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O projeto e exposição DERIVAS POR SÃO PAULO é fruto de um trabalho realizado com os alunos do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Oswald de Andrade, no qual, durante um período de três meses, propusemos o estudo das cidades sob três matrizes diferentes - História, Geografia e Artes Visuais -, tendo como objetivo central a compreensão das cidades contemporâneas, em especial o caso de São Paulo. A captura das imagens foi feita nos diferentes momentos em que realizamos saídas de campo pela cidade, tendo como método de investigação a Teoria da Deriva, proposta por grupos situacionistas, em que o caminhar e o olhar não seguem um roteiro predefinido, mas, sim, as motivações geradas pelo ambiente sobre o observador. As áreas propostas de estudo são delimitadas, mas o percurso é construído espontaneamente pelo observador, de acordo com um processo de imersão no espaço urbano.

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Licença: Atribuição – Uso Não Comercial – Compartilhamento pela mesma Licença (by-nc-sa)mais informações: http://creativecommons.org/

licenses/by-nc-sa/3.0/br/2013

DERIVAS POR SÃO PAULO:

O URBANO E SEU COTIDIANO

O projeto e exposição DERIVAS POR SÃO PAULO é fruto de um trabalho realizado com os alunos do 2º ano do Ensino Médio do Colégio Oswald de Andrade, no qual, durante um período de três meses, propusemos o estudo das cidades sob três matrizes diferentes - História, Geografia e Artes Visuais -, tendo como objetivo central a compreensão das cidades contemporâneas, em especial o caso de São Paulo.

A captura das imagens foi feita nos diferentes momentos em que realizamos saídas de campo pela cidade, tendo como método de investigação a Teoria da Deriva, proposta por grupos situacionistas, em que o caminhar e o olhar não seguem um roteiro predefinido, mas, sim, as motivações geradas pelo ambiente sobre o observador. As áreas propostas de estudo são delimitadas, mas o percurso é construído espontaneamente pelo observador, de acordo com um processo de imersão no espaço urbano.

Conceitualmente, o Estudo do Meio propõe uma análise dos processos de urbanização na cidade de São Paulo, do século XIX ao atual, tendo como foco de análise a expansão da mancha urbana, que vai do centro antigo de São Paulo em direção às zonas oeste e sudoeste, marcada pelas centralidades das avenidas Paulista, (Nova) Faria Lima e Luiz Carlos Berrini. Nossa visão vai de encontro às centralidades, que também constituem territórios de contraste aos modelos hegemônicos de desenvolvimento urbano, como no caso do Brás, do Bom Retiro e da região central de Santo Amaro.

O estudo tem como proposta geral o entendimento das dinâmicas que orientam o desenvolvimento das cidades contemporâneas, bem como suas características espaciais e sociais. A ideia central é mostrar como o discurso do desenvolvimento urbano, assim como os modelos ou modos de vida urbana, concretizam o desenvolvimento da cidade marcada pela perda do sentido de espaço público, fortalecendo uma experiência marcada pela fragmentação dos espaços, pelo consumo individual e a pela segregação econômico-espacial, reduzindo a experiência urbana esta entendida como o lugar da vivência compartilhada e de produção social.

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As principais localizações selecionadas para os exercícios de observação, análise e registros fotográficos na cidade de São Paulo são:

- Uma saída em grupo indicada pelo professor e feita de forma independente pelos alunos como um exercício de circulação, observação e registro fotográfico, incluindo um relatório do trajeto pela Avenida Paulista e arredores, para observação da paisagem e das relações sociais presentes nesse espaço da cidade.

- Uma primeira saída coletiva, pelo bairro do Brás e Zona Cerealista, para a observação de paisagens antigas da cidade e os processos de refuncionalidade e reforma urbana, bem como os atores sociais presentes nesses espaços.

- Segunda saída coletiva, pelo centro de São Paulo, passando pelas localizações da Sé, Largo São Francisco, Praça do Patriarca, São Bento, 25 de Março, Mercado Municipal, Avenida Senador Queirós, Vale do Anhangabaú, Teatro Municipal, Praça da República, Avenida Ipiranga, Luz e Parque da Luz. Observação e análise dos processos iniciais que orientavam a urbanização paulistana, bem como dos processos de desenvolvimento e decadência estrutural e social das regiões centrais.

- Terceira saída coletiva, seguindo a linha ferroviária Cidade Universitária (oeste-sul) – o centro da antiga Vila de Santo Amaro, atual bairro de São Paulo. Roteiro de observação e registro da nova urbanização de São Paulo, associada ao capital corporativo global nas localizações e arredores das estações Berrini e Vila Olímpia.

Os principais questionamentos que orientam a imersão dos alunos nos diferentes espaços urbanos são:

- O que a cidade expressa através de suas paisagens? - O que a cidade comunica através de sua arquitetura, traçados ou “arte pública”? - Como compor uma visão da cidade atual através do estudo das cidades

contemporâneas, com especial ênfase a cidade de São Paulo? - Que tipo de população circula por esses ambientes? Como circula?

Um dos objetivos principais desse Estudo do Meio é desenvolver a percepção de que o espaço da cidade compõe um território de conflitos e interesses opostos, além de um lugar de expressão e comunicação visual-verbal permanente, que inclui diversos segmentos e atores sociais, como o publicitário, o administrador, o construtor, o artista de rua, entre outros.

Outra finalidade, ainda, é a percepção de que a cidade é produto de diferentes tempos e relações sociais que, embora temporalmente difusas e segregadas espacialmente, conjugam camadas de realidades sobrepostas - uma acumulação desigual de tempos unificada por instituições de poder centralizadas na figura do Poder Público.

Trabalho realizado com os alunos do 2° ano do ensino médio (2012) do Colégio Oswald de Andrade sob orientação dos professores Amadeu Cardoso Jr e Lizânias de Souza Lima. Curadoria da exposição fotográfica, compilação e edição do livro digital Amadeu Cardoso Jr. [[email protected]]

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“arte que te abriga arte que te habitaarte que te falta arte que te imita

arte que te modela arte que te meditaarte que te mora arte que te muraarte que te todo arte que te parte

arte que te torto ARTE QUE TE TURA” Paulo Leminski

À deriva na cidade, íamos por onde ela nos chamava. Uma miscelânea visceral de pessoas, arquitetura e arte. Três bairros diferentes, três sentimentos distintos. Andamos pelas ruas do Brás, bairro de caos. O comércio toma conta das ruas. Abordagens constantes que nos oferecem promoções, descontos, ou qualquer coisa, contanto que se pague. Por mais adentro do bairro, fábricas abandonadas e lugares despencando. Ninguém passa por lá, ninguém quer ver.

O centro está desfigurado. Ele fora totalmente desvitalizado. A grande maioria dos legítimos habitantes do centro são aqueles que moram na rua. Prédios vazios e ruas lotadas complementam o cenário de desigualdade. Ao mesmo tempo gente, movimento que nos diz que há vida por lá. Ocupemos o centro!

Em Santo Amaro, foi possível observar duas realidades totalmente opostas. Em contraste com a maior parte urbana da cidade de São Paulo, viamos edifícios e construções extremamente modernos, feitos única e exclusivamente para interesse privados deslocalizados, para corporações globais. Enquanto isso, do outro lado da ponte, fomos capazes de ver, através dos reflexos dos arranha céus espelhados, a realidade de uma grande parte da população: o conjunto habitacional de Cingapura e a favela do Real Parque, um rio poluído que ninguém olha mais para ele.

(relato de um dos grupos do segundo ano - OUT/2012)

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voltando no tempo

da sacada do meu quarto...

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diagonal dois tempos

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a fábrica

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faça sua história

arte cidade

industrialização

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o que sobrou da feira

jardineiro “caminhante”

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fachada

Eletrificado

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redes e quadrados

atravessando a linha do trem

reminiscências

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desconstrução

porta aberta

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vias da modernidade

TRENS URBANOS

Não são como os ratos ou os vira-latas.

Nunca desviam,

os trens.

Este sempre acompanha o rio morto vivo.

Aqui dentro, uns lutam pra dormir,

outros, pra acordar.

Uns achando que a vida é preparação pra morte.

Outros, que a morte é o motor da vida.

Outros não acham nada. Sobrevivem.

Os meus botões pensam:

morte em vidaé que é problema.

Cocteau pensava além: a vida é uma queda na horizontal.

O trem para. A porta se abre. Na falta,

qualquer rua, pra mim, é rio.

Ruy Proença (Visão do térreo. São Paulo: Editora 34,

2007. p.41)

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em algum lugar do passado...

ferro velho

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fachada - Brás

mosaico

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SÃO PAULO É SELVA, NÃO É?

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massa-matéria

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SEGUNDO PAPEL

a cidade é o óbvio, o que salta aos olhos

ulula, o que brilha e fede

a cidade é o cais caos sob controle

outro dia de luto, de luta, de luxo

a cidade é perder outro sol que agride

outra lua (a cidade comporta), mesma via

e é sempre tarde e o lugar que falta

e o que nos prende, perene, perece

Tarso de Melo (Planos de fuga e outros poemas.

São Paulo: Cosac Naify; Rio de Janeiro: Viveiros de Castro Editora, 2005. p.70)

NOTURNO DA RUA MARQUÊS DE ITU

Começa na Praça da República de maneira desde já oblíqua e ambígua

e vai pondo árvores abstratas em seu caminho.

Passantes passam-lhe ao longo e ao estreito, conhecidos meliantes

e mundanas líricas sem escamas e sem dentes

ou de sorriso afiado como um corte, professores de medo em uniformes

de um azul mais escuro do que o preto da noite que dissolve esses contornos

e marginais possíveis, impossíveis trazendo a punição na testa

como um emblema. O uivo dolorido da polícia

estilhaça o sono nas calçadas. A culpa pula, esconde-se na esquina,

espreita atrás do cartaz, dá boa-noite e vai punir-se

no porão do edifício, perplexa. A rua que se afina segue os fios

do ônibus elétrico: transatlântico salão iluminado deslizante

caixão claro vazio baleia oca sob a luz corrompida da lua. A rua

transporta para o lado das Perdizes, Pacaembu, Lapa, Arvoredo, Tempo

os veículos que analisa, canaliza, o imaginário corredor que é o ônibus

de olhares furados. Enquanto, maliciosa, pisca a análise,

a rua calada e fria mais que a lua vai derivando tudo para o lado

do longe e para ele ela deriva seu

sempre que é simplesmente um nunca.

Rubens Rodrigues Torres Filho (Novolume. São Paulo: Iluminuras, 1997. p.77)

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i-lustrando

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me dêem seus ouvidos

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carga pesada

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amor em sp

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VERACIDADE

a cidade se comunica através das geo-grafias urbanas

o simbolismo arquitetônico, o estilo ou falta dele

estão permanentemente firmando um lugar,

uma ideia, uma linha.

E no meio dessa matéria os sinais, as placas,

as rotinas de deslocamentos diários.

Fluxo do materialservindo a nossa (des)

orientação

E a arte? onde está?

arte pública, arte do governo,

versão ou subversão, mas afinal de contas

o que é arte, mesmo?

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desorientaçãoo canto da sereia

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símbolos do poder

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com o tempo

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mi(X)tura

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resistência

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mural

cidade aberta-cidade luz

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O VENTO NESSA CIDADE

O vento nessa cidade vem sempre na mão contrária.

Fumaça, papéis e poeira pegam carona, sem rumo

(pessoas também, se bem que elas não se diferenciam muito

de papéis, poeira ou fumaça). O preto, que à mão só tem dedos,

grava na sarjeta o mapa de seu tesouro escondido,

já são vistos traços brancos, mas vamos de olhos cerrados,

pois nessa cidade o vento não aceita ser contestado.

Paulo Ferraz (Evidências pedestres. São Paulo: Selo Sebastião Grifo, 2007. p.14)

ÀS MINHAS COSTAS

As portas do metrô mastigam o ar condicionado.

Estou em trânsito, com os demais. Percorremos a rede incorpórea

que há de permanecer.

Não se ultrapassa a linha amarela. Nada cheira. E a escada rolante

- áspera via - até se alegoriza

ao conduzir-nos de volta ao simulacro passageiro das avenidas.

Na saída, ponho os óculos escuros.

Sérgio Alcides (O ar das cidades: poemas (1996-2000).

São Paulo: Nankin, 2000. p.33)

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ligado no céu

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precipitação

de quem é o pedaço!

quantos quilos?

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o beijo

art-nouveau?

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A CIDADE

Por mais que insistas em recusar, esta é, sim, a tua cidade concreta

onde tantos te ofereceram amizade e o amigo partiu pela porta secreta.

Andaste cabisbaixo pelas calçadas remoendo as humilhações do trabalho.

Marcaste este chão com teus passos, dores recolhidas como um rebotalho.

Aqui nasceram os filhos, a epifania das infâncias que sumiram passageiras.

Abriste envelopes com muito medo, receoso daquelas notícias derradeiras.

Tu que amas a simetria permanente viste a barriga da cidade arregaçada.

Como nas telas de Anselm Kiefer, tens nela tuas perplexidades retratadas.

Donizete Galvão (O homem inacabado. São Paulo: Portal,

2010. p.59)

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extinto eletri-cidade

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Não existem cidades fora. Difícil de saber o que está fora. Existem cidades dentro, ou melhor, cidades dentro da CIDADE. Boa parte do desenvolvimento e do planejamento urbano pós 1970 está orientado a dividir, a fragmentar o sentido público do viver em cidade. O importante é criar espaços e mercados segmentados, atender aqueles que podem consumir ideologias ou menos que isso, estratégias de marketing. Uma noção precária do habitar, do comum, do que é civil.A experiência da cidade ABERTA, da ÁGORA, DA CENTRALIDADE QUE REÚNE esta sublimada por praças de alimentação, consumo como forma de vida e a visão de “dentro” do meu carro.Medo do outro, medo da persistência do projeto da cidade REAL, que lhe aparece sempre a frente, mesmo que seja através dos muros e de forma inacabada, violenta.

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1° MUNDO?

Cingapura ou Real Parque?

Espelho ponto de fuga

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desenvolvimento ou avanço?

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fora do eixo

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Miragem do mercado (dentro do trem na Marginal) ou Miragem da Marginal

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ilusão e realidade

experimenta! experimenta! ...

FORA!

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Saída pela direita ...Afê, sexta tá longe?

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ascensão social? O que seria daquilo, sem isso?

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insípido, inodoro e monocolor

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Atenção: máquinas trabalhando!

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E LA NAVE VA. “Ma vá pra onde?”

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anexos

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Teoria da deriva

A teoria da deriva é um dos trabalhos de autoria do pensador situacionista Guy Debord. A deriva é um procedimento de estudo psicogeográfico – estudar as ações do ambiente urbano nas condições psíquicas e emocionais das pessoas.

Partindo de um lugar qualquer e comum à pessoa ou grupo que se lança à deriva deve rumar deixando que o meio urbano crie seus próprios caminhos. É sempre interessante construir um mapa do percurso traçado, esse mapa deve acompanhar anotações que irão indicar quais as motivações que construiu determinado traçado. É pensar por que motivo dobramos à direita e não seguimos retos, por que paramos em tal praça e não em outra, quais as condições que nos levaram a descansar na margem esquerda e não na direita… Em fim, pensar que determinadas zonas psíquicas nos conduzem e nos trazem sentimentos agradáveis ou não.

Apesar de ser inúmeros os procedimentos de deriva, ela tem um fim único, transformar o urbanismo, a arquitetura e a cidade. Construir um espaço onde todos serão agentes construtores e a cidade será um total.

Essas idéias, formuladas pela Internacional Situacionista entre as décadas de 1950 e 1970, levam em conta que o meio urbano em que vivemos é um potencializador da situação de exploração vivida. Sendo assim torna-se necessário inverter esta perspectiva, tornando a cidade um espaço para a libertação do ser humano.

Programa elementar da oficina de urbanismo unitário

1. Inexistência do urbanismo e inexistência do espetáculo O urbanismo não existe: nada mais é que uma “ideologia”, no sentido marxista da palavra. A arquitetura realmente existe, do mesmo modo que a coca-cola: é uma produção envolta em ideologia, mas real, satisfazendo falsamente uma falsa necessidade. Enquanto o urbanismo é comparável a exibição publicitária que rodeia a coca-cola, pura ideologia espetacular. O capitalismo moderno, que organiza a redução de toda vida social ao espetáculo, é incapaz de dar outro espetáculo que o de nossa alienação. Seu sonho urbanístico é sua obra-prima.

2. A planificação urbana como condicionamento e falsa participação O

desenvolvimento do meio urbano é a modelação capitalista do espaço. Representa a escolha de uma certa materialização do possível, com exclusão de outras. Assim como a estética, cujo movimento de decomposição permanecerá, pode ser considerada como um ramo bastante negligenciado da criminologia. Entretanto, o que o caracteriza no nível de “urbanismo”, com relação a seu nível simplesmente arquitetônico, é exigir um consentimento da população, uma integração individual na colocação em andamento desta condição burocrática do condicionamento. Tudo isso é imposto por meio da chantagem da utilidade. Se esconde que a importância completa desta utilidade é posta a serviço da reedificação. O capitalismo moderno faz renunciar a toda crítica pelo simples argumento de “faz falta um teto”, o mesmo que acontece com a televisão com o pretexto de que “a informação é necessária” e a diversão. O que leva a esquecer a evidência de que esta informação, esta diversão, este modo de habitação, não são feitos pelas pessoas, mas sem elas e contra elas.Toda planificação urbana só pode ser compreendida unicamente como o campo da publicidade-propaganda de uma sociedade, ou seja: a organização da participação em algo no qual é impossível participar.

3. Circulação: estágio supremo da planificação urbana A circulação é a organização do isolamento de todos. É nisso que ela constitui o problema dominante das sociedades modernas. É o contrário do reencontro, a absorção das energias disponíveis para reencontros ou para qualquer tipo de participação. A participação, que se fez impossível, é compensada sob a forma de espetáculo. O espetáculo se manifesta no habitat e no deslocamento (status da moradia e dos veículos pessoais). Porque de fato não se mora em um bairro de uma cidade, mas no poder. Se mora em algum lugar da hierarquia. No cume dessa hierarquia, os graus podem ser medidos pelo grau da circulação. O poder se materializa mediante a obrigação de se estar presente cotidianamente em lugares cada vez mais numerosos (almoços de negócios) e cada vez mais afastados uns dos outros. Se poderia caracterizar o alto executivo moderno como um homem que se encontra em três capitais diferentes em um só dia. 4. A distância diante do espetáculo urbano A totalidade do espetáculo que tende a integrar a população se manifesta também como a organização das cidades e como rede permanente de organizações. É uma estrutura sólida para proteger as condições existentes da vida. Nossa primeira tarefa é permitir às pessoas que cesse de se submeter ao meio e aos padrões de

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comportamento. O que é inseparável de uma possibilidade de se reconhecer livremente em algumas zonas elementares delimitadas para a atividade humana. As pessoas estarão obrigadas ainda durante muito tempo a aceitar o período reificado das cidades. Mas a atitude com que o aceitarão pode ser mudada imediatamente. Deve-se sustentar a difusão da desconfiança para os jardins de infância ventilados e coloridos que constituem, tanto o Leste como o Oeste, as novas cidades dormitório. Só a desilusão estabelecerá a questão de uma construção consciente do meio urbano.

5. Uma liberdade infragmentável O principal êxito da planificação atual das cidades faz esquecer a possibilidade do que nós chamamos urbanismo unitário, ou seja, a crítica viva, alimentada pelas tensões de toda vida quotidiana, dessa manipulação das cidades e de seus habitantes. Crítica viva quer dizer estabelecimento das bases de uma vida experimental: reunião de criadores de sua própria vida em terrenos dispostos para seus fins. Essas bases não poderão ser reservadas a “diversões” separadas da sociedade. Nenhuma zona espaço-temporal é totalmente separável. De fato, sempre existe pressão da sociedade global sobre as atuais “reservas” de férias. A pressão será exercida no sentido inverso nas bases situacionistas, que cumprirão a função de ponte para uma invasão de toda vida quotidiana. O urbanismo unitário é o contrário de uma atividade especializada; e reconhecer um campo urbanístico separado é reconhecer já toda a mentira urbanística e a mentira de toda a vida.É a felicidade aquilo que se promete no urbanismo. Portanto, o urbanismo será julgado segundo esta promessa. A coordenação dos meios de denúncia artística e dos meios de denúncia científica, deve levar a uma denúncia completa do condicionamento existente.

6. O desembarque Todo espaço já está ocupado pelo inimigo, que domesticou para sua utilização até as regras elementares desse espaço (além da jurisdição: a geometria). O instante de aparição do urbanismo autêntico, será a criação, em algumas zonas, do vazio dessa ocupação. O que chamamos ocupação começa já. Pode-se compreender com a ajuda do “vazio positivo” forjado pela moderna física. Materializar a liberdade é em primeiro lugar diminuir de um planeta domesticado algumas parcelas de sua superfície.

7. A luz do desvio O exercício elementar da teoria do urbanismo unitário será a transcrição de toda mentira teórica do urbanismo, desviando com um fim de desalienação: deve-se defender em todo instante da epopéia dos bardos do condicionamento; inverter seus ritmos.

8. Condições do diálogo O funcional é o que é prático. Unicamente é prático a resolução de nosso problema fundamental: a realização de nós mesmos (nosso desvencilhamento do sistema do isolamento). Isso é o útil e o utilitário. Nada mais. Todo o resto não representa mais que derivações mínimas do prático; sua mistificação.

9. Matéria prima e transformação A destruição situacionista do condicionamento atual é já, ao mesmo tempo, a construção das situações. É a libertação para as energias inesgotáveis contidas na vida quotidiana petrificada. A atual planificação das cidades, que se apresenta como uma geologia da mentira, cederá lugar, com o urbanismo unitário, a uma técnica de defesa das condições da liberdade, sempre amenizadas, no momento em que os indivíduos, que enquanto tais não existem ainda, construam sua própria história.

10. Fim da pré-história do condicionamento. Não sustentamos que se retorne a qualquer estágio anterior ao condicionamento; mas apenas ir além. Inventamos a arquitetura e o urbanismo que não podem ser realizados sem a revolução da vida quotidiana; ou seja, a apropriação do condicionamento por todos os homens, seu crescimento indefinido, seu fim.

(Publicado no #6 de Internationale Situationniste, 1961. A base para a presente tradução foi a tradução do francês para o espanhol de Julio González del Río Rams publicado em “creación abierta y sus enemigos: textos situacionistas sobre arte y urbanismo”, Madrid, La Piqueta, 1977)

REF: http://pt.protopia.at/wiki/Escritos_indispens%C3%A1veis

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CENTRO - VISÃO GERAL

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CIRCUITO COMPLETO - áreas de circuito e

derivas.

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Agradecimentos & Créditos:

A equipe de professores e coordenadores que contribuiram direta ou indiretamente na realização das saídas pela cidade de São Paulo.

A todos alunos do segundo ano - 2012, pelo excelente trabalho e olhar sensível aos espaços de nossa cidade.

Ao Instituto de Estudos Avançados (IEA - USP) pela publicação e compartilhamento online de sua Revista sob a licença Creative Commons (vol.25 no.71 São Paulo jan./abr. 2011) de onde foram extraídas as poesias contidas nesta publicação, além de textos utilizados com os alunos em sala de aula. Mais infos em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_issuetoc&pid=0103-401420110001&lng=pt&nrm=iso

Mais informações sobre este trabalho, visite:

http://reverbe.net/cidades/