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V Encontro Internacional de Economia Solidária “O Discurso e a Prática da Economia Solidária”

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ECONOMIA SOLIDÁRIA COMO IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO HUMANO AO DESENVOLVIMENTO

Princípios da Economia Solidária Cinthya Andrade de Paiva Gonçalves (Especialização em Direitos Humanos da Faculdade de Direito

da USP, [email protected])

Resumo

Trata-se de um trabalho monográfico que analisa de forma comparativa a proposta de implementação do direito ao desenvolvimento previsto na Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento em 1986, feita pelo especialista independente Arjun Sengupta sobre o tema e a proposta de desenvolvimento solidário baseado nos princípios e recomendações expostos no documento base da I Conferência Nacional de Economia Solidária realizada em junho de 2006. O trabalho busca justificar a ação do movimento de Economia Solidária no campo dos direitos humanos. e mostra a identificação teórica dos princípios da Economia Solidária e do processo de desenvolvimento baseado no direito humano, principalmente no tocante à visão da pessoa como sujeito central da ação e sua participação no processo de desenvolvimento.

Palavras Chave:1. Economia Solidária, 2. Direito Humano ao Desenvolvimento

1. Introdução

Este é um trabalho monográfico que procurou comparar a proposta de

implementação do direito ao desenvolvimento previsto na Declaração sobre o Direito

ao Desenvolvimento em 1986, feita pelo especialista independente Arjun Sengupta

sobre o tema e a proposta de desenvolvimento solidário baseado nos princípios e

recomendações expostos no documento base da I Conferência Nacional de

Economia Solidária realizada em junho de 2006.

Este trabalho buscou justificar e embasar a ação do movimento de

Economia Solidária no campo dos direitos humanos. A idéia inicial era aproximar

essa ação com os direitos econômicos, sociais e culturais, mas a identificação dos

princípios da Economia Solidária e de seu plano de desenvolvimento com o

processo de direito ao desenvolvimento sugerido pela Declaração mostrou que era

esse o melhor caminho a ser seguido.

O interesse pela temática é proveniente da experiência pessoal da

pesquisadora na formação e apoio aos grupos de economia solidária no Espírito

Santo e o conhecimento adquirido através de uma pesquisa voluntária sobre as

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cooperativas sociais italianas. As conquistas verificadas tanto na experiência

brasileira com os grupos de catadores de material reciclável, quanto na experiência

italiana com a inclusão de portadores de necessidades especiais, ex-presos e

imigrantes inspiraram o trabalho para uma abordagem baseada nos direitos

humanos.

No embasamento teórico deste trabalho foram utilizadas além do referencial

de Sengupta para o direito ao desenvolvimento, a definição de desenvolvimento de

Amartya Sem e as concepções doutrinárias da Economia Solidária de Singer e

Mance, estudos de caso realizados por estudantes e pesquisadores das

universidades e ONGs de todo Brasil reunidos nos dois últimos encontros

internacionais de Economia Solidária realizados pelo Núcleo de Economia Solidária

da Universidade de São Paulo.

2. Declaração sobre o Direito Humano ao Desenvolvimento

A Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento em 1986 foi aprovada pela

Resolução 41/128 da Assembléia Geral da ONU em 04 de dezembro de 1986, com

146 votos a favor, um voto contra dos Estados Unidos e oito abstenções: Dinamarca,

Finlândia, República Federal da Alemanha, Islândia, Israel, Japão, Suécia e Reino

Unido.

Mesmo após a sua adoção dentro do Direito Internacional Costumeiro, a

Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento deixou um rastro de controvérsias

pois ainda persistiu a discussão política. Enquanto os países em desenvolvimento

do Sul argumentavam em favor de uma transferência de recursos como base para o

direito ao desenvolvimento, os países desenvolvidos, representando o Norte,

procuravam negar a existência de tal direito enquanto direito humano. Percebe-se

que a tarefa está longe de terminar com a sua aprovação, pois ainda permanece –

na agenda dos Estados e povos do mundo – a missão central de encontrar formas e

meios concretos de promover o direito ao desenvolvimento.

No campo jurídico essa discussão porém se encerra quando se conceitua os

direitos humanos como aqueles direitos que são legitimamente concedidos pela

sociedade a si mesma. Não advém de uma autoridade externa nem derivam de um

fenômeno sobrenatural ou divino, embora sejam essenciais para sua compreensão

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os valores filosóficos e religiosos. São direitos humanos porque são reconhecidos

como tal por uma comunidade de povos, oriundos de sua própria concepção de

dignidade humana, a qual esses direitos supõem-se ser inerentes. Uma vez que são

aceitos através de um processo de consenso, eles se tornam assegurados ao

menos para aqueles que são participantes do processo de aceitação.

Esse mesmo argumento pode ser utilizado quando estamos falando de

Estados e a Comunidade Internacional que possui um processo próprio de criação

de suas normas. O pronunciamento da Assembléia Geral das Nações Unidas pode

contribuir para esse processo ou adotando e abrindo para assinaturas uma

convenção internacional ou um tratado e, assim, criando legal obrigações

vinculantes para os Estados que as ratificam; ou expressando um consenso da

Comunidade Internacional sobre o significado de um direito humano particular

através de uma declaração ou outra resolução que, se reafirmada em subseqüentes

pronunciamentos internacionais ou mesmo pelo costumes dos Estados em praticá-

la, esta talvez gradualmente ganhe o status de direito internacional costumeiro, que

é o caso da Declaração.

A Declaração do Direito ao Desenvolvimento é um documento de consenso

que integra o Direito Internancional Costumeiro, e que aborda um direito que é

inserido tanto na esfera individual quanto na esfera coletiva e que possui vários

sujeitos envolvidos, tanto na esfera ativa quanto na esfera passiva.

Na esfera ativa estariam a pessoa humana em si e os povos e na esfera

passiva, os Estados agindo nacionalmente, criando condições favoráveis para a

efetivação do direito ao desenvolvimento ou em cooperação com outros Estados

internacionalmente, além da própria comunidade internacional. De forma mais

concisa, a Declaração teria em seu conteúdo:

− O direito ao desenvolvimento é um direito humano.

− A pessoa humana é o sujeito central do desenvolvimento e por ser um

direito que impõe a participação e contribuição da pessoa , esta estaria

obrigada por esse direito a promover em sua própria comunidade ações

para seu próprio desenvolvimento

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− O direito humano ao desenvolvimento é um direito a um processo

particular de desenvolvimento que leva à realização de cada direito

humano e de todos eles conjuntamente.

− O significado do exercício desses direitos em paralelo com a liberdade

implica em livre, efetiva e total participação de todos os indivíduos

envolvidos no processo decisório e na implementação do processo.

Portanto, o processo deve ser transparente e passível de avaliação, os

indivíduos devem ter oportunidades iguais de acesso aos recursos para o

desenvolvimento e receber distribuição justa dos benefícios do

desenvolvimento e renda.

− Os objetivos do desenvolvimento devem ser expressos em termos de

reivindicações ou demandas judiciais, os quais os portadores dos deveres

devem proteger e promover. A identificação da obrigação correspondente,

a nível nacional e internacional, é essencial para a interpretação conforme

os direitos humanos.

− Ainda, para que o direito ao desenvolvimento seja um direito válido,

concreto, os procedimentos para a estruturação das obrigações têm que

ser coordenado de forma que os direitos possam ser realizados através de

um pacto com a própria sociedade.

− Essa concepção de direito ao desenvolvimento faz com que todos os

seres humanos tenham a responsabilidade pelo desenvolvimento, o que

demanda, além de respeito pelos direitos humanos e liberdades

fundamentais, o dever para com a comunidade de promover e proteger

uma ordem política, social e econômica adequada para o

desenvolvimento.

− Finalmente, o direito confere inequívoca obrigação aos participantes:

indivíduos na comunidade, Estados em nível nacional e em nível

internacional. Estados no nível nacional têm a responsabilidade de ajudar

a realização do processo de desenvolvimento através de políticas de

desenvolvimento apropriadas. Outros Estados e agências internacionais

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têm a obrigação de cooperar com os Estados nacionais para facilitar a

realização do processo de desenvolvimento.

Além desses aspectos acima citados, deve ser ressaltada que para

assegurar o direito ao desenvolvimento, deve haver a liberdade de escolha através

da participação na decisão, com transparência e responsabilidade, com igualdade de

acesso e com participação justa nos benefícios, sendo esta liberdade tão importante

quanto a realização do direito em si através de políticas de desenvolvimento

inadequadas.

O problema de realizar o direito ao desenvolvimento, visto desta perspectiva,

não está necessariamente na projeção de um conjunto de políticas nacionais e

internacionais para implementar os elementos dos direitos econômicos, sociais e

culturais, mas também no exercício da abordagem dos direitos humanos de respeitar

a liberdade fundamental dos indivíduos de escolher as vidas que querem viver, o

exercício dos direitos que querem reclamar, com transparência e responsabilidade,

através da participação, com igual acesso e partilha justa dos benefícios. O processo

do livre exercício do direito ao desenvolvimento é tão importante quanto o aumento

na oferta dos recursos que facilitam o gozo desses direitos.

3 A implementação do Direito Humano ao Desenvolvimento e a Economia Solidária

A idéia de obrigações dos Estados na implementação do direito ao

desenvolvimento originou a proposta de um Pacto de Desenvolvimento que feito

pelo Arjun Sengupta, especialista independente para o Direito ao Desenvolvimento

de acordo com a Resolução da Comissão de Direitos Humanos 1998/72, aprovada

por aclamação em 22 de abril de 1998.

Neste Pacto os países em desenvolvimento teriam a obrigação de pôr em

prática o direito ao desenvolvimento, e a comunidade internacional, a obrigação de

colaborar na implementação do programa. Se o país em desenvolvimento cumprisse

a sua parte no acordo, a comunidade internacional teria de tomar as medidas

correspondentes, assegurando a transferência de recursos e a assistência técnica

previamente acordadas.

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A proposta do trabalho é demonstrar a aproximação teórica existente entre o

programa de implementação do direito ao desenvolvimento proposto por

SENGUPTA e o programa de desenvolvimento solidário que seguem os princípios

da Economia Solidária para a atuação e caracterização de seus empreendimentos.

Esse conjunto de princípios e reivindicações está consolidado no documento base

da I Conferência Nacional de Economia Solidária que ocorreu em junho de 2006.

O programa de desenvolvimento de Sengupta e o programa de

desenvolvimento solidário têm em comum alguns pontos fundamentais. Em primeiro

lugar, ambos colocam a pessoa humana como sujeito central do desenvolvimento e

a sua participação como imprescindíveis ao processo de desenvolvimento.

Para Sengupta, o programa deve seguir as seguintes características

detalhadas abaixo que serão analisadas comparativamente com a proposta de

desenvolvimento solidário. No tocante a propostas de desenvolvimento, é

interessante citar as conclusões alcançadas pelos pesquisadores da ITCP - USP em

um estudo sobre o desenvolvimento local solidário: conceitos e estratégias:

(...) os critérios e parâmetros de desenvolvimento podem surgir, no mínimo, de três formas distintas: das próprias pessoas que vivem dentro da região avaliada; por olhares e propostas externas; ou por uma mescla das duas perspectivas. (...) É equivocado não levar em consideração as necessidades e demandas apresentadas [pela comunidade], e é necessário saber se a proposta do desenvolvimento solidário que apresentamos corresponde ao projeto das pessoas daquela localidade.(SIGOLO e PATEO, 2006, p.08)

A compreensão da necessidade do diálogo entre os princípios orientadores

do desenvolvimento e os atores principais dessa ação é primordial não só para o

processo de desenvolvimento mas para a realização do direito ao desenvolvimento

em si. Como concluem os pesquisadores não é um diálogo fácil e na maioria das

vezes é influenciado por fatores externos à localidade envolvida. Esta dificuldade é

apresentada no trecho que segue:

A partir do diálogo com a localidade consegue-se listar as demandas mais explícitas que orientam as ações para o desenvolvimento daquela região, envolvendo-a na proposta de desenvolvimento local solidário, buscando estratégias e caminhos que correspondam aos princípios democráticos e igualitários que propõe a Economia Solidária. Todavia, essa proposta de diálogo no contexto das relações sociais capitalistas alienantes enfrenta inúmeras dificuldades de se realizar, uma vez que estas relações pautam-se na separação das pessoas e do mundo na qual elas vivem, ou seja, ignorando, por exemplo, as conseqüências dos seus modos de consumir e produzir, (...). Nesse sentido, o diálogo é prejudicado pela predominância de um olhar fragmentado da sociedade.(SIGOLO e PATEO, 2006, p.08)

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A proposta de Sengupta é uma proposta baseada em padrões de direitos

humanos e é muito similar a proposta dos princípios da Economia Solidária, mas é

importante que essa proposta seja adequada aos objetivos e visões da comunidade

em que o planejamento vai ser executado. Nesse diálogo, a compreensão dos

direitos humanos é muito importante, principalmente quando se trata da primeira

característica da proposta de Sengupta.

A primeira característica do plano proposto por Sengupta é “(a) A

implementação do direito ao desenvolvimento deve ser visto como um plano macro

de desenvolvimento onde alguns ou a maioria dos direitos são realizados enquanto

outros direitos não são violados.”(SENGUPTA, 2002, p. 883.)

Apesar de não se referir expressamente a direitos humanos e a não-violação

de direitos, a Conferência destaca que as suas atividades econômicas são

orientadas para uma prática ambiental sustentável e socialmente justa, que visa à

satisfação das necessidades humanas, a justiça social, a igualdade de gênero, raça,

etnia além da preocupação com as gerações, presente e futura. A manifestação

expressa da não-violação de direitos na promoção do direito ao desenvolvimento é

uma sugestão para a inclusão na próxima carta de princípios da Conferência

Nacional.

Em adição a não-violação de direitos, o programa de Sengupta sustenta a

necessidade de um crescimento sustentado da economia, com o aumento da

provisão de recursos para a realização dos direitos e com a melhoria da estrutura de

produção e distribuição que facilitariam a realização deste plano.

A viabilidade e a sustentabilidade econômica dos empreendimentos de

economia solidária, principalmente as pequenas comunidades isoladas, é uma

dificuldade que tem sido superada pelo princípio da Economia Solidária de atuação

em Rede, conforme exposto no parágrafo 17 do documento base. Para a

sobrevivência e progresso desses empreendimentos, procura-se a integração

desses com as redes de produção e comercialização, compras coletivas e

consumo, articulando-se em cadeias produtivas.

Estas cadeias produtivas podem cobrir largas extensões do país, como a

Cadeia do Algodão Orgânico, que inclui cotonicultores no Ceará, fiações e

tecelagens em São Paulo, cooperativas de costura nos Estados do Sul e

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organizações extrativistas que beneficiam sementes na Região Norte. Deste modo,

a Economia Solidária como um sistema econômico diferenciado requer a ampliação

dos programas e projetos, além de políticas públicas que contribuam para a criação

de outras cadeias produtivas e fortalecimento das existentes para dar

sustentabilidade aos empreendimentos de economia solidária.

Porém, não há para os empreendimentos de economia solidária um

mercado alternativo, regido pelos princípios e valores solidários nos locais ou

regiões que não desenvolveram as cadeias produtivas e as redes de consumo

solidário.

A interação entre os empreendimentos de economia solidária e o mercado

formal é um mal necessário, também é enfrentado com grande dificuldade. As

dificuldades apontadas pelos empreendimentos de economia solidária estão na

comercialização, no acesso ao crédito e acesso a acompanhamento, apoio ou

assistência técnica entre outras dificuldades.

O crescimento econômico do movimento ainda é modesto. Metade dos

empreendimentos de economia solidária consegue uma remuneração de até meio

salário mínimo. Por outro lado, 38% dos empreendimentos, em âmbito nacional,

afirmam ter obtido sobras, dado que contribui para o convencimento de que há um

crescimento econômico que pode ser estimulado e promovido caso haja a

implementação de condições de viabilidade.

A atuação da Economia Solidária em rede atinge ao proposto por Sengupta,

no que se refere a sustentabilidade e a necessidade de crescimento econômico.

Seguindo nas características básica da proposta, recomenda-se que: “(b) A

implementação de qualquer direito não pode ser um exercício isolado, e os projetos

de implementação de outros direitos devem ser desenhados levando em

consideração a interdependência dos objetivos do programa.”(SENGUPTA, 2002, p.

883.)

Esta característica coaduna com a preocupação existente da economia

solidária em não isolar o ser humano do seu ambiente e de sua prática. Todas as

atividades propostas pela Economia Solidária baseiam-se na interdependência do

sujeito com o respeito ao meio-ambiente, com o respeito aos diferentes sujeitos. A

promoção humana da proposta da Economia Solidária não é solitária, mas coletiva e

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em prol da comunidade e junto com ela. Essa preocupação é expressa no

documento, também, quando diz: “13. A Economia Solidária compartilha valores,

princípios e práticas de um conjunto de lutas históricas dos trabalhadores e de

setores excluídos da sociedade que tenham como foco principal a valorização do ser

humano.”(I Conferência Nacional de Economia Solidária, 2006, p. 04)

A próxima característica do plano de desenvolvimento de Sengupta, que

considero principal para este trabalho, é a seguinte:

(c) A execução da implementação do plano de desenvolvimento e a realização dos direitos individuais devem ser orientadas de acordo com os padrões de direitos humanos, que são transparência, responsabilidade e não-discriminação através da participação com eqüidade e justiça. Na prática, isto significa que a estratégia de desenvolvimento deve ser formulada e implementada pela sociedade civil com os beneficiários participando nas tomadas de decisão e de implementação, assim como dividindo igualmente os benefícios. Em suma, isto implica em um planejamento que empodera/emancipa (empowers) os beneficiários.(SENGUPTA, 2002, p. 883)

Analisando comparativamente, deve ser ressaltado que a Economia

Solidária é um movimento da sociedade civil e sua mobilização nos últimos anos

possibilitou os avanços alcançados na interação com o Estado, inclusive com

implantação de uma Secretaria Nacional ligada ao Ministério do Trabalho e Emprego

e a criação do Conselho Nacional de Economia Solidária com participação tripartite

entre governo, os empreendimentos da economia solidária e representantes de

outros segmentos da sociedade civil com a finalidade de promover a interlocução e

buscar os consensos em torno de políticas e ações de fortalecimento da economia

solidária.

Em relação aos padrões de direitos humanos, a transparência aparece como

um princípio orientador. No documento base é estabelecido o seguinte:

4. Dentro do modo de organizar a produção é fundamental o acesso irrestrito a todos os tipos de informação, não só no aspecto financeiro, de custos e valor dos produtos e/ou serviços, como em todo o conjunto de informações relativas ao processo de trabalho (matéria prima, equipamentos, nível de desempenho de cada um, negociação com consumidores etc). Na Economia Solidária as informações do empreendimento devem ser democratizadas a todos, através de espaços comuns de discussão. Mas disponibilizar a informação não é suficiente. É importante o incentivo ao envolvimento de todos em todas as questões, criando estratégias para a superação de resistências, respeitando as escolhas e a individualidade de cada um.(I Conferência Nacional de Economia Solidária, 2006, p. 02)

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Além da transparência, a proposta prevê a não-discriminação. Nesse

sentido, o documento base da Conferência cita, no primeiro parágrafo, a

necessidade de atuação com respeito às diferenças de raça, gênero e etnia além de

incorporar ao movimento as lutas de outros movimentos como dos quilombolas,

reforma agrária, pela igualdade de gênero, contra as formas de preconceito e de

discriminação entre outras lutas presentes no parágrafo 13 do documento.

A participação nas lutas de outros movimentos também quer demonstrar que

o movimento não está isolado e não procura ser uma opção alienante. Além disso,

na prática dos empreendimentos de economia solidária, a atuação em lutas

emancipatórias, que desafiam a ordem vigente, como greves, manifestações de

protesto, reuniões de comunidades eclesiais de base, ocupações de terra visando a

reforma agrária são práticas democráticas que estimulam o comportamento social do

ator envolvido.

No tocante a responsabilidade, primeiramente, ela vem associada ao

princípio da participação. A participação, tal como entendida pelo processo de

desenvolvimento de Sengupta, é aquela que todos os beneficiários e agentes

envolvidos na implementação do direito ao desenvolvimento estão autorizados a

participar dos resultados do processo, contribuir para eles e deles usufruir. Esta

participação é entendida pela Economia Solidária como a autogestão dos

empreendimentos e característica essencial ao empreendimento de economia

solidária. Extrai-se do documento base o seguinte trecho com relação a participação:

5. As iniciativas de Economia Solidária têm em comum a igualdade de direitos de responsabilidades e oportunidades de todos os participantes dos empreendimentos econômicos solidários, o que implica em autogestão, ou seja, a participação democrática com exercício de poder igual para todos, nas decisões, apontando para a superação da contradição entre capital e trabalho. ( I Conferência Nacional de Economia Solidária, 2006, p. 02)

A participação através da autogestão é um dos pilares da Economia

Solidária. O empreendimento de economia solidária deve ser administrado

democraticamente. Quando o empreendimento é pequeno, todas as decisões

devem ser tomados em assembléias, que podem ocorrer em curtos intervalos,

quando há necessidade. Quando ela é grande, assembléias-gerais são muito mais

raras porque é muito mais difícil organizar uma discussão significativa entre um

grande número de pessoas.

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Além disso, a autogestão exige o esforço do trabalhador para sua

implementação pois além de cumprir as tarefas a seu cargo deve se preocupar com

os problemas gerais da empresa. A recusa a esse esforço adicional que a

participação democrática e o desinteresse do sócio são os maiores riscos que o

empreendimento de economia solidária pode enfrentar, uma vez que sem essa

participação ele deixa de existir pela perda de sua característica essencial.

A autogestão tem como mérito principal não a eficiência econômica mas o

desenvolvimento humano que proporciona aos praticantes. Participar das

discussões e decisões do coletivo, ao qual se está associado, educa e conscientiza,

tornando a pessoa mais realizada, autoconfiante e segura. Nesse ponto acredito que

haja a maior congruência no processo de desenvolvimento proposto por Sengupta e

o processo de desenvolvimento solidário.

A dificuldade de atingir a participação necessária ao processo de

desenvolvimento aparece na prática dos empreendimentos de economia solidária.

As pessoas participantes estão acostumadas apenas a obedecer e apresentam

dificuldades na tentativa de romper com a barreira entre o trabalho intelectual e o

manual. Esta dificuldade foi constatada por pesquisadores no estudo de caso feito

com cooperativas populares na cidade de Salvador, Bahia:

Um aspecto a ser destacado, dentre as dificuldades observadas, é que poucos associados internalizam a condição de proprietários dos empreendimentos e não raras vezes os cooperados deixam de participar cotidianamente das atividades de gestão e do processo decisório. Em muitos casos, sequer procuram estar atualizados sobre o que se passa no grupo, conservando ainda uma cultura de transferir a responsabilidade para os diretores ou líderes. (...) Em todas as iniciativas encontrou-se um pequeno grupo que toma a frente do empreendimento, que ‘empurra’ os demais. Estas observações depõem negativamente para a caracterização destes grupos como integrantes da Economia Solidária visto que a autogestão é um dos princípios fundamentais a ser observado. (SOUZA e VASCONCELOS, 2005, p. 11).

A responsabilidade ainda está presente na reivindicação dos atores

envolvidos no processo de desenvolvimento. Ao reivindicar os empreendimentos de

economia solidária, cobram a responsabilidade dos detentores das obrigações. O

parágrafo 22 do documento diz que:

22. A Economia Solidária, enquanto estratégia de desenvolvimento exige responsabilidade e cumprimento, por parte dos Estados Nacionais da garantia e defesa dos direitos universais dos cidadãos (...). Ela preconiza um Estado democraticamente ativo, empoderado, a partir da própria sociedade e colocado ao serviço desta (sic); transparente, fidedigno, capaz

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de orquestrar a diversidade que a constitui e de zelar pela justiça social e pela realização dos direitos e das responsabilidades cidadãs de cada um. (I Conferência Nacional de Economia Solidária, 2006, p. 07)

Mais uma vez, percebe-se a identificação das propostas dos dois planos

quando coloca o papel do Estado como detentor do dever de implementar e

contribuir para o desenvolvimento solidário, principalmente quando requer a não

obstrução pelo Estado do processo de desenvolvimento e exige a implementação

dos direitos humanos universais.

Outro aspecto da característica é a “participação com eqüidade e justiça.” O

plano de Sengupta é estruturado para reduzir as disparidades na distribuição de

renda, colocando a pessoa no centro e como beneficiária deste quadro. O plano de

desenvolvimento da Conferência Nacional está baseado na solidariedade da

economia que só pode ser realizada se ela for organizada de forma igualitária pelos

que se associam para trabalhar na atividade econômica. O fundamental é que as

partes sejam iguais na sua associação e em decorrência disso tenham o mesmo

direito a voto em todas as decisões. Como as decisões são tomadas

democraticamente, não há relação de hierarquia autoritária, o que equaliza a

situação entre os associados.

Da mesma forma que a igualdade prevalece na divisão dos frutos do

empreendimento de economia solidária. Os associados não recebem salário, mas

retiram uma quantia do empreendimento conforme a receita obtida. Esta retirada

pode ser igual para todos os sócios ou diferenciada, de acordo com a decisão que

foi tomada coletivamente ou por estabelecimento de critérios como horas

trabalhadas ou capacidade técnica.

Como proposta de igualdade extraída dos princípios da economia solidária

estão o objetivo de promover o trabalho e renda a quem precisa assim como o

ideal de difundir um modo democrático e igualitário de organizar atividades

econômicas. Estas características podem ser verificadas no parágrafo 15:

15. Mas este não é o único desenvolvimento possível. Existem outras concepções de desenvolvimento que consideram a centralidade da pessoa humana, a sustentabilidade ambiental, a justiça social, a cidadania e a valorização da diversidade cultural, articuladas às atividades econômicas. A Economia Solidária considera o desenvolvimento econômico e tecnológico, não como fins, mas como meios de promover o desenvolvimento humano e social em todas as suas dimensões. Hoje, no Brasil, há comunidades em situação de vulnerabilidade que se mobilizam para pôr em marcha um outro desenvolvimento promovido por empreendimentos (...) Podemos chamar

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este outro desenvolvimento de comunitário ou solidário porque dele participam todos e seus resultados econômicos, políticos e culturais são compartilhados com respeito à diversidade de raça, etnia, gênero, geração e opção religiosa. É nesse sentido que a Economia Solidária é uma estratégia para um novo modelo de desenvolvimento sustentável, includente e solidário. (I Conferência Nacional de Economia Solidária, 2006, p. 05)

Através do objetivo de inclusão e de promoção de trabalho e renda,

demonstra-se a preocupação com a justiça social que orienta o movimento na busca

de outro tipo de desenvolvimento e de outro tipo de sociedade.

A última característica do plano de desenvolvimento atribui a titularidade do

direito ao desenvolvimento aos povos e aos indivíduos nos países em

desenvolvimento como especificado na Declaração de 1986 enquanto os detentores

das obrigações seriam os Estados e a comunidade internacional, bem como

organizações nacionais e internacionais da sociedade civil. Para Sengupta é

necessário neste planejamento as específicas atribuições e políticas a serem

reivindicadas de cada devedor. Assim:

(e) (...) Seria, portanto, necessário especificar as políticas a serem perseguidas para a implementação dessas obrigações para que os Estados e a comunidade internacional composta por agências, países donatários e outras corporações multinacionais sejam incumbidos da realização completa deste direito.(SENGUPTA, 2002, p. 884)

Vale ressaltar que apesar da diversidade e pluralidade de ações, elas têm

em comum a viabilização do processo de desenvolvimento solidário. É muito cedo

ainda para afirmar se são propostas eficazes para alcançar os objetivos do

desenvolvimento proposto, porém deve se destacar que a forma com que se busca o

processo, através da reivindicação da viabilidade, é o verdadeiro exercício do direito

humano ao desenvolvimento.

4 Progressos e obstáculos na promoção do direito humano ao desenvolvimento.

Após a demonstração por características e princípios, conclui-se que há

vários pontos de identificação entre a proposta para a promoção do direito humano

ao desenvolvimento, tal qual como idealizada por Sengupta, e a proposta de

desenvolvimento solidária tal como explicitada no documento base da I Conferência

Nacional de Economia Solidária.

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Essa identificação procura demonstrar e justificar a ação do movimento de

Economia Solidária no campo dos direitos humanos. O reconhecimento que a forma

de planejamento e implementação do desenvolvimento, aqui chamado de solidário, é

um forma de promoção do direito humano ao desenvolvimento, previsto na

Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento abre grandes possibilidades para o

movimento, inclusive de caráter reivindicatório também no âmbito internacional.

Como o direito ao desenvolvimento obriga tanto os Estados como a

comunidade internacional a criarem condições para a implementação do direito ao

desenvolvimento, o movimento de Economia Solidária poderia iniciar movimentos de

reconhecimento internacional dessa prática e exigir condições de viabilidade e

sustentabilidade até perante os organismos internacionais. Outro ator que poderia

ser alvo de responsabilização seriam as empresas transnacionais que de acordo

com a Declaração devem cumprir sua parte para criar condições de

desenvolvimento.

Em relação a criação de condições pelo Estado brasileiro para

implementação da Economia Solidária percebe-se avanços. Em junho de 2003, foi

criada a Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES) ligada ao Ministério

do Trabalho e Emprego (MTE), reconhecendo o processo de transformação social

em curso pelos movimentos de economia solidária. Muitos municípios e alguns

governos estaduais já adotavam políticas públicas de fomento e apoio à economia

solidária, sendo a criação da Secretaria um processo de consolidação desse

trabalho de mobilização.

O surgimento da SENAES representou uma ampliação significativa do

âmbito de responsabilidades do MTE, que passa a incluir o cooperativismo e

associativismo em seu campo de ação que era antes limitado ao trabalho

assalariado. A SENAES tem como missão difundir e fomentar a economia solidária

em todo o Brasil, dar apoio político e material às iniciativas do Fórum Brasileiro de

Economia Solidária (FBES). Esse fórum inclui as principais agências de fomento da

economia solidária, a rede de gestores municipais e estaduais de economia

solidária, a Associação Brasileira de Gestores de Entidades de Micro-Crédito

(Abcred) e as principais associações e redes de empreendimentos solidários de todo

o país.

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V Encontro Internacional de Economia Solidária “O Discurso e a Prática da Economia Solidária”

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Outro grande avanço é a criação do Conselho Nacional de Economia

Solidária que integra a SENAES como um órgão colegiado, com representantes do

governo, da sociedade civil e dos empreendimentos da economia solidária, sendo a

sua composição definida pela Conferência Nacional, que tem por finalidade realizar

a interlocução e buscar os consensos em torno de políticas e ações de

fortalecimento da economia solidária. É reconhecido como um importante passo

para inserir politicamente a Economia Solidária como uma política pública no âmbito

federal, sendo considerada uma instância governamental com representação mista

de importância estratégica para a participação da sociedade civil na criação de

políticas públicas.

A criação da Rede Nacional de Gestores Públicos em Economia Solidária foi

um importante passo para a viabilização desta política em alguns Municípios e

Estados, através da capacitação e articulação dos gestores públicos e a

conseqüente aprovação de legislações específicas e de interesse e promoção da

Economia Solidária.

Apesar dos avanços do Estado, existem muitos obstáculos para a

implementação do projeto de desenvolvimento solidário e a promoção do direito ao

desenvolvimento que são extraídos tanto do rol de lutas dos movimentos de

economia solidária quanto das áreas de atuação a serem implementadas pelo

Estado. A luta pela adoção de uma legislação adequada para o cooperativismo e o

respeito ao direito dos trabalhadores é uma reivindicação tanto do movimento

nacional quando da Secretaria Nacional de Economia Solidária.

Outro obstáculo é ausência de um financiamento adequado para os

empreendimentos de economia solidária. Esses empreendimentos têm de ser

financiados com juros subsidiados pelo Estado e com longos períodos de carência.

O custo da assistência ao crédito tem de ser coberto por recursos públicos a fundo

perdido, ao menos nas etapas iniciais do desenvolvimento.

Existe apenas ainda uma pequena demonstração do Estado brasileiro para

que se possibilite um sistema financeiro para as camadas de baixa renda. Já

existem algumas iniciativas de Bancos de Desenvolvimento como o próprio Banco

Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social que criou o Programa de

Invenstimentos Coletivos Produtivos (Proinco) mas não atendem a grande massa.

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V Encontro Internacional de Economia Solidária “O Discurso e a Prática da Economia Solidária”

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As alternativas existentes aos empreendimentos de economia solidária são

os Bancos populares que os estimulam economicamente através de micro-crédito e

a criação da moeda social. O reconhecimento desses Bancos e uma legislação de

sustento a esse tipo de financiamento são urgentes e necessários.

Os obstáculos para esses empreendimentos são muitos principalmente por

tentarem realizar suas atividades no Estado brasileiro, ainda considerado um dos

países mais desiguais no tocante a distribuição de renda do mundo. A precariedade

enfrentada por esses empreendimentos vão desde a demora para a geração de

excedentes para seus membros, que buscam renda para o sustento familiar e que

provoca, na maioria das vezes, a rotatividade dos trabalhadores, às dificuldades

técnicas-administrativas de gerenciamento, produção e comercialização de uma

atividade econômica por mais simples que ela seja. Somado a isso, o desafio de

administrar coletivamente e por meio da autogestão.

Como a avaliação do desenvolvimento não pode ser medida apenas pelos

seus fatores econômicos, o crescimento das capacidades e da autonomia dos

trabalhadores e trabalhadoras envolvidos nos projetos de economia solidária é

recompensador e faz com que as iniciativas permaneçam, mesmo que dependentes

economicamente de auxílio externo. Os avanços realizados pelo segmento dos

catadores de material reciclável em todo país é significativo e demonstra as

possibilidades do movimento de economia solidária tanto para geração de renda e

trabalho como para reconquista da cidadania.

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