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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1 Informativo comentado: Informativo 635-STJ Márcio André Lopes Cavalcante ÍNDICE DIREITO AMBIENTAL RESPONSABILIDADE CIVIL Súmula 618-STJ. DIREITO CIVIL BEM DE FAMÍLIA Os direitos do devedor fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em garantia podem receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal. CONTRATOS Reconhecida a coligação contratual, é possível a extensão da cláusula compromissória prevista no contrato principal de abertura de crédito aos contratos de swap. OCUPAÇÃO INDEVIDA DE BEM PÚBLICO Súmula 619-STJ. DIREITO DO CONSUMIDOR PLANO DE SAÚDE Não é abusiva a cláusula de coparticipação para internação superior a 30 dias decorrentes de transtornos psiquiátricos. DIREITO EMPRESARIAL FALÊNCIA É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional. DIREITO PROCESSUAL CIVIL PRESSUPOSTO PROCESSUAL Não há motivo para ser citada a sociedade empresária se todos os sócios fazem parte do processo como parte. HONORÁRIOS PERICIAIS Mesmo que o dispositivo da sentença mencione apenas a condenação em custas processuais, é possível incluir a cobrança dos honorários periciais. RECURSOS É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional. EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista no art. 649, IV do CPC/1973 (art. 833, IV, do CPC/2015).

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 1

Informativo comentado: Informativo 635-STJ

Márcio André Lopes Cavalcante

ÍNDICE DIREITO AMBIENTAL

RESPONSABILIDADE CIVIL Súmula 618-STJ.

DIREITO CIVIL

BEM DE FAMÍLIA Os direitos do devedor fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em garantia podem

receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal. CONTRATOS Reconhecida a coligação contratual, é possível a extensão da cláusula compromissória prevista no contrato principal

de abertura de crédito aos contratos de swap. OCUPAÇÃO INDEVIDA DE BEM PÚBLICO Súmula 619-STJ.

DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Não é abusiva a cláusula de coparticipação para internação superior a 30 dias decorrentes de transtornos

psiquiátricos.

DIREITO EMPRESARIAL

FALÊNCIA É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar

e recuperacional.

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PRESSUPOSTO PROCESSUAL Não há motivo para ser citada a sociedade empresária se todos os sócios fazem parte do processo como parte. HONORÁRIOS PERICIAIS Mesmo que o dispositivo da sentença mencione apenas a condenação em custas processuais, é possível incluir a

cobrança dos honorários periciais. RECURSOS É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar

e recuperacional. EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista no art. 649, IV do CPC/1973 (art. 833, IV, do CPC/2015).

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EXECUÇÃO FISCAL Forma de contagem do prazo da prescrição intercorrente prevista no art. 40, da LEF.

DIREITO PENAL

CONTRABANDO / DESCAMINHO Competência da Justiça Federal.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

COMPETÊNCIA Justiça Federal é competente para julgar venda de cigarro importado, permitido pela ANVISA, desacompanhada de

nota fiscal e sem comprovação de pagamento do imposto de importação.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA TR não pode ser utilizada como índice de correção monetária dos benefícios da previdência privada a partir de

05/09/1996.

DIREITO AMBIENTAL

RESPONSABILIDADE CIVIL Súmula 618-STJ

Súmula 618-STJ: A inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental.

STJ. Corte Especial. Aprovada em 24/10/2018, DJe 30/10/2018.

Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa “XXX”, após vencer a licitação, construiu uma usina hidrelétrica no rio Paranapanema, que faz a divisa dos Estados de São Paulo e Paraná. João é pescador artesanal e vivia da pesca que realizava no rio Paranapanema. Ocorre que, segundo alega João, após a construção da usina, houve uma grande redução na quantidade de peixes existentes no rio, em especial “pintados”, “jaú” e “dourados”. Diante deste fato, João ajuizou ação de indenização contra a empresa sustentando que a construção da usina causou degradação ambiental com terríveis impactos no ecossistema. Na ação, o autor pediu a inversão do ônus da prova mediante a aplicação, por analogia, da regra do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor: (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

É possível a inversão do ônus da prova nas ações em que se pede a reparação econômica pelos danos causados ao meio ambiente? SIM. A inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental. Princípio da precaução Uma das razões que justifica essa inversão do ônus da prova é o princípio da precaução. Por meio do princípio da precaução, entende-se que o meio ambiente deve ter em seu favor o benefício da dúvida no caso de incerteza.

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Em outras palavras, se existe uma desconfiança, um risco de que determinada atividade pode gerar um dano ambiental ao meio ambiente e à saúde humana, deve-se considerar que esta atividade acarreta sim este dano. Logo, é a empresa-ré (empresa poluidora) quem tem o ônus de provar que a atividade econômica por ela desempenhada não gerou o dano ambiental que foi alegado pelo autor na ação de reparação. Nesse sentido:

O princípio da precaução pressupõe a inversão do ônus probatório, competindo a quem supostamente promoveu o dano ambiental comprovar que não o causou ou que a substância lançada ao meio ambiente não lhe é potencialmente lesiva. STJ. 2ª Turma. REsp 1.060.753/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 01/12/2009.

Qual é a consequência prática disso?

O autor precisará provar apenas que existe um nexo de causalidade provável entre a atividade exercida e a degradação ambiental. Sendo isso provado, fica transferido para a concessionária o encargo (ônus) de provar que sua conduta não ensejou riscos ou danos para o meio ambiente. STJ. 3ª Turma. AgInt no AREsp 1311669/SC, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 03/12/2018.

Aquele que cria ou assume o risco de danos ambientais tem o dever de reparar os danos causados e, em tal contexto, transfere-se a ele todo o encargo de provar que sua conduta não foi lesiva. STJ. 1ª Turma. REsp 1.049.822/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 23/04/2009.

Seja o poluidor ente público ou empresa privada Vale ressaltar que essa inversão do ônus da prova ocorre tanto nos casos em que o degradador é uma pessoa jurídica de direito público como também nas hipóteses em que se trata de pessoa jurídica de direito privado. Assim já decidiu o STJ:

A responsabilidade civil pelo dano ambiental, qualquer que seja a qualificação jurídica do degradador, público ou privado, é de natureza objetiva, solidária e ilimitada, sendo regida pelos princípios poluidor-pagador, da reparação in integrum, da prioridade da reparação in natura e do favor debilis, este último a legitimar uma série de técnicas de facilitação do acesso à justiça, entre as quais se inclui a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental. STJ. 2ª Turma. REsp 1.454.281/MG, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 9/9/2016.

Os princípios poluidor-pagador, reparação in integrum e prioridade da reparação in natura e do favor debilis são, por si sós, razões suficientes para legitimar a inversão do ônus da prova em favor da vítima ambiental. STJ. 2ª Turma. AgInt no AREsp 620.488/PR, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 04/09/2018.

Seja em ACP, seja em ação individual Importante também destacar que essa inversão do ônus da prova pode ocorrer tanto em ação civil pública como em ação individual, desde que relacionada com degradação ambiental. A inversão é cabível mesmo que o autor da ação seja o MP A inversão do ônus da prova deve ser também admitida em caso de ação civil pública proposta pelo Ministério Público pedindo a recomposição e/ou a reparação decorrente de degradação ambiental. Isso porque, por mais que o Ministério Público não possa ser considerado hipossuficiente, ele atua em juízo como substituto processual e a vítima (substituída) é toda a sociedade que, em se tratando de dano ambiental, é considerada hipossuficiente do ponto de vista de conseguir produzir as provas. STJ. 2ª Turma. REsp 1235467/RS, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 20/08/2013. Previsão do princípio da precaução O princípio da precaução tem origem na “Carta Mundial da Natureza”, de 1982, cujo princípio n. 11, “b”, estabeleceu a necessidade de os Estados controlarem as atividades potencialmente danosas ao meio ambiente, ainda que seus efeitos não fossem completamente conhecidos.

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Esse princípio foi posteriormente incluído na Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Eco-92). Além desses documentos, o princípio da precaução está contido, implicitamente, no art. 225, § 1º, IV e V, da CF/88:

Art. 225 (...) § 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: (...) IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

Regra de instrução A inversão do ônus da prova de que trata o art. 6º, VIII, do CDC é REGRA DE INSTRUÇÃO, devendo a decisão judicial que determiná-la ser proferida preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurar à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo a reabertura de oportunidade para manifestar-se nos autos. STJ. 2ª Seção. EREsp 422.778-SP, Rel. para o acórdão Min. Maria Isabel Gallotti, julgados em 29/2/2012.

DIREITO CIVIL

BEM DE FAMÍLIA Os direitos do devedor fiduciante sobre o imóvel objeto do contrato de alienação fiduciária em

garantia podem receber a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal

Importante!!!

Os direitos do devedor fiduciante sobre imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária em garantia possuem a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal.

Ex: João fez um contrato de alienação fiduciária para aquisição de uma casa; ele está morando no imóvel enquanto paga as prestações; enquanto não terminar de pagar, a casa pertence ao banco; apesar disso, ou seja, a despeito de possuir apenas a posse, os direitos de João sobre o imóvel não podem ser penhorados porque incide a proteção do bem de família.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.677.079-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

Em que consiste a alienação fiduciária? “A alienação fiduciária em garantia é um contrato instrumental em que uma das partes, em confiança, aliena a outra a propriedade de um determinado bem, ficando esta parte (uma instituição financeira, em regra) obrigada a devolver àquela o bem que lhe foi alienado quando verificada a ocorrência de determinado fato.” (RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Direito Empresarial Esquematizado. São Paulo: Método, 2012, p. 565). Regramento O Código Civil de 2002 trata de forma genérica sobre a propriedade fiduciária em seus arts. 1.361 a 1.368-B. Existem, no entanto, leis específicas que também regem o tema: • alienação fiduciária envolvendo bens imóveis: Lei nº 9.514/97;

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• alienação fiduciária de bens móveis no âmbito do mercado financeiro e de capitais: Lei nº 4.728/65 e Decreto-Lei nº 911/69. É o caso, por exemplo, de um automóvel comprado por meio de financiamento bancário com garantia de alienação fiduciária. Nas hipóteses em que houver legislação específica, as regras do CC-2002 aplicam-se apenas de forma subsidiária:

Art. 1.368-A. As demais espécies de propriedade fiduciária ou de titularidade fiduciária submetem-se à disciplina específica das respectivas leis especiais, somente se aplicando as disposições deste Código naquilo que não for incompatível com a legislação especial.

Resumindo:

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS fungíveis e

infungíveis quando o credor fiduciário for

instituição financeira

Alienação fiduciária de bens MÓVEIS infungíveis

quando o credor fiduciário for pessoa natural ou jurídica

(sem ser banco)

Alienação fiduciária de bens IMÓVEIS

Lei nº 4.728/65 Decreto-Lei nº 911/69

Código Civil de 2002 (arts. 1.361 a 1.368-A)

Lei nº 9.514/97

Alienação fiduciária de bem imóvel Na alienação fiduciária de bem imóvel, alguém (fiduciante) toma dinheiro emprestado de outrem (fiduciário) e, como garantia de que irá pagar a dívida, transfere a propriedade resolúvel de um bem imóvel para o credor, ficando este obrigado a devolver ao devedor o bem que lhe foi alienado quando houver o adimplemento integral do débito. Veja agora o conceito dado pela Lei nº 9.514/97:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Como consequência, ocorre o “desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto da coisa imóvel” (art. 23, parágrafo único). Resolve-se o negócio com pagamento integral da dívida garantida. Imagine a seguinte situação hipotética: João quer comprar uma casa, mas não possui o dinheiro suficiente. Diante disso, ele procurou o Banco “X”, que celebrou com ele contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária. Assim, o Banco “X” emprestou a João o dinheiro suficiente para comprar o imóvel. Como garantia do pagamento do empréstimo, a propriedade resolúvel da casa ficará com o banco e João terá a posse, podendo usar livremente o bem. Diz-se que o banco tem a propriedade resolúvel porque, uma vez pago o empréstimo, a propriedade do imóvel pelo banco “resolve-se” (acaba) e ela passa a pertencer a João. Ficou combinado que a casa seria paga em 120 prestações mensais. João está pagando normalmente as parcelas e encontra-se na 80ª prestação. Execução João emitiu 10 cheques em favor de Pedro, totalizando R$ 100 mil. Ocorre que não havia fundos. Pedro ingressou, então, com execução de título extrajudicial contra João cobrando os cheques. O devedor foi citado, mas não pagou o débito. João não tem nenhum bem em seu nome.

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Diante disso, o juiz determinou a penhora, em favor de Pedro, dos direitos que João (devedor) possui sobre o imóvel alienado fiduciariamente. Assim, a penhora não recaiu sobre a propriedade do imóvel (considerando que João não a tem). A penhora recaiu tão somente sobre os direitos obrigacionais que o devedor fiduciante possui sobre o imóvel. Isso é permitido? SIM. Mesmo sem previsão legal expressa, isso já era permitido na vigência do CPC/1973. Agora, contudo, o CPC/2015 consagrou textualmente essa possibilidade. Confira:

Art. 835. A penhora observará, preferencialmente, a seguinte ordem: (...) XII - direitos aquisitivos derivados de promessa de compra e venda e de alienação fiduciária em garantia;

Vale ressaltar que não se está penhorando o imóvel. O imóvel não pode ser penhorado por dívidas do devedor fiduciante porque o bem não pertence a ele, mas sim à instituição financeira (credor fiduciário). Veja como o STJ separa bem as coisas:

O bem alienado fiduciariamente, por não integrar o patrimônio do devedor, não pode ser objeto de penhora. Nada impede, contudo, que os direitos do devedor fiduciante oriundos do contrato sejam constritos. STJ. 2ª Turma. REsp 1.646.249/RO, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 3/4/2018.

Como a propriedade do bem é do credor fiduciário, não se pode admitir que a penhora em decorrência de crédito de terceiro recaia sobre ele, mas podem ser constritos os direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária. STJ. 4ª Turma. AgInt no AREsp 644.018/SP, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 2/6/2016.

E como isso pode ser útil ao exequente? “Os direitos decorrentes de promessa de compra e venda de unidade imobiliária, ou de alienação fiduciária de bem imóvel podem ser objeto de alienação – algo comum no mercado, e que é negociado por meio de CRIs (certificado de recebíveis imobiliários), negociados em bolsa.” (DELLORE, Luiz. Execução e recursos. Comentários ao CPC de 2015. São Paulo: Método, 2018, p. 260). Impenhorabilidade João alegou que o imóvel que está alienado fiduciariamente é o local onde ele mora com sua esposa. Logo, deve ser considerado bem de família, nos termos do art. 1º da Lei nº 8.009/90. Sendo bem de família, ele é impenhorável (art. 3º da mesma Lei). O juiz negou a liberação da penhora alegando, entre outras razões, que o art. 1º da Lei nº 8.009/90 exige que o imóvel pertença ao devedor, o que não é o caso, considerando que o bem pertence ao banco. Veja a redação da Lei do Bem de Família e o trecho no qual o magistrado se baseou:

Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

João recorreu até que a questão chegou ao STJ. A tese alegada pelo devedor fiduciante foi aceita pelo STJ? SIM.

Os direitos do devedor fiduciante sobre imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária em garantia possuem a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal. STJ. 3ª Turma. REsp 1.677.079-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

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Interpretação literal do dispositivo justificaria a decisão do juiz Realmente, para o reconhecimento da impenhorabilidade do bem de família, a lei exige, em regra, que a propriedade pertença ao casal ou à entidade familiar, pois o legislador utilizou a expressão “imóvel residencial próprio”. Por conseguinte, se o imóvel sobre o qual incidiu a constrição pertence a terceiro não integrante do grupo familiar, este não pode, em regra, alegar a referida proteção legal. Assim, a partir dessa interpretação literal da Lei nº 8.009/90, um dos requisitos para que o imóvel fosse considerado bem de família seria ele pertencer ao casal ou à entidade familiar. Interpretação baseada nos propósitos sociais da Lei Ocorre que não é possível basear-se apenas na interpretação literal do dispositivo, devendo ser considerados os propósitos sociais tutelados pela Lei nº 8.009/90. Assim, levando em consideração esses propósitos sociais, conclui-se que a Lei nº 8.009/90 tem por objetivo proteger a posse da família sobre o imóvel utilizado para a sua moradia, ainda que não tenha o título de propriedade. Essa é a opinião de parcela da doutrina:

“(...) deve prevalecer a interpretação que melhor atenda ao objetivo da legislação em questão, qual seja, o resguardo da moradia onde reside o conjunto familiar, independentemente da natureza do título da ocupação, se propriedade ou posse, pois o benefício patrimonial daí decorrente é mera consequência, e não sua finalidade precípua.” (SANTOS, Marcione Pereira dos. Bem de família: voluntário e legal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 191). “(...) Mas não só a propriedade é protegida pela impenhorabilidade legal; também a posse é abrangida pelo benefício. (...) A expressão 'imóvel residencial próprio', vale dizer, compreende também o imóvel que está sendo adquirido, desde que incontroverso e devidamente registrado o compromisso de compra e venda." (VASCONCELOS, Rita de Cássia Corrêa. A impenhorabilidade do bem de família e as novas entidades familiares. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 48)

Desse modo, a exegese (interpretação) que melhor representa o objetivo da Lei é aquela que entende que a expressão “imóvel residencial próprio” engloba a posse advinda de contrato celebrado com a finalidade de transmissão da propriedade, a exemplo do compromisso de compra e venda ou de financiamento de imóvel para fins de moradia. Isso porque não se pode perder de vista que a proteção abrange o imóvel em fase de aquisição, sob pena de impedir que o devedor adquira o bem necessário à habitação da entidade familiar. No caso, trata-se de contrato de alienação fiduciária em garantia, no qual, havendo a quitação integral da dívida, o devedor fiduciante consolidará a propriedade para si (art. 25, caput, da Lei nº 9.514/97). Assim, havendo a expectativa da aquisição do domínio, deve prevalecer a regra de impenhorabilidade.

CONTRATOS Reconhecida a coligação contratual, é possível a extensão da cláusula compromissória

prevista no contrato principal de abertura de crédito aos contratos de swap

Uma fábrica e um banco celebraram dois contratos:

• ajuste 1: contrato de abertura de crédito (no qual havia uma cláusula compromissória).

• ajuste 2: contrato de swap (no qual não havia cláusula compromissória).

Foi reconhecido que havia coligação contratual entre os dois ajustes, sendo o contrato de swap dependente do contrato de abertura de crédito (ajuste principal).

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Nos contratos coligados, as partes celebram uma pluralidade de negócios jurídicos tendo por desiderato um conjunto econômico, criando entre eles efetiva dependência.

Tendo sido reconhecida a coligação contratual, é possível que a cláusula compromissória prevista no contrato principal (contrato de abertura de crédito) seja estendida ao contrato de swap (dependente). Isso porque ambos são integrantes de uma operação econômica única.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.639.035-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 18/09/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: A Paranapanema S/A é uma sociedade empresária que trabalha com a produção de cobre primário (exs: vergalhões, fios, laminados, barras, tubos, conexões de cobre etc.). Vale ressaltar que se trata de uma companhia com capital aberto comercializando suas ações na BMF Bovespa. A empresa precisa ter acesso rápido a crédito caso necessitasse para fazer suas operações. Por essa razão, celebrou com o Banco Santander S/A um contrato de abertura de crédito no valor de R$ 200 milhões. No contrato de abertura de crédito o banco se obriga a disponibilizar determinada quantia em dinheiro para o contratante que poderá, ou não, utilizar-se desse valor a título de empréstimo. Se o contratante utilizar, depois terá que devolver, com juros e correção monetária. Veja como o conceitua o clássico mestre Fran Martins:

“Entende-se por abertura de crédito o contrato segundo o qual o banco se obriga a pôr à disposição de um cliente uma soma em dinheiro por prazo determinado ou indeterminado, obrigando-se este a devolver a importância, acrescida dos juros, ao se extinguir o contrato.” (MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. 14ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 437).

Parte desse valor emprestado pelo Banco seria pago pela empresa mediante a integralização de ações societárias da devedora (Paranapanema) em favor do banco credor. Em palavras mais simples, o banco, em vez de receber em dinheiro, seria pago com ações da empresa. Cláusula compromissória Vale ressaltar que este contrato de abertura de crédito tinha uma cláusula compromissória. A cláusula compromissória, também chamada de cláusula arbitral, é... - uma cláusula prevista no contrato, - de forma prévia e abstrata, - por meio da qual as partes estipulam que - qualquer conflito futuro relacionado àquele contrato - será resolvido por arbitragem (e não pela via jurisdicional estatal). Exemplo: “Cláusula 5.1.2 Eventuais controvérsias que porventura surgirem na interpretação ou execução deste contrato serão resolvidas por meio de arbitragem, segundo a Lei nº 9.307/96 e o Código de Processo Civil brasileiro (este aplicado de forma apenas subsidiária à Lei de Arbitragem e ao Regulamento da Câmara de Arbitragem).” Contrato de swap Concomitantemente ao contrato de abertura de crédito, a empresa e o Banco celebraram também um contrato de swap. Swap é uma palavra de origem inglesa que significa “troca”, “permuta”. O contrato de swap ocorre quando o contratante “1” assume o risco e a rentabilidade que eram originalmente do contratante “2” e o contratante “2” assume o risco e a rentabilidade que eram originalmente do contratante “1”.

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Exemplo de contrato de swap A empresa “1” exporta produtos do Brasil para o exterior. Assim, ela gasta em “Reais” para produzir e ganha em “dólar”. A empresa “2”, por sua vez, é uma importadora. Logo, ela gasta (compra) em “dólar” e vende (recebe) no Brasil em “reais”. A empresa “1” gastou dinheiro em “real” para produzir seus bens. A empresa “2” gastou dinheiro em “dólar” para comprar seus produtos. Ocorre que, se houver uma variação cambial muito brusca, uma delas vai lucrar muito e a outra vai perder bastante. Em economia, ficar nessa incerteza, não é recomendável. Desse modo, as duas podem minimizar seus riscos, reduzindo em contrapartida os lucros, ao fazerem entre si um contrato de swap. Por meio deste contrato de swap, elas preveem que, se o dólar subir mais que “x%”, a empresa exportadora “1” (que ganharia mais com a valorização da moeda americana), deverá pagar um determinado valor para a empresa “2”. Por outro lado, se o dólar cair mais que “y%”, será a empresa importadora “2” que deverá pagar para a empresa “1”. Assim, ambas se protegem aproveitando a margem de lucro uma da outra em cada cenário. Voltando à nossa situação hipotética: Paranapanema e Santander fizeram um contrato de swap prevendo que se o valor das ações da Paranapanema subisse menos que “x%” no período de 6 meses, a companhia deveria pagar um determinado valor complementar em favor do banco. Por outro lado, se as ações subissem mais que “y%” haveria um abatimento nas prestações seguintes do empréstimo. Com isso, o banco reduziria seu risco de ficar com um “papel” (ações da companhia) sem tanto valor. Por outro lado, a companhia também reduziria seu risco de ter pagado com ações que valiam “x” uma dívida que correspondia a “x” e depois essas ações passaram a valer “4x”, ou seja, ele teria, na prática, pagado 4 vezes mais. Vale ressaltar, contudo, que este contrato de swap não tinha cláusula compromissória. Divergência no contrato de swap O contrato de abertura de crédito não teve qualquer problema. Por outro lado, algum tempo depois, surgiram divergências entre as contratantes quanto ao contrato de swap. Diante disso, a Paranapanema ajuizou ação contra o banco questionando o cumprimento do contrato de swap. O banco, por sua vez, alegou que existe uma coligação entre os dois contratos, sendo que a abertura de crédito é o contrato principal, e o swap é o contrato dependente. Logo, a cláusula compromissória do contrato principal (abertura de crédito) deve se estender para o contrato dependente (swap). A tese do banco foi acolhida pelo STJ? SIM.

Reconhecida a coligação contratual, é possível a extensão da cláusula compromissória prevista no contrato principal de abertura de crédito aos contratos de swap. STJ. 3ª Turma. REsp 1.639.035-SP, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 18/09/2018 (Info 635).

Contratos coligados Conforme explica Carlos Roberto Gonçalves, contratos coligados são aqueles que, embora distintos, estão ligados por uma cláusula acessória, implícita ou explícita.

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Nos contratos coligados, as partes celebram uma pluralidade de negócios jurídicos tendo por desiderato um conjunto econômico, criando entre eles efetiva dependência. Conforme explica Daniel Carnacchioni:

“Nos contratos coligados ou conexos, há a agregação de vários negócios para a viabilização de uma operação econômica. (...) Nos contratos coligados estes são desejados como um todo, pois isoladamente cada contrato não viabilizaria o interesse dos contratantes. Os contratos condicionam-se reciprocamente em sua existência e validade e, agregados, formam uma unidade econômica.” (Manual de Direito Civil. Salvador: JusPodivm, 2017, p. 843).

Interpretação dos contratos coligados Nesse sistema, o contrato reputado como sendo o principal determina as regras que deverão ser seguidas pelos demais instrumentos negociais que a este se ajustam. Nessa ordem de ideias, a cláusula compromissória prevista no contrato principal pode ser estendida para o contrato de swap, considerando que estão vinculados a uma única operação econômica. Princípio da gravitação jurídica Soma-se a isso a incidência do princípio da gravitação jurídica. “Diante do princípio da gravitação jurídica, pelo qual o acessório segue o principal, tudo o que ocorre no contrato principal repercute no acessório. Desse modo, sendo nulo o contrato principal, nulo será o acessório: sendo anulável o principal o mesmo ocorrerá com o acessório; ocorrendo prescrição da dívida do contrato principal, o contrato acessório estará extinto; e assim sucessivamente.” (TARTUCE, Flávio. Teoria Geral dos Contratos e Contratos em espécie. 9ª ed. São Paulo: Método: 2014, p. 37). Desse modo, extraindo-se que, num sistema de coligação contratual, o contrato reputado como sendo o principal determina as regras que deverão ser seguidas pelos demais instrumentos que a este se ajustam, não se mostra razoável que uma cláusula compromissória prevista no contrato principal (contrato de abertura de crédito) não tivesse seus efeitos estendidos ao contrato acessório (contrato de swap).

OCUPAÇÃO INDEVIDA DE BEM PÚBLICO Súmula 619-STJ

Súmula 619-STJ: A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção ou indenização por acessões e benfeitorias.

STJ. Corte Especial. Aprovada em 24/10/2018, DJe 30/10/2018.

Imagine a seguinte situação: No Distrito Federal ainda há alguns terrenos, especialmente em locais mais afastados, que pertencem ao Governo do Distrito Federal e que estão sem edificação ou utilização. Em outras palavras, são áreas de terra sem nada construído ainda. A maioria desses imóveis está em nome da Companhia Imobiliária de Brasília – TERRACAP. A TERRACAP é uma empresa pública que pertence ao DF e tem por objetivo executar as atividades imobiliárias de interesse do Distrito Federal. Imagine que um grupo de pessoas “sem casa” invade um imóvel da TERRACAP.

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Neste lugar, que era apenas um terreno plano, sem qualquer edificação, estes invasores constroem 10 casas, onde passam a morar com as suas famílias. Além disso, fazem também galinheiros e outras benfeitorias, além de plantações de milho, mandioca, feijão, cana e frutas. Esses particulares permanecem no local por mais de 20 anos. A TERRACAP, então, finalmente, decide ingressar com uma ação reivindicatória contra os “invasores”. A partir dessa situação, podemos fazer algumas perguntas: Se os ocupantes da área alegarem, em sua defesa, a existência de usucapião (Súmula 237-STF), este argumento poderá ser acolhido pelo juízo? NÃO. Isso porque o imóvel pertence ao poder público (empresa pública). Trata-se, portanto, de bem público e os bens públicos não estão sujeitos a usucapião, conforme preveem os arts. 183, § 3º e 191, parágrafo único, da CF/88 e o art. 102 do Código Civil. Segundo o art. 98 do Código Civil:

Art. 98. São públicos os bens do domínio nacional pertencentes às pessoas jurídicas de direito público interno; todos os outros são particulares, seja qual for a pessoa a que pertencerem.

Se fôssemos levar em consideração a redação literal do art. 98 do CC, este imóvel não poderia ser considerado como bem público, considerando que a TERRACAP é uma empresa pública (pessoa jurídica de direito privado). No entanto, a doutrina defende que também deve ser considerado bem público aquele pertencente à pessoa jurídica de direito privado que seja prestadora de serviço público quando este bem estiver vinculado à prestação dessa atividade. Nesse sentido: CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de Direito Administrativo. 14ª ed. Salvador: JusPodivm, 2015, p. 391. Esta orientação é acolhida pela jurisprudência, conforme aconteceu quando o STF reconheceu que os bens dos Correios (empresa pública federal) são impenhoráveis:

Os bens, as rendas e os serviços da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos são impenhoráveis e a execução deve observar o regime de precatórios. STF. 1ª Turma. RE 393032 AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgado em 27/10/2009.

Além disso, no caso da TERRACAP, o STJ, há muito tempo, consolidou o entendimento de que seus bens são públicos, considerando que eram bens do Distrito Federal e que foram transferidos à NOVACAP e depois para a TERRACAP a fim de serem administrados descentralizadamente. Logo, permaneceram com a mesma característica:

Os imóveis administrados pela Companhia Imobiliária de Brasília (TERRACAP) são públicos. STJ. 4ª Turma. AgRg no AREsp 762.197/DF, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em 01/09/2016.

Desse modo, os ocupantes terão que realmente deixar o imóvel. No entanto, indaga-se: eles poderão pedir indenização ao Poder Público pelas acessões e benfeitorias que fizeram no imóvel (exs: as casas, os galinheiros, as plantações etc.)? Eles poderão se valer do direito de retenção, permanecendo no imóvel enquanto o Poder Público não pagar a indenização devida? NÃO. Vamos entender com calma os argumentos do STJ: O legislador brasileiro, ao adotar a teoria objetiva de Ihering, definiu a posse como o exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade:

Art. 1.196 do CC. Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.

O art. 1.219 do CC reconheceu, ao possuidor de boa-fé, o direito à indenização pelas benfeitorias úteis e necessárias, além do direito de retenção:

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Art. 1.219. O possuidor de boa-fé tem direito à indenização das benfeitorias necessárias e úteis, bem como, quanto às voluptuárias, se não lhe forem pagas, a levantá-las, quando o puder sem detrimento da coisa, e poderá exercer o direito de retenção pelo valor das benfeitorias necessárias e úteis.

Apesar de o art. 1.219 do CC mencionar apenas “benfeitorias”, a doutrina majoritária e o STJ entendem que o direito de retenção abrange também as acessões (como é o caso de uma casa construída em um terreno). Nesse sentido: STJ. 3ª Turma. Resp 1.316.895/SP, julgado em 11/06/2013. Foi o entendimento consagrado na I Jornada de Direito Civil do CJF/STF:

Enunciado 81: O direito de retenção previsto no art. 1.219 do CC, decorrente da realização de benfeitorias necessárias e úteis, também se aplica às acessões (construções e plantações) nas mesmas circunstâncias.

Aliás, o Código Civil possui um dispositivo semelhante para os casos de construções. Veja:

Art. 1.255. Aquele que semeia, planta ou edifica em terreno alheio perde, em proveito do proprietário, as sementes, plantas e construções; se procedeu de boa-fé, terá direito a indenização. Parágrafo único. Se a construção ou a plantação exceder consideravelmente o valor do terreno, aquele que, de boa-fé, plantou ou edificou, adquirirá a propriedade do solo, mediante pagamento da indenização fixada judicialmente, se não houver acordo.

Mesmo o possuidor de má-fé tem direito à indenização pelas benfeitorias necessárias, não tendo, contudo, direito de retenção:

Art. 1.220. Ao possuidor de má-fé serão ressarcidas somente as benfeitorias necessárias; não lhe assiste o direito de retenção pela importância destas, nem o de levantar as voluptuárias.

E por que os ocupantes do imóvel público não terão direito? Porque o art. 1.219 e demais dispositivos acima transcritos são inaplicáveis aos imóveis públicos. Tais dispositivos não se aplicam ao caso porque os imóveis públicos não admitem a posse privada, mas apenas a mera detenção. O art. 1.196 do CC (veja a redação novamente acima) define o possuidor como aquele que tem, de fato, o exercício de algum dos poderes inerentes à propriedade. Com se sabe, o particular jamais exerce poderes de propriedade sobre o imóvel público porque o imóvel público não pode ser usucapido. O particular, portanto, não poderá ser considerado possuidor de área pública. O nome jurídico da sua relação com o bem público é “detenção”. Assim, o particular que invade um bem público é considerado mero detentor. A mera detenção é um instituto jurídico de natureza precária e que é mais restrito que a posse. Assim, não se confere ao mero detentor os mesmos direitos do possuidor. A doutrina e a jurisprudência entendem que a posse privada do bem público não se coaduna (não se harmoniza) com os princípios da indisponibilidade e da supremacia do interesse público. Veja dois precedentes do STJ que retratam bem este entendimento:

(...) 2. Posse é o direito reconhecido a quem se comporta como proprietário. Posse e propriedade, portanto, são institutos que caminham juntos, não havendo de se reconhecer a posse a quem, por proibição legal, não possa ser proprietário ou não possa gozar de qualquer dos poderes inerentes à propriedade. 3. A ocupação de área pública, quando irregular, não pode ser reconhecida como posse, mas como mera detenção. 4. Se o direito de retenção ou de indenização pelas acessões realizadas depende da configuração da posse, não se pode, ante a consideração da inexistência desta, admitir o surgimento daqueles direitos, do que resulta na inexistência do dever de se indenizar as benfeitorias úteis e necessárias. (...) STJ. 2ª Turma. REsp 863.939/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 04/11/2008.

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Configurada a ocupação indevida de bem público, não há falar em posse, mas em mera detenção, de natureza precária, o que afasta direitos típicos de posseiro. STJ. 2ª Turma. REsp 1762597/DF, Rel. Min. Herman Benjamin, julgado em 16/10/2018.

Mas os invasores estavam de boa-fé... Se o imóvel é público, não interessa a discussão sobre a existência ou não de boa-fé. Isso porque a detenção, mesmo que de boa-fé, não gera indenização por acessões e benfeitorias. Não havendo direito à indenização, por consequência, também não existe direito de retenção. As realizações feitas no imóvel nem geram benefício ao Poder Público Vale ressaltar que, juridicamente, os argumentos acima expostos já seriam suficientes para afastar o direito à indenização e à retenção por parte dos detentores. Ressalte-se, no entanto, que alguns julgados do STJ mencionam ainda outro aspecto: as construções feitas pelos invasores (exs: casas, barracos, galinheiros etc.), não geram qualquer utilidade para o poder público, que terá, ainda, que demolir tudo a fim de permitir que o imóvel seja utilizado para a finalidade ao qual estava prevista (ex: construção de uma repartição pública, de uma praça etc). Assim, seria incoerente impor à Administração a obrigação de indenizar por construções feitas irregularmente no imóvel público, considerando que tais obras não terão qualquer utilidade para o poder público e, ao contrário, gerarão gastos de recursos do erário para a sua demolição. Alguns Ministros chegam a afirmar nos votos que “a indenização, na hipótese, é devida pelo invasor, não pelo Poder Público.” (Min. Herman Benjamin). Mas o Poder Público foi omisso e permitiu que os invasores ficassem anos no local... “O imóvel público é indisponível, de modo que eventual omissão dos governos implica responsabilidade de seus agentes, nunca vantagem de indivíduos às custas da coletividade. Invasores de áreas públicas não podem ser considerados sócios ou beneficiários da omissão, do descaso e da inércia daqueles que deveriam zelar pela integridade do patrimônio coletivo. (...) Entender de modo diverso é atribuir à detenção efeitos próprios da posse, o que enfraquece a dominialidade pública, destrói as premissas básicas do Princípio da Boa-Fé Objetiva, estimula invasões e construções ilegais, e legitima, com a garantia de indenização, a apropriação privada do espaço público. (...) Saliente-se que o Estado pode – e deve – amparar aqueles que não têm casa própria, seja com a construção de habitações dignas a preços módicos, seja com a doação pura e simples de residência às pessoas que não podem por elas pagar. É para isso que existem as Políticas Públicas de Habitação federais, estaduais e municipais. O que não se mostra razoável é torcer as normas que regram a posse e a propriedade para atingir tais objetivos sociais e, com isso, acabar por dar tratamento idêntico a todos os que se encontram na mesma situação de ocupantes ilegais daquilo que pertence à comunidade e às gerações futuras – ricos e pobres.” (Min. Herman Benjamin, no Resp 945.055/DF). Conclusões • A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária. • A mera detenção não confere ao detentor os mesmos direitos do possuidor. • A mera detenção não gera direito de retenção ou de indenização por acessões e benfeitorias realizadas no bem público.

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SITUAÇÕES PECULIARES Existem duas situações peculiares que podem gerar confusão com o tema tratado na Súmula 619, mas que são ligeiramente diferentes. A fim de que você tenha um conhecimento completo sobre o assunto, passo a tratar delas agora. 1) Particular pode ajuizar ação possessória tendo como objeto bem público de uso comum do povo Imagine a seguinte situação hipotética: A empresa “XX” começou a construir uma indústria em um terreno localizado na área rural do Município. Ocorre que a obra avançou sobre uma rua que liga uma comunidade de 12 casas com a avenida principal. Em outras palavras, parte da indústria em construção está invadindo a via de acesso para as casas dos moradores locais. Diante disso, os moradores ajuizaram ação de reintegração de posse contra a empresa alegando que a rua que está sendo invadida representa uma servidão de passagem que dá acesso aos loteamentos há mais de 20 anos. A ré alegou, dentre outros argumentos, que a estrada objeto da controvérsia é bem público municipal de uso comum, não podendo sua proteção possessória ser requerida por particulares. Isso porque os particulares não detêm a posse dos bens públicos, mas sim a mera detenção, que não pode ser tutelada por ações possessórias. A tese da empresa foi acolhida pelo STJ? Não. O STJ decidiu que:

Particulares podem sim ajuizar ação possessória para resguardar o livre exercício do uso de via municipal (bem público de uso comum do povo) instituída como servidão de passagem. STJ. 3ª Turma. REsp 1.582.176-MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 20/9/2016 (Info 590).

Realmente, o STJ possui inúmeros julgados afirmando que a ocupação irregular de bem público dominical não caracteriza posse, mas mera detenção, hipótese que afasta o reconhecimento de direitos em favor do particular com base em alegada boa-fé. Assim, por exemplo, se o particular invade um bem público que não é utilizado para nada (ex: um terreno baldio), a jurisprudência entende que ele não é considerado possuidor, mas mero detentor. Nesse sentido é a Súmula 619-STJ. Logo, o invasor não poderá invocar a proteção possessória contra o Poder Público. Esse entendimento, porém, não se aplica para o caso de um particular que está defendendo seu direito de usar um bem público de uso comum do povo. Aqui a situação é diferente. No caso de bens públicos de uso comum do povo, podemos sim falar em posse e o particular poderá defendê-la em juízo. Desse modo, podemos concluir que: • o ordenamento jurídico não permite que o particular que ocupa um bem público possa pedir proteção possessória contra o Poder Público, considerando que a sua relação com o bem configura mera detenção; • é possível, no entanto, que particulares exerçam proteção possessória para garantir seu direito de utilizar bens de uso comum do povo, como é o caso, por exemplo, da tutela possessória para assegurar o direito de uso de uma via pública. 2) Particular que ocupa bem público dominical poderá ajuizar ações possessórias para defender a sua permanência no local? Imagine a seguinte situação hipotética: João mora em uma chácara há 20 anos. Ele ajuizou ação de reintegração de posse contra Pedro, alegando que o requerido invadiu metade do terreno em que vive. O Distrito Federal pediu a sua intervenção no feito alegando que a chácara em que João mora pertence ao Poder Público, em nome de quem está registrada. Trata-se, portanto, de bem público e, sendo assim, não pode ser objeto de proteção possessória por parte do particular. Isso porque o particular que ocupa um bem público não tem a posse deste imóvel, mas sim a mera detenção.

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A tese do Distrito Federal foi acolhida pelo STJ? NÃO. O STJ entendeu que:

É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares sobre bem público dominical. STJ. 4ª Turma. REsp 1.296.964-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/10/2016 (Info 594).

A jurisprudência sempre entendeu que se o particular ocupa um bem público, não se pode falar, neste caso, em posse, havendo mera detenção. Nesse mesmo sentido é a Súmula 619-STJ. Em suma, o ocupante de bem público é considerado mero detentor da coisa e, por conseguinte, não há que se falar em proteção possessória, nem em indenização por benfeitorias ou acessões realizadas, por configurar desvio de finalidade (interesse particular em detrimento do interesse público), além de violação aos princípios da indisponibilidade do patrimônio público e da supremacia do interesse público. Em razão disso, é juridicamente impossível que um particular que esteja ocupando irregularmente um bem público ajuíze ação de reintegração ou de manutenção de posse contra o Poder Público, por exemplo. Ocorre que o STJ, no REsp 1.296.964-DF, disse que essa posição (invasor como mero detentor) possui uma exceção: se dois particulares estão litigando sobre a ocupação de um bem público, o STJ passou a entender que, neste caso, é possível que, entre eles, sejam propostas ações possessórias (reintegração, manutenção, interdito proibitório). Assim, é cabível o ajuizamento de ações possessórias por parte de invasor de terra pública, desde que contra outros particulares. Existem decisões das duas Turmas do STJ nesse sentido: STJ. 3ª Turma. REsp 1.484.304-DF, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 10/3/2016 (Info 579). STJ. 4ª Turma. REsp 1.296.964-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 18/10/2016 (Info 594). Duas situações Importante destacar mais uma vez que são duas situações que devem ter tratamentos diferentes:

1) particular invade imóvel público e deseja proteção possessória em face do

PODER PÚBLICO:

2) particular invade imóvel público e deseja proteção possessória em face de outro

PARTICULAR:

Não terá direito à proteção possessória. Não poderá exercer interditos possessórios porque, perante o Poder Público, ele exerce mera detenção.

Terá direito, em tese, à proteção possessória. É possível o manejo de interditos possessórios em litígio entre particulares sobre bem público dominical, pois entre ambos a disputa será relativa à posse.

Voltando ao exemplo dado. O argumento invocado pelo Distrito Federal não poderá ser acolhido e o juiz decidirá qual dos dois particulares tem a posse: João ou Pedro. No entanto, se o DF ajuizar uma ação possessória contra João, este poderá invocar que tinha a posse e pedir indenização ou a retenção das benfeitorias realizadas no local? Não. Isso porque, conforme vimos acima, se o litígio for contra o Poder Público, a ocupação de área pública pelo particular será considerada mera detenção, que não gera direitos de indenização ou retenção, não havendo proteção possessória ao particular, neste caso. Assim, o particular tem apenas detenção em relação ao Poder Público, não se cogitando de proteção possessória.

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DIREITO DO CONSUMIDOR

PLANO DE SAÚDE Não é abusiva a cláusula de coparticipação para internação superior a 30 dias

decorrentes de transtornos psiquiátricos

Não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor para a hipótese de internação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos.

Não há abusividade porque o objetivo dessa cobrança é manter o equilíbrio entre as prestações e contraprestações que envolvem a gestão dos custos dos contratos de planos de saúde.

STJ. 2ª Seção. EAREsp 793.323-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/10/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é cliente do plano de saúde ACEM. No contrato assinado existe uma cláusula dizendo que, se o usuário ficar internado por mais de 30 dias para tratamento de transtornos psiquiátricos, 50% do valor das despesas hospitalares e honorários médicos de internação para tratamento psiquiátrico deverão ser custeados pelo paciente e, os outros 50%, pelo plano. Na linguagem dos planos, isso é chamado de coparticipação do usuário. João ajuizou ação contra o plano alegando que esta cláusula seria abusiva, considerando que acarreta desvantagem exagerada do consumidor frente à operadora de plano de saúde, devendo ser considerada nula de pleno direito, com base no art. 51, IV do CDC:

Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

A tese de João foi aceita pelo STJ? Esta previsão é abusiva? NÃO. O STJ decidiu que:

Não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor para a hipótese de internação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos. STJ. 2ª Seção. EAREsp 793.323-RJ, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 10/10/2018 (Info 635).

Espécies de planos de saúde Os planos de saúde podem ser: a) integrais (completos): quando é apenas exigida uma mensalidade fixa do contratante, mas quando este necessita de algum atendimento médico ou hospitalar, não terá que pagar mais nada; b) coparticipativos: são aqueles em que o plano de saúde cobra uma mensalidade reduzida. No entanto, para o contratante utilizar algum serviço médico ou hospitalar, ele terá que pagar um percentual dos custos do procedimento e o plano arca com o restante. Lei nº 9.656/98 permite planos coparticipativos O art. 12, II, “a” da Lei nº 9.656/98 (Lei dos Planos de Saúde), proíbe que as operadoras de plano de saúde limitem o prazo, o valor máximo e a quantidade de cobertura de internações hospitalares.

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Contudo, o art. 16, VIII da mesma Lei, afirma que o contrato poderá exigir do consumidor ou beneficiário um percentual a título de coparticipação para as despesas médica, hospitalar e odontológica. A cautela que a lei impõe é no sentido de que essa exigência deve ser feita com clareza. Percebe-se, assim, que a Lei nº 9.656/98 autoriza, expressamente, a possibilidade de coparticipação do contratante em despesas médicas específicas, desde que figure de forma clara e expressa a obrigação para o consumidor no contrato. Logo, não há ilegalidade na contratação de plano de saúde em regime de coparticipação. Ao contrário, existe até mesmo previsão expressa na Lei (art. 16, VIII, da Lei nº 9.656/98). Sistema de coparticipação reduz valor das mensalidades e estimula a prudência A adoção da coparticipação no plano de saúde implica diminuição do risco assumido pela operadora, o que provoca redução do valor da mensalidade a ser paga pelo usuário que, por sua vez, caso utilize determinada cobertura, arcará com valor adicional apenas quanto a tal evento. O sistema de coparticipação, além de proporcionar mensalidades mais módicas, é uma medida que inibe condutas descuidadas e pródigas do usuário, visto que o uso indiscriminado de procedimentos, consultas e exames afetará negativamente o seu patrimônio. Por essa razão, a coparticipação é conhecida como um “fator de moderação”, servindo como um estímulo para o usuário não use os serviços médicos e hospitais de forma desenfreada, ou seja, serve para que ele os utilize com “moderação”. Limites aos planos coparticipativos É proibida a cláusula de coparticipação em dois casos: 1) quando preveja o financiamento integral do procedimento por parte do usuário; 2) quando representar fator restritor severo ao acesso aos serviços. Tais limitações estão previstas no art. 2º, VII da Resolução nº 8/1998 do CONSU:

Art. 2º Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: (...) VII - estabelecer co-participação ou franquia que caracterize financiamento integral do procedimento por parte do usuário, ou fator restritor severo ao acesso aos serviços;

Não é possível atribuir ao usuário de plano de saúde, sob o disfarce da coparticipação, o custeio da maior parte das despesas médicas, impedindo-o de usufruir dos serviços de assistência à saúde contratados. Ex: seria abusiva a cláusula que previsse que o plano de saúde pagaria 20% do tratamento e o usuário os 80% restantes. Plano coparticipativo e internação No caso de internação, a Resolução do CONSU determina que: • é possível a cláusula de coparticipação; • essa cláusula de coparticipação não poderá, em regra, ser fixada em percentuais (o contrato deverá prever valores prefixados a fim de não surpreender o contratante). • no caso de tratamentos específicos em saúde mental, é possível que a cláusula de coparticipação seja fixada em percentuais. Veja:

Art. 2º Para adoção de práticas referentes à regulação de demanda da utilização dos serviços de saúde, estão vedados: (...)

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VIII - estabelecer em casos de internação, fator moderador em forma de percentual por evento, com exceção das definições específicas em saúde mental.

Assim, o STJ entende que não é abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor, para a hipótese de internação superior a 30 dias decorrentes de transtornos psiquiátricos. Não há abusividade porque o objetivo é justamente manter o equilíbrio entre as prestações e contraprestações que envolvem a gestão dos custos dos contratos de planos de saúde.

DIREITO EMPRESARIAL

FALÊNCIA É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional

Importante!!!

É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional, ainda que não haja previsão específica de recurso na Lei nº 11.101/2005 (LREF).

Fundamento: interpretação extensiva do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.722.866-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: Nata Indústria S/A ingressou com pedido de recuperação judicial. O juiz deferiu o processamento. Durante a tramitação do feito, o juiz proferiu decisão interlocutória determinando que a recuperanda efetuasse o imediato depósito de 40% dos honorários do administrador judicial. Contra esta decisão, a empresa interpôs agravo de instrumento. O TJ não conheceu do recurso, afirmando que não cabe agravo de instrumento contra a decisão do juiz que determina o pagamento da remuneração do administrador judicial. Para o TJ, não cabe agravo de instrumento porque essa situação não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas no art. 1.015 do CPC/2015. Segundo argumentou o Tribunal, as hipóteses elencadas nos incisos I a XI, do art. 1015, do CPC/2015 são taxativas e não admitem interpretação extensiva. Agiu corretamente o TJ? NÃO. CPC é norma geral e se aplica ao processo falimentar de forma subsidiária e supletiva O Código de Processo Civil, na qualidade de lei geral, é aplicável, forma subsidiária e supletiva, para os processos envolvendo falência e recuperação judicial. É o que se conclui pelo art. 1.046, § 2º do CPC/2015:

Art. 1.046. (...) § 2º Permanecem em vigor as disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará supletivamente este Código.

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A Lei nº 11.101/2005, no mesmo sentido, prevê que se aplica o CPC, “no que couber, aos procedimentos” de falência e recuperação judicial. Sistema recursal da Lei de Falência A Lei nº 11.101/2005 trouxe um sistema recursal próprio, prevendo, para diversas situações específicas, o recurso adequado a desafiar o correspondente ato judicial. No entanto, conforme já explicado, o CPC deve incidir também no sistema recursal da Lei de Falência, seja para suprimento, seja para complementação e disciplinamento de lacunas e omissões, desde que, por óbvio, não conflite com a lei especial. Rol do art. 1.015 do CPC/2015 não afasta a incidência das hipóteses previstas na Lei de Falência Existem algumas hipóteses em que a própria Lei nº 11.101/2005 fala que cabe agravo. Exemplo:

Art. 100. Da decisão que decreta a falência cabe agravo, e da sentença que julga a improcedência do pedido cabe apelação.

Essas situações trazidas pela Lei nº 11.101/2005 continuam existindo e não foram afetadas pelo novo CPC, tendo em vista que são previsões de lei específica. O próprio inciso XIII do art. 1.015 do CPC/2015 determina esse “respeito” pelas leis específicas:

Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: XIII - outros casos expressamente referidos em lei.

Assim, havendo disposição expressa da Lei de Recuperação de Empresas e Falência, essa prevalecerá sobre o dispositivo do CPC, de modo que a aplicação desse Código será apenas para suprimento de lacunas e omissões. Hipóteses do art. 1.015 do CPC/2015 podem ser levadas para o processo falimentar ou de recuperação judicial Se a decisão proferida no âmbito falimentar/recuperacional se enquadrar em uma das hipóteses do rol do art. 1.015 do CPC/2015, também será possível o manejo do agravo de instrumento. Parágrafo único do art. 1.015 do CPC/2015 deve ser aplicado às decisões interlocutórias proferidas nos processos de falência e recuperação judicial O art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015 prevê o seguinte:

Art. 1.015 (...) Parágrafo único. Também caberá agravo de instrumento contra decisões interlocutórias proferidas na fase de liquidação de sentença ou de cumprimento de sentença, no processo de execução e no processo de inventário.

Para o STJ, o mesmo raciocínio que inspirou a permissão do agravo de instrumento para o processo de execução e para o processo de inventário, deve ser aplicado para a aplicação deste recurso ao processo falimentar e recuperacional. Veja o que disse o Min. Luis Felipe Salomão:

“Assim como nos procedimentos previstos no parágrafo único em comento, as decisões de maior relevância na recuperação judicial e na falência são tomadas antes da sentença propriamente dita (muitos não aconsideram, inclusive, como de mérito), que, via de regra, se limita a reconhecer fatos e atos processuais firmados anteriormente. Consequentemente, aguardar a análise pelo Tribunal apenas em sede de apelação equivaleria à irrecorribilidade prática da interlocutória, devendo incidir a interpretação extensiva do art. 1.015,

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parágrafo único, do CPC à LREF, sendo que, pela sua natureza, as decisões judiciais proferidas durante seu curso devem ser de logo combatidas.”

Desse modo, o STJ determinou que o parágrafo único do art. 1.015 do CPC deveria ser interpretado extensivamente para abranger também as decisões interlocutórias proferidas nos processos de falência e recuperação judicial. Essa já havia sido a conclusão adotada na I Jornada de Direito Processual Civil do CJF:

Enunciado nº 69: A hipótese do art. 1.015, parágrafo único, do CPC abrange os processos concursais, de falência e recuperação.

Trata-se da opinião manifestada pela imensa maioria da doutrina especializada:

(...) o entendimento correto é no sentido de continuar sendo possível o agravo de instrumento, em todos os casos de decisão interlocutória na LREF, aplicando-se analogicamente ao processo falimentar e recuperacional, a exceção prevista no parágrafo único do art. 1.015 do CPC.” (BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falência. São Paulo: RT, 2018, p. 448)

Em suma:

É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional, ainda que não haja previsão específica de recurso na Lei nº 11.101/2005 (LREF). Fundamento: interpretação extensiva do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015. STJ. 4ª Turma. REsp 1.722.866-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

PRESSUPOSTO PROCESSUAL Não há motivo para ser citada a sociedade empresária se todos os sócios fazem parte do processo como parte

Na ação de cobrança, é desnecessária a citação da sociedade empresária se todos os que participam do quadro social integram a lide.

STJ. 3ª Turma. REsp 1.731.464-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: João, Pedro e Tiago eram sócios em uma sociedade empresária chamada JPT Ltda. João ajuizou ação de cobrança contra os sócios Pedro e Tiago pedindo o pagamento de valores auferidos pela sociedade JPT e que não teriam sido repassados a ele. O juiz julgou o pedido procedente e condenou os réus a pagarem R$ 500 mil em favor do autor. Os réus recorreram alegando a ilegitimidade passiva. Afirmaram que somente a sociedade empresária é responsável e devedora primitiva da obrigação de distribuir lucros e dividendos auferidos. Pediu, portanto, a nulidade do processo. O STJ concordou com a tese do réu? NÃO.

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Embora o autor não tenha requerido a dissolução parcial da sociedade, é certo que ao formular pedido de cobrança de distribuição de lucros e dividendos, ele pretende promover a dissolução da sociedade e a apuração de haveres. Apuração de haveres é o procedimento por meio do qual se calcula o valor devido ao sócio que deixa a sociedade (art. 1.031 do CC e art. 599, III, do CPC/2015) Se todos os sócios já integram a lide, os interesses da sociedade empresária estão representados De acordo com a sistemática prevista pelo CPC/2015, na hipótese de dissolução parcial da com apuração de haveres a sociedade não precisa ser citada se todos os seus sócios o forem. Veja:

Art. 601. Os sócios e a sociedade serão citados para, no prazo de 15 (quinze) dias, concordar com o pedido ou apresentar contestação. Parágrafo único. A sociedade não será citada se todos os seus sócios o forem, mas ficará sujeita aos efeitos da decisão e à coisa julgada.

Ora, se não é necessária a citação da sociedade para dissolução parcial com apuração de haveres, não haveria motivo para reconhecer o litisconsórcio passivo na hipótese de simples cobrança de valores quando todos os sócios foram citados, como ocorre no presente caso. Como a sociedade fica sujeita aos efeitos da decisão que tem apenas as partes como sócios, não haveria razão para anular o feito, sem qualquer prejuízo à sociedade. Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery destacam que o parágrafo único do art. 601 do CPC/2015 segue orientação do STJ segundo a qual não existe litisconsórcio passivo necessário entre a sociedade e os sócios, pois se todos os sócios fazem parte do polo passivo, consideram-se representados os interesses da sociedade (Comentários ao código de processo civil. São Paulo: RT, 2015, p. 1.421). Realmente, mesmo antes do CPC/2015, o STJ assim já decidia:

Na ação de dissolução parcial de sociedade limitada, é desnecessária a citação da pessoa jurídica se todos os que participam do quadro social integram a lide. STJ. 4ª Turma. REsp 1.121.530/RN, Rel. Min. Marco Buzzi, julgado em 13/9/2011.

Logo, não há que se falar em ilegitimidade passiva ou necessidade de litisconsórcio passivo necessário, tendo em conta que, nos termos do art. 601, parágrafo único, do CPC, se todos os sócios já integram a lide, os interesses da sociedade empresária estão representados. Princípio da instrumentalidade das formas Além do mais, o princípio processual da instrumentalidade das formas, sintetizado pelo brocardo pas de nullité sans grief e positivado nos arts. 282 e 283, do CPC/2015, impede a anulação de atos inquinados de invalidade quando deles não tenham decorrido prejuízos concretos. Não se deve declarar a nulidade do processo pois, conforme já explicado, a sociedade empresária fica sujeita aos efeitos da decisão se os sócios fazem parte da lide. Assim, não haveria razão para anular o feito, considerando a ausência de qualquer prejuízo à sociedade. Em suma:

Na ação de cobrança, é desnecessária a citação da sociedade empresária se todos os que participam do quadro social integram a lide. STJ. 3ª Turma. REsp 1.731.464-SP, Rel. Min. Moura Ribeiro, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

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HONORÁRIOS PERICIAIS Mesmo que o dispositivo da sentença mencione apenas a condenação

em custas processuais, é possível incluir a cobrança dos honorários periciais

Importante!!!

A sentença transitou em julgado condenando a parte a pagar "custas processuais", sem falar sobre os honorários periciais. É possível que esses honorários periciais sejam cobrados da parte sucumbente mesmo não tendo sido expressamente mencionados na sentença?

SIM. É adequada a inclusão dos honorários periciais em conta de liquidação mesmo quando o dispositivo de sentença com trânsito em julgado condena o vencido, genericamente, ao pagamento de custas processuais.

STJ. Corte Especial. EREsp 1.519.445-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/09/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: João ajuizou ação de indenização contra Pedro. Durante a instrução, foi realizada uma perícia. Ao final, o juiz julgou o pedido procedente. No dispositivo da sentença constou expressamente que Pedro ficava obrigado a pagar: a) R$ 100 mil de indenização; b) honorários advocatícios de 10% sobre o valor da condenação; c ) custas processuais. João iniciou o cumprimento de sentença e cobrou de Pedro também o valor dos honorários do perito que o autor teve que pagar durante a fase de conhecimento. Pedro defendeu-se alegando que a sentença em nenhum momento o condenou a pagar os honorários do perito. A condenação ficou limitada ao valor principal, mais as custas processuais e honorários advocatícios. Segundo alegou o executado, os honorários periciais estão dentro do conceito de "despesas processuais", o que não se confunde com "custas processuais". Como o juiz mencionou apenas custas, não se pode cobrar as despesas processuais (ex: honorários do perito). Quem tem razão: João (credor) ou Pedro (devedor)? João (credor). É possível sim incluir os honorários periciais caso a sentença tenha falado apenas em custas judiciais. O STJ pacificou o tema em embargos de divergência:

É adequada a inclusão dos honorários periciais em conta de liquidação mesmo quando o dispositivo de sentença com trânsito em julgado condena o vencido, genericamente, ao pagamento de custas processuais. STJ. Corte Especial. EREsp 1.519.445-RJ, Rel. Min. Og Fernandes, Rel. Acd. Min. Nancy Andrighi, julgado em 19/09/2018 (Info 635).

Custas X despesas processuais Realmente, custas e despesas processuais não são expressões sinônimas. Existe diferença entre elas. Despesas processuais são todos os gastos necessários que têm que ser realizados pelos participantes no processo para que este se instaure, desenvolva e chegue ao final. Assim, a expressão “despesas processuais” é gênero, abrangendo três espécies: a) custas: taxa paga como forma de contraprestação pelo serviço jurisdicional que é prestado pelo Estado-juiz;

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b) emolumentos: taxa paga pelo usuário do serviço como contraprestação pelos atos praticados pela serventia (“cartório”) não estatizada (as serventias não estatizadas não são remuneradas pelos cofres públicos, mas sim pelas partes); c) despesas em sentido estrito: valor pago para remunerar profissionais que são convocados pela Justiça para auxiliar nas atividades inerentes à prestação jurisdicional. Exs: honorários do perito, despesas com o transporte do Oficial de justiça prestado por terceiros (ex: empresa de ônibus, táxi etc.). Contudo, o STJ afirma que a interpretação a ser dada tem que superar o apego ao formalismo. O processo deve dar a quem tem direito tudo aquilo e precisamente aquilo a que tem direito. Se a parte ganhou a causa, ou seja, teve seu pedido julgado procedente, ela não pode ser obrigada a arcar com as custas ou despesas de um processo para cuja formação não deu causa. Aquele que vence não deve sofrer prejuízo por causa do processo. Assim, surpreender o vencedor da demanda com a obrigação de arcar com os honorários periciais apenas e tão somente porque a sentença condenava o vencido ao pagamento de “custas”, e não “despesas”, representa medida contrária ao princípio da sucumbência e até mesmo à própria noção da máxima eficiência da tutela jurisdicional justa.

RECURSOS É cabível a interposição de agravo de instrumento contra todas as decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional

Importante!!!

É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em processo falimentar e recuperacional, ainda que não haja previsão específica de recurso na Lei nº 11.101/2005 (LREF).

Fundamento: interpretação extensiva do art. 1.015, parágrafo único, do CPC/2015.

STJ. 4ª Turma. REsp 1.722.866-MT, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/09/2018 (Info 635).

Veja comentários em Direito Empresarial.

EXECUÇÃO Análise da impenhorabilidade prevista no art. 649, IV do CPC/1973 (art. 833, IV, do CPC/2015)

Importante!!!

O art. 649, IV, do CP/1973 previa que as verbas de natureza salarial do executado eram impenhoráveis.

O § 2º do art. 649 previa uma exceção explícita e dizia que era possível a penhora da verba salarial do devedor para pagamento de prestação alimentícia.

O STJ, interpretando esse dispositivo, afirmou que é possível a penhora das verbas salariais do devedor para pagamento de outras dívidas, além da prestação alimentícia, desde que essa penhora preserve um valor que seja suficiente para o devedor e sua família continuarem vivendo com dignidade.

Nas palavras do STJ: a regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. do devedor (art. 649, IV, do CPC/1973) (art. 833, IV, do CPC/2015), também pode ser

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excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família.

Ex: Flávio recebe salário de R$ 30 mil por mês. Ricardo ajuizou execução contra Flávio. O juiz determinou a penhora de 30% do salário de Flávio, todos os meses, até que a dívida que está sendo executada seja paga. O STJ entendeu que essa penhora é válida e que não violou o art. 649, IV, do CPC/1973.

STJ. Corte Especial. EREsp 1.582.475-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 03/10/2018 (Info 635).

Impenhorabilidade dos vencimentos (verbas salariais) do devedor NÃO. O art. 649 do CPC/1973 (art. 833 do CPC/2015) estabelece um rol de bens que não podem ser objeto de penhora. Dentre eles, veja o que diz o inciso IV:

CPC/1973 CPC/2015

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis: (...) IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, (...)

Art. 833. São impenhoráveis: (...) IV - os vencimentos, os subsídios, os soldos, os salários, as remunerações, os proventos de aposentadoria, as pensões, os pecúlios e os montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º;

Exceção explícita a essa impenhorabilidade: pensão alimentícia O § 2º do art. 649 do CPC/1973 trouxe uma exceção expressa à impenhorabilidade. O § 2º disse que era possível a penhora dos vencimentos (verba salarial) do devedor para pagamento de prestação alimentícia:

Art. 649 (...) § 2º O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia.

O CPC/2015 ampliou as exceções e afirmou que é possível a penhora dos vencimentos (verba salarial) do devedor: a) para pagamento de prestação alimentícia (qualquer que seja a sua origem, ou seja, pode ser pensão alimentícia decorrente de poder familiar, de parentesco ou mesmo derivada de um ato ilícito). Ex: Pedro atropelou Júlia e foi condenado a pagar à vítima prestação alimentícia pelo período em que ela ficar sem trabalhar. O salário de Pedro poderá ser penhorado para pagar essa dívida, sem que ele possa invocar a regra da impenhorabilidade. b) sobre o montante que exceder 50 salários-mínimos. Ex: João tem uma conta bancária onde recebe sua remuneração. Como ele gasta pouco, vai guardando o que sobra de seu salário nesta conta. Atualmente, lá tem depositada a quantia equivalente a 70 salários-mínimos. Neste caso, se João sofrer uma execução, será possível penhorar 20 salários-mínimos de sua conta. Veja como é mais abrangente a redação do art. 833, § 2º do CPC/2015:

Art. 833 (...) § 2º O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias

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excedentes a 50 (cinquenta) salários-mínimos mensais, devendo a constrição observar o disposto no art. 528, § 8º, e no art. 529, § 3º.

Discussão quanto à possibilidade de serem aceitas mais exceções que aquela prevista no § 2º do art. 649 Na vigência do CPC/1973, a jurisprudência enfrentou uma interessante discussão: seria possível admitir outras exceções à regra da impenhorabilidade além daquela prevista no § 2º do art. 649? Dizendo de outro modo: seria permitida a penhora das verbas salariais do devedor para outras situações além da prestação alimentícia? A resposta é SIM. O STJ definiu, em embargos de divergência, que é possível a penhora das verbas salariais do devedor para pagamento de outras dívidas, além da prestação alimentícia, desde que essa penhora preserve um valor que seja suficiente para o devedor e sua família continuarem vivendo com dignidade. As palavras do Tribunal foram as seguintes:

A regra geral de impenhorabilidade dos vencimentos do devedor, além da exceção explícita prevista no § 2º do art. 649, IV, do CPC/1973, também pode ser excepcionada quando preservado percentual capaz de manter a dignidade do devedor e de sua família. STJ. Corte Especial. EREsp 1.582.475-MG, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 03/10/2018 (Info 635).

Exemplo Flávio recebe salário de R$ 30 mil por mês. Ricardo ajuizou execução contra Flávio. O juiz determinou a penhora de 30% do salário de Flávio, todos os meses, até que a dívida que está sendo executada seja paga. O STJ entendeu que essa penhora é válida e que não viola o art. 649, IV, do CPC/1973. Nesse sentido:

A regra geral da impenhorabilidade dos valores depositados na conta bancária em que o executado recebe a sua remuneração, situação abarcada pelo art. 649, IV, do CPC/73, pode ser excepcionada quando o montante do bloqueio se revele razoável em relação à remuneração por ele percebida, não afrontando a dignidade ou a subsistência do devedor e de sua família. STJ. 3ª Turma. REsp 1514931/DF, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 25/10/2016.

Assim, podemos dizer o seguinte: • Regra: os salários, vencimentos, proventos de aposentadoria etc. são, como regra geral, impenhoráveis. • Exceção explícita: dívidas de prestação alimentícia (§ 2º do art. 649 do CPC/1973). • Exceção implícita: é permitida a penhora para outras dívidas, desde que a quantia bloqueada se revele razoável em relação à remuneração por recebida pelo executado, não afrontando a dignidade ou a subsistência do devedor e de sua família. Credor também tem direito à tutela jurisdicional efetiva A interpretação do preceito legal deve ser feita a partir da Constituição da República, que veda a supressão injustificada de qualquer direito fundamental. A impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. tem por fundamento a proteção à dignidade do devedor, com a manutenção do mínimo existencial e de um padrão de vida digno em favor de si e de seus dependentes. Por outro lado, o credor tem direito ao recebimento de tutela jurisdicional capaz de dar efetividade, na medida do possível e do proporcional, a seus direitos materiais.

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Executado tem que agir com boa-fé O processo civil em geral, nele incluída a execução civil, é orientado pela boa-fé que deve reger o comportamento dos sujeitos processuais. Embora o executado tenha o direito de não sofrer atos executivos que importem violação à sua dignidade e à de sua família, não lhe é permitido abusar dessa diretriz com o fim de impedir injustificadamente a efetivação do direito material do exequente. “Caso se afirmasse que os vencimentos do devedor, nestes autos, são 100% impenhoráveis, estar-se-ia chancelando o comportamento de qualquer pessoa que, sendo servidor público, assalariado ou aposentado, ainda que fosse muito bem remunerada, gastasse todas as suas rendas e deixasse de pagar todas as suas dívidas, sem qualquer justificativa.” (Min. Benedito Gonçalves). Impenhorabilidade total e absoluta das verbas salariais é desproporcional Só se revela necessária, adequada, proporcional e justificada a impenhorabilidade daquela parte do patrimônio do devedor que seja efetivamente necessária à manutenção de sua dignidade e da de seus dependentes. Assim, a regra geral da impenhorabilidade de salários, vencimentos, proventos etc. (art. 649, IV, do CPC/73) (art. 833, IV, do CPC/2015), pode ser excepcionada quando for preservado percentual de tais verbas capaz de dar guarida à dignidade do devedor e de sua família. CPC/2015 Vale ressaltar que o precedente acima foi proferido tomando-se como base o CPC/1973. Penso, contudo, que é perfeitamente possível aplicar o mesmo entendimento para o art. 833, IV, do CPC/2015, até mesmo porque a redação do § 2º do art. 833 é mais abrangente, conforme já vimos.

EXECUÇÃO FISCAL Forma de contagem do prazo da prescrição intercorrente prevista no art. 40, da LEF

Importante!!!

Termo inicial do prazo de 1 ano: data da intimação da Fazenda Pública

O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei nº 6.830/80 (LEF) tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução.

Sem prejuízo do disposto anteriormente:

1.1) nos casos de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005), depois da citação válida, ainda que editalícia, logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução; e,

1.2) em se tratando de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido na vigência da Lei Complementar nº 118/2005) e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução.

Encerrado o prazo de 1 ano, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional

Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo), durante o qual o

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processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/1980 - LEF, findo o qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato.

Para interrupção do prazo prescricional é necessário requerimento da Fazenda Pública que acarrete efetiva constrição ou efetiva citação

A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera.

Falta de intimação da Fazenda Pública e efetivo prejuízo

A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - Tema 566, onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.

Juiz, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá demonstrar os marcos que foram aplicados na contagem

O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa.

STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

NOÇÕES GERAIS SOBRE A EXECUÇÃO FISCAL

Execução fiscal Execução fiscal é... - a ação judicial proposta pela Fazenda Pública (União, Estados, DF, Municípios e suas respectivas autarquias e fundações) - para cobrar do devedor - créditos (tributários ou não tributários) - que estão inscritos em dívida ativa. Regramento A execução fiscal é regida pela Lei nº 6.830/80 (LEF) e, subsidiariamente, pelo CPC. O procedimento da execução fiscal é especial e bem mais célere que o da execução “comum”. O que é prescrição intercorrente? Prescrição intercorrente é aquela que ocorre durante o processo judicial, em virtude da demora em se prolatar uma decisão, pondo fim à causa.

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“A prescrição intercorrente ocorre no curso do processo e em razão da conduta do autor que, ao não prosseguir com o andamento regular ao feito, se queda inerte, deixando de atuar para que a demanda caminhe em direção ao fim colimado.” (Min. Luis Felipe Salomão). Fundamento A prescrição intercorrente existe em nome da segurança jurídica e tem por objetivo evitar a eternização dos conflitos. Além disso, é um instrumento de racionalidade e economicidade para o Estado, considerando que evita a perenização de demandas que estão fadadas ao insucesso, acarretando apenas gastos desnecessários ao erário. Prescrição intercorrente na execução fiscal x prescrição do crédito tributário A Lei nº 6.830/80 regulamenta, em seu art. 40, a prescrição intercorrente no curso da execução fiscal. Importante esclarecer que não estou falando aqui da prescrição do crédito tributário, ou seja, da prescrição da pretensão do Fisco para ajuizar a execução fiscal. A prescrição tributária (prescrição do crédito tributário) é regida pelo art. 170 do CTN:

Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.

PRESCRIÇÃO ORDINÁRIA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE DA LEF

Consiste na perda do direito de a Fazenda Pública ajuizar a execução fiscal contra o contribuinte cobrando o crédito tributário.

Consiste na extinção da execução fiscal pelo fato de o devedor não ter sido localizado ou de não terem sido encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora.

Ocorre antes do ajuizamento da execução fiscal. Ocorre durante a tramitação da execução fiscal.

O Fisco ficará impedido de ajuizar ação cobrando a dívida tributária.

O processo é extinto e o Fisco ficará impedido de ajuizar nova ação cobrando a dívida.

Abrange apenas créditos tributários. Pode englobar créditos tributários ou não tributários.

A prescrição ordinária é interrompida: • Antes da LC 118/2005: pela citação válida do devedor (por carta, oficial de justiça ou edital). • Depois da LC 118/2005: pelo despacho do juiz que ordenar a citação na execução fiscal.

A prescrição intercorrente é interrompida: a) pela efetiva constrição patrimonial de algum bem que possa servir para o pagamento do crédito; e b) pela efetiva citação do devedor.

Prevista no art. 174 do CTN. Disciplinada no art. 40, § 4º da LEF.

Redação do art. 40 da LEF Antes de prosseguirmos na análise do tema, leia a redação do art. 40 da LEF:

Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição. § 1º Suspenso o curso da execução, será aberta vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública. § 2º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos. § 3º Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução. § 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051/2004)

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§ 5º A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4º deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda. (Incluído pela Lei nº 11.960/2009)

O espírito da Lei de Execuções Fiscais, em seu art. 40, é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais. Nessa lógica, com o intuito de acabar com as execuções fiscais com pouca ou nenhuma probabilidade de êxito, estabeleceu-se então um prazo para que fossem localizados o devedor ou encontrados bens sobre os quais pudessem recair a penhora. Obs: alguns autores e julgados denominam o art. 40 da LEF de “suspensão-crise”. Constitucionalidade Existe uma discussão sobre a constitucionalidade do § 4º do art. 40 da LEF. Os que alegam a sua inconstitucionalidade afirmam que ele tratou sobre prescrição de crédito tributário e que isso somente poderia ser regulamentado por meio de lei complementar, nos termos do art. 146, III, “b”, da CF/88:

Art. 146. Cabe à lei complementar: (...) III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...) b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários;

Esse tema será definido quando o STF julgar o RE 636562/SC, cuja repercussão geral já foi reconhecida, estando aguardando para deliberação do mérito. Por enquanto, prevalece que o dispositivo é constitucional e aplicável. ETAPAS PARA SE ANALISAR O ART. 40 DA LEF

1) Petição inicial A execução fiscal começa com a petição inicial proposta pela Fazenda Pública, que é uma peça processual muito simples, normalmente de uma ou duas páginas, indicando apenas: I - o Juiz a quem é dirigida; II - o pedido; e III - o requerimento para a citação. A petição inicial deverá ser instruída com a Certidão da Dívida Ativa (CDA), que dela fará parte integrante, como se estivesse transcrita. A petição inicial e a CDA poderão constituir um único documento, preparado inclusive por processo eletrônico. 2) Despacho do juiz Se a petição estiver em ordem, o juiz irá proferir um “despacho” deferindo a inicial e determinado que o executado seja citado. 3) Citação do devedor Existe uma ordem de prioridades na citação do executado na execução fiscal. Inicialmente, deve-se tentar a citação pelo correio. Se não for possível, deve-se buscar a citação por Oficial de Justiça. Caso esta também reste infrutífera, realiza-se a citação por edital. Nesse sentido:

Súmula 414-STJ: A citação por edital na execução fiscal é cabível quando frustradas as demais modalidades.

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Vale ressaltar, no entanto, que não é necessário o exaurimento de todos os meios para que o Oficial de Justiça tente localizar o paradeiro do executado para se admitir a citação por edital. O meirinho procura o devedor em seu domicílio fiscal e, se não o encontrar, a citação por edital é possível. A prescrição ordinária é interrompida: • Antes da LC 118/2005: - se o crédito era tributário: a prescrição só se interrompia com a citação válida do devedor (por carta, oficial de justiça ou edital) (com base na redação antiga do art. 174, I, do CTN). - se o crédito era de outra natureza (não tributário): pelo despacho do juiz que ordenar a citação na execução fiscal (com base no art. 8º, § 2º, da LEF).

• Depois da LC 118/2005: tanto no caso de crédito tributário como “não tributário”, a prescrição ordinária é interrompida pelo despacho do juiz que ordenar a citação na execução fiscal. Isso porque a redação do art. 174, I, do CTN foi alterada pela LC 118/2005. 4) Opções do executado: Depois de citado, o executado terá um prazo de 5 dias para adotar uma das seguintes opções: 1º) pagar a dívida cobrada; 2º) garantir a execução; 3º) não pagar nem garantir. 5) Executado não pagou nem garantiu a execução Se o executado não pagar nem garantir a execução, o juiz determinará a penhora de bens. Penhora é o ato pelo qual são apreendidos bens do devedor que serão utilizados para satisfazer o crédito executado. 6) Suspensão da execução O caput do art. 40 afirma que o juiz deverá suspender a execução fiscal se: a) o devedor não foi localizado; ou b) o devedor foi localizado, mas não foram encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora. Enquanto o processo estiver suspenso, não corre o prazo prescricional:

Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.

Obs1: registre-se que o art. 40, caput, da LEF não dá qualquer opção ao Juiz diante da constatação de que não foram encontrados o devedor ou bens penhoráveis. O texto fala claramente que o Juiz “suspenderá” o curso da execução. Obs2: é possível que sejam encontrados bens em nome do devedor, mas que estes sejam impenhoráveis (ex: bem de família, bem danificado, bem de valor irrisório etc). Assim, para que se aplique o art. 40 não se exige a inexistência absoluta de bens. Exige-se que: a) não tenha sido encontrado nenhum bem; ou b) que o(s) bem(ens) encontrado(s) não possa(m) ser penhorado(s). 7) Vista dos autos à Fazenda Pública Depois que o juiz suspender a execução fiscal, ele deverá dar vista dos autos ao representante judicial da Fazenda Pública (§ 1º do art. 40) com o objetivo de que o Fisco seja intimado, ou seja, fique ciente desta decisão e, eventualmente, possa recorrer.

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8) Aguardar 1 ano com o processo suspenso e sem correr prescrição No mesmo dia em que a Fazenda Pública tiver vista dos autos já começa a correr automaticamente o prazo de 1 ano. Essa foi uma das teses definidas pelo STJ:

O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei nº 6.830/80 (LEF) tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução. STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

Obs1: depois que a Fazenda for intimada da localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis, o magistrado deverá proferir um despacho declarando que ocorreu a suspensão da prescrição nos termos do § 1º do art. 40 da LEF. Obs2: vale ressaltar que o processo já está suspenso automaticamente desde o dia da intimação da Fazenda Pública. Assim, não é esse despacho do juiz que suspende o processo. A suspensão ocorre, por força de lei, no dia da intimação. O despacho do juiz declarando ter ocorrido a suspensão da execução ocorre apenas para melhor organização e controle do processo. Exemplo: • no dia 02/02, a Fazenda Pública é intimada de que não foram encontrados bens. • em 04/04, o juiz declara que ocorreu a suspensão da execução. • o prazo de 1 ano já teve início no dia 02/02; esse despacho do dia 04/04 é apenas uma formalidade e tem conteúdo declaratório. Esse entendimento está em harmonia com o teor da Súmula nº 314 do STJ: “Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição quinquenal intercorrente”. Obs3: repito que, neste prazo de 1 ano de suspensão do processo, o prazo prescricional também fica suspenso, ou seja, ainda não está correndo. 9) Fazenda Pública vai em busca de localizar o devedor ou encontrar bens penhoráveis Neste período de 1 ano, a Fazenda Pública tem o ônus de tentar localizar o devedor (se isso ainda não foi feito) ou de localizar bens penhoráveis. Ela fará pesquisa nos bancos de dados governamentais, nos cartórios, nas redes sociais e onde mais puder. • Se a Fazenda Pública encontrar: ela informa ao juiz e o processo que estava suspenso volta a tramitar; • Se a Fazenda Pública não encontrar no prazo de 1 ano: o processo será arquivado e começa a correr o prazo de prescrição intercorrente. 10) Passou o prazo de 1 ano = arquivamento automático dos autos Veja o que diz o § 2º do art. 40:

Art. 40 (...) § 2º Decorrido o prazo máximo de 1 (um) ano, sem que seja localizado o devedor ou encontrados bens penhoráveis, o Juiz ordenará o arquivamento dos autos.

Assim, após o prazo de 1 ano, se a Fazenda Pública não trouxer nenhuma informação que seja eficaz para a retomada da execução, haverá o arquivamento dos autos, sem baixa na distribuição. O processo ficará em um arquivo, mas sem que seja excluído da tramitação no sistema informatizado, ou seja, sem baixa na distribuição.

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O § 2º diz o seguinte: “o Juiz ordenará o arquivamento dos autos”. Desse modo, pela literalidade do dispositivo, seria necessário que o juiz proferisse um comando (despacho ou decisão) determinando o arquivamento dos autos. O STJ, contudo, disse que isso não é necessário. O prazo é ex lege e seu fluxo é automático. Assim, passado o prazo de 1 ano, os autos serão arquivados automaticamente. Veja as palavras do Min. Relator Mauro Campbell:

“A compreensão de que o prazo de suspensão do art. 40, da LEF somente tem início mediante peticionamento da Fazenda Pública ou determinação expressa do Juiz configura grave equívoco interpretativo responsável pelos inúmeros feitos executivos paralisados no Poder Judiciário ou Procuradorias, prolongando indevidamente o início da contagem do prazo da prescrição intercorrente. Essa interpretação equivocada já foi rechaçada no leading case que originou a Súmula n. 314/STJ (EREsp 97.328/PR). Desse modo, havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não decisão judicial nesse sentido (essas decisões e despachos de suspensão e arquivamento são meramente declaratórios, não alterando os marcos prescricionais), inicia-se automaticamente o prazo prescricional de 5 (cinco) anos durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição.”

11) Passou o prazo de 1 ano = arquivamento automático dos autos = início automático da contagem do prazo prescricional Com o arquivamento dos autos, inicia-se automaticamente o prazo da prescrição intercorrente. Qual é esse prazo prescricional? Depende da natureza do crédito exequendo (crédito que está sendo executado). Isso porque na execução fiscal podem ser cobrados “créditos tributários” ou “créditos não tributários”. • Se estiver sendo executado um crédito tributário, o prazo prescricional será de 5 anos, conforme prevê o art. 174 do CTN; • Se estiver sendo executado um crédito não tributário, terá que ser analisado qual é o prazo prescricional previsto na legislação correspondente. Exemplo: • no dia 02/02/2019, a Fazenda Pública é intimada de que não foram encontrados bens. • em 04/04/2019, o juiz declara que ocorreu a suspensão da execução. • o prazo de 1 ano já teve início no dia 02/02/2019. • em 02/02/2020 termina o prazo de 1 ano e, automaticamente, inicia-se a contagem do prazo prescricional. Veja a tese fixada pelo STJ:

Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) (...) STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

Repare, portanto, que o legislador previu duas etapas com dois prazos diferentes:

1ª etapa: suspensão do curso da execução e suspensão do prazo prescricional

2ª etapa: arquivamento dos autos e contagem do prazo prescricional

Duração: 1 ano Duração: o prazo prescricional previsto na lei. • 5 anos (no caso de créditos tributários). • créditos de outra natureza: depende da lei.

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Termo inicial: data em que a Fazenda é intimada da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, caput). Termo final: termina automaticamente depois de 1 ano da intimação (art. 40, §§ 1º e 2º).

Termo inicial: tem início com o fim da primeira parte, ou seja, a segunda parte começa com o fim do prazo de 1 ano da intimação da Fazenda. Termo final: termina automaticamente depois de expirado o prazo prescricional próprio do crédito fiscal em cobrança.

Durante essa primeira parte, a execução fiscal fica suspensa com vista dos autos aberta ao representante judicial da Fazenda Pública.

Nessa segunda parte, a execução fiscal fica arquivada no Poder Judiciário, sem baixa na distribuição.

O fluxo do prazo é automático. O fluxo do prazo também é automático.

Desse modo, na prática, se a Fazenda Pública estiver executando um crédito tributário haverá um prazo de 6 anos contados para que a Fazenda Pública encontre o devedor ou os referidos bens. Esse prazo começa automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido. 12) Interrupção do prazo prescricional Durante o curso do prazo prescricional, a Fazenda Pública deve continuar tentando localizar o devedor ou bens penhoráveis e, se tiver êxito, informa isso ao Juiz e a prescrição pode ser interrompida e a execução retomada. Assim, existem duas causas interruptivas da prescrição: a) a efetiva constrição patrimonial de algum bem que possa servir para o pagamento do crédito; e b) a efetiva citação (ainda que por edital). Essas duas hipóteses estão previstas expressamente no § 3º do art. 40:

Art. 40 (...) § 3º Encontrados que sejam, a qualquer tempo, o devedor ou os bens, serão desarquivados os autos para prosseguimento da execução.

Mera petição da Fazenda Pública não interrompe a prescrição Vale ressaltar, contudo, que a palavra “encontrados” deve ser interpretada à luz do princípio da eficiência. Isso significa que somente haverá a interrupção da prescrição se o devedor ou bem forem encontrados efetivamente pelo Poder Judiciário. Assim, imaginemos que a Fazenda Pública descobre um possível endereço ou bem penhorável e peticiona ao juízo repassando essas informações e requerendo a citação ou a penhora. Essa petição, por si só, não satisfaz o requisito do art. 40, § 3º, da LEF, ou seja, a mera petição da Fazenda Pública não interrompe a prescrição. Para todos os efeitos, o devedor ou os bens ainda não foram encontrados (trata-se de mera indicação). É preciso que a providência requerida ao Poder Judiciário seja frutífera, ou seja, que resulte em efetiva citação ou penhora (constrição patrimonial). A providência deve ser requerida antes de terminar o prazo prescricional, ainda que seja efetivada depois Se a Fazenda Pública peticionou trazendo informações sobre o devedor ou sobre bens penhoráveis antes de esgotado o prazo prescricional e este requerimento foi frutífero/eficiente (conseguiu-se a efetiva citação ou a efetiva constrição patrimonial), considera-se que houve a interrupção da prescrição, mesmo que a providência requerida ao Poder Judiciário tenha ocorrido fora do prazo de 6 anos. Nas palavras do STJ: “A providência requerida ao Poder Judiciário deve resultar em efetiva citação ou penhora constrição patrimonial (isto é: ser frutífera/eficiente), ainda que estas ocorram fora do prazo de 6 (seis) anos.”

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Se a petição da Fazenda foi protocolizada após o prazo de 6 anos não haverá interrupção Vale ressaltar que não é possível interromper a prescrição intercorrente fora do prazo de 6 anos. Isso por conta de um motivo muito simples: não se interrompe aquilo que já acabou. Se o prazo prescricional já foi todo ultrapassado, ele já acabou e a petição apresentada não tem o condão de reabri-lo. Mesmo que a penhora seja depois desconstituída, houve a interrupção Conforme decidiu o STJ, tendo ocorrido a efetiva constrição patrimonial, houve a interrupção, mesmo que, posteriormente, essa penhora seja desconstituída. Assim, não importa, para fins de interrupção, que a penhora (constrição patrimonial) perdure, que o bem penhorado (constrito) seja efetivamente levado a leilão e que o leilão seja positivo. Cumprido o requisito, a prescrição intercorrente se interrompe na data em que protocolada a petição que requereu a providência frutífera. Se a providência requerida for infrutífera Se a providência requerida for infrutífera, decreta-se a prescrição, salvo se o Poder Judiciário excepcionalmente reconhecer a sua culpa. Neste caso, aplica-se o raciocínio da Súmula 106-STJ, o que deve ser averiguado de forma casuística, já que depende de pressupostos fáticos:

Súmula 106-STJ: Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência.

Veja a tese fixada pelo STJ sobre este ponto:

A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera. STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

13) Após o transcurso do prazo prescricional: oitiva da Fazenda e reconhecimento de ofício da prescrição Passado o prazo prescricional sem que tenha havido a sua interrupção, o juiz deve intimar a Fazenda Pública. Após a oitiva, o magistrado poderá, de ofício, decretar a prescrição, extinguindo o processo. Essa é a redação do § 4º do art. 40:

Art. 40 (...) § 4º Se da decisão que ordenar o arquivamento tiver decorrido o prazo prescricional, o juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. (Incluído pela Lei nº 11.051/2004) § 5º A manifestação prévia da Fazenda Pública prevista no § 4º deste artigo será dispensada no caso de cobranças judiciais cujo valor seja inferior ao mínimo fixado por ato do Ministro de Estado da Fazenda. (Incluído pela Lei nº 11.960/2009)

Confira agora a síntese das etapas 10, 11 e 13 acima explicadas:

Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de

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acordo com a natureza do crédito exequendo), durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/1980 - LEF, findo o qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

14) E se o juiz decretar a prescrição sem antes ter intimado a Fazenda Pública? O art. 40, § 4º determina que, antes de o juiz decretar a prescrição intercorrente, ele deverá intimar a Fazenda Pública. No entanto, eventual descumprimento dessa regra deverá ser analisado à luz do princípio da instrumentalidade das formas, previsto no art. 277 do CPC:

Art. 277. Quando a lei prescrever determinada forma, o juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.

Sendo assim, se ao final do referido prazo de 6 anos, contados da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis, a Fazenda Pública for intimada do decurso do prazo prescricional, sem ter sido intimada nas etapas anteriores, terá, nesse momento e dentro do prazo para se manifestar (que pode ser inclusive em sede de apelação), a oportunidade de providenciar a localização do devedor ou dos bens e apontar a ocorrência no passado de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Esse entendimento é o que está conforme o comando contido no art. 40, § 3º, da LEF. Por outro lado, caso a Fazenda Pública não faça uso dessa prerrogativa, deve ser reconhecida a prescrição intercorrente. O mesmo raciocínio é aplicável caso se entenda que a ausência de intimação das etapas anteriores tem enquadramento nos arts. 280 e 281 do CPC. Isto porque o princípio da instrumentalidade das formas recomenda que a Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 278 do CPC), ao alegar a nulidade pela falta de intimação, demonstre o prejuízo que sofreu, e isso somente é possível se houver efetivamente localizado o devedor ou os bens penhoráveis, ou tenha ocorrido qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Em suma, o STJ entende que somente deverá ser decretada a nulidade pela ausência de intimação se a Fazenda Pública, ao vir nos autos alegar essa nulidade, demonstrar a ocorrência de prejuízo. Veja a tese fixada sobre este ponto:

A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu. Assim, a Fazenda deverá demonstrar que havia uma causa interruptiva ou suspensiva da prescrição que ela poderia ter alegado. Exceção. Existe uma situação na qual a Fazenda Pública não precisará demonstrar prejuízo: se ela não foi intimada da falta de localização de devedores ou bens penhoráveis (art. 40, caput). Isso porque o prazo de 1 ano somente começa a ser contado na data em que a Fazenda Pública é intimada. Logo, esta é uma situação de prejuízo presumido. STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

15) Sentença do juiz decretando a prescrição Transcorrido o período prescricional e constatada a falta de efetividade do exequente, será reconhecida a prescrição. Esse transcurso do prazo é automático. Vale ressaltar, no entanto, que o magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa.

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Com isso, restará a possibilidade de o exequente, intimado da decisão que reconheceu a prescrição intercorrente, utilizar-se dos meios recursais cabíveis para questionar a contagem dos marcos legais indicados na decisão judicial e demonstrar eventual equívoco do ato judicial impugnado. A tese foi fixada nos seguintes termos:

O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. STJ. 1ª Seção. REsp 1.340.553-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 12/09/2018 (recurso repetitivo) (Info 635).

Agradecimento Agradeço ao amigo Felipe Duque pela troca de ideias e pelas valiosas contribuições.

DIREITO PENAL

CORRUPÇÃO PASSIVA Chamada curta sobre o julgado

O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a solicitação ou recebimento de vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público, mas que, em razão da função pública, materialmente implicam alguma forma de facilitação da prática da conduta almejada.

Ao contrário do que ocorre no crime de corrupção ativa, o tipo penal de corrupção passiva não exige a comprovação de que a vantagem indevida solicitada, recebida ou aceita pelo funcionário público esteja causalmente vinculada à prática, omissão ou retardamento de “ato de ofício”.

A expressão “ato de ofício” aparece apenas no caput do art. 333 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção ativa, e não no caput do art. 317 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção passiva. Ao contrário, no que se refere a este último delito, a expressão “ato de ofício” figura apenas na majorante do art. 317, § 1.º, do CP e na modalidade privilegiada do § 2.º do mesmo dispositivo.

STJ. 6ª Turma. REsp 1.745.410-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Laurita Vaz, julgado em 02/10/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: Gilberto era funcionário da “Avitation Ltda.”, uma empresa privada concessionária do uso de área destinada a carga e descarga de aeronaves no Aeroporto Internacional de São Paulo. Gilberto trabalhava no local controlando as cargas que vinham nas aeronaves. Housseim, fugindo das autoridades do Líbano, fugiu daquele país em um avião de carga e chegou no Aeroporto de São Paulo. Ele foi encontrado por Gilberto, tendo oferecido ao brasileiro R$ 1 mil para que ele o ajudasse a ingressar no país, sem ser visto pela Polícia Federal. Gilberto aceitou a proposta, mas foi flagrado pelas câmeras do aeroporto e preso pela Polícia Federal. O Ministério Público Federal denunciou Gilberto pela prática de corrupção passiva, delito tipificado no art. 312 do Código Penal e Housseim pela prática de corrupção ativa (art. 333 do CP):

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Art. 317. Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

O juiz absolveu os réus sob o argumento de que Gilberto não detinha competência para permitir a entrada de estrangeiro, circunstância que excluiria os crimes. O magistrado afirmou que controlar a entrada dos estrangeiros no Brasil não era um “ato de ofício” de Gilberto e, portanto, faltou um elemento objetivo dos tipos acima descritos. A questão chegou até o STJ. O concordou com o entendimento do magistrado? NÃO, com relação a Gilberto. SIM, no que tange à Husseim. Vamos entender com calma. Corrupção passiva não exige que o ato que o agente prometeu praticar esteja dentro de suas competências formais Ao se ler o art. 317 do CP percebe-se que o agente deve ter solicitado ou recebido a vantagem “em razão” da sua função. Isso não significa, contudo, que o ato que ele prometeu praticar deve estar dentro das competências formais do agente. Assim, para a configuração do delito de corrupção passiva exige-se apenas que haja um nexo causal entre a oferta (ou promessa) de vantagem indevida e a função pública exercida. Em outras palavras, o agente recebeu “em razão” da função que ele exerce. No entanto, não é necessário que o ato esperado pelo agente esteja dentro das competências formais do agente. Nesse sentido foi o voto da Ministra do STF Rosa Weber no Inq 4506, julgado em 17/04/2018. Exigência de “ato de ofício” aparece apenas para o crime de corrupção ativa No crime de corrupção ativa, exige-se a prática de “ato de ofício”. Veja:

Corrupção ativa Art. 333. Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

Assim, a expressão “ato de ofício” aparece apenas no caput do art. 333 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção ativa, e não no caput do art. 317 do CP, como um elemento normativo do tipo de corrupção passiva. Ao contrário, no que se refere a corrupção passiva, a expressão “ato de ofício” figura apenas na majorante do art. 317, § 1º, do CP e na modalidade privilegiada do § 2º do mesmo dispositivo, o que reforça a ideia de que o caput do art. 317 do CP não exige ato de ofício:

Art. 317 (...) § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional.

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 38

§ 2º - Se o funcionário pratica, deixa de praticar ou retarda ato de ofício, com infração de dever funcional, cedendo a pedido ou influência de outrem: Pena - detenção, de três meses a um ano, ou multa.

Não foi atecnia do legislador, mas sim opção legislativa No caso de crime de corrupção passiva (art. 317 do CP), o legislador não praticou uma atecnia, ou falou menos do que desejava. Houve, na verdade, uma nítida opção legislativa direcionada a ampliar a abrangência da incriminação por corrupção passiva, quando comparada ao tipo de corrupção ativa, a fim de potencializar a proteção ao aspecto moral do bem jurídico protegido (a probidade da Administração Pública). Princípios da proporcionalidade e da isonomia Se, na corrupção passiva, fosse exigido que o ato prometido pelo funcionário público fosse um “ato de ofício”, haveria uma afronta aos princípios da proporcionalidade e da isonomia. Afinal, como bem pontuou o Min. Luís Roberto Barroso por ocasião do julgamento do Inq 4.506/DF, exigir nexo de causalidade entre a vantagem e ato de ofício de funcionário público levaria à absurda consequência de admitir, por um lado, a punição de condutas menos gravosas ao bem jurídico, enquanto se nega, por outro, sanção criminal a manifestações muito mais graves da violação à probidade pública: “o guarda de trânsito que pede dinheiro para deixar de aplicar uma multa seria punível, mas o senador que vende favores no exercício do seu mandato passaria impune”. Expressão “em razão dela” não exige que o ato tenha relação com a competência funcional do agente O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a solicitação ou recebimento de vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público, mas que, em razão da função pública, materialmente implicam alguma forma de facilitação da prática da conduta almejada. Foi o caso de Gilberto que recebeu a vantagem indevida para facilitar a entrada do estrangeiro em razão da função que desempenhava, apesar disso não estar dentro das suas competências formais (não era um “ato de ofício”). Em outros termos: “Para a aptidão de imputação de corrupção passiva, não é necessária a descrição de um específico ato de ofício, bastando uma vinculação causal entre as vantagens indevidas e as atribuições do funcionário público, passando este a atuar não mais em prol do interesse público, mas em favor de seus interesses pessoais” (STF. 1ª Turma. Inq 4.506, Rel. p/acórdão Min. Roberto Barroso, publicado em 04/09/2018). Conclusões 1ª) não tem razão o Ministério Público quando pleiteia a condenação de Housseim, pois o tipo penal a ele imputado, de fato, exige que a vantagem indevida seja oferecida ou prometida para determinar que funcionário público pratique, omita ou retarde ato de ofício, isto é, que está dentro de suas atribuições funcionais formais. Como Gilberto não tinha competência para realizar controle imigratório no Aeroporto Internacional de São Paulo/SP, Housseim não ofereceu nem prometeu vantagem indevida a funcionário público para que ele praticasse “ato de ofício”. 2ª) tem razão o Ministério Público quando pleiteia a condenação de Gilberto. Isso porque:

O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a solicitação ou recebimento de vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público, mas que, em razão da função pública, materialmente implicam alguma forma de facilitação da prática da conduta almejada.

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 39

STJ. 6ª Turma. REsp 1.745.410-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, Rel. Acd. Min. Laurita Vaz, julgado em 02/10/2018 (Info 635).

Mas... para condenar por corrupção passiva não se exige que também se condene pela corrupção ativa? NÃO. Prevalece o entendimento de que, via de regra, os crimes de corrupção passiva e ativa, por estarem previstos em tipos penais distintos e autônomos, são independentes, de modo que a comprovação de um deles não pressupõe a do outro. STJ. 5ª Turma. RHC 52.465-PE, Rel. Min. Jorge Mussi, julgado em 23/10/2014 (Info 551) Veja como o tema já foi cobrado em prova: • (Promotor MP/SC 2014) É possível, segundo entendimento doutrinário predominante, a ocorrência do crime de corrupção ativa sem que existe simultaneamente o cometimento de corrupção passiva, pois são condutas independentes. (certo) • (DPE/MS 2012) Não há possibilidade de ocorrer corrupção ativa sem a correspondente corrupção passiva. (errado)

CONTRABANDO / DESCAMINHO Competência da Justiça Federal

Importante!!!

Compete à Justiça Federal a condução do inquérito que investiga o cometimento do delito previsto no art. 334, § 1º, IV, do Código Penal, na hipótese de venda de mercadoria estrangeira, permitida pela ANVISA, desacompanhada de nota fiscal e sem comprovação de pagamento de imposto de importação.

STJ. Plenário. CC 159.680-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 08/08/2018 (Info 631).

Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de contrabando e de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta.

STJ. 3ª Seção. CC 160.748-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/09/2018 (Info 635).

Veja comentários em Direito Processual Penal.

DIREITO PROCESSUAL PENAL

COMPETÊNCIA Justiça Federal é competente para julgar venda de cigarro importado, permitido pela ANVISA, desacompanhada de nota fiscal e sem comprovação de pagamento do imposto de importação

Importante!!!

Compete à Justiça Federal a condução do inquérito que investiga o cometimento do delito previsto no art. 334, § 1º, IV, do Código Penal, na hipótese de venda de mercadoria estrangeira, permitida pela ANVISA, desacompanhada de nota fiscal e sem comprovação de pagamento de imposto de importação.

STJ. Plenário. CC 159.680-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 08/08/2018 (Info 631).

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Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de contrabando e de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta.

STJ. 3ª Seção. CC 160.748-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/09/2018 (Info 635).

Imagine a seguinte situação hipotética: João é camelô em Belo Horizonte e na sua barraca foram encontrados diversos pacotes de cigarro, da marca “Fume Bien”, disponíveis para venda. Os cigarros “Fume Bien” são oriundos do Paraguai e fazem muito sucesso no Brasil em razão de seu preço ser bem mais barato que os nacionais. São normalmente vendidos, clandestinamente, no mercado informal. Os cigarros da marca “Fume Bien” são aprovados pela ANVISA e, portanto, podem ser importados e comercializados no Brasil, desde que cumpridas as obrigações tributárias. Vale ressaltar, no entanto, que João não possuía nota fiscal dos cigarros apreendidos em sua posse. João confessou que adquiriu os cigarros de Pedro, um rapaz que também mora em Belo Horizonte e fornece mercadorias para os camelôs. Qual foi o crime, em tese, praticado por João? Descaminho, na figura equiparada prevista no art. 334, § 1º, IV, do CP (descaminho por assimilação):

Art. 334. Iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria. Pena - reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos. § 1º Incorre na mesma pena quem: (...) IV - adquire, recebe ou oculta, em proveito próprio ou alheio, no exercício de atividade comercial ou industrial, mercadoria de procedência estrangeira, desacompanhada de documentação legal ou acompanhada de documentos que sabe serem falsos.

Em que consiste o crime de descaminho? “Iludir” = “frustrar”. Esse é o sentido utilizado pelo tipo penal. Assim, iludir o pagamento do imposto significa “frustrar o pagamento do imposto”. O crime pode ocorrer em duas situações: • quando a pessoa traz para o Brasil (importa) uma mercadoria permitida, mas, ao fazê-lo, engana as autoridades e com isso não paga (ilude) o imposto devido; ou • quando a pessoa manda para fora do Brasil (exporta) uma mercadoria permitida, mas, ao fazê-lo, engana as autoridades e com isso não paga (ilude) o imposto devido. Obs: quando o tipo fala em imposto ou direito devido pelo “consumo de mercadoria”, ele está se referindo ao Imposto sobre Produtos Industrializados. O IPI também é conhecido, por razões históricas, como “imposto sobre o consumo”. Um dos fatos geradores do IPI é o desembaraço aduaneiro de produtos industrializados de procedência estrangeira (art. 46, I, do CTN). Algumas características do descaminho: • Impostos que o tipo penal visa proteger: imposto de importação (II), imposto de exportação (IE) e imposto sobre produtos industrializados (IPI). • Sujeito passivo: o Estado (mais especificamente a União, considerando que os impostos devidos nas operações de importação e exportação são federais). • Elemento subjetivo: dolo (não admite forma culposa). • Consumação: trata-se de crime formal. Para que seja proposta ação penal por descaminho, não é necessária a prévia constituição definitiva do crédito tributário. Não se aplica a SV 24 (Não se tipifica crime material contra a ordem tributária, previsto no artigo 1º, incisos I a IV, da Lei nº 8.137/90, antes do lançamento definitivo do tributo).

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 41

• A competência para julgar o delito é da Justiça Federal, considerando que é praticado em detrimento de interesse da União na arrecadação dos impostos. • Em termos territoriais, a competência será da seção judiciária onde os bens foram apreendidos, não importando o local por onde entraram no país (no caso de importação) ou de onde seguiriam para o exterior (na hipótese de exportação). Tal entendimento está cristalizado em enunciado do STJ:

Súmula 151-STJ: A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens.

Figuras equiparadas O § 1º do art. 334 prevê condutas equiparadas a descaminho. Em outras palavras, são situações nas quais o agente não é punido por ter importado ou exportado mercadoria iludindo o pagamento de imposto, mas sim por ter praticado uma conduta relacionada com a prática de descaminho. As figuras previstas no § 1º do art. 334 do CP são chamadas de “descaminho por assimilação”. Art. 334, § 1º, IV Trata-se de uma forma específica de receptação (art. 180 do CP). Se a pessoa aceita adquirir, receber ou ocultar, no exercício de atividade comercial ou industrial, uma mercadoria de procedência estrangeira sem os documentos que atestam que ela foi introduzida regularmente ou com documentos falsos, essa pessoa está fomentando o crime de descaminho. Este inciso pune a pessoa que pratica atividade comercial ou industrial envolvendo mercadoria de procedência estrangeira, que foi trazida para o Brasil de forma clandestina (sem que as autoridades soubessem) ou fraudulenta (enganando as autoridades). Voltando ao nosso exemplo: o inciso IV do § 1º do art. 334 fala em “exercício de atividade comercial”. João pode ser acusado deste delito mesmo tendo apenas uma barraca de camelô? Isso é considerado atividade comercial? SIM. Veja o que diz o § 2º do art. 334 do CP:

Art. 334 (...) § 2º Equipara-se às atividades comerciais, para os efeitos deste artigo, qualquer forma de comércio irregular ou clandestino de mercadorias estrangeiras, inclusive o exercido em residências.

Assim, não há dúvida de que a mercadoria é estrangeira, que João exercia atividade comercial (ainda que na informalidade) quando foi encontrada em sua posse, e que não apresentou a nota fiscal correspondente à sua aquisição.

Por que João não responde pelo caput do art. 334 do CP? Porque, no caso concreto, não ficou demonstrado nenhum indício de que ele tenha, de alguma maneira, participado da importação dos cigarros. Ele responderia pelo caput se tivesse importado os cigarros ou, de alguma forma, concorrido para esta importação (ex: fornecido dinheiro para que alguém trouxesse os cigarros do Paraguai).

Por que João não responde por contrabando? Antes de responder, é necessário relembrar as principais diferenças entre contrabando e descaminho:

CONTRABANDO DESCAMINHO

Tipificado no art. 334-A do CP. Tipificado no art. 334 do CP.

Consiste em “importar ou exportar mercadoria proibida”.

Consiste em “iludir, no todo ou em parte, o pagamento de direito ou imposto devido pela entrada, pela saída ou pelo consumo de mercadoria”

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 42

Corresponde à conduta de importar ou exportar mercadoria PROIBIDA. Obs: essa proibição pode ser absoluta ou relativa.

Corresponde à entrada ou à saída de produtos PERMITIDOS, todavia elidindo o pagamento do imposto devido. É a fraude utilizada para iludir o pagamento de impostos relacionados com a importação ou exportação de produtos.

NÃO é uma espécie de crime tributário. É uma espécie de crime tributário.

Bem jurídico: a moralidade administrativa, a saúde e a segurança pública. O bem juridicamente tutelado vai além do mero valor pecuniário do imposto elidido, alcançando também o interesse estatal de impedir a entrada e a comercialização de produtos proibidos em território nacional.

Bem jurídico protegido: interesse do Estado na arrecadação dos tributos. Além disso, alguns autores apontam que este crime também protege o controle estatal das importações e das exportações.

É INAPLICÁVEL o princípio da insignificância. Exceção: contrabando de pequena quantidade de medicamento para uso próprio (STJ EDcl no AgRg no REsp 1708371/PR).

APLICA-SE o princípio da insignificância se o valor do tributo cujo pagamento foi iludido não superar R$ 20 mil (posição majoritária).

NÃO admite suspensão condicional do processo (a pena é de 2 a 5 anos).

Admite suspensão condicional do processo (a pena é de 1 a 4 anos).

João não praticou contrabando porque a comercialização do cigarro da marca “Fume Bien” é permitida no Brasil. Logo, não se trata de mercadoria proibida. No entanto, para que essa venda ocorresse, seria necessário que o comerciante recolhesse os tributos devidos. Como não o fez, responde por descaminho por equiparação. Ressalte-se que, se os cigarros da marca “Fume Bien” fossem de importação proibida no Brasil (não fossem aprovados pela ANVISA), aí a conduta de João configuraria contrabando. De quem será a competência para processar e julgar este delito? Justiça Federal. Compete à Justiça Federal processar e julgar a conduta de expor à venda cigarros de importação permitida pela ANVISA, sem nota fiscal e sem comprovação de pagamento de imposto de importação. Como o descaminho tutela prioritariamente interesses da União, é de se reconhecer a competência da Justiça Federal para conduzir o inquérito policial e, eventualmente, caso seja oferecida denúncia, julgar a ação penal, aplicando-se o disposto no enunciado 151 do STJ:

Súmula 151-STJ: A competência para o processo e julgamento por crime de contrabando ou descaminho define-se pela prevenção do Juízo Federal do lugar da apreensão dos bens.

Compete à Justiça Federal a condução do inquérito que investiga o cometimento do delito previsto no art. 334, § 1º, IV, do Código Penal, na hipótese de venda de mercadoria estrangeira, permitida pela ANVISA, desacompanhada de nota fiscal e sem comprovação de pagamento de imposto de importação. STJ. Plenário. CC 159.680-MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, julgado em 08/08/2018 (Info 631).

Tese declinatória invocada por João A defesa de João, a fim de afastar a competência da Justiça Federal, alegou que não houve transnacionalidade na conduta do agente. João argumentou que a mercadoria apreendida já havia sido internalizada e que ele não concorreu de qualquer forma, direta ou indireta, para a efetiva importação desses cigarros. Ele explicou que comprou os cigarros em Belo Horizonte (MG) e os revendia apenas nesta cidade, de sorte que a sua conduta não envolvia mais de um país, sendo apenas um comércio interno.

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 43

Logo, não havendo transnacionalidade da conduta, a competência para julgar os fatos seria da Justiça Estadual (e não da Justiça Federal). Essa tese de João é aceita pelo STJ? Para que o descaminho seja de competência da Justiça Federal, é necessária a comprovação da transnacionalidade da conduta? NÃO.

Compete à Justiça Federal o julgamento dos crimes de contrabando e de descaminho, ainda que inexistentes indícios de transnacionalidade na conduta. STJ. 3ª Seção. CC 160.748-SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgado em 26/09/2018 (Info 635).

O simples fato do produto mantido em depósito ter origem estrangeira é suficiente, por si só, para atrair a competência da Justiça Federal. Os crimes de contrabando e de descaminho tutelam prioritariamente interesse da União porque a ela compete privativamente definir os produtos que não podem ingressar no país, além de exercer a fiscalização aduaneira e de fronteira (arts. 21, XXII e 22, VIII, da CF/88). Além disso, os impostos exigidos para a entrada de mercadorias no país são tributos de competência da União.

Última pergunta: no caso concreto, seria possível aplicar o princípio da insignificância? SIM. O STJ e a 2ª Turma do STF admitem a aplicação do princípio da insignificância para o descaminho se o valor do tributo cujo pagamento foi iludido não superar R$ 20 mil. Logo, na prática, nos casos concretos envolvendo camelô, geralmente é aplicado o princípio da insignificância, tendo em vista que normalmente não se ultrapassa essa quantia.

DIREITO PREVIDENCIÁRIO

PREVIDÊNCIA PRIVADA TR não pode ser utilizada como índice de correção monetária dos benefícios da previdência privada a partir de 05/09/1996

A Taxa Referencial (TR) não pode ser utilizada como fator de correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta, a partir de 5/9/1996, devendo o indexador ser substituído por um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade, que será o IPCA, na ausência de repactuação.

STJ. 2ª Seção. EAREsp 280.389-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 26/09/2018 (Info 635).

Previdência complementar Previdência complementar é um plano de benefícios feito pela pessoa que deseja receber, no futuro, aposentadoria paga por uma entidade privada de previdência. A pessoa paga todos os meses uma prestação e este valor é aplicado por uma pessoa jurídica, que é a entidade gestora do plano (ex: Bradesco Previdência). É chamada de “complementar” porque normalmente é feita por alguém que já trabalha na iniciativa privada ou como servidor público e, portanto, já teria direito à aposentadoria pelo INSS ou pelo regime próprio. Apesar disso, ela resolve fazer a previdência privada como forma de “complementar” a renda no momento da aposentadoria. O plano de previdência complementar é prestado por uma pessoa jurídica chamada de “entidade de previdência complementar” (entidade de previdência privada).

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 44

Entidades de previdência privada Existem duas espécies de entidade de previdência privada (entidade de previdência complementar): as entidades de previdência privada abertas e as fechadas.

ABERTAS (EAPC) FECHADAS (EFPC)

As entidades abertas são empresas privadas constituídas sob a forma de sociedade anônima, que oferecem planos de previdência privada que podem ser contratados por qualquer pessoa física ou jurídica. As entidades abertas normalmente fazem parte do mesmo grupo econômico de um banco ou seguradora. Exs: Bradesco Vida e Previdência S.A., Itaú Vida e Previdência S.A., Mapfre Previdência S.A., Porto Seguro Vida e Previdência S/A., Sul América Seguros de Pessoas e Previdência S.A.

As entidades fechadas são pessoas jurídicas, organizadas sob a forma de fundação ou sociedade civil, mantidas por grandes empresas ou grupos de empresa, para oferecer planos de previdência privada aos seus funcionários. Essas entidades são conhecidas como “fundos de pensão”. Os planos não podem ser comercializados para quem não é funcionário daquela empresa. Ex: Previbosch (dos funcionários da empresa Bosch).

Possuem finalidade de lucro. Não possuem fins lucrativos.

São geridas (administradas) pelos diretores e administradores da sociedade anônima.

A gestão é compartilhada entre os representantes dos participantes e assistidos e os representantes dos patrocinadores.

Imagine agora a seguinte situação hipotética: João contratou um plano de previdência privada aberta, em 1981. O regulamento previa que, após 25 anos de contribuição, ele teria direito à aposentadoria complementar no valor “X” (plano de benefício definido). João começou a receber a aposentadoria, no entanto, não concordou com o valor da correção monetária que estava sendo aplicado pelo plano. O plano utilizou a Taxa Referencial (TR) como índice de correção monetária e o aposentado afirmou que a aplicação deste índice seria ilegal porque não refletiria a perda do poder aquisitivo da moeda. O que o STJ entende sobre o tema? O STJ entendeu que a Taxa Referencial (TR) não pode ser utilizada como fator de correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta, a partir de 5/9/1996. Por quê? Vamos fazer um rápido histórico sobre o tema. Salário-mínimo De início, os planos antigos de previdência privada utilizavam o salário-mínimo como fator de atualização monetária dos benefícios que eram oferecidos. Ocorre que, se muitas obrigações estão vinculadas ao salário mínimo, isso gera o aumento da inflação. Isso porque todas as vezes em que há um reajuste do salário mínimo, todas essas obrigações sobem junto e o preço dos produtos e serviços também sobe. Logo, aumenta a inflação e reduz o poder de compra da pessoa que ganha o salário mínimo. ORTN Assim, em 1977, o governo federal, preocupado em desindexar a economia baseada no salário mínimo e frear a inflação crescente da época, editou a Lei nº 6.435/77. Esta Lei substituiu o salário-mínimo pela ORTN como índice de correção monetária:

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Art. 22. Os valores monetários das contribuições e dos benefícios serão atualizados segundo índice de variação do valor nominal atualizado das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN (...) Parágrafo único. Admitir-se-á cláusula de correção monetária diversa da de ORTN, desde que baseada em índices e condições aprovadas pelo órgão normativo do Sistema Nacional de Seguros Privados.

Essa mudança de índice da Lei nº 6.435/77 aplicou-se imediatamente para os contratos em curso? SIM. A jurisprudência entende que a lei que modifica o regime monetário (ex: correção monetária) possui natureza institucional e estatutária, o que justifica a sua incidência imediata, inclusive em contratos em curso de execução:

(...) Segundo reiterada jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, as normas que tratam do regime monetário - inclusive, portanto, as de correção monetária -, têm natureza institucional e estatutária, insuscetíveis de disposição por ato de vontade, razão pela qual sua incidência é imediata, alcançando as situações jurídicas em curso de formação ou de execução. É irrelevante, para esse efeito, que a cláusula estatutária esteja reproduzida em ato negocial (contrato), eis que essa não é circunstância juridicamente apta a modificar a sua natureza. (...) STF. RE 212609, Relator p/ Acórdão Min. Teori Zavascki, julgado em 29/04/2015.

(...) não há direito adquirido à indexação do benefício de previdência privada complementar ao salário mínimo, devendo a norma de ordem pública que a vedou (Lei 6.435/77) ser aplicada à relação contratual, sem retroação, de imediato. (...) STJ. 4ª Turma. REsp 883.911/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 02/06/2011.

Desse modo, é de se concluir que, mesmo que houvesse previsão no contrato, o reajuste dos benefícios da previdência complementar não poderia mais se fundar na variação do salário mínimo desde a edição da Lei nº 6.435/77, situação que foi reforçada com a CF/88, que proibiu expressamente a vinculação:

Art. 7º (...) IV - salário mínimo , fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua vinculação para qualquer fim;

Atos normativos do CNSP Depois da Lei nº 6.435/77, foram editados, vários atos normativos pelo Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e pela Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) disciplinando, ao longo dos anos, os indexadores idôneos para atualizar as contribuições e os benefícios previdenciários suplementares, sobretudo para as entidades abertas de previdência privada. Índices adotados ao longo do período: ORTN, OTN, IPC, BTN, TR e, por fim, um “índice geral de preços de ampla publicidade”. TR A Taxa Referencial (TR) é um índice muito criticado. Isso porque ele não consegue evitar a perda de poder aquisitivo da moeda. Esse índice (TR) é fixado ex ante, ou seja, previamente, a partir de critérios técnicos não relacionados com a inflação considerada no período. Em outras palavras, a TR é calculada antes de a inflação ocorrer. Assim, a remuneração da caderneta de poupança – diferentemente de qualquer outro índice oficial de inflação – é sempre prefixada. Essa circunstância deixa claro que existe uma desvinculação entre a remuneração da poupança e a evolução dos preços da economia, isto é, a TR não capta a variação da inflação.

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Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 46

Por essa razão, diz-se que todo índice definido ex ante é incapaz de refletir a real flutuação de preços apurada no período em referência. É o caso da TR. Esses foram os motivos que levaram o STF a declarar a TR inconstitucional como índice de correção monetária nas condenações impostas à Fazenda Pública: RE 870.947/SE, Rel. Min. Luiz Fux, DJe 20/11/2017. Vale ressalta que o STJ possui a seguinte súmula:

Súmula 295-STJ: A Taxa Referencial (TR) é indexador válido para contratos posteriores à Lei nº 8.177/91, desde que pactuada.

Contudo, nos precedentes que deram origem a esta súmula, verifica-se que a TR não era utilizada isoladamente, mas sim em conjunto com juros bancários ou remuneratórios (a exemplo da caderneta de poupança, dos contratos imobiliários e das cédulas de crédito). Desse modo, não se pode encarar essa súmula como uma permissão para a TR ser utilizada nos contratos de previdência complementar. TR não pode ser utilizada, sozinha, para corrigir um benefício alimentar Se a complementação de aposentadoria (aposentadoria paga pelo plano de previdência complementar) for corrigida pela TR, isso acarretará enormes prejuízos ao assistido, que perderá gradualmente o seu poder aquisitivo com a corrosão da moeda, dando azo ao desequilíbrio contratual. Vale ressaltar que a complementação de aposentadoria é um benefício periódico de caráter alimentar. Circular SUSEP 11/1996 É por isso que, após a edição da Circular/SUSEP nº 11/1996, a TR não pode mais subsistir como índice de atualização dos valores oriundos dos contratos de previdência privada aberta. Esta Circular, de 05/09/1996, estabeleceu em seu art. 1º, que a correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta deveria adotar ser feita com base em um “índice geral de preços de ampla publicidade” e estabeleceu algumas opções: INPC/IBGE, IPCA/IBGE, IGPM/FGV, IGP-DI/FGV, IPC/FGV e IPC/FIPE. Repactuação Assim, a partir da Circular/SUSEP nº 11/1996, ou seja, a partir de 5/9/1996, as entidades de previdência deveriam fazer uma repactuação, substituindo a TR por um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade, segundo as opções acima expostas. E se a entidade não fez essa repactuação? Aplica-se o IPCA. O IPCA foi o índice escolhido pelo Governo para o caso de ausência de repactuação (art. 1º, parágrafo único, do Anexo I da Circular/SUSEP nº 255/2004). Resumindo:

A Taxa Referencial (TR) não pode ser utilizada como fator de correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta, a partir de 5/9/1996, devendo o indexador ser substituído por um Índice Geral de Preços de Ampla Publicidade, que será o IPCA, na ausência de repactuação. STJ. 2ª Seção. EAREsp 280.389-RS, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em 26/09/2018 (Info 635).

Informativo comentado

Informativo 635-STJ (09/11/2018) – Márcio André Lopes Cavalcante | 47

EXERCÍCIOS Julgue os itens a seguir: 1) A inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental. ( ) 2) Os direitos do devedor fiduciante sobre imóvel objeto de contrato de alienação fiduciária em garantia

possuem a proteção da impenhorabilidade do bem de família legal. ( ) 3) Tendo sido reconhecida a coligação contratual, é possível que a cláusula compromissória prevista no contrato

principal (contrato de abertura de crédito) seja estendida ao contrato de swap (dependente). ( ) 4) A ocupação indevida de bem público configura mera detenção, de natureza precária, insuscetível de retenção

ou indenização por acessões e benfeitorias, salvo se o detentor estiver de boa-fé. ( ) 5) É abusiva a cláusula de coparticipação expressamente contratada e informada ao consumidor para a hipótese

de internação superior a 30 (trinta) dias decorrentes de transtornos psiquiátricos. ( ) 6) É cabível a interposição de agravo de instrumento contra decisões interlocutórias em processo falimentar e

recuperacional, ainda que não haja previsão específica de recurso na Lei nº 11.101/2005 (LREF). ( ) 7) Na ação de cobrança, é desnecessária a citação da sociedade empresária se todos os que participam do quadro

social integram a lide. ( ) 8) Não é adequada a inclusão dos honorários periciais em conta de liquidação mesmo quando o dispositivo de

sentença com trânsito em julgado condena o vencido, genericamente, ao pagamento de custas processuais. ( ) 9) O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º

da Lei nº 6.830/80 (LEF) tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução. ( )

10) Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão, inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo), durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/1980 - LEF, findo o qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato. ( )

11) A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera. ( )

12) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial, onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. ( )

13) O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa. ( )

14) O crime de corrupção passiva consuma-se ainda que a solicitação ou recebimento de vantagem indevida, ou a aceitação da promessa de tal vantagem, esteja relacionada com atos que formalmente não se inserem nas atribuições do funcionário público, mas que, em razão da função pública, materialmente implicam alguma forma de facilitação da prática da conduta almejada. ( )

15) A Taxa Referencial (TR) pode ser utilizada como fator de correção monetária dos benefícios da previdência privada aberta. ( )

Gabarito

1. C 2. C 3. C 4. E 5. E 6. C 7. C 8. E 9. C 10. C

11. C 12. C 13. C 14. C 15. E