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Variação e mudança

Quinta, 27 de novembro de 2008, 20h07

Sírio PossentiDe Campinas (SP)

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A maioria absoluta dos brasileiros - talvez não só os brasileiros - alfabetizadosou letrados tem uma idéia completamente equivocada do que seja uma língua.Para eles, língua é a que a escola ensina, ou o que está nos manuais do tipo"não erre mais". O resto é erro. Todos consideram que as variantes são erros.

Ocorre que o que a escola ensina também é mais ou menos variado. Edepende muito também do desempenho lingüístico dos professores. Comoeles são membros da sociedade, são afetados pelas mudanças que a línguasofre com o correr do tempo, de forma que seu "português" é, de algumaforma, o português de seu tempo. O que não é necessariamente ruim.

Isto quer dizer que o português que os professores falam e mesmo o queescrevem não é necessariamente o português dos livros adotados nasescolas. O que vale para professores de português vale também para os dasoutras disciplinas, claro. E vale também para os jornalistas e para aspersonalidades que eles entrevistam, tenham elas a formação que tiverem (emgeral, são especialistas em alguma coisa, sempre especialistas). É só ouvir osdebates ou os programas de entrevistas para verificar isso.

Dou dois exemplos banais. Duvido que haja 10% de professores ou falantesletrados que profiram o dito futuro (aplicarei minha poupança em ações daempresa X). Todos dizem "vou aplicar". Outro exemplo? Quase ninguém diz"nós". Diz-se "a gente". Como pouco se diz "tu", exceto em algumas regiões, a

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conjugação verbal do futuro é

Eu vou aplicar

Você vai aplicar

Ele/ela vai aplicar

A gente vai aplicar

Vocês vão aplicar

Eles/elas vão aplicar.

Ou não é? Quem não fala assim que atire a primeira pedra. Não vou dizer (!!)que todos falam sempre assim porque sei que uma língua sempre apresentavariação. Alguns entrevistados, ou jornalistas, dirão (!!), talvez, de vez emquando, no meio da conversa, "falaremos disso na próxima entrevista", claro,sendo mais formais. Em compensação, alguns também dirão "vamo falá dissona próxima veiz", sendo bem mais informais. E ninguém nota que falou erradodurante a entrevista. Por que? Porque ninguém fala errado mesmo! Isso não éerro. Esse é o português falado culto do Brasil hoje. É um fato. Só isso.

Numa certa ocasião, fui entrevistado por uma emissora de TV (eu no estúdio eum folclorista em outra cidade). Argumentava que a linguagem popular não tinhanada de errado, era só diferente, e era enfrentado pela apresentadora que"defendia nossa língua". Para dobrá-la, só me restou um recurso: ficar atentoao que ela dizia e citar os "erros" que ela ia cometendo, segundo os próprioscritérios dela. Ficou meio sem jeito, e eu tive que insistir que ela falavacorretamente... o português real (e que aquele que ela defendia não existemais, pelo menos na fala).

O que muita gente não entende - ou não quer entender, porque significariaperder uma boa teta! - é que a variação tem tudo a ver com a mudança. Todosacham normal que aquila tenha derivado para águia, que asinus tenhaderivado para asno (tem muita coisa mudada aí, mas o básico é que a palavralatina proparoxítona se torna paroxítona), mas acha ridículas formas comofosfro (para fósforo), corgo (para córrego), xicra e chacra (para xícara echácara), embora a regra antiga que explica a mudança e a atual que explica avariação sejam a rigor a mesma (os falantes seguem regras, não erram!!!),sem contar que dizem, numa boa, sem se dar conta do que fazem, xicrinha echacrinha. Quá!

Variação tem tudo a ver com mudança. Mas, se entendêssemos isso, muita

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gente perderia uma grana preta!!

***

Pode até ser que o preconceito racial diminua com o tempo ou que venha a semanifestar de forma diferente, menos agressiva, mais "cordial" (como sugere ocaderno especial da Folha de 23/11/2008). Mas o preconceito lingüístico estámais firme do que nunca (mais ou menos sutil): Fernando de Barros e Silvaescreveu na Folha (24/11/2008) que o "pobrema" é mais embaixo. Por queuma forma lingüística popular representa um problema mais embaixo? É láembaixo que está o povo? E o colunista diz isso logo em uma época em queficou claro que o problema é bem mais em cima!!

A FSP, aliás, é useira e vezeira em referir-se a autoridades menos letradascomo "otoridade" e a políticos nordestinos como aqueles que exercem o"pudê". Não se dá conta do que há nisso de preconceito? E de burrice?

Sírio Possenti é professor associado do Departamento de Lingüística da

Unicamp e autor de Por que (não) ensinar gramática na escola, Os humores dalíngua e de Os limites do discurso.

Fale com Sírio Possenti: [email protected]

Opiniões expressas aqui são de exclusiva responsabilidade do autor e não necessariamente estão de acordo com osparâmetros editoriais de Terra Magazine.

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Aceitam tudo

Quinta, 19 de maio de 2011, 21h22

Trecho do livro "Por uma Vida Melhor" apresenta a pergunta "posso falar'os livro'?"18 de maio de 2011Reprodução

Sírio PossentiDe Campinas (SP)

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De vez em quando, alguém diz que lingüistas "aceitam" tudo (isto é, que achamcerta qualquer construção). Um comentário semelhante foi postado na semanapassada. Achei que seria uma boa oportunidade para tentar esclarecer de novoo que fazem os linguistas.

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Mas a razão para tentar ser claro não tem mais a ver apenas com aquelecomentário. Surgiu uma celeuma causada por notas, comentários, entrevistasetc. a propósito de um livro de português que o MEC aprovou e que ensinariaque é certo dizer Os livro. Perguntado no espaço dos comentários, quandofiquei sabendo da questão, disse que não acreditava na matéria do IG, primeirafonte do debate. Depois tive acesso à indigitada página, no mesmo IG, econstatei que todos os que a leram a leram errado. Mas aposto que muitos acomentaram sem ler.

Vou tratar do tal "aceitam tudo", que vale também para o caso do livro.

Primeiro: duvido que alguém encontre esta afirmação em qualquer texto delinguística. É uma avaliação simplificada, na verdade, um simulacro, da posiçãodos linguistas em relação a um dos tópicos de seus estudos - a questão davariação ou da diversidade interna de qualquer língua. Vale a pena insistir: dequalquer língua.

Segundo: "aceitar" é um termo completamente sem sentido quando se trata depesquisa. Imaginem o ridículo que seria perguntar a um químico se ele aceitaque o oxigênio queime, a um físico se aceita a gravitação ou a fissão, a umornitólogo se ele aceita que um tucano tenha bico tão desproporcional, a umbotânico se ele aceita o cheiro da jaca, ou mesmo a um linguista se ele aceitaque o inglês não tenha gênero nem subjuntivo e que o latim não tivesse artigodefinido.

Não só não se pergunta se eles "aceitam", como também não se pergunta seisso tudo está certo. Como se sabe, houve época em que dizer que a Terragira ao redor do sol dava fogueira. Semmelveis foi escorraçado pelos médicosque mandavam em Viena porque disse que todos deveriam lavar as mãosantes de certos procedimentos (por exemplo, quem viesse de uma autópsia efosse verificar o grau de dilatação de uma parturiente). Não faltou quemdissesse "quem é ele para mandar a gente lavar as mãos?"

Ou seja: não se trata de aceitar ou de não aceitar nem de achar ou de não acharcorreto que as pessoas digam os livro. Acabo de sair de uma fila desupermercado e ouvi duas lata, dez real, três quilo a dar com pau. Eu deveriamandar esses consumidores calar a boca? Ora! Estávamos num caixa desupermercado, todos de bermuda e chinelo! Não era um congresso científico,nem um julgamento do Supremo!

Um linguista simplesmente "anota" os dados e tenta encontrar uma regra, isto é,uma regularidade, uma lei (não uma ordem, um mandato).

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O caso é manjado: nesta variedade do português, só há marca de plural noelemento que precede o nome - artigo ou numeral (os livro, duas lata, dez real,três quilo). Se houver maias de dois elementos, a complexidade pode sermaior (meus dez livro, os meus livro verde etc.). O nome permaneceinvariável. O linguista vê isso, constata isso. Não só na fila do supermercado,mas também em documentos da Torre do Tombo anteriores a Camões.Portanto, mesmo na língua escrita dos sábios de antanho.

O linguista também constata the books no inglês, isto é, que não há marca deplural no artigo, só no nome, como se o inglês fosse uma espécie de avessodo português informal ou popular. O linguista aceita isso? Ora, ele não temalternativa! É um dado, é um fato, como a combustão, a gravitação, o bico dotucano ou as marés. O linguista diz que a escola deve ensinar formas como oslivro? Esse é outro departamento, ao qual volto logo.

Faço uma digressão para dar um exemplo de regra, porque sei que é umconceito problemático. Se dizemos "as cargas", a primeira sílaba destasequência é "as". O "s" final é surdo (as cordas vocais não vibram para produziro "s"). Se dizemos ¿as gatas", a primeira sílaba é a "mesma", mas nóspronunciamos "az" - com as cordas vocais vibrando para produzir o "z". Por quedizemos um "z" neste caso? Porque a primeira consoante de "gatas" é sonora,e, por isso, a consoante que a antecede também se sonoriza. Não acredita? Váa um laboratório e faça um teste. Ou, o que é mais barato, ponha os dedos nasua garganta, diga "as gatas" e perceberá a vibração. Tem mais: se dizemos"as asas", não só dizemos um "z" no final de "as", como também reordenamosas sílabas: dizemos as.ga.tas e as.ca.sas, mas dizemos a.sa.sas ("as" sedividiu, porque o "a" da palavra seguinte puxou o "s/z" para si). Dividimos "asas"em "a.sas", mas dividimos "as asas" em a.sa.sas.

Volto ao tema do linguista que aceitaria tudo! Para quem só teve aula de certo /errado e acha que isso é tudo, especialmente se não tiver nenhuma formaçãohistórica que lhe permitiria saber que o certo de agora pode ter sido o erradode antes, pode ser difícil entender que o trabalho do linguista é completamentediferente do trabalho do professor de português.

Não "aceitar" construções como as acima mencionadas ou mesmo algumasmais "chocantes" é, para um linguista, o que seria para um botânico não"aceitar" uma gramínea. O que não significa que o botânico paste.

Proponho o seguinte experimento mental: suponha que um descendente seunasça no ano 2500. Suponha que o português culto de então inclua formascomo "A casa que eu moro nela mais os dois armário vale 300 cabral" (achoque não será o caso, mas é só um experimento). Seu descendente nunca

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saberá que fala uma língua errada. Saberá, talvez (se estudar mais do quevocê), que um ancestral dele falava formas arcaicas do português, como 300cabrais.

Outro tema: o linguista diz que a escola deve ensinar a dizer Os livro? Não.Nenhum linguista propõe isso em lugar nenhum (desafio os que têm opiniãocontrária a fornecer uma referência). Aliás, isso não foi dito no tal livro, emboratodos os comentaristas digam que leram isso.

O linguista não propõe isso por duas razões: a) as pessoas já sabem falar oslivro, não precisam ser ensinadas (observe-se que ninguém falao livros, o quenão é banal); b) ele acha - e nisso tem razão - que é mais fácil que alguémaprenda os livros se lhe dizem que há duas formas de falar do que se lhedizem que ele é burro e não sabe nem falar, que fala tudo errado. Há muitosrelatos de experiências bem sucedidas porque adotaram uma postura diferenteem relação à fala dos alunos.

Enfim, cada campo tem seus Bolsonaros. Merecidos ou não.

PS 1 - todos os comentaristas (colunistas de jornais, de blogs e de TVs) queeu ouvi leram errado uma página (sim, era só UMA página!) do livro que deuorigem à celeuma na semana passada. Minha pergunta é: se eles defendem alíngua culta como meio de comunicação, como explicam que leram tão mal umtexto escrito em língua culta? É no teste PISA que o Brasil, sempre temfracassado, não é? Pois é, este foi um teste de leitura. Nosso jornalismo seriareprovado.

PS 2 - Alexandre Garcia começou um comentário irado sobre o livro emquestão assim, no Bom Dia, Brasil de terça-feira: "quando eu TAVA naescola...". Uma carta de leitor que criticava a forma "os livro" dizia "ensinam osalunos DE que se pode falar errado". Uma professora entrevistada que criticoua doutrina do livro disse "a língua é ONDE nos une" e Monforte perguntou"Onde FICA as leis de concordância?". Ou seja: eles abonaram a tese do livroque estavam criticando. Só que, provavelmente, acham que falam certinho! Nãose dão conta do que acontece com a língua DELES mesmos!!

Sírio Possenti é professor associado do Departamento de Linguística da

Unicamp e autor de Por que (não) ensinar gramática na escola, Os humores dalíngua, Os limites do discurso, Questões para analistas de discurso e Língua naMídia.

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T E R Ç A - F E I R A , 1 7 D E M A I O D E 2 0 1 1

"Por uma vida melhor": por que abolir os conceitos

de “certo” e “errado”.

Por Daniela Jakubaszko*

A polêmica que se criou em torno do livro Por uma vida melhor, da

coleção Viver, aprender, adotado pelo MEC, é inútil e representa um

retrocesso para a Educação.

Como lingüista e professora de português defendo ardorosamente a

utilização do livro. Vou explicar, mas antes faço alguns esclarecimentos:

1. A escola é o lugar por excelência da norma culta, é lá que devemos

aprender a utilizá-la, isso ninguém discute, é fato.

2. O livro NÃO está propondo que o aluno escreva “nós pega” – como

estão divulgando por aí - ele está apenas constatando a existência da

expressão no registro “popular”. Do ponto de vista cotidiano, a expressão

é válida porque dá conta de comunicar o que se propõe. E ela é mais que

comum e, sejamos sinceros, é a linguagem que o leitor dessa obra usa e

entende. Será que é intenção da escola se comunicar com ele de

verdade? Se for, ela tem que usar um livro que consiga fazer isso. Uma

gramática cheia de exemplos eruditos e termos que o aluno não consegue

nem memorizar, com certeza, não vai conseguir.

3. O que o livro está propondo é trocar as noções de “certo” e “errado”

por “adequado” e “inadequado”. E isso é mais que certo. Vou explicar a

seguir.

4. A questão é: como ensinar a norma culta num país de tradição oral, e

no qual existe um abismo entre a língua oral e a língua escrita? Como

fazer isso com jovens adultos – que já apresentam um histórico de

“fracasso” em seu processo formal de educação e, muito provavelmente,

na aquisição dos termos da gramática e seus significados. Se esse jovem

não assimilou até o momento em que procurou o EJA (Educação de Jovens

e Adultos) a “concordância de número”, como o professor vai fazê-lo usar

a crase? Isso para mencionar apenas um dos tópicos mais fáceis da

gramática e que a maioria das pessoas, inclusive as “mais cultas e

graduadas”, algumas até mesmo com doutorado, ainda não sabem

explicar quando ela é necessária.

Por que abolir os conceitos de “certo” e “errado”?

Vou mencionar apenas 3 razões, para não cansar demais o leitor, mas

existem muitas outras, quem se interessar pode perguntar que eu passo a

bibliografia.

1. Primeiro, por uma questão de honestidade com o aluno. A língua é viva,

Mulheres deFibraO blog Somos Mulheres de Fibraparticipa do movimento deblogueiros progressistas queprocuram contribuir, de formaresponsável, para ademocratização e a pluralidade dainformação e da comunicação nasociedade brasileira. Nosso blogse apresenta como um espaçoaberto a debates sobre temasdiversos como política nacional einternacional, questões de gênero,atividades culturais emanifestações de diferentescategorias sociais.

S O B O C É U D EB R A S Í L I A

Foto de Rinaldo Arruda

Cadê a tão falada liberdade deexpressão?

V I S I T A N T E S D E S T E

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18/05/2011 Mulheres de Fibra: "Por uma vida melh…

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assim como a cultura, e não pode ser dirigida, por mais que tentem. Por

isso, não existe nem “certo” nem “errado”: as regras são convenções e

são alteradas de tempos em tempos por um acordo entre países falantes

de uma mesma língua. O que era “errado” há alguns anos, hoje pode ser

“certo”. Agora é correto escrever lingüística sem trema - o que discordo -

e ideia sem acento. Assim, o que existe é o “adequado à norma culta” e o

“inadequado à norma culta”. E essa norma é uma convenção, não uma lei

natural e imutável. Além disso, por mais que a escola seja representante

da norma culta, isto não significa que ela deva ficar “surda” diante dos

demais níveis de fala. A língua portuguesa – ou qualquer língua – não

pode ser reduzida à sua variante padrão. Tão pouco as aulas de português

devem ficar. Afinal, se numa narrativa aparece um personagem, por

exemplo, pescador e analfabeto, como o aluno deverá escrever uma fala

(verossímil) para ele? Escrever de forma inverossímil é certo? Aliás, o que

seria dos poetas e escritores se não fosse o registro popular da língua?

Acho que Guimarães Rosa nem existiria.

Com certeza a crítica ao livro parte de setores conservadores e

normativos. Eu, como lingüista e professora, não apoio a retirada dos

livros porque não acho justo falar para o aluno que o jeito que ele fala é

errado, até porque não é, só não está de acordo com a norma culta, o que

é muito diferente. Depois que você explica isso para o aluno é que ele

entende o que está fazendo naquela aula. Essa troca faz toda a diferença.

2. Segundo, porque quando você diz para um aluno sucessivas vezes que

o que ele fez está “errado” você passa por cima da subjetividade dele e

acaba com toda a naturalidade dessa pessoa. Daí, ela não fala “certo” e

também não sabe quando fala “errado”. Assim, quando na presença de

pessoas que ela julga mais letradas que ela própria, não tenha dúvida, vai

ficar muda. A formação da identidade do sujeito passa obrigatoriamente

pela aquisição da linguagem, viver apontando os erros é desconsiderar a

experiência de vida daquela pessoa, é diminuí-la porque ela não teve

estudo. E não se engane: ela pode se tornar até uma profissional mais

desejada pelo mercado por usar melhor a norma culta, mas não

necessariamente vai se tornar uma pessoa melhor.

3. Em terceiro, porque é urgente trocar o ponto de vista normativo pelo

científico. A lingüística reconhece que a língua tem seu curso e muda

conforme o uso e a cultura: já foi muito errado falar (e escrever) "você",

por exemplo. A lingüística também reconhece que a língua é instrumento

de poder, por isso, nada mais importante do que desmistificar a gramática

normativa. Isto não significa deixá-la de lado, mas precisamos exercitar

uma visão mais crítica. Esse aluno sente na pele a discriminação social

devido ao seu nível de fala, nada mais natural que ele rejeite a norma

culta e considere pedante a pessoa que fala segundo a norma padrão. É

compreensível, ainda, que ele não entenda grande parte do que se diz em

sala de aula. O que não é compreensível é o professor, ou melhor, “a

Escola”, não entender a razão de isso acontecer.

Em nenhum momento foi dito que a professora e autora do livro em

questão não iria corrigir ou ensinar a norma culta aos alunos, só ficou

validado o registro oral. Os alunos precisam entrar em contato com o

distanciamento científico. E os lingüistas não saem por aí corrigindo

ninguém, eles observam, e você, leitor, bem sabe como funciona a ciência

- e um aluno de pelo menos 15 anos já precisa começar a ouvir falar do

pensamento científico. Além disso, é muito bom que eles percebam se o

nível de fala que usam tem prestígio ou não, e o porquê.

Por que ignorar o estudo da língua oral em sala de aula? Eu fazia um

trabalho nesse sentido com os meus alunos e só depois de transcrever

Luis Nassif OnlineA invasão dos carroschineses

Tijolaço - O Blog do

Brizola NetoBrizola, assim, tirariaeste sapato

Richard Jakubaszko"Por umavidamelhor":por queabolir osconceitosde “certo”

e “errado”.

Cloaca NewsNÓSROUBEMOASPALAVRADE OUTROBLOG

Viomundo - O que

você não vê na mídiaMarcos Bagno:Discussão sobre livrodidático só revelaignorância da grandeimprensa

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L E I A T A M B É M

18/05/2011 Mulheres de Fibra: "Por uma vida melh…

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entrevistas orais eles conseguiam ouvir a si mesmos e tomar consciência

de seu registro lingüístico: “nossa como eu falo gíria! Eu nem percebia!”.

Aí sim eles entendem que, com o amigo, com os pais, eles podem dizer

"os peixe", mas que na prova é preciso escrever "os peixes", no seminário

é preciso dizer “os peixes”, mas ele precisa estar à vontade para fazer

isso. A realidade em sala de aula é que os alunos não entendem onde

estão errando. Quando você explica o conceito de norma culta eles

entendem. Cria-se um parâmetro e não uma tábua de salvação

inatingível. É aceitando o registro desse interlocutor e apresentando mais

uma possibilidade de uso da língua para ele que vai surgir o esforço para

aprender. Se você insistir no “certo” e no “errado” ele vai ficar com raiva

e rejeitar o novo. Quer apostar?

Ter uma boa comunicação não é sinônimo de usar bem as regras da

gramática. Para ensinar os conceitos de "gramática natural" e "gramática

normativa" temos de dar esses exemplos. Os conservadores se arrepiam

porque eles partem do princípio que você nunca pode escrever ou falar

nada errado na frente do aluno. Para mim isso é hipocrisia: o aluno tem

direito de saber que o registro que ele usa em casa é diferente daquele

que ele usa na rua, no estádio de futebol, na escola, no trabalho, em

frente ao juiz. E tem o direito de saber que o “correto” se define por

aquele que tem mais prestígio social. Essas são só as primeiras noções de

sociolingüística, para quem quiser abrir a cabeça e saber. Ou será que a

língua portuguesa se aprende descolada da realidade? É isso que se está

tentando mudar. É tão difícil assim perceber isso?

Quando me perguntam qual é a função do professor de português na

escola, eu respondo: oferecer ao aluno um grau cada vez mais elevado de

consciência lingüística; oferecer instrumentos para que ele possa transitar

conscientemente entre os diversos níveis de linguagem. Só depois de

realizada essa operação o aluno vai conseguir escrever conforme as

regras da norma culta. E falar a norma padrão com naturalidade. Ou,

ainda, escolher falar conforme o ambiente em que cresceu e formou a sua

subjetividade (Lula que o diga, comunica-se muito bem, sem camuflar as

suas origens). É bom ficar claro que a função do professor não se reduz a

"corrigir" o aluno. Isso, o google, até o word, pode fazer. Ajudar o aluno a

ter consciência de seu nível de fala é outra história...

O problema não é uma pessoa dizer “nós pega”, o problema é ela não

entender que esse uso não é adequado em determinados contextos, o

problema é não saber dizer “nós pegamos”. Ou sequer compreender

porque não pode falar “nós pega”... É, leitor, tem muito aluno que não

entende porque precisa aprender uma lista de nomes difíceis que nada

significam para ele e que ele não enxerga a relação direta entre uso da

norma culta e como esta vai ajudá-lo a melhorar de vida.

Conheço quilos, ou toneladas, de gente formada, pós-graduada, que fala

“seje” e não tem consciência de que está falando assim, e ainda critica

quem fala “menas”. Ouvir a si mesmo é uma das coisas mais difíceis de

fazer. E como ajudar o aluno a fazer isso?

O primeiro passo é, sem dúvida, abolir o “certo” e o “errado”. Enquanto o

professor for detentor da caneta vermelha, o aluno vai tremer diante dele

e nada do que ele disser vai entrar na cabeça dessa pessoa preocupada

em acertar uma coisa que não entende, tem vergonha de dizer que não

entende, então não pergunta, faz que entendeu, erra na prova e o

resultado é ela se achar cada vez mais burra e desistir de estudar. Ufa...

Puxa, ninguém estuda mais psicologia da educação? Isso é básico!

E então, leitor, o que é mais honesto com esse aluno que chega no EJA

30 mil pessoas emfrente ao Congresso

Blog da CidadaniaPor gentileza, vão sesodomizar

Metal Cadente

Joaquim Fernandes

NetoO DEVENIR E A LEI DARENÚNCIA

GonzumFúria, fúria, contra amorte da luz

A Moeda

Conversa Afiada

A R Q U I V O D O B L O G

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"Por uma vida melhor":por que abolir osconceitos...

O MEC, os Linguistas e aLíngua Portuguesa.

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Q U E M S O M O S

dalva teodorescu

mulheres de fibra

18/05/2011 Mulheres de Fibra: "Por uma vida melh…

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Page 12: Dossie norma culta 1.1

com a autoestima lá em baixo? Começar falando a língua dele e depois

trazê-lo para a norma padrão ou começar de cara a humilhá-lo com uma

língua que ele não entende?

É muito sério quando pessoas leigas começam a emitir, levianamente,

juízos de valor sobre assuntos que não dominam. Alguns jornalistas,

blogueiros e “opineiros” de plantão, por exemplo, sem conhecimento dos

conceitos e técnicas de ensino em lingüística, sem a menor noção do que

está acontecendo nas salas de aula desse país, começam a querer dizer

para os professores o que eles têm de fazer, como eles têm de ensinar!

Isto sim, é nivelar por baixo! É detonar, mais ainda, a autoridade do

professor, já tão desprezada no país. Ah, e ainda fazem isso sem

perceber que freqüentemente cometem erros crassos; eu estou cansada

de lê-los em blogs, jornais e revistas, e ouvi-los na televisão. Não que

precisem, ou usamos com eles os mesmos critérios que defendem?

E então, qual é mesmo o tipo de educação que o Brasil precisa?

* Daniela Jakubaszko é bacharel em lingüística e português pela FFLCH-

USP, mestre e doutora pela ECA-USP. Desistiu de ser professora depois de

dar aula por 15 anos e virou redatora porque não agüentava mais ouvir:

"você trabalha além de dar aulas?"

** Ah, eu tenho uma dúvida: até quando eu posso usar otrema? Até 2012?

Postado por mulheres de fibra às 15:53

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18/05/2011 Mulheres de Fibra: "Por uma vida melh…

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mídia, economia e cultura – por Glauco Cortezmídia, economia e cultura – por Glauco Cortez

Outra proposta para o ensino degramática

A língua é um fenômeno curioso. Nela, existe algum mistério que está além do simples certo ou errado, alguma força maior que a

faz viver em movimento constante, de forma múltipla e particular. Ao falar sobre questões linguísticas deveria se ter mais

cuidado, um mínimo de conhecimento e, principalmente, uma postura não daquele que julga, mas daquele que antes busca

conhecer.

A distribuição do livro “Por uma vida melhor”, da professora Heloísa Ramos, com supostos “erros gramaticais” pelo Programa

Nacional do Livro Didático, do Ministério da Educação, tem feito muito barulho e dentro de todo esse barulho muita coisa

equivocada foi dita. O livro busca dar maior importância à linguagem oral, contemplando-a juntamente com a linguagem escrita

e sua norma culta, neste sentido, leva em consideração que frases como “nós pega o peixe” poderiam ser consideradas corretas

em certos contextos.

Os defensores da gramática e da norma erudita condenaram o livro e a sua linha de proposta

pedagógica dizendo que isso é um desrespeito à língua portuguesa, que agora se ensina errado

nas próprias escolas, que se está jogando a toalha e a educação não vale mais nada. Enfim, eles

temem pela língua.

A questão é será que há mesmo algo a temer pela língua? Será que ela precisa mesmo de

tantos jornalistas, gramáticos e escritores atacando as formas da linguagem oral porque esta

pode destruir a norma culta e aí sim seremos um país de pessoas analfabetas que não sabem

escrever e falar corretamente? Há um medo absurdo em toda essa crítica que chega ao

desespero típico dos que matam uma nova forma, para não mexer no esquema das antigas.

Em primeiro lugar, deve ser dito que muitos dos jornalistas que estão criticando o livro

didático e sua proposta ao falarem e redigirem seus textos cometem muitos dos “erros” que

eles tanto condenam, sem dizer que, a maioria não tem conhecimento mínimo de linguística

para sair falando e revestem seu discurso de tanto preconceito que não há espaço para

qualquer tipo de reflexão.

Em segundo lugar, deve se lembrar de que os gramáticos têm muita dificuldade em lidar com

as formas novas da língua, afinal, elas exigem mudanças nos sagrados manuais, assim, eles

abraçam a causa de uma língua que supostamente deve ser defendida a todo custo, inclusive da própria língua. Pois faz parte do

movimento da língua introduzir formas novas como “os livro.

Além disso, ao dizer “os livro”, por exemplo, não há um problema comunicacional, é possível entender o que se diz, a construção

não está de todo equivocada, o problema que existe aí é de outra ordem e obviamente deve ser estudado, no entanto, é

importante sim que as gramáticas e os livros didáticos contemplem essas novas formas explicando por que uma língua permite

que surjam construções como essa e dizendo, obviamente, qual é a norma culta, a forma consagradamente correta de dizer.

Sem dúvida, a gramática que for dinâmica como é a própria língua, será uma gramática muito mais completa e eficiente, afinal,

quando simplesmente se aponta uma forma como errada, perde-se muito mais do que quando se procura entender quais

mecanismos mentais e sociais propiciaram que aquela forma existisse. Por isso, pode-se dizer que esse livro didático ao invés de

pisotear a norma culta está colocando-a no mais alto patamar, pois não se aprende uma língua sem abrir-se para a sua totalidade.

Se fôssemos levar em consideração todas essas críticas que têm sido feitas, um escritor como Guimarães Rosa poderia ser

apedrejado em praça pública por inventar palavras e frases que desmerecem a sagrada norma culta. No entanto, muitos dos

jornalistas, escritores e membros da Academia que estão agora condenando o livro didático da professora Heloísa Ramos, rendem

ao escritor vastas homenagens. E o incrível é que com os escritos de Guimarães a língua não parece ter se perdido, muito pelo

contrário.

Abaixo, alguns trechos de notícias e comentários que saíram na imprensa sobre o assunto:

MEC lava as mãos no caso dos livros com erros

18/05/2011 LIVRO APROVADO PELO MEC É ALVO …

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Mande aos amigos: 3

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MÍDIA E A BANDA LARGA PÚBLICA

PEDIDO DE IMPEACHMENT DE GILMAR MENDES, MINISTRO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, JÁ ESTÁ NO SENADO →

Do Globo

Por Cássio Bruno

Escritores e educadores criticaram ontem a decisão de distribuir o livro, tomada pelos responsáveis pelo Programa Nacional do Livro Didático. Para Mírian

Paura, professora do Programa de Pós-graduação em Educação da Uerj, as obras distribuídas pelo MEC deveriam conter a norma culta:

- Não tem que se fazer livros com erros. O professor pode falar na sala de aula que temos outra linguagem, a popular, não erudita, como se fosse um dialeto.

Os livros servem para os alunos aprenderem o conhecimento erudito.

Na obra “Por uma vida melhor”, da coleção “Viver, aprender”, a autora afirma num trecho: “Posso falar ‘os livro?’ Claro que pode, mas dependendo da

situação, a pessoa pode ser vít ima de preconceito linguíst ico.” Em outro, cita como válidas as frases: “nós pega o peixe” e “os menino pega o peixe”.

Autor de dezenas de livros infantis e sobre Machado de Assis, o escritor Luiz Antônio Aguiar também é contra a novidade:

- Está valendo tudo. Mais uma vez, no lugar de ensinar, vão rebaixar tudo à ignorância. Estão jogando a toalha. Isso demonstra falta de competência para

ensinar. (Texto completo)

Livro adotado pelo MEC defende ‘erro’

Da redação O Estado de S.Paulo

“Nós pega o peixe” ou “os menino pega o peixe”. Para os autores do livro de língua portuguesa Por uma Vida Melhor, da Coleção Viver, Aprender, adotado

pelo Ministério da Educação (MEC), o uso da língua popular – ainda que com seus erros gramaticais – é válido.

A obra também lembra que, caso deixem a norma culta, os alunos podem sofrer “preconceito linguíst ico”.

Diz um trecho do livro, publicado pela Editora Global: “Você pode estar se perguntando: “Mas eu posso falar “os livro”?” Claro que pode. Mas fique atento,

porque, dependendo da situação, você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e

escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas”. (Texto completo)

Os livro mais interessante estão emprestado

Coluna do Augusto Nunes

A menção a leituras informa que a frase reproduzida no título do post não foi pinçada de alguma discurseira de Lula. Mas os autores do livro didático “Por uma

vida melhor”, chancelado pelo MEC, decerto se inspiraram na oratória indigente do Exterminador do Plural para a escolha de exemplos que ajudem a ensinar

aos alunos do curso fundamental que o s no fim das palavras é tão dispensável quanto um apêndice supurado. O certo é falar errado, sustenta o papelório

inverossímil.

A lição que convida ao extermínio da sinuosa consoante é um dos muitos momentos cafajestes dessa abjeta louvação da “norma popular da língua

portuguesa”. Não é preciso aplicar a norma culta a concordâncias, aprendem os estudantes, porque “o fato de haver a palavra os (plural) já indica que se

trata de mais de um livro”. Assim, continuam os exemplos, merece nota 10 quem achar que “nós pega o peixe”. E só podem espantar-se com um medonho

“Os menino pega o peixe” os elitistas incorrigíveis.

“Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever tomando as regras estabelecidas para norma culta como padrão de correção de todas

as formas linguísticas”, lamenta um trecho da obra. Por isso, o estudante que fala errado com bastante fluência “corre o risco de ser vít ima de preconceito

linguístico”. A isso foram reduzidos pelo Brasil de Lula e Dilma os professores que efetivamente educam: não passam de “preconceituosos linguísticos”. (Texto

completo)

Leia mais em Educação Política:

PROJETO DE LEI NO RS REVELA OBSESSÃO POR UMA LÍNGUA PURA

ESCOLA PÚBLICA RESERVA UM TEMPO PARA O APRENDIZADO DA CULTURA POPULAR BRASILEIRA POR MEIO

DA TRADIÇÃO ORAL

AS PALAVRAS E SEUS SIGNIFICADOS DIZEM ADEUS AO PAPEL E MIGRAM PARA AS TELAS DIGITAIS

VEJA AS PALAVRAS E EXPRESSÕES MAIS USADAS COM HÍFEN, DE ACORDO COM A NOVA ORTOGRAFIA

AGÊNCIA EP, NOTÍCIA Brasil, CULTURA, EDUCAÇÃO, escrita, gramática, Jornalismo, língua, norma popular, normal culta, NOTÍCIA, oralidade

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Aguardamos você com café e torradas aqui e com maiores intimidades à direita. ==>>

Sergio Leo

Arte, cultura, jornalismo, para quem tem mais a fazer com o próprio tempo

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Lobato entra de sola na nova polêmica com o MECMay 18th, 2011by sleo.

Está divertido ver a patrulha do gramaticalmente correto (à qual pertenço, aliás, embora nãoentre na histeria atual) contra um livro distribuído pelo MEC para educação de jovens e adultos. Dizem até que o livro quer impor a fala das ruas eavacalhar a norma culta, quando ele faz o contrário, tentando dar o conhecimento da norma culta a quem conhece pouco mais que o linguajar popular,como se vê no capítulo polêmico, AQUI.

(Se você estava preso em uma mina no Chile, só agora foi salvo e não está entendendo do que falamos aqui no Sítio, o tema desse post é o que bemesclarece esse blogue AQUI).

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Divertida a polêmnica porque pouco tempo atrás metiam o pau no MEC acusando o governo de querer censurar Monteiro Lobato porque umconselho pediu cuidado com os trechos racistas do escritor, ao distribuir seus livros nas escolas. Agora querem censurar o livro “Por uma vida melhor”do MEC, que tem uns trechos que me fizeram lembrar Lobato, embora menos agressivo em suas propostas do que os escritos do velho escritorpaulista.

Esclareço que não pertenço à turma que acha a defesa da norma culta um “preconceito linguístico”; já falei disso aqui no Sítio. Autores como MarcosBagno (popularíssimos hoje em dia nas escolas de letras) apontam questões relevantes, como a necessidade de reconhecer o valor da fala popular, masmisturam isso num caldeirão ideológico para acusar a norma culta de ser apenas um instrumento de dominação, seleção e controle de classe. Para mimé evidente que não é isso, mas seria assunto para outro post. (Nada contra a ideologia também, , apenas contra certos usos dela).

Os trechos a seguir estão no livro”Prefácios e Entrevistas”, último tomo das obras completas do autor, editora Brasiliense, de 1949. Falei dele aqui noSítio, antes .Vamos ao Lobato, pois, tão defendido pelos articulistas que hoje acham coisa de maluco da Al Qaeda dizer que não é errado dizer“pescar os peixe”:

“Essa língua descende da que os portugueses introduziram e que alijou a língua geral então existente nesses territórios: o tupu-guarani. Ficou a línguaportuguesa sendo a língua geral do Brasil e até hoje o é. E por que o é? Porque aprendemos o português de duas maneiras, de ouvido e de leitura. Seo aprendessemos só de ouvido, como acontece com o jeca, a nossa “língua geral” estaria hoje tão distanciada da língua portuguesa que um portuguêsnão a entenderia. O que conserva as línguas e impede que caminhem com velocidade excessiva pela tentadora estrada da evolução é a escrita.

Mas como o jeca nunca soube ler nem escrever, a evolução da língua portuguesa em sua boca se fez a galope…… Por que nossos filólogos não extraem a gramática dessa língua do jeca? Que interessante seria! Quanta “mutação” vocabular, quanta variação desintaxe, da prosodia, de tudo! Troca do “b” pelo “v”: cumbérsa, bérso, cuvérta… o “lh” substituído pelo “i”: “abêia”, “páia”, “máia” (malha)… O “ou”reduzido a “ô”: “fumô”, “botô”, “juntô”… Quantos aspectos!Devíamos fazer a gramática da interessantíssima “língua do jeca” como os franceses fizeram a gramática da “língua de oc”; e devíamos enviar essagramática às escolas, lado a lado com a gramática portuguesa… Que vantagem haveria nisso? Oh, grande _ podermos falar com os 15 milhões dejecas que há no território brasileiro.

A evolução da língua é curiosíssima e inteligentíssima, como todas as evoluções não atrapalhadas pelos breques dos artificialismos. A forma escrita das

línguas é um artificalismo tremendamente embaraçador da evolução natural das línguas. Tão emperrado que, no inglês, alíngua falada está pra cá e a escrita está pra lá. Mr Churchill escreve “enough” e diz “inâf”. O jeca teve a felicidade de não saber ler nem escrever, denão se preocupar com a Academia de Letras, de usar dos jornais unicamente o papel _ e graças a isso “evoluiu” a língua portuguesa só de ouvido esempre de acordo com as injunções da “lei do menor esforço” e da “lei da melhor compreensão”. E como suprimiu besteiras inúteis! Os verbos, porexemplo. Nós, por causa da tirania da escrita, ainda estamos com tantas variações quanto o latim. Di8zemos: Eu tenho, Tu tens, Ele tem, Nós temos,Vós tendes, Eles têm. Há um grave defeito aqui. Se opronome já indica a pessoa do verbo, por que indicá-la de novo com a variação do verbo?Redundância, bobagem – perda de esforço. O jeca, porque vive na maior das penpurias, diz: Eu tenho, vancê tem, ele tem, nós tem, Vânces tem, elestem. O inglês diz: I have, You have, He has, We have, You have, they have – e tanto o jeca como o inglês exprimem perfeitamente a “pessoa que tem”,

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sem estarem latinescamente variabndo o pobre verbo.…

O jeca forma os seus plurais com a mesma inteligência e economia do inglês; diz, por exemplo, “as casa”, “os home”, “asmuíé”, em vez de dizer redudantemente como o português, “as casas”, “os homens”, ” as mulheres”. O inglês diz “the men”, “the women”, “the houses”– a mesma coisa que o jeca, só que invertido. Se pondo apenas o artigo no plural a frase fica perfeitamente clara, para que botar no plural também osubstantivo? pensa com muita razão o jeca e o inglês faz o mesmo raciocínio quando pluraliza o substantivo e não mexe no artigo.”

Mais adiante, no livro, que tem rpefácios a granel, muitos para livros obscuros dos amigos do escritor, como é o caso do Nho Bento que motivou essapeça de linguística amadora de Lobato:

“… o mesmo direito que tiveram os portugueses de corromper o latim e transformá-lo em línguaportuguesa temos nós, letrados, de

corromper a língua portuguesa e transformá-la na língua brasileira; e tem o iletrado jeca de “evoluí-la” em outro rumo. mais

cientificamenter, podemos dizer que a língua portuguesa bno Brasil está sofrendo duas variações: uma lenta, de gente que sabe ler e

escrever e outra rápida, de gente da roça segregada do urbanismo , do livro, do jornal e do rádio – o abençoadop jeca que tem a sorte de

não ler os jornais do governo nem da oposição e de não ouvir a “Hora do Brasil”.

Quem condena como coisa errada o modo de falar ou a língua do jeca revela-se curto de miolo. Os modos de avriação duma língua são

fenômenos naturais, en não há erro nos fenômenos naturais. Erro é coisa humana. Temos de estudar essas variações em vez de tolamente

condená-las, pois condená-las equivale, por exemplo, a condenar os anéis de Saturno em nome dos planetas que não tem anéis.”

Tem mais. Sei não, acho que, contra toda censura, deveriam distribuir esse texto do Lobato nas escolas.

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Mentiras do Rio

18/05/2011 Lobato entra de sola na nova polêmica…

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Esclarecimentos sobre o livro “Por uma vida melhor”, para Educação de 

Jovens e Adultos  

Uma  frase  retirada  de  seu  contexto  na  obra  Por  uma  vida melhor,  cuja  responsabilidade 

pedagógica  é  da  Ação  Educativa,  vem  gerando  intensa  repercussão  na  mídia.  Diante  da 

enorme quantidade de  informações  incorretas ou  imprecisas que  foram divulgadas,  a Ação 

Educativa  se  coloca  à  disposição  dos  órgãos  de  imprensa  para  promover  um  debate mais 

qualificado, e esclarece: 

1. “Escrever é diferente de falar”. Como o próprio nome do capítulo indica, os autores se 

propõem, em um trecho específico do livro, a apresentar ao estudante da modalidade 

de Educação de Jovens e Adultos (EJA) as diferenças entre a norma culta e as variantes 

que ele aprendeu até chegar à escola, ou seja, variantes populares do idioma. 

2. Os  autores  não  se  furtam,  com  isso,  a  ensinar  a  norma  culta.  Pelo  contrário,  a 

linguagem  formal  é  ensinada  em  todo  o  livro,  inclusive  no  trecho  em  questão. No 

capítulo mencionado, os autores apresentam trechos inadequados à norma culta para 

que  o  estudante  os  reescreva  e  os  adeque  ao  padrão  formal,  de  posse  das  regras 

aprendidas. Por  isso, é  leviana a afirmação de que o  livro “despreza” a norma culta. 

Ainda mais incorreta é a afirmação de que o livro “contém erros gramaticais”. 

3. Para  que  possa  aprender  a  utilizar  a  norma  culta  nas  mais  diversas  situações,  o 

estudante precisa  ter  consciência da maneira  como  fala. A partir de então, poderá 

escolher  a melhor  forma  de  se  expressar.  Saberá,  assim,  que  no  diálogo  com  uma 

autoridade ou em um  concurso público, por exemplo, deve usar a variante  culta da 

língua. Mas não quer dizer que deva abandoná‐la ao  falar com os amigos, ou outras 

situações informais.  

4. É importante frisar que o livro é destinado à EJA – Educação de Jovens e Adultos. Ao 

falar  sobre  o  tema,  muitos  veículos  omitiram  este  “detalhe”  e  a  mídia  televisiva 

chegou a ilustrar VTs com salas de crianças.  Nessa modalidade, é necessário levar em 

consideração a bagagem cultural do adulto, construída por suas vivências e biografias 

educativas. 

5. O livro “Por uma vida melhor” faz parte do Programa Nacional do Livro Didático. Por 

meio  dele,  o  MEC  promove  a  avaliação  de  dezenas  de  obras  apresentadas  por 

editoras, submete‐as à avaliação de especialistas e depois oferece as aprovadas para 

que secretarias de educação e professores façam suas escolhas. O livro produzido pela 

Ação  Educativa  foi  submetido  a  todas  essas  regras  e  escolhido,  pois  se  adequa  aos 

parâmetros curriculares do Ministério e aos mais avançados parâmetros da educação 

linguística.  

6.  A Ação Educativa tem larga experiência no tema, e a coleção Viver, Aprender é um dos 

destaques  da  área.  Seus  livros  já  foram  utilizados  como  apoio  à  escolarização  de 

milhões de jovens e adultos, antes de ser adotado pelo MEC, em vários estados.  

Conheça o livro! Leia o capítulo na íntegra, em pdf, aqui. 

Dell
Typewriter
http://www.acaoeducativa.org.br/downloads/ESCLARECIMENTOS_AE.pdf 2011-04-18
Page 20: Dossie norma culta 1.1

 

 

Leia também artigo de Vera Masagão, coordenadora geral da Ação Educativa, sobre o caso 

(página 3). 

Contexto: outros trechos, do mesmo capítulo, não mencionados na cobertura da imprensa  “A língua escrita não é o simples registro da fala. Falar é diferente de escrever”  “Como a linguagem possibilita acesso a muitas situações sociais, a escola deve se preocupar em apresentar a norma culta aos estudantes”  “A norma culta existe tanto na linguagem escrita como na linguagem oral, ou seja, quando escrevemos um bilhete a um amigo, podemos ser informais, porém, quando escrevemos um requerimento, por exemplo, devemos ser formais, utilizando a norma culta”  “Algo semelhante ocorre quando falamos: conversar com uma autoridade exige uma fala formal, enquanto é natural conversarmos com as pessoas de nossa família de maneira espontânea, informal. Assim, os aspectos que vamos estudar sobre a norma culta podem ser postos em prática tanto oralmente como por escrito”  

 

Fontes: Para obter os contatos dos especialistas listados abaixo, fale com nossa Assessoria de Imprensa: (11) 3151‐2333 ramal 160 (Ana) ou 170 (Fernanda) 

 

Vera Masagão – Doutora em educação, Coordenadora Geral da Ação Educativa 

 

Heloísa Cerri Ramos – uma das autoras do livro 

Algumas fontes conceituadas no campo linguístico podem ser consultadas sobre o tema: 

Marcos Bagno  

Doutor em Linguística pela USP e professor da UnB 

 

Magda Becker Soares 

Professora emérita da UFMG, especialista em alfabetização e letramento 

 

Sírio Possenti  

Professor associado no Departamento de Linguística do Instituto de Estudos da 

Linguagem (IEL‐Unicamp) 

 

Page 21: Dossie norma culta 1.1

 

 

Marco Antônio de Oliveira  

Doutor em Linguística pela Universidade da Pennsylvania, professor da PUC‐MG 

 

Egon Rangel de Oliveira 

Professor do Departamento de Linguística da Faculdade de Comunicação e Filosofia da 

PUC‐SP 

 

Rodolfo Ilari 

Professor de semântica da Unicamp 

 

Milton do Nascimento  

Doutor em Linguística pela Universidade de Paris VIII, St. Denis e professor de 

Linguística da PUC‐MG 

 

Maria Cecília Mollica  

Professora titular de Linguística da UFRJ 

 

Ataliba de Castilho 

Professor titular da Universidade de São Paulo (USP) 

 

Maria José Nóbrega 

Consultora especialista em ensino de língua portuguesa 

 

ABRALIN – Associação Brasileira de Linguística 

 

 

ARTIGO 

Livro para adultos não ensina erros 

 

Uma frase retirada da obra Por uma vida melhor, cuja responsabilidade pedagógica é da Ação 

Educativa, vem gerando enorme repercussão na mídia. A obra é destinada à Educação de 

Jovens e Adultos, modalidade que, pela primeira vez neste ano, teve a oportunidade de 

receber livros do Programa Nacional do Livro Didático. Por meio dele, o Ministério da 

Educação promove a avaliação de dezenas de obras apresentadas por editoras, submete‐as à 

avaliação de especialistas e depois oferece as aprovadas para que secretarias de educação e 

professores façam suas escolhas.  

O trecho que gerou tantas polêmicas faz parte do capítulo “Escrever é diferente de falar”. No 

tópico denominado “concordância entre palavras”, os autores discutem a existência de 

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variedades do português falado que admitem que substantivo e adjetivo não sejam 

flexionados para concordar com um artigo no plural. Na mesma página, os autores completam 

a explanação: “na norma culta, o verbo concorda, ao mesmo tempo, em número (singular – 

plural) e em pessoa (1ª –2ª – 3ª) com o ser envolvido na ação que ele indica”. Afirmam 

também: “a norma culta existe tanto na linguagem escrita como na oral, ou seja, quando 

escrevemos um bilhete a um amigo, podemos ser informais, porém, quando escrevemos um 

requerimento, por exemplo, devemos ser formais, utilizando a norma culta”. 

Pode‐se constatar, portanto, que os autores não estão se furtando a ensinar a norma culta, 

apenas indicam que existem outras variedades diferentes dessa.  A abordagem é adequada, 

pois diversos especialistas em ensino de língua, assim como as orientações oficiais para a área, 

afirmam que tomar consciência da variante linguística que se usa e entender como a 

sociedade valoriza desigualmente as diferentes variantes pode ajudar na apropriação da 

norma culta. Uma escola democrática deve ensinar as regras gramaticais a todos os alunos 

sem menosprezar a cultura em que estão inseridos e sem destituir a língua que falam de sua 

gramática, ainda que esta não esteja codificada por escrito nem seja socialmente prestigiada. 

Defendemos a abordagem da obra por considerar que cabe à escola ensinar regras, mas sua 

função mais nobre é disseminar conhecimentos científicos e senso crítico, para que as pessoas 

possam saber por que e quando usá‐las.     

O debate público é fundamental para promover a qualidade e equidade na educação. É 

preciso, entretanto, tomar cuidado com a divulgação de matérias com intuitos políticos pouco 

educativos e afirmações desrespeitosas em relação aos educadores. A Ação Educativa está 

disposta a promover um debate qualificado que possa efetivamente resultar em 

democratização da educação e da cultura.  Vale lembrar que polêmicas como essa ocupam a 

imprensa desde que o Modernismo brasileiro em 1922 incorporou a linguagem popular à 

literatura. Felizmente, desde então, o país mudou bastante. Muitas pessoas tem consciência 

de que não se deve discriminar ninguém pela forma como fala ou pelo lugar de onde veio. Tais 

mudanças são possíveis, sem dúvida, porque cada vez mais brasileiros podem ir à escola tanto 

para aprender regras como parar desenvolver o senso crítico. 

Vera Masagão Ribeiro é doutora em Educação e coordenadora geral da Ação Educativa 

 

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quarta, 18 de maio de 2011

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Nota Pública: Livro para adultos não ensina erros

Posicionamento institucional da Ação Educativa sobre a polêmica envolvendo livro distribuído peloMEC.

Uma frase retirada da obra Por uma vida melhor, cuja responsabilidade pedagógica é da AçãoEducativa, vem gerando enorme repercussão na mídia. A obra é destinada à Educação de Jovense Adultos, modalidade que, pela primeira vez neste ano, teve a oportunidade de receber livros doPrograma Nacional do Livro Didático. Por meio dele, o Ministério da Educação promove a avaliaçãode dezenas de obras apresentadas por editoras, submete-as à avaliação de especialistas edepois oferece as aprovadas para que secretarias de educação e professores façam suasescolhas.

O trecho que gerou tantas polêmicas faz parte do capítulo “Escrever é diferente de falar”. Notópico denominado “concordância entre palavras”, os autores discutem a existência devariedades do português falado que admitem que substantivo e adjetivo não sejam flexionadospara concordar com um artigo no plural. Na mesma página, os autores completam a explanação:“na norma culta, o verbo concorda, ao mesmo tempo, em número (singular – plural) e em pessoa(1ª –2ª – 3ª) com o ser envolvido na ação que ele indica”. Afirmam também: “a norma culta existetanto na linguagem escrita como na oral, ou seja, quando escrevemos um bilhete a um amigo,podemos ser informais, porém, quando escrevemos um requerimento, por exemplo, devemos serformais, utilizando a norma culta”.

Pode-se constatar, portanto, que os autores não estão se furtando a ensinar a norma culta,apenas indicam que existem outras variedades diferentes dessa. A abordagem é adequada, poisdiversos especialistas em ensino de língua, assim como as orientações oficiais para a área,afirmam que tomar consciência da variante linguística que se usa e entender como a sociedadevaloriza desigualmente as diferentes variantes pode ajudar na apropriação da norma culta. Umaescola democrática deve ensinar as regras gramaticais a todos os alunos sem menosprezar acultura em que estão inseridos e sem destituir a língua que falam de sua gramática, ainda que estanão esteja codif icada por escrito nem seja socialmente prestigiada. Defendemos a abordagem daobra por considerar que cabe à escola ensinar regras, mas sua função mais nobre é disseminarconhecimentos científ icos e senso crítico, para que as pessoas possam saber por que e quandousá-las.

O debate público é fundamental para promover a qualidade e equidade na educação. É preciso,entretanto, tomar cuidado com a divulgação de matérias com intuitos políticos pouco educativos eafirmações desrespeitosas em relação aos educadores. A Ação Educativa está disposta apromover um debate qualif icado que possa efetivamente resultar em democratização daeducação e da cultura. Vale lembrar que polêmicas como essa ocupam a imprensa desde que oModernismo brasileiro em 1922 incorporou a linguagem popular à literatura. Felizmente, desdeentão, o país mudou bastante. Muitas pessoas tem consciência de que não se deve discriminarninguém pela forma como fala ou pelo lugar de onde veio. Tais mudanças são possíveis, semdúvida, porque cada vez mais brasileiros podem ir à escola tanto para aprender regras como paradesenvolver o senso crítico.

Acesse o capítulo do livro na íntegra

Imprensa: Acesse aqui um kit de informações sobre o caso.

Ação na Justiça

Educação de Jovens eAdultos

Juventude

Ação na escola

Diversidade, raça eparticipação

Observatório daEducação

Espaço de Cultura

18/05/2011 Ação Educativa - Nota Pública: Livro p…

acaoeducativa.org.br/portal/index.php… 1/1

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 11

Capítulo 1

Escrever é diferente de falar

“Preciso entregar esse texto e queria que você lesse antes, para ver se está bom.”

A frase acima traduz uma situação bastante comum. Mesmo alguém experiente na leitura e na escrita sente necessidade da avaliação de outra pessoa sobre o que escreve. Escritores consagrados, do passado e da atualidade, tam-bém mantiveram, e mantêm, o hábito de trocar correspondências sobre sua obra.

Há momentos em que surgem dúvidas sobre a grafia das palavras (se têm acento, se levam um s ou dois...), sobre a pontuação, o emprego de maiúsculas etc. Às vezes, somos dominados por uma insegurança que nos impede até mesmo de saber ao certo qual é nossa dúvida. Sentimos que falta algo no texto, mas não sabemos o que é. Isso é natural, pois se trata de uma dificulda-de enfrentada por todos que estão aprendendo o funcionamento da língua escrita. À medida que ampliamos nosso conhecimento sobre ela, essas sensações vão sendo superadas.

A língua escrita não é o simples registro da fala. Falar é diferente de escrever. A fala es-pontânea, por exemplo, é menos planejada, apresenta interrupções que não são retomadas. Além disso, conta com outros recursos, como os gestos, o olhar, a entonação. Já a escrita possui muitas convenções. Ela precisa ser mais contí-nua, sem os cortes repentinos da fala, e mais exata, porque geralmente não estamos perto do

leitor para lhe explicar o que queremos dizer.Você, que é falante nativo de português,

aprendeu sua língua materna espontaneamen-te, ouvindo os adultos falarem ao seu redor. O aprendizado da língua escrita, porém, não foi assim, pois exige um aprendizado formal. Ele ocorre intencionalmente: alguém se dispõe a ensinar e alguém se dispõe a aprender. Geral-mente há local, momento e material próprios para isso. Obviamente, em algumas ocasiões, é possível improvisar: um irmão mais velho pode ensinar o que já aprendeu na escola para o ir-mão mais novo, por exemplo. De qualquer for-ma, dificilmente aprendemos a ler e a escrever por acaso, sem ter a intenção disso.

Outro ponto importante: da mesma forma que uma criança aprende a falar observando os outros falarem, o aprendizado da língua escrita requer acesso a textos escritos, ou seja, apren-demos a ler lendo e a escrever escrevendo. A lei-tura e a escrita necessitam de prática. Por isso, mesmo que uma ou outra atividade de escrita lhe ofereça dificuldade, você deve se empenhar ao máximo para realizá-la. Procure reler e revi-sar o que foi escrito, e, quando necessário, pas-se o texto a limpo. No começo, você pode achar difícil, mas os resultados compensarão.

Neste capítulo, vamos exercitar algumas ca-racterísticas da linguagem escrita. Além disso, vamos estudar uma variedade da língua portu-guesa: a norma culta. Para entender o que ela é

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Typewriter
Ação Educativa - Por uma vida melhor - MEC, 2011
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e a sua importância, é preciso antes conhecer alguns conceitos.

Em primeiro lugar, não há um único jeito de falar e escrever. A língua portuguesa apresenta muitas variantes, ou seja, pode se manifestar de diferentes formas. Há variantes regionais, próprias de cada região do país. Elas são per-ceptíveis na pronúncia, no vocabulário (fala-se “pernilongo” no Sul e “muriçoca” no Nordeste, por exemplo) e na construção de frases.

Essas variantes também podem ser de ori-gem social. As classes sociais menos escolari-zadas usam uma variante da língua diferente da usada pelas classes sociais que têm mais es-colarização. Por uma questão de prestígio — vale lembrar que a língua é um instrumento de poder —, essa segunda variante é chamada de variedade culta ou norma culta, enquanto a primeira é denominada variedade popular ou norma popular.

Contudo, é importante saber o seguinte: as duas variantes são eficientes como meios de comunicação. A classe dominante utiliza a nor-ma culta principalmente por ter maior acesso à escolaridade e por seu uso ser um sinal de prestígio. Nesse sentido, é comum que se atri-bua um preconceito social em relação à varian-te popular, usada pela maioria dos brasileiros.

Esse preconceito não é de razão linguística, mas social. Por isso, um falante deve dominar as diversas variantes porque cada uma tem seu lugar na comunicação cotidiana.

Como a linguagem possibilita acesso a mui-tas situações sociais, a escola deve se preocupar em apresentar a norma culta aos estudantes, para que eles tenham mais uma variedade à sua disposição, a fim de empregá-la quando for necessário.

Há ainda mais um detalhe que vale a pena lembrar. A norma culta existe tanto na lingua-gem escrita como na linguagem oral, ou seja, quando escrevemos um bilhete a um amigo, podemos ser informais, porém, quando es-crevemos um requerimento, por exemplo, devemos ser formais, utilizando a norma cul-ta. Algo semelhante ocorre quando falamos: conversar com uma autoridade exige uma fala formal, enquanto é natural conversarmos com as pessoas de nossa família de maneira espon-tânea, informal. Assim, os aspectos que vamos estudar sobre a norma culta podem ser postos em prática tanto oralmente como por escrito. Neste capítulo, vamos ler dois textos. Eles per-mitirão aprofundar questões relativas à escrita e à maneira formal de as pessoas se expressa-rem em português.

Convite à leitura

O primeiro texto é um parágrafo produzido por um aluno.

A violência em nosso pais esta a cada dia que passa se acentuando mais, isto devido a diversos fatores podemos citar o fator economico a ganancia do homem pelo dinheiro, o desemprego dos pais, a falta de moradias, alimentação e educação impedem o de criar seus filhos dignamente dai a grande violencia da sociedade o menor abandonado, que sozinho sem ter uma mão firme que o conduza pela vida, parte para o crime o roubo na tentativa de sobreviver.

VAL, Maria da Graça Costa. Redação e textualidade. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 75. (Fragmento.)

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 13

Diálogo com o texto

De acordo com a norma culta escrita, o pa-rágrafo acima apresenta falhas. Para adequá-lo, é preciso que se apliquem algumas regras da modalidade escrita, como as que serão vistas a seguir.

As várias ideias que compõem um texto pre-cisam ser apresentadas de maneira que o leitor possa acompanhá-las. Por isso, é importante saber usar um determinado sinal de pontuação: o ponto [.]. Ele marca o fim de uma declaração. Em seguida, pode-se iniciar outra, empregan-do sempre a letra maiúscula.

Leia o parágrafo abaixo:

As cidades são obras complexas as características marcantes delas são a concentração de pessoas e edificações e a grande diversidade social e econômica sobretudo em países como o Brasil a cidade também é cenário de grandes desigualdades.

GIANSANTI, Roberto. A cidade e o urbano no mundo atual. São Paulo: Global/Ação Educativa, 2003. p. 11. (Fragmento adaptado para fins didáticos.)

Agora, examine a sequência abaixo para en-tender como empregar o ponto nesse texto, a fim de separar suas ideias.a) O autor faz a primeira declaração:

“As cidades são obras complexas.”b) Em seguida, acrescenta uma frase que justifi-

ca essa declaração:“As cidades são obras complexas. As caracte-rísticas marcantes delas são a concentração de pessoas e edificações e a grande diversi-dade social e econômica.”

c) Como a explicação não está completa, ele prossegue:“As cidades são obras complexas. As caracte-rísticas marcantes delas são a concentração de pessoas e edificações e a grande diversida-de social e econômica. Sobretudo em países como o Brasil, a cidade também é cenário de grandes desigualdades.”É essa divisão que permite ao leitor acompa-

nhar a informação que o autor traz. Seria difícil se o leitor tivesse que, sozinho, identificar cada ideia do texto. Ele provavelmente precisaria ler repetidas vezes para corrigir os enganos que certamente ocorreriam.

A frase que se inicia com a letra maiúscula e se estende até o ponto é chamada de período. Os períodos também podem terminar com ponto de interrogação (?) e ponto de exclamação (!).

Em alguns textos, os períodos são mais lon-gos. Isso é possível desde que o leitor possa acompanhá-los sem se perder.

Respondam às questões oralmente.

1. Qual é o assunto do texto?2. Que aspecto desse assunto é expresso no parágrafo que você leu?3. Releia o texto, tente identificar os problemas dele e explique-os aos colegas.

Emprego do ponto

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Unidade 1 Língua Portuguesa14

Emprego de alguns pronomes

Na língua, alguns pronomes são usados para evitar repetições de palavras, ou seja, eles substituem substantivos ou expressões mencio-nados antes. Alguns estão apresentados a seguir:

a) O rapaz entregou o dinheiro ao comerciante.Ele entregou o dinheiro ao comerciante. (Ele substitui quem entrega.)

b) O rapaz entregou o dinheiro ao comerciante.O rapaz entregou-o ao comerciante. (O substitui o que foi entregue.)

c) O rapaz entregou o dinheiro ao comerciante.O rapaz entregou-lhe o dinheiro. (Lhe substitui a pessoa para quem foi entregue.)

Os pronomes ele e o substituem termos masculinos no singular e eles e os substituem termos masculinos no plural. Para os termos femininos, empregam-se ela e a no singular, e elas e as no plural.

Os pronomes lhe e lhes servem para os dois gêneros.

É comum na linguagem in-formal o emprego de ele e ela no lugar de o e a. As pessoas dizem, por exemplo, “Minha irmã viu ele lá”. Na norma culta, a frase seria: “Minha irmã viu-o lá”, por-que o pronome “o” está substi-tuindo quem foi visto.

Observação: Há casos em que os pronomes o, os, a, as passam por algumas adaptações a fim de ter sua pronúncia facilitada.a) Um dos casos é quando o verbo

termina em -r. Veja o que ocorre: Encontraram a aluna e foram chamar a

aluna. Encontraram a aluna e foram chamá-la. O verbo chamar perde o -r final e o

pronome passa a ser la, em vez de a.b) Outro caso de adaptação ocorre quando

o verbo termina em -m. Examine: Procuraram as meninas e encontram as

meninas no parque. Procuraram as meninas e encontraram-

nas no parque. O pronome passa a ser nas em vez de as.

A concordância entre as palavras

A concordância entre as palavras é uma importante característica da lin-guagem escrita e oral. Ela é um dos princípios que ajudam na elaboração de orações com significado, porque mostra a relação existente entre as palavras.

Verifique como isso funciona:

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 15

Alguns insetos provocam doenças, às vezes, fatais à população ribeirinha.

insetos (masculino, plural) ß alguns (masculino, plural)

doenças (feminino, plural) ß fatais (feminino, plural)

população (feminino, singular) ß ribeirinha (feminino, singular)

As palavras centrais (insetos, doenças, população) são acompanhadas por outras que esclarecem algo sobre elas. As palavras acompanhantes são escritas no mesmo gênero (masculino/feminino) e no mesmo núme-ro (singular/plural) que as palavras centrais.

Essa relação ocorre na norma culta. Muitas vezes, na norma popular, a concordância acontece de maneira diferente. Veja:

Os livro ilustrado mais interessante estão emprestado.

livro (masculino, singular) à os (masculino, plural) ilustrado (masculino, singular) interessante (masculino, singular) emprestado (masculino, singular)

Você acha que o autor dessa frase se refere a um livro ou a mais de um livro? Vejamos:

O fato de haver a palavra os (plural) indica que se trata de mais de um livro. Na variedade popular, basta que esse primeiro termo esteja no plu-ral para indicar mais de um referente. Reescrevendo a frase no padrão da norma culta, teremos:

Os livros ilustrados mais interessantes estão emprestados.

Você pode estar se perguntando: “Mas eu posso falar ‘os livro?’.”Claro que pode. Mas fique atento porque, dependendo da situação,

você corre o risco de ser vítima de preconceito linguístico. Muita gente diz o que se deve e o que não se deve falar e escrever, tomando as regras estabelecidas para a norma culta como padrão de correção de todas as formas linguísticas. O falante, portanto, tem de ser capaz de usar a va-riante adequada da língua para cada ocasião.

Existe outro tipo de concordância: a que envolve o verbo. Observe seu funcionamento:

Na norma culta, o verbo concorda, ao mesmo tempo, em número (singu-lar/plural) e em pessoa (1.ª/2.ª/3.ª) com o ser envolvido na ação que ele indica.

O menino pegou o peixe.menino à singularpegou à singular

Os meninos pegaram o peixe.meninos à pluralpegaram à plural

O menino pegou o peixe.menino à 3.ª pessoapegou à 3.ª pessoa

Eu peguei o peixe.eu à 1.ª pessoapeguei à 1.ª pessoa

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Na variedade popular, contudo, é comum a concordân-cia funcionar de outra forma. Há ocorrências como:

Nós pega o peixe.nós à 1.ª pessoa, pluralpega à3.ª pessoa, singular

Os menino pega o peixe.menino à 3.ª pessoa, ideia de plural (por causa do “os”)pega à 3.ª pessoa, singular

Nos dois exemplos, apesar de o verbo estar no singular, quem ouve a frase sabe que há mais de uma pessoa envol-vida na ação de pegar o peixe. Mais uma vez, é importante que o falante de português domine as duas variedades e escolha a que julgar adequada à sua situação de fala.

Observação: Quando se refere à concordância, a palavra pessoa não tem o sentido de ser humano. Nesse contexto, pessoa refere-se aos envolvidos no ato de fala, que não precisam ser indivíduos. Existe aquele que fala (1.ª pessoa), aquele com quem se fala (2.ª pessoa) e aquele de quem se fala (3.ª pessoa). Exemplos:

Não vi sua revista, mãe. (1.ª pessoa: o filho; 2.ª pessoa: a mãe; 3.ª pessoa: a revista).

Mas eu a deixei aqui! (1.ª pessoa: a mãe; 2.ª pessoa: o filho; 3.ª pessoa: a revista)

Sílaba e acento gráfico

Para entender o sistema de acentuação gráfica, é preciso conhecer al-guns conceitos. Um deles é o de sílaba.

Repare que, quando falamos uma palavra, nossa pronúncia é marca-da por impulsos sonoros. Preste atenção em como pronunciamos as pa-lavras. Observe: pa la vra. Cada som que você pronunciou em uma só emissão de voz representa uma sílaba. Assim, “palavra” tem três sílabas.

Atente à separação de sílabas: vogais idênticas, rr, ss, sc, xc ficam separados na escrita.

Exemplos: ca-a-tin-ga; co-or-de-na-ção; car-ro; as-sa-do, nas-ci-men--to, ex-ce-ção etc.

Sílaba tônica é aquela pronunciada com mais intensidade. O acento gráfico é o sinal que marca a sílaba tônica de algumas palavras na escrita. Os acentos mais empregados com essa finalidade são o acento agudo (´) e o acento circunflexo (^).

Toda palavra com mais de duas sílabas apresenta uma sílaba tônica, que poderá ser a última, a penúltima ou a antepenúltima. Exemplos:

moderno à mo-der-no (a sílaba tônica é der)moderníssimo à mo-der-nís-si-mo (a sílaba tônica é nís)modernizar à mo-der-ni-zar (a sílaba tônica é zar)Portanto: Modernizar tem a última sílaba tônica; moderno tem a penúlti-

ma; moderníssimo tem a antepenúltima.Veja ao lado a classificação que essas

palavras recebem, de acordo com a po-sição da sílaba tônica.

Última sílaba é a tônicaPenúltima sílaba é a tônica

Antepenúltima sílaba é a tônica

OxítonaParoxítonaProparoxítona

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 17

Existem algumas regras que orientam o emprego dos acentos agudo e cir-cunflexo. Vamos estudar quatro delas.

1. Toda palavra proparoxítona tem a sílaba tônica marcada com acento.Exemplo: pássaro (pás-sa-ro); lâmpada (lâm-pa-da).

2. Quando palavras paroxítonas ou oxítonas terminam em a, ocorre o seguin-te: as oxítonas têm a sílaba tônica acentuada; as paroxítonas, não.• Paroxítonas sem acento

• Oxítonas com acento

Essa regra permite marcar a pronúncia diferente de palavras escritas com as mesmas letras. Exemplos:Eu não sabia de nada. (sa-bi-a à paroxítona terminada em a: não é acentuada)Um sabiá pousou no galho da laranjeira. (sa-bi-á à oxítona termina-da em a: é acentuada)Na semana anterior, ele comprara o material. (com-pra-ra à paroxí-tona terminada em a: não é acentuada)Na próxima semana, ele comprará o material. (com-pra-rá à oxítona terminada em a: é acentuada)

3. Quando a vogal i estiver sozinha em uma sílaba tônica, ela é acentuada. Exemplos:A chuva cai sem parar. (cai à letra i não está sozinha: não é acentuada)Eu caí na escada. (ca-í à letra i está sozinha na sílaba tônica: é acentuada)Essa regra permite marcar a pronúncia diferente de palavras escritas com as mesmas letras.

Observações:• Se houver nh na sílaba seguinte à letra i, que está sozi-

nha na sílaba tônica, ela não é acentuada. É o que ocorre com rainha (ra-i-nha à letra i sozinha na sílaba tônica, seguida de nh: não é acentuada).

• Se houver apenas is na sílaba tônica, haverá acento. É o que ocorre com: egoísta (e-go-ís-ta à apenas is na sílaba tônica: é acentuada).4. Quando uma palavra paroxítona tem na última sílaba ditongos como -ia, -ie, -io, -ua, -ue etc., ela é acentuada.Exemplos: história à his-tó-ria (paroxítona terminada em ia: é acentuada)série à sé-rie (paroxítona terminada em ie: é acentuada)água à á-gua (paroxítona terminada em ua: é acentuada)incêndio à in-cên-dio (paroxítona terminada em io: é acentuada)

Com o último Acordo Ortográfico, os acentos relativos ao item c são válidos se, na sílaba anterior a um i paroxítono, houver apenas uma vogal. Havendo ditongo, não se acentua. Exemplos:

Chei-i-nho (Letra i é tônica e está sozinha, mas é paroxítona e antes dela há o ditongo ei. Por isso, a palavra não recebe acento.)

Pi-au-í (Ocorre o mesmo, mas a letra i é oxítona. Por isso, recebe acento.)

onda on — da revista re — vis — ta economia e — co — no — mi —a

sofá so — fá guaraná gua — ra — ná tamanduá ta — man — du — á

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Unidade 1 Língua Portuguesa18

Essa regra permite marcar a pronúncia diferente de palavras escritas com as mesmas letras. Exemplos:

A notícia chegou. (no-tí-cia à paroxítona terminada em ia: é acentuada)

O jornal noticia as mortes. (no-ti-ci-a à paroxítona terminada em a, não em ia: não é acentuada)

Explorando o universo textual

Você examinou apenas o primeiro parágrafo de um texto escrito por um aluno. Mesmo assim, verá que esse trecho possibilita muitas observa-ções e descobertas a respeito da língua escrita. Releia-o:

A violência em nosso pais esta a cada dia que passa se acentuando mais, isto devido a diversos fatores podemos citar o fator economico a ganancia do homem pelo dinheiro, o desemprego dos pais, a falta de moradias, alimentação e educação impedem o de criar seus filhos dignamente dai a grande violencia da sociedade o menor abandonado, que sozinho sem ter uma mão firme que o conduza pela vida, parte para o crime o roubo na tentativa de sobreviver.

Você deve ter observado que o tema do texto é a violência, pois isso fica claro logo no início. Mas o texto não facilita o trabalho do leitor, e você, que tentou lê-lo, deve saber por quê. A divisão do texto em períodos, marcados com ponto, não ocorreu.

Em uma das partes, o leitor consegue determinar onde poderia estar o ponto:

A violência em nosso país está a cada dia que passa se acentuando mais, isto devido a diversos fatores podemos citar [...]

Nesse trecho, percebe-se que a intenção do autor era escrever:A violência em nosso país está a cada dia que passa se acentuando mais. Isto devido a diversos fatores. Podemos citar [...]

Porém, a partir daí, o leitor não detecta com facilidade o que o autor quis dizer. De todas as possibilidades, vamos optar por uma que pareça coerente a fim de prosseguir em nossa análise:

Podemos citar o fator econômico, a ganância do homem pelo dinheiro. O desemprego dos pais, a falta de moradias, alimentação e educação impedem o de criar seus filhos dignamente. Daí a grande violência da sociedade.

Esse trecho permite-nos constatar que uma cuidadosa divisão em perí-odos é decisiva para a clareza dos textos escritos. A língua oral conta com gestos, expressões, entonação de voz, enquanto a língua escrita precisa contar com outros elementos. A pontuação é um deles.

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 19

Vamos analisar outro aspecto: a relação entre alguns elementos do texto. Releia o trecho acima, atentando à expressão “impedem o de criar seus filhos”. Impedem quem de criar os filhos? A quem se refere a palavra “o”? Pelo sentido que o texto tem, você provavelmente responderá que “impedem os pais”. Como a expressão “os pais” já foi usada anteriormen-te, o autor não precisa mesmo repeti-la; ele pode empregar um pronome no lugar dela. Repare que a expressão “os pais” está no plural, por isso deve ser substituída por um pronome plural, como vimos anteriormente; no caso, “os”, não “o”. Observe:

O desemprego dos pais, a falta de moradias, alimentação e educação os impedem de criar seus filhos dignamente. Daí a grande violência da sociedade.

Há ainda outra ocorrência bastante comum em textos longos: o au-tor parece perder a sequência do raciocínio. Vamos examinar um trecho para tornar a questão mais perceptível:

O menor abandonado, que sozinho sem ter uma mão firme que o conduza para a vida, parte para o crime o roubo na tentativa de sobreviver.

Você notou que o período começou e não terminou? O que se passa com esse menor? Falta completar.

Uma maneira de corrigir esse trecho seria eliminando a palavra “que”. Veja:O menor abandonado, que sozinho sem ter uma mão firme que o conduza para a vida, parte para o crime o roubo na tentativa de sobreviver.

E, depois, com a inclusão de três vírgulas:O menor abandonado, que sozinho, sem ter uma mão firme que o conduza pela vida, parte para o crime, o roubo, na tentativa de sobreviver.

O trecho original ainda necessita de algumas alterações. A primeira con-siste em escrever “moradia”, no singular, porque trata-se da condição de morar, no geral, não de residências específicas. Outra mudança que pode contribuir para a clareza do texto é o uso da palavra e, em vez da vírgula, para ligar dois elementos (fator econômico + ganância do homem). Além desse acréscimo, convém fazer outro no trecho em que se indicam as ca-rências: “falta de moradia, de alimentação e de educação”. Convém repetir a palavra de antes de alimentação e educação, caso contrário, pode parecer que a presença de alimentação e educação impede a criação digna.

No texto original, há erros de acentuação gráfica. Com base nas regras que você estudou, é possível acompanhar as correções: país (não pais); daí (não dai); está (não esta); econômico (não economico); ganância e violência (não ganancia e violencia).

Se juntarmos tudo que foi revisado, teremos:A violência em nosso país está a cada dia que passa se acentuando mais. Isto devido a diversos fatores. Podemos citar o fator econômico e a ganância do homem pelo dinheiro. O desemprego dos pais, a falta de moradia, de

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Unidade 1 Língua Portuguesa20

principe:

tucano:

magico:

cupuaçu:

maximo:

japonesa:

grafico:

tecnologia:

tecnologico:

onibus:

alimentação e de educação os impedem de criar seus filhos dignamente. Daí a grande violência da sociedade. O menor abandonado, sozinho, sem ter uma mão firme que o conduza pela vida, parte para o crime, o roubo, na tentativa de sobreviver.

Roda de escrita

1. Separe as sílabas das palavras destacadas, analise se elas precisam ou não de acento e reescreva as frases corretamente.a) Eu percebia uma vantagem na troca de horario.

b) A infancia parecia ter terminado.

c) Não inicio a leitura porque não há claridade.

d) A cerimonia já teve inicio.

e) A ferida não doia mais.

f) Nós caimos na conversa dele.

2. Leia as palavras da lista abaixo. Reescreva-as dividindo suas sílabas, circule a sílaba tônica de cada uma e acentue quando necessário.

3. Reescreva as frases e, se necessário, acentue as palavras destacadas.a) Será que até amanhã ela descobrira a resposta?

b) Esta caneta é sua ou minha?

c) Antes de terminar o prazo ela já descobrira a resposta.

Lembre-se: todas as palavras proparoxítonas são acentuadas.

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 21

Observação: os pronomes o, a, os, as podem aparecer nas formas lo, la, los, las, no, na, nos, nas.

d) Você fica irritado quando esta com sono?

4. Leia as frases abaixo e reescreva-as substituindo a palavra repetida, que está sublinhada, por um dos seguintes pronomes: ele – ela – o – a – lhe; eles – elas – os – as – lhes.a) Minha amiga é uma pessoa maravilhosa. Minha amiga

sabe como manter as amizades.

b) O rapaz mudou-se, mas o carteiro localizou o rapaz.

c) O rapaz mudou-se, por isso o carteiro não conseguiu localizar o rapaz.

d) Descobriram as formigas e eliminaram as formigas.

e) Fui à casa de meus avós e apresentei minha noiva para meus avós.

f) Comprei os livros e encapei os livros.

g) O menino chorou lá dentro e ninguém foi buscar o menino.

h) Meus pais moram longe de mim, mas meus pais recebem muitas notícias minhas.

i) Devemos ser os primeiros a refletir sobre a educação cidadã, a incentivar a educação cidadã e a praticar a educação cidadã.

j) Aquele senhor é teimoso e parcial. Precisamos sempre dizer para aquele senhor que aquele senhor não é dono da verdade.

k) Informaram o ocorrido à professora, mas não disseram à professora toda a verdade.

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Convite à leitura

O texto que você vai ler a seguir é um poema de Juó Bananére, do co-meço do século XX. Nessa leitura você vai poder constatar uma maneira especial de registrar a língua por escrito.

Quem é Juó Bananére?

Juó Bananére é o pseudônimo literário de Alexandre Ribeiro Marcondes Machado, que nasceu em Pindamonhangaba (SP) em 1892 e morreu em 1933. Machado passou a infância no interior paulista e em 1917 formou-se engenheiro pela Faculdade Politécnica da Universidade de São Paulo. Empregando uma linguagem toda especial, escrevia sátiras em algumas revistas e parodiava poetas conhecidos, como Olavo Bilac e Camões, além de satirizar políticos da época. Seus poemas foram reunidos no livro La divina increnca, publicado em 1924. O autor praticamente permaneceu anônimo, sobressaindo seu estilo original e irreverente sob a identidade de Juó Bananére.

Migna terra

Migna terra tê parmeras, Che ganta inzima o sabiá,As aves che stó aqui, Tambê tuttos sabi gorgeá.

A abobora celestia tambê, Che tê lá na mia terra, Tê moltos millió di strella Che non tê na Ingraterra.

Os rios lá sô maise grandi Dus rio di tuttas naçó; I os matto si perdi di vista, Nu meio da imensidó.

Na migna terra tê parmeras Dove ganta a galligna dangolla; Na migna terra tê o Vapr’elli, Chi só anda di gartolla.

BANANÉRE, Juó. La divina increnca. São Paulo: Ed. 34, 2001. p. 8.

Diálogo com o texto

Troque ideias sobre o texto com seus colegas e o professor baseando-se nas questões a seguir.

1. O que primeiramente despertou sua atenção na leitura?2. De forma geral, que opinião o eu lírico manifesta sobre sua terra?3. De que aspectos naturais de sua terra o eu lírico fala?4. O que é possível constatar sobre o modo como algumas palavras são grafadas?5. O que você descobriu de peculiar no que diz respeito à autoria do poema?

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 23

Apesar de alguns elementos incomuns presentes no poema, você certamente compreendeu a ideia geral: o eu lírico falando de sua terra, como se percebe nos versos “I os matto si perdi di vista, / Nu meio da imensidó.”, referentes ao tamanho da floresta existente ali. Talvez tenha reconhecido detalhes de outro poema, “Canção do exílio”, de um poeta chamado Gonçalves Dias, que expressou sua saudade do Brasil quando estava em Portugal, justamente cantando as belezas da pátria. Ele escreveu mais de cinquenta anos antes que Juó Bananére e inspirou ainda outros poetas.

Neste capítulo, que trata das linguagens oral e a escrita e das variedades culta e popular, a proposta, ao apresentar o poema “Migna terra”, é refletir principalmente a respeito da linguagem empregada por Bananére e em que medida ela é importante para expressar as ideias dele.

Se você pensou na sequência de letras d + e para grafar a palavra de, por exemplo, pode não ter compreendido a razão do registro di, que apare-ce em “di vista”. Nos versos citados acima, a palavra e, tão empregada para expressar acréscimo, foi grafada com a letra que mais lembra o modo como tantas vezes a pronunciamos: a letra i (“i os matto”).

Uma palavra como che, repetida várias vezes no poema, também deve ter soado de forma estranha se você a pronunciou como xê, conforme se faz em português com a sequência de letras c + h. Releia o poema, pronun-ciando kê ao ler essa palavra, como fazemos ao pronunciar a palavra que do português. O poema certamente fará mais sentido.

É justamente o nosso que a intenção do poeta ao grafar che. A pergunta que surge é: “Por que, então, ele não grafa q + u + e?

Convém esclarecer alguns detalhes a respeito da linguagem do po-ema “Migna terra”. Os desvios que você percebe na grafia de certas palavras são intencionais. Por meio deles, o poeta está expressando algo.

Este poema — e outros trabalhos de Juó Bananére — foram produzidos em um determinado contexto. Apesar de ser uma espécie de personagem, Juó Bananére tinha uma identidade: era um barbeiro que vivia na cidade de São Paulo no começo do século XX. Ele trabalhava em um bairro da região central chamado Abaix’o Piques, posteriormente chamado de Bixiga (como é conhecido hoje). Naquela época a cidade era em grande parte formada por imigrantes italianos.

Esse é o aspecto central da linguagem de “Minha terra”. Ela reflete a forma de falar de boa parte dessa população, que misturava a pronúncia própria do idioma italiano com a do português. Isso ocorre, por exemplo, em inzima (que corresponde a em cima); tambê (que corresponde a também); naçó (que corresponde a nação). Pronúncias como essas podem ser ouvidas em tele-novelas que retratam a São Paulo daquela época ou determinada variedade linguística de hoje.

Explorando o universo textual

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E não é só isso que se vê no poema no que diz respeito à lingua-gem. Para representar a influência que já foi mencionada, o poeta chega a escrever as palavras de maneira a lembrar a grafia do italiano. Você constata isso no l duplo, no t duplo e no gn (que representa o som nhê em italiano) presentes em migna, galligna, gartolla, strella, matto, tuttos, tuttas. Essas grafias não existem nem mesmo em italiano; apenas lem-bram marcas importantes da escrita desse idioma.

Pode parecer estranho, mas não é incomum. Muitos nomes de lojas brasileiras lembram detalhes da grafia de outros idiomas, como o’s do inglês.

Na verdade, palavras do vocabulário italiano mesmo há poucas no po-ema: dove (= onde), mia (= minha), che (= que), chi (= quem). Claro! O poeta não pretendia escrever em italiano, e sim usar uma maneira de falar português da população de São Paulo. Com isso, ele acabava mostrando também uma visão de mundo dessa população. Ainda hoje, quando le-mos o poema, é em parte a visão de mundo daquela época que acabamos levando em conta. De fato, a linguagem é uma marca importante.

No poema é empregado um dialeto ítalo-português oral de sua épo-ca. Seu emprego acaba sendo uma forma de tratar com irreverência a produção literária extremamente séria que existia até então. Este é outro dado importante referente àquela época: muitos poetas (classificados como modernistas) passaram a valorizar em suas obras o português fa-lado no Brasil (em contraste com o português falado em Portugal) e a variedade popular da língua.

Em resumo, tudo que pode parecer erro é uma forma intencional de usar a língua escrita. E esse uso significa algo.

Naturalmente existe um código convencional a ser seguido no registro escrito na norma culta, conforme você estudou na seção Para conhecer mais, mas ele não é o único viável, sobretudo na linguagem literária.

Outros autores já usaram esse recurso. Adoniran Barbosa, por exem-plo, empregava deliberadamente determinada variedade regional em suas letras. Músicas como “Saudosa maloca” (1951), “Samba do Arnes-to” (1953), “Trem das onze” (1964) e “Tiro ao álvaro” (1960) mostram isso. O poeta Patativa do Assaré, que você estudará nesta coleção, tam-bém explorava certa variedade linguística em seus poemas.

Longe de serem erros, todos esses desvios são, no fundo, pistas que o texto fornece ao seu leitor. O falar espontâneo do poema de Juó Ba-nanére é importante para construir uma crítica em forma de paródia à postura “patriota” extremamente sentimental presente no poema de Gonçalves Dias. A brincadeira com a linguagem, nesse caso, reforça essa postura.

Canção do exílio

Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabiá;As aves que aqui gorjeiam,Não gorjeiam como lá.

Nosso céu tem mais estrelas,Nossas várzeas têm mais flores,Nossas flores têm mais vida,Nossa vida mais amores.

Em cismar, sozinho, à noite,Mais prazer encontro eu lá;Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabiá.

Minha terra tem primores,Que tais não encontro eu cá;Em cismar — sozinho, à noite —Mais prazer encontro eu lá;Minha terra tem palmeiras,Onde canta o Sabiá.

Não permita Deus que eu morraSem que eu volte para lá;Sem que desfrute os primoresQue não encontro por cá;Sem qu’inda aviste as palmeiras,Onde canta o Sabiá.

DIAS,Gonçalves.

Coimbra,julhode1843.

Luiz

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O sambista Adoniran Barbosa em 1979.O compositor de Saudosa Maloca, utilizou uma determinada variedade liguística, na qual utiliza muitos elementos da fala popular de sua época na cidade de São Paulo.

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 25

Atividade Aplicar conhecimentos

a) Escreva o poema em seu caderno, trocando as ocorrências típicas da variedade popular pelas formas que seriam usadas na norma culta.

b) Verifique as mudanças que você fez e os efeitos que elas provocaram. Escreva quais foram esses efeitos.

2. Sobre o tema televisão, construa um período que:

a) termine com ponto final:

b) termine com ponto de interrogação:

c) termine com reticências:

d) termine com ponto de exclamação: 3. Escreva um parágrafo sobre o tema televisão. Separe as ideias em períodos para que o

leitor possa acompanhar o texto.

4. Nestas frases, as palavras destacadas estão escritas como, geralmente, são pronunciadas. Reescreva-as de acordo com as regras de ortografia:

a) Comecei a trabalhá em um lugar agradável.

b) Não foi fácil acostumá com essa ideia.

c) Vim com uma prima para ajudá na costura.

d) Não tenho nada a falá sobre esse assunto.

e) Talvez não conseguisse voltá para casa.

f) Passeei bastante antes de percebê que tava perdida. 5. Reescreva as frases, corrigindo os verbos que foram escritos incorretamente.

a) Eu quero dizê para vocês que os ônibus dessa linha tão cada vez mais raros.

b) E eu tenho que acordá mais cedo para não perdê a hora.

Roda de escrita

[ATENÇÃO: NA SEÇÃO “APLICAR CONHECIMENTOS”, AS QUESTÕES 1 E 2 REFEREM-SE A “SAUDOSA MALOCA” E PRECISAM SER ELIMINADAS. SEGUINDO A ESTRUTURA DOS DEMAIS CAPÍTULOS, INCLUO APÓS O SEGUNDO TEXTO A SEÇÃO “RODA” (QUE AQUI FOI CHAMADA “DE ESCRITA”).

[ACRESCENTAR AO QUADRO Indicação de leituras, vídeos e músicas.]

Site• Sunetto futuriste, de Juó Bananére, na voz de Francisco Papaterra Limongi Neto:

<http://www.carbonoquatorze.com.br/versaopaulo/primeiro/>.

1. Traduzir a variedade popular para a variedade culta comprometeria parte do sentido do poema, afinal, em certos textos, nem sempre importa o que se diz, mas o modo como se diz.

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c) Pedi para trocá o produto, mas não concordaro.

d) O jornal é uma publicação que todo mundo ler.

e) Tá tudo bem, mas poderia está melhor, se não fosse a falta de respeito com a população.

f) Eles fizero uma pesquisa para sabê quantas pessoas teria oportunidade de trabalhá.

g) Nessa rua não temo paz nem para dormi.

h) Então eu resolvir escrever para vocês.

6. Leia as frases e complete as lacunas com as palavras mas ou mais.

a) Aqui chove que na minha cidade.

b) Eu não vou lá.

c) Tudo é possível, é preciso colaborar.

d) Quanto é 25 39?

e) Quanto eu o aconselho a não fazer isso, você faz!

f) Gosto de filmes, os livros me interessam do que eles.

g) Já fiz tudo por ele, não farei nada.

h) Você disse que não pode comprar nada esse mês, hoje é aniversário da Ana.

7. Leia o modelo e, a seguir, complete as frases.É preciso estudar as regras.É preciso estudá-las.

a) Eu gostaria de admirar o país.

Eu gostaria de b) Não consegui ouvir o pedido.

Não consegui c) Esqueci-me de grifar as palavras.

Esqueci-me de .d) Não houve tempo de concluir o projeto.

Não houve tempo de .

Lembre-se: mas = porém. Nos demais casos, emprega-se mais.

Lembre-se: palavra oxítona que termina em a tem acento; se o i estiver sozinho na sílaba tônica, ele é acentuado.

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Capítulo 1 Escrever é diferente de falar 27

e) Não fui capaz de impedir a vingança.

Não fui capaz de .8. Reescreva no caderno os textos a seguir levando em consideração as normas da linguagem

culta. Faça as modificações que julgar necessárias: evite repetições de palavras, substitua ou elimine palavras, use os sinais de pontuação, corrija as palavras que apresentam erros de grafia e de acentuação.a) Sabemos que a leitura é uma das coisas que conseguir muda o homem, a leitura tem a

capacidade de nos levar a lugar imaginario, imaginar coisas belissima, meu pai sempre diz quem ler e sábio meu pai esta lendo sempre que pode.

b) A leitura transforma as pessoa, assim que procuramos os livro, os livro revela culturas e os ensina e nos torna mais sabios de conhecimentos. Os livro nos leva ao sonhos, para realizar os sonhos sem sai de casa em viagens literarias.

Leia o início do parágrafo a seguir e copie-o no caderno. Identifique o assunto tratado e continue a escrevê-lo. Use as palavras que estão abaixo (mas, além disso, assim) observando o sentido de cada uma para iniciar os parágrafos seguintes. No final, crie um título para o texto.

Momento da escrita

Indicações de leituras, vídeos, músicas

Livro

• CAMARGO, José Eduardo e SOARES, L. O Brasil das placas. São Paulo: Panda Books, 2007.Site

• Sunetto futuriste, de Juó Bananére, na voz de Francisco Papaterra Limongi Neto: <http://www.carbonoquatorze.

com.br/versaopaulo/primeiro/>.

Música

• “Inútil”, de Ultraje a Rigor. WEA, 1983. Pode ser ouvida em: <http://roxmo.sites.uol.com.br/musicas/inutil.html>.

A voz da mulher é ainda pouco ouvida em nossa sociedade. Afinal, ter competência para falar não implica ser ouvido.Mas...Além disso...Assim...

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16/05/2011 - 19h19

Uma defesa do "erro" de português

O pessoal pegaram pesado. Da esquerda à direita, passando por vários amigosmeus, a imprensa foi unânime em atacar o livro didático "Por uma Vida Melhor", deHeloísa Ramos. O suposto pecado da obra, que é distribuída pelo Programa do LivroDidático, do Ministério da Educação, é afirmar que construções do tipo "nós pega opeixe" ou "os livro ilustrado mais interessante estão emprestado" não constituemexatamente erros, sendo mais bem descritas como "inadequadas" em determinados"contextos".

Os mais espevitados já viram aí um plano maligno do governo do PT para pespegar aanarquia linguística e destruir a educação, pondo todas as crianças do Brasil para falarigualzinho ao Lula. Outros, mais comedidos, apontaram a temeridade pedagógica dedizer a um aluno que ignorar a concordância não constitui erro.

Eu mesmo faria coro aos moderados, não fosse o fato de que, do ponto de vista dalinguística --e não o da pedagogia ou da gramática normativa--, a posição daprofessora Heloísa Ramos é corretíssima, ainda que a autora possa ter sido inábil aoexpô-la.

Acredito mesmo que, excluídos os ataques politicamente motivados, tudo não passade um grande mal-entendido. Para tentar compreender melhor o que está por trásdessa confusão, é importante ressaltar a diferença entre a perspectiva da linguística,ciência que tem por objeto a linguagem humana em seus múltiplos aspectos, e a dagramática normativa, que arrola as regras estilísticas abonadas por um determinadogrupo de usuários do idioma numa determinada época (as elites brancas de olhosazuis, se é lícito utilizar a imagem consagrada pelo ex-governador de São PauloClaúdio Lembo). Podemos dizer que a segunda está para a primeira assim como apesquisa da etiqueta da corte bizantina está para o estudo da História. Daí nãodecorre, é claro, que devamos deixar de examinar a etiqueta ou ignorar suasprescrições, em especial se frequentarmos a corte do "basileus", mas é importante terem mente que a diferença de escopo impõe duas lógicas muito diferentes.

Se, na visão da gramática normativa, deixar de fazer uma flexão plural ou apor umavírgula entre o sujeito e o predicado constituem crimes inafiançáveis, na perspectiva dalinguística nada disso faz muito sentido. Mas prossigamos com um pouco mais devagar. Se os linguistas não lidam com concordâncias e ortografia o que eles fazem?Seria temerário responder por todo um ramo do saber que ainda por cima se divideem várias escolas rivais. Mas, assumindo o ônus de favorecer uma dessas correntes,eu diria que a linguística está preocupada em apontar os princípios gramaticaiscomuns a todos os idiomas. Essa ideia não é exatamente nova. Ela existe pelo menosdesde Roger Bacon (c. 1214 - 1294), o "pai" do empirismo e "avô" do métodocientífico, mas foi modernamente desenvolvida e popularizada pelo linguista norte-americano Noam Chomsky (1928 -).

Há de fato boas evidências em favor da tese. A mais forte delas é o fato de que alinguagem é um universal humano. Não há povo sobre a terra que não tenha

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linguagem é um universal humano. Não há povo sobre a terra que não tenhadesenvolvido uma, diferentemente da escrita, que foi "criada" de forma independentenão mais do que meia dúzia de vezes em toda a história da humanidade. Tambémdiferentemente da escrita, que precisa ser ensinada, basta colocar uma criança emcontato com um idioma para que ela o adquira quase sozinha. Mais até, o fenômenodas línguas crioulas mostra que pessoas expostas a pídgins (jargões comerciaisnormalmente falados em portos e que misturam vários idiomas) acabamdesenvolvendo, no espaço de uma geração, uma gramática completa para essa novalinguagem. Outra prova curiosa é a constatação de que bebês surdos-mudos"balbuciam" com as mãos exatamente como o fazem com a voz as crianças falantes.

O principal argumento lógico usado por Chomsky em favor do inatismo linguístico é ochamado Pots, sigla inglesa para "pobreza do estímulo" ("poverty of the stimulus"). Emgrandes linhas, ele reza que as línguas naturais apresentam padrões que não poderiamser aprendidos apenas por exemplos positivos, isto é, pelas sentenças "corretas" àsquais as crianças são expostas. Para adquirir o domínio sobre o idioma elas teriamtambém de ser apresentadas a contraexemplos, ou seja, a frases sem sentidogramatical, o que raramente ocorre. Como é fato que os pequeninos desenvolvem afala praticamente sozinhos, Chomsky conclui que já nascem com uma capacidadeinata para o aprendizado linguístico. É a tal da Gramática Universal.

O cientista cognitivo Steven Pinker, ele próprio um ferrenho defensor do inatismo, extraialgumas consequências interessantes da teoria. Para começar, ele afirma que oinstinto da linguagem é uma capacidade única dos seres humanos. Todas as tentativasde colocar outros animais, em especial os grandes primatas, para "falar" seja atravésde sinais ou de teclados de computador fracassaram. Os bichos não desenvolveramcompetência para, a partir de um número limitado de regras, gerar uma quantidade emprincípio infinita de sentenças. Para Pinker, a linguagem (definida nos termos acima) éuma resposta única da evolução para o problema específico da comunicação entrecaçadores-coletores humanos.

Outro ponto importante e que é o que nos interessa aqui diz respeito ao domínio dagramática. Se ela é inata e todos a possuímos como um item de fábrica, não faz muitosentido classificar como "pobre" a sintaxe alheia. Na verdade, aquilo que noshabituamos a chamar de gramática, isto é, as prescrições estilísticas que aprendemosna escola são o que há de menos essencial, para não dizer aborrecido, no complexofenômeno da linguagem. Não me parece exagero afirmar que sua função éprecipuamente social, isto é, distinguir dentre aqueles que dominam ou não umconjunto de normas mais ou menos arbitrárias que se convencionou chamar de culta.Nada contra o registro formal, do qual, aliás, tiro meu ganha-pão. Mas, sob esseprisma, não faz mesmo tanta diferença dizer "nós vai" ou "nós vamos". Se a linguagemé a resposta evolucionária à necessidade de comunicação entre humanos, o únicocritério possível para julgar entre o linguisticamente certo e o errado é a compreensãoou não da mensagem transmitida. Uma frase ambígua seria mais "errada" do que umaque ferisse as caprichosas regras de colocação pronominal, por exemplo.

Podemos ir ainda mais longe e, como o linguista Derek Bickerton (1925 -), postularque existem situações em que é a gramática normativa que está "errada". Isso ocorrequando as regras estilísticas contrariam as normas inatas que nos são acessíveisatravés das gramáticas das línguas crioulas. No final acabamos nos acostumando eseguimos os prescricionistas, mas penamos um pouco na hora de aprender. Estruturasem que as crianças "erram" com maior frequência (verbos irregulares, dupla negaçãoetc.) são muito provavelmente pontos em que estilo e conexões neuronais estão em

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desacordo.

Mais ainda, elidir flexões, substituindo-as por outros marcadores, como artigos,posição na frase etc., é um fenômeno arquiconhecido da evolução linguística. Foi,aliás, através dele que os cidadãos romanos das províncias foram deixando de dizeras declinações do latim clássico, num processo que acabou resultando no português eem todas as demais línguas românicas.

A depender do zelo idiomático de meus colegas da imprensa, ainda estaríamos todosfalando o mais castiço protoindo-europeu.

Não sei se algum professor da rede pública aproveita o livro de Heloísa Ramos paralevar os alunos a refletir sobre a linguagem, mas me parece uma covardia privá-losdessa possibilidade apenas para preservar nossas arbitrárias categorias de certo eerrado.

Hélio Schwartsman, 44 anos, é articulista da Folha. Bacharel em filosofia, publicou"Aquilae Titicans - O Segredo de Avicena - Uma Aventura no Afeganistão" em 2001.Escreve para a Folha.com.

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Obras técnicas e didáticasGramática: passado, presente e futuroNão é errado falar assim!Nada na língua é por acasoA norma ocultaLingüística da normaLíngua maternaNorma lingüísticaPortuguês ou brasileiro?Dramática da língua portuguesaO processo de independência do BrasilPreconceito lingüísticoMachado de Assis para principiantesPesquisa na escolaA língua de Eulália

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Polêmica ou ignorância?

POLÊMICA OU IGNORÂNCIA?

DISCUSSÃO SOBRE LIVRO DIDÁTICO SÓ REVELA IGNORÂNCIA DA GRANDEIMPRENSA

Marcos BagnoUniversidade de Brasília

Para surpresa de ninguém, a coisa se repetiu. A grande imprensa brasileira mais uma vez exibiu sua ampla e larga ignorância a respeitodo que se faz hoje no mundo acadêmico e no universo da educação no campo do ensino de língua.Jornalistas desinformados abrem um livro didático, leem metade de meia páginae saem falando coisas que depõem sempre muito maiscontra eles mesmos doque eles mesmos pensam (se é que pensam nisso, prepotentementeconvencidos que são, quase todos, de quedetêm o absoluto poder da informação).Polêmica? Por que polêmica, meus senhores e minhas senhoras? Já faz mais de quinze anos que os livros didáticos de língua portuguesadisponíveis nomercado e avaliados e aprovados pelo Ministério da Educação abordam o tema da variação linguística e do seu tratamento em sala deaula. Não é coisa depetista, fiquem tranquilas senhoras comentaristas políticas da televisão brasileira e seus colegas explanadores do óbvio.Já no governo FHC, sob a gestão do ministro Paulo Renato, os livros didáticos de português avaliados pelo MEC começavam aabordar os fenômenos davariação linguística, o caráter inevitavelmente heterogêneo de qualquer língua viva falada no mundo, a mudança irreprimível quetransformou, temtransformado, transforma e transformará qualquer idioma usado por uma comunidade humana. Somente com uma abordagem assim asalunas e osalunos provenientes das chamadas “classes populares” poderão se reconhecer no material didático e não se sentir alvo de zombaria e

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preconceito. E, é claro,com a chegada ao magistério de docentes provenientes cada vez mais dessas mesmas “classes populares”, esses mesmos profissionaisentenderão que seumodo de falar, e o de seus aprendizes, não é feio, nem errado, nem tosco, é apenas uma língua diferente daquela – devidamentefossilizada e conservadaem formol – que a tradição normativa tenta preservar a ferro e fogo, principalmente nos últimos tempos, com a chegada aos novosmeios decomunicação de pseudoespecialistas que, amparados em tecnologias inovadoras, tentam vender um peixe gramatiqueiro para lá depodre.Enquanto não se reconhecer a especificidade do português brasileiro dentro doconjunto de línguas derivadas do português quinhentistatransplantados para as colônias, enquanto não se reconhecer que o português brasileiro é uma língua em si, com gramática própria,diferente da do português europeu, teremos de conviver com essas situações no mínimo patéticas.A principal característica dos discursos marcadamente ideologizados (sejam eles da direita ou da esquerda) é a impossibilidade de veras coisas emperspectiva contínua, em redes complexas de elementos que se cruzam e entrecruzam, em ciclos constantes. Nesses discursos só existeo preto e obranco, o masculino e o feminino, o mocinho e o bandido, o certo e o errado e por aí vai.Darwin nunca disse em nenhum lugar de seus escritos que “o homem vem do macaco”. Ele disse, sim, que humanos e demais primatasdeviam ter seoriginado de um ancestral comum. Mas essa visão mais sofisticada não interessava ao fundamentalismo religioso que precisava de umlema distorcidocomo “o homem vem do macaco” para empreender sua campanha obscurantista, que permanece em voga até hoje (inclusive nodiscurso dacandidata azul disfarçada de verde à presidência da República no ano passado).Da mesma forma, nenhum linguista sério, brasileiro ou estrangeiro, jamais disse ou escreveu que os estudantes usuários de variedadeslinguísticas maisdistantes das normas urbanas de prestígio deveriam permanecer ali, fechados em sua comunidade, em sua cultura e em sua língua. Oque esses profissionais vêm tentando fazer as pessoas entenderem é que defender uma coisa nãosignifica automaticamente combater aoutra. Defender o respeito à variedade linguística dos estudantes não significa que não cabe à escola introduzi-los aomundo da culturaletrada e aos discursos que ela aciona. Cabe à escola ensinar aos alunos o que eles não sabem! Parece óbvio, mas é preciso repetir issoa todo momento.Não é preciso ensinar nenhum brasileiro a dizer “isso é para mim tomar?”, porque essa regra gramatical (sim, caros leigos, é uma regragramatical) já fazparte da língua materna de 99% dos nossos compatriotas. O que é preciso ensinar é a forma “isso é para eu tomar?”, porque ela nãofaz parte dagramática da maioria dos falantes de português brasileiro, mas por ainda servir de arame farpado entre os que falam “certo” e os quefalam “errado”, édever da escola apresentar essa outra regra aos alunos, de modo que eles – se julgarem pertinente, adequado e necessário – possam vira usá-laTAMBÉM. O problema da ideologia purista é esse também. Seus defensores não conseguem admitir que tanto faz dizer assisti o filmequanto assiti ao filme,que a palavra óculos pode ser usada tanto no singular (o óculos, como dizem 101% dos brasileiros) quanto no plural (os óculos, comodizem dois ou trêsgatos pingados).O mais divertido (para mim, pelo menos, talvez por um pouco de masoquismo) é ver os mesmos defensores da suposta “língua certa”,no exato momento em quea defendem, empregar regras linguísticas que a tradição normativa que eles acham que defendem rejeitariaimediatamente. Pois ontem, vendo o Jornal das Dez, da GloboNews, ouvi da boca do sr. Carlos Monforte essa deliciosa pergunta:“Como é que fica então as concordâncias?”. Ora, sr. Monforte, eu lhedevolvo a pergunta: “E as concordâncias, como é que ficam então?

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18/05/2011 marcosbagno.com.br: Polêmica ou ign…

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