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HISTÓRIA DA PROFISSIONALIZAÇÃO DOCENTE DO PROFESSOR
DE EDUCAÇÃO INFANTIL APÓS A LEI DE DIRETRIZES E BAS ES
NACIONAL BRASILEIRA Nº 9394/96 Á LUZ DA IMPRENSA
PERIÓDICA EDUCACIONAL
MORENO, Gilmara Lupion1 - UEL
Grupo de Trabalho – Formação de Professores e Profissionalização Docente
Agência Financiadora: não contou com financiamento Resumo O trabalho em questão é fruto das leituras e discussões realizadas na disciplina Memória e História da Profissão Docente, no Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo (USP). A questão norteadora deste estudo é: Qual a ressonância da história da profissionalização docente do professor de educação infantil após a Lei de Diretrizes e Bases Nacional Brasileira 9.394/96 na imprensa periódica educacional? Quanto aos objetivos, pretendeu-se: refletir sobre a história da profissionalização docente do professor de educação infantil após a promulgação da LDB (9.394/96), a partir dos artigos publicados sobre o tema em questão; verificar se houve e quais foram as estratégias realizadas para atender a legislação em vigor; conhecer o trabalho realizado no interior das instituições de formação de professores e de educação infantil, a fim de cumprir o que dispõe a lei em questão sobre esta etapa da educação básica. O mesmo realizou-se por meio de pesquisa em fontes veiculadas pela imprensa periódica educacional brasileira sobre a história da profissão docente do professor de educação infantil, no período de 1996 a 2010. Num primeiro momento, desenvolveu-se uma discussão que teve como base as concepções dos autores dos artigos pesquisados sobre a LDB (9.394/1996) e sobre a formação do professor de educação infantil. Num segundo momento, são apresentadas as questões da profissionalização docente do professor deste nível de ensino nos textos das revistas educacionais pesquisadas. Espera-se que este estudo possa contribuir para o desenvolvimento de outras pesquisas sobre a formação docente do professor de educação infantil, fornecendo-lhes informações importantes, veiculadas na imprensa periódica educacional após a LDB (9.394/96), sobre o tema em questão. Palavras-chave: Educação Infantil. Profissionalização Docente. Formação de Professores.
Lei de Diretrizes e Bases Nacional Brasileira (9394/96).
1 Doutora em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FEUSP). Professora Adjunta da Universidade Estadual de Londrina (UEL). E-mail: [email protected].
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Introdução
Antes da promulgação da vigente Lei de Diretrizes e Bases Nacional Brasileira (LDB
9.394/96), que determina sobre a formação de professores para a educação infantil,
normalmente, trabalhavam, em creches e pré-escolas, pessoas com baixa escolaridade, pois
não havia nenhuma exigência de um curso profissionalizante para atuar nesse segmento.
Assim, nessas instituições, predominava o ato de cuidar, de vigiar, e prevalecia à concepção
de um cuidado como favor às famílias, em especial, às mulheres de baixa renda, que não
podiam pagar alguém para ficar com as crianças enquanto trabalhavam.
Em consequência disto, o monitor, o auxiliar de creche, o auxiliar de desenvolvimento
infantil, entre outros, eram vistos como aqueles que deveriam substituir os cuidados
maternais. Entre os artigos pesquisados por este estudo muitos são os autores que ressaltam
estas características, tradicionalmente pertinentes ao quadro de profissionais que atuavam na
educação infantil, anteriormente à promulgação da nova LDB, entre eles, Rosemberg (1996),
Cruz (1996), Kishimoto (1999), Campos (1999), Vieira (1999), Cerizara (2002), Volpatto e
Melo (2005), Oliveira et al (2006). No entanto, não se pode esquecer a questão da carreira
profissional do trabalhador dessa área, “[...] além dos baixos salários, a alta rotatividade pode
ser explicada também pelo desprestígio da profissão, falta de perspectivas em termos de
carreira e más condições de trabalho [...] que provocam stress físico e emocional (CRUZ,
1996, p.83).
Nessa mesma perspectiva, Rosemberg (1996, p.62), no artigo ‘Educação Infantil,
classe, raça e gênero’, publicado em fevereiro de 19962, denuncia que “a educação infantil
[...] é uma atividade historicamente vinculada à ‘produção humana’ (isto é, à esfera da
reprodução) e considerada de gênero feminino, tendo, além disso, sido sempre exercida por
mulheres...”. Ao analisar o impacto desta especificidade do gênero feminino na educação
infantil, observa-se a educação infantil como uma ocupação atraente para muitas mulheres
que com escasso treinamento específico, “tornaram-se professoras de educação infantil [...].
Por outro lado, o fato de não ser necessária uma formação técnica/profissional específica
desvalorizou o salário e o prestígio dessa ocupação” (BEATTY apud ROSEMBERG, 1996,
p.62).
2 Artigo publicado anteriormente à promulgação da (LDB 9394/96).
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Volpato e Mello (2005, p.724) apontam para o fato de que, no Brasil, nas décadas de
1970 e 1980, programas de formação como, por exemplo, o Projeto Casulo (LBA)3, ou o
Programa Nacional de Educação Pré-escolar4, objetivaram “ampliar ao máximo o
atendimento da criança pequena com um custo mínimo e uma participação equivocada da
comunidade, o que certamente prejudicou discussões e ações efetivas para a
profissionalização” do professor de educação infantil. Rosemberg (1996) também assinala
este fato.
A LDB (9.394/96) trouxe mudanças significativas para a docência na educação
infantil, tais como: a substituição da “tia” pela “professora”; a exigência do curso
profissionalizante em nível médio ou superior (Pedagogia e/ou Normal Superior); a busca
pela equidade entre o cuidar e o educar no cotidiano das instituições; a formação em exercício
e continuada dos professores; o professor tido como aquele que complementa a família na
educação da criança pequena e não como quem a substitui.
Em síntese, qualidades “como ‘ser mãe’, ‘gostar de criança’, ‘ser mulher’ etc. cedem
lugar a uma proposta mais elaborada de profissionalização [...]” (VOLPATO; MELLO, 2005,
p.725). Entretanto, verifica-se a predominância das mulheres no exercício do magistério da
educação infantil, baixos salários, más condições de trabalho, a substituição da contratação de
professores por estagiários remunerados e desprestígio profissional e social.
O presente estudo é fruto das leituras e discussões realizadas na disciplina Memória e
História da Profissão Docente, no Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo
(USP), e o resultado do desafio de realizar, a partir da análise, em revistas educacionais, a
história da profissão docente do professor de educação infantil, no período de 1996 a 2010. A
delimitação do período investigado justifica-se em razão das mudanças ocorridas na educação
infantil com a promulgação da LDB (9.394/96), em especial, no que diz respeito à formação
do professor desta etapa da educação básica.
Portanto, a questão problema deste estudo é: Qual a ressonância da história da
profissionalização docente do professor de educação infantil, após a Lei de Diretrizes e Bases
Nacional Brasileira nº 9.394/96, na imprensa periódica educacional? Em outras palavras, qual
o impacto do que dispõe a lei sobre a formação dos professores de educação infantil no
cotidiano destes profissionais?
3 Implementado pela Legião Brasileira de Assistência – LBA. 4 Implementado pelo Ministério da Educação – MEC.
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Quanto aos objetivos, pretendeu-se com este estudo refletir: sobre a história da
profissionalização docente do professor de educação infantil após a promulgação da LDB
(9.394/96), a partir de artigos publicados sobre o tema em questão; verificar se houve e quais
foram as estratégias realizadas para atender a legislação em vigor; conhecer o trabalho
realizado no interior das instituições de formação de professores e de educação infantil, a fim
de cumprir o que dispõe a lei em questão sobre esta etapa da educação básica.
No que diz respeito à metodologia, o mesmo realizou-se por meio de pesquisa em
fontes veiculadas à imprensa educacional periódica brasileira sobre a história da profissão
docente do professor de educação infantil, por entender que é possível partir do estudo de
determinados “periódicos educacionais e tomá-los como núcleos informativos, enquanto suas
características explicitam modos de construir e divulgar o discurso legítimo sobre as questões
de ensino e o conjunto de prescrições ou recomendações sobre formas ideais de realizar o
trabalho docente” (CATANI; SOUSA, 1999, p.11).
Nesse sentido, buscou-se artigos que tratassem da profissionalização docente do
professor de educação infantil, nos periódicos ‘Cadernos de Pesquisa’, ‘Educação &
Sociedade’ e ‘Pro-posições’, no período de 1996 a 2010, em razão do que dispõe a LDB
(9.394/96) acerca da formação do professor desta etapa da educação básica, pois, entre a
norma imposta pelos poderes centrais e a “[...] prática cotidiana no nível da classe, a leitura da
imprensa pedagógica permite discernir o que se passa ou não, do centro para a periferia (ou do
alto para a base) revelando assim as reticências e os bloqueios que opõem a instituição escolar
às diretrizes que recebe” (CASPARD APUD CATANI; SOUSA, 1999, p.15).
Para desenvolver a temática proposta, num primeiro momento, o presente texto faz
uma discussão, com base nos autores dos artigos selecionados e demais estudiosos, acerca do
que diz a LDB (9.394/1996) sobre a formação do professor de educação infantil. Num
segundo momento, são apresentadas algumas questões veiculadas pelas revistas educacionais
pesquisadas sobre a profissionalização docente do professor deste nível de ensino.
A Lei de Diretrizes e Bases Nacionais nº 9394/96 e a formação do professor de educação
infantil
Profissionais e pesquisadores da área de educação infantil vivenciaram, após a
promulgação da LDB (9.394/96), um momento de grandes mudanças e de muitas conquistas e
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incertezas no que diz respeito à concepção de criança e de educação infantil,
consequentemente, sobre a formação e a identidade do profissional desta etapa da educação
básica. De acordo com Kishimoto (1999, p.61), no artigo “Política de formação profissional
para a educação infantil: Pedagogia e Normal Superior”, “a formação profissional para a
educação infantil ressurge com o clima instaurado após a Constituição de 1988, o Estatuto da
Criança e do Adolescente, a Lei de Diretrizes e Bases Nacional e a Lei Orgânica de
Assistência Social”, que impuseram ao Estado a obrigatoriedade de oferecer: instituições para
a faixa etária de 0 a 6 anos de idade; reformas institucionais; e preparo dos profissionais de
educação infantil.
No entanto, é impossível abordar a história da profissão docente do professor de
educação infantil sem sinalizar a história da educação infantil no Brasil, uma vez que o espaço
de atuação deste profissional ocorre no âmbito das creches e pré-escolas, hoje, denominadas
Centro de Educação Infantil. A história da educação infantil revela que a creche surgiu com a
finalidade de liberar a mão de obra feminina para o mercado de trabalho, bem como, para
atender as crianças pobres, cujas mães precisavam trabalhar e não tinham com quem deixá-
las.
O artigo ‘Reflexões acerca da formação do educador infantil’ faz apontamentos
importantes sobre a história da educação infantil brasileira, tais como, o fato de que a mesma
“sempre foi marcada pela desigualdade: tanto as possibilidades de acesso a qualquer das
formas de atendimento quanto a qualidade desse atendimento têm sido definidas
prioritariamente pela classe social da criança” (CRUZ, 1996, p.79). Isto é, enquanto para “[...]
os filhos da população mais abastada prevalecia a preocupação quanto ao seu
desenvolvimento social, afetivo e cognitivo, os serviços destinados às crianças pobres, via de
regra, restringiram-se à sua guarda, cuidando [...] de sua higiene e alimentação” (CRUZ,
1996, p.79).
Entretanto, a Constituição de 1988 foi ‘um divisor de águas’ para a educação infantil,
ao “[...] assegurar a educação das crianças de 0 a 6 anos enquanto dever do Estado. E, ao
situar a creche no capítulo da educação, deixou muito clara também a função eminentemente
educativa que essa instituição deveria assumir” (CRUZ, 1996, p.80). Sabe-se que tal
conquista é fruto de muitas lutas em prol do direito à educação para esse segmento da
população. “No bojo desse processo, uma nova concepção de educação infantil, pautada na
visão da criança cidadã, sujeito histórico e construtora de conhecimentos na interação com o
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seu meio, começou a ser gestada” (CRUZ, 1996, p.80). Nas palavras da autora, “é evidente
que essa nova concepção de educação infantil coloca em questão a formação dos profissionais
que atuam nessa área” (CRUZ, 1996, p.80).
Em atendimento à Constituição de 1988, há mais de uma década, graças à
promulgação da LDB (9.394/96), a educação infantil passou a ocupar o seu lugar de direito no
sistema de ensino brasileiro, sendo considerada a primeira etapa da educação básica. Portanto,
de acordo com a lei, as creches e pré-escolas, até então, politicamente e administrativamente,
alocadas na pasta da assistência social, deveriam migrar para a pasta da educação. Este fato
causou bastante conflito entre os envolvidos, principalmente entre aqueles que compreendiam
ser o atendimento da criança de 0 a 6 anos de idade uma atribuição da assistência social e não
da educação, dentre outras razões, por considerá-lo um serviço dedicado às pessoas de baixa
renda.
Outra questão que gerou polêmica entre os profissionais que atuavam nas creches e
pré-escolas brasileiras foi o Art.62 da LDB 9.394/96, pois, embora afirmasse que para o
exercício do magistério, nesse nível de atuação, seria necessária formação em nível superior,
admitia, entretanto, como formação mínima, o curso de magistério em nível médio.
Muitas foram as especulações nesse sentido, entre elas, a de que os professores em
exercício que não haviam cursado Pedagogia deveriam fazê-lo até o final da década da
educação (1997-2007), para que pudessem estar habilitados em nível superior ou formados
por treinamento em serviço.
Devido aos equívocos causados pelas interpretações do texto legal, infelizmente, num
curto período de tempo, apressadamente extinguiram-se, na maioria dos estados brasileiros, os
cursos de magistério em nível médio e proliferaram os cursos de Normal Superior, em
especial, na modalidade EAD (Educação a Distância), oferecidos por instituições privadas,
com um valor possível de ser assumido pelo público em questão, mas, não necessariamente,
acessível, uma vez que, na sua maioria dos casos, o trabalho com as crianças pequenas é
realizado por mulheres, de baixa renda que sustentam suas famílias, ou então, somam seus
salários aos de seus maridos e companheiros. Esta foi uma atitude imoral por parte daqueles
que viram, nesta situação, uma oportunidade de ganhar dinheiro à custa da fragilidade
intelectual, econômica e social desse grupo de trabalhadores. Mais tarde, o próprio Ministério
da Educação, por meio do Parecer n. CNE/CEB 03/2003, desfez este mal entendido, ao
esclarecer que os professores que possuíam o curso de magistério em nível médio tinham
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resguardado o direito de continuar exercendo o magistério na educação infantil e anos iniciais
do ensino fundamental sem ‘ferir’ a lei.
Neste contexto, houve um aceleramento na formação do professor de educação
infantil, pois, por um lado, houve uma ‘corrida contra o tempo’ por parte daqueles que não
possuíam o curso superior e não pretendiam deixar de exercer o magistério na educação
infantil, e por outro, os cursos de Normal Superior implementados utilizaram-se de
dispositivos legais de aproveitamento de estudos para aqueles que haviam cursado o
magistério em nível médio e para aqueles que atuavam na educação infantil; o curso podia ser
realizado em até três anos, dependendo da modalidade (presencial ou à distância) e da
organização do mesmo (KISHIMOTO, 1999).
Silva (2005, p.173) em seu artigo “O curso de pedagogia e a formação para a educação
infantil”, defende a formação de profissionais da educação básica em cursos de nível superior
universitário, uma vez que, “isto significa se contrapor aos modelos de inspiração neoliberal,
que têm se traduzido em cursos rápidos, aligeirados e massificados” (SILVA, 2005, p.173). A
formação do professor da educação básica por meio dos cursos de pedagogia ou do normal
superior foi uma questão que rendeu muitas discussões, análises e críticas, principalmente
porque os professores leigos ou não habilitados e mesmo aqueles que já haviam cursado o
magistério em nível médio, na maioria das vezes, embora estivessem atuando na área,
pressupunham certa dificuldade para concorrer a uma vaga para no curso de pedagogia, de
uma universidade pública, pois alegavam que haviam concluído os seus estudos há anos e,
como trabalhavam de 8 a 10 horas por dia, não tinham tempo para se preparar para o
vestibular e assim, concorrerem, em condição de igualdade, com os outros candidatos. Desse
modo o curso normal superior, especialmente aqueles oferecidos pelas instituições privadas,
foi uma forma de ascensão acadêmica e profissional mais viável.
No entanto, para se atender as solicitações previstas na legislação, bem como, dos
movimentos sociais que lutam em defesa de uma educação de qualidade para a primeira
infância, é urgente a presença de um profissional qualificado para trabalhar com essa faixa
etária. Isto é, para que se cumpra a lei, não cabe mais a ideia de que para trabalhar com a
criança pequena serve o ‘profissional menor’, exigindo-se, muitas vezes, dos candidatos a
educador infantil, apenas a experiência de cuidado dos próprios filhos, irmãos mais novos,
filhos da vizinha, uma vez que a maioria desses constitui-se de mulheres.
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Com as recentes políticas públicas para a educação de crianças de zero a seis anos de
idade, surge uma nova identidade para o professor que atua em instituições de educação
infantil, em especial, nas creches. Isto é, a LDB (9.394/96) “caracteriza-o como professor,
como docente, cuja formação se fará em nível superior, admitindo-se como formação mínima
a oferecida em nível de ensino médio – modalidade normal” (VIEIRA 1999, p.32).
Entretanto, Vieira (1999), assim como Kishimoto (1999) apontam várias questões para se
pensar nesse novo perfil do professor de educação infantil, dentre elas, a não existência de
conteúdos, nos cursos de formação inicial, que enfocam a especificidade e a
indissociabilidade das ações de educar e cuidar de criança de zero a seis anos, em especial,
das menores de três anos.
Wada (2003), em seu artigo intitulado “A professora de creche: a docência e o gênero
feminino na educação infantil”, sintetiza muito bem essa especificidade do profissional de
educação infantil ao dizer que a entrada nesse campo de trabalho exige a mobilização de
muitos conhecimentos, entretanto, “ter professoras para crianças de 0 a 3 anos na creche e no
sistema de ensino legitima a profissão docente e cumpre a Constituição Federal e a LDB
(9.394/1996) [...], no entanto, não autoriza as professoras a escolarizarem precocemente as
crianças, através de aulas! (WADA, 2003, p.55). Ao citar as duas categorias de trabalhadores
existentes em algumas instituições de educação infantil - monitoras e professoras, a autora
elucida que “a monitora não é uma ‘auxiliar de sala’, e a professora de creche não é uma
‘professora de pré-escola’ que fica com um grupo por quatro horas” (WADA 2003, p.60).
É importante dizer que um dos grandes desafios, se não o maior deles, em prol da
educação da criança pequena, está na formação desse profissional, pois se acredita que, se o
governo e a sociedade, de um modo geral, respeitarem o professor como pessoa e como
cidadão, garantindo-lhe o direito à formação inicial e continuada de qualidade, além de
condições dignas de trabalho, com planos de carreira e salários que correspondam à
importância proclamada pelas políticas públicas para a educação da criança de cinco/seis
anos5, boa parte do que diz a lei será cumprida no que se refere ao direito da criança à
educação infantil.
5 No que diz respeito à faixa etária das crianças atendidas na educação infantil, diferente do que diz a LDB (9.394/96), após a implantação do ensino fundamental de nove anos, ao determinar que a educação infantil atenderá crianças de 0 a 5 anos de idade, recorro às Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil n. 5/2009, que diz que as crianças que não completam 6 anos de idade até o dia 31 de março deverão ser matriculadas na educação infantil.
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A profissionalização docente do professor de educação infantil na imprensa periódica
nacional após a Lei de Diretrizes e Bases n.9394/96
Para falar sobre a ressonância da história da profissionalização docente do professor de
educação infantil após a LDB 9.394/96 na imprensa periódica educacional é importante
elucidar o significado da expressão ‘história da profissionalização docente’, que diz respeito a
noção unificadora das diferentes dimensões do exercício profissional do magistério, “cuja
concepção exige a análise simultânea e integrada dessas mesmas dimensões: a formação, a
instituição e os saberes, o exercício concreto da atividade, as relações com o Estado, as
formas de organização da categoria profissional” (CATANI, 2000, p.587).
Nesse sentido, buscou-se, nas revistas Caderno de Pesquisa, Educação & Sociedade e
Pro-Posições, os artigos que tratavam da profissionalização docente do professor de educação
infantil, nas suas diferentes perspectivas, no período de 1996 a 2010. Antes de apresentar a
ressonância das questões relativas à profissionalização docente do professor de educação
infantil, nos periódicos já citados, bem como no período pesquisado, é preciso conhecer o
‘ciclo de vida’ das respectivas revistas, para que se possa compreender o ‘campo científico’
em que se deram as publicações selecionadas para este trabalho.
‘Cadernos de Pesquisa’ é um periódico que foi criado em 1971 pela Fundação Carlos
Chagas, instituição considerada um centro de excelência em pesquisa educacional, cujo
objetivo principal é divulgar as pesquisas acadêmicas produzidas na área. Trata-se de uma
revista de estudos e pesquisas em educação, que foi publicada trimestralmente até 1996 e se
tornou quadrimestral a partir de 1997. Entre 1979 e 1998, a publicação passou a ser co-
editada pela Cortez Editora e, desde 1999, pela Editora Autores Associados. A
comercialização do periódico é realizada pelas editoras.
A revista ‘Educação & Sociedade’ é uma publicação do Centro de Estudos Educação e
Sociedade (CEDES), planejada como instrumento de incentivo à pesquisa acadêmica e ao
debate sobre o ensino, que aceita colaborações de artigos e resenhas na área de Ciência da
Educação. Esta revista é considerada um dos mais importantes periódicos editados na área da
Educação no país. Publicada desde 1978, a revista tem periodicidade quadrimestral. Desde
1995, a cada ano, tem sido organizado um número especial temático, o que transformou a
revista em uma publicação trimestral; indexada internacionalmente, recebe contribuições de
autores de diversos países.
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A Revista Pro-Posições é uma publicação da Faculdade de Educação (FE) da
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), fundada em 1990, cujo objetivo é divulgar a
produção acadêmica na área da Educação. A partir do número 35/36 (jul./nov. 2001), passou a
contar com um dossiê temático, organizado por pesquisadores da área-tema, que traz artigos
de especialistas convidados. Em 2003, a revista passou pela avaliação nacional de periódicos
da área de Educação, realizada pela Anped, tendo recebido no Qualis a classificação
“Nacional A”, classificação esta mantida em 2005.
Para este estudo, buscou-se, nas revistas acima, os artigos sobre a profissionalização
docente do professor de educação infantil, no período de 1996 a 2010, foram selecionados 18
(dezoito) artigos, no entanto, não se encontrou nenhuma publicação sobre o tema no ano de
2010. Verificou-se que apenas duas autoras possuem mais de um artigo publicado sobre a
temática em questão; tanto a autora Sonia Kramer, quanto Tizuko Morchida Kishimoto
publicaram seus artigos em épocas e periódicos diferentes. O estudo revelou a presença
significativa de autores vinculados a universidades brasileiras localizadas nas diferentes
regiões do Brasil e 01 (um) artigo cujas autoras pertencem à Universitá Statale di Milano, na
Itália.
Os artigos pesquisados foram caracterizados a partir da identificação do tema central,
do tipo de texto e do tipo pesquisa. No que diz respeito às temáticas, identificou-se os
seguintes temas: formação de professores; identidade; gênero; trabalho docente – avaliação,
propostas pedagógicas; política e educação infantil.
Sobre a formação do professor de educação infantil, os autores discutem, em seus
textos, a formação inicial, em serviço e continuada destes profissionais. Os artigos
apresentam-se na forma de relato de experiências dos autores a partir de suas vivências, como,
por exemplo: a docência e a pesquisa na área de educação infantil; e nas atividades de
assessoria o acompanhamento e a avaliação de políticas públicas de educação (KRAMER,
1997); da experiência como membro da Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia
do MEC para avaliação de cursos de pedagogia (KISHIMOTO, 2005); e como professora e
diretora da Faculdade de Ciências da Formação da Università Statale di Milano
(MANTOVANI ; PERANI, 1999). Mantovani e Perani (1999), no artigo “Uma profissão a ser
inventada: o educador da primeira infância” relatam a experiência italiana de formação de um
profissional que tem papel flexível e pluralidade de competências.
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Apresentam-se também, na forma de relatório de pesquisa, os textos de Volpato e
Mello (2005) e de Oliveira et al (2006), que acompanharam professores em exercício, em
programas de formação continuada e em cursos de magistério em nível médio. O artigo de
Silva (2005), intitulado “O curso de pedagogia e a formação para a educação infantil”,
apresenta o resultado de um estudo documental realizado em 05 (cinco) universidades
federais que ofereciam a formação de professores para a educação infantil. E por fim, o artigo
de Zapelini (2009), intitulado “Processos formativos constituídos no interior das instituições
de educação infantil: uma experiência de formação continuada”, que relata os dados
levantados por sua dissertação de mestrado.
Entre os artigos pesquisados, há 02 (duas) resenhas, uma do livro: “Avaliando a pré-
escola: uma trajetória de formação de professoras” (GODOI, 2003) e outra “A educadora de
creche: Construindo suas identidades” (MELLO, 2004). A primeira apresenta uma
experiência denominada pesquisa-formação, realizada em pré-escolas do município de
Pistóia, na Itália, integrando pesquisadores da Universidade de Paiva e professores da rede
púbica. A segunda trata-se de um livro organizado a partir de uma pesquisa realizada com
educadoras de creche nas principais regiões da Itália, cujo objetivo foi “compreender qual é a
imagem das educadoras de creche frente à profissão e se é possível a articulação entre a
indefinição do modelo profissional vigente e as representações que as educadoras têm sobre a
sua prática” (MELLO, 2004, p.256).
Artigos de cunho bibliográfico também encontram-se presentes, como, por exemplo,
as 02 (duas) resenhas já mencionadas e os 04 (quatro) trabalhos: “Reflexões acerca da
formação do educado infantil” (CRUZ, 1996); “Política de formação profissional para a
educação infantil: Pedagogia e Normal Superior” (KISHIMOTO, 1999); “A formação de
professores para crianças de 0 a 10 anos: Modelos em debate” (CAMPOS, 1999); “A
formação do profissional da educação infantil no Brasil no contexto da legislação, das
políticas e da realidade do atendimento” (VIEIRA, 1999).
A identidade do professor de educação infantil é o tema do artigo “Construção da
identidade docente: relatos de educadores de educação infantil”, uma vez que, “a necessidade
de atender a LDB (9.394/96) encarregou-se de levar essa discussão aos educadores em
exercício nas creches e pré-escolas, mediante programas de formação” (OLIVEIRA et al,
2006, p.548), e da resenha do livro “A educadora de creche: Construindo suas identidades”
acima referenciado.
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Dois artigos abordaram a questão de gênero: um relato de experiência de autoria de
Rosemberg (1996) e um relato de pesquisa de autoria de Wada (2003). A discussão realizada
por Rosemberg (1996) fundamenta-se no fato de que a grande maioria dos profissionais de
educação infantil são mulheres e estas trazem consigo uma história de preconceito, pois ainda
as acompanha uma concepção hierárquica de dominação do gênero e suas capacidades
específicas, de um modo em geral, são consideradas de segunda ordem. Wada (2003, p.53)
enfatiza “a construção da profissão docente a partir do gênero feminino, na medida em que ser
mulher, mãe (ou não) e professora condiciona a atuação profissional”.
O trabalho docente, entendido aqui como todas as atividades pertinentes aos
profissionais da educação infantil no interior das creches e pré-escolas é apresentado
explicitamente, no artigo “Trabalho e formação dos educadores de creche em Botucatu:
reflexões críticas”, de Volpato e Mello (2005), e abordado também no contexto das
publicações de outros autores Oliveira et al (2006), Kramer (1997), Godoi (2003), Wada
(2003) e Mello (2004). Kramer (2002b), em “Propostas pedagógicas ou curriculares de
educação infantil: para retomar o debate”, desenvolve uma discussão teórica para
fundamentar a análise das propostas pedagógicas ou curriculares da educação infantil, que
tem, como um dos enfoques a “Formação de Profissionais de Educação Infantil no Estado do
Rio de Janeiro: concepções, políticas e modos de implementação”, no período de agosto de
1999 a julho de 2001. Sobre esta temática, verificou-se a presença de 07 (sete) artigos, sendo
04 (quatro) relatórios de pesquisas, 02 (duas) resenhas e 01 (um) relato de experiência.
No que se refere ao tema política e educação infantil, de modo geral, os artigos que
tratam sobre a formação do professor desta etapa da educação básica contextualizam suas
discussões no âmbito político da educação brasileira. No entanto, constatou-se 03 (três)
artigos de cunho bibliográfico que têm como finalidade discutir a política brasileira de
educação infantil, entre eles, o de Kischimoto (1999), em “Política de formação profissional
para a educação infantil: Pedagogia e Normal Superior”, que aborda a política de formação
profissional para a educação infantil dos anos de 1990, configurada pelos cursos de pedagogia
e normal superior. Arce (2001), em “Compre o kit neoliberal para a educação infantil e ganhe
grátis os dez passos para se tornar um professor reflexivo”, tem por objetivo contribuir para a
reflexão sobre a formação do professor de educação infantil, ao alertar para as interfaces do
neoliberalismo e do pós-modernismo no que diz respeito às políticas educacionais, em
especial, às políticas de formação de professores para a educação infantil. Cerizara (2002), em
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“O Referencial Curricular Nacional Para a Educação Infantil no contexto das reformas”,
dentre os vários aspectos enfatizados, destaca a formação de professores e alerta para o
princípio de aligeiramento nos cursos denominados emergenciais, consequentemente, sobre o
caráter neoliberal das políticas de formação docente.
Quanto ao tipo de texto, 06 (seis) são artigos, 02 (duas), resenhas, 05 (cinco), relatos
de experiência e 05 (cinco), relatórios de pesquisa. No que se refere ao tipo de pesquisa, em
um dos artigos, não foi possível identificar a metodologia utilizada; 09 (nove) são estudos
bibliográficos; 06 (seis) são pesquisas empíricas e 02 (dois) são estudos teórico-práticos.
Na análise dos artigos, buscou-se verificar se os autores, ao categorizar as temáticas
desenvolvidas em seus textos, utilizavam-se de definições de própria autoria ou se realizavam
uma retomada de outros autores. Foi possível identificar que, dos 18 (dezoito) artigos, os
autores de 07 (sete) utilizaram-se de definições de própria autoria, sendo que 05 (cinco) destes
fizeram também uma retomada de outros autores; apenas em 02 (dois) artigos, os autores
mantiveram, exclusivamente, a sua definição da categoria desenvolvida. Nos demais 11
(onze) artigos, os autores recorreram a outros autores para a categorização de suas temáticas.
O estudo em questão buscou também verificar, nos artigos, a existência ou não de
características argumentais sobre a relação desenvolvida entre a criança, a família e a
instituição de educação infantil, ao tratar da profissionalização docente do professor desta
etapa da educação básica. Verificou-se que, dos 18 (dezoito) artigos analisados, 17 (dezessete)
apresentam, em seus textos, questões relativas à criança, à família, à creche, à pré-escola e a
formação de professores e argumentam que tanto a qualidade dos serviços prestados na
educação da criança de 0 a 5/6 anos de idade quanto a qualidade da formação do professor de
educação infantil perpassam pelo viés da concepção de criança e de educação infantil, bem
como, pelo tratamento dado às famílias.
Rosemberg (1996), em “Educação infantil, classe, raça e gênero” ressalta que a
relação sinalizada no título do seu texto está condicionada à situação socioeconômica das
famílias atendidas pelas creches, fator que influencia também o trabalho desenvolvido e a
qualidade da formação da trabalhadora que lida diretamente com a criança. Segundo Campos
(1999), as mudanças sociais e econômicas, no Brasil provocaram transformações importantes
nos sistema de ensino, consequentemente, no mercado de trabalho e no perfil dos professores.
Deste modo, tendo em vista as mudanças legais e as reformas dos sistemas educacionais do
país, a autora discute diferentes aspectos, dentre eles, a necessidade da preparação dos
10522
professores para o trabalho com os pais e com a comunidade, e a urgência de se pensar na
criança e nos diversos espaços que esta ocupa fora da escola, tais como, o da família
(CAMPOS, 1999).
Mantovani e Perani (1999), ao relatarem a experiência da Itália na formação de
professores, contribuem, significativamente, ao trazer para a discussão a importância da
concepção de criança e de educação infantil, bem como, o envolvimento das famílias no
trabalho junto às crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos de idade.
Cruz (1996), Volpato e Mello (2005) explicitam a nova concepção de criança e de
educação infantil e o caráter de complementaridade desta etapa da educação básica em relação
à ação desenvolvida pela família da criança, fato que fundamenta a proposição legal
(Constituição de 1988 e LDB nº 9.394/96) de exigência de formação para o professor de
educação infantil. Ainda na perspectiva da legislação, Cerizara (2002) acrescenta que, com a
lei em vigor, “[...] todas as famílias que optarem por partilhar com o Estado a educação e o
cuidado de seus filhos deverão ser contempladas com vagas em creches e pré-escolas
públicas” (CERIZARA, 2002, p.328). Ao analisar o volume 1 do RCNEI, a autora destaca
que, em relação ao conteúdo, verificou-se a presença de conceitos importantes para a área de
educação infantil, dentre eles, a interação creche-família e a parceria com as famílias
(CERIZARA, 2002). Vale ressaltar o argumento da autora no que se refere à relação criança,
escola e família, pois ela lembra que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação
Infantil estabelecem que é função da educação infantil “incentivar e orientar projetos
educacionais-pedagógicos [...], com objetivos relacionados à formação integral da criança,
deixando um espaço para que os envolvidos na educação infantil – famílias, professoras e
crianças assumam a autoria desses projetos (CERIZARA, 2002, p.339).
Referendando o que determina o texto legal, Kramer (1997) e (2002b), ao propor
subsídios para uma leitura crítica das propostas pedagógicas ou curriculares, elenca várias
questões que podem auxiliar a análise deste documento, dentre elas, aquelas relacionadas à
concepção de criança e de educação infantil, bem como, as que dizem respeito às famílias das
crianças. Na resenha dos livro “Avaliando a pré-escola: uma trajetória de formação de
professoras”, a relação entre a criança, a família, a instituição de educação infantil e a
profissionalização docente do professor de educação infantil é evidente, pois o texto diz que:
“Uma pedagogia da Educação Infantil que é diferente da casa, do hospital e da escola, é uma
10523
experiência construída com a participação de três protagonistas: a criança, os educadores e a
família” (GODOI, 2003, p.329).
Para Kishimoto (2005), as Pedagogias da Educação Infantil deveriam tratar de
concepções de criança e de educação infantil, prevendo também, a formação do adulto e da
criança. Na opinião da autora (2005, p.185), “faltam pedagogias que dão voz às crianças, que
utilizam as observações do cotidiano, as histórias de vidas nas quais crianças, pais e
professores(as) e a comunidade [...]” assumam o papel de protagonistas. Estudos em Braga e
na Inglaterra, “demonstram que a pesquisa-ação, com o envolvimento de professores e pais,
aumenta o profissionalismo” (KISHIMOTO, 2005, p.189).
Em síntese, com a análise dos artigos pesquisados constatou-se que o tema
predominantemente discutido nas revistas foi a formação de professores para a educação
infantil; quanto ao tipo de texto, a maioria são artigos e há um equilíbrio entre os relatos de
experiência e as pesquisas. No que se refere ao tipo de pesquisa, constatou-se um maior
número de estudos bibliográficos, na sequência, aparecem as pesquisas empíricas e os estudos
teórico-práticos. Foi possível verificar, ainda, algumas características comuns entre os artigos,
decorrentes do período relacionado para o estudo (1996-2010), tais como, referência aos
mesmos autores e às mesmas temáticas e categorias de análise e a influência da bibliografia
italiana nas discussões. Observou-se que a legislação em vigor fez com que os cursos de
formação de professores incluíssem, em seus currículos a nova concepção de criança e de
educação infantil e, consequentemente, de professor desta etapa da educação básica, e
abordassem a necessidade do envolvimento das famílias na educação da criança de 0 (zero) a
6 (seis) anos de idade.
Considerações finais
Utilizar como material de pesquisa fontes veiculadas na imprensa periódica
educacional brasileira sobre a história da profissão docente do professor de educação infantil
foi uma experiência significativa, pois, a cada artigo lido e analisado, pude resgatar a minha
militância pela educação infantil, seja como mulher, mãe e professora universitária,
formadora de professores de educação infantil. Muitos têm sido os desafios e também muitas
são as conquistas neste campo educacional, a passos lentos, mas recompensadores,
principalmente, na luta pela desmistificação de que as instituições de educação infantil têm
por objetivo principal liberar a mão de obra feminina para o mercado de trabalho, atendendo,
10524
exclusivamente, a criança pobre, e que, para atuar com as crianças pequenas, serve o
profissional menos qualificado.
A história da profissão docente do professor de educação infantil na imprensa
pedagógica educacional, após a LDB (9.394/96), desencadeou uma discussão rica e necessária
sobre a formação inicial, em serviço e continuada do professor desta etapa da educação
básica, assim como, reflexões importantes sobre a forma como se daria, a partir de então, a
formação desses profissionais.
Essas discussões e reflexões alertam para o risco de se aligeirar a formação dos
professores, realizando-a superficialmente apenas para atender a lei, bem como, para a
necessidade de respeitar a experiência e a história de vida daqueles que atuavam nas
instituições de educação infantil sem a formação mínima exigida. Uma questão importante
também se fez presente nos artigos analisados, ora explicitamente, ora implicitamente: De que
professor de educação infantil se precisa para atender as necessidades desta nova concepção
de criança e de educação infantil? Nesse sentido, temáticas como gênero, identidade e
trabalho pedagógico foram desenvolvidas, traçando um ‘esboço’ do perfil desejável para o
professor de crianças de 0 (zero) a 6 (seis) anos de idade.
No que se refere às estratégias utilizadas para atender a legislação em vigor, verificou-
se a oferta do curso de magistério em nível médio, do curso de pedagogia e do curso normal
superior, bem como, de cursos de formação continuada, oferecidos pelas Secretarias de
Educação, e daqueles realizados pelas próprias instituições de educação infantil. Foi possível,
também, conhecer o trabalho realizado nos campos de pesquisa (instituições de formação de
professores e de educação infantil), por meio dos relatos dos autores em seus artigos.
Identificou-se, com exceção de um artigo, características argumentais sobre a relação
desenvolvida entre a criança, a família e a instituição de educação infantil, quando os autores
tratavam da profissionalização docente do professor desta etapa da educação básica. Nesse
sentido, acredita-se que o material encontrado e produzido neste trabalho poderá auxiliar no
exercício de uma melhor compreensão das relações entre as crianças e os adultos (professores
e pais) no interior das instituições de educação infantil.
Espera-se que o proposto em lei e as discussões realizadas pelos autores pesquisados
tornem-se uma realidade na educação infantil brasileira, e, em especial, garantam aos
professores aquilo que lhes é de direito, isto é, uma formação inicial e continuada de
qualidade, condições adequadas de trabalho (espaço físico, material, razão adulto/criança,
10525
jornada de trabalho etc.) e salários dignos, o que lhes possibilitará respeito e prestigio social
perante as famílias, a comunidade e a sociedade de modo geral. Almeja-se também que este
estudo possa contribuir para o desenvolvimento de outras pesquisas sobre a formação docente
do professor de educação infantil, fornecendo-lhes informações importantes veiculadas na
imprensa periódica educacional após a LDB (9.394/96), sobre o tema em questão.
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