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Proceedings CLME2014 / IVCEM 7º Congresso Luso-Moçambicano de Engenharia / IV Congresso de Engenharia de Moçambique Inhambane/Moçambique, 14-18 Abril 2014 -1- Artigo Nº A193695 DESENVOLVIMENTO DE SOLUÇÕES CUSTOMIZADAS PARA A AUTOMATIZAÇÃO DOS PROCESSOS DE LIMPEZA E ALIMENTAÇÃO DE PEIXES VISANDO A SUSTENTABILIDADE DA AQUICULTURA NA COSTA ATLÂNTICA PORTUGUESA Diogo Fula 1(*) , Ana Reis 1 , Dirk Loyens 2 , Jorge Lino Alves 1 1 INEGI, FEUP, Universidade do Porto, Portugal 2 ESAD, Matosinhos, Portugal (*) Email: [email protected] RESUMO A população humana tem vindo continuamente a aumentar, consequentemente existe uma necessidade crescente de produção de alimentos. A agricultura encontra-se limitada devido ao recurso a água potável fresca e solos aráveis. De forma a conseguir um futuro sustentável da produção de pescado, a captura terá que permanecer nos níveis atuais de produção, com o risco de que um aumento de consumo poderá levar ao esgotamento das reservas naturais de peixe. A aquacultura surge assim como uma potencial fonte para a satisfação do consumo, justificando investimentos relativos ao desenvolvimento desta prática. Esta investigação visou disponibilizar ao projeto “CLEANxFEED” a informação necessária para o desenvolvimento de soluções automatizadas com controlo adaptativo para processos de limpeza de redes e alimentação de pescado, apropriadas a explorações de pequena/média dimensão, com caraterísticas de ambientes marinhos similares às da costa atlântica portuguesa e adaptáveis à tipologia de jaulas habitualmente usadas neste tipo de exploração. Palavras-chave: Aquicultura, processos de limpeza, alimentação de peixes, soluções customizadas 1. INTRODUÇÃO A população humana tem progressivamente vindo a aumentar, ampliando consecutivamente a demanda por produção de alimento. A agricultura tradicional encontra-se limitada devido ao indispensável recurso a água potável e solos aráveis (Bostock, 2008), e a atividade pecuária é responsável pela criação, em grande quantidade, de resíduos de difícil tratamento e que deterioram os terrenos através de contaminação de solos e dos lençóis freáticos. A sustentabilidade alimentar humana depende assim da obtenção de um equilíbrio entre a produção e a capacidade de alcançar uma pegada ecológica reversível (Lopes, 2010). De forma a conseguir um futuro sustentável dentro da produção de pescado, a captura terá que permanecer nos níveis atuais de produção. A aquacultura surge assim como uma potencial fonte para a satisfação do consumo, o que justifica investimentos relativos ao desenvolvimento desta prática (Shainee et al., 2012). A produção aquícola tem beneficiado de um crescimento anual de cerca de 6%, conseguindo ter um aumento de 45.5 milhões de toneladas em 2004 para 60 milhões em 2010, com uma previsão de alcançar os 80 milhões em 2050. Grande parte desta produção destina-se a consumo humano, prevendo-se que o sector continue a crescer exponencialmente nos próximos anos (FAO, 2012). O rápido aumento na produção, assim como o decréscimo na captura de espécies selvagens, deu origem a que hoje

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Proceedings CLME2014 / IVCEM 7º Congresso Luso-Moçambicano de Engenharia / IV Congresso de Engenharia de Moçambique Inhambane/Moçambique, 14-18 Abril 2014

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Artigo Nº A193695

DESENVOLVIMENTO DE SOLUÇÕES CUSTOMIZADAS PARA A AUTOMATIZAÇÃO DOS PROCESSOS DE LIMPEZA E ALIMENTAÇÃO DE PEIXES VISANDO A SUSTENTABILIDADE DA AQUICULTURA NA COSTA ATLÂNTICA PORTUGUESA Diogo Fula1(*), Ana Reis1, Dirk Loyens2, Jorge Lino Alves1 1INEGI, FEUP, Universidade do Porto, Portugal 2ESAD, Matosinhos, Portugal (*)

Email: [email protected] RESUMO

A população humana tem vindo continuamente a aumentar, consequentemente existe uma

necessidade crescente de produção de alimentos. A agricultura encontra-se limitada devido

ao recurso a água potável fresca e solos aráveis. De forma a conseguir um futuro sustentável

da produção de pescado, a captura terá que permanecer nos níveis atuais de produção, com

o risco de que um aumento de consumo poderá levar ao esgotamento das reservas naturais

de peixe. A aquacultura surge assim como uma potencial fonte para a satisfação do consumo,

justificando investimentos relativos ao desenvolvimento desta prática.

Esta investigação visou disponibilizar ao projeto “CLEANxFEED” a informação necessária

para o desenvolvimento de soluções automatizadas com controlo adaptativo para processos

de limpeza de redes e alimentação de pescado, apropriadas a explorações de pequena/média

dimensão, com caraterísticas de ambientes marinhos similares às da costa atlântica

portuguesa e adaptáveis à tipologia de jaulas habitualmente usadas neste tipo de exploração.

Palavras-chave: Aquicultura, processos de limpeza, alimentação de peixes, soluções customizadas

1. INTRODUÇÃO

A população humana tem progressivamente vindo a aumentar, ampliando consecutivamente a demanda por produção de alimento. A agricultura tradicional encontra-se limitada devido ao indispensável recurso a água potável e solos aráveis (Bostock, 2008), e a atividade pecuária é responsável pela criação, em grande quantidade, de resíduos de difícil tratamento e que deterioram os terrenos através de contaminação de solos e dos lençóis freáticos. A sustentabilidade alimentar humana depende assim da obtenção de um equilíbrio entre a produção e a capacidade de alcançar uma pegada ecológica reversível (Lopes, 2010). De forma a conseguir um futuro sustentável dentro da produção de pescado, a captura terá que permanecer nos níveis atuais de produção. A aquacultura surge assim como uma potencial fonte para a satisfação do consumo, o que justifica investimentos relativos ao desenvolvimento desta prática (Shainee et al., 2012). A produção aquícola tem beneficiado de um crescimento anual de cerca de 6%, conseguindo ter um aumento de 45.5 milhões de toneladas em 2004 para 60 milhões em 2010, com uma previsão de alcançar os 80 milhões em 2050. Grande parte desta produção destina-se a consumo humano, prevendo-se que o sector continue a crescer exponencialmente nos próximos anos (FAO, 2012). O rápido aumento na produção, assim como o decréscimo na captura de espécies selvagens, deu origem a que hoje

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cerca de 50% do peixe marítimo consumido, em países desenvolvidos como Finlândia, França, Canadá, Estados Unidos da América provenha da aquacultura.

Os países com maior tradição aquícola (China, Japão, Noruega, etc.) conseguiram, nas últimas décadas, progressivos aumentos na qualidade e tamanho das explorações, assim como altos graus de complexidade nos mecanismos de apoio às estruturas e à gestão. Estas estruturas foram consequentemente adaptadas à sua realidade climatérica e geográfica, favoráveis para produção aquícola (Sturrock, 2008; Baldwin et al., 2002).

Em Portugal (Figura 1) apesar de existir uma linha de costa com 850 km de extensão marítima, as condições geográficas na costa oeste apresentam grande alternância de arribas e cabos com troços constituídos por grandes areais com altitudes pouco acima do nível do mar (Ferreira, 2000), a orla costeira atlântica é também exposta a fatores naturais fortes como a ondulação, correntes e ventos. O que determina, à partida, que as explorações terão que ser implementadas na costa Sul do país onde as condições geográficas são mais adaptadas à prática aquícola (Castro, 2009). No entanto, Portugal encontra-se entre os países que menos recorrem a aquacultura como método de produção alimentar, representando apenas 1,4% da produção total nacional. Que se revela uma percentagem extremamente baixa comparada com outros países da Comunidade Europeia como a Espanha (21%) ou a França (35%).

O desenvolvimento da produção aquícola manifesta-se como uma contribuição importante para a sustentabilidade económica de um país em desenvolvimento, fornecendo proteínas alimentares a baixos preços melhorando a alimentação populacional, criando postos de trabalho, gerando capital e promovendo desenvolvimento regional. Moçambique destaca-se como um exemplo de integração da atividade, pelo que apesar da aquacultura de Tilapia já existir desde 1950, a prática aquícola em zonas marinhas apenas emergiu na última década, potenciando um grande crescimento económico em algumas zonas do país (FAO, 2013).

a) b)

Figura 1. (a) Altura significativa (m) e direção de pico de ondas em Portugal Continental em metros (IH, 2014); (b) período de pico (s) de ondas em Portugal Continental (IH, 2014).

A aquicultura em mar aberto (Figura 2) usufrui, de incentivos económicos associados à inexistência de legislação referente ao tratamento dos detritos resultantes da exploração. No

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entanto, uma vez que existem poucos locais com condições favoráveis à exploração aquícola na costa atlântica da Europa, esta atividade permanece sem grande expressão e o avanço para zonas menos abrigadas (off-shore), tem sido ponderada (Carrasquinho, 2009, Nyanti et al., 2012). Este facto introduz um grande desafio tecnológico, uma vez que o tipo de estruturas e soluções tecnológicas apropriadas a zonas calmas, é claramente distinto do exigido para zonas mais instáveis, o que obriga a repensar toda a instalação holísticamente, de forma a assegurar a eficácia do sistema e a sua sustentabilidade económica e ecológica (Castro, 2008).

Figura 2. Aquacultura Nearshore em mar em jaulas aquáticas.

1.1 JAULAS AQUÁTICAS

A aquacultura por jaulas aquáticas (Figura 3) é atualmente a forma de produção piscícola no mar que menos investimento requer na instalação e manutenção (Baldwin et al., 2002, Shainee et al., 2012, Størkersen, 2012). Esta tipologia de produção utiliza os recursos existentes no meio ambiente a seu proveito. A circulação da água dentro das jaulas é resultante da entrada de correntes aquáticas, que fornecem uma parte da alimentação do peixe e evitam acumulação de detritos, garantindo um ambiente mais adequado para o seu crescimento saudável. A jaula aquícola é uma estrutura em forma de colar, que alberga no seu centro a rede responsável por manter em cativeiro o peixe, com a particularidade de ser flutuante. A rede mantém a forma por gravidade, devido à existência de pesos na parte inferior da mesma. A jaula pode também contemplar o equipamento necessário para sua operação, manutenção e monitorização, tais como os sistemas de alimentação, de limpeza de redes e monitorização de pescado. É a tipologia de jaulas mais usada em todo o mundo, e pode ser projetada numa enorme diversidade de dimensões e configurações (Fula, 2013, Korsøen et al., 2012). Esta configuração permite igualmente a fácil adaptação ao tamanho e às necessidades particulares de cada espécie de peixe: A jaula pode ter um fundo liso e rígido de forma a poder albergar peixes planos (Pleuronectiformes).

2. PROBLEMA

A aquacultura é um setor emergente e é usualmente associado aos mesmos riscos (Figura 4) geralmente encontrados na agricultura, mas vários trabalhos aquícolas têm perigos acrescentados devido ao envolvimento de água e trabalhos noturnos (Myers, 2010). A maior parte dos acidentes são causados por quedas, esmagamentos ou perfurações na realização de tarefas diárias, como alimentação ou manutenção das jaulas (Myers, 2010). Atualmente, no sector alimentar existe muita concorrência, pelo que a pressão exercida aos produtores para

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baixar preços e aumentar produção é muito grande. Consequentemente, os aquicultores têm que garantir que, durante o ciclo produtivo, o peixe tenha um crescimento saudável e chegue ao período de pesca em boas condições para venda (Carrasquinho, 2009). Os funcionários aquícolas são encarregados de ponderar riscos, realizar as tarefas de manutenção e manter a segurança operacional, enquanto expostos à imposição de produção no menor tempo possível. Mesmo nas operações que possam envolver risco para o trabalhador ou para o equipamento, prevalece sempre o cuidado pelo peixe (Størkersen, 2012). É recorrente que os acidentes partam de más decisões, muitas vezes causadas pelo stress dos trabalhadores em manter as instalações em bom funcionamento, subvalorizando alguns riscos (Myers, 2010).

Figura 3. Vista esquemática de uma jaula flutuante aquícola.

Figura 4. Registo fotográfico de acidente de trabalho nas instalações aquícolas. Um dos funcionários escorregou

sendo arrastado pela plataforma, o incidente resultou na perda de cerca de 50 kg de peixe. A boa manutenção das instalações e processamento do peixe até chegar ao tamanho de venda, encontra-se sujeita a uma sequência de fatores internos e externos que podem comprometer a viabilidade das explorações; desde logo a limpeza é um dos critérios determinantes na

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sustentabilidade e exequibilidade das instalações (Shainee et al., 2013). Apesar da sua importância, esta operação é muitas vezes subvalorizada, devido aos seus efeitos na produção não serem imediatos. No entanto, a limpeza das redes afeta a circulação da água, podendo atrasar em muito o crescimento do peixe, e consequentemente atrasar o retorno financeiro, para além de constituir um decréscimo na qualidade do pescado.

As estruturas que se encontram imersas em água marítima tornam-se rapidamente colonizadas por organismos marinhos, num processo que se intitula de bioincrustação (Figura 5) (Railkin, 2004). A bioincrustação reduz em muito a resistência dos materiais e do equipamento, danificando-os fisicamente através de abrasão e carga excessiva. As comunidades de organismos presentes nas incrustações podem competir por recursos diretamente com o pescado, podendo inclusive albergar doenças e predadores. Adicionalmente, pode ter efeito direto no nível de toxinas presentes no pescado, alterando a qualidade da água, devido à falta da sua renovação dentro da rede. Os custos associados podem ser bastante significativos e os efeitos diretos na redução do crescimento do pescado pode comprometer a viabilidade da exploração, acrescendo que pode ainda reduzir substancialmente a qualidade do peixe (Willemsen, 1994).

Figura 5. Imagem de uma rede aquícola com severa bioincrustação.

Por sua vez, a alimentação (Figura 6) numa produção aquícola representa o maior custo fixo de produção, podendo alcançar os 60% (Carrasquinho, 2009). Grande parte dos recursos humanos e logísticos destinam-se a esta tarefa, pelo que é essencial que o processo de alimentação esteja bem regulado e otimizado de forma a evitar perdas de ração e consequentemente de capital investido (Rubio, 2007).

O pescado deverá ser alimentado o maior número de vezes possível por dia, estando dependente das condições do mar e atmosfera. Apesar do peixe poder permanecer sem ser alimentado durante um longo período, durante este espaço de tempo também não se desenvolve, comprometendo a produção (Carrasquinho, 2009). No entanto, o pescado nem sempre mostra apetite para se alimentar. Estas mudanças no seu comportamento podem dever-se a fatores ambientais ou de alterações biológicas, sendo difícil a sua previsão. As flutuações no apetite determinam quando a ração é consumida ou ignorada, o que tem grandes implicações na racionalização da produção. A subalimentação pode significar que o pescado não se desenvolva dentro do tempo pretendido, tornando a produção insustentável. Por outro

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lado, a sobrealimentação pode significar que o pescado ignore alguma da ração, promovendo perdas e consequentemente desperdício. Na Figura 6(a) encontra-se representado um sistema convencional de alimentação por pressão de água, cuja oxidação em estado avançado fez com que o sistema deixa-se de funcionar. A oxidação dos sistemas alimentares é um acontecimento recorrente pelo que parte das instalações aquícolas em zonas geográficas e climatéricas adversas recorram a métodos de alimentação manual por arremesso de ração com um balde ou pá (Figura 6 b)).

Existe uma grande pressão sobre os produtores aquícolas para se assegurarem que o pescado se alimenta de forma correta, ao mesmo tempo que garantam a otimização possível da ração. Em adição, a comida desperdiçada pode significar um problema para o ecossistema envolvente e perdas capitais significativas para a exploração (Huntingford et. al., 2012).

a) b) Figura 6. (a) Sistema de alimentação aquícola por pressão de água; e (b) balde utilizado para alimentação das

jaulas por arremesso da ração. 3. OBJETIVOS E MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO

Os métodos utilizados para a realização da investigação procuraram analisar e compreender a dinâmica nas interações entre os diferentes intervenientes numa produção aquícola, aquicultores, sistemas de produção e condicionantes ambientais. A investigação seguiu uma abordagem designada user centered aproach, utilizando a observação direta participante como fonte de obtenção de dados (Figura 7), permitindo uma maior proximidade do investigador às dificuldades e preocupações dos funcionários. Uma posterior análise da observação foi realizada com o intuito de ajudar a equipa de projeto a desenvolver soluções que, para além de cumprirem a sua função de produção e maneio de pescado, o façam minimizando o risco de acidentes dentro das instalações e otimizando o processo produtivo.

Foram utilizados, na elaboração desta investigação, métodos de observação tais como: Visita de campo, Cinco fatores humanos, Etnografia por Fotografia e Etnografia por Vídeo. A maior parte destes métodos foram alicerçados no trabalho de Kumar (2013), que apresenta novas abordagens a um problema antigo: a aproximação do investigador aos utilizadores no seu contexto, baseados numa abordagem centrada no utilizador e na compreensão e satisfação de necessidades. A visita às instalações permitiu também o experimento em primeira mão (Figura 8) de atividades como a deslocação nas estruturas das jaulas e a sujeição à ondulação constante a que os funcionários estão diariamente expostos. Este foi um importante fator na criação de empatia para com os funcionários.

Foram utilizados ainda métodos específicos para insights e Matriz de Clusters de enquadramento do Systems Oriented Design2011), um mapa extensivo de informação que permite obter uma visualização holística sobre todo o sistema em estudo (Sevaldson, 2011

Figura 7. Estrutura m Posteriormente, a realização de entrevistas etnográficas permitiu o diálogo direto entre o investigador e os funcionários da empresa, contribuindo com partilha de experiências por

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Foram utilizados ainda métodos específicos para o tratamento de dados:e Matriz de Clusters de Insights. Foram também utilizados métodos aplicados no

Systems Oriented Design, como é o caso do gigamapping , um mapa extensivo de informação que permite obter uma visualização holística sobre

Sevaldson, 2011).

. Estrutura metodológica utilizada para a investigação.

Posteriormente, a realização de entrevistas etnográficas permitiu o diálogo direto entre o investigador e os funcionários da empresa, contribuindo com partilha de experiências por

: Observações para . Foram também utilizados métodos aplicados no

, como é o caso do gigamapping (Sevaldson, , um mapa extensivo de informação que permite obter uma visualização holística sobre

Posteriormente, a realização de entrevistas etnográficas permitiu o diálogo direto entre o investigador e os funcionários da empresa, contribuindo com partilha de experiências por

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parte dos funcionários, obtendo importantes informações sobre as dificuldades na execução das tarefas e nas limitações dos sistemas atuais de produção. Estes diálogos possibilitaram, ainda, a clarificação de dúvidas e questões pelo investigador, levantados em estudos e investigações publicadas. As entrevistas tornaram-se importantes contactos, pelo acesso a informação privilegiada, sobre questões resultantes do conhecimento empírico, que normalmente não são referidas em estudos ou relatórios da investigação.

O registo fotográfico e em vídeo possibilitou a obtenção de dados que demonstram os esforços inerentes à atividade. A posteriori este método permitiu a partilha das experiências com os restantes membros da equipa de design e desenvolvimento, facilitando a compreensão dos problemas e constrangimentos dos diferentes sistemas e componentes de uma produção aquícola e na execução das tarefas que permitam o seu funcionamento eficaz e produtivo. Em algumas ocasiões, durante a visita, a utilização de lentes de aproximação variável, permitiu, a partir de terra, a observação de situações ocorridas na plataforma e das jaulas, sem interferência pelo investigador. Adicionalmente, o registo vídeo possibilitou obter informação adicional ao capturar períodos inteiros de tempo e áudio que depois de filmado, pôde ser revisto quando necessário pela equipa de projeto.

Figura 8. Registo fotográfico de observação participante por um dos investigadores.

A partir das observações captadas realizou-se uma análise que permitiu obter um grupo de considerações intituladas de insights. Usando por base estes insights, foi desenvolvida uma tabela de matriz de grupos que através do relacionamento cruzado, evidenciando possíveis interconexões existentes. Posteriormente foi conferida uma avaliação numérica estipulando o nível de interação. Às relações residuais foi conferido o nível “1”, o “2” foi conferido a relações indiretas e “3” às relações diretas e dependentes. Consoante a classificação dos insights foi completando uma a tabela com, três grandes grupos de insights relacionados. Um primeiro grupo foi associado a um conjunto de problemas específicos, relacionados com a acessibilidade e movimentação dos trabalhadores dentro das instalações e às dificuldades de movimentação de cargas pesadas entre as jaulas, a plataforma flutuante e as embarcações.

O segundo grupo encontra-se associado a problemas derivados das tarefas que colocam em risco a integridade física dos funcionários. Destacando-se a existência de comportamentos

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exercidos entre os funcionários por os considerarem práticas comuns. O terceiro grupo foi associado a problemas de produção e falhas na automatização da produção. A este grupo encontra-se associado o facto de não haverem atualmente respostas sustentáveis economicamente de sistemas automatizados de auxílio à produção aquícola especificamente dirigidas para pequenas e médias empresas. O quarto grupo é referente a um conjunto de problemas relacionados com a manutenção e preservação dos sistemas e subsistemas de auxílio à prática aquícola. A manutenção é um dos fatores que mantém grandes custos fixos ao longo da produção. Devido às instalações se encontrarem no oceano, a deterioração por oxidação (Figura 9) é muito grande. Como tal, a esperança de normal funcionamento de um sistema é curta. A inexistência de proteção sobre estes sistemas faz com que as peças mecânicas sejam diretamente expostas às intempéries e salinidade, acelerando o processo de deterioração.

Figura 9. Registo fotográfico de um sistema aquícola deteriorado por oxidação metálica.

Considera-se, assim, que os quatro grandes fatores a ter em conta na intervenção do design e desenvolvimento serão: a movimentação e organização de pessoal nas instalações; exposição a riscos de acidente; gestão e otimização de recursos e manutenção dos sistemas.

Dada a complexidade emergente dos problemas retratados, foi desenvolvido um Gigamaping como ferramenta de organização sistemática dos grupos e observações resultantes da observação. Esta ferramenta permitiu uma representação do sistema aquícola de forma simplificada e de fácil interpretação aos elementos do grupo de desenvolvimento, possibilitando uma melhor compreensão dos sistemas que poderiam ser complementares e os que são passiveis de funcionarem melhor autonomamente.

A utilização de uma matriz de comparação permitiu a avaliação dos sistemas atualmente existentes no mercado, conforma as indicadores baseados nas necessidades encontradas durante o processo de análise de dados (Fula, 2013). A coleção de variáveis obtidas das ferramentas de análise foi posteriormente exposta a discussão no grupo de desenvolvimento de projeto. No capítulo 4 falar-se-á dos resultados que foram considerados plausíveis de integrar o brief dos diferentes projetos e que faram base conceptual para o desenvolvimento dos mesmos.

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4. RESULTADOS DE INVESTIGAÇÃO

Após a investigação, foi desencadeado o processo de desenvolvimento das soluções para os dois sistemas a integrar no projeto CLEANxFEED coordenado pelo INEGI - Instituto de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial. Incluindo um sistema de limpeza de redes e um sistema de alimentação de pescado. Os requisitos técnicos recolhidos durante a investigação, permitirão elaborar uma especificação preliminar do desempenho esperado para cada um dos sistemas. Nesta fase serão ainda analisadas as diferentes soluções de automação e controlo existentes e será avaliada a sua adequação à aquacultura e aos conceitos em desenvolvimento.

Seguidamente, iniciar-se-á um processo exploratório desenvolvendo conceitos a adotar para os sistemas de limpeza e de alimentação: definição das suas componentes estruturais, sistema da automação e controlo (robótica), flowcharts para a programação e modelos para as interfaces gráficas e tácteis. No final desta fase deverá ser possível identificar uma solução adequada e desejável para cada sistema. Esta solução será desenvolvida em pormenor e construído um protótipo que será montado numa instalação experimental da Aquamar em ambiente próximo do ambiente real, para permitir testar os novos sistemas e validar o desempenho conforme os objetivos planeados. Nesta fase de demonstração experimental, como em todas as atividades de investigação industrial anteriores, o consórcio prestará particular atenção ao esforço de instalação e de manutenção dos novos sistemas, em todas as vertentes de viabilidade discutidas anteriormente (técnica, económica e ambiental/ecológica).

Da investigação realizada surgem ainda os seguintes objetivos específicos, relativos à otimização e ao aumento da eficiência laboral dentro das instalações:

Sistema de limpeza de redes:

- Eliminar ou otimizar a troca de rede;

- Reduzir os riscos de acidentes e más posições laborais;

- Reduzir a frequência de limpeza, atualmente mensal;

- Reduzir os custos fixos de manutenção, sobretudo através da redução significativa da afetação de recursos humanos;

- Minimizar o custo com intuito de baixar o preço de venda;

- Eliminação da suscetibilidade às condições atmosféricas;

- Usar e desenvolver tecnologia apropriada às especificidades da costa atlântica;

- Facilitar a organização e aplicação do sistema em instalações previamente concebidas.

Sistema de alimentação do pescado:

- Otimizar a frequência de alimentação, atualmente de 2-3x/dia;

- Reduzir os custos fixos de manutenção, sobretudo através da redução significativa da afetação de recursos humanos;

- Reduzir os riscos de acidentes e más posições laborais;

- Minimizar o custo com intuito de baixar o preço de venda;

- Facilitar o controlo do fornecimento da ração;

- Eliminação da suscetibilidade às condições atmosféricas;

- Usar e desenvolver tecnologia apropriada às especificidades da costa atlântica;

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- Facilitar a organização e aplicação do sistema em instalações previamente concebidas.

5. CONCLUSÕES

O crescimento da população humana a nível mundial tem aumentado a necessidade de produção de alimentos. A agricultura e a pecuária são recursos limitados e as cotas pesqueiras por sua vez, são um recurso já sobre explorado. A aquicultura surge, assim, como um importante fator na satisfação da necessidade de alimento. Portugal é um dos maiores consumidores, per capita, de peixe no mundo, mas o panorama atual de produção satisfaz menos de metade da procura nacional. A costa atlântica é muito exposta a intempéries e fortes correntes marítimas, pelo que os locais autorizados para exploração nem sempre reúnem condições adequadas para a implementação de explorações. Em regra, as soluções para auxiliar a produção aquícola são desenvolvidas em países cuja exposição às condições naturais permitem a utilização de locais abrigados para a exploração, tal como os Fiordes. Estes sistemas tornam-se desadequados quando em utilização em zonas mais expostas, como a costa Atlântica.

Considerando que os sistemas de produção baseados na utilização de jaulas flutuantes requerem um investimento muito menor que os restantes e que a sua integração não requer construção de infraestruturas complementares como estações de tratamento de água, estes sistemas continuam a ser os mais adaptados à realidade nacional. Este estudo permitiu identificar as áreas prioritárias de intervenção e definir as principais preocupações e objetivos da mesma.

Os funcionários que trabalham nas instalações em mar estão constantemente sujeitos à exposição a um ambiente de trabalho desfavorável, sendo atualmente uma das indústrias mais expostas a acidentes no trabalho. A ondulação constante, as intempéries, a exposição solar e ao sal, locomoção em piso escorregadio, o esforço físico, as posturas não ergonómicas, o levantamento e movimentação de cargas pesadas, as tarefas repetitivas e operações de mergulho com o iminente risco associados à presença de redes em movimento são algumas das situações que fazem perigar a saúde e segurança dos trabalhadores. Esta questão emerge como uma das constatações observadas a partir da prática e que deve permanecer presente nas propostas de modificação nas áreas de intervenção sugeridas.

O aumento da produtividade, expresso pelo número de peixes passiveis de venda, normalizados por tamanho e peso está dependente da eficiência do sistema produtivo e, consequentemente, dos sistemas auxiliares. Sendo esta a finalidade do projeto, as áreas de intervenção identificadas como prioritárias, neste estudo, são os sistemas de limpeza de redes e de alimentação de peixe.

A alimentação representa, na aquacultura, cerca de 60% dos custos de produção. Verifica-se que os atuais sistemas de alimentação encontram-se desajustados às necessidades: os sistemas manuais porque não cumprem as metas pretendidas de alimentação diária e semanal e os automatizados porque se encontram projetados para realidades geográficas, marítimas, e climatéricas diferentes das existentes na costa atlântica. Assim sugere-se que o sistema a ser projetado seja automatizado de forma a reduzir significativamente a alocação de recursos humanos diretos na atividade.

A limpeza de redes constrange a circulação de água dentro das jaulas, o que influencia o tempo de crescimento do peixe, pelo que se justifica a intervenção nesta área. O sistema deve ser autónomo e reduzir o tempo de troca de redes ou eliminar por completo a sua necessidade, mantendo a capacidade de fácil integração em instalações já operacionais. O projeto

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CleanxFeed terá englobadas preocupações referentes aos resultados estipulados na investigação, numa tentativa de reduzir os riscos de acidentes de trabalho, reduzir o contacto direto dos funcionários aquícolas com as jaulas e prevalecer o uso da tecnologia sobre a mão-de-obra, desenvolvendo sistemas de auxílio à prática aquícola no âmbito da limpeza de redes e alimentação de pescado que interajam com os restantes sistemas de apoio e produção de forma coerente e potenciando aumentos na produção.

A inserção do design industrial no desenvolvimento de dispositivos de apoio à produção aquícola em locais com condições climatéricas adversas considera-se pertinente devido à potencialidade desta disciplina ajudar à integração de variáveis referentes à interação humana, possibilitando o desenvolvimento de sistemas mais adaptados e passiveis de aumentar as condições laborais e aumentar produtividade e eficiência da exploração.

Este estudo foi limitado por questões temporais próprias da realização de uma tese de mestrado integrado, pelo que os seus objetivos, a priori, contemplaram exclusivamente a exploração das dificuldades decorrentes da atividade e fornecimento de indícios para o desenvolvimento de estratégias a desenvolver em projetos futuros.

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