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Exposição Bíblica de Colossenses Russel Shedd Vida Nova APRESENTAÇÃO "Afirmamos e cantamos as nossas crenças, sim; mais importante ainda, porém, é vivê-las. Sendo Jesus Cristo o Senhor do universo, todos os aspectos de nossas vidas ficam sob o senhorio dele. Todas as nossas atividades cotidianas, até mesmo os nossos atos mais comuns, tais como o comer e o beber, devem manifestar seu senhorio. Será que Jesus é o Senhor dos seus estudos? E ele o guia da sua vida cultural? Dos seus compromissos sociais? Sem dúvida, o chamado mundo ocidental evidencia ainda em sua vida institucional e social as marcas da sua herança cristã. Poderíamos mencionar a influência de pessoas e comunidades cristãs que, pela submissão ao senhorio de Cristo na vida acadêmica, social e política, transformaram as coisas de tal forma que hoje temos o que chamamos de mundo ocidental. Devemos admitir, porém, que há um processo de deterioração dessa herança cristã, que tem feito com que o mundo ocidental se afaste cada vez mais da influência cristã. Chegamos ao ponto em que manifestar o senhorio de Cristo em nossas vidas, pela maneira como nos comportamos em nosso dia-a-dia com referência ao trabalho, ao dinheiro ou ao nosso relacionamento social, é ir contra a correnteza. É exatamente neste ponto que precisamos do discernimento baseado numa teologia bíblica, para distinguirmos o decadente e o meramente acidental do sadio e cristão, em todas as áreas da vida." * Dentre os livros do Novo Testamento, talvez seja Colossenses o que mais pode nos ajudar neste sentido. E aqui o Dr. Shedd nos apresenta uma exposição completa, dando todo o destaque aos aspectos desse andar no Senhor e de como viver, neste fim de século, sob a direção daquele que é o Senhor do universo. O presente trabalho foi uma decorrência natural dos preparativos que o Dr. Shedd fez para a apresentação de suas palestras no "Congresso Geração 79 " , incumbido que fora de fazer uma exposição bíblica de toda a carta aos Colossenses. Visando ajudar os participantes desse Congresso e ainda possibilitar que a mensagem de "Geração 79 " atinja todo o público evangélico brasileiro, surgiu a idéia de publicar este livro. O Dr. Shedd é bacharel em Teologia pelo Faith Seminary de Philadelphia, nos Estados Unidos. Tem o mestrado pelo Wheaton College Graduate School e o doutorado pelo New College de 1

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Exposição Bíblica de ColossensesRussel Shedd

Vida Nova

APRESENTAÇÃO

"Afirmamos e cantamos as nossas crenças, sim; mais importante ainda, porém, é vivê-las. Sendo Jesus Cristo o Senhor do universo, todos os aspectos de nossas vidas ficam sob o senhorio dele. Todas as nossas atividades cotidianas, até mesmo os nossos atos mais comuns, tais como o comer e o beber, devem manifestar seu senhorio. Será que Jesus é o Senhor dos seus estudos? E ele o guia da sua vida cultural? Dos seus compromissos sociais?

Sem dúvida, o chamado mundo ocidental evidencia ainda em sua vida institucional e social as marcas da sua herança cristã. Poderíamos mencionar a influência de pessoas e comunidades cristãs que, pela submissão ao senhorio de Cristo na vida acadêmica, social e política, transformaram as coisas de tal forma que hoje temos o que chamamos de mundo ocidental. Devemos admitir, porém, que há um processo de deterioração dessa herança cristã, que tem feito com que o mundo ocidental se afaste cada vez mais da influência cristã. Chegamos ao ponto em que manifestar o senhorio de Cristo em nossas vidas, pela maneira como nos comportamos em nosso dia-a-dia com referência ao trabalho, ao dinheiro ou ao nosso relacionamento social, é ir contra a correnteza.

É exatamente neste ponto que precisamos do discernimento baseado numa teologia bíblica, para distinguirmos o decadente e o meramente acidental do sadio e cristão, em todas as áreas da vida." *

Dentre os livros do Novo Testamento, talvez seja Colossenses o que mais pode nos ajudar neste sentido. E aqui o Dr. Shedd nos apresenta uma exposição completa, dando todo o destaque aos aspectos desse andar no Senhor e de como viver, neste fim de século, sob a direção daquele que é o Senhor do universo.

O presente trabalho foi uma decorrência natural dos preparativos que o Dr. Shedd fez para a apresentação de suas palestras no "Congresso Geração 79 ", incumbido que fora de fazer uma exposição bíblica de toda a carta aos Colossenses. Visando ajudar os participantes desse Congresso e ainda pos -sibilitar que a mensagem de "Geração 79" atinja todo o público evangélico brasileiro, surgiu a idéia de publicar este livro.

O Dr. Shedd é bacharel em Teologia pelo Faith Seminary de Philadelphia, nos Estados Unidos. Tem o mestrado pelo Wheaton College Graduate School e o doutorado pelo New College de Edimburgo, Escócia. É o diretor das "Edições Vida Nova", tendo editado em português o "Novo Comentário da Bíblia" e a "Bíblia Vida Nova". Além de pastor de uma igreja, o Dr. Shedd é professor de Novo Testamento na Faculdade de Teologia Batista de São Paulo. Tem cooperado com a Aliança Bíblica Universitária em muitas ocasiões, dando ex-posições bíblicas em acampamentos, cursos de férias e conferências.

Que o Senhor venha a utilizar este livro na vida de muitas pessoas, levando-as não somente a aceitarem a Cristo como Senhor, mas também a cumprirem nas suas vidas a exortação do apóstolo Paulo: ANDAI NELE!

Os Editores

*Samuel Escobar, em "Jesus Cristo, Senhor do Universo, Esperança do Mundo" (Jesus Christ, Lord of The Universe, Hope of The World — Inter-Varsity Press, USA)

INTRODUÇÃO

Era por volta do ano 60 A. D. Em Roma, numa casa alugada, encontrava-se aquele que talvez tenha sido o preso mais famoso de toda a História: Paulo, da cidade de Tarso. Com ele achava-se alguém que saboreava as palavras do após-tolo com evidente satisfação, arriscando-se, de quando em quando, a alguns palpites: Timóteo. Fora seu companheiro de longas e cansativas viagens e de ardentes

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perseguições. Ali estava, também preso, o companheiro Aristarco, além do evangelista Marcos e de Onésimo, o escravo foragido da casa de Filemom, de Colossos. Em Roma, nesta ocasião, encontrava-se também Lucas, o médico amigo e companheiro de Paulo, autor do terceiro evangelho.

Paulo recebera, há pouco, a visita de Epafras, o evangelista que havia fundado três igrejas no Vale do Lico, no interior da província romana chamada Ásia: Colossos, Laodicéia e Hierápolis. Epafras expusera a Paulo à situação decorrente do surgimento de certas correntes teológicas que ameaçavam a saúde espiritual desse novo centro de divulgação do Cristianismo.

Com Paulo achava-se ainda Tíquico, que fazia as funções de "secretário", escrevendo o que o apóstolo dizia. E o que foi escrito é justamente o que mais tarde veio a ser conhecido como a Epístola aos Colossenses, inspirado livro que integrou o cânon do Novo Testamento!

Antecedentes

Uma curiosidade é que Paulo, mesmo estando sempre a orar pelos colossenses, nunca chegara a visitar essa igreja, até então. Assim, não nos é difícil imaginar o cuidado com que ele ouviu o relato de Epafras, procurando informar-se de todas aquelas idéias que os mestres heterodoxos estavam di-vulgando naquela pequena cidade. Para nós, hoje, não é tão fácil entender o que realmente perturbava a fé cristã daqueles que se tinham convertido durante o ministério de Paulo em Éfeso, na sua terceira viagem missionária (A.D. 52-55), quando "todos os que moravam na Ásia ouviram a palavra do Senhor, tanto judeus como gregos". O Instituto Bíblico de Éfeso, fundado e dirigido por Paulo nas dependências da escola de Tirano (At 19: 9), desempenhou um importante papel na preparação de obreiros, tais como Epafras e Arquipo. Estes, evidentemente, eram os líderes da igreja de Colossos (Cl 4: 17) na ocasião em que Paulo escreveu esta carta. Mas eles não se sentiam capazes de vencer de uma vez, naquele confronto com as novas correntes teológicas, que traziam uma heresia sincretística. Meu amigo e antigo professor, James Stewart, da cidade de Edimburgo, certa vez observou que toda a controvérsia do Novo Testamento pode ser reduzida à batalha da liberdade evangélica contra o legalismo dos judaizantes, de um lado; e, do outro, à luta da verdade salvadora contra o gnosticismo. Paulo entendeu plenamente a deficiência doutrinária dos gnósticos que menosprezavam a Cristo mas supervalorizavam os anjos; que davam pouca atenção à moralidade e à ética, porém muita à especulação teosófica; que diminuíram o papel da história mas exaltavam o misticismo.

No combate levantado na Epístola aos Colossenses, percebemos que a heresia era uma mistura ou apanhado de elementos judaicos e gnósticos. "Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, ou dia de festa, ou lua nova, ou sábado, porque tudo isso tem sido sombra das cousas que haviam de vir" (Cl 2: 16,17). Esta frase faz-nos lembrar do judaísmo. "Culto aos anjos ", "visões", "rudimentos do mundo" e proibições de tocar, manusear e provar (Cl 2:18-21) indicam uma forte inclinação para o gnosticismo.

Logo após a invasão da cultura grega no Médio Oriente, em conseqüência da vitória de Alexandre sobre os Persas, no quarto século antes de Cristo, a filosofia grega fez-se sentir tal como a cultura ocidental permeia o mundo de nossos dias. O primeiro século caraterizou-se por um profundo anseio pela salvação. Onde encontraria o homem aquela segurança religiosa em face dos poderes destrutivos que incessantemente ameaçavam a sua vida? Era uma época de experiência e fomentação de movimentos antagônicos. Promessas cativantes emanavam das religiões orientais, cheias de mistérios, fundadas num certo tipo de magia que induzia uma profunda experiência religiosa, descrita como "união com o deus" da religião, fosse Ísis ou Cibele, Osiris ou Dionísio. Assim, uma religião se confundia com outra. A busca de uma segurança, pretendida através da aceitação de várias formas de adoração, convidava os pensadores a sugerir um Pan-Theos, um deus que incluiria todo e qualquer deus, uma idéia não muito distante dos filósofos religiosos estóicos. Na iniciação de Lúcio no mistério de Ísis, vê-se que Diana, Vênus, Astarte e Minerva eram todos nomes distintos de uma única deusa. O estoicismo queria aliar a filosofia do ocidente à religião do oriente, como o espiritismo e o catolicismo se unem na fé popular brasileira. Possidônio nos fornece um exemplo interessante: era cientista, importante platonista, mas também um místico e astrólogo e acreditava firmemente na união com um deus.

O Problema Fundamental

Depois de terem ouvido e crido no evangelho salvador, como foi que os colossenses se sentiram atraídos por conceitos tão inferiores? Convém observar que o desafio surgiu da luta humana contra o

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poder do mal e do azar. Como se pode-ria admitir a realidade de um Deus Criador, todo-poderoso, onisciente e bom, que permitisse o sofrimento no seu universo? Os gnósticos propuseram a solução da separação, quase infinita em distância, do Deus bom, de um lado; e do mundo material, de outro. O homem, pelo conhecimento (gnosis, isto é, conhecimento esotérico) e acertada adoração, poderia influenciar os poderes angelicais e demoníacos que dominavam o espaço entre Deus e o mundo. Com muito sacrifício se propunha uma caminhada intelectual especulativa do nível material para o espiritual.

Os gnósticos não achavam necessário negar o poder de Cristo para salvar os homens do pecado, mas criam que o sofrimento e a morte de Jesus mostravam inconfundivelmente que ele mesmo fora vítima do azar, condenado a sofrer um caprichoso fatalismo do mundo material. Assim vieram apoiar uma teologia que, por um lado, era ascética, de privação do material para se elevar e escapar; e que, de outro, defendia a posição antinomianista, que consistia em comer, beber e esquecer-se nas orgias sexuais, já que o ser humano estaria desesperadamente envolvido no mundo material (veja Ap 2: 14 e a doutrina de Balaão).

A Reação de Paulo

Diante deste quadro, que lhe fora pintado por Epafras, Paulo não fica inerte. O apóstolo desembainha a sua espada contra toda essa sutileza filosófica e escreve a carta aos Colossenses. Como veremos, ele emprega quatro métodos em sua luta:

(1) Advertência: "Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas..." (2: 8). Não pode haver um casamento entre a verdade evangélica e as mentiras inventadas por mentes não iluminadas pelo Espírito de Deus.

(2) Usa os termos chaves dos hereges contra as suas próprias doutrinas. Exemplos temos em palavras tais como, "plenitude" (do grego: plerõma, que aparece dez vezes em Colossenses), "conhecimento pleno" (grego:Epignõsis) e mistério (grego: mystérion).

(3) Dá à história o seu devido lugar, como percebemos nos pretéritos repetidos, ao destacar o que realmente aconteceu nos eventos da morte, ressurreição e entronização de Jesus Cristo.

Exalta a Cristo, o Filho de Deus, que se tornou carne por nós, homens. Afirma que ele agora preenche muito mais do que os gnósticos esperavam dos poderes angelicais; e enfatiza que Cristo, o Senhor, está sobre todos esses poderes. Assim Jesus Cristo, o verdadeiro mediador, dá acesso ao Deus único. Enquanto o gnosticismo colocou a matéria em oposição a Deus, a encarnação traz o Deus transcendente para dentro da nossa humanidade. Não é a matéria, em oposição a Deus, o antagonismo fundamental; mas ela é o meio pelo qual Deus se revela no Corpo de Cristo. Não é a matéria o obstáculo ao progresso, mas o veículo pelo qual Deus nos salva por meio da cruz e do túmulo vazio.

Em síntese, Paulo nos mostra, em Colossenses, que é no senhorio de Jesus Cristo que jaz toda a esperança da humanidade.

O primeiro credo da Igreja, Cristo é o Senhor, é o tema desta carta aos Colossenses. Paulo destaca o fato de que o cristão não somente aceitou a Cristo como Senhor, num momento de sua vida, mas deve viver sua vida nesta mesma condição, ou seja, sob o senhorio de Cristo.

"Ora, como recebestes a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele. . . " (2: 6).

Vejamos a seguir como este tema é desenvolvido nesta belíssima obra de arte, escrita há quase dois milênios, mas ainda atualíssima na sua abordagem da verdade libertadora do Evangelho.

1- O ESCRITOR, OS DESTINATÁRIOS E A SAUDAÇÃO INICIAL

Texto : Colossenses 1:1, 2

"Paulo, apóstolo de Cristo Jesus, por vontade de Deus, e o irmão Timóteo: 2 Aos santos e fiéis irmãos em Cristo que se encontram em Colossos: Graça e paz a vós outros da parte de Deus nosso Pai. "

O Escritor

O escritor se apresenta como apóstolo: no sentido técnico da palavra, um mensageiro, um agente autorizado, com os direitos de um procurador. Ele é, pois, um mensageiro de Jesus Cristo, pela vontade de Deus. Falsos apóstolos, condenados por Paulo em II Coríntios 11: 3 e por Cristo em Apocalipse 2: 2, são homens que agem por conta própria, sem essa autorização plena que recebe no apostolado uma testemu-nha da ressurreição, especificamente comissionada por Cristo (cf. I Co 9: 1; 15: 8ss). Pelo que se deduz de Efésios 2: 20, Paulo parece endossar a afirmação do Talmude judaico: "Um homem enviado é equivalente

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àquele que o enviou" (Beracote 5: 5). A Igreja foi fundada sobre os apóstolos e os profetas, já que são eles que garantem os fatos históricos sobre os quais está alicerçada a nossa fé.

Disso decorrem três pontos muito significativos:

Primeiro: Que a Igreja só é Igreja de Cristo enquanto for apostólica, isto é, enquanto seguir as normas doutrinárias e as práticas que lhe legaram os apóstolos.

Segundo: Que a inspiração do Novo Testamento é igualmente apostólica. Cremos em Cristo assim como ele foi crido e interpretado pelos apóstolos e profetas. Nada pode exigir tão fortemente de nós o cumprimento da vontade de Cristo quanto a nossa obrigação de cumprir os ensinamentos dos escritores do Novo Testamento.

Terceiro: Que a comissão apostólica não pode ser transmitida a outrem. Não há, portanto, base alguma para a crença católico-romana de que há uma sucessão de homens que podem exercer a autoridade infalível dos primeiros apóstolos.

Os Destinatários

Os destinatários são descritos como santos e fiéis, designação característica do Novo Testamento.

O termo santo tem profundas raízes no mundo hebreu do Antigo Testamento. Literalmente, refere-se a algo ou alguém diferente. Da raiz, que quer dizer saudável, passou a significar separado, para indicar possessão e uso exclusivos de Deus. Os santos recebem essa qualificação pelo preço da redenção, que os comprou (I Co 6: 20), e pela presença do Espírito Santo, que os santifica.

A palavra fiéis refere-se aos que crêem; não há, no grego, qualquer distinção entre quem crê e quem é fiel. A ênfase diz respeito à entrega confiante a Cristo, que passa, então, a controlar todos os aspectos dessa vida que descansa nele. A fidelidade evidencia uma fé realmente salvadora (Cl 1: 23; Hb 3: 14).

Irmãos são os membros da mesma família, da qual Deus é o Pai. No judaísmo, podia-se chamar de irmão tanto a um compatriota quanto a alguém que tivesse aderido à religião judaica. Não esqueçamos que, como filhos adotivos de Deus, tornamo-nos igualmente irmãos de Jesus Cristo e cada cristão, um do outro. Mas nem sempre temos dado o justo valor aos nossos irmãos de outras raças ou denominações; não temos reconhecido devidamente que pertencemos a uma mesma família. Paulo diz que os irmãos estão em Cristo ; ou, em outras palavras: só numa relação vital com Cristo é que existe qualquer veracidade no privilégio de ser santo ou um fiel membro da família de Deus.

A Saudação

Paulo saúda os irmãos com os termos graça e paz. O primeiro lembra a saudação comum no grego, que traduzimos como "Ave!". Graça é todo favor que Deus nos concede incessantemente. Paz traduz uma palavra grega que reflete o conceito hebraico de "shalom", indicador de prosperidade e bem-estar outorgados por Deus apenas àqueles que o amam.

2- A FÉ, O AMOR E O EVANGELHO

Texto: Colossenses 1: 3 a 8

3 "Damos sempre graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, quando oramos por vós, 4 desde que ouvimos da vossa fé em Cristo Jesus, e do amor que tendes para com todos os santos; 5 por causa da esperança que vos está preservada nos céus, da qual antes ouvistes pela palavra da verdade do evangelho, 6 que chegou até vós; como também em todo o mundo está produzindo fruto e crescendo, tal acontece entre vós, desde o dia em que ouvistes e entendestes a graça de Deus na verdade; 7 segundo fostes instruídos por Epafras, nosso amado conservo, e, quanto a vós outros, fiel ministro de Cristo,8 o qual também nos relatou do vosso amor no Espírito."

Fé e Amor

Apesar de nunca ter tido o privilégio de conhecê-los pessoalmente, Paulo amava os novos convertidos que compunham a pequena comunidade cristã de Colossos. Esse amor, ele o expressava dando constantemente graças por eles ao Pai de Jesus Cristo, e fazendo petições em favor daqueles que criam no Senhor (Cf. 1:12; 2: 6; 3:15, 17).

O que motivou o apóstolo à oração foi a notícia da fé em Cristo, sinal do poder que operava nos

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colossenses a convicção da verdade do evangelho, levando-os a se compro-meterem inteiramente com o senhorio de Cristo. Uma fé que se restringe a apenas crença ou assentimento não pode reivindicar o direito de ser chamada "fé", no sentido bíblico. A fé sem compromisso ou obediência não passa de uma ilusão.

A conseqüência inevitável de uma fé comprometida é o florescimento do amor fraternal para com todos os santos (v. 4; veja também I Pe 1: 22). Dentro do único corpo de Cristo é impossível não haver auxílio mútuo, mesmo quando os irmãos estão geograficamente separados (como era o caso de Paulo, distante dos colossenses a mais de 1. 500 quilômetros). A única explicação para esse amor é a operação do Espírito Santo, como o evidencia a frase "amor no Espírito" (v. 8).

A fé e o amor dos colossenses fundamentavam-se na esperança (v. 5) despertada nos corações daqueles que eventualmente viriam a crer em Cristo. Essa esperança os fez voltarem os olhos dos seus corações para o céu, onde estava o Senhor ressurreto, bem como para a herança de vida que abrangeria todos os benefícios e alegrias incontaminados do Paraíso. Convém atentarmos para o fato de que a esperança precede a fé e esta, o amor. Não nos devemos basear nisto para evangelizarmos os não-cristãos desiludindo-os em relação a este mundo e incentivando-os a almejarem um mundo perfeito "onde habita justiça"? (Cf. Rm 8: 24).

Esse trio de virtudes - fé, amor e esperança - que os colossenses compartilhavam, confirmou, para Paulo, a operada graça do Espírito Santo nas suas vidas. Mas se indagássemos sobre a dinâmica dessa intervenção de Deus, que trans-forma pecadores em santos, o apóstolo apontaria para o evangelho. A boa nova refere-se àquilo que Deus fez historicamente em Cristo; o evangelho, de igual forma, pode ser deno-minado "palavra da verdade". Essa mensagem original, anteriormente ouvida pelos colossenses por intermédio de Epafras, tinha que ser contrastada com uma nova versão de "boas novas", distorcida por astutas especulações humanas. Por isso Paulo os faz lembrar que a mensagem pura eles a ouviram antes (2: 6; note a palavra "recebestes", no passado).

O Evangelho

Consideremos como o evangelho é descrito aqui:

Em primeiro lugar, é uma mensagem que consiste verdade. Logos, o termo escolhido por Paulo, e que em português se traduz por palavra, diz respeito à lógica, razão e mensagem persuasiva por não ser contraditória. É também o título atribuído por João a Jesus no seu evangelho (Jo 1: 1,14). Assim, o evangelho resume-se essencialmente na verdade que nos revela quem é Jesus Cristo e o que ele fez por nós em sua vida, morte, ressurreição e exaltação.

Segundo, percebe-se que esta mensagem de Deus universal em seu escopo: ". . . chegou até vós, como também em todo o mundo está . . . " (v. 6). Tanto o gnosticismo como o judaísmo se restringiram, necessariamente, a uns poucos indivíduos que estavam em condições de se encaixar no sistema. O evangelho, por sua vez, oferece a todos, indistintamente, a sua maravilhosa salvação.

Terceiro, o evangelho tem a qualidade fundamental de vida. Por isso ele frutifica - e esta palavra frisa o seu poder penetrante (Hb 4: 12) e transformador. O texto ainda adiciona que esse evangelho está crescendo, tanto entre os colossenses como em toda e qualquer parte do mundo. A ênfase é dada à dinâmica extensiva do evangelho, estendendo-se em direção a todos, sem acepção de raça, língua, cultura ou geografia. Como disse Crisóstomo: "O crescimento externo acompanha os passos da sua energia interna." Essa energia espiritual existe em virtude do senhorio de Cristo, ativo em sua Igreja onde quer que esta se encontre, na Ásia de então ou no Brasil de hoje.

Quarto, Paulo dá-nos a conhecer que o evangelho é nada menos que a graça de Deus em verdade (v. 6b). Evidentemente, a graça se coloca em oposição às obras ou ordenanças (2: 14) promulgadas pelos falsos mestres. Estes exigiam do homem mérito suficiente para obrigar Deus a salvá-los Mas a graça declara justo o pecador, mesmo sem mérito algum, através da expiação dos seus pecados pelo sangue remidor de Cristo (v. 14).

Quinto, notamos que o evangelho não funciona afastado do coração humano. Paulo emprega três termos para mostrar a absoluta necessidade de que a mensagem penetre os ouvidos. (ouvistes, v. 6b) e o entendimento (conhecestes, de "epignote", que fala de um conhecimento com convicção), vindo então o discipulado (aprendestes, verbo cuja raiz é a mesma que a de ser discipulado). Sem o envolvimento da mente e da vontade do homem, o evangelho não tem condições de crescer e frutificar. A comunicação de tão valiosa mensagem, portanto, deve ser dada muita atenção.

Finalmente, o evangelho precisa de um portador, alguém que o comunique. Entre os colossenses,

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era Epafras, "um dos vossos" (4: 12), quem exercia esse dom de evangelista (Ef 4: 11). As qualidades deste obreiro, semeador do evangelho, não devem passar despercebidas: sendo um "escravo junto com Paulo" (do grego sundoulos), entende-se que a sua motivação e energias foram colocadas A. plena dis-posição do seu Senhor Jesus Cristo. Também é referido como amado, o que indica a amizade que o unia a Paulo e seus companheiros. Epafras, diz Colossenses 4: 12, era um servo fiel (diakonos); isto destaca a lealdade e fidelidade com que prestava a sua "diaconia" ou serviço, representando a igreja de Colossos junto a Paulo, "esforçando-se sobremaneira,continuamente, por vós nas orações" (4: 12). A frase "fostes instruídos" (1: 7) revela a qualidade de pastor-mestre que discipulou os cristãos, conforme o sugere o original dessa expressão. Epafras também compartilhava a prisão com Paulo, segundo entendemos a partir de Filemom 23.

O quadro inteiro nos dá a impressão de um jovem pastor, cheio de amor por Deus, por seus irmãos e pelos perdidos do Vale do Lico, já que foi ele, provavelmente, quem fundou não só a igreja de Colossos como também as de Laodicéia e Hierápolis (cidades localizadas no Vale e bem próximas umas das outras). Oxalá fôssemos insistentes diante de Deus, pedindo-lhe levantar, nas igrejas brasileiras, muitos servos como Epafras!

Em resumo, Paulo agradece incessantemente pelos irmãos colossenses, pela manifestação da fé, amor e esperança que os caracterizavam. O evangelho é o meio usado por Deus para produzir o fruto, que se expandia e tinha sucesso em todo lugar. Mas Deus não dispensa homens como Epafras, plenamente dispostos a pregar, discipular e até mesmo sofrer por amor a Cristo.

3- INTERCESSÃO EM ESTILO APOSTÓLICO

Texto: Colossenses 1: 9 a 12

9 "Por esta razão, também nós, desde o dia em que o ouvi-mos, não cessamos de orar por vós, e de pedir que transbordeis de pleno conhecimento da sua vontade, em toda a sabedoria e entendimento espiritual; 10 a fim de viverdes de modo digno do Senhor, para o seu inteiro agrado, frutificando em toda boa obra, e crescendo no pleno conhecimento de Deus; 11 sendo fortalecidos com todo o poder, segundo a força da sua glória, em toda a perseverança e longanimidade; com alegria, 12 dando graças ao Pai que vos fez idôneos à parte que vos cabe da herança dos santos na luz. "

Pleno Conhecimento da Vontade de Deus

Com a chegada de Epafras e o relatório que este lhe apresentou, Paulo foi levado a orar nos termos aqui descritos. Assim, a oração cresce num solo de gratidão ("Por esta razão...") e traça o desenvolvimento que se deve esperar na vida cristã, começando na infância espiritual e indo até a plena maturidade em Cristo.

Ao analisarmos o pedido de Paulo, assim expresso: "... que transbordeis de pleno conhecimento da vontade de Deus" (v. 9), concluímos que esta é a necessidade básica para todo crescimento espiritual. Sem conhecer a vontade de Deus para nós (estando ela revelada na sua Palavra), como poderemos atingir a "sabedoria e entendimento espiritual" que nos possibilitarão viver de maneira digna do nosso Senhor?

O termo transbordeis traduz a mesma palavra no pretérito (aoristo) que aparece no presente em Efésios 5:18. Quando todo o espaço das nossas mentes for preenchido até transbordar com o conhecimento da vontade do Senhor, já não teremos muito interesse em satisfazer egoisticamente a nossa própria vontade. A voz passiva, no original, indica que não é outro senão o Espírito de Deus que grava a lei de Deus no coração do crente, conforme prometido séculos antes em Ezequiel 11:19, 20 e 36:25-27. Tudo parte deste princípio, dando Deus aos seus filhos uma gloriosa apreciação da sua vontade divina, bem como a motivação para fazê-la. É bem mais do que um farisaísmo árido, que procura cumprir legalisticamente as ordens de Deus. Não! Não! Seria uma reação da pessoa inteira (vontade, ambição e intelecto) diante de Deus, que se revelou em Cristo encamado, vivendo este em plena submissão ao Pai.

Sabedoria e Entendimento (v. 9)

Os termos sabedoria e entendimento espiritual indicam as qualificações da vontade de Deus, ou os critérios pelos quais distinguimos essa vontade das atraentes e convincentes "vontades" contrárias àquilo que Deus quer.

Sabedoria fala de revelação divina, ao contrário de soluções intelectuais e humanas. Na literatura sapiencial (Provérbios, Jó, Eclesiastes) refere-se ao relacionamento humano e 6 responsabilidade.

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Entendimento espiritual (isto é, concedida pelo Espírito) diz-nos da aplicação pormenorizada da revelação que Deus nos deu na sua Palavra e na vida de Cristo (I Co 1: 30). Convém lembrar a importância que tem, para o cristão verdadeiro, o possuir a mente de Cristo (Fp 2:5ss).

As Conseqüências de se Conhecer A Vontade de Deus

O propósito de que o cristão transborde (v. 10) de pleno conhecimento da vontade de Deus é que ele ande de maneira digna do Senhor. Modo digno traduz uma palavra relacionada com a balança. Imaginemos as atitudes, palavras e ações de Deus colocadas num dos pratos de uma balança e as nossas empilhadas no outro prato. Se a nossa vida, como cristãos, deixar de corresponder A. vida do Senhor, estaremos andando indignamente. Vemos aí a importância de que a nossa intercessão mútua focalize a necessidade de, sob a ação do Espírito Santo, transbordarmos do conhecimento da vontade de Deus.

Daí, o apóstolo aponta cinco conseqüências de uma conduta cristã digna do Senhor:

1) Agradando a Deus. Deve ficar bem claro para o cristão que "viver para o seu inteiro agrado" é, em síntese, o único propósito para o qual vivemos. Tornou-se bastante conhecida a primeira pergunta do Catecismo de Westminster: "Qual é a razão principal pela qual o homem existe?" Resposta: "Para glorificar a Deus e deleitar-se nele para sempre".

2) Frutificando em toda boa obra é a segunda conseqüência. Não se trata de ação ou obra alguma que o homem possa efetuar para conseguir mérito aos olhos de Deus, mas, sim, atos tão cheios de amor que quem os observa não pode explicá-los sem recorrer à operação de Deus na vida do cristão. Por isso Jesus recomendou que fizéssemos boas obras que redundassem em glória para Deus por parte dos homens (Mt 5:16).

3) Crescendo no pleno conhecimento de Deus: isto só ocorre quando o cristão vive santa e piamente pelo poder de Deus. No v. 9, Paulo recomenda aos seus leitores que transbordem do pleno conhecimento da vontade divina. E, logo a seguir, notamos que aproximar-se de Deus de forma mais íntima e pessoal produz o mesmo resultado que o de obedecer à vontade dele na vida prática.

4) Sendo fortalecidos com todo o poder de Deus. Esse poder (dunamis) é comparável (pelo significado da palavra "segundo") à força dominadora que tem a glória de Deus, cada vez que se manifesta. Imaginemos o terror dos guardas do túmulo de Jesus quando a pedra foi removida e Cristo ressurgiu, radiante, superando o poder da morte e a precaução dos romanos! Quando Isaías entrou no templo, a glória de Deus encheu a casa e o profeta caiu em si, arrependido e disposto a servir ao Senhor onde e como este ordenasse. O termo força (kratos) significa imponência de alguém como um imperador que, pela majestade da sua presença e reconhecimento do seu poder, provoca uma total submissão à sua vontade.

Esse crescimento no pleno conhecimento de Deus ocorre em virtude de algumas atitudes, aqui indicadas por duas palavras: "... em toda a perseverança e longanimidade" (v. 11). A primeira (hupomonê) é freqüentemente traduzida por "paciência", no sentido oposto ao de covardia ou disposição de tentar escapar de uma situação difícil. A segunda palavra (makrothumia) corresponde àquela paciência que contrasta com a ira ou hostilidade; expressa bem a atividade passiva de quem aceita de bom grado uma aflição ou in-justiça, sem ficar revoltado. Bem disse Tertuliano, antigo pai da Igreja: "A fé é a paciência com a lâmpada acesa".

A terceira atitude característica encontra-se na referência a "alegria". Não é difícil perceber que tudo que Paulo almeja para os colossenses era experimentado por ele mesmo. Na sua carta aos filipenses, o termo "alegria" aparece, de uma forma ou de outra, num total de dezesseis vezes, indicando a forma como Deus lhe respondia as orações na prisão.

5) A oração é concluída com adoração (N. 12): "Dando graças ao Pai que vos fez idôneos" para herdar tudo que ele tem para os seus filhos. A gratidão e o louvor são a conseqüência natural de uma conduta digna do Senhor. Estando idôneos ou capacitados, a nossa mente se abre para toda a obra redentora de Cristo, mediante a qual Deus nos deu as condições para herdarmos o céu. Aqueles que estavam, anteriormente, alienados e sem Cristo, os que eram "estranhos às alianças da promessa, não tendo esperança e sem Deus no mundo" (Ef 2: 12), agora passaram a ter direito à escri tura do paraíso, lavrada por Jesus Cristo, favorecendo-lhes em tudo.

Em síntese, Paulo fundamenta a sua oração pelos cristãos de Colossos demonstrando a realidade e o poder do evangelho. Roga a Deus que eles conheçam plenamente a sua vontade, a fim de poderem viver segundo o inteiro agrado do Senhor. Eis o modelo apostólico de intercessão!

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Perguntas para Meditação :

Tendo em mente o que foi exposto, o leitor poderá fazer a si próprio as seguintes perguntas:

1. Será que os irmãos que me conhecem bem vêem a fé, a esperança e o amor como características da minha vida cristã?

2. Estou sempre dando graças por um determinado filho de Deus? Será que há algum cristão que sempre agradece a Deus por mim?

3. Quais são as maiores diferenças entre as minhas orações e esta de Paulo, em Colossenses 1: 9-12? 0 que me levará a orar mais segundo o padrão bíblico?

4- JESUS CRISTO, O SENHOR DE TODA A CRIAÇÃO

Texto : Colossenses 1:13 a 23

13 "Ele nos libertou do império das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor, 14 no qual temos a redenção, a remissão dos pecados. 15 Ele é a imagem do Deus invisível, o primogênito de toda a criação; 16 pois nele foram criadas todas as cousas, nos céus e sobre a terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias, quer principados, quer potestades. Tudo foi criado por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as cousas. Nele tudo subsiste. 18 Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os mortos, para em todas as cousas ter a primazia, 19 porque aprouve a Deus que nele residisse toda a plenitude, 20 e que, havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as cousas, quer sobre a terra, quer nos céus. 21 E a vós outros também que outrora éreis estranhos e inimigos no entendimento pelas vossas obras malignas, 22 agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis, 23 se é que permaneceis na fé, alicerçados e firmes, não vos deixando afastar da esperança do evangelho que ouvistes, e que foi pregado a toda criatura debaixo do céu, e do qual eu, Paulo, me tornei ministro."

O Resgate que Deus efetuou no Passado

Deus montou uma "operação-resgate" para libertar os pecadores do poder das trevas. Foi nessa investida contra o reino satânico, levada a efeito por Jesus Cristo, que a luz brilhou naquele império, sendo construída a ponte que daria acesso dali até o reino do Filho. "Ele nos libertou" (v. 13): isto indica que os santos já não estão mais sujeitos à escravidão do pecado nem à obediência à vontade de Satanás.

Uma vez que ele "nos transportou" (o tempo aoristo, no grego, mostra uma ação completada) para o reino do amado Filho de Deus, gozamos dos benefícios interpretados por alguns no contexto do milênio. O reino de Cristo ("do Filho") é termo raro no Novo Testamento, em contraste com a expressão "reino de Deus". Em I Coríntios 15:24-28, Paulo mostra que a presente exaltação de Cristo ao trono do Pai caracteriza-se pelo domínio das forças inimigas que se opõem ao seu reinado. E Apocalipse 11: 15 afirma que o domínio deste mundo já foi transferido ao Senhor (Deus Pai) e ao seu Cristo (o Messias), que reinará pelos séculos dos séculos. Esta perspectiva é denominada pelos teólogos escatologia realizada. As coisas que se realizarão plenamente no futuro (na segunda vinda e no milênio) já são uma realidade presente. O reino futuro já se manifestou na primeira vinda de Cristo (veja Mt 12: 28 e Lc 11: 20), mas só o veremos na totalidade na Parousia (comparar I Co 15: 50). Alguns interpretam a presente realidade como o reino de Cristo (I Co 6: 9ss; 15: 50; GI 5: 2 1 ; II Tm 4 : 1, 18) e o futuro reino como o reino de Deus. O mais importante é saber que o verdadeiro cristão já é cidadão do reino de Jesus Cristo, vivendo já como súdito de tão glorioso Rei, cujo domínio se manifesta na santidade e no amor dos "filhos do reino".

A Redenção Presente

Enquanto o v. 13 coloca no passado o resgate e o trans-porte de um reino para o outro, o versículo seguinte declara a verdade da salvação presente. Em Cristo temos a redenção por intermédio de um redentor (no hebraico, "geou": um parente ou intermediário que tinha possibilidades e direitos para readquirir o que tinha sido vendido ou escravizado, como se vê em Rute 2: 20 e 4: 1-12). Outro exemplo de destaque na Bíblia encontra-se no Êxodo, quando Deus redimiu da escravidão o seu povo Israel. Redenção envolve o pagamento do preço, ou algo oferecido em troca do valor da pessoa ou objeto a ser redimido. Efésios 1: 7 revela a imensidão do preço que nos resgatou: nada menos que o sangue do próprio Rei da Glória, vítima de violenta morte! Desta forma, os direitos com que o império das trevas segurava os seus súditos foram substituídos pelos direitos plenos que nos impõe o cativeiro gracioso de Cristo (Ef 4:

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8ss; II Co 2: 14ss; I Co 6:19, 20).

O Perdão dos Pecados

Além do resgate, do transporte para o reino de Cristo, e da redenção, realizados no passado e no presente, temos ainda o perdão dos pecados e o privilégio de gozar a paz advinda do total pagamento da dívida (idéia comunicada pelo grego afesin), dando-nos acesso à plena comunhão com Deus e uns com os outros. Já não mais existe barreira entre o pecador imundo e o seu Deus três vezes santo. O que aconte-ceu com Lady Macbeth, na peça de Shakespeare, não ocorre com o cristão verdadeiro: a mancha do pecado não lhe fica nas mãos. Ainda que ele peque, o sangue remidor de Jesus Cristo combate eficazmente o poder contagioso e febril da maldade. E nem mesmo Satanás resiste ao sangue do Cordeiro (Ap 12:10, 11).

O Senhorio de Cristo na Criação

Nos versículos 15 a 17, Paulo deixa de lado a obra redentora para considerar a grandeza da pessoa de Jesus Cristo:

"Ele é a imagem do Deus invisível " (v. 15).

Nosso Senhor reflete perfeitamente, tal como um espelho, a exata natureza de Deus; no seu corpo encarnado pode-mos contemplar as marcas deixadas pelo molde divino. Dessa forma o próprio Deus, embora oculto aos olhos pecaminosos, se fez visível através do seu Filho, que o revelou (Jo 1: 18; Iib 1: 3). Quem quer saber como é Deus, considere atenta-mente a pessoa de Jesus Cristo: seu amor e sua indignação, sua misericórdia e sua denúncia dos hipócritas, sua humildade e majestade, sua atitude de servo e seu senhorio.

"Ele é o primogênito de toda a criação" (v. 15).

Esta afirmação ressalta a verdade da primazia de Jesus Cristo como o "primeiro gerado", o herdeiro de tudo. Como Senhor e também autêntico representante e substituto do Pai, a ele cabem todos os direitos, tanto na área civil quanto na religiosa. Na antiguidade, o primogênito também exercia soberania na casa (comp. Gn 25: 31; 27: 29, 37; 49: 3). Assim, constatamos que o nosso soberano Senhor é o herdeiro de tudo quanto já foi criado; e, como tal, possui direitos irrevogáveis para possuir e exercer absoluta autoridade sobre a criação, quer sejam os céus, quer a terra ou tudo que neles há (cf. Sl 24: 1).

A primogenitura indica também o privilégio de ser eleito ou escolhido para ocupar a mais alta posição de honra. Neste sentido, Israel foi constituído primogênito de Deus (Ex 4: 22, 23), que assim declarou o seu amor para com o povo escolhido. Da mesma forma, o Pai se manifestou na ocasião do batismo de Cristo (Lc 3: 22). Os privilégios decorrentes de se receber o título de primogenitura são encontrados no Salmo 89: 27, onde o divino descendente de Davi é assim descrito: "Fá-lo-ei, por isso, meu primogênito, o mais elevado entre os reis da terra" (comp Ap 1: 5). Não obstante os argumentos dos arianos do Século IV, que afirmaram ser Jesus parte da criação, é muito claro que ele foi co-agente e já era antes de tudo o que Deus fez (vs. 16, 17). Em Romanos 8: 29 há mais um sentido no qual o Primogênito, Cristo, está relacionado com a Igreja, que é constituída por muitos filhos de Deus, irmãos transformados na imagem do próprio Primogênito. O apóstolo concentra sua atenção num horizonte distante, a partir do versículo 19 do referido capítulo de Romanos. Toda a criação geme, na ansiedade de presenciar a restauração de todas as coisas, no glorioso dia em que o Senhor da Criação tomará posse do novo céu e da nova terra. Nesse mesmo dia, os filhos de Deus receberão corpos reconstituídos, como o de Cristo, declarado as primícias da ressurreição (I Co 15: 23).

Por que o Senhor foi exaltado à primogenitura? Três verdades fundamentam o pensamento de Paulo com respeito à relação entre a Criação e Jesus Cristo. A palavra "pois" (do grego hoti) mostra que a posição atribuída ao Senhor é conseqüência do que Paulo apresenta logo em seguida:

1) Nele, todas as coisas foram criadas (v. 16).

Portanto, ele é a fonte originadora de tudo que existe no céu e na terra; tudo que o olho humano é capaz de perceber, bem como o invisível ou que está fora do alcance dos sentidos humanos, tudo se originou no plano e no poder do Senhor. Tronos e senhorios, tanto de anjos quanto de homens, príncipes e autoridades do mundo sobrenatural, todos emanaram do seu poder criador. "Cristo, ele próprio, enche o universo da maior profundeza até a maior altura com Deus e faz da alma humana o seu santo dos santos."

Tais implicações não devem ter passado desapercebidas aos colossenses, que consideravam tão atraentes as reivindicações dos mestres gnósticos acerca dos poderes invisíveis dos ares. Paulo

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simplesmente derruba qualquer busca de meios e caminhos para influenciar os "soberanos" invisíveis do universo, apresentando a inabalável verdade: "Cristo é senhor, herdeiro e primogênito sobre tudo e sobre qualquer inteligência desencarnada". Buscá-los a única forma de vencer todas as forças opositoras na vida!

2) Tudo foi criado por meio dele (v.16).

Cristo é o agente do poder criador de Deus. Se é que tudo que existe passou pelas mãos dele, então podemos ter absoluta confiança no seu controle providencial. Para ele não há surpresas e nunca poderia encarar como tal os nossos incidentes e "por acasos", já que nada do que existe nem qualquer ocorrência pode ser separado da sua divina vontade (veja Jo 1:3eHb2:8).

3) Tudo foi criado para ele (v. 16).

Cristo, aqui, é-nos apresentado como o alvo da criação. Todas as coisas feitas e moldadas pelas sua mãos, todas as funções da variedade infinita do nosso universo - tudo tem como única finalidade render ao Senhor todo o louvor possível! Desde os bilhões de sóis que compõem as galáxias espalhadas pelos céus, até os micróbios unicelulares, tudo rende e ainda prestará dívidas de louvor, numa sinfonia que proclama eternamente que o Senhor é digno de receber toda a honra, glória e adoração (Sl 19: 1-4; 5:11-14).

A Primazia de Cristo

Após declarar a razão por que Cristo merece ser o primogênito de toda a criação, no v. 17 Paulo passa a apresentar duas verdades que apóiam a absoluta primazia de Jesus.

Em primeiro lugar, "Ele é antes de todas as coisas". Quando Jesus surpreendeu os judeus, ao declarar que já existia antes de Abraão (Jo 8:58), lançou a base para o que Paulo diz aos colossenses aqui. Além disso, Jesus empregava a frase "Eu sou" (no grego, ego eimi), colocando-se a si mesmo acima do tempo, no sentido em que os homens o vivem; ele era sem início e sem fim, "o mesmo ontem, hoje e para sempre" (Hb 7: 3; 13: 7). No pensamento antigo, quem vem antes merece o primeiro lugar. Confrontamo-nos, assim, com a prioridade de Jesus, evidenciada no fato de que, já que todas as coisas lhe são posteriores, logo ele é superior a tudo que existe.

Considere-se, em segundo lugar, o fato de Cristo integrar todo o universo. "Nele tudo subsiste" significa que ele é o centro de coerência ou coesão. Sendo ele o segredo da unidade, que interliga e dá simetria a todas as leis da física ou da química, da biologia como também da astronomia, os sistemas de leis que regem todo o universo são manifestações para dar lugar aos novos céus e à nova terra. Talvez assim possamos entender melhor a declaração do v. 20, que aponta a cruz como o veículo de reconciliação de "todas as coisas". Os rabinos judaicos acreditavam- firmemente que a primeira criação tinha sido o modelo ou o tipo da nova criação. A redenção não se efetivou num vácuo, mas no centro da História e do universo. Deus encara com tanta seriedade a ordem própria do mundo por ele estabelecido, que sacrificou seu próprio Filho a fim de salvar o mundo sem desprezar essa ordem. A nova criação vem a ser, portanto, o "não" de Deus aos problemas deste mundo, como também o seu "sim" para o propósito original.

Na época de Paulo (e em parte também na nossa), o homem não se preocupava tanto com seus problemas pessoais, seu pecado ou retidão, mas, sim, com os problemas do mundo : a falta de significado na vida, a ameaça do azar, a tirania desoladora das forças que controlavam os eventos terrestres e as estrelas que supostamente determinavam toda mudança na sorte dos homens. Mas Paulo teve uni en-contro com Cristo e, ao conhecê-lo, descobriu a solução para todo esse quebra-cabeça. A resposta estava enquadrada na soberania de Cristo: não uma verdade teórica ou apenas religiosa mas, sim, para o dia-a-dia. Assim, ao enfrentar o sofre-mento, perseguição ou qualquer problema, o apóstolo passou a encará-los como manifestações da graça de Cristo, que atuava em tudo (veja II Co 12: 7-10).

O Senhorio de Jesus Cristo Sobre A Nova Criação

Em relação à Igreja, encontram-se nos vs. 18 e 19 quatro afirmações de amplo significado:

O Cabeça do Corpo

Além de ser o titular do governo sobre a criação, Jesus Cristo foi exaltado à posição de Cabeça do corpo, figura escolhida por Paulo para salientar a relação orgânica existente entre Cristo e a Igreja universal. Assim como Eva foi criada do corpo de Adão, também a Igreja surgiu pela encarnação do único Filho de Deus, o qual, na sua morte e ressurreição, se ofereceu para criá-la (Jo 2: 19-21). Ao se dizer que o Senhor é "a cabeça", está implícita a sua inseparabilidade do corpo, ao mesmo tempo que se exdui a sua

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identidade total com esse corpo. Os benefícios da redenção fluem da cabeça para o corpo, mas este não tem o direito de reivindicar soberania sobre o mundo, nem de exercer um espírito triunfalista. Cristo, e não a Igreja (e muito menos a sua hierarquia), é o Senhor. Cada vez que a Igreja tem usurpado a posição soberana de Cristo sobre o mundo, foram notados sinais, não do seu caráter celestial, mas carnais e até infernais.

O Princípio da Nova Criação

Cristo estabeleceu o esboço da Igreja, assim como os alicerces dão, em princípio, a idéia projetada de como será o prédio a ser sobre eles edificado. Em Hebreus 12:2, Cristo aparece como o "autor e consumador da nossa fé". Daí percebemos que ele é o Cabeça por ser o iniciador da nova raça dos salvos.

O Primogênito de Entre Os Mortos

Focalizando a ressurreição (veja também Ap 1: 5), esta frase declara que o Senhor tem o direito de governar a sua Igreja por ser o Herdeiro, o primeiro e o principal dentre muitos irmãos. Mais ainda, este versículo ensina que o fato de que "dos mortos a vida por ele começou" (O Novo Testa-mento, versão de Phillips) implica em ser ele realmente o Senhor de tudo na Igreja. Quando os santos, que compõem seu corpo, evidentemente lhe desobedecem, estão negando abertamente a finalidade da ressurreição. Deus Pai o constituiu para exercer pleno domínio sobre os seus "irmãos mais no-vos". No grego, Paulo usou a palavra "auton" (ele mesmo) dentro da cláusula: "para em todas as coisas (ele mesmo) ter a primazia ". Isto objetiva enfatizar que somente Jesus Cristo tem o direito de dirigir, e não o pastor ou a congregação; não o bispo ou mesmo o Papa, mas Cristo, sozinho. Todos estes devem se subordinar ao Cabeça, para servirem unicamente a ele. E evidente que nem o mundo, nem os demônios ou os anjos rebeldes reconhecem ainda a primazia de Cristo, mas a sua Igreja deve testemunhar incessantemente essa realidade.

Nele Reside Toda A Plenitude

Uma outra razão pela qual Cristo deve ter a primazia sobre tudo na Igreja surge na frase: "porque aprouve a Deus que nele residisse toda a plenitude" (v. 19). 0 termo plenitude (plêrõma) denominava, para os gnósticos, todas as emanações que ocupavam o espaço entre o deus espiritual e o mundo material. Provavelmente, é neste sentido que Paulo deseja que seus leitores concebam a Cristo, como aquele que preencheria totalmente qualquer necessidade que eles tivessem de alcançar o Deus verdadeiro. Poderia indicar também todos os atributos divinos de Cristo (2: 9). Assim, podemos confiar que Cristo supre tudo que a Igreja necessita para cumprir sua missão ou para enfrentar os poderes do mal.

Cristo, O Reconciliador de Tudo

Tendo apresentado a pessoa de Jesus Cristo, Paulo volta a discutir o seu direito de primazia em decorrência da sua obra (vs. 20-22): "Havendo feito a paz pelo sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra, quer nos céus".

A obra efetuada por Cristo proporciona a visão dos benefícios que acompanharão os salvos no dia do encontro.

A Paz Entre Pecadores e Deus

Convém lembrar a rica herança que tem a palavra "paz" nas suas raízes hebraicas: o Shalom de Deus. Não somente refere-se ao cancelamento de inimizade, como também à prosperidade que Deus concede aos seu amigos (Abraão, Davi, ... ). Esta relação de amizade foi ganha na morte de Cristo na cruz. Seu sangue homologou a Nova Aliança de paz, um tratado gracioso originado inteiramente nos propósitos e planos de Deus. E Paulo novamente nos adverte que o preço que pagou essa paz foi o sangue sacrificial vertido na cruz.

Reconciliação

Reconciliação reflete duas palavras hebraicas que expressam a remoção da inimizade, criando, por um lado, uma atmosfera agradável e, por outro, acalmando atitudes hostis. Objetivamente, no sacrifício expiatório e substitutivo de Cristo Deus removeu a inimizade criada pelo pecado humano, apaziguando essa rebelião.

Ao notar a condição em que estavam os colossenses quando foram alcançados pelo evangelho, Paulo aponta para a situação dos gentios, tão necessitados de reconciliação. Eram estranhos, isto é, pertenciam literalmente a um outro rei ou dono, que os hostilizara com Deus. Eram alienados, cidadãos de uma outra potência que os mobilizara numa rebelião contra a autoridade de Deus. A expressão no entendimento (v. 21) indica que essa alienação e hostilidade contra Deus eram o resultado de uma

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persuasão de Satanás, que levara suas mentes e imaginação a concluírem que as obras malignas estavam certas. Ideologias como o marxismo, ou mesmo a conversa informal de uma turminha de jovens numa grande cidade, são exemplos de como a mente humana concorda com a maldade e racionaliza qualquer ação repreensível praticada no corpo.

Ao outrora do passado (v. 21) segue-se o hoje presente (v. 22), caracterizado pela reconciliação dentro do corpo de Jesus, por ele oferecido voluntariamente na cruz. O corpo da sua carne ferida pelos cravos mortíferos possibilitou uma nova harmonia com Deus. E são as testemunhas vivas dessa harmonia que compõem o novo povo de Deus, a Igreja.

A segunda parte do versículo 22 resume o tríplice propósito de Deus ao oferecer o "Filho do seu amor". Ele quer apresentar a si mesmo, num dia futuro, os membros do Corpo de Cristo, que deverão ter as seguintes características:

Santos: Esses pecadores, que antes serviam prazerosamente a Satanás, são agora santos, inteiramente consagrados e separados para Deus. Ele os santificou pela reconciliação e amizade plenas, tal qual o filho pródigo foi santificado pela restaurada harmonia com seu pai (Lc 15: 11-32).

Inculpáveis: No grego, usava-se a palavra "amomos" para descrever animais limpos, imaculados e, conseqüentemente, aceitáveis para o sacrifício a Deus. Esta mesma palavra é usada por Pedro para comunicar a qualidade do "cordeiro (Cristo) sem defeito", absolutamente aceitável como sacrifício para a nossa remissão (I Pe 1: 19).

Irrepreensíveis: Isto é, sem possibilidade de ser alvo de uma acusação efetiva. Não haverá cheiro de escândalo nem crítica válida que o inimigo das almas possa lançar contra os convidados para as bodas do Cordeiro. Os salvos estarão absolutamente imunes ao castigo que os seus pecados merecem. Toda repreensão cairá sobre o Filho perfeito (Isa 53:6).

As Condições Providenciadas por Deus

No versículo 23 vemos essas importantes condições, que definem os que realmente podem ser enquadrados no rol dos reconciliados:

Firmes na Fé

"Se é que permaneceis na fé" parece ser uma condição para gozarmos todos benefícios oferecidos, em princípio, na morte reconciliadora do Senhor Jesus. E preciso preservar na fé até o fim (comp. Mt 24: 13). Esta perseverança na comunhão de Cristo é a única base válida para a segurança da salvação (Jo 15: 2-6). 0 cristão que se afasta daquele que é o único capaz de salvar não deve pensar que a fé efêmera do passado lhe garantirá automaticamente o futuro.

Alicerçados na Rocha

Alicerçados mostra que, sem que a nossa confiança esteja fundamentada na rocha, não há base para presumirmos que de fato temos a segurança na salvação. O homem que construiu a sua casa sobre a areia necessitava deste fundamento imprescindível (Mt 7: 24-27; Lc 6:48, 49). Cristo é o único fundamento (I Co 3: 11) e a Rocha eterna. Quem nele confia não será envergonhado.

Firmes

"Firmes", juntamente com a palavra "inabaláveis" (I Co 15: 58), mostra a constância e a imutável firmeza que são condições para se esperar essa apresentação gloriosa, já vista no v. 22.

"Não vos deixando afastar da esperança do evangelho."

Aqui o apóstolo emprega a figura dos estragos decorrentes de um terremoto, capaz de remover um edifício do seu fundamento, destruindo-o. Durante o reinado do impera-dor Tibério (14-37 A. D.), doze cidades da Ásia Menor foram arrasadas. No ano 60, segundo Tácito (para Eusébio, em 64 ou 65), um fortíssimo terremoto abalou Laodicéia, atingindo também Colossos, cidade vizinha. Se é que isto acabava de acontecer, entende-se que efeito causaria nos cristãos colossenses a advertência de Paulo quanto a não se deixarem levar por ensinamentos falsos que viessem a destruir a sua esperança no evangelho.

Esperançosos no Evangelho

Segue-se a condição de esperarem no evangelho que já ouviram (v. 23b). O evangelho não significa boas novas apenas para alguns, mas para toda a humanidade, que tem plenos direitos a ouvi-lo. Toda barreira de raça, cor, geografia, idade, língua ou tribo foi tirada, em princípio, quando Jesus afirmou

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que o evangelho seria pregado por todo o mundo, antes do fim (Mt 24: 14). Por isso ele deu aos seus discípulos a missão de levar o evangelho a todas as nações (Mt 28: 20) e prometeu o poder incontido do Espírito para dar sucesso a esse empreendimento mundial de testemunhar dele (At 1: 8). Ao declarar que "foi pregado a toda criatura debaixo do céu", Paulo queria dizer que o evangelho já se espalhara aos grandes centros do império, tornando-se acessível a todos.

Desse evangelho é que Paulo foi apontado ministro (do grego diakonos, termo ainda muito geral, na sua acepção neotestamentária). Sobre esse ministério, ele discorrerá nos versículos seguintes.

5- O SENHORIO DE CRISTO NO MINISTÉRIO DE PAULO

Texto: Colossenses 1:24 a 2:5

24 "Agora me regozijo nos meus sofrimentos por vós; e preencho o que resta das aflições de Cristo, na minha carne, a favor do seu corpo, que é a igreja; 25 da qual me tornei ministro de acordo com a dispensação da parte de Deus, que me foi confiada a vosso favor, para dar pleno cumprimento à palavra de Deus: 26 O mistério que estivera oculto dos séculos e das gerações; agora, todavia, se manifestou aos seus santos; 27 aos quais Deus quis dar a conhecer qual seja a riqueza da glória deste mistério entre os gentios, isto é, Cristo em vós, a esperança da glória; 28 o qual nós anunciamos, advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo; 2 para isso é que eu também me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo a sua eficácia que opera eficiente-mente em mim.

2 1 Gostaria, pois, que saibais quão grande luta venho mantendo por vós, pelos laodicenses e por quantos não me viram face a face; 2 para que os seus corações sejam confortados, vinculados juntamente em amor, e tenham toda riqueza da forte convicção do entendimento, para compreenderem plenamente o mistério de Deus, Cristo, 3 em quem todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento estão ocultos. 4 Assim digo para que ninguém vos engane com raciocínios falazes. 5 Pois, embora ausente quanto ao corpo, contudo em espírito estou convosco, alegrando-me, e verificando a vossa boa ordem e a firmeza da vossa fé em Cristo."

Passando das considerações quanto à posição do Senhor Jesus Cristo sobre o universo e a Igreja, o apóstolo discorre, agora, sobre a sua própria parte na evangelização mundial, particularmente dos gentios.

Um Ministério de Alegre Sofrimento (v. 24)

"Agora me regozijo", diz Paulo. Antes, ele aproveitava sua liberdade viajando e propagando o evangelho de cidade em cidade. Agora, porém, preso e impossibilitado de se deslocar, ele se alegra num "serviço inativo" mas sofredor. E certas afirmações suas nos desafiam a pensar: como atuaríamos, se estivéssemos na situação de Paulo?

Primeiro, Paulo estava sofrendo no lugar dos colossenses. Não era um sofrimento expiatório, mas algo que penetrava no território do inimigo com o conhecimento da verdade. Enquanto os colossenses viviam na tranqüilidade estável, Paulo confrontava a perseguição que todo cristão merece. Sofrimento é, portanto, a forma que o amor tem de assumir quando entra na luta contra o mal para conquistá-lo.

Em seguida, diz o apóstolo que esses sofrimentos preenchem o que resta das aflições de Cristo. Não podem, é claro, ser os sofrimentos de Cristo na cruz para expiar os pecados do mundo (Jo 1: 29); são aflições especiais, relacionadas com o testemunho cristão. Existe um sofrimento que vem como conseqüência do pecado; mas há um outro tipo que vence o mal no próximo: são as chamadas "aflições de Cristo", sendo que, ao sofrer o corpo, a cabeça também sente. (Em Atos 9:4, vemos que a perseguição de Saulo à Igreja atingia também a Cristo.) O sacrifício de Jesus na cruz foi oferecido na sua carne. Da mesma forma, "o que resta das aflições de Cristo" atinge a carne de Paulo e a dos cristãos perseguidos através dos séculos; trata-se daqueles que de bom grado se ofereceram sobre o altar (Fp 2:17; Ap 6:11).

Podemos imaginar três tipos de sofrimento suportados por Paulo. Primeiro, eram as aflições provocadas por inimigos de Cristo: perseguição na prisão, cadeias, restrições, má alimentação, desconforto de toda espécie. Segundo, ele menciona o sofrimento do cansaço: "Para isso é que eu me afadigo, esforçando-me o mais possível..." (v.29). 0 apóstolo experimentou, tanto no corpo quanto na mente, a fadiga de longas viagens a pé e de noites inteiras a pregar e ensinar. Mais do que tudo, este servo de Deus sabia o que era sofrer na luta de oração; "esforçando-me" (do grego agonizantes) e a "grande luta que venho mantendo" (2: 1) são expressões que bem descrevem esta maneira de sofrer. Todas estas formas

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de sofrimento tinham um valor eterno como "investimentos no banco celestial", por produzirem transformações nas vidas dos cristãos pastoreados pelo apóstolo.

Se ainda houver na Igreja líderes dispostos a sofrer na carne, no cansaço mental e, acima de tudo, na luta espiritual em oração, pode-se esperar um grande avanço na conquista do território inimigo. Muito ao contrário dos mestres gnósticos, para quem era ideal o escapar do sofrimento, o apóstolo de Cristo declara sua alegria por sofrer em benefício dos crentes de Colossos, apressando a segunda vinda de Cristo, dia em que findará o sofrimento de todos os santos (veja II Pe 3: 12, 13).

Um Ministério de Serviço (Diakonia) (vs. 25-27).

Paulo, a exemplo do seu Senhor, considerava-se um servo (comp. Mc 10: 45). Foi Deus quem o comissionou, de acordo com o seu plano, com a responsabilidade de mordomia da casa divina.

O termo dispensação (grego, oikonomia) indica uma pessoa encarregada de administrar os bens do seu senhor (cf. Lc 16: 1-8). 0 serviço incluía a responsabilidade de cuidar da melhor forma possível dos valores e posses do dono, a fim de poder prestar contas alegremente. Mas também era responsável por suprir as necessidades dos outros empregados ou escravos (note Lc 12: 42-48). As exigências impostas ao servo despenseiro, segundo I Coríntios 4: 2 e Lucas 12: 42, são fidelidade e prudência. O mordomo infiel utiliza o que não lhe pertence para alcançar os interesses próprios. O servo imprudente faz mau uso dos valores de modo que os negócios do seu senhor não granjeiam lucros, mas perdas. Paulo sentia profundamente a responsabilidade da dispensação que Deus lhe dera em favor dos colossenses (v. 25). "Dar pleno cumprimento" quer dizer desempenhar toda a missão que lhe foi confiada (Ef 3: 8), incluindo a pregação do evangelho, acompanhando, em seguida, os novos decididos na fé até a maturidade espiritual (v. 28).

O caráter especial da dispensação concedida a Paulo foi o de anunciar o mistério que outrora fora oculto durante séculos e gerações do Antigo Testamento e no período interbíblico. Nas religiões de mistério, o segredo ou "mistério" era o rito de iniciação pelo qual o novato ingressava numa união com o deus patrocinador da religião. Mas aqui deve ficar bem claro que "mistério" refere-se a um segredo revelado por Deus aos seus santos (v. 26).

Não foi, porém, uma revelação sem importância, como um anúncio de jornal datado de um ano atrás, mas uma verdade de tão grande significado que Deus quis que a riqueza da glória deste mistério fosse conhecida e divulgada entre todos os gentios.

A substância desse mistério tão valioso e irradiado da glória do céu é Cristo, o Messias judaico, e igualmente o Senhor dos crentes gentios. Neles também Cristo habita, garantindo-lhes, assim, a esperança de compartilharem da glória de Deus (v. 27).

Um Ministério Pastoral (v. 28)

O método usado por Paulo para desenvolver a sua tarefa de "administrador do mistério" girava em torno de três atividades pastorais.

(1) Em princípio, era-lhe necessário, bem como à sua equipe, anunciar o senhorio de Cristo, o Salvador. Em II Corintios 4: 5, ele aborda o perigo sutil e constante de se anunciar a si mesmo ao invés de Jesus Cristo como Senhor, ou seja, reivindicar para si próprio algum direito ou privilégio especial. O anúncio enfatiza especialmente a disponibilidade de Cristo para salvar qualquer pessoa que queira ser redimida.

(2) Não se cumpre a responsabilidade de despenseiro apenas divulgando a verdade do evangelho. Muitas pessoas são apáticas, necessitando, portanto, de advertência; e este é um termo negativo que aponta para o grande perigo que corre aquele que não atende ao convite do evangelho. Quase sempre que a palavra advertência (nouthetéo, nouthesia) é usada no Novo Testamento, ela se refere a crentes. Isto indica que precisam ser readvertidos para os riscos na vida cristã. (Veja At 20: 31, I Co 4: 14, I Ts 5:12 e também aqui, onde se destaca o trabalho pastoral de admoestar e advertir; em Rm 1 5 : 14, Col 3 : 16, I Ts 5: 14 e II Ts 3: 15, é um serviço que deve ser prestado pelos membros da Igreja.)

(3) Anunciar as Boas Novas e advertir os ouvintes, e isto sob a bênção de Deus, produz conversões. Paulo nunca achou que o fato de ganhar almas o desobrigava de integrá-las no Corpo vivo de Cristo. Daí a sua declaração quanto a se responsabilizar pelo ensino de todos com "toda a sabedoria" de Deus; trata-se da cuidadosa catequese dos cristãos gentios, discipulando-os na doutrina e na prática cristã (comp. At 20: 20, 27, 32). Jesus, logo antes da sua ascensão, ordenou aos onze que fizessem discípulos de todas as nações, batizando-os e ensinando-lhes tudo que ele mesmo lhes havia ensinado a guardar,

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tudo que lhes ordenara (Mt 28: 19, 20). 0 objetivo final do bom despenseiro de Deus não deixa de ser a apresentação de "todo homem perfeito em Cristo". Perfeito (em grego, teleios) significa maduro, adulto, e não quem jamais pecou (veja Fp 3: 12-15). Um cristão adulto, em contraste com o imaturo (I Co 3: 1,2; Hb 5: 12-14), pode servir ao Senhor, conduzindo outros à maturidade. A criança na fé fica na dependência da ajuda e sustento do cristão mais maduro, sendo incapacitada de continuar sem esse apoio. Neste curto v.28, Paulo fala em "todo homem" três vezes, querendo mostrar com isso o quanto lhe desgostara a atitude dos gnósticos de Colossos, não reconhecendo a universalidade do evangelho. Eles queriam "aperfeiçoar" somente alguns, uma elite; mas o evangelho, por natureza, tem que ser para todos. Todos merecem ouvir.

Um Ministério de Trabalho (1:29 a 2: 4)

0 apóstolo não apenas sofre (v. 24) e desempenha sua mordomia (vs. 25 - 28); ele trabalha. "Também me afadigo, esforçando-me (agonizõ) o mais possível, segundo a sua eficácia (energeia) que opera eficientemente (energoumenên... en dunamei)". Se compararmos este versículo com Filipenses 2: 12, 13, verificaremos que o esforço humano pode abrir caminho para a manifestação do poder divino. A Paulo não importava desgastar o seu corpo e ficar bem cansado ("me afadigo" traduz bem o grego "kopioõ ", com o sentido de trabalhar tanto até se cansar muito). O seu esforço, porém, não se realizava na "carne", mas no Espírito. Provavelmente ele estava falando da oração, já que na prisão não lhe era possível gastar muita energia física em favor dos colossenses.

Só Paulo, no Novo Testamento, emprega nove vezes o vocábulo aqui traduzido por "eficácia" (veja Ef 1: 19; 3: 7; 4: 16; Fp 3: 21). A nossa palavra "energia" vem do grego, mas o original enfatiza a eficiência da energia usada. Muitas vezes sentimos cansaço no trabalho de Deus sem ver um resultado correspondente. Por quê? Não se explicaria este fenômeno pelo esforço carnal em vez da oração do justo, que "muito pode, por sua eficácia" (Tg 5: 16)? 0 elemento chave é a fé, sem a qual não é possível agradar a Deus, e muito menos efetivar o seu serviço espiritual.

Paulo prossegue, em 2: 1, expondo a importância da oração na sua estratégia de batalha. Não queria que os cristãos de Colossos e Laodicéia pensassem que ele, por não conhecê-los pessoalmente, deixava de lutar por eles de uma for-ma absorvente, concentrando todo o seu ser nessa "agonia" (grego: agõna. Compare com Fp 1:30 e I Tm 6: 12). A semelhança do conflito de Jesus no Getsêmani, o apóstolo se empenhou na batalha pela salvação das almas que Cristo comprara com o seu precioso sangue. Essa luta de joelhos, na prisão de Roma, vencia as forças satânicas que avançavam contra os mal protegidos cristãos da Ásia. Combate idêntico ele já travara outrora em favor dos gálatas e coríntios, que também enfrentaram o perigo de serem enganados por um falso evangelho.

O que Paulo pedia em favor do colossenses?

1) Encorajamento para os seus corações (v.2) "Confortados" traduz a palavra grega parakaleõ, que tem o sentido de exortar, encorajar, animar. Corações desanimados geram um pessimismo na Igreja. A depressão espiritual não deixa de ser o campo mais propício para o inimigo semear o "joio" doutrinário, para não dizer o da falta de amor e a desunião. O pedido de que Deus os encoraje condiz com a promessa do Pai (Jo 14: 16ss, 26; 15:26; 16: 7,13): o Espírito Santo, o Consolador (paraklêtos). Este, sim, atuando em resposta às orações, conforta os corações dos santos.

2) Vinculados pelo amor (v. 2)

Além de encorajamento para os seus corações, Paulo pedia que os crentes fossem estreitamente ligados pelos vínculos do amor. Esta mesma palavra, vinculados, é empregada em 2: 9 para descrever a maneira como funcionam juntas e ligamentos do nosso corpo, ilustrando assim as relações dinâmicas e edificantes em toda a Igreja. Quando o povo de Deus se une em amor, pode resultar em encorajamento e firmeza contra o erro e, sobretudo, orientação para a plena riqueza da convicção trazida pelo entendimento (v.2). 0 erro doutrinário tem livre acesso à mente que não tem certeza (grego: pieroforia) daquilo em que crê, justamente por não o entender. Tudo resulta numa compreensão de quem é realmente o Senhor Jesus Cristo. Ele é o conteúdo do segredo de Deus. E a humanidade tateia em busca de solução definitiva da conquista do pecado e do sofrimento, até encontrá-la em Cristo (comp. At 17: 27), pois é nele e na sua obra redentora que se encontra a salvação.

Em Cristo encontra-se a mina inesgotável de todos os valores da verdadeira sabedoria (sofra) e conhecimento (epignósin). Mas esta sabedoria não está na superfície, nem este conhecimento é como as águas do mar para o marinheiro: ambos estão ocultos em Cristo. É preciso buscar, cavar nessa mina, cujos brilhantes só se desenterram com oração, leitura da Palavra, meditação e espera no Espírito Santo. Em I Coríntios 1 a 4, Paulo desenvolve o tema da sabedoria, ressaltando esta verdade: a espiritualidade real só

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se encontra em Cristo, e este crucificado.

Esses tesouros, sabedoria e conhecimento, como já vimos nos versículos 9 e 10 (Cap. 1), levam-nos a urna verdadeira penetração no mistério de Deus, isto é, uma integração dentro do propósito divino, revelado na vinda de Jesus Cristo ao mundo. Devemos saber que o objetivo de Deus Pai ao dar o seu Filho ao mundo foi produzir muitos filhos semelhantes ao seu Unigênito (Rm 8:29). Quem buscar em Cristo, na singularidade da sua pessoa e vida, e também no seu ensino, a sabedoria de Deus, encontrá-la-á. Este seria o galardão prometido a quem se restringir a procurar de fato o ponto de vista divino em sua única fonte, o tão grande Salvador!

0 objetivo desta ênfase de Paulo era advertir os seus leitores quanto ao perigo do engano (no original: para, "ao lado de"; logizõ, "raciocinar") através de palavras cativantes ou "argumentos atraentes" (v. 4). Palavras habilmente utilizadas podem persuadir, assim como um filme de cinema pode iludir. Se não tivermos critérios bíblicos, como discerniremos a verdade no meio de tantas palavras persuasivas? (Veja At 20:30.)

Um Ministério de União Espiritual (2: 5)

Embora fisicamente separado dos colossenses, Paulo declarou sua presença espiritual com eles (v. 5): ou pelo seu próprio espírito (imaginando), ou pelo Espírito Santo (revelando), ele presenciava o que acontecia na Ásia distante. Isto lhe dava ânimo, pois observava, com muita alegria, duas características da igreja (ele as descreve usando uma terminologia militar). Primeiro, sua boa ordem (grego: taxin, "fileiras ordeiras de um exército") e, segundo, sua firmeza (stereóma, "linha de frente firme", "falange pronta para receber o impacto do inimigo, sem recuar") na fé, posta no Senhor.

Assim, neste trecho o apóstolo Paulo nos dá o privilégio de divisar um panorama geral do seu ministério. Mostra a nós, seus leitores, as vantagens do sofrimento, os valores do esforço e a centralidade da oração. Tudo isso para proteger uma igreja pequena contra os ataques de um inimigo sobremaneira esperto e poderoso. Mais uma vez conserva-se no centro a imagem de Jesus Cristo. Foi ele quem inspirou seu servo a se gastar no amor que o incentivou a desempenhar tão desinteressadamente o seu serviço.

E nós? Seguimos nos seus passos marcantes ou consideramos o preço alto demais? Só a clara visão de Cristo nos moverá a tal excesso de sacrifício pelos outros!

6- EM CRISTO, O SENHOR

Texto: Colossenses 2: 6 a 154

6 "Ora, como recebestes a Cristo Jesus, o Senhor, assim andai nele, 7 nele radicados e edificados, e confirmados na fé, tal como fostes instruídos, crescendo em ações de graça. 8 Cuidado que ninguém vos venha a enredar com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a tradição dos homens, conforme os rudi -mentos do mundo, e não segundo Cristo: 9 porquanto nele habita corporalmente toda a plenitude da Divindade. 10 Também nele estais aperfeiçoados. Ele é o cabeça de todo principado e potestade. 11 Nele também fostes circuncidados, não por intermédio de mãos, mas no despojamento do corpo da carne, que é a circuncisão de Cristo; 12 tendo sido sepultados juntamente com ele no batismo, no qual igualmente fostes ressuscitados mediante a fé no poder de Deus que o ressuscitou dentre os mortos. 13 E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas transgressões, e pela incircuncisão da vossa carne, vos deu vida juntamente com ele, perdoando todos os nossos delitos; 14 tendo cancelado o escrito de dívida, que era contra nós e que constava de ordenanças, o qual nos era prejudicial, removeu-o inteiramente, encravando-o na cruz; 15 e, despojando os principados e as potestades, publicamente os expôs ao desprezo, triunfando deles na cruz."

Andai Nele!

Até o final de 2: 5, não encontramos qualquer exortação, imperativo ou mandamento explícito. Mas no v. 6 o apóstolo Paulo muda a maneira de falar. Aqui aparece uma ordem, simples e clara. "Andai nele", ordena o apóstolo, "tal como recebestes Jesus Cristo, o Senhor"! Ou, em outras palavras: "Portanto, visto que Jesus foi entregue a vós como Cristo e Senhor, continuai vivendo conforme esse fato de ele ser o vosso Senhor". (0 verbo éntregue, em grego "paralembanõ ", sugere esta tradução.) "Recebestes" ou "foi entregue" era o termo comumente usado para indicar o recebimento de uma tradição. Logo no v. 8 Paulo adverte contra o perigo de abraçar "a tradição dos homens". Ou vivemos segundo a lei da liberdade que o Senhor grava no coração, ou em breve estaremos moldando a nossa conduta pelas especulações humanistas da cultura semi-religiosa contemporânea.

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A vereda, então, é Cristo Jesus, continuamente convidado a se assenhorear de todos os nossos atos, planos, pensamentos e ambições (comp. Rm 12: 2). Esta figura do caminho nos lembra a afirmação de Jesus: "Eu sou o caminho" (Jo 14: 6). No livro de Atos, os discípulos são o "povo do caminho" (22: 4), símbolo desta verdade: todo verdadeiro cristão é um peregrino (Mt 8: 20) e estrangeiro (Hb 11: 13) que caminha na direção de sua pátria celeste.

Nele Radicados, Edificados e Confirmados

Três palavras ligadas às figuras da árvore e do edifício apresentam outras verdades muito significativas (v. 7):

Nele radicados está no pretérito perfeito, indicando uma experiência no passado que não mudará. A árvore, uma vez enraizada, só fica mais fume à medida que o tempo passa e ela cresce. Paulo deixa bem claro que, à semelhança da árvore, os cristãos foram plantados em Cristo, de uma vez para sempre. Sendo um verbo passivo, dá para entender que foi Deus quem plantou a Igreja, e não uma decisão meramente humana.

Nele edificados sugere um prédio em construção. O comentarista Lightfoot traduz assim: "Sendo edificados nele hora após hora". As pedras vivas, lavradas por Deus, estão sendo colocadas no Templo vivo da ressurreição (Jo 2: 20ss). Não foi, porém, um simples ato, mas é um processo contínuo. Maravilhoso é pensar que as influências e experiências que Deus manda para nós, individual e coletivamente, têm o único propósito de nos edificar. E este edifício o Senhor está construindo para sua habitação (Ef 2:22).

Nele confirmados novamente é verbo passivo no tempo presente. Fala de um processo pelo qual se garante uma verdade, tornando-a imutável (veja Hb 2: 2; 3: 14). 0 andar em Cristo, a firmeza das raízes crescendo no evangelho, o processo de edificação, tudo deve confirmar a convicção do crente na fé. Por isso não é de se admirar que Paulo, muitos anos depois de experimentar um encontro transformador na estrada de Damasco, pudesse escrever aos filipenses: "Estou plena-mente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até ao dia de Cristo Jesus."

As três descrições da vida cristã nos termos "radicados", "edificados" e "confirmados" ocorrem onde há instrução verdadeira e cuidadosa na doutrina dos apóstolos (At 2: 42). Junto com a instrução deve haver crescente louvor e ações de graças, que indicam a importância da adoração verdadeira para a santificação da vida em Cristo.

O Perigo do Ensino Falso

Mesmo havendo tão excelentes motivos para que os colossenses crescessem na fé, Paulo sabia que também havia perigos que ameaçavam o fundamento do edifício, bem como idéias falazes que bem poderiam cortar as raízes da árvore da fé cristã. Daí a nova ordem do apóstolo: "Cuidado que ninguém vos venha enredar com sua filosofia e vãs sutilezas" (v. 8). Enredar (no grego, sulagogõ: "seqüestrar", "raptar") adverte os leitores para o perigo de serem persuadidos a mudarem as convicções de mente por meio da filosofia. Mas não se tratava de filosofia que buscasse a verdade pela análise cuidadosa, sempre consciente de suas limitações; muito pelo contrário, a heresia constava de idéias insensatas, de um intelectualismo capaz de penetrar onde nenhuma mente humana poderia ii sem a iluminação de Deus. Daí Paulo revelou a fonte de tais especulações: não passavam de "tradições humanas", isto é, falatórios consagrados pela transmissão. As vezes o passar de palavras da boca para o ouvido, ou da cabeça para o papel e tinta, impressiona ouvintes ou leitores como sendo válido. Confiamos na capacidade da mente humana de discernir a verdade e descartar o erro. Mas nada fica mais longe da realidade! Jesus condenou redondamente a facilidade com que os homens transformam a revelação em especulação e os mandamentos de Deus em tradição humana.

Ao conteúdo dessa tradição o apóstolo chama de "rudimentos" (grego: stoicheia). Esta palavra significava, no primeiro século, os elementos básicos de toda existência, ou o "ABC" de qualquer assunto, no sentido de passos preliminares e básicos (veja Hb 6: 1). Mas também significava poderes espirituais ou corpos celestes que supostamente governavam (no pensamento astrológico) as circunstâncias da vida humana. De fato, não importa muito o que seriam aqueles "elementos", uma vez que reconhecemos a sua oposição total à realidade de Cristo (v. 8). Ele tanto é o único fundamento como o destino de toda rea-lidade. "Alfa e Omega" é a feliz designação dada por João no Apocalipse (1: 8).

Cristo, A Única Fonte

Não se pode esperar qualquer auxílio de nenhuma destas fontes, diz o apóstolo. A razão é muito

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simples. Em Cristo reside permanentemente toda a plenitude da Divindade em corpo. Como, então, procuraria o cristão manifestações de poder, proteção ou qualidades sobrenaturais de outra fonte que não fosse Cristo? Uma interpretação sugere que a plenitude seria uma referência às emanações intermediárias que, na opinião dos gnósticos, preenchiam o espaço entre o deus espiritual e mundo material. Paulo, então, declara que Cristo não seria qualquer um destes, mas a soma total dos seus supostos poderes, englobados sob a sua soberania. Outra interpretação vê nesta passagem a verdade inegável de que todos os atributos divinos habitam (objetivamente) em Cristo.

O termo "divindade" foi usado em Romanos 1: 20 para indicar a mão de Deus revelada na criação do universo. Aqui, estaríamos vendo a Cristo como a revelação da face de Deus.

A palavra "corporalmente" pode significar "encarnado"; portanto, acontecido concreta e historicamente na pessoa de Jesus de Nazaré. Também esta palavra (sõmatikõs) pode ter a idéia de "totalmente", ou "unidamente", e não poderes ou espíritos distribuídos e espalhados, como pensaram os gnósticos. Paulo relembra os colossenses de que já passaram pela experiência da "circuncisão espiritual" (v. 11). Assim é que eles foram galardoados com a perfeição de Cristo (v. 10). A indagação de como se apropriaram desta plenitude de Deus, Paulo responde: pelo novo nascimento, cujo sinal foi o batismo, um ato que tinha profundas raízes no Antigo Testamento e na paixão e ressurreição de Cristo.

Não por intermédio de mãos humanas nos mostra que o valor da cerimônia inicial da vida cristã não depende de ação humana (Jo 1: 13). Também não coincide, de forma alguma, com o rito judaico da circuncisão física, que marcava a vinculação da criança com a aliança feita por Deus com Abraão, quase vinte séculos antes. Mas é o “despojamento do corpo da carne", isto é, a negação definitiva, no ato do batismo, da vida marcada pelo egoísmo e pela sensualidade. Em Romanos 6: 6, uma passagem paralela, Paulo aponta para o batismo como o homem velho (as práticas e atitudes anteriores à conversão) sendo crucificado com Cristo, "para que o corpo do pecado seja destruído".

A circuncisão de Cristo se refere especificamente à morte de Jesus na cruz, morte esta compartilhada por todo cristão que é enxertado em Cristo pelo novo nascimento, e testemunhada pelo seu batismo. Os cristãos não só compartilharam da crucificação de Cristo, mas também do sepultamento com ele no seu túmulo. Trata-se de um enterro espiritual acentuado pelo batismo, simbolizando o fim da vida velha no mundo e a ressurreição espiritual como membro do Corpo de Cristo. Estas realidades somente podem ser apropriadas pela "fé no poder de Deus" (v. 12), que literalmente levantou Jesus Cristo dentre os mortos. Crer na ressurreição é essencial para que se receba o dom da salvação (Rm 10:9; I Co 15: 14, 17).

Este modo de falar tem muito em comum com o pensamento dos judeus em relação ao Êxodo. Na Páscoa, a família judia revivia a realidade dos eventos que deram à luz a nação israelita. Através da celebração, na qual o judeu comia o cordeiro e os pães asmos, ouvia e respondia às perguntas de seus filhos, entendia-se que os participantes realisticamente compartilhavam do acontecimento original. Nesse contexto de pensamentos, o apóstolo fala da repetição, através do batismo, do evento salvador original, quando Cristo morreu e reviveu por nós.

Além de focalizar a morte de Cristo compartilhada por todos os seus "irmãos menores", Paulo chama atenção, no v. 13, para o estado mortal que precede a nova vida ressurreta dos regenerados. O estado de morte é primeiramente descrito como um produto das transgressões. O pecado, rebelião contra Deus, merece ser condenado pelo Deus da criação. No jardim do Éden nossos primeiros pais sofreram a implacável ira de Deus contra a sua desobediência. No mesmo dia, Adão e Eva morreram, no sentido de comunhão vital com Deus. A transgressão da lei de Deus é sempre punida pela separação dele, que é a única fonte de vida. Assim devemos considerar o sentido de morte pelas transgressões.

Em segundo lugar encontramos a frase "pela incircuncisão da vossa carne". Quer dizer, alienados e separados da aliança que Deus fez com Israel (Ef 2: 12). Foi Deus quem tomou a iniciativa de fazer essa aliança de graça e favor junto ao seu povo. Os colossenses, porém, não eram judeus, mas gentios; portanto, não podiam reivindicar qualquer vantagem dessa natureza.

Diante de tão impossível situação de marginalização espiritual, Cristo veio e "deu vida juntamente com ele" (v. 13), vida que Paulo exporá mais claramente no capítulo 3, nos versículos 1 a 4. Assim, a vida ressurreta de Cristo substitui a morte que antes nos caracterizava.

Todos os pecados foram perdoados por esta ação divina providenciada no Filho. Diz Sócrates, o famoso filósofo grego: "Pode ser que a deidade possa perdoar pecados, mas não vejo como!" O renomado Dr. Bob Pierce, acometido pela terrível leucemia, passou dezessete dias no hospital aguardando a morte, que Deus miraculosamente afastou por um longo tempo. Comentando sobre aquele período, poucos

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meses atrás, em nossa igreja, ele disse: "A única coisa realmente importante é que todos os meus pecados estão debaixo do sangue!" Cada dia a realidade do perdão deve tornar-se mais gloriosa e suscitar contínuo louvor.

Paulo explica, no v. 14, o meio pelo qual Deus nos outorgou este perdão: foi cancelado (exaleipsas, quer dizer, "apagar", "remover", "queimar ou inutilizar uma acusação ou dívida escrita") o escrito de dívida que seria a base de punição. A figura de um tribunal está na mente de Paulo. O réu está no banco. A escrita, repleta de acusações, está sendo preparada e lida. Mas o juiz, que é Deus, inocenta o culpado, tendo satisfeito na morte de Jesus, seu Filho amado, todas as exigências da lei (comp. Mt 18:23 - 35).

O apóstolo denomina essas exigências de "escrita de dívida" (cheirographon, uma promessa de pagar uma quantia x, assinada pessoalmente), que consistia nas ordenanças de Deus encontradas na Bíblia. As leis e obrigações do Antigo Testamento, que os homens sozinhos seriam incapazes de cumprir, e mesmo os mandamentos do Novo Testa-mento, nunca deixariam de condenar impreterivelmente todo pecador ao inferno. Por isso encontramos a palavra "ordenanças" (dogmasin, "ordens de tribunal ou juiz ", "decretos"; comp. v. 20, dogmatizesthe: "sois sujeitos a ordenanças").Mas este vocábulo acrescenta a idéia de "tradição humana".

Paulo pede aos seus leitores que considerem tão maravilhosa verdade. Cristo tomou sobre si mesmo as acusações todas. Em obediência absoluta a todas as ordens de Deus, ele cumpriu completamente as obrigações, removendo-as inteiramente (v. 14). Ficaram cravadas na cruz do Calvário as mãos e os pés do nosso Senhor, estendidos e transpassados pelos cravos, mostrando assim sua total submissão a toda a vontade de Deus. Fragmentos rasgados jazem espalhados no seu túmulo. Assim, nossa sujeição não pode ser mais a essas ordenanças religiosas, mas a Cristo, o Senhor. A "Lei", no sentido legalista, não é mais constitucional no Reino do Filho do seu amor. Como Paulo escreveu aos coríntios: "Não estais sem lei para com Deus, mas debaixo da lei (ennomos) de Cristo..." (9:21).

O v. 15 destaca a maravilhosa vitória de Jesus Cristo sobre os poderes satânicos: despojou (apekdusamenos, "desarmou-os", "derrotou-os", "tirou todas as suas armas", "neutralizando-os") os principados e potestades, ao vencer todas as tentações satânicas, vivendo uma vida absolutamente sem pecado. Mais ainda, Cristo os venceu pela morte conquistada na ressurreição. Os poderes do mal tentaram destruir a Jesus, publicamente, pela rejeição do povo, que gritava: "Crucifica-o!" e pelo poder político dos líderes israelitas, junto com a concordância de Roma (At 2: 23). Justa-mente na hora da maior vitória das trevas sobre o Senhor da Glória, ele rompeu os grilhões da morte, demonstrando sua vitória sobre o poder do pecado na sua expiação na cruz e sobre a morte pela ressurreição. A palavra grega aqui traduzida por "triunfando" (também em II Co 2: 14) pode indicar o cortejo triunfal do general romano que, após a conquista de território novo, traz os cativos amarrados, junto com o seu exército vitorioso.

Resumindo, entenderemos o argumento deste capítulo se lembrarmos que os colossenses estavam sendo atraídos por uma "salvação" mística, intelectual, especulativa e pela busca de contato benéfico com poderes espirituais. Procuravam uma "perfeição", não moral ou espiritual, mas teosófica. Paulo combateu toda essa palha, reconfirmando as principais verdades históricas e teológicas do Evangelho:

1) Cristo incorpora toda a realidade divina: v.9.

2) Ele é superior a todo poder real ou inventado: vs. 10, 15.

3) A perfeição só se alcança unicamente em união vital com ele : v. 10.

4) Por intermédio da fé e o enxerto em Cristo, simbolizado no batismo, todos os benefícios da morte e ressurreição dele são compartilhados.

5) Não estando mais morto e alienado de Deus pelo pecado, o cristão vive totalmente liberto da culpa e em tranqüilidade diante de qualquer obrigação religiosa, por intermédio da vitória de Jesus na morte e ressurreição.

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