introdução à teologia armínio-wesleyana [vinicius couto]

109
Introdução à Teologia Armínio-Wesleyana Vinícius Couto

Upload: allan-costa

Post on 18-Dec-2015

213 views

Category:

Documents


17 download

DESCRIPTION

Introdução à Teologia Armínio-Wesleyana

TRANSCRIPT

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    Vincius Couto

    Sindicato 01Mquina de escreverhttp://agraphai.blogspot.com.br/

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

  • A teologia arminiana muitas vezes desconhecida no meio protestante e caricaturada, constantemente, de forma precipitada. Calvinistas equivocam-se sobre conceitos fundamentais de nosso pensamento e at mesmo alguns irmos que se intitulam arminianos fazem confuso sobre nosso posicionamento. Esta obra, alm de desmitifi- car os equvocos relacionados teologia arminiana, relaciona os axiomas do arminianismo de forma clara e objetiva, reforando o conhecimento bsico de tal ramo do pensamento cristo. Este livro indicado para seminaristas, estudiosos das doutrinas da graa e, sobretudo, para os membros de denominaes confessionalmente arminianas em sua soteriologia.

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

  • VINCIUS COUTO

    Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    6 MXo/lA. fyjlLvilO

  • VINCIUS COUTO. 2014

    Reviso Impresso

    Conselho Editorial

    Editora Executiva Caroline Dias de Freitas

    Cludia Cintra

    Forma Certa Grfica e Editora

    Prof. Dr. Antnio Mspoli de Arajo Gomes

    Prof. Dr. Edson Pereira Lopes

    Tiragem: 1000 exemplares

    Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por quaisquer meios (eletrnico ou mecnico, incluindo fotocpia e gravao) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem permisso escrita da Editora Reflexo.

    Editora ReflexoRua Ferno Marques, 226 - Vila Graciosa 03160 030 So Paulo Fone 11 4107 6068 www.editorareflexao.com.br [email protected]

    Dados internacionais de Catalogao na publicao (CIP) Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil

    couto, VINCIUS

    I . Religio 2. Teologia I. Titulo. 1. Srie.

    06-6456 CDD-809

    ndices para catlogo sistemtico:1. Teologia Arminiana 2. Teologia Wesleyana 3. Ttulo

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escreverhttp://agraphai.blogspot.com.br/

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

    Sindicato 01Mquina de escrever

  • Dedico esta obra a minha fam lia, que alm de me dividir com o com pu

    tador, deu-me grandes incentivos para concretiza-la; e ao s meus am igos

    que me encorajaram para que este projeto fo s se publicado.

  • \ cVSumario I Cx y t

    Prefcio.....................................................................................................09

    Prefcio.....................................................................................................11

    Introduo................................................................................................ 13

    Captulo 1Introduo ao arminianismo................................................................... 15

    Captulo 2Eleio Condicional..................................................................................28

    Captulo 3Expiao ilimitada................................................................................... 41

    Captulo 4Depravao total...................................................................................... 55

    Captulo 5Graa Preveniente.................................................................................... 68

    Captulo 6Perseverana dos santos. 84

  • PREFACIO

    O lugar de escritor cristo nunca ficou vazio, pois o Mestre sempre levanta e faz surgir uma voz no deserto. A mim, com mais de quatro dcadas no ministrio 100% ativo, me parece que a Igreja que Jesus amou e deu Sua Vida por ela; parece-me que ela est no deserto do to necessrio aprendizado conhecimento teolgico. J nos idos sculos do Antigo Testamento, a voz do Altssimo ressoava ... O meu povo est sendo destrudo por lhe faltar o conhecimento. Graas interferncia do alto, o povo todo no foi destrudo e o conhecimento das verdades chegou e continua chegando at ns.

    Nas viagens que fazemos aos quatro cantos da terra, especialmente quando participamos de congressos e conferncias, com participao de povos de todas as naes, nos prostramos ante o Rei que fez e faz que o conhecimento da Sua verdade chegue at os confins da terra. Como as guas cobrem o mar, assim a terra se encher do conhecimento de Deus. E nesses dias de acentuado descaso do aprendizado teolgico, temos que a Deus se primam por em diferentes e distantes lugares levantar homens que zelo do conhecimento.

    Sinto-me honrado em apresentar ao mundo dos ledores e daqueles que dia-aps-dia se colocam para ministrar em seminrios e classes afins; O jovem telogo e escritor, Ministro da Igreja do Nazareno, Vincius Couto, que depois de acurada investigao coloca em nossas mos - Introduo Teologia Armnio-Wesleyana, que sem dvida uma obra rica de valores e contedos raros, providos conhecimentos dos mestres do saber.

    Amadeu Aparecido TeixeiraPastor da Igreja do Nazareno de MesquitaSuperintendente DistritalMembro da Junta Internacional da Igreja do Nazareno

    9

  • PREFACIO

    Mais cedo ou mais tarde, no necessariamente no incio da converso, os fiis acabam se perguntando se a salvao pode ou no ser perdida, se a eleio divina elimina o livre-arbtrio, se as pessoas podem fazer ou no algo para sua salvao, se o homem pode adorar e agradar a Deus sem conhec-lo e se o pecado de Ado afeta seus descendentes ou no, bem como diversas questes semelhantes. Todas essas dvidas se enquadram na doutrina da salvao e este livro contrasta de forma clara, precisa e correta as posies calvinista e arminiana.

    Na teologia, porm, a doutrina crist no auto-sustentvel. As doutrinas crists formam um mosaico onde, em vez de peas, temos de falar de dimenses transversais. Cada uma das doutrinas crists afeta s outras em um movimento recproco e contnuo. Portanto, a doutrina da salvao se fundamenta na doutrina de Deus. Da mesma forma, a doutrina da salvao fundamenta a doutrina de Deus. Estas duas doutrinas, por sua vez, no podem ser separadas da doutrina do homem, a antropologia. A salvao para o homem e o homem para a salvao.

    Neste livro voc vai encontrar pelo menos duas posies contrastadas em alguns aspectos da salvao, de Deus e do ser humano. Convido os leitores a se perguntarem: de que tipo de Deus fala esta posio? o Deus que conhecemos na vida, morte e ressurreio de Jesus Cristo? De que tipo de ser humano assume esta posio? o ser humano que se reflete na vida, morte e ressurreio de Jesus Cristo? De que tipo de salvao est falando esta posio? Ela est falando sobre a salvao que se executa e se revela na vida, morte e ressurreio de Jesus Cristo?

    11

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    Jesus Cristo o Deus-Homem. a imagem perfeita de Deus, mas tambm a perfeita imagem de um ser humano. A vida, morte e ressurreio de Jesus Cristo contada no Antigo Testamento, o que podemos chamar de pr-histria de Jesus Cristo. Da mesma forma, o Novo Testamento narra a vida, morte e ressurreio de Cristo. sua histria. Como o pastor Vincius Couto nos disse, o mais importante no sermos de Paulo, de Apoio ou de Pedro. Vale tambm lembrar que, a mesma passagem de 1 Corntios nos diz que existe um jeito errado de ser de Cristo. Aqueles que diziam serem de Cristo no estavam em uma posio melhor do que aqueles que alegavam ser Pedro, Paulo ou Apoio.

    Por isso, no podemos ser omissos quanto nossa posio teolgica. Creio que esta obra ajudar a elucidar e divulgar de forma mais precisa o pensamento arminiano-wesleyano. meu desejo e minha orao que sejamos todos ns achados em Cristo Jesus; que sejamos achados nEle quando partirmos para Sua presena; que sejamos achados em Cristo quando Ele vier pela segunda vez e que sejamos achados em Cristo Jesus todos os dias de nossas vidas.

    Sadrac Meza Perez, Ph.DDiretor da Escuela de Estdios Pastorales de Costa Rica Professor de Interpretacin y Exposicin Bblica no Seminrio Nazareno de las Amricas

    12

  • INTRODUO

    A teologia arminiana muitas vezes desconhecida no meio protestante. Calvinistas equivocam-se sobre conceitos fundamentais de nosso pensamento e at mesmo alguns irmos que se intitulam arminianos fazem confuso sobre nosso posicionamento.

    H alguns dias encontrei um pastor (arminiano) que afirmava algo incoerente com a doutrina da depravao total do homem. Ele achava que a raa humana podia dar o primeiro passo em relao a Deus e pregava isso insistentemente. Todavia, esse pensamento foi rejeitado pela Igreja e isso ficou conhecido como semi- -pelagianismo. Teremos uma abordagem mais direta em um de nossos captulos a esse respeito, mas vale aqui a observao de como nosso pensamento ainda no est devidamente alinhado.

    Em funo de equvocos como esse, que vemos os nossos irmos calvinistas nos acusarem de sermos semi-pelagianos, mas o arminianismo clssico no prega essa mensagem. Outra coisa interessante, que as pessoas normalmente associam o arminianismo ao livre-arbtrio e esse no o carro chefe da nossa posio doutrinria. Antes, partimos do pressuposto da eleio amorosa realizada pela prescincia divina em Cristo Jesus. A base do arminianismo o amor de Deus e no a vontade do homem!

    O objetivo primrio desta obra, portanto, mais para esclarecer o povo cristo e dar as diretrizes e os rudimentos do pensamento arminio-wesleyano. No nossa pretenso escrever uma obra exaustiva, mas introdutria, que d aos segmentos tanto arminianos quanto calvinistas, explicaes bsicas de nossa doutrina.

    13

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    Outro fator motivador para que esta obra fosse formada, se d em virtude da escassez de material arminiano em nossas livrarias no idioma portugus. Se compararmos com o calvinismo, estamos consideravelmente aqum. Pouqussimas teologias sistemticas foram traduzidas para nosso idioma e at desconheo algum telogo brasileiro que tenha escrito uma teologia sistemtica declarativamente arminiana.

    Desejo que esta obra possa, primeiramente, edificar aos irmos e ajudar-lhes no conhecimento de base da teologia arm- nio-wesleyana. Em segundo lugar, pretendo contribuir para o despertamento do arminianismo no solo brasileiro, e finalmente, acredito que essa fagulha literria arminiana poder incentivar a outros mestres e doutores de nossa teologia a prepararem mais materiais, e quem sabe at uma teologia sistemtica.

    Sem mais delongas, venhamos conhecer a teologia armnio- -wesleyana. Que Deus lhe abenoe nessa leitura!

    Pr. Vincius Couto.

    14

  • CAPTULO 01Introduo ao arminianismo

    Salvao um tema que sempre gerou e continua a gerar curiosidades e anseios no cerne da alma humana. Certo jovem abastado procurou Jesus e perguntou: Bom Mestre, que hei de fazer para herdar a vida eterna? (Mc 10.17). Em outra ocasio, um dos doutores da Lei, querendo experimentar a Cristo, questionou: Mestre, que farei para herdar a vida eterna? (Lc 10.25).

    Alguns sistemas de crena dizem que a salvao se d por meio de boas obras, atribuindo mrito ao ser humano e invalidando o sacrifcio de Cristo por meio de uma auto salvao. Outros sistemas pregam uma esperana baseada em constantes reencar- naes, nas quais o esforo humano as proporcionar melhores

    | condies em suas vidas subsequentes.I H, ainda, o sistema universalista, o qual prefere ludibriar a i conscincia do homem sob o falso entendimento de que no final [ das contas todos sero salvos, independentemente da Obra Vic- I ria de Cristo e sua eficcia para com aqueles que O receberam (Jo ; 1.12). Todas essas posies so contrrias perspectiva da Palavra| de Deus (cf Ef 2.8,9; Hb 9.27; Jo 3.16).i| Nesta obra poderemos observar os dois principais sistemas j que discorrem sobre a salvao do homem dentro do protestan- | tismo. O primeiro se baseia na predestinao divina, cuja atuao j unicamente monergista, e o ltimo, no sinergismo entre DeusI e homem, cuja atuao se d atravs da graa preveniente e do livre-arbtrio humano.kk

    I 15

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    1.1 Antecedentes histricos

    Esses dois conceitos paradoxais remontam aos dias de Agostinho, o qual defendia que o homem predestinado por Deus e, portanto, no possui capacidade de escolher Cristo e Sua obra salvadora. Para que o homem seja salvo, necessrio que Deus atue com sua graa irresistvel e o regenere.

    As doutrinas soteriolgicas de Agostinho foram formadas antes e durante o embate da controvrsia pelagiana. Pelgio foi um austero monge e popular professor em Roma. Sua austeridade era puramente moralista, ao ponto de no conseguir conceber a ideia de que o homem no podia deixar de pecar.

    Pelgio estava mais interessado na conduta crist e queria melhorar as condies morais de sua comunidade. Sua nfase particular recaa na pureza pessoal e na abstinncia da corrupo e da frivolidade do mundo, resvalando no ascetismo.1

    Ele negava a nfase de Tertuliano ao pecado original, sob a argumentao de que o pecado meramente voluntrio e individual, no podendo ser transmitido ou herdado. Para ele, crer no pecado original era minar a responsabilidade pessoal do homem. Ele no concebia a ideia de que o pecado de Ado tivesse afetado as almas e nem os corpos de seus descendentes. Assim como Ado, todo homem, segundo o pensamento pelagiano, criador de seu prprio carter e determinador de seu prprio destino.2

    No entendimento pelagiano, o homem no possui uma tendncia intrnseca para o mal e tampouco herda essa propenso de Ado, podendo, caso queira, observar os mandamentos divinos sem pecar. Ele achava injusto da parte de Deus que a humanidade herdasse a culpa de outrem e desta forma negava a doutrina do pecado original.

    Desta forma, Pelgio passou a ensinar uma doutrina exage- radamente antropocntrica e focada no livre-arbtrio, ensinando

    1. MCGIFFERT, Arhur Cushman. A History o f Christian Thought, Volume 2. Charles Scribners Sons, 1953, p. 125.2. Ibid, p. 126.

    16

  • Vinicius Couto

    que, ao criar o homem, Deus no o sujeitou como fizera com as outras criaturas, mas deu-lhe o privilgio singular de ser capaz de cumprir a vontade divina por sua prpria escolha3.

    Como Pelgio baseava suas teorias em uma abordagem moralista, entendia que a desobedincia do homem vinha do exemplo e dos costumes observados ao redor, podendo pela prpria fora, alcanar a perfeio mediante grande esforo de sua prpria vontade.

    Em contrapartida, Agostinho sustentava que Ado fora criado em um estado original de retido e perfeio e estaria, em seu estado original, isento de males fsicos, dotado de alta intelectualidade, bem como num estado de justificao, iluminao e bem aventurana inigualveis, alm de ter a inclinao de sua vontade para a virtude.4

    A gravidade do pecado de Ado foi tal, que a consequncia foi uma tragdia para a humanidade, a qual se tornou uma massa de pecado (massa damnata), isto , um antro pecaminoso e propagador de pecadores. As bases agostinianas para a doutrina do pecado original se encontravam em passagens como SI 51; Ef 2.3; Rm 5.12 e jo 3.3-5.

    Uma vez que o homem havia cedido ao pecado, a natureza humana foi afetada obscuramente pelas consequncias do mesmo, tornando-se desordenada e propensa para o mal. Sendo assim, sem a ajuda de Deus impossvel, pelo livre-arbtrio, vencer as tentaes desta vida.5 Essa ajuda divina para escolher o certo, ou retornar para Deus, era Sua graa, a qual Agostinho define como um poder interno e secreto, maravilhoso e inefvel6 operado por Deus nos coraes dos homens.

    Para Agostinho, a graa divina antev e provoca cada impulso na vontade do homem. Essa graa expresso da soberania de Deus, no podendo ser resistida. Para explicar o antagonismo da irresistibilidade frente ao livre-arbtrio, o Bispo de Hipona diz

    3. KELLY, J. N. D. Patrstica: Origem e desenvolvimento das doutrinas centrais da f crist. Vida Nova, 1994, p. 270.4. AGOSTINHO, Aurlio. De civitate Dei 14.11.5. AGOSTINHO, Aurlio. Enarrationes in Psalmos 89.4.6. AGOSTINHO, Aurlio. De grata Christi et Peccatum Originale 1.25.

    17

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    que a liberdade do homem baseada nas motivaes. Sendo as decises do homem, portanto, um fruto do meio, o homem no regenerado que vive em uma atmosfera de concupiscncia escolher o mal. A graa divina, porm, cura o homem e restaura seu livre-arbtrio, substituindo seu sistema de escolhas.7

    1.2 Outros referenciais histricos

    A questo do livre arbtrio um tema que sempre teve seu espao na teologia, fosse na antiguidade clssica, na era patrol- gica ou na contemporaneidade. Normalmente no embate predestinao x livre-arbtrio, o nome mais lembrado o do eminente telogo supracitado, Agostinho, cuja notoriedade contra a controvrsia de Pelgio consabida, entretanto, outros nomes tambm so dignos de considerao.

    Justino Mrtir (100-165) dizia que, embora no tenhamos tido escolha alguma no nascimento, em virtude dos poderes racionais que Deus nos deu, podemos escolher viver ou no de modo aceitvel a Ele, no havendo desculpas quando agimos erroneamente. Ele dizia, ainda, baseado na pr-cincia divina que, Deus no predetermina as aes dos homens, mas prev como iro agir por sua prpria vontade, podendo inclusive, anunciar antecipadamente esses atos.8 Concordavam com a livre escolha do homem os apologistas Atengoras (133-190), Tefilo (-186) e Taciano (120-180).

    Vale a pena comentar a opinio de Tertuliano (160-220). Ele cria que o homem como um ramo cortado do tronco original de Ado e plantado como uma rvore independente. Sendo assim, o homem herdou atravs da transgresso de Ado a tendncia ao pecado. Como resultado do pecado de Ado, carregamos mcula e impureza. Apesar disso, o homem detm livre-arbtrio e responsvel por seus prprios atos.9

    7. AGOSTINHO, Aurlio. De gratia et libero arbtrio liber 31 \De Spiritu et Littera 52.8. KELLY, J. N. D. Op. Cit., p. 125.9. Ibid, p. 131.

    18

  • Vincius Couto

    Muitas controvrsias em torno do livre-arbtrio se deram por equvocos exegticos. Clemente de Alexandria (150-215), negava o pecado original baseado, por exemplo, em J 1.21. Segundo ele, a declarao de que J havia sado nu do ventre de sua me, deixava implcito que as crianas entram no mundo sem pecado. Essa m interpretao e nfase exagerada no livre-arbtrio, levava-o a professar que Deus deseja que sejamos salvos por nossos prprios esforos.10

    Outros esforos na defesa do livre-arbtrio tambm se deram nas disputas contra os maniquestas. Estes questionavam a benevolncia de Deus e lhe outorgavam a autoria do pecado. Se o homem herda de Ado a culpa e o pecado, no possumos poder de escolha. Logo, raciocinavam eles, Deus o autor do mal. Contra esses argumentos, levantaram-se homens como Cirilo de Jeusa- lm (313-386), Gregrio de Nissa (330-395), Gregrio de Nazianzo (329-389) e Joo Crisstomo (347-407). Infelizmente, eles acabaram negando o pecado original afirmando que crianas recm- -nascidas esto isentas de pecado, embora cressem que a raa humana foi afetada pelo pecado de Ado.11

    O entendimento sobre o livre-arbtrio foi sendo amadurecido. No sculo V, por exemplo, temos na expresso de Teodorete (393- 466), o pensamento de que, embora o homem necessite da graa divina e sem esta impossvel dar um s passo na senda que conduz virtude, a vontade humana tem de colaborar com tal graa, pois existe a necessidade de um sinergismo tanto de nossos esforos quanto da assistncia divina. A graa do Esprito no assegurada queles que no fazem esforo algum ao mesmo tempo que sem essa graa impossvel que nossos esforos recebam a recompensa da virtude.12

    semelhana de Teodorete, Teodoro de Mopsustia (350-428) dizia que o livre-arbtrio pertence a seres racionais. Na opinio

    10. bid, p. 134.11. Ibid, p. 263-264.12. Ibid, p. 283.

    19

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    dele, todos os homens possuem conhecimento do bem o tempo todo, bem como capacidade de escolher entre o certo e o errado.Ele no negava os efeitos da queda na humanidade e dizia que os homens possuem propenso definida para o pecado e que se for para o homem passar deste13 estado cado para a vida bendita reservada por Deus necessria a operao graciosa da ddiva j divina no homem.

    Saltando oito sculos, chegamos a outra pessoa que deu sua enorme contribuio doutrina do livre-arbtrio: Toms de Aquino (1225-1274). Ele dizia que em cada ser intelectual h vontade, assim como em cada intelecto.14 Seu conceito sobre vontade de que esta um poder para atrair ou afastar aquilo que apreendido pelo intelecto.15 Apesar de Deus mover a vontade, j que ele move todo tipo de coisa de acordo com a natureza da coisa movida... ele tambm move a vontade de acordo com sua condio, como indeterminadamente disposta a vrias coisas, no de forma necessria.16

    Feser explica a posio Aquiniana fazendo a seguinte analogia: quando escolhemos tomar caf ao invs de ch, poderiamos fazer diferente. A cafeteira, por sua vez no pode mudar sua funo sozinha. Isto assim porque nossa vontade foi a causa de tomarmos caf, enquanto que algo fora da cafeteira (programaes de instrues, corrente eltrica fluindo para ela da tomada na parede, as leis da fsica, etc) foi a causa de seu comportamento. Deus causa os dois eventos de uma maneira consistente com tudo isto, ou seja, enquanto que ao causar sua livre escolha ele causa algo que opera independentemente do que acontece no mundo sua volta. Ele conclui dizendo que, embora seja Deus a causa ltima da vontade e da ordem causai natural, Ele no mina a liberdade do homem, mas a faz possvel no sentido que assim como nas causas naturais, se escolhas livres no fossem causadas por Deus, elas nem poderam existir.1713. Ibid, p. 283.14. AQUINO, Toms de. Suma Teolgica 1.19.1.15. AQUINO, Toms de. Suma Contra Gentios IV. 19.16. AQUINO, Toms de. Questes disputadas sobre o mal 6.1 7. FESER, Edward. Aquinas, a Begginefs Guide. One World, 2009, pp. 150-1 51.

    20

  • Vincius Couto

    1 .3 A influncia calvinista

    Na Idade Mdia as pessoas procuravam, muitas das vezes, uma soluo eterna baseada em um documento assinado pelo pontfice da igreja romana. Essas indulgncias prometiam efetuar um pagamento mais completo da dvida que o pecador deve a Deus e amenizar as exigncias futuras em um suposto purgatrio.18

    Nessas condies decadentes da teologia medieval romana, emergiu a Reforma Protestante e doutrinas como Sola Fide, Sola Scriptura, Solus Christus, Sola Gratia e Soli Deo Gloria19 foram ver- beradas com veemncia.

    A proposta do presente livro entendermos melhor acerca do que conhecemos como arminianismo. Entretanto, no h possibilidade de falar de Armnio sem comentarmos de Calvino.

    Quando Lutero afixou as 95 teses na porta da igreja no castelo de Wittenberg, Calvino tinha oito anos de idade. Natural de Picardia, na Frana, Calvino nasceu em 1509 e morreu em 1564 e foi sem sombra de dvidas, um proeminente telogo protestante e lder eclesistico, dono de uma mente brilhante.

    Ele recebeu grau de mestre em teologia no incio do ano de 1528, mas a pedido de seu pai deu inicio ao estudo de Direito, em Orleans. Com a morte de seu pai em 1531, Calvino pde retornar s suas preferncias teolgicas e dedicou-se ao estudo das lnguas grego, hebraico e latim.

    Vendo dificuldade para que houvesse reforma em Paris, Calvino mudou-se para Basel, na Sua. L, ele escreveu e publicou suas institutas no ano de 1536. Em seus comentrios sobre os salmos, ele contou ter passado pelo o que ele mesmo denominou de sbita converso, dizendo que outrora estava teimosamente preso s supersties do papado e que no era possvel desvencilhar-se

    18. SWEENEY, Charles, lndulgences. Enciclopdia do site newadvent.org. Disponvel em: http://www.newadvent.org/cathen/07783a.htm. Acesso em 04/04/2013 s 16:46.19. Os cinco solas foram expresses surgidas durante a Reforma Protestante e significam, respectivamente, somente a f, somente as Escrituras, somente Cristo, somente a graa e somente a Deus a Glria. As frases, que foram escritas em latim, sintetizam os rudimentos fundamentais dos reformadores.

    21

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    desse profundo lamaal, mas que Deus havia subjugado seu corao da obstinao de sua idade para a docilidade e conhecimento da verdadeira piedade, mediante Sua providncia secreta,20

    Outros reformadores desenvolveram pensamentos que, unidos com os de Calvino, formaram uma tradio que chamada de Reformada. Dentre esses telogos reformadores, podemos citar Martin Bucer, Heinrich Bullinger e Ulrico Zwinglio. Essa escola de pensamento tambm chamada de Calvinismo.

    1.4 Jac Armnio

    Armnio foi um telogo holands, nascido em Oudewater (1560 - 1609). Ele estudou entre os anos de 1576 e 1582 na Universidade de Leiden, na Holanda, onde posteriormente foi professor desde 1603 at sua morte.

    Johann Kolmann, um de seus professores de teologia nesse perodo, acreditava e ensinava que o alto calvinismo tornava Deus um tirano e carrasco, o que certamente influenciou as idias de Armnio. Em 1582, comeou a estudar em Genebra e teve como um de seus mestres o reformador Teodoro Beza, sucessor de Calvino. Em 1588 foi ordenado e pastoreou uma igreja em Amsterd.21

    Segundo o Novo Dicionrio Internacional da Igreja Crist, quando Calvino morreu, toda a responsabilidade (...) recaiu sobre Beza. Beza era chefe da Academia [de Genebra] e professor, presidente do Conselho dos Pastores, uma influncia poderosa sobre os magistrados de Genebra e porta-voz e defensor da posio protestante reformada.22

    O que sabemos que Arminio discordou das doutrinas de Calvino, baseado em duas argumentaes: 1) a predestinao tal qual no entendimento calvinista, tende a fazer de Deus o autor do pecado, por ter Ele escolhido, na eternidade passada, quem seria ou

    20. CALVINO, Joo. Comentrio de Salmos. Volume I. Fiel, 2009, p. 32.21. CHAMPLIN, R. N.; BENTES, J. M. Enciclopdia de Bblia Teologia e Filosofia, volume 1. Candeia, 1991. p. 288.22. SCHNUCKER, Robert. Theodore Beza, in: The new intemational dictionary of the Christianchurch. Grand Rapids, Zondervan, 1974, p. 126.

    22

  • Vincius Couto

    no salvo, e 2) o livre-arbtrio do ser humano negado no ensino de uma graa coercitivamente irresistvel.23

    A teologia arminiana, tal como conhecemos, no foi totalmente sistematizada durante a vida de Armnio. Aps a sua morte, seus discpulos (pouco mais de quarenta pregadores) cristalizaram suas idias em um panfleto o qual continha resumidamente, cinco pontos que rejeitavam o rgido calvinismo, intitulado Remonstran- ce (protesto), publicando-o no dia 19 de outubro de 1609, expondo assim, a posio arminiana.24

    1 .5 O Snodo de Dort

    Esse protesto (remonstrncia), ganhou o apoio de estadistas e lderes polticos holandeses que tinham ajudado a libertar os Pases Baixos da Espanha. Os opositores do movimento remonstran- te acusaram-nos de apoiar secretamente os jesutas e a teologia catlica romana e de simpatizar com a Espanha, embora no haja nenhuma evidncia de culpa por parte dos que protestavam em relao a essas acusaes polticas.

    Desde ento, houve muita confuso em vrias cidades holandesas: sermes eram pregados contra os remonstrantes, panfletos eram espalhados a fim de difam-los como hereges e traidores, pessoas foram presas por pensarem contra o alto calvinismo e um snodo nacional de telogos e pregadores foi realizado para regular tais controvrsias entre as idias paradoxais calvinismo x arminianismo.

    A primeira reunio do snodo foi realizada em 13 de Novembro de 1618 e a ltima (154a) em 9 de Maio de 1619, contando com a presena de mais de cem delegados, inclusive alguns da Inglaterra, da Esccia, da Frana e da Sua. O nome Dort usado em funo do idioma ingls, como que transliterandoo nome da cidade holandesa de Dordrecht.

    23. HORTON, Stanley (Org.). Teologia Sistemtica: uma perspectiva pentecostal. CPAD, 1996, pp. 54-55.24. Infelizmente, no possumos muito material arminiano em idioma portugus. Para maiores informaes biogrficas sobre Armnio consultar BANGS, Carl. Arminius: a study in the Dutch reformation. Grand Rapids, Zondervan, 1985.

    23

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    Na concluso do snodo, os remonstrantes foram condenados como hereges. Pelo menos duzentos foram depostos do ministrio da igreja e do estado e cerca de oitenta foram exilados ou presos. Um deles, o presbtero, estadista e filsofo Hugo Grotius (1583- 1645), foi confinado em uma masmorra da qual posteriormente conseguiu escapar. Outro estadista foi publicamente decapitado.

    Neste snodo, as idias arminianas foram, portanto, rejeitadas e a doutrina reformada estabelecida em seus cinco pontos, que formam o acrstico do ingls TUL1P, a saber: 1) depravao total (Total depravity), 2) eleio incondicional (Unconditional election), 3) expiao limitada (Limited atonement), 4) graa irresistvel (Ir- resistible grace) e 5) perseverana dos santos (Perseverance of the saints). Os pontos remonstrantes vo de encontro aos pontos cal- vinistas: 1) depravao total, 2) eleio condicional, 3) expiao ilimitada, 4) graa preveniente e 5) perseverana condicional.

    1.6 Mitos sobre o arminianismo

    Como podemos perceber, as idias arminianas possuem uma disparidade considervel com o sistema calvinista. Sobre isso, Wyncoop declara que, a linha divisria entre estas duas tradies crists repousa sobre teorias opostas acerca da predestinao. Ela a encruzilhada entre a soberania de Deus e a responsabilidade do homem, o pecado e a graa, a justificao e a santificao, a f humana e a obra do Esprito Santo.25

    Um dos principais mitos sobre o arminianismo, que este tem sido acusado erroneamente de ser uma doutrina semipelagiana por parte de alguns eminentes telogos calvinistas. Esta antiga heresia oriunda dos ensinos dos massilianos, liderados principalmente por Joo Cassiano (433 d.C), o qual tentou construir um elo entre o Pelagianismo, que negava o pecado original, e Agostinho, que defendia a eleio incondicional sobre o fundamento de que todos os homens nascem espiritualmente mortos e culpados do

    25. WYNKOOP, Mildred Bangs. Fundamentos da Teologia Arminio Wesleyana. Casa Publicadora Nazarena, 2004, p. 17.

    24

  • Vincius Couto

    pecado de Ado. Cassiano acreditava que as pessoas so capazes de se voltarem para Deus mesmo parte de qualquer infuso da graa sobrenatural. Isto foi condenado pelo Segundo Concilio de Orange no ano de 529.26

    O telogo nazareno H. Orton Wiley mostra que o sistema semipelagiano sustentava, erroneamente, que restou poder suficiente na vontade depravada para dar o primeiro passo em direo salvao, mas no o suficiente para complet-la. Ele conclui mostrando que esse pensamento equivocado e que o homem por si s no tem condies de se achegar a Deus, mas que isso deve ser feito pela graa divina.27 Essa a graa preveniente que antecede, prepara e capacita o homem para converter-se do pecado para a retido, a crer em Jesus Cristo para perdo e purificao dos pecados e a praticar obras agradveis e aceitveis28, pois os seres humanos, pela queda de Ado se tornaram depravados, de maneira que agora no so capazes de se voltar e se reabilitar pelas suas prprias foras e obras, e, desta forma, renovar a f e a comunho com Deus.29

    Um dos principais eruditos arminianos da atualidade, o Dr. Ro- ger Olson, em uma defesa centralidade da doutrina arminiana em Deus e no no homem como dizem certos calvinistas, comenta que esses crticos normalmente de baseiam em trs argumentos: 1) que o Arminianismo foca demais na bondade e capacidade humana, especialmente no campo da redeno, 2) que limita a Deus ao sugerir que a vontade de Deus pode ser frustrada pelas decises e aes humanas e 3) que coloca demasiada nfase na realizao e felicidade humana em negligncia ao propsito de Deus que glorificar a si mesmo em todas as coisas.

    Olson argumenta sua defesa de forma bastante contundente nesse artigo e comenta que muito raramente os crticos mencionam algum telogo arminiano ou citam do prprio Armnio para apoiar essas acusaes e que a maioria desses crticos desco

    26. KELLY, J. N. D. Op. Cit., pp. 289-291.27. WILEY, H. Orton. Christian Theology. Beacon Hili Press, 1941. p. 103.28. Manual da Igreja do Nazareno, p. 2929. Ibid. p. 28

    25

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    nhece o arminianismo clssico, tendo portanto, um entendimento preconcebido e consequentemente superficial do assunto.30

    Em contrapartida, o pensamento calvinista concebido pelos arminianos como um sistema que acaba por fazer do decreto divino a causa primeira da salvao, ao passo que a morte de Cristo torna-se causa secundria e subsidiria, no sendo absolutamente essencial para a salvao, mas um elo de uma corrente predeterminada de eventos.31

    1.7 Consideraes finais

    Nossa percepo no diferente: muitos so os que ainda no compreenderam e no conheceram a doutrina da salvao segundo a tica arminiana e infelizmente, alguns irmos no conseguiram abrir a cabea para gozarmos uma verdadeira unidade na diversidade.32

    Apesar das diferenas, ambas as posies possuem verdades essenciais que podem e devem nos unir em Cristo. Identificamo- -nos com certa linha teolgica e a defendemos, todavia, isso no pode criar partidarismo, ao ponto de dizermos eu sou de Paulo; ou, eu de Apoio; ou eu sou de Cefas; (ou, eu de Armnio; ou, eu de Calvino;) ou, eu de Cristo. Ser que Cristo est dividido? Foi Paulo crucificado por amor de vs? Ou fostes vs batizados em nome de Paulo? (1 Co 1.12,13 - parfrase minha).

    John Wesley dizia que dever de todo pregador arminiano, primeiro: jamais, nem em pblico, nem em particular, usar a palavra calvinista em deboche.33 Para ele, a norma de um metodista no estava em distinguir cristos de cristos, mas em distinguir-se

    30. OLSON, Roger. Arminianism is God-centered theology. Disponvel em: < http:// www.patheos.com/blogs/rogereolson/2010/ll/arminianism-is-god-centered-the- ology/ > . Acesso em 05/04/2013.31. WYNKOOP, Mildred Bangs . Op. Cit., p. 33.32. Para um estudo mais aprofundado sobre a doutrina arminiana, ver a recm- -traduzida obra de Olson, na qual ele trata de desmitificar pelo menos dez pressupostos equivocados acerca do pensamento de Armnio: OLSON, Roger. Teologia Arminiana: Mitos e Realidades. Editora Reflexo, 2013.33. WESLEY, John. What is an arminian?, Sermes

    26

  • Vinicius Couto

    cristos de no conversos: teu corao reto como o meu? No te pergunto mais. Se for assim, d-me a mo. Por opinies ou termos, esforcemo-nos juntos pela f do evangelho.34

    O Dr. Augustus Nicodemus, clebre telogo brasileiro do pensamento reformado, confirma que temos pontos em comuns dizendo que, os arminianos e os calvinistas concordam que Deus tem um plano, que ele controla a histria, que no existe acaso e que Ele conhece o futuro. Ambos aceitam a Bblia como Palavra de Deus e querem se guiar por ela.35

    Que possamos, como Igreja, cumprir a misso que nos foi ordenada, afinal, fomos todos eleitos segundo a prescincia de Deus Pai, na santificao do Esprito, para a obedincia e asperso do sangue de Jesus Cristo (1 Pe 1.2).

    34. WESLEY, John. The Character of a Methodist, Sermes.35. NICODEMUS, Augustus. Paganismo versus Cristianismo - Acaso ou Desgnio Divino? Revista Defesa da F. Ano 12, n 89 - Janeiro/Fevereiro de 2011, p.55.

    27

  • CAPTULO 02 Eleio condicional

    A discusso teolgica acerca dos pontos calvinistas e arminia- nos no se limitam predestinao e ao livre-arbtrio. Na verdade, esses dois pressupostos so parte de dois sistemas soteriolgicos que se ope em praticamente todos seus quesitos.

    O calvinismo, por exemplo, tem esse seu sistema montado num raciocnio lgico, conhecido pelo acrstico, do ingls, TU- LIP, a saber: Total depravity (Depravao total), Unconditional election (Eleio incondicional), Limited atonement (Expiao limitada), lrresistible grace (Graa irresistvel) e Perseverance o f the saints (Perseverana dos santos).

    Esses pontos foram respostas aos artigos dos remonstrantes, seguidores de Armnio, que protestaram as idias calvinistas baseados em cinco observaes, as quais podemos resumir da seguinte forma: 1) depravao total, 2) eleio condicional, 3) expiao ilimitada, 4) graa preveniente e 5) perseverana condicional.

    Nosso propsito estudar cada um dos axiomas soteriolgicos supracitados, segundo a tica arminiana. Para isso, dividiremos, doravante, nosso estudo em cinco etapas, a fim de abordar com maior preciso cada um desses pontos. Ademais, optaremos por seguir nosso raciocnio na mesma ordem dos artigos da remonst- rncia, visando um aproveitamento mais didtico.

    2.1 Artigo I - Remonstrncia

    Que Deus, por um eterno e imutvel plano em Jesus Cristo, seu Filho, antes que fossem postos os fundamentos do mundo,

    28

  • Vinicius Couto

    determinou salvar, de entre a raa humana que tinha cado no pecado - em Cristo, por causa de Cristo e atravs de Cristo - aqueles que, pela graa do Santo Esprito, crerem neste seu Filho e que, pela mesma graa, perseverarem na mesma f e obedincia de f at o fim; e, por outro lado, deixar sob o pecado e a ira os contumazes e descrentes, condenando-os como alheios a Cristo, segundo a palavra do Evangelho dejo 3.36 e outras passagens da Escritura.

    2.2 A predestinao

    Para o sistema calvinista alcanar sua lgica, ele tem seu pontap inicial nos decretos divinos, atravs dos quais a predestinao encontra-se subordinada. Best, telogo calvinista, define decreto como uma determinao ou ordem de algum que tem autoridade suprema. Ele refora, ainda, que o propsito de Deus est fundamentado na soberania absoluta, ordenado pela sabedoria infinita, ratificado pela onipotncia e cimentado pela imutabilidade.36

    Strong conceitua os decretos divinos como o plano eterno pelo qual Deus tornou certos todos os eventos do universo, passados, presentes e futuros.37 Charles Hodge complementa dizendo que, tais decretos so eternos, imutveis, livres, infalivelmente eficazes e relacionam-se com todos os acontecimentos, podendo ser reduzidos a um propsito divino, alm de terem como objetivo central, glorificar a Deus.38

    Historicamente, falando, Teodoro de Beza (1519-1605), bem como outros telogos reformados, comearam a especular sobre a ordem dos decretos divinos 39 Embora esses decretos fossem simultneos e eternos (pois Deus no est limitado ao passado, presente ou futuro, estando todas as coisas eternamente presentes no

    36. BEST, W.E.. Definition of Gods Decree. In:_____ . Cods Eternal Decree. WEBest Book Missionary Trust, 1992.37. STRONG, A. H. Teologia Sistemtica. 2007, Hagnos, p. 61 7.38. HODGE, Charles. Teologia Sistemtica. 2001, Hagnos, pp. 399-405.39. OLSON, Roger. Histria da Teologia Crist: 2000 anos de tradio e reformas. 2001, Vida, p. 468.

    29

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    plano espiritual), qual seria a ordem deles? Teria Deus decretado primeiramente a criao do mundo ou a dupla predestinao?

    Atravs destas conjecturaes, outros pontos calvinistas passaram a ser deduzidos, atravs do uso da lgica: se Deus decretou os eleitos e os rpobros (antes, durante ou depois da fundao do mundo), ento no faria sentido que Cristo morresse pelos reprovados; os eleitos, por sua vez, no teriam condies de resistirem graa de Deus, visto que j foram predestinados mediante os decretos eternos de Deus; Finalmente, algum que j teve sua salvao decretada desde a eternidade, como a perdera? Portanto, uma vez salvo, salvo para sempre.

    A discusso sobre quando se sucedeu o decreto da predestinao teve duas vertentes, cuja primeira o supralapsarianismo, na qual supra se remete a algo prioritrio e antecedente e lapsa- rianismo a um lapso ou queda. Portanto, o supralapsarianismo, trata-se de alguma coisa antes da queda, ou seja, a eleio como primeiro dos decretos de Deus.

    Olson explica que, teologicamente, o supralapsarismo uma forma de ordenar os decretos divinos de tal maneira que a deciso e o decreto de Deus em relao predestinao dos seres humanos, ao cu ou ao inferno, antecede seus decretos de criar os seres humanos e permitir sua queda ,40 cuja sequencia decretiva seria1) a predestinao salvao e ao castigo eterno, 2) a criao, 3) a permisso da queda, 4) o meio de salvao em Cristo e 5) a aplicao da salvao aos eleitos.

    Outros calvinistas, entretanto, discordaram com essa ordem e conjecturaram os decretos em outra sequencia, perfazendo a segunda vertente lapsariana. Eles, por sua vez, ficaram conhecidos como infralapsarianistas. Segue-se o mesmo raciocnio: infra est para depois e lapsarianismo para a queda. Sendo assim, eles situaram o decreto da predestinao depois da queda de Ado.

    A concepo dos decretos divinos sofre uma alterao cabal no entendimento dos telogos arminianos. A diferena, entretanto, no se choca de imediato com as teorias lapsarianas e sim

    40. Idem.

    30

  • Vincius Couto

    com a relao entre a soberania de Deus e a responsabilidade do homem, conforme podemos constatar nas palavras de Russel E. joiner:

    Os decretos divinos so o seu plano eterno que, em virtude de suas caractersticas, faz parte de um s plano, que imutvel e eterno (Ef 3.11; Tg 1.1 7). So independentes e no podem ser condicionados de nenhuma maneira (Si 135.6). Tm a ver com as aes de Deus e no com a sua natureza (Rm 3.26). Dentro desses decretos, h as aes praticadas por Deus, pelas quais Ele, embora permita que aconteam, no responsvel. Baseado nessa distino, torna-se possvel concluir que Deus nem o autor do mal... nem a causa do pecado.41

    Essa diferena melhor explicada pelo telogo metodista, Samuel Wakefield. Ele descreve os decretos como sendo os propsitos de Deus ou Sua determinao com respeito a suas criaturas e reconhece-os como sendo eternos, livres e imutveis, mas faz uma distino interessante: ele classifica os decretos em absolutos e condicionais. Os primeiros so aqueles que se relacionam com os eventos da administrao divina que no dependem das aes livres das criaturas morais. J os condicionais so aqueles nos quais Deus respeita as aes livres de Suas criaturas morais. Ele cita o arrependimento, a f e a obedincia como exemplos dessas condies para a salvao do homem.42

    2.3 Objees predestinao

    Solano Portela definiu a predestinao como sendo o aspecto da pr-ordenao de Deus, atravs do qual a salvao do crente considerada efetuada de acordo com a vontade de Deus, que

    41. JOINER, Russell E.. O Deus Verdadeiro. In: Teologia Sistemtica. HORTON, Stanley M. (org.). 1996, CPAD, p. 153.42. WAKEFIELD Apud GARRETT, James Leo. Teologia Sistemtica. 2000, Casa Bautista de Publicaciones, p.452.

    31

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    o chamou e o elegeu em Cristo, para a vida eterna, sendo a sua aceitao VOLUNTRIA, da pessoa e do sacrifcio de Cristo, uma CONSEQUNCIA desta eleio e do trabalho do Esprito Santo, que efetiva esta eleio, tocando em seu corao e abrindo-lhe os olhos para as coisas espirituais.43

    Apesar do esforo de Portela em enfatizar a voluntariedade da aceitao do homem quanto pessoa do salvador e Seu ato sal- vfico pelo pecador arrependido, e de salientar que esta aceitao trata-se de uma consequncia da eleio, a doutrina da eleio incondicional continua a ser, em outras palavras, uma coercitividade divina operada atravs de uma graa supostamente irresistvel - para no dizer imperativa - decretada desde a eternidade.

    A doutrina da predestinao no simplesmente uma das mais difceis de serem abordadas,44 mas uma das mais distorcidas biblicamente, pois acabapor fazer, como observa Wynkoop, do decreto divino a causa primeira da salvao, ao passo que a morte de Cristo torna-se causa secundria e subsidiria, no sendo absolutamente essencial para a salvao, mas um elo de uma corrente predeterminada de eventos.45 como se o sacrifcio de Cristo fosse um evento para cumprir tabela (decreto) e no um ato gracioso de um Deus cuja essncia o amor.

    Muitas so as objees sobre a doutrina da predestinao46 e vale a pena avaliar as principais observaes, comeando por Ar- mnio, que rejeitava o conceito supralapsarianista dos decretos de Deus por quatro razes:

    1) No era sustentado pelas Escrituras: os conceitos deterministas do supralapsarianismo transformam Deus num tirano que faz acepo de pessoas. Esses conceitos esto mais pautados

    43. PORTELA, Solano. Estudo Sobre a Predestinao. Disponvel em: < http:// www.solanoportela.net/artigos/estudo_predestinacao.htm> Acesso em: 12 de Fevereiro de 2014.44. Idem.45. WYNCOOP, Mildred Bangs. Fundamentos da Teologia Arminio Wesleyana. 2004, Casa Publicadora Nazarena, p. 33.46. Para um estudo mais acurado sobre as objees da doutrina da predestinao, ver OLSON, Roger. Sim Para a Eleio; No Para a Dupla Predestinao. In: . Contra o Calvinismo. 2013, Editora Reflexo, pp. 159-210.

    32

  • Vincius Couto

    numa teologia lgica e filosfica dos telogos calvinistas, a quem Olson chama de calvinistas escolsticos,47 do que na prpria Palavra de Deus.

    Em um de seus artigos, Armnio declarou que, a regra da verdade teolgica no deve ser dividida em primria e secundria; una e simples, as Sagradas Escrituras. Para ele, nenhum escrito composto por homens, seja um, alguns ou muitos indivduos, exceo das Sagradas Escrituras [...] est [...] isento de um exame a ser institudo pelas Escrituras, pois elas so a regra de toda a verdade divina, de si, em si e por si mesmas. Portanto, tirania e papismo controlar a mente dos homens com escritos humanos e impedir que sejam legitimamente examinados, seja qual for o pretexto adotado para tal conduta tirnica.48

    2) No havia sido apoiado por cristos doutos e responsveis durante mil e quinhentos anos e nunca fora aceito pela totalidade da Igreja: Wyncoop conta que, em 1589, um leigo instrudo, chamado Koornheert, da Holanda, levantou uma tormenta nos crculos teolgicos por suas dissertaes e escritos em refutao da teoria supralapsariana dos decretos divinos.49 O argumento de Koornheert era que, o ensino supralapsariansta de Beza tornava Deus a causa e o autor do pecado. A exposio brilhante e polmica de Koornheert atraa um nmero cada vez maior de ouvintes e chegou-se a temer que seu pensamento solapasse a estrutura total do calvinismo, bem como a estabilidade poltica dos Pases Baixos. Parecia que nenhum ministro era capaz de refut-lo e, por isso, Armnio foi incumbido desta tarefa. significativo que o tremendo descontentamento gerado com a posio de Calvino e Beza, tenha levado um leigo a fazer tal coisa.50

    Armnio comeou, ento, uma sria reviso da doutrina da predestinao, particularmente na Epstola aos Romanos. Concentrou-se no captulo 9, baluarte calvinista de seu dogma. Porm,

    47. OLSON, Roger. Op. Cit., pp. 466-470.48. Ibid, p. 476.49. WYNCOOP, Mildred Bangs. Op. Cit., p. 52.50. Idem.

    33

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    quanto mais se aprofundava Armnio, mais lhe convencia sua investigao de que o ensinamento de Paulo estava em oposio classe de predestinao que Beza ensinava. Embora Armnio no tivesse abandonado sua crena na predestinao divina, em suas revises, ele percebeu que os judeus criam que eles haviam sido divinamente predestinados para serem salvos e que nada podera mudar este ato. Todavia, a Epstola aos Romanos foi escrita exatamente para mostrar a distino entre a histrica soberania absoluta e as condies da salvao pessoal, a qual sempre pela f, no por decretos.51

    Armnio leu os escritos dos Pais da Igreja. Ele investigou e compilou evidncias demonstrando que nenhum Pai fidedigno, isto , digno de crdito, jamais havia ensinado os critrios de Beza. Ele constatou, ainda, que a dupla predestinao particular de Calvino jamais havia sido oficialmente aceita pela igreja. Para sua surpresa, descobriu que o mesmo Agostinho, no s antes da controvrsia com Pelgio, como principalmente depois, havia ensinado a completa responsabilidade moral.52

    3) Deus se tornava o autor do pecado: Vejamos a seguir as prprias palavras de Armnio sobre esse questionamento:

    De todas as blasfmias que podem proferir-se contra Deus, a mais ofensiva aquela que O declara autor do pecado; o peso dessa imputao aumentado seriamente se lhe agrega que, segundo essa perspectiva, Deus o autor do pecado cometido pela criatura, para poder conden-la e lan-la perdio eterna que lhe havia destinado para ela de antemo, sem ter relao com o pecado. Porque, desse modo, Ele seria a causa da iniquidade do homem para poder infligir o sofrimento eterno... Nada imputar tal blasfmia a Deus, a quem todos concebem como bom... No pode atribuir-se a nenhum dos doutores da Igreja Reformada, que eles abertamente declarem Deus como autor do pecado... No entanto, provvel que al

    51. NICHOLS, James; NICHOLS, Willian (Trad.). The Works of James Arminius. 1875, Thomas Baker, vol. 3, pp. 527ss.52. WYNCOOP, Mildred Bangs. Op. Cit., p. 53.

    34

  • Vincius Couto

    gum possa, por ignorncia, ensinar algo do qual fora possvel, como claro resultado, deduzir que, por essa doutrina, Deus permanea declarado autor do pecado. Se tal for o caso, ento... (os doutores) devem ser admoestados a abandonar e desprezar a doutrina da qual se tem tirado tal inferncia.53

    4) O decreto da eleio se aplicara ao homem ainda no criado: objetivamente falando, se Deus tivesse decretado a eleio antes da queda do homem, ento a queda do homem tinha sido desejada por Ele.54 Por isso Deus teria de ser o autor do pecado! Laurence Vance explica que, segundo esse sistema, Deus primeiramente decidiu eleger alguns homens para o cu e reprovar os outros homens ao inferno, de forma que ao cri-los, ele os fez cair, usando Ado como um bode expiatrio, de forma que parecera que Deus foi gracioso ao enviar os eleitos ao cu e justo ao enviar os reprovados ao inferno. Ele explica, ainda, que a caracterstica distintiva deste esquema seu decreto positivo da reprovao. A reprovao a condenao deliberada, preordena- da, predestinada de milhes de almas ao inferno como resultado do soberano beneplcito de Deus e conforme o conselho da sua vontade55 (Ef 1.11).

    2.4 Objees de John Wesley

    Outro grande expoente da tradio arminiana John Wesley. Ele tinha a salvao da alma humana como tema central dos seus princpios doutrinrios a respeito de Deus, e sendo assim, entendia que, a salvao pela graa atravs da f no permite uma viso da soberania e da justia de Deus que no condiga com a sua misericrdia e o seu amor.56 Veremos que Wesley atacava a

    53. NICHOLS, James; NICHOLS, Willian. Op. Cit., pp. 645-655.54. BERKOUWER, G. C.. Divine Election. 1960, Eerdmans Publishing Co., p. 257.55. VANCE, Laurence M.. Sistemas Lapsrios. In :______. O Outro Lado do Calvi-nismo. Material no publicado. Disponvel em www.arminianismo.com.56. BURTNER, Robert W.; CH1LES, Robert. E. (org.). Coletnea da Teologia de Joo Wesley. 1995, Colgio Episcopal, p. 41.

    35

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    doutrina eleio, visto que esse sistema apresenta uma divindade inconcebivelmente desptica, ao passo que as Escrituras revelam uma concepo de Deus em que o amor o atributo dominante.

    Em sua obra A predestinao calmamente considerada, Wesley faz uma anlise da doutrina citada, baseada nos atributos divinos da sabedoria, justia e misericrdia. No primeiro atributo, ele diz que na multiforme sabedoria de Deus, foram postos diante dos homens a vida e a morte, o bem e o mal e que forar o homem a aceita-lo seria desrespeitar o livre-arbtrio.

    Segundo Wesley, o desejo de Deus que todos os homens sejam salvos, mas no se querendo for-los a isso, querendo-se que todos os homens sejam salvos, mas no como rvores ou pedras, mas como homens, como criaturas inteligentes, dotadas de entendimento para discernir o que bom e de liberdade para aceit-lo ou recus-lo, pois o homem , at certo ponto, um agente livre. Deus quer salvar o homem como homem, no como uma pedra ou uma rvore, isto , um ser sem inteligncia, sem capacidade de raciocnio. Portanto, Deus coloca a vida e a morte perante o homem e ento, sem o forar, o persuade (convence) a escolher a vida.57

    No tocante justia, Wesley argumenta que, Se o homem capaz de escolher entre o bem e o mal, ele se torna um objeto prprio da justia de Deus que o absolve ou o condena, que o recompensa ou pune. Mas se ele no , no se torna objeto daquela. Uma simples mquina no capaz de ser absolvida nem condenada. A justia no pode punir uma pedra por cair ao cho, nem, no nosso plano, um homem por cair no pecado, ele no pode senti-la mais do que a pedra, se ele est, de antemo, condenado. Feitas essas consideraes, ele questiona e reponde ironicamente: ser este homem sentenciado a ir para o fogo eterno preparado para o diabo e os seus anjos por no fazer o que ele nunca foi capaz de evitar? Sim, porque a soberana vontade de Deus. Ento, ele conclui, ou temos achado um novo Deus ou temos feito um! Este no o Deus dos cristos.5857. Ibid, p. 46.58. ibid. pp. 46-47.

    36

  • Vincius Couto

    Finalmente, Wesley encerra sua argumentao se reportando misericrdia divina e faz uma abordagem sarcstica da posio predestinista: Assim Ele gloriosamente distribui o seu amor, su- pondo-se que esse amor recaia em uma dentre dez de suas criaturas, (no podia eu dizer uma dentre cem?), e no se importe com as restantes, que as noventa e nove condenadas peream sem misericrdia; suficiente para Ele amar e salvar a nica eleita. Mas por que tem misericrdia apenas desta e deixa todas aquelas para a inevitvel destruio?, ele questiona. A resposta de um calvinista, obviamente seria baseada na soberania de Deus: Ele o faz porque o quer.59

    Wesley no concebia a ideia de que Deus agisse isoladamente atravs de Sua soberania, pois na disposio do estado eterno dos homens, no somente a soberania, mas a justia, a misericrdia e a verdade mantm as rdeas.60 Se o propsito de Deus em Seus decretos glorificar a si mesmo, qual seria o pronunciamento da humanidade a respeito de um homem que procedesse desse modo? A respeito daquele que, sendo capaz de livrar milhes da morte apenas com um sopro de sua boca, se recusasse a salvar mais do que um dentre cem e dissesse: Eu no fao porque no o quero? Como exaltarmos a misericrdia de Deus se lhe atribumos tal procedimento?.

    Em sua obra, Um pensamento sobre a necessidade, Wesley levanta 7 razes pelas quais a doutrina da predestinao no faz sentido e a primeira delas o questionamento clssico de todo aquele que se depara com tal doutrina. Se existe a eleio, toda a pregao v. desnecessria aos que so eleitos, pois, com ela ou sem ela eles sero infalivelmente salvos. Portanto, o fim da pregao - salvar as almas - destitudo de sentido em relao a eles; e intil queles que no so eleitos, pois, possivelmente, no podero ser salvos. Estes, quer com a pregao ou sem ela, sero infalivelmente condenados,61 afinal j esto predestinados desde a eternidade pelos decretos divinos salvao ou danao.

    59. Ibid, p. 47.60. Ibid, p. 48.61. Idem.

    37

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    2.5 A viso arminiana da eleio

    Visto que seguimos o princpio Sola Scriptura, cremos, como arminianos, na doutrina da eleio, haja vista que, somos eleitos segundo a prescincia de Deus Pai (1 Pe 1.2). Obviamente que, no da mesma forma como os calvinistas, os quais pudemos ver, creem que Deus elegeu pessoalmente cada indivduo que ser salvo ou condenado.

    O arminianismo no nega a doutrina da predestinao, apenas a interpreta de forma diferente. Enquanto o entendimento calvinista parte da escolha pessoal de Deus, em nosso sistema, cremos numa eleio corporativa, ou seja, de que Deus no escolheu as pessoas, mas a Igreja. No os israelitas, mas Israel. No os salvos, mas a salvao. No os redimidos, mas a redeno.

    A predestinao foi definida por Armnio como o decreto eterno e gracioso de Deus em Cristo, pelo qual ele determina justificar e adotar crentes, e os dotar com vida eterna, mas condenar os descrentes e impenitentes. Contudo, tal decreto, (...) no que Deus resolve salvar certas pessoas e, para que Ele possa fazer isso, resolve dota-las com f, mas que, para condenar outros, ele no os dota com f.62

    O Dr. Wiley explica que, a eleio difere da predestinao nisto, que a eleio implica uma escolha, enquanto a predestinao no. A predestinao, por sua vez, conceituada por Wiley como o propsito gracioso de Deus de salvar da runa toda a humanidade. Em outras palavras, trata-se do plano corporativo e condicional de Deus para toda a humanidade. Ele complementa o aspecto condicional da eleio, mostrando que, os eleitos so os escolhidos, no por decreto absoluto, mas por aceitao das condies da chamada.63

    Como vimos no primeiro artigo da remonstrncia, cremos no decreto de que Deus por um eterno e imutvel plano em jesus

    62. ARMINIUS, James. A letter addressed to Hippolytus A. Collibus. In :------ .Works of James Arminius. Volume 2, Christian Classics Ethereal Library, p. 331.63. WILEY, Orton. Introduo Teologia Crist. 2009, Casa Nazarena de Publicaes, pp. 269, 270.

    38

  • Vincius Couto

    Cristo, seu Filho, antes que fossem postos os fundamentos do mundo, determinou salvar, de entre a raa humana que tinha cado no pecado. Todavia, esse plano de redeno condicionado f daqueles que, pela graa do Santo Esprito, isto , no por uma f prpria, mas gerada por Deus mediante sua graa preve- niente (cf Hb 12.2), crerem neste seu Filho e que, pela mesma graa, perseverarem na mesma f e obedincia de f at o fim.

    Em contrapartida, a condenao faz parte do plano de Deus que deixar sob o pecado e a ira os contumazes e descrentes, condenando-os como alheios a Cristo, segundo a palavra do Evangelho dejo 3.36 e outras passagens da Escritura.

    John Wesley classificou a eleio sob dois pontos de vista: um deles, especfico, visando o cumprimento de determinado propsito de Deus e outro macro ou corporativo, como so a salvao e a condenao:

    Creio que a eleio signifique comumente uma destas duas coisas: primeiro, um chamado divino para determinados homens para que realizem uma obra especial no mundo. Creio que esta eleio no seja pessoal, mas absoluta e incondicional. Deste modo, Ciro foi eleito para reconstruir o templo, S. Paulo e os doze para pregarem o evangelho. Mas no vejo nisto qualquer conexo necessria com a felicidade [eterna]. Certamente no existe tal conexo, pois, aquele que eleito neste sentido ainda poder perder-se eternamente (...) Em segundo lugar, creio que esta eleio signifique um chamado divino a certos homens felicidade eterna. Mas creio que esta eleio seja condicional tanto quanto a condenao. Creio que o decreto eterno concernente a ambas esteja expresso nestas palavras: Aquele que cr ser salvo, aquele que no cr ser condenado". Sem dvida, Deus no pode mudar e o homem no pode resistir a este decreto. De acordo com isto, todos os verdadeiros crentes so chamados eleitos nas Escrituras e os descrentes so propriamente condenados, isto , no aprovados por Deus e sem discernimento das coisas espirituais.64

    64. BURTNER, Robert W.; CHILES, Robert. E. (org.). Op. Cit., pp. 51-52.

    39

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    Concluindo essa seo, podemos citar os telogos metodistas Klaiber e Marquardt: a vontade salvfica de Deus no abrange pessoas cuja reao ao Evangelho Deus sabe de antemo. Deus no predetermina, pois, para ele, o mais importante a experincia com o caminho da salvao.65

    2.6 Consideraes finais

    Cremos nos decretos eternos de Deus e que em Sua prescin- cia predestinou o homem para a salvao, porque os que dantes conheceu, tambm os predestinou para serem conformes imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primognito entre muitos irmos (Rm 8.29).

    Cremos, coadunando e complementando o pensamento anterior, que essa eleio foi corporativa, isto , Ele elegeu a Igreja, visto que, nos elegeu [a Igreja] nele antes da fundao do mundo, para sermos santos e irrepreensveis diante dele em amor; e nos predestinou para sermos filhos de adoo por Jesus Cristo, para si mesmo, segundo o beneplcito de sua vontade (Ef 1.5).

    E cremos que atravs da f, operada no sinergismo entre a graa preveniente de Deus e o livre-arbtrio do homem, o ser humano salvo, pois aos que predestinou, a estes tambm chamou; e aos que chamou, a estes tambm justificou; e aos que justificou, a estes tambm glorificou (Rm 8.30).

    Todavia, nossa discusso est apenas comeando. Ser que possvel resistir ao chamado de Deus? Ser que Jesus morreu apenas pelos salvos ou pela humanidade? Ser que o homem tm livre-arbtrio ou livre agncia? Ser que o cristo, verdadeiramente convertido, pode cair da graa? Estes sero assuntos para nossos prximos captulos. At l...

    65. KLAIBER, Walter; MARQUARDT, Manfred. Viver a Graa de Deus: um compndio de teologia metodista. 1999, Editeo, p. 238.

    40

  • CAPTULO 03 Expiao ilimitada

    Vimos no captulo anterior, uma exposio a respeito da doutrina da eleio. Nela, pudemos constatar que, as posies armi- niana e calvinista, diferem-se drasticamente nos conceitos dos decretos de Deus e da predestinao. Para os calvinistas, Deus elegeu aqueles que sero salvos, antes da criao (supralapsaria- nismo) ou depois da queda do homem (infralapsarianismo). Os arminianos, entretanto, creem numa eleio corporativa, isto , Deus escolheu e predestinou a Igreja e no os indivduos. Trata-se de uma eleio com base em Sua prescincia, ao passo que, para os calvinistas, com base em Sua Soberania.

    .A discusso (no no sentido pejorativo da palavra) agora outra: por quem Jesus morreu? Teria o nosso Redentor morrido apenas por aqueles que Ele escolheu desde a eternidade? Ou teria Cristo morrido por toda a humanidade, dando assim, a oportunidade de salvao a todo aquele que crer? Se Ele morreu por toda a humanidade, quais seriam os efeitos dessa obra? Todos seriam salvos ou h condies? Nosso objetivo analisar calmamente, embora no exaustivamente, a doutrina da expiao, de modo que essas perguntas e outras que surgirem no decorrer das anlises, sejam respondidas luz das Escrituras.

    3.1 Artigo II - Remonstrncia

    Que, em concordncia com isso, Jesus Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos e cada um dos homens, de modo que

    41

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    obteve para todos, por sua morte na cruz, reconciliao e remisso dos pecados; contudo, de tal modo que ningum participante desta remisso seno os crentes.

    3.2 O que expiao

    Antes de mais nada, interessante definirmos expiao. Erickson definiu-a como sendo um aspecto da obra de Cristo, e particularmente sua morte, que torna possvel a restaurao da comunho entre indivduos que creem em Deus, alm de se referir ao cancelamento do pecado.66

    Rigsby diz que, a palavra expiar e seus derivados vm de ki- pper (hb.), cujo significado cobrir ou limpar. J nos textos neotes- tamentrios, a palavra expiao praticamente no aparece nas verses em portugus, seno em algumas verses catlicas, na ARC, na ACF e na Bblia Literal do Texto Tradicional Anotada de 2009.67 Na maioria das vezes, as palavras gregas so derivaes de hilaskomai e normalmente elas so traduzidas por sacrifcio, propiciao, propiciatrio e reconciliao.68 Pecota acrescenta, ainda, que o grupo de palavras - tanto hebraicas, quanto gregas - para expiao, possui o sentido de aplacar, pacificar , conciliar ou encobrir com um preo, a fim de remover o pecado ou a ofensa da presena de algum.69

    O telogo metodista do sculo XIX, Richard Watson, definiu expiao como sendo a satisfao oferecida justia divina por meio da morte de Cristo pela humanidade, em virtude do qual todos os verdadeiros penitentes que creem em Cristo so pesso-

    66. ERICKSON, Millard. Dicionrio Popular de Teologia. 2011, Mundo Cristo, p. 77.67. Na verso da CNBB encontramos em Rm 3.25; Hb 2.17; 9.5; 13.11 e em 1 Jo 2.2; 4.10; Na ARC (Almeida Revista e Corrigida), bem como na ACF (Almeida Corrigida Fiel), encontramos apenas em Hb 2.17; Finalmente, na verso da Bblia literal do Texto Tradicional Anotada de 2009, encontramos somente em Rm 5.11.68. RIGSBY, Richard. A Expiao. In: DOCKERY, David S.. Manual Bblico Vida Nova. 2010, Vida Nova, p. 823.69. PECOTA, Daniel. B.. A Obra Salvifica de Cristo. In: Teologia Sistemtica. HORTON, Stanley M. (org.). 1996, CPAD, pp. 352,353.

    42

  • Vincius Couto

    alimente reconciliados com Deus, livrados de toda pena dos seus pecados e feitos merecedores da vida eterna.70

    Falando sobre a universalidade do sacrifcio de Cristo, Thomas Summers, outro telogo metodista do final do sculo XIX, disse que expiao aquela satisfao feita para com Deus pelos pecados de toda humanidade, quer seja pelo pecado original ou pelos pecados atuais, pela mediao de Cristo e, especialmente pela Sua paixo e morte, de maneira que o perdo gratuito a todos.71

    Arminianos e Calvinistas concordam com a ideia da depra- vao total e que, portanto, ramos por natureza filhos da ira (Ef 2.3), no havendo um justo sequer (Rm 3.10,11).72 Sendo assim, somente o sacrifcio de Cristo poderia abrandar ou aplacar a ira de Deus, reconciliando o Criador com a criatura. Desta forma, podemos concluir, como afirma Rigsby, que a ideia que est por trs da palavra expiar reconciliar, pois sem uma ao expiatria, a raa humana est separada de Deus.73 Pelo menos nisso gozamos de unanimidade! A questo divergente entre os sistemas monergista e sinergista, no tocante expiao, est na abrangncia desta.

    Para os calvinistas, ou melhor dizendo, para os calvinistas de cinco pontos,74 a expiao de alcance limitado, isto , somente

    70. WATSON, Richard. Atonement. In :_____ . A Biblical and Theological Dic-tionary. 1832, John Mason, p. 116.71. SUMMERS, Thomas Osmond. A Complete Body ofWesleyan Arminian Divi- nity. 1888, Publishing House of the Methodist Episcopal Church, p. 258,259.72. A doutrina da Depravao Total ainda ser abordada no nosso quarto captulo. Os conceitos so idnticos, mas alguns calvinistas acusam injustamente os arminianos de crerem numa Depravao Parcial, o que est mais para o semi-pelagianismo, conforme teremos a oportunidade de abordar.73. RISGBY, Richard. Op. Cit., p 823.74. A abrangncia da expiao divide a opinio nos crculos calvinistas. Alguns deles no aceitam a limitao do derramamento do Sangue de Cristo e negam o ponto da expiao limitada. Eles so chamados de calvinistas de quatro pontos e apelidados por alguns calvinistas de calvinistas de Natal, em funo do trocadilho Noel (no L), do ingls, que quer dizer "sem o L (o L do Limited Atonement - Expiao Limitada). Podemos citar como calvinistas de 4 pontos, Richard Baxter, Moyse Amyraut, John Davenant, Norman Geisler, Charles C. Ryrie e Lewis Sperry Chafer, dentre outros.

    43

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    para os que foram predestinados para a salvao. Para os armi- nianos, de carter ilimitado, ou seja, Jesus morreu por toda a humanidade. bom que entendamos o que se expressa em cada teologia no tocante a tal abrangncia. Vejamos a seguir.

    3.3 Expiao Limitada na Tradio Monergista75

    A posio calvinista sobre a expiao limitada est delineada na Confisso de f de Westminster:

    O Senhor jesus, pela sua perfeita obedincia e pelo sacrifcio de si mesmo, sacrifcio que pelo Eterno Esprito, ele ofereceu a Deus uma s vez, satisfez plenamente justia do Pai e para todos aqueles que o Pai lhe deu adquiriu no s a reconciliao, como tambm uma herana perdurvel no Reino dos Cus.76

    E no Catecismo de Heidelberg:

    Por que Cristo devia sofrer a morte? Porque a justia e a verdade de Deus exigiam a morte do Filho de Deus; no houve outro meio de pagar nossos pecados.77

    Podemos citar, ainda, o Cnone de Dort, o qual descreve em seu segundo captulo, nove artigos sobre a morte de Cristo e a redeno humana atravs dela. O primeiro artigo mostra que Deus no apenas misericordioso, mas tambm supremamente justo, sendo que sua justia requer que os pecados que cometemos contra sua infinita majestade sejam punidos com punies tanto temporais quanto eternas. No h possibilidade de escapar do juzo de Deus a menos que lhe seja dada uma satisfao (expiao).

    75. Preferi utilizar a expresso tradio monergista porque acho injusto chamar o calvinismo de tradio reformada. Os arminianos creem nos mesmos princpios da Reforma Protestante (os 5 solas) e integram, sem sombra de dvidas, a tradio reformada.76. Confisso de F de Westminster. 2011, Cultura Crist, cap. VIII, pargrafo V.77. Catecismo de Heidelberg. Pergunta e Resposta 40.

    44

  • Vinicius Couto

    Sendo assim, o segundo artigo mostra que, essa satisfao s dada atravs de Cristo.

    A morte do Filho de Deus, diz o terceiro artigo, sacrifcio nico e inteiramente completo, e satisfao pelos pecados; de valor e merecimento infinitos, mais que suficiente para reconciliar os pecados de todo o mundo. Embora parea pender para a expiao ilimitada, o quarto artigo continua o raciocnio do valor do sacrifcio de Cristo, como sendo infinito, em virtude da natureza de quem era sacrificado: o Cristo unignito de Deus - de mesma natureza e essncia eterna e infinita com o Pai e o Esprito Santo - e verdadeira e perfeitamente homem, o qual sem pecado, morreu por nossos pecados.

    O quinto artigo resvala a eleio condicional, quando diz que, promessa do evangelho que todo aquele que crer no Cristo crucificado no perecer, mas ter a vida eterna. Esta promessa, juntamente com o mandamento de arrepender-se e crer, deve ser anunciada e declarada sem diferenciao ou discriminao a todas as naes e povos, a quem Deus em seu bom propsito enviar o evangelho.

    , porm, a partir do sexto artigo que vemos mais claramente as idias predestinistas. tratado aqui do problema da responsabilidade do homem. Verdadeiramente, o calvinismo no nega este fato, porm, o trata de uma forma maquiada, pois o prprio artigo prope que o no arrependimento dos descrentes no se trata de insuficincia ou deficincia do sacrifcio de Cristo, mas da prpria falta dos mpios,78 pois, conforme trata o stimo artigo, somente eleitos desde a eternidade que recebem o dom da f. Ora, se Deus decretou desde a eternidade a reprovao daqueles, no seria a responsabilidade divina ao invs de humana? No foi Deus quem escolheu a quem daria a f e a quem no daria?

    Neste ponto consigo compreender o questionamento de John Wesley: qual seria o pronunciamento da humanidade (...) a res-

    78. Vale a pena ressaltar que, no queremos com isso, criar uma teologia centrada no homem e nem mesmo coloca-lo como merecedor de alguma coisa. A no aceitao do Evangelho por parte dos impios uma prova emprica de que, a graa pode ser resistida e, por isso mesmo que Deus mantm a punio eterna a estes.

    45

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    peito daquele que, sendo capaz de livrar milhes da morte apenas com um sopro de sua boca, se recusasse a salvar mais do que um dentre cem e dissesse: Eu no fao porque no o quero? Como exaltarmos a misericrdia de Deus se lhe atribumos tal procedimento?.79

    O oitavo artigo prope explicar a eficcia do sacrifcio de Cristo:

    Porque este foi o plano soberano e o mui gracioso desejo e inteno de Deus o Pai: que a eficcia vivificante e salvfica da preciosa morte de seu Filho operasse em todos os escolhidos, de modo que pudesse conceder-lhes f justificadora e por meio dela os guiasse infalivelmente salvao. Em outras palavras, foi vontade de Deus que Cristo atravs do sangue na cruz (pelo qual ele confirmou a nova aliana) deveria efetivamente redimir de todos os povos, tribos, naes, e lnguas todos aqueles, e somente aqueles, que foram escolhidos desde a eternidade para salvao e que foram dados a ele pelo Pai...

    O captulo termina com a consumao do plano de Deus, que no pde, no pode e nunca poder ser frustrado. O plano, segundo o ltimo artigo, provm do eterno amor de Deus por seus escolhidos, mas difcil enxergar tal amor com as lentes armi- nianas, pois o critrio dessa eleio vai de encontro com o carter amoroso de Deus. Se admitirmos essa eleio incondicional, teremos de admiti-la como uma acepo soberana de Deus das pessoas.

    3.4 Compreendendo a Expiao Limitada

    Sproul disse que h muita confuso sobre o que a doutrina da expiao limitada realmente ensina 80 Talvez, a pergunta correta para compreendermos tal doutrina, no seja por quem Jesus

    79. BURTNER, Robert W.; CH1LES, Robert. E. (org.). Coletnea da Teologia de Joo Wesley. 1995, Colgio Episcopal, p. 47.80. SPROUL, R. C.. The Truth ojthe Cross. 2007, Reformation Trus: Publishing, p. 142.

    46

  • Vinicius Couto

    morreu?, mas por qu?. Berkhof comenta que, a expiao foi destinada a cumprir trs propsitos, a saber: a afetar a relao de Deus com o pecador, o estado e a condio de Cristo como o Autor Mediatrio da salvao, e o estado e a condio do pecador.81

    Com referncia a Deus, no no sentido de sua natureza ou atributos, visto que imutvel, mas na relao de Deus com as criaturas. Sua ira foi aplacada. Sobre isso, Berkhof diz que a expiao no deve ser entendida como a causa motora do amor de Deus, pois j foi uma expresso do seu amor. Com respeito a Cristo, a expiao assegurou multiforme recompensa. Foi constitudo Esprito vivificante, fonte inexaurvel de todas as bnos da salvao para os pecadores. E, finalmente, no tocante aos homens, a expiao no apenas tornou a salvao possvel, mas garantida queles para os quais estava destinada.

    Todavia, preciso discordar dele, pois a sequencia dos decretos de Deus, segundo a tica calvinista, faz do plano da redeno o cumprimento de um elo predeterminado de uma corrente de eventos. No consigo visualizar um plano de amor, mas um ato mecanicista e deliberadamente soberano. Para que essa lgica irresistvel - como diz Sproul, fazendo aluso a Lutero - faa sentido, preciso que aceitemos que Deus tenha premeditado (predestinao) a queda de Ado, ao invs de t-la previsto (prescincia), o que inevitavelmente tornaria Deus o autor do mal.

    E a posio calvinista realmente no foge do raciocnio anterior. De acordo com Driscoll e Breshears, Deus escolheu certos indivduos para serem recipientes da vida eterna unicamente com base em seu propsito gracioso.82 Os calvinistas entendem por gracioso, o fato de que ningum merece ser salvo. Visto que todos merecem a condenao, um ato gracioso de Deus escolher alguns para serem salvos. Ns concordamos com eles, exceto que, para ns, Deus no escolheu os indivduos, mas deu Seu Filho

    81. BERKHOF, Louis. Teologia Sistemtica. 201 2, Cultura Crist, p. 361.82. DRISCOLL, Mark; BRESHEARS, Gerry. Doctrine: What Christians Should Believe. 2010, Crossway, pp. 267-270.

    47

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    Unignito como propiciao pelos nossos pecados, e no somente pelos nossos, mas tambm pelos do mundo inteiro (1 Jo 2.2).

    Driscoll e Breshears, dizem ainda, que as principais passagens bblicas para a expiao limitada so Mt 1.21; 20.28; 26.28; Jo 10.11, 15, 26-27; 15.3; At 20.28; Rm 5.12-19; 8.32-35; 2 Co 5.15; Ef. 5.25 eTt 2.14.

    Os autores supracitados explicam, na doutrina da expiao limitada, uma segunda vertente calvinista, a qual eles chamam de expiao limitada ilimitada, ou mais tecnicamente, calvinismo modificado. Essa reviso da expiao, se podemos dizer assim, explicada por eles da seguinte forma: ... ao morrer por todos, Jesus comprou todos como sua possesso, e ento aplica seu perdo aos eleitos - aqueles em Cristo - pela graa, e aplica sua ira aos no eleitos - aqueles que rejeitam a Cristo. A concluso disso que, a morte de Jesus foi suficiente para salvar qualquer um, e, (...) eficiente somente para salvar aqueles que se arrependem do seu pecado e confiam nele.

    A meu ver, essa expiao limitada ilimitada trata-se, na verdade, da prpria expiao limitada acrescida da predestinao. Seriam eles calvinistas de quatro pontos ou arminianos enrusti- dos? Veremos mais adiante, a explicao da expiao limitada, mas posso adiantar que, o arminianismo ensina basicamente a mesma coisa (excluindo a predestinao): Jesus morreu por todos, mas isso no quer dizer que Ele salvou a todos (pois isso seria universalismo e est fora de questo). Embora sua morte tenha sido por todos, eficaz apenas para os que se arrependem e creem.

    3.5 A expiao Ilimitada na Tradio Sinergista Temos nas palavras de Armnio:

    Aquele que diz que o Salvador no foi crucificado pela redeno do mundo todo, leva em considerao, no a virtude do sacramento, mas a situao dos incrdulos, visto que o sangue de Cristo o preo pago por todo o mundo. A esse precioso resgate so estranhos aqueles que, estando satisfeitos com seu cativeiro, no tm nenhum desejo de serem redimidos, ou,

    48

  • Vincius Couto

    aps terem sido redimidos, retornam mesma escravido. (...) Em relao extenso e potencialidade do preo e em relao nica causa [geral] da humanidade, o sangue de Cristo a redeno de todo o mundo. Mas aqueles que passam por esta vida sem f em Cristo, sem o sacramento da regenerao, so totalmente estranhos redeno.83

    John Wesley fez suas consideraes no seu famoso sermo Livre Graa:

    E o mesmo Senhor de todos rico em misericrdia para todos os que o invocam (Rm 10.12). Mas voc diz: No, ele to somente para aqueles por quem Cristo morreu. E eles no so todos, mas apenas alguns, a quem Deus escolheu para fora do mundo, porque ele no morreu por todos, mas apenas para aqueles que foram escolhidos nele antes da fundao do mundo (Ef. 1.4). Categoricamente contrria sua interpretao dessas escrituras, tambm, todo o teor do Novo Testamento: como so, particularmente, os textos (...) uma prova clara de que Cristo morreu, no s para aqueles que so salvos, mas tambm para os que perecem: Ele o Salvador do mundo (Jo 4.42). Ele o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo (Jo 1.29). E ele a propiciao pelos nossos pecados, e no somente pelos nossos, mas tambm pelos de todo o mundo (1 Jo 2.2) Ele, o Deus vivo, o Salvador de todos os homens (1 Tm 4.10). Ele deu a si mesmo em resgate por todos (1 Tm 2.6). Ele provou a morte por todos os homens (Hb 2.9).

    O manual da Igreja do Nazareno diz em seu artigo de f sobre a expiao:

    Cremos que Jesus Cristo, pelos Seus sofrimentos, pelo derramamento do Seu prprio sangue e pela Sua morte na Cruz, fez

    83. ARMINIUS, James. Article XII: Christ has died for all men and for everyindividual. In: ._____. Works of Jam es Arminius. Volume i, Christian ClassicsEthereal Lbrary, p. 227.

    49

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    uma expiao completa para todo o pecado humano; e que esta Expiao a nica base de salvao; e que suficiente para cada pessoa da raa de Ado. A Expiao benignamente eficaz para a salvao [dos irresponsveis] daqueles incapazes de assumir responsabilidade moral e para as crianas na idade da inocncia, mas somente eficaz para a salvao daqueles que chegam idade da responsabilidade, quando se arrependem e creem.84

    No vigsimo artigo de f dos cnones da igreja Metodista lemos:

    A oblao de Cristo, feita uma s vez, a perfeita redeno, propiciao e satisfao por todos os pecados de todo o mundo, tanto o original como os atuais, e no h nenhuma outra satisfao pelo pecado, seno essa."85

    H, tambm, artigos de f dos chamados Batistas Gerais, que foram assim chamados em funo da crena na expiao ilimitada. A confisso de f Batista de 1689 foi, inclusive, criada, para diferenciar os gerais (arminianos) dos particulares (calvinistas). Embora eu no tenha conseguido localiza-los, o historiador Batista, W.J. McGlothlin, menciona que, entre os Batistas Gerais foram coletadas sete confisses de f, um Credo Ortodoxo (1677) e trs outras obras sem ttulo.86

    3.6 Expiao Ilimitada

    Vamos comear pelo artigo remonstrante. dito que, Jesus Cristo, o Salvador do mundo, morreu por todos e cada um dos homens.... Enfim, Jesus no morreu por um nmero limitado de pessoas, aquelas que o calvinismo diz que Deus j escolheu desde

    84. Manual da Igreja do Nazareno 2009-20) 3. 2009, Casa Nazarena de Publicaes, p.28.85. Cnones da Igreja Metodista 2007-2011. Captulo 1, artigo 20.86. MCGLOTHLIN, William Joseph. Baptist Confession of Faith. 1911, American Baptist Society, 1911, p. 368.

    50

  • Vincius Couto

    a eternidade. No, Jesus morreu por toda a humanidade. Porque Deus amou o mundo de tal maneira... (Jo 3.16a ~ nfase minha). A palavra mundo ali, kosmon, que pode ser traduzido como planeta, "universo, mundo e habitantes do mundo. No faz sentido Jesus morrer pelo planeta, mas pelas pessoas do planeta sim, portanto, uma expiao ilimitada.

    Essa expiao traz efeitos condicionais para a humanidade,"... de modo que obteve para todos, por sua morte na cruz, reconciliao e remisso dos pecados.... Pedro disse: Assim como no meio do povo surgiram falsos profetas, assim tambm haver entre vs falsos mestres, os quais introduziro, dissimuladamente, heresias destruidoras, at ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou, trazendo sobre si mesmos repentina destruio (2 Pe 2.1 - nfase minha). A palavra resgatou ali, agoradzo, cujo significado literalmente comprar no mercado. a mesma palavra usada em 1 Co 6.20: fostes comprados por bom preo, 1 Co 7.23: Fostes comprados por bom preo e Ap 5.9: ...em Teu sangue nos compraste.... A passagem petrina uma forte aluso no somente expiao ilimitada, mas resistibilidade da graa e perseverana condicional dos santos.

    A universalidade da salvao (no confundir com universalismo), pode ser constatada em passagens das Escrituras como Is 53.6; Jo 1.29; 3.15-17; 2 Co 5.14-15; 1 Tm 2.1-6; 4.10; Tito 2.11; Hb 2; 9 2 Pe 3.9; 1 Joo 2.2; 4.14; Ap. 5.9.

    Embora seja a expiao de Cristo seja ilimitada, isto , para toda a raa humana, limitada condicionalmente, ou eficaz, aos que creem: ...contudo, de tal modo que ningum participante desta remisso seno os crentes. Ou, como disse Joo, ...para que todo aquele que nele cr, no perea, mas tenha a vida eterna (Jo 3.16b). A. T. Robertson complementa: A propiciao operada por Cristo prov salvao para todos (ver Hb 2.9), contanto que se reconciliem com Deus (ver 2 Co 5.19-21).87

    Ao passo que a razo primria da morte de Cristo, torna-se algo mecanicista, o mero cumprimento dos decretos de Deus na

    87. ROBERTSON Apud CHAMPLIN, Russel Norman. O Novo Testamento Interpretado Versculo por Versculo. 1988, Hagnos, vol. 6, p. 234.

    51

  • Introduo Teologia Arminio-Wesleyana

    viso calvinista, para os arminianos, o motivo da expiao encontra-se no amor de Deus88 e do prprio Cristo (cf Rm 5.8; Ef 3.19). Jesus morreu e expiou o pecado da raa humana, como em Ado todos morrem, do mesmo modo em Cristo todos sero vivificados (1 Co 15.22). Isso, entretanto, explica Wiley, no quer dizer que toda a humanidade se salvar incondicionalmente, mas apenas que a oferta sacrificial de Cristo satisfez as pretenses da lei divina, de maneira que tornou a salvao possvel a todos. Dessa forma, a redeno universal ou geral no sentido de proviso, mas especial ou condicional na sua aplicao ao indivduo.89

    Biblicamente, falando, acredito que o versculo-chave para a expiao ilimitada seja 1 Tm 4.10, ao invs de 1 Jo 2.2. Paulo disse que, Deus o Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem. O que Paulo quer dizer, no que todos sero salvos, mas que atravs do ato gracioso de Cristo na cruz, a salvao est disponvel a todos, pois fomos todos comprados por Seu sangue. Apesar de a expiao ser universal, sua eficcia e seus efeitos (regenerao, adoo, justificao e santificao) no se estendem a toda humanidade, mas queles que creem. Por isso a distino paulina entre a humanidade e especialmente os que creem.

    O texto supracitado no necessita de uma exegese baseada na traduo, pois as palavras significam, literalmente, como esto traduzidas. A nica exceo que vale a pena comentar aqui, a palavra creem, cuja forma grega pistn. No lxico de Strong, encontramos que, pistn (4103) e pisteuo (4100), f, vm ambas da raiz pist-, cujo significado persuaso. A palavra pistn pode ser ainda traduzida por fiel, confivel ou crente. Parafraseando e ampliando 1 Tm 4.10, Deus expiou os pecados da humanidade atravs do sacrifcio de Seu Filho Unignito, mas essa expiao eficaz apenas para os crentes fiis, que esto persuadidos a confiarem em Cristo

    88. WILEY, Orton H.. Introduo teologia crist. 2009, Casa Nazarena de publicaes, p. 235.89. Ibid, p. 248.

    52

  • Vincius Couto

    3.7 Consideraes finais

    Voltemos s perguntas da nossa introduo: por quem Jesus morreu? Quais so os efeitos dessa obra? Todos seriam salvos ou h condies? Acredito que, aps as exposies do presente captulo, podemos responder a essas perguntas com embasamento bblico.

    Por quem Jesus morreu? Porque h um s Deus, e um s Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual se deu a si mesmo em resgate por todos, para servir de testemunho a seu tempo (1 Tm 2.5,6 - nfase minha). E ele a propiciao pelos nossos pecados, e no somente pelos nossos, mas tambm pelos de todo o mundo (1 Jo 2.2 - nfase minha).

    Quais so os efeitos dessa obra? Porque se ns, quando ramos inimigos, fomos reconciliados com Deus pela morte de seu Filho, muito mais, estando j reconciliados, seremos salvos pela sua vida (Rm 5.10 - nfase minha). Mas todas as coisas provm de Deus, que nos reconciliou consigo mesmo por Cristo, e nos confiou o ministrio da reconciliao; pois que Deus estava em Cristo reconciliando consigo o mundo, no imputando aos homens as suas transgresses; e nos encarregou da palavra da reconciliao (2 Co 5.18,19 - nfase minha).

    Todos seriam salvos ou h condies? Pois para isto que trabalhamos e lutamos, porque temos posto a nossa esperana no Deus vivo, que o Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem (1 Tm 4.10 - nfase minha). Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho unignito, para que todo aquele que nele cr no perea, mas tenha a vida eterna (Joo 3 .16- nfase minha). E disse-lhes: Ide por todo o mundo, e pregai o evangelho a toda criatura. Quem crer e for batizado ser salvo; mas quem no crer ser condenado (Mc 16.15,16- nfase minha).

    Quem crer ser salvo. Esse um assunto interessante. Pode o homem crer por seu prprio livre-arbtrio? O que livre-arbtrio? O homem tem livre-arbtrio? Ser que ele no tem, na verdade, li

    53

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    vre-agncia? O que livre-agncia? O homem est num estado de depravao total ou parcial? O que depravao total? E parcial? Teremos a oportunidade de falar sobre esses tpicos no nosso prximo captulo. At l...

    54

  • CAPTULO 04 Depravao Total

    J abordamos, em nossos ltimos captulos, dois pontos do arminianismo: o primeiro a respeito da eleio e o segundo sobre a expiao. J foi possvel constatar que, Deus elegeu corporativamente a Igreja e que Jesus morreu por todos, fazendo expiao pelos pecados da humanidade e tornando a salvao potencial. Aquele que crer ser salvo, relatou Marcos, provavelmente sob a superviso de Pedro (Mc 16.16). Essa passagem nos d a ideia de que o homem pode escolher positiva ou negativamente a opo de Deus, pois aquele que no crer ser condenado.

    Como entendermos essa questo? O homem, por si s, realmente tem condies de escolher a Deus? At que ponto os efeitos da queda atingiram a raa humana? O arminianismo ensina o livre-arbtrio e o calvinismo, por sua vez, ensina a livre-agncia. Qual seria a diferena entre as duas terminologias? Veremos, doravante, a explicao da doutrina da depravao total, e as perguntas supracitadas podero ser respondidas no decorrer de nossa exposio.

    4.1 Artigo 111 - Remonstrncia

    Que o homem no possui por si mesmo graa salvadora, nem as obras de sua prpria vontade, de modo que, em seu estado de apostasia e pecado para si mesmo e por si mesmo, no pode pensar nada que seja bom - nada, a saber, que seja verdadeira

    55

  • Introduo Teologia Armnio-Wesleyana

    mente bom, tal como a f que salva antes de qualquer outra coisa. Mas que necessrio que, por Deus em Cristo e atravs de seu Santo Esprito, seja gerado de novo e renovado em entendimento, afeies e vontade e em todas as suas faculdades, para que seja capacitado a entender, pensar, querer e praticar o que verdadeiramente bom, segundo a Palavra de Deus |jo 15.5].

    4.2 Depravao total no Calvinismo

    A palavra depravao, segundo qualquer dicionrio de portugus, significa, nada mais nada menos, do que corrupo ou perverso. a nossa tendncia pecaminosa, nossa inclinao para o mal. a herana de Ado: ...por um s homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado a morte, assim tambm a morte passou a todos os homens, porquanto todos pecaram (Rm 5.12).

    Essa tendncia pecaminosa pode ser vista at mesmo em seres inocentes como as crianas. Qual o pai que ensina seu filho de dois anos a mentir? Mesmo assim, quando tal criana apronta alguma travessura, ela trata logo de mentir para se livrar da bronca. Quem ensina as crianas a serem desobedientes, egostas, briguentas, pirracentas e rebeldes? Entretanto, naturalmente, essas mazelas aparecem livre e espontaneamente, cabendo aos pais educar tais crianas. Chamamos isso de pecado original, ou seja, a herana de Ado.

    Depois da queda,