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JUCILEIDE DAS DORES LUCAS TOLENTINO INVESTIGANDO A MOTIVAÇÃO PARA APRENDER MATEMÁTICA NO CURSO DE LICENCIATURA EM PEDAGOGIA: ANÁLISE DE UM GRUPO DE ESTUDOS Ouro Preto 2018

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JUCILEIDE DAS DORES LUCAS TOLENTINO

INVESTIGANDO A MOTIVAO PARA APRENDER MATEMTICA NO CURSO DE LICENCIATURA EM

PEDAGOGIA: ANLISE DE UM GRUPO DE ESTUDOS

Ouro Preto

2018

JUCILEIDE DAS DORES LUCAS TOLENTINO

INVESTIGANDO A MOTIVAO PARA APRENDER MATEMTICA NO CURSO DE LICENCIATURA EM

PEDAGOGIA: ANLISE DE UM GRUPO DE ESTUDOS

Dissertao apresentada Banca Examinadora, como exigncia parcial obteno do Ttulo de Mestre em Educao Matemtica pelo Mestrado Profissional em Educao Matemtica da Universidade Federal de Ouro Preto, sob orientao da Prof. Dr. Ana Cristina Ferreira.

Ouro Preto

2018

AGRADECIMENTOS

Agradeo a Deus por sempre guiar meus passos e me dar foras para superar os

obstculos.

Agradeo minha me pelo amor e pela educao.

Ao meu pai (in memoriam), que me incentivou a lutar pelos meus sonhos.

minha irm, Jucineide e a meu esposo, Jos Afonso, pelas palavras de incentivo nos

momentos difceis, pela confiana e apoio, sempre.

professora, orientadora e amiga Ana Cristina, pela pacincia, pelas orientaes e pelo

carinho.

Aos membros da banca de qualificao e defesa professora Maria Laura Magalhes

Gomes, professores Edmilson Minoru Torisu e Jos Aloyseo Bzuneck, pela

disponibilidade, pela leitura atenciosa do texto e pelas consideraes.

Aos professores do Programa de Mestrado Profissional em Educao Matemtica, pelo

companheirismo, pelos ensinamentos e pelas contribuies ao longo da pesquisa.

Aos colegas da turma 2016 pelos momentos de descontrao, pela troca de experincias

e pelo carinho.

s alunas participantes do grupo de estudos desenvolvido durante a pesquisa, sem vocs

esse trabalho no seria possvel.

Enfim, a todos que acreditaram em meus esforos e contriburam para a realizao desta

pesquisa.

Eu quero desaprender para aprender de novo. Raspar as tintas com que me pintaram. Desencaixotar emoes, recuperar sentidos.

Rubem Alves

RESUMO

A motivao para aprender fundamental nos processos de ensino e aprendizagem, independente do contedo ou do nvel de ensino. No caso da Matemtica, alm dos baixos resultados obtidos por estudantes brasileiros nas avaliaes regionais, nacionais e internacionais, preciso considerar que, muitas vezes, o prprio docente da Educao Infantil e dos anos iniciais do Ensino Fundamental no possui uma boa relao com essa disciplina, nem contou com uma formao inicial adequada. Apesar disso, ainda so poucas as pesquisas brasileiras voltadas para a compreenso de como o futuro professor/pedagogo se relaciona com a Matemtica e como sua formao inicial poderia contribuir para o fortalecimento dessa relao. A presente pesquisa teve como foco a motivao para aprender Matemtica de um grupo de licenciandas em Pedagogia de uma universidade pblica do interior de Minas Gerais. Seu propsito foi investigar como a participao em um grupo de estudos voltado para a autorregulao da aprendizagem e para a construo de conhecimentos matemticos influenciou a motivao para aprender Matemtica em alunos de um curso de Pedagogia. O marco terico foi constitudo pelas noes de motivao para aprender e autorregulao da aprendizagem, trazidas da Psicologia Social. A metodologia, de abordagem qualitativa, envolveu uma pesquisa de interveno na qual os dados foram produzidos por meio de observao das aulas de duas disciplinas de Matemtica do referido curso, durante dois semestres, registros produzidos pelos estudantes, questionrio e gravaes das reunies de estudos. Participaram da pesquisa oito licenciandas que aceitaram o convite para compor um grupo de estudos em horrio extraclasse. Os resultados evidenciam a participao mais ativa do grupo de estudos durante as aulas de Matemtica e maior persistncia, por parte das alunas, na realizao das tarefas propostas, indcios de fortalecimento das crenas de autoeficcia associados principalmente ao aumento da frequncia de experincias de sucesso, alm do desenvolvimento de uma relao mais favorvel para a aprendizagem de Matemtica. A partir deste estudo, foi construdo um produto educacional, voltado para formadores de professores, futuros professores, gestores e demais interessados, no qual as tarefas so apresentadas, discutidas e fundamentadas.

Palavras-chave: Educao Matemtica, Motivao para Aprender, Formao Matemtica do Pedagogo, Autorregulao, Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

ABSTRACT

Motivation to learn is fundamental in teaching and learning processes, regardless of

content or level of education. Concerning Mathematics, besides the low results obtained

by Brazilian students in regional, national, and international exams, it is important to

consider that, quite often, the Childhood and Early Elementary Educations teachers

neither have a good relationship with this subject nor have had a proper initial training.

Nevertheless, there are still few Brazilian studies on understanding how the future

teacher/educator engages with Mathematics and how their initial training can contribute

to strengthen this relationship. This research focuses on the motivation to learn

Mathematics in a group of Pedagogy students of a public university in the countryside

of Minas Gerais. It is aimed at investigating how the participation in a study group on

self-regulated learning and construction of mathematical knowledge influences

Pedagogy students motivation toward learning Mathematics. The theoretical

framework consists of notions of motivation to learn and self-regulated learning,

brought from Social Psychology. The methodology, of qualitative approach, involves an

intervention research, on which, during a semester, data are produced through class

observations in a Mathematics course within the Pedagogy major, registers developed

by the students, questionnaire, and recordings of the study meetings. Eight Pedagogy

students participated in this study. They accepted to attend a study group beyond school

hours. The results showed a more active participation of the group during the

Mathematics classes and a greater persistence, by the students, when carrying out the

tasks proposed. This indicated a strengthening of the self-efficacy beliefs associated,

mainly, with an increase in the frequency of successful experiences, besides developing

a more favorable relationship towards Mathematics learning. Stemming from this study,

an educational product aimed at teacher trainers, future teachers, managers and whoever

may be interested will be produced. Its tasks will be introduced, discussed, and

substantiated.

Keywords: Mathematics Education, Motivation to Learn, Educators Mathematical

Training, Self-Regulated Learning, Early Elementary Education.

LISTA DE FIGURAS

Figura 01: Fases e processos da autorregulao segundo Zimmerman e Moylan

35

Figura 02: Fases de planejamento

36

Figura 03: Fase de execuo

37

Figura 04: Fase de autorreflexo

38

Figura 05: Resoluo inicial do problema da diviso dos 35 camelos

58

Figura 06: Alunas explorando a diviso com auxlio do tapetinho

60

Figura 07: Dicas de preparao para exame

61

Figura 08: Representao de fraes com denominadores iguais feita por Karol

64

Figura 09: Resoluo de Teresa aos problemas

65

Figura 10: Ficha de apoio para resoluo de problemas 84

Figura11: Desenvolvimento das atividades com tiras de papel

88

Figura12: Resposta de Teresa questo 3

95

Figura13: Resposta de Lcia questo 3

96

Figura14: Representao de fraes com tiras de papel

99

Figura15: Resposta de Teresa questo 2 Grupo de estudos 23/08/17

101

Figura16: Respostas de Teresa atividade aplicada no dia 20/07/18

104

Figura17: Metas e desafios apresentados por Lcia na segunda fase da pesquisa

104

Figura18: Exemplo de atividade aplicada no 4 encontro 01/08/2017

106

LISTA DE QUADROS

Quadro 01: Algumas definies e caracterizaes sobre a autorregulao da aprendizagem

33

Quadro 02: Sntese das aulas observadas 54

Quadro 03: Sntese das atividades desenvolvidas no grupo de estudo 66

SUMRIO

INTRODUO ..................................................................................................... 13

CAPTULO 1: MOTIVAO PARA APRENDER MATEMTICA NO CURSO

DE PEDAGOGIA .................................................................................................. 18

1.1. Motivao para aprender Matemtica ............................................................ 18

1.1.1. Motivao no contexto escolar ............................................................... 19

1.1.2. Como avaliar a motivao para aprender ................................................ 25

1.1.3. Breve levantamento das pesquisas brasileiras relacionadas motivao para aprender Matemtica ................................................................................ 26

1.2. Autorregulao da aprendizagem .................................................................. 32

1.2.1. Autorregulao da aprendizagem: origem e conceitos ............................ 32

1.2.2. A autorregulao da aprendizagem na formao docente ........................ 41

CAPTULO 2: METODOLOGIA DA PESQUISA ................................................. 45

2.1. Questo de investigao e objetivos da pesquisa ........................................... 45

2.2. Opes metodolgicas adotadas .................................................................... 46

2.3. Contexto de pesquisa..................................................................................... 47

2.4. Participantes do grupo de estudos .................................................................. 48

2.5. Procedimentos metodolgicos ....................................................................... 50

2.6. A produo de dados ..................................................................................... 51

2.7. Observaes e participaes realizadas nas disciplinas Matemtica: Contedos e Metodologias I e II ............................................................................................ 53

2.8. Desenvolvimento do grupo de estudos .......................................................... 56

CAPTULO 3: A MOTIVAO PARA APRENDER A PARTIR DA

PARTICIPAO NO GRUPO DE ESTUDOS ...................................................... 69

Eixo 1: Engajamento nas atividades ..................................................................... 70

Eixo 2: Crenas de autoeficcia ........................................................................... 81

Eixo 3: Dinmica de trabalho no grupo de estudos ............................................... 93

CONSIDERAES FINAIS ................................................................................ 112

REFERNCIAS ................................................................................................... 117

APNDICES ........................................................................................................ 123

Apndice A: Alguns modelos tericos de investigao e interveno na aprendizagem autorregulada .............................................................................. 123

Apndice B: Observaes das aulas da disciplina Matemtica Contedos e Metodologias I (05/05/17 a 25/08/17) ................................................................ 125

Apndice C: Observaes das aulas da disciplina Matemtica Contedos e Metodologias II (28/09/17 a 15/02/18). .............................................................. 132

Apndice D: Desenvolvimento das atividades do grupo de estudo (Transcries dos encontros realizados entre 12/07/2017 a 23/08/2017) ............................................ 138

Apndice E: Desenvolvimento das atividades do grupo de estudo (Transcries dos encontros realizados entre 04/10/2017 a 29/01/2018)............................................. 163

Apndice F: Roteiro de questionrio aplicado em 26/05/17 ................................ 206

Apndice G: Roteiro de questionrio aplicado em 18/01/18 ............................... 208

Apndice H: Roteiro de entrevista realizada no dia 29/01/2018 .......................... 209

13

INTRODUO

Apresento algumas informaes sobre a minha caminhada como aluna e

professora de Matemtica que, certamente, influenciaram a escolha pela presente

investigao. Sempre gostei da disciplina Matemtica, porm, durante a graduao, eu

no conseguia assimilar facilmente os contedos que o professor ensinava. s vezes,

desanimava, mas algo nesse curso despertava meu interesse e me fazia buscar

alternativas para sanar minhas dificuldades. Comecei a perceber que a aprendizagem

estava relacionada a um elemento propulsor: a motivao. Sendo assim, os professores e

meus colegas de classe poderiam influenciar meu engajamento no curso e,

consequentemente, minha aprendizagem.

No ano de 2014, ingressei na Rede Estadual de Educao como professora de

Matemtica. O comportamento e os comentrios de alguns alunos, durante as aulas,

apontavam a falta de interesse e o desnimo para com a aprendizagem, o que eu tambm

havia experimentado no papel de aluna. Alm disso, percebi que eles tambm no se

organizavam para estudar e no conheciam o prprio potencial. Ento as consideraes

sobre motivao comearam novamente a despertar minha curiosidade. Muitos alunos

relatavam no gostar da Matemtica, devido a uma sequncia de resultados negativos,

outros apontavam o fato de no saberem como estudar aqueles contedos, e outros,

ainda, queixavam-se de que na Matemtica tudo era difcil.

Tais inquietaes me levaram a buscar algumas formas diferentes de ensinar e

embasamento terico que me fizesse entender o referido processo de ensino e

aprendizagem. No final do ano de 2015, participei do processo seletivo do Mestrado

Profissional em Educao Matemtica da UFOP, e resolvi analisar a motivao1 dos

alunos, durante o processo de aprendizagem de Matemtica.

Para compreender2 o conceito de motivao, recorremos primeiramente ao

dicionrio. Encontramos para motivao ato ou efeito de motivar, e para o termo

motivar: dar motivo a, causar, provocar, prender a ateno de, interessar, apresentar

com motivo ou causa de alegar (HOUAISS, 2004).

1A princpio, como no conhecia a terminologia motivao para aprender, descrevi o anteprojeto utilizando os termos motivao e atitudes favorveis para a aprendizagem. 2At esse momento, escrevi na primeira pessoa do singular, por se tratar de experincias vivenciadas por uma das pesquisadoras, porm, a partir do ingresso no Mestrado e da interlocuo com minha orientadora, considero mais apropriado o uso da primeira pessoa do plural.

14

Considerando a importncia da motivao no contexto escolar, procuramos

identificar o que j havia sido produzido sobre o tema no Brasil. A literatura refora que

a motivao no contexto escolar diferente daquela produzida em outras atividades,

uma vez que se relaciona com o trabalho mental. Observamos que, no Brasil, a pesquisa

referente motivao para aprender distribui-se em diversas regies, embora ainda haja

poucos estudos nesse campo. Quando se trata da motivao para aprender Matemtica,

o nmero de pesquisas ainda bem menor. Logo, se fazem necessrias mais

investigaes nessa rea.

Um contexto que particularmente nos interessou foi o da formao inicial de

pedagogos. So eles os principais responsveis pelo ensino da Matemtica na Educao

Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental. E como esses profissionais se

relacionam com essa disciplina? evidente que a formao matemtica dos pedagogos

deveria proporcionar-lhes condies para promover a aprendizagem de seus alunos e,

para isso, seria vital que se sentissem motivados para aprender Matemtica e confiantes

em sua prpria capacidade.

Um aspecto importante a ser considerado a natureza do curso de Pedagogia.

Ele no se destina especificamente formao de professores, mas abrange vrios

campos de conhecimento e vrias reas de atuao. Ele envolve desde disciplinas de

carter mais amplo, como as Didticas, Filosofias e Psicologias, at as disciplinas

voltadas para a construo de um conhecimento mais especfico, como Portugus,

Matemtica e Cincias, por exemplo.

No Brasil, os cursos de Licenciatura em Pedagogia so institudos pela

Resoluo n. 1 do Conselho Nacional de Educao (CNE)/ Conselho Pleno (CP), de 15

de maio de 2006. De acordo com o artigo 4 dessa resoluo, o curso de Licenciatura

em Pedagogia destina-se : (...) formao de professores para exercer funes de magistrio na Educao Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Mdio, na modalidade Normal, de Educao Profissional na rea de servios e apoio escolar e em outras reas nas quais sejam previstos conhecimentos pedaggicos (BRASIL, 2006, p.2).

Ainda, conforme o artigo 5 dessa mesma resoluo, o egresso do curso de

Pedagogia deve estar apto a ensinar Matemtica, bem como Portugus, Cincias,

Histria, Geografia e Artes, de forma interdisciplinar e adequada s diferentes fases do

desenvolvimento humano.

15

Para atender o propsito a que se destina, devem fazer parte da estrutura do curso, segundo o artigo 6 da Resoluo n. 1 do Conselho Nacional de Educao (BRASIL, 2006, p.3):

1) Um ncleo de estudos bsicos que deve considerar a multiculturalidade e a diversidade da sociedade brasileira. Nesse ncleo ser articulada a decodificao e a utilizao de cdigos de linguagens variadas, utilizadas pelas crianas, alm do trabalho didtico com contedos pertinentes aos primeiros anos de escolarizao relativos Matemtica e a outras disciplinas;

2) Um ncleo de estudos diversificados voltado para as reas de atuao profissional priorizadas pelo projeto pedaggico da instituio;

3) Um ncleo de estudos integradores que proporcionem o enriquecimento curricular. As atividades desse ncleo compreendem a participao em seminrios, projetos de iniciao cientfica, monitoria e extenso, orientados pelos docentes da instituio de ensino superior; participao em atividades prticas que propiciem vivncias nos diferentes campos de atuao profissional e em atividades de comunicao e expresso cultural.

A carga horria mnima atribuda ao curso de 3200 horas de trabalho

acadmico, sendo 2800 dessas horas atribudas para aulas, realizao de pesquisas,

visitas a instituies culturais, participao em grupos de estudos; 300 horas dedicadas

realizao dos estgios supervisionados, e 100 horas dedicadas a atividades de

aprofundamento em reas especficas de interesse dos alunos, como iniciao cientfica,

extenso e monitoria (BRASIL, 2006).

Souto (2016), com base no levantamento realizado em 2013 sobre a formao

matemtica de licenciandos em Pedagogia de 14 instituies de Minas Gerais, evidencia

que apenas 8% da carga horria total do curso dedicada s disciplinas de Matemtica.

Em vrios destes cursos, esto previstas apenas uma ou duas disciplinas de Matemtica

em toda a matriz curricular. A anlise de Souto (2016) tambm mostra que, na

percepo dos licenciandos participantes do estudo, o tempo dedicado a formao

matemtica insuficiente e eles no se sentem preparados para lecionar Matemtica nos

anos iniciais do Ensino Fundamental. A nosso ver, crucial que o futuro professor dos

anos iniciais, responsvel por todas as disciplinas, seja adequadamente preparado para,

dentre outras coisas, ensinar Matemtica.

Alm da falta de domnio conceitual da Matemtica, muitos alunos ingressantes

no curso de Pedagogia costumam trazer crenas e atitudes geralmente negativas com

relao a essa disciplina e seu ensino. Geralmente, essa relao proveniente de

fracassos escolares ou mesmo da concepo de que a Matemtica pode ser

16

compreendida apenas por algumas pessoas. A no resoluo desse problema acaba

afetando a formao do aluno e sua futura prtica docente (FIORENTINI, 2008).

Desenvolver atitudes favorveis com relao Matemtica muito importante

para os professores das sries iniciais, pois so eles que iniciaro a formao

matemtica das crianas, assim como sua relao afetiva com essa disciplina

(CARZOLA E SANTANA, 2005). Sendo assim, necessrio repensar a formao deste

profissional para que ele desenvolva uma relao positiva com relao Matemtica e

tambm domine os conhecimentos necessrios para o seu ensino.

A partir da problemtica apresentada, recortamos a seguinte questo para nortear

a nossa pesquisa:

Como a participao em um grupo de estudos voltado para a aprendizagem

autorregulada3 e para a construo de conhecimentos matemticos influencia a

motivao para aprender Matemtica de licenciandas de um curso de Pedagogia?

O principal objetivo deste estudo investigar, junto a um grupo de estudantes do

curso de Pedagogia de uma instituio federal do interior de Minas Gerais, como a sua

participao em um grupo de estudos voltado para o desenvolvimento da aprendizagem

autorregulada e para construo de conhecimentos matemticos influencia a sua

motivao para essa disciplina.

A pesquisa tambm motivada pelo propsito de gerar um produto educacional

voltado para professores e futuros professores de Matemtica, bem como interessados

na temtica, reunindo as reflexes e os resultados obtidos com a realizao e a anlise

das tarefas.

Justificamos a escolha da autorregulao como forma de incrementar a

motivao para aprender porque acreditamos que na medida em que o aluno comea a

ter capacidade de se apropriar do seu processo de aprendizagem, a utilizar algumas

estratgias de autorregulao, ele poder experimentar situaes de sucesso, aumentar a

confiana em sua capacidade e se motivar para aprender, construindo um ciclo virtuoso

de aprendizagem.

Nosso estudo est organizado em trs captulos. No primeiro, apresentamos os

conceitos da Psicologia Social que fundamentam nossa pesquisa: motivao para

aprender e autorregulao da aprendizagem, e justificamos a importncia desses

3Abordamos autorregulao da aprendizagem como processo pelo qual o indivduo planeja, executa e reflete sobre sua aprendizagem, considerando os aspectos sociais, motivacionais, cognitivos e o ambiente no qual est inserido.

17

constructos no contexto educacional. No segundo captulo, apresentamos as opes

metodolgicas, o contexto e os participantes da pesquisa. Em seguida, no captulo trs,

trazemos a anlise e os resultados. O texto concludo com as Consideraes Finais,

Referncias, Apndices e Anexos.

18

CAPTULO 1: MOTIVAO PARA APRENDER MATEMTICA NO CURSO DE PEDAGOGIA

Nas ltimas dcadas, tem-se observado a tentativa dos movimentos educacionais

de acompanhar as evolues sociais e as novas concepes de ensino e aprendizagem.

Entretanto, apesar das mudanas, continua sendo um desafio tornar nossos alunos

autnomos e responsveis por sua aprendizagem, bem como oferecer-lhes condies

para incrementar e orientar a sua Motivao para aprender.

Visando compreender alguns conceitos da Psicologia Social que usamos neste

trabalho, apresentamos, nesta primeira parte de reviso de literatura, os seguintes

tpicos referentes motivao para aprender: a motivao no contexto escolar, como

avaliar a motivao para aprender, breve levantamento das pesquisas brasileiras

relacionadas motivao para aprender. E para compreender um pouco mais a

autorregulao da aprendizagem e como esta se relaciona com a motivao exploramos

apresentamos: a origem e conceitos sobre este constructo e a autorregulao da

aprendizagem na formao docente.

A seguir, apresentamos a fundamentao terica associada problemtica do

estudo para cada um dos itens acima relacionados.

1.1. Motivao para aprender Matemtica

Motivao uma palavra comumente utilizada no nosso cotidiano. Em livros,

artigos e na fala corriqueira. Mas, afinal, o que seria essa motivao? A etimologia da

palavra indica que ela vem do latim, movere, e que se relaciona com o substantivo

motivum, dessa forma, podemos compreender motivao como aquilo que move uma

pessoa ou a pe em ao ou a faz mudar de curso (BZUNECK, 2009a, p. 9).

Neste trabalho, entendemos a motivao para aprender da mesma forma que

Brophy (1987), ou seja, como uma disposio duradoura que leva o aluno a esforar-se

para aprender determinado contedo, em uma situao de aprendizagem. Para este

estudioso, a motivao para aprender existe, quando o engajamento do aluno guiado

pela inteno de adquirir o conhecimento que a atividade prope ensinar.

Como Reeve (2011, p.4), entendemos que o estudo da motivao refere-se aos

processos que fornecem ao comportamento sua energia e direo. A direo significa

que o comportamento tem um propsito, ou seja, direcionado para alcanar um

resultado. Os processos que direcionam o comportamento de um indivduo emanam

19

tanto de suas foras internas quanto do seu ambiente. Sendo assim, os motivos podem

ser internos ou externos.

Compreender como a motivao influencia o contexto escolar importante para

que possamos melhorar o processo de ensino e aprendizagem, sobretudo da Matemtica,

disciplina cujo contedo considerado difcil e que apresenta um ndice de reprovao

considervel.

1.1.1. A Motivao no contexto escolar

O conceito de motivao tem dado origem a diversos estudos e interpretaes

que sistematizam e fundamentam vrias atividades sociais, sobretudo o ato de aprender.

Esse constructo est cada vez mais presente nas escolas, seja na explicao do

desempenho escolar, seja no envolvimento dos alunos com a atividade.

A motivao para aprender no algo inato ao aluno. Ela pode ser desenvolvida

por meio da experincia e da socializao, por influncia da famlia e da escola. A motivao do aluno para aprender uma competncia adquirida desenvolvida atravs da experincia geral, mas estimulada mais diretamente atravs de modelagem, comunicao das expectativas e direta instruo ou socializao dos outros (especialmente dos pais e professores). Se ativada em situaes particulares de aprendizagem, a motivao para aprender funciona como um esquema ou script que inclui no somente elementos afetivos, mas tambm elementos cognitivos tais como as metas e estratgias associadas para realizar a aprendizagem pretendida. De acordo com essa viso, os professores no so meramente reatores para quaisquer padres motivacionais, que seus alunos tenham desenvolvido antes de entrar em suas salas de aula, mas so agentes de socializao ativos, capazes de simular o desenvolvimento geral da motivao do aluno para aprender e sua ativao em situaes especficas4 (BROPHY, 1987, p. 40 traduo nossa).

Segundo Linnenbrink e Pintrich (2002), a motivao um fenmeno dinmico,

multifacetado e, por esse motivo, ampliam-se as maneiras nas quais e pelas quais ela

atua, ou seja, consideram-se mais os aspectos qualitativos da motivao, contrastando 4Original: Student motivation to learn is an acquired competence developed through general experience but simulated most directly through modeling, communication of expectations and direct instruction or socialization by others (especially parents and teachers). If activated in particular learning situations, motivation to learn functions as a scheme or script that includes not only affective elements but also cognitive elements such as goals and associated strategies for accomplishing the intended learning. According to this view, teachers are not merely reactors to whatever motivational patterns their students had developed before entering their classrooms but rather are active socialization agents capable of simulating the general development of student motivation to learn and its activation in particular situations.

20

com a viso quantitativa tomada pelos modelos tradicionais. Dessa forma, os alunos

podem ser motivados de vrias maneiras, e a questo importante compreender como e

por que os alunos so motivados para a aprendizagem. Essa mudana de foco implica

que professores no podem generalizar a rotulao dos alunos como motivados ou

desmotivados.

Outra conjectura importante, apontada pelos autores, que motivao no uma

caracterstica estvel de um indivduo, mas, sim, situada, contextual e de um domnio

especfico. Isto , a motivao dos alunos pode variar em funo do contexto da escola

ou, mais especificamente, da sala de aula.

Quando tratamos do contexto especfico da sala de aula, Bzuneck (2009a) relata

que a motivao especfica para esse ambiente difere daquela relacionada a outros

contextos, como, por exemplo, para praticar um esporte ou desempenhar uma atividade

de lazer. Na escola, as atividades so revestidas de um carter obrigatrio, h

necessidade de concentrao, raciocnio, desenvolvimento de atividades abstratas que,

muitas vezes, no so interessantes para quem aprende, e so realizadas.

Apesar das diversas abordagens e teorias do tema motivao no mbito

educacional, os estudiosos dessa rea concordam em um ponto: a motivao

fundamental para o processo de aprendizagem. Para Bzuneck (2009a, p. 13):

A motivao tornou-se um problema de ponta em educao, pela simples constatao de que, em paridade de outras condies, sua ausncia representa queda de investimento pessoal de qualidade nas tarefas de aprendizagem. Alunos desmotivados estudam pouco ou nada e, consequentemente, aprendem muito pouco. Em ltima instncia, a se configura uma situao educacional que impede a formao de indivduos mais competentes para exercerem a cidadania e realizarem-se como pessoas, alm de se capacitarem a aprender pela vida afora.

Algumas vezes, os professores associam a desmotivao falta de interesse.

Alunos desinteressados no prestam ateno s aulas, no se envolvem nas atividades, e

podem, consequentemente, promover atritos na sala de aula, seja com o professor ou at

mesmo com os demais colegas. Mas tal associao pode no corresponder aos fatos de

forma generalizada, uma vez que um aluno supostamente envolvido na atividade, bem-

comportado na sala de aula, pode no estar motivado para a aprendizagem. Certos comportamentos desejveis na sala de aula e at um desempenho escolar satisfatrio podem mascarar srios problemas motivacionais, enquanto que um mau rendimento em classe pode, s vezes, no ser causado simplesmente por falta de esforo, ou seja, por desmotivao (BZUNECK, 2009a, p. 14).

21

A motivao no pode ser ensinada, nem treinada como se fosse um

conhecimento, mas pode ser objeto de socializao (BZUNECK, 2004). Existem

estratgias de ensino que podem, de certa forma, incrementar, orientar a motivao do

aluno ou at mesmo prejudic-la. Sendo assim, a motivao no apenas influencia o

processo de aprendizagem, mas ela prpria resultante de processos de interao social.

Por isso, importante que o professor tenha cautela com certas crenas errneas e

atitudes negativas, para no colocar em risco seu trabalho de socializao para uma

motivao positiva de seus alunos (BZUNECK, 2004).

Brophy (1999, p.13 apud BZUNECK, 2010, p.15) sintetiza com preciso o que

realmente deve ser buscado na escola pelos professores.

Um objetivo motivacional vivel dos professores para o dia a dia das classes buscar o desenvolvimento e a manuteno da motivao para aprender com as atividades acadmicas. Isto , devem fazer com que os alunos considerem tais atividades significativas e merecedoras de envolvimento, buscando obter os benefcios de aprendizagem, achem ou no interessantes tais atividades ou prazerosos os processos.

Bzuneck (2010) apresenta uma seleo de estratgias de ensino mais

relevantes, em quatro grupos, para uso de todo professor interessado em desenvolver ou

manter seus alunos mais motivados. So eles:

O significado e a relevncia da tarefa;

Caractersticas motivadoras inerentes a essas atividades;

O complemento com o uso de embelezamentos;

Reaes dos professores s tarefas cumpridas e avaliadas.

Para que o aluno se sinta motivado, essencial que ele perceba a importncia na

atividade prescrita pelo professor. Sabemos que hoje, mediante tantas distraes como

celulares, esportes, lazer, e tambm, em muitos casos, com a omisso da famlia quanto

vida escolar de seus filhos, as tarefas da escola no parecem to valiosas para os

alunos. Uma tarefa vista como irrelevante no tem o poder de despertar motivao, mas,

sim, de provocar tdio ou indiferena (BZUNECK, 2010).

Para que o aluno acredite na importncia do contedo e das atividades

acadmicas de seu currculo, o professor deve capitalizar seus interesses e valores

pessoais, embora essa tarefa no seja fcil, devido diversidade de interesses presentes

em uma sala de aula. Segundo Eccles e Wigfield (2002), uma tarefa pode adquirir

significado para o aluno, se ela for vista como algo que o far alcanar algum objetivo.

Essa estratgia motivacional consiste em mostrar ao aluno o valor instrumental da

22

atividade proposta. Por exemplo, estudar Matemtica para cursar engenharia, ser um

bom comerciante.

Seguindo essa mesma linha de demonstrao do valor instrumental das tarefas,

uma forma de argumentao consiste em demonstrar que os conhecimentos adquiridos

so pr-requisitos para outros que viro posteriormente, e que so de interesse do aluno.

Porm, no aconselhvel esperar que a utilizao de estratgias motivacionais ligadas

instrumentalidade das tarefas resolva todos os problemas voltados ao desinteresse dos

alunos. Essa estratgia representa apenas parte do quebra-cabeas que a motivao.

Sempre oportuno buscar e usar outras estratgias (BZUNECK, 2010).

Outro fator motivacional fundamental no convencimento dos alunos a crena

do professor na importncia da prpria disciplina. Tal valorizao transparece na

dedicao, no entusiasmo e na vitalidade com que trata os assuntos referentes

disciplina, contagiando afetivamente seus alunos.

Uma sugesto para motivar os alunos proporcionar-lhes tarefas estimulantes,

que tenham caractersticas de desafios. O desafio deve ser percebido pelo aluno como

algo acessvel, deve atender o seu nvel de desenvolvimento cognitivo e a srie escolar

que frequenta. No deve ser fcil demais, para no causar tdio, e nem difcil demais,

para evitar frustrao. Os desafios considerados como difceis, mas acessveis, so um

incentivo para o esforo, uma vez que o carter motivacional exercita a mente. Todo

desafio encerra o enfrentamento de erros e fracassos. No devemos passar a mensagem

de que preciso acertar sempre da primeira vez, e de que os alunos devem ser poupados

do erro, facilitando as tarefas. A escola deve trabalhar a cultura de que o erro, alm de

algo normal, uma oportunidade de aprendizagem (BZUNECK, 2010).

Para trabalhar com desafios em classes heterogneas, Bzuneck (2010), com base

nos estudos de Stipek (1998), prope as seguintes estratgias para promoo da

motivao intrnseca5: oferecer tarefas com diferentes nveis de dificuldade, para que

todos os alunos da classe tenham desafios com chances reais de acerto; dar atividades

suplementares de enriquecimento; permitir que os alunos escolham o tipo de tarefa;

permitir que os alunos sigam seu prprio ritmo, de modo que todos tenham

oportunidade de concluir suas tarefas, e alterar trabalhos individuais com trabalhos

coletivos. Outra estratgia eficaz consiste no fornecimento de ajuda a determinados

alunos. Ao ajudar individualmente um aluno, na realizao de uma atividade

5Tipo de motivao onde o comportamento motivado pela atividade em si, ou seja, pela satisfao a ela inerente (BZUNECK e GUIMARES, 2010, p.44).

23

desafiadora, o professor ou at mesmo outro colega explora o conhecimento potencial

desse aluno, permitindo seu xito na realizao da atividade.

As estratgias de ensino que contribuem para melhor envolvimento dos alunos

nas atividades tm sido adotadas na literatura como embelezamentos motivacionais

(BZUNECK, 2010), e servem para provocar interesse de aprendizagem, e suavizar o

tdio e a obrigatoriedade no desenvolvimento das tarefas. Com base na literatura

contempornea sobre interesse, Bzuneck (2010, p. 23) denomina interesse situacional

como aquele que despertado por eventos, objetos ou outras pessoas. Na escola, esse

tipo de interesse resulta de determinadas modalidades de ensino que esto sob controle e

disposio do professor. Bzuneck apresenta alguns exemplos de embelezamentos

motivacionais, segundo listagem de Begin (1999). So eles: manipulao de objetos e

movimentos fsicos; conflitos cognitivos; introduo de novidades; relao com

comestveis; interao com amigo no grupo, autor explcito nas narrativas escritas;

modelao; jogos; fantasia; humor e apresentao de casos ilustrativos.

Embora seja intuitiva a eficcia dos embelezamentos motivacionais, alguns

autores pedem cautela no seu uso e sugerem tambm que sejam consideradas algumas

limitaes ligadas a suas configuraes.

Primeiramente, deve-se considerar que os embelezamentos motivacionais

provocam desequilbrio cognitivo, pois excitam a curiosidade e o interesse, porm no

conseguem manter essa virtude com o passar do tempo. Em segundo lugar, os

embelezamentos podem no ser bem acolhidos por alunos j motivados. E por ltimo,

pode-se considerar que os embelezamentos no garantem um trabalho mental de

profundidade, o que pode impossibilitar uma aprendizagem de qualidade. Um

embelezamento deve ser aplicado para estimular uma atividade desafiadora, visando ao

desenvolvimento cognitivo do aluno, e no apenas para provocar interesse, divertimento

(BZUNECK, 2010).

medida que os alunos forem concluindo a tarefa prescrita, cabe ao professor

dar-lhes o feedback que informao da adequao e qualidade do trabalho

(BZUNECK, 2010, p. 29). O feedback afeta tanto a aprendizagem quanto a motivao.

Com relao motivao, geralmente, est ligada s suas duas formas bsicas: feedback

positivo ou confirmatrio, dado ao indivduo quando a tarefa foi cumprida

corretamente, e feedback negativo ou corretivo, quando houve erro no desenvolvimento

da tarefa. As verbalizaes realizadas pelo professor, durante a efetuao do feedback,

so de suma importncia para a motivao do aluno.

24

Bzuneck (2010), citando Weiner (1984; 2000), sugere que todo professor, ao

identificar um erro ou fracasso do aluno, atribui uma crena quanto ao que causou esse

erro ou fracasso. Se esse erro for atribudo falta de capacidade, o aluno se sentir

incapaz. Logo, esse tipo de retorno no deve fazer parte das prticas motivacionais

dos professores. Os erros podem ser benficos para o processo de aprendizagem,

dependendo de como forem tratados. No feedback corretivo, o professor deve levar o

aluno a perceber que h algo incorreto em sua soluo e encoraj-lo a rever as

estratgias utilizadas para o desenvolvimento da tarefa; deve-se tambm considerar se o

aluno detm os conhecimentos prvios necessrios para que o erro possa ser superado.

Quando um aluno atingir um objetivo de aprendizagem, o fato deve ser

reconhecido num retorno confirmatrio. Isso pode acontecer por meio de um feedback

positivo simples, que consiste numa forma de reconhecimento que confirma uma

resposta ou comportamento adequado, ou atravs do elogio que se segue a um

comportamento, como um reforo positivo (BZUNECK, 2010).

Devem ser observadas algumas regras para o uso do elogio de forma eficaz: o

elogio deve fazer referncia ao esforo e persistncia constatados, e no a situaes de

sorte; deve considerar as etapas do processo, e no apenas o produto final; no se deve

elogiar a capacidade ou inteligncia; o elogio deve ser sincero, e muito importante

quando dado em funo de um progresso verificado (BZUNECK, 2010).

Ainda no que se refere a estratgias motivacionais, Alonso-Tapia (2005) prope

uma alterao na estrutura dos padres de ensino, com base em trs grandes momentos

da aprendizagem, apresentados a seguir.

1: No incio das atividades de aprendizagem: momento em que os professores devem

ativar a inteno de aprendizagem, despertando a curiosidade nos alunos pelo que vai

ensinar, com o objetivo de ajud-los a relacionar o que j sabem com o que deve ser

aprendido, e mostrar-lhes a relevncia da tarefa.

2: Durante o desenvolvimento das atividades presenciais (na sala de aula) ou no

presenciais (em casa): momento em que os professores devem conseguir que a ateno

dos alunos se mantenha focada sobre o processo e o progresso da aprendizagem.

Podemos citar algumas estratgias como: no comparar os alunos, pedir razes para

respostas incorretas, sugerir a diviso da tarefa em passos, modelar o uso dos processos

de pensamento, tornando-os explcitos, orientar a busca de meios para superar as

dificuldades, utilizar recompensas de forma apropriada, mostrar os erros como

oportunidades de aprendizagem, propor tarefas que impliquem cooperao. Dentre essas

25

estratgias, destacamos que o professor deve ficar atento, ao trabalhar com a diviso da

tarefa em passos, para no automatizar procedimentos que ainda no foram

compreendidos pelos alunos, ou mesmo reduzir a capacidade de compreenso global da

tarefa.

3: Durante todo o processo de ensino e aprendizagem, ou ao final do mesmo, naqueles

momentos em que as realizaes dos alunos so avaliadas: incluir tarefas com nveis de

dificuldade variados, para possibilitar a todos as chances de xito, evitar possveis

comparaes entre os alunos, dar informao de como superar o erro.

As estratgias de ensino aqui apresentadas tm como foco a relao professor-

aluno, considerando o aluno como protagonista de sua aprendizagem. Sabemos que os

desafios so muitos e que qualquer tentativa com a finalidade de melhorar o processo de

ensino e aprendizagem, sobretudo promovendo a autonomia e a motivao para

aprender, demanda esforos de toda a comunidade escolar.

1.1.2. Como avaliar a motivao para aprender

Alm da importncia da motivao para aprender no ambiente escolar, interessa-

nos saber como ela se manifesta, isto , como podemos perceb-la nas pessoas. Mayer,

Faber e Xu (2007, apud GUIMARES, BZUNECK, BORUCHOVITCH, 2010)

consideram que, em qualquer rea da psicologia, fundamental a mensurao dos

conceitos que se queira estudar. Para esses autores, a mensurao estabelece tanto os

limites sobre o que deve ser pesquisado, quanto o desenvolvimento da rea, ao refletir

conhecimento sobre determinado assunto. No caso brasileiro, nossos pesquisadores

sobre motivao escolar tm acompanhado estudiosos de outros pases na preocupao

com rigor cientfico, na adoo de referenciais tericos, no desenvolvimento

metodolgico, bem como no delineamento da pesquisa.

A motivao na sala de aula capaz de produzir efeitos tanto imediatos quanto

finais. Os efeitos imediatos referem-se motivao no que diz respeito a um

engajamento que pode ser determinado, conforme Reeve et al. (2004), como um

constructo capaz de revelar intensidade comportamental e qualidade emocional de uma

pessoa na participao de determinada tarefa. O aluno, por meio do engajamento,

capaz de aplicar esforo no processo de aprender e manter a persistncia, mesmo diante

dos obstculos (ALMEIDA, 2013).

Para Reeve (2011), existem duas maneiras de inferir a motivao em outra

pessoa. A primeira delas observar as manifestaes comportamentais da motivao, e

26

a segunda observar atentamente os antecedentes que, segundo se sabe, conduzem os

estados emocionais. Porm, nem sempre possvel conhecer esses antecedentes. s

vezes, necessrio inferir a motivao a partir das expresses do indivduo, das suas

atitudes, de seu autorrelato.

Entre os diversos procedimentos utilizados para avaliar a motivao para

aprender, Guimares, Bzuneck, Boruchovitch (2010) nos apontam a observao e

registro dos comportamentos e os relatos de observaes feitos por terceiros. De acordo

com esse mtodo, podemos inferir sobre os processos motivacionais implcitos. Porm,

a observao a partir do relato de outras pessoas pode levar a alguma distoro dos

dados observados. Como alternativa, usa-se aferir os estados motivacionais do aluno por

meio do autorrelato.

Para esses autores, avaliar os estgios emocionais fazendo uso dos autorrelatos

dos alunos vantajoso, porque permite caracterizar os eventos internos e do ambiente

por intermdio dos prprios participantes e evita a perda de informao, o que poderia

acontecer, caso os dados fossem coletados por meio de observadores.

O autorrelato tem sido o mtodo mais utilizado, tanto em pesquisas qualitativas,

como nas quantitativas. Est presente nos estudos de caso, nas entrevistas e nos

questionrios abertos. tambm um componente muito importante nas escalas de

mensurao ou questionrios tipo Likert, tpicos das pesquisas quantitativas.

caracterstica das escalas de mensurao a apresentao de itens ou questes, que so

pistas que servem para ativar representaes cognitivas ou de conhecimento

armazenado. O sujeito ir responder cada item marcando o grau com o qual concorda,

que julgar verdadeiro ou com que frequncia ocorre um dado comportamento, etc

(GUIMARES, BZUNECK, BORUCHOVITCH, 2010).

Avaliar a motivao para aprender algo desafiador, do ponto de vista

metodolgico, pois se trata de um constructo subjetivo, que pode se tornar observvel

pelos comportamentos externados, pelas verbalizaes e relatos dos participantes.

1.1.3. Breve levantamento das pesquisas brasileiras relacionadas motivao para aprender Matemtica

Devido importncia da motivao para aprender no contexto escolar e ao nosso

interesse em compreender os estudantes e o que os move nas aulas de Matemtica,

procuramos identificar o que j havia sido produzido sobre o tema em nosso pas.

Apresentamos aqui o resultado de um levantamento terico realizado no Banco de Teses

27

e Peridicos da Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

(CAPES), na Biblioteca Digital do Domnio Pblico, e na Biblioteca Digital Brasileira

de Teses e Dissertaes, cujo foco foram os estudos desenvolvidos no Brasil sobre

motivao para aprender Matemtica no contexto escolar. A partir desse levantamento,

buscamos uma compreenso mais ampla desse campo de pesquisa, bem como conhecer

as reas de concentrao desses estudos, os caminhos traados na realizao dessas

pesquisas e os seus resultados. Foram priorizadas as pesquisas que, em alguma medida,

envolvem a motivao para aprender Matemtica.

O levantamento foi realizado entre os dias 29 de fevereiro e 19 de maro de

2016, no Banco de Teses e peridicos da CAPES, na Biblioteca Digital do Domnio

Pblico, e na Biblioteca Brasileira de Dissertaes e Teses. A princpio, recorreramos

apenas ao Banco de Teses da Capes, mas, devido desatualizao do mesmo,

procuramos outras fontes.

O portal do Domnio Pblico, lanado em 2004, de iniciativa do Ministrio da

Educao e contm 198.122 arquivos em diferentes tipos de mdia (textos, sons, vdeos

e imagens). A Biblioteca Digital Brasileira de Dissertaes e Teses composta por 122

instituies de ensino superior dos setores pblico e privado, onde esto cadastradas

97.001 teses e 261.481 dissertaes.

Para selecionar os documentos a serem investigados, buscamos a palavra-chave

motivao, nos ttulos de teses e dissertaes defendidas no pas, entre 2000 e 2016.

Foram encontrados 92 arquivos no Domnio Pblico, 76 no Banco de Teses da Capes,

206 no Portal de Peridicos Capes e 264 na Biblioteca Digital de Dissertaes e Teses.

A partir das informaes contidas nos resumos encontrados, refinamos a busca,

utilizando os seguintes critrios: (a) pesquisa realizada ou referente ao contexto escolar,

e (b) pesquisa na qual os sujeitos so estudantes. Por fim, aplicamos um terceiro filtro,

buscando pesquisas que tratam da motivao para aprender Matemtica. A esse grupo

demos maior destaque.

Os dados coletados foram organizados em uma tabela, contendo: autor, nvel,

instituio, ano, tipo do programa de ps-graduao, regio, rea com a qual se

relaciona a motivao, propsito da pesquisa, metodologia utilizada, resultados e

referenciais tericos adotados.

Adotamos uma perspectiva qualitativa para a anlise dos dados, dessa forma,

mais que quantificar a frequncia de determinados termos ou ideias, procuramos

28

conhecer o que tem sido produzido no pas sobre motivao para aprender Matemtica,

a partir dos tpicos destacados anteriormente.

Localizamos 89 pesquisas sobre motivao para aprendizagem no contexto

escolar, cujos sujeitos so os alunos. Destas, 12 so teses de doutorado e 77 so

dissertaes de mestrado. O tema parece atrair pesquisadores de todo o Brasil, uma vez

que essas pesquisas se distribuem por todas as regies.

Com relao ao perodo em que foram desenvolvidas as pesquisas, constatamos

que a maior produo de teses e dissertaes sobre motivao relacionada

aprendizagem concentrou-se no ano de 2009.

Desse conjunto de pesquisas, a maioria aborda a motivao para aprender em

reas distintas da Matemtica. Nove estudos tratam da motivao para aprender

Matemtica, porm, quatro deles tm como foco o papel da criatividade na motivao

para aprender. Dessa forma, apenas cinco pesquisas investigam especificamente a

motivao para aprender Matemtica. A seguir, passamos apresentao de cada um

desses estudos cronologicamente.

Parellada (2009) pesquisou as relaes entre o uso do computador, a motivao e

o aprendizado de Matemtica de estudantes de 5 srie do Ensino Fundamental (atual 6

ano) de uma escola pblica de Londrina (PR). O estudo fundamentou-se nas teorias da

autodeterminao, abordagem sociocognitivista da motivao humana, e no

construcionismo, destacando-se os autores Deci, Reeve, Ryan, Piaget e Papert. A

pesquisa adotou a abordagem quase experimental, ou seja, os experimentos foram

realizados em situaes naturais. A seleo da escola para a realizao da pesquisa

obedeceu a alguns critrios: (a) ser pblica; (b) ter duas ou trs turmas de quinta srie;

(c) ter laboratrio de informtica disponvel para pesquisa. Participaram desse estudo

100 alunos, separados em um grupo experimental composto por 10 alunos, e um grupo

de controle, denominado grupo de controle 1, tambm composto por 10 alunos. Ambos

foram submetidos a estratgias diferenciadas de ensino e aprendizagem, utilizando-se o

computador. Os outros 80 alunos integraram o grupo de controle 2, que no

desenvolveu atividades com computadores, mas responderam ao instrumento de

avaliao, como parmetro de comparao.

Os alunos foram submetidos a um pr-teste e a um ps-teste, aps interveno

com estratgias diferenciadas, usando o computador para a aprendizagem de

Matemtica. O teste com contedos matemticos foi analisado de modo quantitativo, e a

motivao dos alunos foi quantificada tendo como referncia seu desempenho no teste

29

denominado Escala de Avaliao da Motivao de Estudantes do Ensino Fundamental.

Os resultados indicaram um ganho na qualidade motivacional dos alunos do grupo

experimental, quando comparados com o grupo de controle 2, o que implicou

diretamente o nvel de engajamento dos alunos nas tarefas acadmicas. No que se refere

avaliao do conhecimento dos alunos sobre os contedos apresentados, foi observada

uma evoluo positiva, tanto no grupo experimental, quanto no grupo de controle 1.

Torisu (2010) investigou as contribuies de um acompanhamento sistemtico,

extraclasse, para o fortalecimento de crenas de autoeficcia6 e da motivao para

Matemtica de alunos do 9 ano do Ensino Fundamental de uma escola pblica de Ouro

Branco (MG). A pesquisa baseou-se na Teoria Social Cognitiva de Albert Bandura. Ao

longo de quatro meses, doze alunos participaram de encontros extraclasses semanais,

nos quais os contedos estudados na escola eram abordados de forma criativa. Os dados

foram coletados por meio de questionrios, gravao em udio, entrevistas realizadas

com o professor de Matemtica dos alunos participantes, observao, dirio de campo,

registros produzidos pelos alunos durante os encontros, e documentos escolares dos

participantes. Uma anlise qualitativa dos mesmos evidenciou que o acompanhamento

extraclasse contribuiu para a incrementao das crenas de autoeficcia e do nvel de

motivao dos alunos para aprender. Alm disso, corroborou-se a ideia de que a

experincia de xito e a persuaso verbal podem se constituir em poderosas ferramentas

de autoeficcia, bem como de que as escolhas do professor podem contribuir ou

dificultar a construo de uma relao positiva do aluno com relao Matemtica,

sendo fundamental um repensar sobre sua formao.

Garabini (2011) investigou como a utilizao de materiais manipulativos, a

observao e a construo de objetos do cotidiano influenciam a motivao para

aprender os conceitos de rea de polgonos e o volume de prismas, em um grupo de

alunos do 9 ano do Ensino Fundamental de uma escola pblica de Belo Horizonte

(MG). A pesquisa de cunho qualitativo, fundamentada nos estudos de Bzuneck, Brophy,

Boekarts e Boruchovitch, envolveu 18 alunos, sendo a maioria deles com baixo

rendimento em Matemtica. A pesquisa aconteceu em duas etapas: na primeira, foram

realizados 12 encontros com os alunos em um projeto e, na segunda, os alunos

6Autoeficcia um constructo central da teoria social cognitiva, entendida por Bandura (1997) como a crena do indivduo em sua capacidade em organizar e executar cursos de ao requeridos para realizao de uma tarefa (POLYDORO e AZZI, 2009, p.77).

30

participantes do projeto foram convidados a atuar como monitores nas aulas regulares

de Matemtica. Foram analisados em profundidade os casos de quatro alunos.

A coleta de dados se deu por meio de filmagens dos encontros, dirio de campo,

entrevistas, relatrio das atividades desenvolvido pelos alunos, pr-testes e ps-testes,

questionrio e avaliao por meio de prova. Os resultados evidenciaram que o papel do

professor importante no apenas na implementao de prticas pedaggicas

diferenciadas para motivar os alunos, mas, tambm, na ateno individualizada

oferecida a cada um deles. Conforme a pesquisadora apresenta, a utilizao dos

materiais manipulativos desperta o interesse e a curiosidade em vrios momentos,

desafiando os alunos a descobrir a Matemtica do cotidiano (GARABINI, 2011, p. 7).

Zukauskas (2012) investigou a motivao dos estudantes para aprender

contedos de Geometria, a partir de atividade de construo de embalagens. Seu

trabalho fundamentou-se principalmente nas concepes dos seguintes autores:

Bzuneck, Alonso-Tapia e Fita, Biembengut, Bassanezzi, Maslow. A pesquisa envolveu

15 alunos do 6 ano do Ensino Fundamental de uma escola pblica de Porto Alegre

(RS), teve uma abordagem qualitativa, tratando-se de um estudo de caso. Os

instrumentos de coleta de dados utilizados foram avaliaes, dirio de campo e duas

entrevistas (a primeira, coletiva e aberta, e a segunda, individual e fechada). A

abordagem metodolgica foi organizada em trs etapas: mapa terico, mapa de campo e

mapa de anlise. Durante o mapa de campo, foi desenvolvido um projeto com 11

encontros extraclasse, envolvendo as fases da modelao: percepo e apreenso;

compreenso e explicao; e representao e modelao para estudar Geometria por

meio de embalagens. Os resultados indicaram que a atividade extraclasse favoreceu a

aprendizagem de contedos de Geometria, assim como possibilitou que fossem

identificados momentos de motivao e de desmotivao dos estudantes, durante o

desenvolvimento das atividades.

Melin (2013) investigou se existiam mudanas em relao s orientaes, metas

e percepo de acolhimento na transio dos alunos do Fundamental I (5 ano) para o

Fundamental II (6 ano). A pesquisa, de natureza exploratria com abordagem

transversal, fundamentou-se na teoria de metas de realizao e na noo de senso de

pertencimento. A coleta de dados se deu por meio da aplicao de um questionrio,

composto por 24 itens em escala Likert, a 226 alunos dos 5 e 6 anos de uma escola

pblica localizada em Londrina (PR). Os dados obtidos foram submetidos anlise

fatorial e a anlises de varincia. Os resultados indicaram que no houve diferenas

31

significativas entre meninos e meninas na percepo de acolhimento e meta de

realizao/evitao de trabalho. Porm foi identificado que as meninas adotam em

maior grau a meta de realizao do que os meninos. Quanto percepo de acolhimento

e meta de aprender, os alunos do 5 ano apresentaram escores mais altos que os do 6

ano, isto , sentem-se mais acolhidos pelos professores da disciplina de Matemtica;

enquanto os alunos do 6 ano apresentam metas de evitao de trabalho

significativamente mais altas que os do 5 ano.

Analisando a produo sobre motivao para aprender no contexto escolar,

observamos que a maioria desses estudos (29) se concentra na motivao para aprender

uma lngua estrangeira. Tambm verificamos que a regio Sudeste concentra a maior

parte das pesquisas (40).

O presente levantamento corroborou os resultados encontrados por Boruchovitch

e Bzuneck (2010): ainda h pesquisas que se limitam a explorar a presena e o grau da

motivao dos alunos, porm, j podemos observar estudos que buscam relacionar esses

resultados a fatores de ordem qualitativa. Autores de alguns estudos limitaram-se a explorar a presena e o grau de motivao ou de desmotivao na escola, em particular entre crianas e adolescentes, o que representa uma contribuio inicial vlida para o conhecimento na rea. (...). Entretanto, a maior parte das pesquisas brasileiras na rea j tem trabalhado com constructos motivacionais especficos e muitos deles se ativeram a algum referencial terico para identificar nos alunos no apenas a presena da motivao, mas seus aspectos qualitativos e sua relao com outras variveis intrapessoais ou de contexto (BORUCHOVITCH e BZUNECK, 2010 p. 232).

Do total de estudos analisados, apenas cinco tinham como foco a motivao para

aprender Matemtica. Desses, a maioria foi desenvolvida na regio Sul. Todos so

pesquisas de mestrado. Dois trabalhos abordam o contedo matemtico especfico de

Geometria Espacial (GARABINI, 2011; ZUKAUSKAS, 2012). Outros dois investigam

uma sequncia de atividades envolvendo diversos contedos matemticos

(PARELLADA, 2009 e TORISU, 2010).

Dentre os estudos analisados, percebemos que aqueles que utilizaram a teoria da

autodeterminao e metas de realizao, respectivamente, Melin (2013) e Parellada

(2009), realizaram uma abordagem quantitativa para a anlise dos dados. Os demais

analisaram os dados qualitativamente. As pesquisas de Garabini (2011), Parellada

(2009), Torisu (2010) e Zukauskas (2012) tm um carter de interveno, na medida em

que propem e, em alguns casos, realizam mudanas na prtica pedaggica feita no

32

trabalho de campo7. Todos os estudos analisados apontam a importncia do papel do

professor na motivao do aluno para a aprendizagem.

1.2. Autorregulao da aprendizagem

Estar motivado para aprender implica promoo de estratgias de metacognio8

e autorregulao nos alunos. O que mostra a importncia dos processos motivacionais,

sem desconsiderar os cognitivos, na produo de uma aprendizagem com significados

(POCINHO, CANAVARRO, 2009). Nesse contexto, torna-se necessrio que os alunos

sejam capazes de administrar a prpria aprendizagem, traando seus objetivos,

definindo seu plano de trabalho e avaliando o desempenho empregado para a realizao

da tarefa.

Como nos aponta Zimmerman (2010), os alunos autorregulados so proativos,

procuram informaes, buscam estratgias para obter sucesso. E, talvez, o mais

importante, eles reconhecem as habilidades que possuem e conseguem empreg-las,

visando ao sucesso acadmico.

Neste tpico, exploramos a aprendizagem autorregulada e sua relao com a

motivao e com a formao docente.

1.2.1. Autorregulao da aprendizagem: origem e conceitos

A pesquisa sobre autorregulao da aprendizagem acadmica emergiu para

responder pergunta de como o aluno tornava-se dono de seu processo de

aprendizagem. A autorregulao, ao contrrio das medidas de capacidade mental,

refere-se aos processos de autocrenas, auto-orientao que permitem aos alunos

transformarem suas habilidades mentais em habilidades de desempenho acadmico,

admitindo o estabelecimento de metas, seleo e aplicao de estratgias e

automonitoramento da eficcia (ZIMMERMAN, 2008).

Os estudos sobre a autorregulao da aprendizagem ganharam destaque a partir

da dcada de 1980 e, inicialmente, enfatizaram as estratgias de aprendizagem. Porm,

nos ltimos anos, pode-se perceber uma preocupao crescente com fatores afetivos e

motivacionais, como emoes, autoeficcia, autoavaliao, dentro deste processo,

promovendo um estudo mais amplo e integrado (BORUCHOVITCH, 2014).

7Melin (2013) analisou estatisticamente dados coletados por meio de um questionrio. 8Neste trabalho, entendemos metacognio como a autoconscincia dos processos cognitivos e a habilidade de control-los (FLAVELL, 1979 apud BORUCHOVITCH, 2014. p. 403).

33

Um momento muito importante para a pesquisa no campo da autorregulao da

aprendizagem foi o Simpsio da Associao Americana de Pesquisa Educacional, em

1986, onde foi publicada uma edio especial da Contemporary Educational

Psychology. Esse trabalho reuniu, sob uma mesma tica, estudos de vrios

pesquisadores, como Monique Boekaerts, Lyn Corno, Steve Graham, Karen Harris,

Mary McCaslin, Barbara McCombs, Judith Meece, Richard Newman, Scott Paris, Paul

Pintrich, Dale Schunk, que abordavam temticas diferentes, como, por exemplo,

estratgias de aprendizagem, percepo de autoconceito, autocontrole e estratgias

volitivas. Segundo Zimmerman (2008), um resultado relevante do simpsio foi a

definio do constructo autorregulao da aprendizagem como o grau com que os

alunos participam do seu processo de aprendizagem, considerando sua motivao, seu

comportamento e sua metacognio.

Do ano de 1980 at os dias atuais, a autorregulao da aprendizagem vem sendo

objeto de estudo em muitas investigaes. Diversos pesquisadores tm trabalhado nessa

rea e construdo definies e caracterizaes acerca desse tema. No quadro 01,

apresentamos algumas delas.

Quadro 01 Algumas definies e caracterizaes sobre a autorregulao da aprendizagem

Autor Definio Panadero e Alonso-Tapia (2014)

A autorregulao pode ser definida como o controle que o aluno exerce sobre seus pensamentos, emoes, aes e motivaes para alcanar os objetivos estabelecidos9 (PANADERO E ALONSO-TAPIA, 2014, p.451 traduo nossa). O controle de pensamento apresentado na definio refere-se ao componente cognitivo da autorregulao, chamado de metacognio, que tem por base o domnio estratgico dos processos cognitivos. O controle das aes e das emoes implica o domnio da conduta para alcanar os objetivos traados. E o controle da motivao implica a vontade/empenho para iniciar uma tarefa e para manter o interesse e concentrao durante o desenvolvimento da mesma. J os objetivos referem-se a trs grandes orientaes motivacionais: aprendizagem, resultado e evitao.

Azzi e Polydoro (2009) A autorregulao um processo consciente e voluntrio de governo que possibilita a gerncia dos prprios comportamentos, pensamentos e sentimentos, voltados e adaptados para obteno de metas pessoais e guiados por padres gerias de conduta (BANDURA, 1991, AZZI E POLYDORO, 2008, ZIMMERMAN, 2000 apud AZZI E POLYDORO, 2009, p. 75). O processo de autorregulao opera por meio de trs subfunes: a auto-

9Original: La autorregulacin La definimos como el control que el sujeito realiza sobre sus pensamientos, acciones, emociones y motivacin a travs de estratgias personales para alcanzar los objetivos que h establecido.

34

observao, que permite ao indivduo identificar o prprio comportamento, as condies em que ele ocorre e seus efeitos; julgamento, na qual aes e escolhas so avaliadas considerando o prprio comportamento, as circunstncias em que ocorre, as referncias pessoais e as normas sociais; e a autorreao, que representa a mudana autodirigida no curso da ao, com base em consequncias autoadministrativas. As trs subfunes ocorrem de forma integrada e atuam em interao com o ambiente.

Rosrio, Nez e Gonzlez-Pienda (2006)

(...) refere-se a pensamentos, sentimentos e aes que so planejadas e adaptadas, quando necessrio, para incrementar a motivao e a aprendizagem (SCHUNK, 1994; ZIMMERMAN 2000 apud ROSRIO, NEZ e GONZLEZ-PIENDA, 2006, p. 16). Quando aplicado ao campo da educao, a autorregulao apresenta um leque de estratgias como: o estabelecimento de objetivos; a ateno e concentrao na instruo, utilizando estratgias de codificao, organizao da informao aprendida; a construo de um ambiente de trabalho favorvel ao rendimento escolar; a gesto do tempo disponvel e a procura da ajuda necessria junto a colegas e familiares, entre outros.

Kremer-Hayon e Tillema (1999)

A autorregulao refere-se conscincia e ao conhecimento que o indivduo tem sobre seu processo de aprendizagem. Esse constructo tambm alude cognio e seu controle, uma vez que essa habilidade fundamental para o desenvolvimento da aprendizagem.

Zimmerman (2008) Refere-se aos processos de auto-orientao e autocrenas que permitem aos alunos transformar suas habilidades mentais, como, por exemplo, aptido verbal em uma habilidade de desempenho acadmico, como a escrita. A autorregulao da aprendizagem pode ser vista como um processo pr-ativo que permite ao aluno estabelecer metas, selecionar e implantar estratgias e monitorar a eficcia, e no apenas como um componente reativo.

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Analisando as definies, percebemos que elas apresentam mais elementos

comuns que divergentes. Como descrevem Azzi e Polydoro (2009), observamos ainda

que alguns pesquisadores, como Zimmerman, Rosrio, Nez e Gonzlez-Pienda,

compartilham da perspectiva da teoria Social Cognitiva, de Albert Bandura.

A partir dos estudos que realizamos sobre o tema, abordamos, neste trabalho, a

autorregulao da aprendizagem como o processo pelo qual o indivduo planeja, executa

e reflete sobre sua aprendizagem, considerando os aspectos sociais, motivacionais,

cognitivos, e o ambiente no qual est inserido.

Dentre os diversos modelos de autorregulao de aprendizagem existentes,

consenso que ela envolve, de modo geral, o controle dos processos de cognio, das

emoes e do pensamento (BORUCHOVITCH, 2014). Ainda, segundo os estudiosos da

rea, h convergncia quanto ao grande valor das estratgias de aprendizagem, as

variveis motivacionais e afetivas para a aprendizagem autorregulada.

35

Na presente pesquisa nos apoiamos no modelo de Zimmerman, apresentado pela

primeira vez no ano 2000. Uma breve anlise de outros modelos pode ser observada no

apndice A, p. 123. O modelo de aprendizagem autorregulada de Zimmerman baseia-se

na teoria social cognitiva de Bandura. Na perspectiva dessa teoria, a autorregulao

entendida como resultante da interao entre os aspectos comportamentais do estudante

e das variveis ambientais (BORUCHOVITCH, 2014, p. 404).

Neste modelo, existem trs tipos de autorregulao: comportamental, ambiental

e interna. A autorregulao comportamental ocorre por meio da auto-observao e dos

ajustes estratgicos dos fatores pessoais e comportamentais. J a ambiental ocorre por

meio da observao e envolve a adequao entre os fatores ambientais e

comportamentais. A autorregulao interna envolve o monitoramento e controle dos

aspectos cognitivos e afetivos dos fatores ambientais, comportamentais e pessoais

(BORUCHVITCH, 2014). Zimmerman prope trs fases cclicas para explicar seu

modelo: a fase de previso, a de controle volicional/execuo e a de controle

autorreflexivo/autorreflexo.

Figura 01: Fases e processos da autorregulao (Modelo de Zimmerman e Moylan - 2009).

Fonte: PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014, p. 452.

A fase de antecipao e previso antecede qualquer ao. Refere-se atividade

de anlise e antecipao da tarefa pelo estudante. Ela envolve o estabelecimento de

objetivos e o planejamento de estratgias para a realizao das tarefas, associados

anlise de crenas motivacionais, ou seja, motivao intrnseca, crenas de autoeficcia,

expectativas de resultado e as metas de realizao (AZZI e POLYDORO 2009).

36

Figura 02: Fases de planejamento (Modelo de Zimmerman e Moylan - 2009).

Fonte: PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014, p. 453. A fase de controle de desempenho ou volio refere-se s aes e

comportamentos reais que os alunos realizam durante o processo de aprendizagem.

Nessa fase, importante que o aluno mantenha a concentrao nas atividades e utilize

estratgias de aprendizagem adequadas para alcanar sucesso acadmico e para manter-

se motivado (PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014).

De acordo com Panadero e Alonso-Tapia (2014), os dois principais processos,

durante a fase de execuo, so a auto-observao e o autocontrole. A auto-observao

subdivide-se em outros dois processos: o automonitoramento e o autorregistro.

O automonitoramento consiste em comparar o que est sendo feito, utilizando

algum tipo de critrio que permita avaliar sua execuo, um tipo de trabalho similar

autoavaliao final do trabalho, porm, nesse contexto, a autoavaliao ocorre durante o

processo.

O autorregistro refere-se s anotaes das aes que foram utilizadas durante o

desenvolvimento da tarefa. Essa estratgia de aprendizagem ajuda no processo de

reflexo, aps o desenvolvimento da tarefa. J o autocontrole do desempenho e da

motivao implica a utilizao de uma srie de estratgias metacognitivas e

37

motivacionais como gesto de tempo, autoinstruo, construo de imagens mentais,

controle do ambiente de trabalho, para evitar elementos capazes de causar distrao, o

pedir ajuda quando necessrio e o pensar nas consequncias (PANADERO e ALONSO-

TAPIA, 2014).

Figura 03: Fase de execuo (Modelo de Zimmerman e Moylan - 2009).

Fonte: PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014, p. 456.

A autorreflexo a fase que ocorre aps o planejamento e execuo das

atividades, em que os alunos se autoavaliam quanto eficcia das estratgias utilizadas

e s metas alcanadas (BORUCHVITCH, 2014). Ao tratar das razes para justificar os

resultados obtidos, os alunos podem experimentar emoes positivas e negativas que

podem influenciar na sua motivao e em sua capacidade de autorregulao no futuro

(PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014).

38

Figura 04: Fase de autorreflexo (Modelo de Zimmerman e Moylan - 2009).

Fonte: PANADERO e ALONSO-TAPIA, 2014, p. 458.

Boruchovitch (2014), ressalta que, embora o modelo de Zimmerman apresente

as fases separadamente, elas no podem ser analisadas como eventos isolados, elas so

dinmicas e cclicas. O que nos leva a pensar na autorregulao como uma varivel em

termos de grau de um continuum.

Boruchovitch (2014) aponta que, entre os vrios modelos de autorregulao de

aprendizagem, o modelo de Zimmerman um dos mais completos, por abranger maior

nmero de variveis que possibilitam a compreenso da inter-relao entre os aspectos

afetivos, motivacionais, metacognitivos. Essa autora ainda destaca a nfase dada s

caractersticas internas dos estudantes (como motivao, comportamento, crenas, entre

outras), nas pesquisas relacionadas autorregulao. Panadero e Alonso-Tapia (2014)

tambm destacam a relevncia do modelo de Zimmerman, como base terica que

permite determinar sobre em quais aspectos intervir para melhorar a motivao dos

alunos na sala de aula.

Para compreendermos o papel da autorregulao no contexto escolar,

precisamos caracterizar os alunos autorregulados. Zimmerman, Bandura e Martinez-

Ponz (1992, p. 664 traduo nossa) reforam que os alunos autorregulados no so

diferenciveis apenas por sua orientao proativa e desempenho, mas, tambm, pelas

suas capacidades automotivadoras10. Zimmerman (2010) relata que alunos

autorregulados possuem altas crenas de autoeficcia, interesse intrnseco nas tarefas,

10 Original: Self-regulated learners are not only distinguished by their proactive orientation and performance but also by their self-motivative capabilities.

39

so persistentes durante a atividade, buscam conselhos e ajuda quando necessrio, e

utilizam estratgias para otimizar a aprendizagem. Alm disso, eles so cientes do que

sabem e das habilidades que possuem.

Montalvo e Torres (2004 apud AZZI e POLYDORO, 2009, p. 79) tambm

denotam que o aluno autorregulado aquele que aprendeu planejar, controlar e avaliar

seus processos cognitivos, afetivos, motivacionais, comportamentais e contextuais,

possui autoconhecimento sobre o prprio modo de aprender, suas possibilidades e

limitaes.

Com base na reviso de alguns estudos Kremer-Hayon e Tillema (1999) atestam

que alunos autorregulados so seguros em suas estratgias, definem metas para alcanar

seus objetivos, sustentam sua motivao, alm de ter conscincia de como seu

conhecimento e suas crenas implicam a abordagem, durante as tarefas. So tambm

mais flexveis e adaptam-se mais facilmente aos desafios da sala de aula.

Zimmerman (2010) alerta para a importncia de distinguirmos os processos de

autorregulao (como, por exemplo, as percepes de autoeficcia) das estratgias

desenvolvidas para aperfeioar esses processos (como a definio de objetivos

intermedirios).

Para esse autor, as estratgias de autorregulao referem-se s aes dos alunos

dirigidas aos processos de aquisio de habilidade, informao, instrumentalidade. De

certo modo, a maioria dos estudantes utiliza esses processos regulatrios em algum

grau. Porm, estudantes autorregulados distinguem-se pela conscincia das relaes

estratgicas entre os processos regulatrios e os resultados da aprendizagem, e tambm

porque conseguem usar as estratgias para alcanar seus resultados acadmicos.

Um aspecto importante das teorias da autorregulao da aprendizagem que a

aprendizagem e a motivao devem ser tratadas como processos interdependentes, no

podendo ser compreendidos de forma isolada (ZIMMERMAN, 2010). As percepes de

autoeficcia dos estudantes, por exemplo, so um motivo para aprender e subsequentes

resultados das tentativas de aprender11 (SCHUNK, 1984,1985 apud ZIMMERMAN,

2010, p. 6 traduo nossa). Ainda como nos aponta Zimmerman (2010), com base em

seus estudos sobre Bandura (1989), a maior motivao desses estudantes definir metas

superiores para si, diante do fato de j terem alcanado as metas definidas

anteriormente.

11Original: For example, student perceptions of self-efficacy are both a motive to learn and a subsequent outcome of attempts to learn.

40

Assim, a autorregulao mais do que uma capacidade de executar uma resposta

de aprendizagem por si mesmo, e de ajustar respostas de aprendizagem diante de um

feedback negativo. Ela envolve esforos proativos para lucrar com as atividades de

aprendizagem. Nessa perspectiva, os aprendizes no so autorregulados somente num

sentido metacognitivo, mas tambm motivados. A sua vontade e suas habilidades so

componentes integrados de autorregulao (ZIMMERMAN, 2010).

A autorregulao da aprendizagem tambm no possui uma natureza associal.

Cada processo ou comportamento autorregulatrio pode ser ensinado ou modelado

pelos colegas, pais e professores (ROSRIO, NEZ e GONZALZ-PIENDA, 2006).

Certamente, alunos autorregulados sempre esto dispostos a melhorar a qualidade de

sua aprendizagem.

Paris, S.G. e Paris, A.H. (2001) acreditam que a compreenso da autorregulao

da aprendizagem pelos alunos pode ser reforada de trs maneiras: indiretamente, por

meio da experincia, diretamente, por meio de instruo, e eliciada, atravs da prtica.

Primeiro, a autorregulao pode ser induzida de repetidas experincias, por exemplo,

alunos podem perceber que, controlando seu trabalho, obtero maior preciso e gastaro

menos tempo para a realizao das tarefas. Em segundo lugar, o professor pode fornecer

instrues explcitas sobre a autorregulao. Quando, por exemplo, expe uma

estratgia e explica seu benefcio com relao aprendizagem, ou quando analisa cada

termo em uma histria de um problema matemtico. Em terceiro lugar, quando a

autorregulao adquirida atravs de situaes nas quais a prpria autorregulao

pertencente natureza da tarefa. Podemos usar, como exemplo, o projeto de

aprendizagem colaborativa, no qual cada aluno dever contribuir com uma parte do

projeto global. Se a contribuio for insuficiente, a necessidade de uma reformulao do

trabalho pode tornar-se aparente. Tambm pode haver apontamentos explcitos de seus

pares sobre a necessidade de melhoria. Nesse caso, a autorregulao apresenta-se como

parte da atividade.

Raramente os alunos utilizam apenas um dos modos apresentados acima para

reforar sua autorregulao. Provavelmente, todos eles operam juntos na sala de aula,

para que o aluno seja capaz de administrar sua aprendizagem (PARIS, S.G. e PARIS,

A.H., 2001). Devemos lembrar que as caractersticas individuais e do ambiente podem

levar os alunos a diferentes nveis de regulao da aprendizagem.

A autorregulao da aprendizagem mais provvel, quando os professores criam

ambientes de sala de aula em que os alunos tenham a oportunidade de buscar desafios,

41

refletir sobre seu progresso, e tomar responsabilidade e orgulho de suas conquistas

(PARIS, S.G. e PARIS, A.H., 2001). O professor pode ajudar seus alunos a obterem um

controle maior sobre sua aprendizagem. Mas, para isso, parece fazer sentido que ele seja

um profissional autorregulado. Dessa forma, se quisermos compreender a

autorregulao no contexto escolar, necessrio que voltemos nossos olhares

formao de nossos docentes.

1.2.2. A autorregulao da aprendizagem na formao docente

Embora a noo de autorregulao da aprendizagem no seja novidade na

formao de professores, pode-se perceber que, nos ltimos anos, ela ganhou destaque.

Segundo Kremer-Hayon e Tillema (1999), podemos considerar, entre os principais

fatores que levaram a esse fato:

A necessidade de autonomia e da responsabilidade, caractersticas que podem

ser aplicadas somente se os professores se tornarem aprendizes autorregulados,

pois ningum pode ser autnomo ou responsvel pela prpria aprendizagem se

ela for organizada por terceiros;

A recente mudana educacional de uma orientao de racionalidade tcnica para

a reflexo e ao. Esse modelo de racionalidade tcnica est em desacordo com

o modelo pedaggico que visa envolver professores em uma relao dialgica e

igualitria com os alunos. Essa proposta chama a ateno para ambientes de

aprendizagem autorregulada em que o aluno possa gerenciar seu aprendizado;

A mudana na percepo dos professores, quanto ao seu papel no processo de

ensino e aprendizagem. O professor percebe que seu papel no monopolizar o

conhecimento, mas, sim, ajudar o aluno a constru-lo;

O rpido processo de atualizao do conhecimento, que exige sempre a

formao continuada do professor.

Para ensinar, o professor precisa ter cincia de como acontece o processo de

aprendizagem. Ele deve ser capaz de buscar estratgias que lhe permitam a otimizao

do aprender. Somente assim, ele conseguir oferecer aos alunos condies para se

tornarem protagonistas na construo do conhecimento e buscar caminhos para a sua

formao continuada.

Bembenutty et al. (2015) consideram que a autorregulao como uma empresa

social que envolve um aprendiz e um indivduo que possua os conhecimentos

42

necessrios para guiar esse aprendiz em sua jornada. Com base na teoria social

cognitiva de Bandura e no modelo de autorregulao de Zimmerman, os autores

descrevem que o desenvolvimento da autorregulao na formao docente requer

aprendizes sensveis a algumas pistas sociais como: ateno, reteno, produo e

motivao. E expem tambm que tanto estudantes quanto professores tm tarefas e

responsabilidades no desenvolvimento da autorregulao, que composto pelos

seguintes nveis, conforme o modelo de Zimmerman: observao, emulao,

autocontrole e autorregulao.

A fase de observao envolve a capacidade dos alunos para perceber e manter os

padres comportamentais demonstrados pelo professor, analisando suas estratgias,

suas potencialidades e fraquezas. A fase de emulao envolve os esforos dos alunos

para reproduzir os padres observados. Nessa fase, cabe ao professor acompanhar o

aluno, oferecendo-lhe feedback sobre seus comportamentos. Na terceira fase, os alunos

buscam desenvolver os padres comportamentais observados sob a mnima orientao

do professor. Nessa fase, os alunos devem autoavaliar as estratgias empregadas e cabe

ao professor orient-los quando necessrio. A quarta fase envolve a tentativa dos

estudantes de reproduzir de forma independente os comportamentos observados. Nessa

fase, cabe ao professor incentivar seus alunos por meio de desafios.

Para se tornarem capazes de ensinar, alm de dominar os contedos especficos,

fundamental que os professores saibam aprender a aprender. Com base em seus

estudos em Sternberg (1996), Boruchovitch (2014) apresenta consideraes importantes

sobre a autorregulao na formao docente, dentre as quais aponta uma questo

central, que a identificao das caractersticas e aes de docentes e discentes

considerados excelentes por futuros professores. Segundo descreve o autor, essas

caractersticas so: domnio de conhecimento especfico de forma organizada e

integrada, amplo conhecimento de procedimentos e capacidade para aprendizagem

autorregulada aguada.

Outros pesquisadores apontados por Boruchovitch, como Dembo (2001) e Veiga

Simo (2004), consideram respectivamente que, para melhorar a formao de

professores, o ponto de partida deve ser o professor como estudante, suas crenas e seus

comportamentos, e que a formao de professores deve ser pensada num processo de

dupla vertente, isto , o professor como algum que ensina e que aprende.

Recomenda-se que sejam dadas oportunidades para que os professores possam

desenvolver sua autorregulao durante sua formao. Docentes em formao devem

43

refletir sobre sua aprendizagem, sobre suas concepes de ensino, sobre o que os bons

alunos fazem para alcanar suas metas e, sobretudo, sobre o que ser aluno.

Pesquisadores consideram que a reflexo uma forma de o professor ganhar

conhecimentos sobre si, mas tambm uma forma de perceber o papel que ela exerce nas

suas aes e no seu pensamento (BORUCHOVITCH, 2014).

Investigaes mostram que h possibilidade de promover a aprendizagem de

futuros professores, por meio da utilizao de alguns instrumentos que favoream o

desenvolvimento metacognitivo e a tomada de conscincia como, por exemplo, os

dilogos coletivos, os portflios, os ciclos de reflexo e anlise de estratgias. Ou,

ainda, por meio de interveno sistmica em curso de formao de professores ou

disciplina especfica (BORUCHOVITCH, 2014).

Tendo como base as pesquisas desenvolvidas na rea da autorregulao de

aprendizagem, nota-se que os professores precisam ser melhores preparados para

intervir com estratgias para a aprendizagem autorregulada junto a seus alunos.

A conscincia dos nossos prprios processos cognitivos, a metacognio, o que possibilita que iniciemos o seu controle e regulao. Na realidade, para ser estratgico, o professor tem que ser primeiro estudante autorregulado. Acredita-se que futuros professores precisem vivenciar a metacognio como um exerccio, como uma possibilidade de autorreflexo acerca de suas prprias facilidades e dificuldades de aprender a aprender e ensinar para aprender a aprender (BORUCHOVITCH, 2014, p. 406).

Acredita-se que um bom professor seja capaz de refletir sobre a forma como se

aprende. Segundo Boruchovitch (2014), fundamental que as escolas promovam

espaos em que o futuro professor possa refletir sobre a dupla vertente de sua formao,

estudante e professor, para que possa, alm de aprender a aprender, vivenciar esse

processo para que seja capaz de ensin-lo. Essas iniciativas sero valiosas para a

formao docente, mas, sobretudo, para a criao de escolas capazes de formar alunos

mais autorregulados.

Em uma sociedade que exige cada vez mais aprendizagem, a capacidade de

orientar a prpria aprendizagem torna-se muito importante, para que o aluno atinja

sucesso, seja ele acadmico ou no (KREMER-HAYON e TILLEMA, 1999). Esse fato

torna-se ainda mais relevante, quando associamos a motivao metacognio.

Segundo Wolters (2003 apud VRIELING, 2012), a motivao pode ser vista como

produto ou como processo.

44

Quando vista como produto, os alunos tm o nvel de motivao que eles