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GOVERNO DO ESTADO DO PARANÁSECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO
SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
DIRETRIZES CURRICULARES DE SOCIOLOGIA PARA O ENSINO MÉDIO
EM REVISÃO
CURITIBA2007
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SUMÁRIO
1. DIMENSÃO HISTÓRICA DA DISCIPLINA
1.1 O ENSINO DA SOCIOLOGIA NO CONTEXTO ESCOLAR BRASILEIRO
2. FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
2.1 ALGUMAS CONCEPÇÕES TEÓRICAS ACERCA DA SOCIOLOGIA
2.1.1 Concepções sociológicas de Karl Marx
2.1.2 Concepções sociológicas de Emile Durkheim
2.1.3 Concepções sociológicas de Max Weber
2.1.4 Concepções sociológicas de Antonio Gramsci
2.1.5 Concepções sociológicas de Pierre Bourdieu
2. Concepções sociológicas de Florestan Fernandes
2.2 A ESCOLHA PELA SOCIOLOGIA CRÍTICA
3. CONTEÚDOS ESTRUTURANTES E CONTEÚDOS ESPECÍFICOS
3.1 O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO E AS INSTITUIÇÕES SOCIAIS
3.2 CULTURA E INDÚSTRIA CULTURAL
3.3 TRABALHO, PRODUÇÃO E CLASSES SOCIAIS
3.4 PODER, POLÍTICA E IDEOLOGIA
3.5 DIREITOS, CIDADANIA E MOVIMENTOS SOCIAIS
4. ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS
5. AVALIAÇÃO
6. REFERÊNCIAS
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1 DIMENSÃO HISTÓRICA DA DISCIPLINA
As inquietações que mobilizaram os primeiros sociólogos no final do século
XIX, após a Revolução Industrial, em muitos aspectos se aproximam das
preocupações de nossos colegas contemporâneos. No entanto, há que se
compreender as modificações verificadas nas relações sociais, decorrentes das
mudanças estruturais impostas pela formação de um novo modo de produção
econômica.
Embora consolidado, o sistema capitalista não cessa sua dinâmica e
assume inéditas formas de produção, distribuição e opressão, nunca imaginadas
pelos precursores do estudo da sociedade, o que implica novas formas de olhar,
compreender e atuar socialmente.
Como ciência, a Sociologia delineou-se no rastro do pensamento
positivista, vinculada à ordem das Ciências Naturais. O caráter científico, tão
buscado e valorizado na época (século XIX), estava ligado à lógica da ciências
ditas “experimentais”. Ou seja, para ascender ao estatuto de ciência, deveria
atender a determinados pré-requisitos e seguir métodos “científicos” que
pretendiam também a neutralidade e o estabelecimento de regras.
São representantes deste pensamento Augusto Comte (1798-1857), o
primeiro a usar o termo Sociologia, relacionando-o com a ciência da sociedade, e
Émile Durkheim (1858-1917), que adotou conceitos elaborados por Comte,
especialmente o de ordem social, para delinear uma das correntes
representativas do pensamento sociológico. Durkheim foi o responsável pela
inclusão da Sociologia como disciplina acadêmica na França. Seu trabalho visava
a instituicionalização da Sociologia como ciência e como disciplina.
Ambos pensadores tiveram em comum a busca de soluções para os graves
problemas sociais gerados pelo modo de produção capitalista; isto é, a miséria, o
desemprego e as conseqüentes greves e rebeliões operárias. Cada um desses
sintomas sociais foram analisados por esses pensadores como desvios ou
anomalias da sociedade, que poderiam ser corrigidos ou mesmo solucionados
pelo resgate de valores morais – como a solidariedade - os quais restabeleceriam
relações estáveis entre as pessoas, independentemente da classe social a que
pertencessem.
Um dos mecanismos responsáveis por essa tarefa seria a educação, capaz
de adequar devidamente os indivíduos à nova sociedade. Tais pensadores a
analisaram sob um determinado ponto de vista e preconizaram a manutenção do
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status quo, da ordem vigente e, de alguma forma, pelo elogio à sociedade
capitalista.
Apesar de sua origem conservadora e de sua proposta inicial conformista,
a Sociologia desenvolveu também um olhar crítico e questionador sobre a
sociedade. O pensador alemão Karl Marx (1818-1883) trouxe importantes
contribuições ao pensamento sociológico porque desnudou as relações de
exploração que se estabeleceram a partir do momento em que uma determinada
classe social apropriou-se dos meios de produção e passou a deter e conduzir os
mecanismos (as ações) da sociedade.
De acordo com o pensamento de Marx, não há soluções conciliadoras
numa sociedade cujas relações se baseiem na exploração do trabalho e na
crescente espoliação da maioria. Para Marx, a teoria apenas tem sentido se
transformada em práxis, ou seja, em ação fundamentada politicamente, para
transformar as estruturas de poder vigente e construir novas relações sociais,
fundadas na igualdade de condições a todos os indivíduos.
Para Marx, a única possibilidade de superar a desigualdade e a opressão
está na construção de uma nova sociedade, que pressuponha a inexistência de
classes sociais e, portanto, de dominação de uma minoria sobre uma maioria.
Outra importante contribuição ao pensamento sociológico crítico e revolucionário
pode ser encontrada nos escritos do italiano Antonio Gramsci (1891-1937), cujas
análises foram incorporadas principalmente às pesquisas sociológicas e
educacionais. Criados por Gramsci, os conceitos de hegemonia, intelectual
orgânico e escola única auxiliam no processo de repensar as estruturas
educacionais.
No Brasil, tanto as idéias conformistas quanto as revolucionárias
exerceram forte influência na formação do pensamento sociológico brasileiro.
Após a instalação da República, autores como Silvio Romero (1851-1914),
Euclides da Cunha (1866-1909) e Oliveira Vianna (1883-1951), entre outros,
considerados conservadores, configuraram uma tradição ensaísta – sem uma
preocupação especificamente científica – preocupada em pensar o que seria a
identidade cultural nacional. Os estudos históricos, literários e as análises
sociológicas das três primeiras décadas do século XX, realizados por estes e
outros autores, problematizaram a nação brasileira no contexto da chamada
modernização. Temas como raça e cultura eram o foco desses estudos. A grande
questão era construir, delinear e definir a brasilidade.
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Na década de 1930, ressaltam-se as contribuições de Gilberto Freyre e
Fernando de Azevedo que, em suas obras, analisaram com mais rigor científico a
realidade brasileira e procuraram estabelecer sínteses explicativas do Brasil.
Gilberto Freyre (1900-1987): formado pela Sociologia norte-americana, recebeu
forte influência teórica da chamada escola culturalista. Sua obra mais
conhecida, Casa-Grande & Senzala, problematizou a questão étnico-racial e
assumiu como positiva para a cultura brasileira a miscigenação entre
brancos de origem européia e negros de origem africana. Essa obra e suas
teses repercutiram intensamente no cenário intelectual brasileiro e tornou-
se referência nos estudos sociológicos. Apesar da importância de sua obra,
Freyre foi considerado um pensador conservador, devido à ausência, em
seus trabalhos, de uma crítica mais profunda das estruturas econômicas que
determinavam a existência do sistema escravista.
Fernando de Azevedo (1894-1974): um dos principais representantes do
pensamento escolanovista no Brasil e redator do Manifesto dos pioneiros da
educação nova (1932), contribuiu para o tratamento científico que a
educação passaria a receber por meio da ciência sociológica. Na sua obra, a
educação foi considerada, pela primeira vez, um problema social e, como
tal, mereceria também um tratamento analítico especial. Caberia à
Sociologia não somente esta tarefa mas, também, a atribuição de “salvar a
educação” e, conseqüentemente, a sociedade.
Por sua vez, como forma de pensar e explicar a sociedade capitalista, o
marxismo teve fortes repercussões no Brasil, notadamente a partir de 1930, com
a criação da Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo (1933), da
Universidade de São Paulo (1934) e da Universidade do Distrito Federal (1935).
Estes novos meios universitários tornaram-se centros aglutinadores de
intelectuais importantes, tais como:
Caio Prado Júnior (1907-1980);
Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982);
Florestan Fernandes (1920-1995);
Otávio Ianni (1926-2004).
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Esses intelectuais apresentaram uma produção sociológica significativa
que, somada à presença de professores estrangeiros convidados, sobretudo os
da chamada Missão Francesa – o primeiro grupo de professores contratados para
inaugurar, em São Paulo, os cursos da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da
USP, em 1934 – contribuíram para que a Sociologia no Brasil se firmasse. Uma
nova geração de sociólogos definiria em seguida os rumos desse conhecimento.
A produção sociológica desses e outros autores posteriores esteve atenta
aos grandes problemas sociais decorrentes das mudanças econômicas e políticas
da sociedade brasileira, como os movimentos sociais agrários e urbanos, os
movimentos estudantis, as mudanças na organização do mundo do trabalho. As
questões das minorias – indígenas, mulheres, negros, homossexuais – passaram
a ter mais atenção e as instituições sociais passaram a ser estudadas em sua
dinâmica social e histórica.
Forjadas nas universidades e centros de estudos, as discussões no campo
da Sociologia se consolidaram como importante perspectiva de compreensão das
novas dimensões constantes na sociedade brasileira.
1.1 O ENSINO DA SOCIOLOGIA NO CONTEXTO ESCOLAR BRASILEIRO
Retomar a trajetória histórica do ensino da Sociologia no Brasil significa
percorrer um caminho marcado por intermitências. As idas e vindas da disciplina
às grades curriculares das escolas de ensino secundário demonstram a
dificuldade em firmar-se como área do conhecimento fundamental para a
formação humana e seu atrelamento a interesses e vontades políticas.
A adoção da disciplina nos cursos secundários ocorreu no início da
República (1891), vinculada à disciplina de Moral, embora ainda não existissem
cursos de formação de professores em nível superior nesta área. Em 1901, o
Decreto n.º 3890, de 1.º de janeiro, retirou a disciplina oficialmente dos currículos
escolares. O retorno ocorreria somente em 1925, na escola secundária Colégio
Pedro II, no Rio de Janeiro, e em 1928 passaria a ser ministrada nas escolas de
formação de professores e no chamado ciclo complementar para quem desejasse
freqüentar cursos superiores nas áreas de Direito, Ciências Médicas, Engenharia
e Arquitetura.
Os anos de 1930 foram de fundamental importância para a história do
ensino da Sociologia no Brasil. A criação dos Cursos Superiores de Ciências
Sociais na Escola Livre de Sociologia e Política de São Paulo e da própria
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Universidade de São Paulo possibilitou não apenas o desenvolvimento da
pesquisa sociológica mas, também, a conseqüente formação de quadros
intelectuais e técnicos para pensar o país e para dar suporte às políticas públicas
em expansão, durante o Estado Novo. Possibilitou, ainda, a formação de
professores para o Ensino Secundário, o que veio colaborar para a consolidação
da Sociologia como disciplina.
Na década de 1930, também ocorreu uma explosão do mercado editorial
brasileiro e, especificamente, na área da Sociologia, sobretudo na região Sudeste
e no Estado de Pernambuco, com autores que procuravam fazer uma explicação-
síntese sobre o país. Algumas publicações tiveram grande destaque: Casa
Grande & Senzala, de Gilberto Freyre; Formação Econômica do Brasil, de Caio
Prado Júnior, e Raízes do Brasil, de Sergio Buarque de Holanda. Foram livros
muito discutidos e tiveram muito prestígio comercial. Contudo, um dos motivos
centrais da força que a Sociologia ganhou nesse período foi sua maciça
introdução nos cursos de formação de professores. A intenção do ensino de
Sociologia era que a disciplina se “livrasse” de seu traço de tradição
bacharelesca.
A Sociologia ainda se apresentava como ciência imparcial, despida de
dogmatismo, e possibilitaria, por suas análises e conclusões, retirar a educação
de um estado pré-científico, pautando a prática educacional em aspectos
experimentais característicos da Sociologia da época. Entretanto, esse
encaminhamento supostamente científico tinha um caráter normatizador, voltado
para a manutenção da ordem social, próprio da tradição positivista, e que
perduraria ainda por algum tempo no ensino desta disciplina.
Após a instalação do Estado Novo, no governo de Getúlio Vargas, várias
medidas educacionais foram tomadas para reforçar as idéias de nacionalismo. A
chamada Reforma Capanema (1942) retirou a obrigatoriedade do ensino de
Sociologia nas escolas secundárias; como conseqüência, a disciplina
praticamente desapareceu dos currículos escolares. Esta alternância – ora a
obrigatoriedade, ora não – seria constante na trajetória do ensino da Sociologia
no Brasil. Desse modo, todas as vezes que deixou de ser obrigatória, a disciplina
ficou ausente da formação educacional básica, o que evidenciava também
ausência de uma compreensão da importância da Sociologia como área de
conhecimento e como forma de interpretação da realidade.
Na década de 1950 e início da década de 1960, o clima de democracia
política que o país respirou favoreceu a disseminação das Faculdades de Filosofia,
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Ciências e Letras pelo Brasil, de modo que a Sociologia passou a fazer parte dos
currículos dos cursos de Ciências Sociais e também de outros cursos superiores,
especialmente os da área das Ciências Humanas. Ampliou-se, assim, a formação
da Sociologia para o Ensino Médio; entretanto, ela ainda não estava com
presença permanente nos currículos dos cursos secundários.
No período da ditadura militar, na década de 1970, a Sociologia continuou
excluída das grades curriculares dos cursos secundários e permaneceu apenas
nos cursos de formação para magistério e constantemente substituída pela
disciplina de Fundamentos da Educação.
Nos programas de políticas públicas educacionais implementados no
mesmo período, pela Lei 5692/71, que instituía a obrigatoriedade do ensino
profissional no chamado 2.º grau, outras disciplinas foram criadas: Educação
Moral e Cívica, Organização Social e Política Brasileira e Ensino Religioso. Essas
disciplinas foram marcadas por um acentuado caráter moral e disciplinador.
A partir de 1982, com o início do processo de redemocratização, alguns
estados brasileiros como São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do
Sul, Pará, Pernambuco, além do Distrito Federal, iniciaram movimentos pela
inclusão da Sociologia no Ensino Médio. No entanto, a partir de 1989, com a
promulgação das novas Constituições dos estados brasileiros, mais uma vez, os
defensores do ensino da Sociologia viram frustrada a possibilidade de que a
disciplina se inserisse nos currículos escolares como obrigatória.
A promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9394/96)
abriu novas perspectivas para a inclusão da Sociologia nas grades curriculares,
uma vez que dita no art.36, §1º, inciso III, a importância do “domínio dos
conhecimentos de Filosofia e Sociologia necessários ao exercício da cidadania”.
Contudo, durante a regulamentação da Lei, foi alterado profundamente o seu
sentido, pois as Diretrizes Curriculares do Ensino Médio apresentaram como
proposta o tratamento interdisciplinar dos conteúdos de Sociologia e esvaziaram,
portanto, sua especificidade e seu caráter de obrigatoriedade. Esta nova derrota
da Sociologia impulsionou uma série de discussões e propostas de ações para
reverter a situação em vários Estados do país, uma vez que, até aquele
momento, a obrigatoriedade da disciplina no Ensino Médio não estava garantida.
A trajetória do ensino da Sociologia, caracterizada por freqüentes
interrupções, trouxe-lhe marcas que não podem ser ignoradas relativamente a
sua inserção no cenário educacional. Alguns aspectos originários dessas
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interrupções dificultam que a disciplina se consolide em muitas escolas.
Destacam-se:
a falta de tradição da disciplina dificulta seu espaço nas grades
curriculares,
a carência de materiais didáticos adequados limita o ensino aos alunos de
Ensino Médio,
a ausência de pesquisa e metodologias para esse nível e modalidade de
ensino implica, de algum modo, a reprodução de métodos do ensino
superior.
Na realidade contemporânea, não há mais espaço para discussões
pretensamente neutras, como se fazia no século XIX; pois, no presente, a
Sociologia tem a função de ir além da leitura e da interpretação teórica da
sociedade. De fato, tornou-se questionável explicar e compreender normas
sociais e institucionais, pelo interesse de simplesmente adaptar sujeitos ao meio
ou, mesmo, para que eles façam a mera crítica da sociedade. Espera-se da
disciplina de Sociologia que ela contribua para que os sujeitos – neste contexto,
os envolvidos no processo pedagógico – tenham recursos para desconstruir e
desnaturalizar conceitos tomados historicamente como irrefutáveis, de maneira
que melhorem seu senso crítico e também possam transformar a realidade e
conquistar mais participação ativa na sociedade.
Os grandes problemas que vivemos hoje, provenientes do acirramento das
forças do capitalismo mundial e do desenvolvimento industrial desenfreado,
entre outras causas, exigem sujeitos capazes de refutar a lógica neoliberal da
destruição social e planetária. É tarefa inadiável da escola e da Sociologia a
formação de novos valores, de uma nova ética e de novas práticas que indiquem
a possibilidade de construção de novas relações sociais.
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2 FUNDAMENTOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
Desde a sua constituição como conhecimento sistematizado, a Sociologia
tem contribuído para ampliar o conhecimento dos homens sobre sua própria
condição de vida e, fundamentalmente, para a análise das sociedades, ao
compor, consolidar e alargar um saber especializado, pautado em teorias e
pesquisas que esclarecem muitos problemas da vida social.
Seu objeto é o conhecimento e a explicação da sociedade pela
compreensão das diversas formas pelas quais os seres humanos vivem em
grupos, das relações que se estabelecem no interior e entre esses diferentes
grupos, bem como a compreensão das conseqüências dessas relações para
indivíduos e coletividades.
A Sociologia se afirmou no desenvolvimento e na consolidação do
capitalismo; por isso, traz a especificidade de, simultaneamente, fazer parte e
procurar explicar a sociedade capitalista como forma de organização social.
Contudo, não existe uma única forma de explicar sociologicamente a realidade;
cada uma depende de posicionamentos políticos distintos, o que confirma o
princípio de que não existe neutralidade científica em análises do social.
O tratamento dos conteúdos pertinentes à Sociologia se fundamenta e
sustenta-se em teorias originárias de diferentes tradições sociológicas, cada uma
com seu potencial explicativo. A ciência, dessa forma, pode ser mobilizada para a
conservação ou para a transformação da sociedade, para a melhoria ou para a
degradação humana. Como disciplina escolar, a Sociologia deve acolher esta
particularidade – das diferentes tradições – e, ao mesmo tempo, recusar qualquer
espécie de síntese teórica, assim como encaminhamentos pedagógicos de
ocasião, carentes de método e rigor.
No século XX, três diferentes linhas teóricas clássicas, sistematizadas por
Émile Durkheim, Karl Marx e Max Weber alicerçaram, e ainda alicerçam,
concepções sociológicas contemporâneas. Entre elas, destacam-se: as
concepções de Antonio Gramsci, Pierre Bourdieu e Florestan Fernandes. Cada
uma, a seu modo, elege conteúdos, temáticas, problemáticas, metodologias,
concernentes ao contexto histórico em que foram construídas, e buscam
interpretar e dar respostas aos problemas da realidade contemporânea.
Ressalta-se que, como disciplina acadêmica e escolar, a história da
Sociologia não está desvinculada dos fundamentos teóricos e metodológicos que
a constituem como campo científico mais abrangente. É preciso destacar nos
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teóricos clássicos suas concepções de sociedade e, também, suas concepções de
educação, já que uma está relacionada à outra e orientam mutuamente campos
de ação política e, por efeito, de ação educacional.
2.1 ALGUMAS CONCEPÇÕES TEÓRICAS ACERCA DA SOCIOLOGIA
2.1.1 Concepções sociológicas de Karl Marx
Karl Marx (1818-1883) concebe a sociedade capitalista como relação de
exploração, e a educação como possibilidade de emancipar o sujeito da
opressão exercida por essa relação desigual.
Marx, cuja finalidade foi compreender a natureza da sociedade capitalista
e apontar uma direção para sua transformação e superação, investigou os
mecanismos de “enquadramento” social dos indivíduos pela análise das forças
sociais capazes de controlar a consciência humana. Seu esforço foi o de
desvendar a essência da sociedade capitalista, de modo a superar análises de
aparência, consideradas abordagens ideológicas, que não se constituiriam em
ciência.
Ao perceber, para além das aparências, o processo histórico que conduziu
a burguesia ao patamar de classe dominante, Marx enunciou – como lei de
validade geral – que a história das sociedades é movida pela luta entre as classes
sociais.
Para Marx, a educação é importante forma de perpetuar a exploração de
uma classe sobre a outra, pois dissemina a ideologia dominante e inculca na
classe dominada o modo burguês de ver o mundo. No entanto, Marx também vê
na educação a possibilidade de reverter essa situação. Conforme seu
entendimento, cabe à educação devolver ao trabalhador expropriado o
conhecimento do conjunto do processo produtivo, e extinguir a divisão do
trabalho em intelectual e manual e, conseqüentemente, a alienação. Portanto,
para este autor, por meio da educação, o sujeito irá apreender a essência dos
fenômenos sociais, superando as explicações que reduzem-se tão-somente à sua
aparência.
Marx propõe a substituição do indivíduo parcial e restrito, fragmentado
socialmente, pelo indivíduo integral, cujas ações sociais seriam desdobramentos
de suas potencialidades. De acordo com Marx, a educação é um mecanismo que,
conforme seu conteúdo de classe, pode oprimir ou emancipar o homem.
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2.1.2 Concepções de sociológicas Émile Durkheim
Émile Durkheim (1858-1917) concebe a sociedade capitalista como vínculo moral
entre os homens, e a educação como forma de manutenção da estabilidade e da
ordem social. Enfatizou a possibilidade de se pensar os fatos sociais
objetivamente, a partir de procedimentos científicos, de métodos que revelariam
as estruturas e os padrões dos fenômenos sociais. Esse método de pensamento
social ajudaria a nos afastar das pré-noções, dos pré-conceitos, enfim, do senso
comum.
Para Durkheim, as representações dos fatos sociais são percebidas pelas
pessoas de modo singular e coletivo ao mesmo tempo: cada ser humano é
habitado por estados mentais que dizem respeito apenas a sua pessoa quanto
por estados mentais coletivos, que são crenças, valores e hábitos
compartilhados.
O sujeito faz parte da sociedade assim como parte da sociedade o
compõe. Portanto, a sociedade faz sentido somente se compreendida como um
conjunto cuja existência própria, independentemente de manifestações
individuais, exerce sobre cada ser humano uma coerção exterior, a partir de
pressões e obrigatoriedades porque, de alguma forma, ela não “cabe” na sua
totalidade, na mente de cada indivíduo. Assim consideradas, as representações
coletivas exteriores às consciências individuais não derivam dos indivíduos
tomados isoladamente, mas de sua cooperação.
Como totalidade, a sociedade precede sobre os indivíduos. Daí a
necessidade da cooperação para concretizar a organização social. Durkheim
afirma que, para haver cooperação é necessário consenso, ou seja, adesão às
regras sociais de validade geral e indistinta, de modo que cabe à educação
ensinar aos indivíduos essas regras. Para Durkheim, educação é socialização, é
ensinar e aprender o “lugar” de cada um no sistema, no organismo social, sem
questionar se a forma de organização social é desigual ou não. Sob tal ponto de
vista, a sociedade modela a ação individual; à educação cabe enquadrar cada
indivíduo às expectativas de classe, gênero, etnia, moral que são esperadas dele.
2.1.3 Concepções sociológicas de Max Weber
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Max Weber (1864-1920) concebe a sociedade capitalista como vínculo de
racionalização da vida, resultado de uma grande teia de interações e relações
interindividuais e pensa a educação como uma resposta limitada e inexorável à
esta racionalização.
Para Weber, a realidade social não é algo por si, independente. A realidade
tem determinada fisionomia a partir dos valores que orientam sua compreensão,
os quais são compartilhados, são coletivos. No entanto, são introjetados e
apreendidos de formas diferenciadas, efeito do processo de interação social. Ou
seja, o social reside na interação entre as partes, que são muitas e se renovam a
cada dia; daí a impossibilidade de sua apreensão como totalidade.
No que tange à compreensão da realidade social, no máximo, é possível
decifrar a significação da ação social, ou seja, as condutas humanas. Para Weber,
a ação social no mundo moderno exige dos homens desempenho de tarefas,
além dos valores, e não prescinde do cálculo dos custos e benefícios e da
racionalidade (finalidades). Compreender a sociedade é analisar os
comportamentos movidos pela racionalidade dos sujeitos com relação aos outros,
é compreender o agir dos homens que se relacionam uns com os outros, de
acordo com um cálculo e uma finalidade que tem por base as regras.
Weber entende que uma ordem social para atender à finalidade do mundo
moderno capitalista se torna cada vez mais ampla, institucionalizada,
desencantada e, sobretudo, burocrática. Neste contexto, sob uma compreensão
“desencantada”, Weber considera que resta à educação sistemática (escolar)
prover os sujeitos de conteúdos especializados, eruditos, e de disposições que os
predisponham a ter as condições – conduta de vida e conhecimento
especializado – necessárias para realizar suas funções de perito na burocracia
profissional.
2.1.4 Concepções sociológicas de Antonio Gramsci
Antonio Gramsci (1891-1937), pensador marxista e ativo militante
comunista, volta sua reflexão para as sociedades de capitalismo avançado,
caracterizadas por um forte mercado interno e pelo pluralismo político. Conforme
a concepção de Gramsci, o poder é diluído entre o governo e suas instituições,
qualificado por ele como o espaço da coerção; e a variadas instâncias da
sociedade civil como as indústrias, os partidos, os sindicatos, chamados de
espaço de consenso e persuasão.
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Desta concepção de sociedade, Gramsci propõe uma ação política
revolucionária articulada organicamente na sociedade, no cotidiano das relações
sociais. Além da superação da exploração de uma classe sobre a outra e da
eliminação da propriedade privada, é necessário conquistar a hegemonia política
e ideológica, lutar contra a apropriação privada e elitista do conhecimento.
A escola, em seus diferentes graus, é o instrumento da formação de um
novo tipo de homem, que deve entender-se como produto de uma elaboração de
vontade e pensamento coletivo, logrado mediante o esforço individual concreto e
não por processos ou determinações alheios a cada um.
Para Gramsci, as características da alternativa pedagógica que buscam a
hegemonia são:
que a educação seja social;
que a educação seja de todos e para todos, e
que a educação seja responsável, aceita interiormente, e não imposta.
Trata-se do projeto da “escola única”, na qual, desde o nível fundamental
até o nível superior, não esteja presente o abismo que separa as classes sociais
na sociedade capitalista ocidental. Esse projeto é revolucionário porque
abandona a idéia do conhecimento dual, ou seja, extingue a existência de
escolas nas quais alguns são preparados para ser dirigentes e escolas nas quais
outros são preparados para serem dirigidos.
2.1.5 Concepções sociológicas de Pierre Bourdieu
Em sua concepção de sociedade, Bourdieu (1930 – 2002) transcende a
oposição entre objetivismo e subjetivismo de forma a romper com a dualidade
entre indivíduo e sociedade. Este autor questiona o discurso que propaga uma
escola igualitária que, supostamente, possibilitaria a concretização das
potencialidades humana. Ao contrário, para ele, a instituição escolar dissimularia,
sob a fachada da neutralidade, as desigualdades.
As escolas, as universidades e outras instituições reproduzem as relações
sociais e de poder dominantes pelos critérios de triagem e seleção, inclusão ou
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exclusão de conteúdos, métodos e, conseqüentemente, de indivíduos que
ocupam determinados papéis sociais.
Sob tal concepção, a possibilidade de mudança não está necessariamente
na educação que veicula o saber sistematizado. Assim, toda ação pedagógica é
considerada uma violência simbólica, arbitrária, e oculta relações de força sob
imposição de valores, normas e concepções culturais revestidas de uma suposta
autoridade, originárias nos grupos e classes dominantes.
Para Bourdieu, os bens culturais aos quais o aluno tem acesso conforme
sua classe social, incrementados pelos conhecimentos escolares – seu capital
cultural –, determinam a sua posição na hierarquia econômica e social.
2.1.6 Concepções sociológicas de Florestan Fernandes
Para Florestan Fernandes (1920-1995), a sociedade é um nexo de relações
causais que se desdobram em processos e estruturas que engendram a
especificidade social. Para ele, o homem se constitui como ser social no mesmo
processo por meio do qual constitui sua sociabilidade, sua forma de organização
concreta. “Existir” socialmente significa, para o sociólogo, compartilhar
condições e situações, desenvolver atividades e reações, praticar ações e
relações que são interdependentes e se influenciam reciprocamente. Tal nexo de
relações configuram as condições de persistência e/ou transformação da
realidade social.
Ao se voltar para conteúdos que propiciem a consciência social de classe
dos trabalhadores e sua desobjetificação, Florestan Fernandes reivindica uma
escola que dê prioridade à maioria da população marginalizada. A educação e a
auto-emancipação coletiva se tornam, então, co-determinantes de uma relação
recíproca mediada pela escola e inspirada no papel político da classe
trabalhadora de negar a sociedade capitalista existente.
2.2 A ESCOLHA PELA SOCIOLOGIA CRÍTICA
Conhecer as diversas concepções sociológicas torna-se de importância
central na construção do pensamento sociológico, sobretudo no contexto escolar.
Por meio de tais concepções, o professor reflete e orienta criticamente sua ação
pedagógica, e, por sua vez, o aluno de Ensino Médio tem acesso a outros
saberes, elaborados de forma rigorosa e crítica, acerca da realidade.
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De fato, uma visão plural das concepções sociológicas possibilita ao
professor e ao aluno, cada um no seu nível de compreensão, alterar
qualitativamente sua prática social. Do resgate dos seus conteúdos críticos, a
sociologia clássica e a moderna permitem esclarecer muitas questões acerca de
desigualdades sociais, econômicas, políticas e culturais da sociedade brasileira.
Nestas Diretrizes, ao descartar-se a neutralidade, a imparcialidade, o
descompromisso, o conformismo, a ausência de historicidade, propõe-se uma
Sociologia Crítica que analise a realidade em sua perspectiva de prática e de
crítica social. Da relação entre ambas, propõe-se alguns questionamentos:
como ir além do que é estabelecido e explicado historicamente?
quais as causas mais evidentes das desigualdades sociais?
quais as adversidades e os antagonismos presentes no meio social onde
vivem os alunos e os professores?
Sob a ótica da Sociologia Crítica, essas questões podem ser analisadas
conforme as diversas perspectivas dos grupos e classes, situados num dado
contexto histórico, e por meio de uma análise que deve incluir as distintas
interpretações sistematizadas acerca de tais perspectivas. À semelhança da
concepção de Florestan Fernandes, nestas Diretrizes, o conhecimento sociológico
crítico é tomado como instrumento de resgate dialético do movimento histórico,
do real e do pensado, a partir dos grupos e classes que compõem a maioria
(excluída) do povo brasileiro: índios, negros, mulheres, migrantes e trabalhadores
da cidade e do campo.
Na escola, o pensamento sociológico se consolida na articulação entre
experiências e conhecimentos fragmentados com experiências e conhecimentos
compreendidos como totalidades complexas.
A partir desses pressupostos, procura-se dar um tratamento teórico aos
problemas decorrentes do modo como a sociedade capitalista está organizada,
cujos sintomas sociais, entre outros, são:
desigualdades sociais e econômicas;
exclusão do mundo do trabalho;
relações sociais conflituosas;
17
descaso frente a problemas socioambientais;
negação da diversidade cultural, de gênero e étnico-racial.
Em síntese, trata-se de propiciar ao aluno do Ensino Médio os
conhecimentos sociológicos, de maneira que alcance um nível de compreensão
mais elaborado em relação às determinações históricas nas quais se situa e,
mais que isso, na capacidade de intervir e transformar as práticas sociais
cristalizadas.
18
3 CONTEÚDOS ESTRUTURANTES E CONTEÚDOS ESPECÍFICOS
Nestas Diretrizes Curriculares, propõe-se metodologicamente que o ensino
da Sociologia seja fundamentado em conteúdos estruturantes representativos
dos grandes campos de saber, da cultura e do conhecimento universal, que
devem ser compreendidos a partir da práxis pedagógica como construção
histórica.
De fato, os conteúdos estruturantes de Sociologia são conhecimentos de
grande amplitude, conceitos e práticas que identificam e organizam campos de
estudo considerados centrais e básicos para compreender os processos de
construção social. Não devem ser confundidos com uma listagem de temas e
conceitos encadeados de forma rígida, pois são muito mais que isto. Tais
conteúdos norteiam professores e alunos – sujeitos da educação escolar e da
prática social – na seleção, organização e problematização dos conteúdos
específicos, a partir das necessidades locais e coletivas, sem perder a busca da
totalidade, em inter-relações e não na simples soma das partes.
Ressalta-se que os conteúdos estruturantes e os conteúdos específicos
propostos devem ser trabalhados de modo inter-relacionado, conforme a
seqüência que o professor considerar mais adequada e, sobretudo, podem ser
rearticulados e revistos sempre que uma nova questão a eles relacionada se
apresente.
O ensino da Sociologia deve ser encaminhado de modo que a dialética dos
fenômenos sociais seja explicada e entendida para além do senso comum, para
uma síntese que favoreça a leitura das sociedades à luz do conhecimento
científico.
Os elementos analíticos do conhecimento sociológico devem estar em
contínuo diálogo com as transformações socioeconômicas, culturais, e políticas
do mundo contemporâneo. Por isso, não podem ser estanques nem vistos em si
mesmos.
Assim, para discutir exclusão, desemprego, violência urbana e no campo,
segurança, cidadania, consumo, individualismo, reforma agrária, educação e
saúde, a Sociologia Crítica articula outros aspectos, mais amplos, como a
transnacionalização da economia, a sujeição de países às exigências do
capitalismo multinacional, o superdimensionamento do mercado, o Estado
mínimo privatista, o mercantilismo nas relações sociais, os conflitos étnico-
19
raciais, a celebração da cultura de massas, os estilos de vida individualistas e
consumistas.
Embora a construção histórica da Sociologia e das teorias sociológicas
fundadoras desta ciência não sejam apresentadas como um conteúdo
estruturante, sugere-se, nestas Diretrizes, que a disciplina seja iniciada com
esses temas e que eles fundamentem os conteúdos específicos.
Tal abordagem visa estabelecer uma relação entre o contexto histórico dos
autores clássicos da Sociologia, a construção de suas teorias e o conteúdo
específico em estudo, numa perspectiva crítica, que embasará teoricamente as
várias possibilidades de explicação sociológica.
Os conteúdos estruturantes da disciplina de Sociologia propostos são:
- o processo de socialização e as instituições sociais;
- a cultura e a indústria cultural;
- trabalho, produção e classes sociais;
- poder, política e ideologia, e
- cidadania e movimentos sociais.
3.1 O PROCESSO DE SOCIALIZAÇÃO E AS INSTITUIÇÕES SOCIAIS
A socialização – inserção, construção e transmissão – de valores, normas e
regras capazes de desenvolver a vida em sociedade constitui o processo que
possibilita compreender as diferentes formas de organização social. A vida em
sociedade exige que seus membros conheçam e internalizem as expectativas de
comportamentos estabelecidos por valores, regras e normas nela presentes, o
que se dá fundamentalmente por meio das instituições sociais vinculadas a
contextos econômico, políticos e culturais.
Estudar sociologicamente as instituições sociais significa recuperar sua
historicidade nos diversos grupos humanos, a fim de que sejam desnaturalizadas
e, posteriormente, sofram uma crítica e uma explicação de aspectos
aparentemente estáticos e imutáveis. De fato, as instituições sociais devem ser
estudadas em sua constante dinâmica, sempre conflituosa, e em suas diversas
faces – sejam elas conservadoras, sejam quando apontam para práticas
revolucionárias.
Tradicionalmente, as instituições sociais têm sido tratadas pela Sociologia
de forma a-histórica, como responsáveis pela manutenção da ordem social, de
20
modo que são tomadas como um dado natural sobre o qual não cabem dúvidas
ou questões.
A simples apreensão e constatação da existência das instituições na
sociedade em nada contribui para a construção de um pensamento sociológico
crítico nos alunos do Ensino Médio; apenas reforça o senso comum e o status
quo. Importa à disciplina de Sociologia desenvolver um olhar crítico, explicativo e
sobretudo interrogador, com vistas a mudança de atitudes acerca da organização
da sociedade. Portanto, a importância do estudo das instituições sociais na
disciplina de Sociologia tem como funções principais:
contribuir para a mudança de atitudes a fim de que se ampliem as
condições de cidadania dos estudantes,
contribuir para o desenvolvimento de um pensamento analítico, livre de
noções preconceituosas e deterministas, acerca das relações sociais.
Considerada a dimensão dos conteúdos estruturantes, nestas Diretrizes,
propõe-se a inclusão dos seguintes conteúdos específicos para as três séries do
Ensino Médio:
- instituição familiar,
- instituição escolar e
- instituição religiosa, entre outros.
Instituição familiar
Relativamente à instituição familiar, propõe-se o estudo de suas origens
históricas; suas diversas configurações em distintos espaços geográficos e a
dinâmica das famílias nas sociedades contemporâneas. Importa ao aluno
compreender a importância da família como parte constituinte das sociedades, e,
sobretudo, livrar-se de pré-julgamentos e preconceitos em relação a uma ou
outra forma de organização familiar. A leitura e a discussão de textos ligados à
antropologia apresentam povos com organizações sociais distintas da nossa e
contribuem para que se abandonem visões etnocêntricas; a exibição de filmes
que provoquem à reflexão e remetam o aluno a situações próximas ou distantes
da sua realidade também levam o jovem a pensar, a rever e a buscar modelos
21
familiares adequados às suas necessidades; investigações na própria
comunidade também podem contribuir para o alcance dos objetivos pretendidos.
Instituição escolar
Acerca da instituição escolar, poderão ser estudadas suas origens
históricas, diferentes teorias ou olhares construídos sobre a instituição escolar,
distintos modelos escolares presentes em sociedades diversas. Também poderão
ser orientadas análises sobre a importância e o papel da escola e de seus atores
– professores, alunos, funcionários e direção – nas sociedades atuais.
Instituição religiosa
Propõe-se o estudo das origens e a importância do pensamento religioso,
das diferentes práticas religiosas, e a reflexão sobre idéias preconcebidas e
sectarismos.
3.2 CULTURA E INDÚSTRIA CULTURAL
Teoricamente, da forma como é visto na Antropologia, o conceito de
cultura se desenvolve ao configurar-se como ciência no final do século XIX. No
entanto, esse conceito já existia anteriormente, com significados distintos e, de
alguma forma, parciais.
O encontro do “velho” – Europa – com o “novo” mundo – América e África –,
a partir do início do processo de conquista e colonização, provocou um choque
devido á diversidade cultural entre os europeus e os outros povos, “diferentes e
exóticos”, e produziu ideologias que afirmavam existir uma superioridade cultural
daqueles sobre os demais, que era justificada cientificamente.
No decorrer do século XX, esse discurso reproduzido passou a ser
questionado por vertentes mais críticas das Ciências Sociais, que analisavam as
sociedades em suas especificidades e não apenas na comparação entre culturas.
Quando se busca definir o conceito de cultura, é preciso clareza de que
existem muitos, mas, comumente, incorpora-se aquele que afirma tratar-se de
“todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis e costumes
ou qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro
de uma sociedade” (apud LARAIA, 2005, p. 25).
22
Esses conhecimentos revelam que a cultura não é natural, mas, sim, um
comportamento apreendido, que difere de um grupo para outro. Assim, não
nascemos com um comportamento específico, nós o aprendemos de acordo com
o nosso processo de socialização.
A cultura se reproduz à medida que os anos se passam; no entanto, uma
de suas características é a dinamicidade, pois se transforma de modo rápido,
incorpora aspectos que vêm de fora dos grupos ou, simplesmente, modifica
aqueles que já a integram. Não podemos dizer que uma sociedade se constitua
de uma cultura única porque se compõe de vários e distintos grupos.
É importante problematizar para os alunos de Ensino Médio o conceito de
cultura e suas derivações para eles perceberem que não existem culturas
superiores ou inferiores. Mas, é preciso também reconhecer que há grupos
diferentes, cuja apropriação é distinta dos aspectos de constituição de vida como
a família, o trabalho, o lazer, a religião etc. Assim, eles poderão questionar que a
dominação cultural que algumas sociedades de modo aparentemente natural
impõem sobre outras não é apenas nessa instância, mas que parte de outro foco,
mais econômico do que cultural.
A partir dessas concepções, os conteúdos específicos relacionados à
cultura estarão todos interligados, já que quando propomos a contextualização e
a construção histórica do conceito, diretamente nos remetemos aos seguintes
conteúdos específicos:
- diversidade cultural;
- relativismo;
- etnocentrismo;
- questões de gênero, étnicas e de outras minorias.
Quando falamos que num mesmo grupo temos percepções e práticas
culturais distintas, temos os conteúdos da cultura erudita e cultura popular, que
muitas vezes são trabalhados no senso comum e que tendem a separar
distintamente os grupos pelas suas práticas, naturalizando essas diferenças.
Assim, chegamos ao conteúdo chamado indústria cultural, que também
pode ser problematizado como cultura de massa. Surgido no contexto europeu
da industrialização, tem como objetivo transformar em mercadoria consumível
igualmente a todos os grupos sociais, as diferentes manifestações culturais,
como teatros, circos, obras de arte, literatura, fotografia, cinema, entre outros,
23
deixando-os com a mesma linguagem e intensificando a passividade social. O
interesse existente é de universalizar as culturas, ou seja, vender para todas as
pessoas aquilo que foi produzido especificamente para uma determinada classe
social, retirando dela as suas especificidades.
Devemos discutir em nossas aulas, como isso se tornou possível, quer
dizer, como nos transformamos em meros consumidores de informações muitas
vezes sem nenhum questionamento? Aí entram os meios de comunicação de
massa – televisão, rádio, cinema – que também podem ser caracterizados como
produtos de mercado de uma sociedade capitalista. Eles produzem bens
simbólicos para o mercado consumidor que está cada vez mais massificado e
intensificam a produção e reprodução de conceitos para indivíduos alienados,
inertes e sem memória social. No entanto, essa temática possibilita abordagens
distintas da visão da mera reprodução cultural porque pode-se apontar outras
formas de consumo cultural que estimulam a criatividade, a crítica e a
reinvenção.
3.3 TRABALHO, PRODUÇÃO E CLASSES SOCIAIS
O trabalho é a condição de sobrevivência humana. Ao agir sobre a
natureza para suprir as condições materiais da sua existência, os homens
transformam a natureza, reproduzem a si mesmos e, ao reproduzirem a vida,
produzem riqueza.
É impossível uma pessoa retirar individualmente da natureza tudo o que
precisa para sobreviver. Para tanto, é necessário que ela troque, venda ou
compre algo que disponha por algo que não possua. Ou seja, o trabalho é uma
atividade social, pois exige mais de uma pessoa para realizar-se. De fato, além
da função de garantir a existência humana, o trabalho é sobretudo uma relação
social que pode ser organizada de variadas formas. Tanto pode ser resultado de
cooperação, como de confronto e concorrência, pela sobrevivência entre os
homens.
Na forma de organização social capitalista, a produção da vida material é
baseada na propriedade privada, no trabalho assalariado e numa determinada
divisão social do trabalho.
Na visão de Émile Durkheim, a divisão social do trabalho é uma forma de
justamente atenuar a concorrência e a competição entre os homens, pois o fato
24
de cada indivíduo depender do trabalho especializado do outro para sobreviver
acaba provocando uma maior solidariedade entre si.
Para Karl Marx, o capitalismo organiza-se da tal forma que origina duas
classes sociais: a do trabalhador ou proletário, provido apenas da sua força de
trabalho, a qual troca por um salário, e a classe do empresário ou burguês,
detentor dos meios de produção e que compra no mercado a força de trabalho do
proletário. Para Marx, as classes sociais têm origem na organização das relações
de produção, da sobrevivência e na organização da sociedade capitalista. Essas
relações entre as classes são antagônicas e desiguais e caracterizam uma luta
entre elas: o trabalhador busca uma vida melhor e o empresário busca mais
lucro, ao explorar o trabalhador.
Para Max Weber, a noção de classe está baseada em indicadores de status.
O acesso a determinados tipos de bens de consumo, aos próprios meios de
produção, aos serviços é o que identifica as diversas classes sociais. Mas uma, a
dos desprovidos de propriedade, e muitas vezes sem qualificação, é obrigada a
ter sua sobrevivência por meio do trabalho em ocupações inconstantes. As
diferenças de prestígio, de poder e de status entre os grupos que compõem a
sociedade, bem como os conflitos entre eles, são resultados da organização de
cada sistema social. Diante disso, a relação entre trabalho e a organização da
sociedade – seja em castas, estamentos ou classes sociais possibilita o reforço ou
não da especialização e, conseqüentemente, o lugar da maioria ou da minoria de
cada grupo na sociedade ou o lugar de cada indivíduo no grupo.
Por conta do avanço das tecnologias, a divisão do trabalho nas sociedades
industriais acabou por atribuir maior importância aos trabalhadores das fábricas
e aos capitalistas industriais – que vivem em áreas urbanas – do que aos
trabalhadores do campo. Para atender às demandas industriais, inclusive da
mecanização nas áreas rurais, trabalhadores do campo acabam por abandonar
suas atividades e se submetem a ser mão-de-obra nas cidades, que, por sua vez,
não lhes oferece as condições mínimas de sobrevivência. Anthony Giddens
indica, por exemplo, um encaminhamento metodológico para compreender a
dimensão dessa problemática.
Em face da estrutura e do modo de produção sociais das sociedades
capitalistas adiantadas, as tarefas da análise de classes são muito simples.
Primeiramente, a análise envolve a identificação minuciosa das classes e
subclasses que compõem essas sociedades – em outras palavras, o desenho de
25
um “mapa social” que seja mais pormenorizado e preciso possível e inclua as
numerosas complexidades que envolvem a natureza de classe.
Em segundo lugar, a análise de classes deve demonstrar as estruturas e os
mecanismos exatos de dominação e exploração nessas sociedades e as
diferentes maneiras pelas quais a mais-valia se extrai, apropria-se e se aloca.
Em terceiro lugar, e de maneira correlata, a análise de classes deve estar
preocupada com o conflito entre classes, sobretudo o capital e o Estado, de um
lado, e o trabalho, do outro, embora se deva também prestar atenção às
pressões exercidas sobre outras classes e agrupamentos, como, por exemplo, os
diferentes setores da pequena burguesia ou os movimentos sociais com suas
queixas e reivindicações específicas (GIDDENS, 1999).
Pela análise dos processos históricos e das diferentes linhas
interpretativas, torna-se igualmente importante discutir com o aluno do Ensino
Médio que a organização social não é algo dado, natural. O objetivo é que esse
aluno perceba que a exclusão e o desemprego na sociedade brasileira é
resultado de processos e determinações sociais, políticas e especialmente
econômicas e, como tal, a depender da organização das forças sociais, podem
ser revertidos.
Com o processo de globalização, foi intensificada a tendência de
acumulação de capital organizada em corporações multinacionais, cujas
atividades de busca do lucro não são contidas pelas fronteiras dos estados
nacionais; algumas, inclusive, percebem receitas monetárias que excedem a de
alguns Estados-Nação. Daí, o crescente papel das coordenações de integração
supranacionais como o Nafta, dos acordos econômicos regionais e mundiais com
poderes assimétricos (desiguais), da divisão global do trabalho, do mercado que
não é uma entidade, mas relações sociais entre pessoas, como um “universal
econômico”, de mecanismos concretos e ideológicos de desregulação comum a
todos, de tal modo que, qualquer acontecimento mesmo que geograficamente
distante, interfira nos demais.
Contudo, apesar da internacionalização do capital e da incorporação da
microeletrônica ao processo produtivo, que se expande excepcionalmente, a
produtividade não extingue as classes sociais nem suas contradições, mas
extingue postos de trabalho e aumenta o desemprego estrutural e o excedente
de trabalhadores.
Na forma de organização capitalista, na qual as relações se estabelecem a
partir da propriedade privada, trabalhador desnecessário à produção significa
26
miséria, fome, colapso social. A relação entre capital e Estado, tanto no plano
nacional como internacional, tem o mesmo objetivo: defender “interesses
nacionais”, que significam interesses da classe dominante, os quais têm cada vez
mais alcance global.
Numa perspectiva crítica, que contemple diferentes linhas interpretativas,
a análise sociológica da categoria trabalho, na contemporaneidade, deve
também problematizar o lugar da mulher, do negro, e do índio, ou seja, das
denominadas minorias. É legítimo que estes grupos busquem visibilidade social e
definição de suas identidades; contudo, é importante que o aluno do Ensino
Médio conheça as formas pelas quais essas minorias, assim como os demais
trabalhadores, vivenciam a discriminação, a exploração e a opressão em virtude
da classe social a que pertencem.
Pela apropriação e reconstrução do conhecimento sistematizado, cabe à
educação escolar garantir ao aluno a compreensão crítica das mudanças
ocorridas no processo histórico brasileiro, a partir do binômio trabalho-emprego,
problematizando que o emprego passa pela precarização – que amplia o quadro
de exclusão – e não pela estabilidade.
De uma perspectiva histórico-crítica, os conteúdos específicos que podem
ser problematizados nas aulas de Sociologia, relativamente ao conteúdo
estruturante trabalho, produção e classes sociais, são os seguintes:
- salário e lucro;
- desemprego, desemprego conjuntural e desemprego estrutural;
- subemprego e informalidade,
- terceirização,
- voluntariado e cooperativismo;
- empreendedorismo;
- agronegócio;
- empregabilidade e produtividade;
- capital humano,
- reforma trabalhista e Organização Internacional do Trabalho;
- economia solidária;
- flexibilização;
- neoliberalismo;
- reforma agrária;
27
- reforma sindical;
- toyotismo, fordismo;
- estatização e privatização;
- parcerias público-privadas;
- relações de mercado, entre muitos outros.
3.4 PODER, POLÍTICA E IDEOLOGIA
Em relação à esse conteúdo estruturante é primordial ressaltar que os
conteúdos específicos, dele derivados, discutem as relações de poder e são
permeados por ideologias. Portanto, o primeiro conceito a ser desenvolvido é o
de poder.
Ao buscar-se uma definição, tem-se que poder é uma relação assimétrica
em que uma pessoa ou um grupo consegue que outra ou outras façam aquilo
que não fariam por si próprias, mas o faz por ordem da primeira. Muitas vezes,
isso ocorre sem que haja percepção de quem obedeceu de que está cumprindo
uma ordem, ou seja, a ação acontece como cooperação. Nesse sentido, verifica-
se que o uso do poder não se faz ou não se limita ao uso da força estritamente;
ele se apresenta também pela linguagem, pelos símbolos e nas práticas,
efetivamente. Por isso, o poder também está permeado pela ideologia.
A ideologia é uma visão de mundo que se mostra verdadeira, mas nem
sempre o é, pois varia de acordo com os grupos que estão no poder, com o tipo
de sociedade e com os interesses que serão objetivados por esses. O poder e a
ideologia são exercidos sob a forma de organizações formais como o Estado, mas
estão presentes também nas diversas instituições da sociedade civil.
Quando se pensa a respeito do poder configurado pelo Estado, surgem
várias outras questões:
- Que tipos de Estado existem?
- Como delimitar as tarefas que devem ser realizadas exclusivamente pelo
Estado e as que não são de sua competência?
- Cabe ao Estado a responsabilidade sobre a educação, a saúde, a
segurança, a infra-estrutura para a produção industrial e agrícola, o
controle das atividades econômicas? Ou são questões que devem estar
nas mãos da iniciativa privada?
28
- Como separar o que é publico do que é privado?
As respectivas respostas variam conforme a organização da sociedade.
Nas sociedades socialistas, por exemplo, o Estado deve atender a todas as
necessidades da população porque a iniciativa privada não existe. Ele deve gerir
os interesses da população e atendê-la em sua totalidade. Já nas sociedades
capitalistas, o Estado age como representante do público em geral, cobra dos
cidadãos determinados valores (impostos e taxas) e, com isso, tem a obrigação
de devolver bens públicos à sociedade, como a educação, segurança e saúde,
por exemplo.
Essas ações devem ser traduzidas em práticas que poderão ser cobradas
pelos governados (os cidadãos), os quais devem participar delas politicamente,
no uso ou na cobrança quando elas não são efetivadas.
Além das funções já citadas, o Estado muitas vezes atende a determinados
interesses políticos que nem sempre são os dos seus governados. Como nação, o
Estado pode constituir relações políticas com outros Estados – ou nações – e
podem atualmente ter a sua fronteira – não geográfica, mas comercial – rompida
devido a um processo de muitos séculos anteriores, acentuado no século XX,
denominado globalização.
Diante do processo de globalização no domínio político, não estão apenas
países isolados, mas unidades chamadas de supranacionais com blocos políticos
e até militares, como coalizões de forças dominantes – Grupo dos Oito, Mercosul,
Nafta – que acabam por fazer do sistema de democracia parlamentar uma
“verdade universal”, supostamente válida para todos. Tal verdade deve ser
questionada porque em sua base está o mesmo problema do chamado novo
imperialismo do século XIX, atualmente com nova roupagem, aparentemente
mais democrática porque permite a participação de países intermediários em
termos econômicos.
As análises dessas relações mostram que, de acordo com a organização
econômica, social e política de cada momento histórico, outros grupos se
articulam para defender determinada proposta ideológica e assim configurar
nova organização para o poder estatal, como os grupos nacionalistas que
defendem a unidade étnica e cultural, a preservação de diferenças e, mais do
que isso, a aceitação dessas. No entanto, a grande discussão parte da imposição
que determinados países fazem, conforme já mencionado, sob a mesma
concepção do novo imperialismo do século XIX.
29
3.5 DIREITOS, CIDADANIA E MOVIMENTOS SOCIAIS
Na análise dos direitos, deve-se considerar se eles foram inscritos nas leis
lentamente ou se foram conquistados pela pressão dos que não tinham inclusão
civil, política, social. A cidadania é a possibilidade de sermos sujeitos atuantes,
com direitos e deveres, os quais requerem inclusão social. Entretanto, os direitos
se tornam plenos se forem exercidos no cotidiano das ações das pessoas. Direito
na lei, que não é exercido, é apenas direito formal. Por isso, nestas Diretrizes,
vincula-se esta temática aos movimentos sociais, pois sua existência está
relacionada à criação de novos direitos ou para fazer valer os que já estão
inscritos na lei.
A organização e a luta de grupos sociais estão presentes em várias
sociedades de vários tempos históricos. No entanto, os movimentos sociais,
sejam eles urbanos ou rurais, são um conceito próprio das sociedades
capitalistas. Os movimentos sociais são práticas civis de confronto que
desempenham o papel de criar novas políticas, as quais impactam o
desenvolvimento desta mesma sociedade e criam possibilidades de novos
projetos sociais. Resultado dessas práticas são os rearranjos que os detentores
de poder político e de capital têm de fazer para satisfazer as reivindicações
desses movimentos.
No cenário atual das sociedades neoliberais, diante da força do capital e da
ausência intencional do Estado na mediação de conflitos entre capital e trabalho,
faz-se necessário pensar em novas formas de organização, com maior alcance
político.
Ressalta-se o papel que as chamadas Organizações Não-Governamentais
(ONGs) têm ocupado nos espaços deixados pelos movimentos sociais de cunho
político. De fato, as ONGs mais se adaptam à sociedade capitalista do que
efetivam propostas de mudança radical. Essas organizações veiculam a ideologia
de que o Estado Nacional não tem mais sentido, pois afinal tudo está globalizado.
Portanto, contra quem os trabalhadores devem se organizar e lutar, uma vez que
o discurso é de que não existem mais classes sociais?
O estudo deste conteúdo estruturante possibilita aos alunos
compreenderem a dinâmica que os cerca como, também, a capacidade de
inserir-se e participar de movimentos já organizados ou em processo de
organização. Constantemente, a mídia traz notícias de grupos sociais que se
30
manifestam pela conquista e garantia de direitos sociais e é fundamental que os
alunos estejam aptos a fazer um leitura crítica desses fatos noticiados.
Nestas Diretrizes Curriculares, os conteúdos específicos propostos são os
seguintes:
- Movimentos Sociais Urbanos, como o estudo dos problemas decorrentes do
processo crescente de urbanização, a falta de moradia e de serviços públicos
de educação, saúde, transportes, segurança, que acabam por gerar situações
de tensão e conflitos;
- Movimentos Estudantis, como os Grêmios Estudantis, Upes, UNE e outras
formas de inserção;
- Movimentos Sociais Rurais, como o cooperativismo, as origens históricas da
estrutura agrária brasileira, as formas de distribuição da terra no Brasil, os
movimentos de luta pela terra – Ligas Camponesas, Movimento dos Sem
Terra, e
- Movimentos Sociais Conservadores, como o Golpe Militar, a TFP, a UDR.
31
4 ENCAMINHAMENTO METODOLÓGICO
Para o ensino da Sociologia no Ensino Médio, os conteúdos estruturantes e
os conteúdos específicos deles desdobrados não devem ser pensados e
trabalhados de maneira autônoma, como se bastassem por si próprios, da
mesma forma como também não exigem uma obediência seqüencial, ou seja,
apesar de estarem articulados, é possível o estudo e a apreensão pelos alunos de
cada um dos conteúdos sem a necessidade de uma “amarração” com os demais.
No ensino de Sociologia, é fundamental a adoção de múltiplos
instrumentos metodológicos, os quais devem adequar-se aos objetivos
pretendidos, seja a exposição, a leitura e esclarecimento do significado dos
conceitos e da lógica dos textos (teóricos, temáticos, literários), a análise, a
discussão, a pesquisa de campo e bibliográfica ou outros.
Assim como os conteúdos estruturantes e os conteúdos específicos deles
derivados, os encaminhamentos metodológicos e o processo de avaliação ensino-
aprendizagem também devem estar relacionados à própria construção histórica
da Sociologia crítica, caracterizada portanto por posições teóricas e práticas
favorecedoras ao desenvolvimento de um pensamento criativo e instigante.
O conhecimento sociológico deve ir além da definição, classificação,
descrição e estabelecimento de correlações dos fenômenos da realidade social. É
tarefa primordial do conhecimento sociológico explicitar e explicar problemáticas
sociais concretas e contextualizadas, de modo a desconstruir pré-noções e
preconceitos que quase sempre dificultam o desenvolvimento da autonomia
intelectual e de ações políticas direcionadas à transformação social.
O aluno do Ensino Médio deve ser considerado em sua especificidade
etária e em sua diversidade cultural; isto é, além de importantes aspectos como
a linguagem, interesses pessoais e profissionais e necessidades materiais, deve-
se ter em vista as peculiaridades da região em que a escola está inserida e a
origem social do aluno, para que os conteúdos trabalhados e a metodologia
escolhida respondam às demandas desse grupo social. Por exemplo, uma escola
situada nas proximidades de regiões de conflito agrário, não pode deixar de
incluir em seu conteúdo programático de Sociologia o estudo de movimentos
sociais do campo; assim como uma escola da região central de uma grande
cidade não pode ignorar a questão da violência urbana ou da cultura,
considerando a grande diversidade social presente nesse grupo.
32
Aprender a pensar sobre a sociedade em que vivemos e,
conseqüentemente, a agir nas diversas instâncias sociais, implica antes de tudo
uma atitude ativa e participativa.
O ensino da Sociologia pressupõe metodologias que coloquem o aluno
como sujeito de seu aprendizado, não importa que o encaminhamento seja a
leitura, o debate, a pesquisa de campo ou a análise de filmes, mas importa que o
aluno esteja constantemente provocado a relacionar a teoria com o vivido, a
rever conhecimentos e a reconstruir coletivamente novos saberes.
Reflexões e pesquisas a respeito do ensino da sociologia são ainda iniciais
devido, sobretudo, à excessiva tradição bacharelesca da disciplina e conseqüente
desvalorização da área de ensino em muitas universidades. Por efeito, o que se
vê nas escolas é o “transplante” direto de práticas acadêmicas para as salas de
aula de Ensino Médio, o que acarreta grande distanciamento entre as
necessidades do aluno e o desejo dos professores que acabam por frustrarem-se
mutuamente.
Considera-se pertinente abrir um grande parênteses com a intenção de
facilitar a análise de algumas práticas pedagógicas presentes no ensino de
Sociologia, as quais, se não forem trabalhadas com método, em nada
contribuirão para a construção do pensamento científico. Entre outros, dois
encaminhamentos metodológicos são próprios do ensino da Sociologia:
- pesquisa de campo e
- recursos audiovisuais, especialmente vídeos e filmes.
Pesquisa de campo
A pesquisa de campo deve ser iniciada a partir da discussão com o grupo
de alunos para a definição do tema a ser pesquisado e do enfoque ou recorte a
ser privilegiado. Em seguida, deverá ser elaborado um pré-projeto de pesquisa a
partir de referências bibliográficas, da confecção de um roteiro de observação
e/ou de entrevistas, ida a campo para levantamento dos dados, organização dos
dados coletados, confecção de tabelas ou gráficos e, se necessário, a respectiva
interpretação e, finalmente, a análise e a articulação com a teoria.
Recursos audiovisuais
33
Um filme deve ser entendido também como texto. Como tal, deve ser
passível de leitura pelo aluno, pois o cinema e a TV são dotados de linguagem
próprias e compreendê-los não significa apenas apreciar imagens e sons. É
preciso que o professor proponha uma interpretação analítica, contextual.
Portanto, alguns passos devem ser seguidos pelo professor:
- a escolha do filme não deve estar relacionada somente ao conteúdo, mas
também à faixa etária e o repertório cultural dos alunos;
- a observação da ficha técnica do filme deve estar incluída na atividade;
- a elaboração de um roteiro que contemple aspectos fundamentais para o
conteúdo em estudo facilitará a compreensão do trabalho;
- a exibição do filme é essencial neste encaminhamento metodológico;
- a discussão das temáticas contempladas deve estar articulada à teoria
sociológica;
- a sistematização por meio da produção de um texto ou de outro meio de
expressão – visual, musical, literário – compõe a atividade.
A fim de subsidiar teoricamente a ação docente, as escolas públicas do
Paraná contam com um acervo bibliográfico formado pela Biblioteca do Professor,
pela Biblioteca do Ensino Médio e pela Biblioteca de Temas Paranaenses. Nelas,
há interessantes fontes de pesquisa para o professor, seja para seu próprio
estudo e constante aperfeiçoamento, seja como material para dar suporte ao
trabalho com os alunos. Destaca-se que textos literários contextualizados e
articulados com o conhecimento sociológico enriquecerão ainda mais as
discussões da disciplina.
Ressalta-se, ainda, que o Livro Didático Público de Sociologia é importante
porque dá suporte teórico e metodológico às aulas dessa disciplina e constitui,
portanto, um ponto de partida para professores e alunos. Assim como qualquer
material pedagógico, o Livro Didático Público não esgota ou supre todas as
necessidades do ensino de Sociologia. No entanto, foi elaborado por professores
da rede pública e é um material aberto a críticas e contribuições de todos que
assumem a tarefa de fazer da Sociologia uma área de estudo imprescindível e,
ao mesmo tempo, acessível à população que dela mais necessita.
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5 AVALIAÇÃO
A avaliação é parte do processo pedagógico e, por isso, deve tanto
acompanhar a aprendizagem dos alunos quanto nortear o trabalho do professor.
No ensino da Sociologia a avaliação deve perpassar todas as atividades
relacionadas à disciplina e ser pensada e elaborada de forma transparente e
coletiva, ou seja, seus critérios devem ser conhecidos, debatidos e
acompanhados por todos os envolvidos no processo pedagógico.
Como critérios básicos de avaliação em sociologia considera-se:
a apreensão de alguns conceitos básicos da ciência, articulados com a
prática social;
a capacidade de argumentação fundamentada teoricamente;
a clareza e a coerência na exposição das idéias sociológicas, no texto oral
ou escrito; e
a mudança na forma de olhar e compreender os problemas sociais.
Algumas ações, como a iniciativa e a autonomia para tomar atitudes
diferenciadas e criativas, com o objetivo reverter práticas de acomodação e sair
do senso comum, indicam aos professores o alcance e a importância de seu
trabalho no cotidiano de seus alunos.
As formas e instrumentos de avaliação em Sociologia, portanto,
acompanham as próprias práticas de ensino e de aprendizagem da disciplina.
Podem ser registros de reflexões críticas em debates, que acompanham os textos
ou filmes; participação nas pesquisas de campo; produção de textos que
demonstrem capacidade de articulação entre teoria e prática. Enfim, várias
podem ser as formas, desde que se tenha como perspectiva ao selecioná-las, a
clareza dos objetivos que se pretende atingir, no sentido da apreensão,
compreensão e reflexão dos conteúdos pelo aluno.
Por fim, entende-se que não só o aluno, mas também professores e a
instituição escolar devem constantemente se auto-avaliarem em suas dimensões
práticas e discursivas e principalmente em seus princípios políticos com a
qualidade e a democracia.
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