jornalismo comunitário: o desafio das mídias alternativas ... · estudantes trouxe para a sala de...
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Jornalismo Comunitário: o desafio das mídias alternativas na democratização da comunicação. Autora: Célia Trindade Amorim1
O universo do jornalismo comunitário sempre foi desafiador. Como ministrar
uma disciplina para alunos acostumados com o discurso e as práticas das mídias
convencionais? Ou, utilizando a expressão Marcusiana, com o discurso unidimensional?
Ao apresentar a disciplina Jornalismo Comunitário para alunos do 5º semestre
Vespertino e Noturno da Faculdade de Estudos Avançados do Pará (FEAPA) 2009/A,
os discentes foram informados, no primeiro dia de aula, que teriam que investigar, in
loco, uma mídia produzida por uma comunidade de Belém do Pará. Uma parte
considerável da classe comentou que não tinha contato com um fenômeno de
Doutora em Comunicação e Semiótica Faculdade de Estudos Avançados do Pará. (FEAPA) - Pará Resumo: Este artigo faz uma reflexão sobre o universo do chamado jornalismo comunitário. Um campo da Comunicação ainda pouco explorado pela academia. Apresenta-se o desenvolvimento do plano de ensino da disciplina Jornalismo Comunitário para alunos do 5 º semestre do Curso de Jornalismo da Faculdade de Estudos Avançados do Pará (FEAPA). O objetivo foi proporcionar aos discentes fundamentação teórica do jornalismo para que pudessem conhecer, in loco, o processo de construção das mídias produzidas pelas comunidades de Belém do Pará. A pesquisa de campo realizada pelos estudantes trouxe para a sala de aula diversas possibilidades de comunicação alternativa produzidas pelos populares para dar voz a seus problemas e anseios. Essas mídias expandem a informação para além dos limites hegemônicos do discurso da mídia oficial. Trata-se do paradigma relacional, a comunidade como co-arquiteta do processo comunicativo, diferentemente do paradigma informacional – emissor e receptores ideais. Este modelo não consegue responder sozinho aos desafios da comunicação. Palavras-chave: Jornalismo comunitário. Mídia Alternativa. Comunicação.
1 - Introdução
1 Jornalista. Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC/SP, profª da disciplina Jornalismo Comunitário e Coordenadora do Curso de Comunicação Social da Faculdade de Estudos Avançados do Pará. (FEAPA).
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comunicação desta natureza. Outros, em número menor, enfatizaram desconhecer tal
mídia.
A revelação discente não causou surpresas. Afinal, boa parte dos estudos
nacionais e internacionais em Comunicação/jornalismo prioriza objetos da chamada
grande imprensa, jornais e revistas de grande visibilidade, incluindo as mídias mais
sedutoras como as rádios e TVs comerciais, e a “menina dos olhos” do século XXI, a
rede mundial de computadores. Não por acaso o professor e pesquisador do jornalismo
brasileiro, José Marques de Melo, no 3º Encontro Nacional sobre História da Mídia
(Novo Hamburgo, RS, 2005), enfatizou a necessidade de se introduzir o estudo das
mídias alternativas na agenda dos pesquisadores midiáticos, fascinados, em sua maioria,
“pelo protagonismo das grandes empresas nacionais”2
2 Esta fala de José Marques de Melo foi extraída do CD-ROM do III Encontro Nacional de História da Mídia da Rede Alfredo de Carvalho, realizado na cidade de Novo Hamburgo, em 2005. Consultar o endereço eletrônico www.redealcar.jornalismo.ufsc.br.
.
No âmbito internacional, o pesquisador inglês John Downing, autor de Mídia
Radical: Rebeldia nas comunicações e movimentos sociais (2002), de forma mais
incisiva, argumenta:
A profunda desigualdade entre as abordagens correntes aos meios de comunicação se deve precisamente à recusa em se levar a sério a persistência histórica e a disseminação geográfica da mídia radical alternativa. Embora o alcance dessa mídia, na aurora do século XXI, seja mais amplo do que nunca – exigindo, por isso mesmo, nossa atenção analítica – esses meios de comunicação não são, de forma alguma, recentes na cultura e na política. A questão é que só a pouco tempo eles entraram na pauta da teoria e dos estudos oficiais, que têm uma predileção pelo que parece óbvio e fácil de verificar (DOWNING, 2002, p. 21).
Afora isso, há o preconceito quando se lida com os meios de comunicação que
não fazem parte do circuito do jornalismo tecno-informacional moderno, ou seja, de
expressão hegemônica tanto nas academias quanto nas mídias. O historiador brasileiro
Werneck Sodré afirma, por exemplo, que “aqueles que se ocuparam em estudar a
imprensa brasileira antiga julgaram o pasquim pelas suas aparências apenas, pelo que
apresentava de exterior e formal, e condenaram-no como manifestação espúria, sem
significação, marginal”. (SODRÉ, 1999, p. 174).
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Atton, citado por Downing, introduz uma perspectiva coerente nesta
problemática ao observar que muitas destas pequenas mídias jamais estabeleceram para
si as metas de sucesso que seus críticos parecem admitir como universais: longevidade,
lucratividade, estabilidade e venda de noticiários em cadeia. (2002, p. 491).
O Plano de Ensino apresentado nos dias 04/05 de fevereiro às Turmas do 5º
semestre da FEAPA teve como principal objetivo proporcionar aos graduandos do
Curso de Comunicação Social fundamentação teórica do jornalismo para que pudessem
conhecer in loco o processo de construção das mídias produzidas pelas comunidades de
Belém do Pará. Nesta perspectiva, o plano estava dividido em três grandes etapas. A
primeira delas trabalhou o referencial teórico por meio de leituras sobre Mídia Radical
Alternativa: rebeldia nas comunicações e movimentos sociais, de John Downing
(2002), Características do Jornalismo Comunitário, de Pedro Celso Campos (2009), e a
pesquisa de doutorado de Célia Trindade Amorim, intitulada Jornal Pessoal: Uma
metalinguagem Jornalística na Amazônia (2008). Todos os três textos focalizam o
universo de pequenas mídias que expressam uma visão alternativa às políticas,
prioridades e perspectivas hegemônicas. O de Downing possibilitou aos alunos um
olhar estrangeiro sobre o fenômeno, o de Pedro Celso Campos centrou-se no universo
de São Paulo e a pesquisa de Célia Trindade Amorim focou tal experiência de
comunicação na Amazônia.
Frente a esta preparação, que culminou com a apresentação de seminários,
resumos e a 1ª Nota de Desempenho Acadêmico sobre os textos em questão, iniciou-se
a segunda etapa: a pesquisa de campo com a proposta de fazer com que os alunos
deixasse os muros da FEAPA e passassem a investigar, in loco, o modus operandi de
uma mídia produzida por uma determinada comunidade. As mídias poderiam ser as
diversas possibilidades de comunicação desenvolvidas pelos populares: informativos,
jornais, rádios, blogs, dentre outras. Alguns alunos se sentiram desafiados, outros
manifestaram preocupação em não encontrar um veículo de comunicação alternativo
que, a partir daquele momento, passava a ser o objeto de estudo de cada equipe.
Para pesquisa de campo, algumas diretrizes foram traçadas. A idéia era fazer
com que o alunado observasse tal fenômeno de comunicação sem grandes
interferências, registrasse como a comunidade se apropria de um meio de comunicação
para dar voz a seus problemas e reclamos, já que a mídia tradicional não consegue dar
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respostas plenamente satisfatórias para tais questões. Tal atividade tratou-se de um
estudo de caso por considerar que este é utilizado como estudo inicial de problemas
pouco conhecidos [...] “pesquisa descritiva por caracterizar-se basicamente por
observar, registrar, classificar e analisar dados, fatos ou fenômenos sem manipulá-los”.
(OLIVEIRA, 2008, p. 97).
Desse modo, os discentes foram a campo para observar a linha editorial, a pauta,
a temática, o relacionamento com as fontes de informação, a relação jornalismo e
publicidade, a linguagem, etc. Mas um item era fundamental: saber se a mídia
investigada contribuía como meio de transformação social, ajudava a comunidade a
construir a sua própria cidadania, lutando por causas coletivas. Eis a hipótese inicial
perseguida por todos. Além da observação direta, os alunos utilizaram como técnica
para obtenção dos dados a entrevista com os responsáveis pelo veículo alternativo, com
a orientação de não censurar os construtores da mídia. Estes precisavam se expressar
sem problemas.
A terceira e última etapa do plano de ensino centrou-se nos resultados da
pesquisa, com apresentação de seminários, relatório de pesquisa, a 2ª Nota de
Desempenho Acadêmico, além da produção de vídeos apresentados por duas equipes da
Turma 5JNN1 (Noturno)3
Os discentes da Turma 5JNN1 apresentaram várias possibilidades de
comunicação alternativa. Os objetos de pesquisa foram a Rádio Erê, localizada no
bairro da Pedreira, o jornal Cururu – o jornal que paga o sapo - do bairro do Satélite; a
Rádio Publicitária Som Brasil, do bairro da Cabanagem, esta escolhida por ser próxima
à Faculdade, a Belém FM 104, 9, da Marambaia; e o blog Cufa (Central Única das
. Nesta fase, vários alunos ampliaram a leitura com a
introdução de novos textos por eles escolhidos para que pudessem entender as
especificidades da mídia investigada.
Assim, os alunos das Turmas 5JNV1 (Vespertino) trouxeram para a sala de aula
a experiência alternativa de quatro rádios localizadas em bairros periféricos de Belém.
Rádio Comunitária Cidadania FM, localizada no bairro da Terra Firme; a Rádio
Apocalipse, que funciona no Império Amazônico; a Belém FM 104,9, localizada no
bairro da Marambaia, e a Rádio Publicitária São Brás, no bairro do mesmo nome.
3 5JNV1 E 5JNN1 – Referem-se às Turmas do 5º semestre Vespertino e Noturno do Curso de Jornalismo da Faculdade de Estudos Avançados do Pará (FEAPA).
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Favelas), este de dimensões regional ([email protected]) e nacional
(http://www.cufa.org.br)
Eis alguns resultados da pesquisa que não se esgotam nesta comunicação
científica: Há uma multiplicidade de meios produzidos pelos populares em Belém do
Pará que ajudam a ampliar e a fortalecer a democratização da comunicação. São espaços
midiáticos alternativos que têm como pauta os problemas e anseios da população, numa
inversão de pauta contrária à estrutura da mídia convencional brasileira centrada nas
mãos de políticos e famílias com forte tendência monopolista.
Na sua maioria, as mídias alternativas investigadas em bairros periféricos de
Belém do Pará expandem a informação para além dos limites hegemônicos do discurso
da mídia oficial, com a participação direta da comunidade. Trata-se do paradigma
relacional, a comunidade como co-arquiteta do processo comunicativo, diferentemente
do paradigma informacional – emissor e receptores ideais. Este modelo não consegue
responder sozinho aos desafios da comunicação. O paradigma relacional, usando o
raciocínio de Downing, propõe a democracia do processo de comunicação
reconhecendo “a audiência ativa como aquela que elabora e molda os produtos da
mídia, e não apenas absorve passivamente suas mensagens, proposta radicalmente
oposta à ideologia da mídia comercial” (2002, p. 38-83).
A Rádio Cidadania FM, por exemplo, que existe há 18 anos na Terra Firme, um
dos bairros mais violentos de Belém, foi objeto de pesquisa da equipe de Cássio Ribeiro
e Jorge Afonso, Turma 5JNV1. A mídia investigada dá voz à população do bairro de
forma pluralista e permite com que os próprios moradores sejam sujeitos do processo
comunicativo. Os estudantes identificaram que a Cidadania FM critica os problemas
sociais da Terra Firme como prostituição infantil, preconceitos contra classe social, falta
de saneamento básico, aumento da criminalidade, dentre outros assuntos, que ora são
discutidos ora produzidos para serem noticiados pelos populares.
A equipe liderada por Augusto Gamboa e Lais Martins da Turma 5JNN1 pôde
constatar que a Rádio Erê, do bairro da Pedreira, é aberta a participação da população.
“São programas, denúncias, recados, anúncios populares”, afirmou a equipe em
relatório de pesquisa.
Já a Rádio Apocalipse, do Império Amazônico, objeto de estudo da equipe de
Maylene Tieli e Andressa Ferreira (5JNV1), focaliza sua programação em músicas,
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serviços de utilidade pública, documentos achados e perdidos, denúncias de moradores
do bairro, finalizando com a leitura da palavra da Bíblia.
A Rádio Publicitária Som Brasil, da Cabanagem, área oriunda de invasão de
terra e que hoje se transformou em bairro de Belém, da equipe de Adisson Souza e
Kelves Rodrigues (5JNN1), trabalha especificamente com anúncios comerciais a preços
populares. A receita mensal chega a R$ 180,00. Adisson Souza observou que a
publicidade está centrada nos pequenos empreendimentos do bairro como padarias,
vendas de gás e açaí, carros de lanches, além de salões de beleza.
Apesar de ser uma rádio publicitária, a Som Brasil abre os microfones aos
populares da Cabanagem. “A única restrição imposta pelo proprietário Seu Santos,
como gosta de ser chamado Manuel Santos da Silva, é para não chamar palavrões e
ofensas pessoais no ar. Essa disponibilidade da rádio proporciona aos moradores espaço
para divulgação de reuniões de igrejas, campeonato de futebol, festas, bingos, anúncios
de falecimento, etc. não havendo cobrança pelas comunicações”, destaca a equipe em
relatório de pesquisa.
Ao contrário da mídia anterior, a Rádio Publicitária São Brás, da equipe de
Andrezza Anaice e Vanessa Bendelak, Turma 5JNV1, é totalmente publicitária. E não
possui apoio da comunidade do bairro, que a tem como um transtorno sonoro. Andrezza
Anaice observou que a rádio tem convênio com um grande jornal paraense e todos os
dias faz a leitura desse único jornal. Em discussão em sala de aula, alunos e docente
chegaram à conclusão de que a rádio não tem apoio dos populares porque é meramente
repetidora da mídia oficial, que insiste em um noticiário elitizado.
O Jornal Cururu, do bairro do Satélite, intitulado o jornal que paga o sapo,
existe desde 1999 e conta com a ajuda de populares com sugestões de pauta e
denúncias. “O periódico não contava com publicidade, mas pelas dificuldades
enfrentadas, começou a fazer anúncios de comerciantes que moram no próprio
conjunto: donos de mercearias, açougues, escolas e outros estabelecimentos”, observou
a equipe de Jucilene Nascimento, Jaqueline Cabral e Bruno Pinheiro da 5JNN1. De
acordo com os estudantes, o grupo do Cururu faz não só a produção do texto como
também todo o processo jornalístico, sem que haja nenhuma remuneração, trabalhando
apenas pelo prazer de comunicar uma informação que deve ser de interesse da
coletividade.
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A Central Única das Favelas do Pará - CUFA PA foi o blog pesquisado pelo
Aluno Thalles Pluget. De acordo com sua investigação, a CUFA Pará promove, desde
setembro de 2008, projetos que contribuam para o desenvolvimento socio-cultural de
crianças e jovens de bairros periféricos. A linguagem é por meio do movimento hip hop,
esportes, blog e TV on line. Thalles Pluget enfatizou que a Central Única das Favelas
existe nacionalmente desde 1999 no Rio de Janeiro e em outros 25 Estados brasileiros,
além do Distrito Federal.
2 - Legalização x Pirataria
Abriu-se um campo de discussão em sala de aula no que diz respeito à
legalização das rádios comunitárias, objeto de pesquisa da maioria dos estudantes. A
Rádio FM 104, 9 do bairro da Marambaia foi objeto de estudo tanto da equipe de
Honório Pinto, do turno da tarde, quanto da equipe de Elma Barbosa, do turno da noite.
De acordo com a pesquisa dos discentes, com exceção da FM 104,9, nenhuma rádio
comunitária em Belém do Pará é legalizada. Todas são consideradas “piratas”. Este
dado foi bastante relevante para a análise, pois o objetivo da pesquisa não era saber se a
mídia era legalizada ou não, mais sim se contribuía na construção da cidadania.
Por esta proposta, a Rádio FM 104,9 apesar de ser legalizada, não foi
considerada uma mídia a serviço da comunidade e para a comunidade de acordo com a
equipe de Elma Barbosa e Gleidson Gomes. A rádio possui o status de comunitária
apenas para ter as benesses da legislação 9.612/98 que estabelece o Serviço de
Radiodifusão Comunitária, regulamentada pelo decreto 2.615/98. Na realidade, “a rádio
da Marambaia adota o modelo empresarial da mídia oficial, possui 15 funcionários e
pouco contribui com os moradores do bairro” revelou em relatório de pesquisa a equipe
de Elma Barbosa. Além disso, “a cobertura restrita a 1Km por legislação a partir da
antena transmissora para as rádios comunitárias não é respeitada, já que a FM 104,9
alcança em média 4km”.
A equipe de Honório Pinto, em seminário, considerou a FM 104, 9 como a
serviço da cidadania. Entretanto, em sua 2ª Nota de Desempenho Acadêmico, ponderou
e disse que os alunos não puderam constatar se é dada liberdade para a comunidade
quando o assunto é contrário aos interesses da administração do veículo e seus
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anunciantes. “Seria interessante realizar a pesquisa também em período eleitoral para
monitorar a programação a fim de constatar se realmente os microfones continuam
abertos à comunidade”.
3 - Histórias de sobrevivência e tensão
A luta por espaços alternativos de comunicação não é fácil. A história das mídias
alternativas seja brasileira ou de outros países é permeada por conflitos e tensões.
Muitas das mídias investigadas pelos alunos já sofreram sanções por parte do poder do
Estado por não estarem legalizadas. A equipe de Augusto Gamboa, que apresentou a
Rádio Erê - prefixo 101,7 - observou que “há 13 anos a Erê vem lutando pela
legalização e não consegue. O pedido de autorização para funcionamento já foi
repassado à Agência Nacional de Telecomunicações, mas até hoje nada foi resolvido. A
ação chegou a caducar e ser arquivada”. A programação da Erê, de acordo com os
estudantes, é levada ao ar no horário das 18 às 22 horas para escapar das ações de
fiscalização por parte da Polícia Federal e por problemas financeiros. A Rádio
Cidadania FM, assim como a Rádio Apocalipse, também já foram censuradas com
apreensão de equipamentos, ficando fora do ar por meses.
Neste momento, é oportuno o pensamento de Downing, que abre espaço em sua
obra para falar das repressões, por parte do Estado, que muitas vezes sofrem os ativistas
da mídia radical alternativa como execução, cárceres, tortura, agressões fascistas,
bombardeio de estações de rádio, ameaças, vigilância policial e táticas de intimidação.
Dessa forma, o pesquisador reitera:
A história da mídia radical, como o próprio Gramsci só a duras penas descobriu em sua própria vida, é quase sempre uma história de sobrevivência e tensão perante a hostilidade veemente e às vezes mortal das autoridades. Inserir a mídia radical alternativa nesse contexto mais amplo do poder do Estado, da hegemonia e da insubordinação é um passo necessário para entendê-la. Precisamos estar atentos para as múltiplas formas de poder e subordinação, que com freqüência se encontram entrelaçadas; para a centralização da cultura como o campo no qual se travam as lutas por liberdade e justiça; e para a atuação poderosa das estratégias microssubversivas (DOWNING, 2002, p. 54).
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Guardadas as devidas exceções, a maioria das mídias investigadas pelos alunos
do Curso de Jornalismo da FEAPA desempenha uma função social de contribuir com a
cidadania, lutando por liberdade e justiça. A linguagem é coloquial, sem formalismo,
uma linguagem de aproximação, com temática que privilegia o universo de cada bairro,
mas sem se desconectar do que acontece no mundo globalizado. Não possui fins
lucrativos. O lucro é o social, pois a mídia é um produto da coletividade. Verificou-se
também que a comunidade constrói e reconstrói as suas mídias. À maioria de caráter
efêmero, uma característica desse tipo de veículo.
Registra-se também que as mídias alternativas, sem querer idealizá-las, como
alerta Downing, são essenciais à democracia. Além de expandir o âmbito das
informações, da crítica, são mais sensíveis do que a mídia oficial às vozes e problemas
dos excluídos. E, com muita freqüência, como argumenta o estudioso, toma à frente
“discussões de questões que só mais tarde receberão atenção da mídia oficial [...] e não
precisa censurar-se para atender aos interesses dos mandachuvas da mídia, do
entrincheirado poder estatal e das autoridades religiosas” (DOWNING, p. 2002, p. 81).
Diante do exposto, observa-se que apesar da grande resistência aos meios
alternativos, aos pequenos veículos de comunicação, eles entraram na pauta da teoria e
dos debates acadêmicos. Os estudos têm sido fecundos e abrem perspectivas
importantes para se entender um fenômeno que de modo algum é recente na cultura e na
política.
Especificamente, o trabalho desenvolvido com os alunos de Jornalismo da
FEAPA fortalece o campo da Comunicação, especificamente o chamado Jornalismo
Comunitário, ainda pouco explorado e carente de pesquisa científica. O plano de ensino
desenvolvido neste semestre 2009A foi o ponto de partida para o mapeamento das
pequenas mídias em Belém do Pará. A proposta final do semestre foi impulsionar uma
reflexão crítica aos alunos, pois o jornalismo, seja aquele praticado nas mídias
alternativas ou nas oficiais, tem o dever para com a cidadania, com a causa pública,
enfim, com a democratização da comunicação.
Participaram da pesquisa os alunos da Turma 5JNV1: Adalberto Aquino, Aila
Cunha, Andressa Ferreira, Andrezza Anaissi, Cássio Ribeiro, Cláudia Nogueira, Diego
Beckman, Diego Monteiro, Honório Neto, Jorge Afonso, Marcelo Duarte, Maria
Leilane de Souza, Mylene Tieli Soares, Patrick de Campos, Raimunda Graciete Silva,
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Sarah Loami da Silva, Talita Xavier e Vanessa Bendelak. Turma 5JNN1: Adisson
Santos, Adriana Macedo, Aline da Silva, Augusto Gamboa, Bruno Pinheiro, Cíntia
Barroso, Denislea Joseph, Elma Barbosa, Giovane da Silva, Gleidson Gomes, Hannan
Fernandes, Jaqueline Cabral, Jucilene do Nascimento, Kamila Dias Santos, Karina
Nunes, Kelves Gonçalves, Lais Martins, Lúcia de Oliveira, Luiz Belém, Sonia Maria da
Silva, Thales Pugget e Yorrana Suilan Barbosa.
Aos alunos da FEAPA, o meu agradecimento pelo empenho e determinação em
desbravarem este fascinante campo da Comunicação.
Referências Bibliográficas
AMORIM, Célia Regina Trindade Chagas. Jornal Pessoal: Uma metalinguagem jornalística na Amazônia. Tese de Doutorado. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. 2008. DOWNING, John. Mídia Radical: rebeldia nas comunicações e movimentos sociais. São Paulo: Senac, 2002. MARCUSE, Herbert. Ideologia da sociedade industrial. 3ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1969. OLIVEIRA. Valéria Rodrigues de. Desmitificando a pesquisa científica. Belém: EDUFPA, 2008. WERNECK SODRÉ, Nelson. História da imprensa no Brasil. 4ª ed. Rio de Janeiro: Mauad, 1999. Sites: CAMPOS, Pedro Celso. História do Jornalismo Comunitário. Disponível em http://webmail.faac.unesp.br/~pcampos/HISTORIA%20DO%20JORNALISMO%20COMUNITARIO.htm. Acesso em 08.02.2009. ENCONTRO NACIONAL DA REDE ALFREDO DE CARVALHO, 3., 2005, Novo Hamburgo, RS. Anais Eletrônicos... Novo Hamburgo, RS, 2005. Disponível em http://www.redealcar.jornalismo.ufsc.br. Acesso em 05.05.2009.