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ECOSSOCIOECONOMIA E ECONOMIA SOLIDÁRIA: UMA
APROXIMAÇÃO TEÓRICA E PRÁTICA
Carlos Alberto Cioce Sampaio1
Lourença Santiago Ribeiro2
Luciane Cristina Ribeiro dos Santos3
Resumo
As crises históricas causadas pela dinâmica capitalista e economia de mercado fizeram
surgir movimentos de resistência, contra suas principais mazelas como as desigualdades
sociais. As alternatividades apontadas por Boaventura Sousa Santos (2011) ou a
ecossocioeconomia apontada por Ignacy Sachs (2007) possuem o desafio de superar a
mera crítica para ação possível, evidenciando neste sentido que há experiências
propositivas em curso, como é o caso da economia solidária, temática aqui apresentada.
A ecossocioeconomia retrata experiências do cotidiano, comunitárias, organizacionais,
territoriais que muitas vezes ficam relegadas a um mundo invisível ou descalço, nas
palavras de Manfred Max-Neef (2012). Os significados das relações
ecossocioeconômicas estão próximos com os que vivenciam a maioria das pessoas,
aproximando-se da realidade e se afastando da espetacularização da pobreza. Por sua
vez, não tem a pretensão de se transformar em outro modelo hegemônico, tal como a
economia de mercado, como que pudesse existir uma única maneira de viver. A
ecossocioeconomia caracteriza-se, sobretudo, por três modalidades de agir. O primeiro é
o agir extraorganizacional, aquele que releva na ação organizacional o impacto da
decisão sobre o entorno territorial. Segundo é o agir interorganizacional que espacializa
e temporaliza a organização dentro de um arranjo sociopolítico e socioeconômico. O
último é o agir extrarracional que valoriza a dimensão tácita do conhecimento dos atores
sociais envolvidos no dado território (SAMPAIO, 2010). A economia solidária surgiu
na Europa, como uma reação ao capitalismo industrial, no qual se configura a
exploração do capital sobre o trabalho. No Brasil, a economia solidária foi concebida no
final do século XX, como resposta dos trabalhadores às novas formas de exclusão,
exploração e precarização do mundo do trabalho, resultado das mudanças políticas e
estruturais que afetaram o cenário econômico. Os postulados da Economia Solidária
baseiam-se no humanismo, solidariedade e cooperação materializadas na propriedade
coletiva dos meios de produção e autogestão, preservando ainda o direito à liberdade
individual (SINGER, 2002). O cooperativismo compreendido pela economia solidária
1 Pós-Doutor em Ecossocioeconomia/UACH (Chile) e Cooperativismo
Corporativo/UMondragón (Espanha). Professor do Curso de Turismo e Programa de
Pós-Graduação (PPG) em Gestão Urbana/PUCPR e do PPG em Desenvolvimento
Regional/FURB. Pesquisador CNPq. Coordenador Adjunto da Área em Ciências
Ambientais/CAPES. e-mail: [email protected] 2 Mestre em Ciência, Gestão e Tecnologia da Informação/UFPR. Supervisora de
Projetos em Economia Solidária/Trilhas Incubadora Social Marista/PUCPR. e-mail:
[email protected] 3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana/PUCPR. Pesquisadora/
Trilhas Incubadora Social Marista/PUCPR. e-mail: [email protected]
não é a organização de muitos proprietários, como que um número maior de acionistas
pudesse por si só sugerir solidariedade. Um dos princípios norteadores da economia
solidária é que a racionalidade organizacional tem intencionalidade substantiva, ainda
que se recorra a lógica instrumental, baseada no cálculo de consequências, mas que se
privilegiem resultados coletivos sobre os individuais. A autogestão se realiza por meio
da adoção de práticas que valorizam e propiciam a democracia, autonomia do coletivo e
participação. Trata-se de um exercício cotidiano de partilha do bem querer, que
fortalece a cooperação entre os membros do empreendimento coletivo por via das
relações sociais fraternas. O modelo de gestão possui horizontalidade, confiança e
transparência nas relações sociais. As cooperadas e cooperados participam do processo
de concepção e execução da tomada de decisão. Elas e eles são sujeitos e ao mesmo
tempo finalidade por si só da atividade econômica. A economia solidária, como uma
manifestação da ecossocioeconomia, privilegia o território local, aonde as pessoas
nascem, crescem, vivem - se conhecem, dialogam, amam e trabalham -, e morrem. O
lugar possui histórias e estórias próprias. O trabalho possui significados, seja
reprodutivo, produtivo e redistributivo, e não é necessariamente sinônimo no seu
conjunto de atividades repetitivas e alienantes. Há que se recordar, como apontava Jose
Maria Arizmendiarreta (in AZURMENDI, 1992), protagonista do cooperativismo de
Mondragon, antes de se criar empreendimentos cooperativos há de se formar mulheres
cooperativas e homens cooperativos.
Palavras-chave: Ecossocioeconomia, Economia Solidária, Ação Interorganizacional,
Ação Extraorganizacional, Ação Extrarracional, Autogestão.