crises e oportunidades[1]
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Crise de oportunidadeTRANSCRIPT
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Crises e oportunidades em tempos de mudana1
Ignacy Sachs, Carlos Lopes, Ladislau Dowbor
(texto atualizado em 28 de abril de 2013)
Todos temos as nossas crises prediletas. So as crises dos valores, das pandemias, da
demografia, da economia, da energia, da especulao financeira, da educao, da
pasteurizao cultural, de identidades, da banalizao da vida, da misria que explode
no mundo, da falta de gua que j atinge mais de um bilho de pessoas. A questo no
mais a de escolher a crise que nos parea mais ameaadora. A verdadeira ameaa vem
de uma convergncia impressionante de tendncias crticas, da sinergia de um conjunto
de comportamentos at compreensveis, mas profundamente irresponsveis, e
frequentemente criminosos, que assolam a nossa pequena espaonave.
Nas ltimas dcadas fechamos o horizonte estatstico do planeta. Com todas as
variaes possveis nos detalhes, no conjunto hoje sabemos o que est acontecendo. E a
imagem que emerge simplesmente trgica. Inicialmente foi vista em fragmentos. No
Rio de Janeiro, em 1992, ampliamos a nossa viso do que est acontecendo com o meio
ambiente; em Viena, com os direitos humanos; no Cairo, com o crescimento
populacional; em Beijing, com o papel das mulheres; em Istanbul, com a urbanizao;
em Copenhague de 1996, com a situao social do planeta, em Johanesburgo em 2002
com o desenvolvimento sustentvel, antes de vermos agora, de novo em Copenhague, a
dimenso dos desafios climticos. Hoje, mesmo sem grandes reunies planetrias, nos
damos conta, em relatrios que cobrem desde a extino das espcies at a acidificao
dos oceanos e o esgotamento de metais raros, que enfrentamos um desafio sistmico,
onde j no cabem simples arranjos nas formas como organizamos o que podemos
chamar de maneira ampla de gesto da sociedade. Uma outra gesto inevitvel. Os
desafios so simplesmente vitais, no sentido mais direto do termo.
Somos todos avessos a catastrofismos. No queremos parecer bruxos que pintam um
futuro negro. O Clube de Roma de certa maneira nos vacinou contra alertas que nos
pareceram prematuros. Hoje estamos comeando a avaliar de forma mais sensata o
realismo destas previses. Com os dados se cruzando de forma coerente, com a
generalizao e aperfeioamento dos modelos, com a prpria acessibilidade online das
mais variadas pesquisas cientficas, permitindo a confrontao dos dados de inmeros
ncleos de pesquisa, o futuro deixou de ser uma vaga ameaa, um desenho inseguro. De
certa forma, nas nossas conscincias, o futuro chegou. Na forte expresso adotada como
ttulo do Frum de Salvador, trata-se de uma crise civilizatria.
E nos preocupamos tambm em manter o realismo, seno nos nossos desejos que
podem ser infinitos, pelo menos nas nossas propostas. Mas este realismo tem de ser
qualificado. Na maioria dos casos, ao olhar o difcil que obter o mnimo avano de
reduo da poluio, ou alguma proteo para crianas em situao de risco, achamos
que colocar os nossos objetivos muito altos alimenta bons sonhos, mas no assegura
boas polticas. Hoje, com a dimenso das ameaas, a viso tende a se deslocar. Temos
de colocar no nosso horizonte realista aes que assegurem a sobrevivncia das espcies
1 Link do presente documento: http://dowbor.org/2010/01/crises-e-oportunidades-em-tempos-de-
mudanca-jan-2.html/
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na terra e nos mares, a manuteno das condies de reproduo da nossa prpria vida.
Qual o mnimo que assegura a sobrevivncia? Um poltico pode se dar ao luxo de
pensar de quanto vai reduzir as suas aspiraes, para conseguir um voto favorvel sua
proposta. Ns, como construtores de vises, temos de deixar claro sim qual o mnimo
necessrio para evitar a catstrofe e assegurar uma vida digna e sustentvel.
A nossa tarefa, neste sentido, de definir horizontes mnimos de resultados sistmicos
que temos de obter, j no como sonho de um mundo possvel, mas como exigncia do
que necessrio. E frente a estes resultados sistmicos, irmos definindo estratgias,
propostas, agendas.
Todos j estamos, sem dvida, cansados de fazer isto. E cansados de ver as propostas
rejeitadas ou adiadas, as anlises serem diludas em supostas dvidas cientficas, e o
planeta embalado no marasmo to bem qualificado de business as usual. O que nos est
tirando do business as usual, o que transforma a crise em oportunidade, o fato que a
crise atinge muita gente, e est se tornando de uma evidncia mais palpvel. Como
humanidade, estamos reagindo de maneira realista: ou seja, estamos reagindo no
quando a gua estava nas canelas, mas quando comea a chegar ao pescoo.
O exerccio que pretendemos no presente texto, ao apresentarmos argumentos para
estimular a discusso e provocar propostas, apontar os principais eixos de mudana, e
as possveis convergncias de ao. Porque o que temos pela frente um imenso
esforo planetrio de agregao de foras, de articulao em rede, de aprofundamento
da compreenso dos desafios, de ampla comunicao, visando gerar uma massa crtica
de conhecimento por parte dos mais variados atores sociais. Paulo Freire definia bem a
nossa tarefa: somos os andarilhos do bvio. Dizia isto com bom humor, pois o bom
humor faz parte do processo.
Queremos parar de nos matar de trabalhar para construir coisas inteis e destruir o
planeta. Queremos priorizar radicalmente a melhoria da situao de um bilho de
pessoas que passam fome e de dez milhes de crianas que morrem anualmente de
causas ridculas. Queremos a prosaica qualidade de vida, o prazer do cotidiano, em paz,
para todos, e de forma sustentvel.
O sistema hoje vigente produz muitos bilionrios, mas no responde aos anseios de uma
vida digna e sustentvel para todos. Na realidade, agrava todos os problemas, e nos
empurra para impasses cada vez mais catastrficos. Temos um deslocamento tico
fundamental pela frente: parar de nos admirar com a fortuna dos afortunados, como se
fossem smbolos de sucesso. A tica do sucesso deve estar centrada no que cada um de
ns, individualmente ou em atividades institucionais, contribui para melhorar o planeta,
e no no quanto consegue dele arrancar, ostentando fortunas e escondendo os custos.2
Aproveitamos aqui vrios documentos, aportes dos mais variados pesquisadores, porque
trata-se essencialmente de sistematizar pontos-chave, de facilitar a convergncia dos
nossos esforos. Apoiamo-nos em particular nos aportes da ampla conferncia sobre a
crise e o desenvolvimento de Braslia, em maro de 2009, buscando construir sobre o j
adquirido.
2 Os rios de dinheiro e embustes utilizados pela ExxonMobil e outras empresas para tentar camuflar os
impactos da mudana climtica e outros desastres ambientais esto descritos em detalhe no livro de James
Hoggan, Climate Cover-up; the crusade to deny global warming, Greystone Books, Vancouver, 2009
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I A DIMENSO DOS DESAFIOS
Focaremos aqui o que nos parecem ser os quatro principais desafios, ou vetores de
desequilbrio que nos ameaam. Trata-se de salvar o planeta, de reduzir as
desigualdades, de assegurar o acesso ao trabalho digno, e de corrigir as prioridades
produtivas.
A convergncia dos desequilbrios
O grfico que apresentamos abaixo constitui um resumo de macro-tendncias, no
perodo histrico que vai de 1750 at a atualidade. As escalas tiveram de ser
compatibilizadas, e algumas das linhas representam processos para os quais temos cifras
apenas mais recentes. Mas no conjunto, o grfico permite juntar reas tradicionalmente
estudadas separadamente, como demografia, clima, produo de carros, consumo de
papel, contaminao da gua, liquidao da vida nos mares e outros. A sinergia do
processo torna-se bvia, como se torna bvia a dimenso dos desafios ambientais. 3
Fonte: New Scientist (18 October 2008, p 40).
3 New Scientist, October 18, 2008, p. 40; para acessar o grfico online veja http://dowbor.org/ar/ns.doc; o
dossi completo pode ser consultado em www.newscientist.com/opinion ; os quadros de apoio e fontes
primrias podem ser vistos em http://dowbor.org/ar/08_ns_overconsumption.pdf; contribuiram para o
dossi Tim Jackson, David Suzuki, Jo Marchant, Herman Daly, Gus Speth, Liz Else, Andrew Simms,
Suzan George e Kate Soper.
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O comentrio do New Scientist sobre estas macro-tendncias foca diretamente o nosso
prprio conceito de crescimento econmico:
A cincia nos diz que se queremos ser srios com a viso de salvar a terra, precisamos dar outra
forma nossa economia. Isso, naturalmente, constitui uma heresia econmica. O crescimento para
a maioria dos economistas to essencial como o ar que respiramos: seria, dizem, a nica fora
capaz de tirar os pobres da pobreza, de alimentar a crescente populao mundial, de enfrentar os
custos crescentes dos gastos pblicos e de estimular o desenvolvimento tecnolgico isso sem mencionar o financiamento de estilos de vida cada vez mais caros. Eles no vem limites ao
crescimento, nunca. Nas semanas recentes tornou-se claro quo aterrorizados esto os governos de
qualquer coisa que ameace o crescimento, enquanto derramam bilhes em dinheiro pblico num
sistema financeiro em falncia. No meio da confuso, qualquer questionamento do dogma do
crescimento precisa ser visto de forma muito cuidadosa. O questionamento apoia-se numa questo
duradoura: como conciliamos os recursos finitos da terra com o fato que medida que a economia
cresce, o montante de recursos naturais necessrio para sustentar a atividade tambm deve crescer?
Levamos toda a histria humana para a economia atingir a sua dimenso atual. Na forma corrente,
levar apenas duas dcadas para dobrar.4
A convergncia das tenses geradas para o planeta tornam-se evidentes. No podemos
mais nos congratular com o aumento da pesca quando estamos liquidando a vida nos
mares, ou com o aumento da produo agrcola quando estamos liquidando os aquferos
e contaminando as reservas planetrias de gua doce. Isto sem falar do aumento de
produo de automveis e da expanso de outras cadeias produtivas geradoras de
aquecimento climtico. As solues tm de ser sistmicas. Esta viso mais ampla pode
e apenas pode viabilizar mudanas mais profundas, ao estender o nvel de conscincia dos desafios.
Qual desenvolvimento queremos? E para este desenvolvimento, que Estado e que
mecanismos de regulao so necessrios? No h como minimizar a dimenso dos
desafios. Com 7 bilhes de habitantes e 75 milhes a mais a cada ano que buscam um consumo cada vez mais desenfreado, e manejam tecnologias cada vez mais
poderosas, o nosso planeta mostra toda a sua fragilidade. E ns, a nossa
irresponsabilidade ou impotncia.
O escndalo da desigualdade
A financeirizao dos processos econmicos vem h dcadas se alimentando da
apropriao dos ganhos da produtividade que a revoluo tecnolgica em curso permite,
de forma radicalmente desequilibrada. No o caso de desenvolver o processo aqui,
4 No original: The science tells us that if we are serious about saving the Earth, we must reshape our economy. This, of course, is economic heresy. Growth to most economists is as essential as the air we
breathe: it is, they claim, the only force capable of lifting the poor out of poverty, feeding the worlds growing population, meeting the costs of rising public spending and stimulating technological
development not to mention funding increasingly expensive lifestyles. They see no limits to growth, ever. In recent weeks it has become clear just how terrified governments are of anything that threatens
growth, as they pour billions of public money into a failing financial system. Amid the confusion, any
challenge to the growth dogma needs to be looked at very carefully. This one is built on a long standing
question: how do we square Earths finite resources with the fact that as the economy grows, the amount of natural resources needed to sustain that activity must grow too? It has taken all of human history for
the economy to reach its current size. On current form, it will take just two decades to double. New Scientist, October 18, 2008, p. 40
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mas importante lembrar que a concentrao de renda no planeta est atingindo limites
absolutamente obscenos.5
Fonte: Human Development Report 2005, p. 37 - http://hdr.undp.org/en/media/HDR05_complete.pdf
A imagem da taa de champanhe extremamente expressiva, pois mostra quem toma
que parte do contedo, e em geral as pessoas no tm conscincia da profundidade do
drama. Segundo o Relatrio, no topo, onde a taa mais larga, os 20% mais ricos se apropriam de trs quartos da renda mundial. Na parte mais baixa, os 40% de pobres tm
acesso a 5% da renda mundial, enquanto os 20% mais pobres apenas 1,5%. Os 40%
mais pobres correspondem basicamente aos 2 bilhes de pessoas que vivem com menos
de dois dlares por dia. A Amrica Latina apresenta uma situao particularmente desequilibrada: A distribuio de renda mostra o grau extremo de desigualdade na Amrica Latina.
A concentrao de renda absolutamente escandalosa, e nos obriga de ver de frente
tanto o problema tico, da injustia e dos dramas de bilhes de pessoas, como o
problema econmico, pois estamos excluindo bilhes de pessoas que poderiam estar
no s vivendo melhor, como contribuindo de forma mais ampla com a sua capacidade
produtiva. No haver tranquilidade no planeta enquanto a economia for organizada em
funo de um tero da populao mundial.
Esta concentrao no se deve apenas especulao financeira, mas a contribuio
significativa e, sobretudo, absurdo desviar o capital de prioridades planetrias bvias.
The Economist traz uma cifra impressionante sobre o excedente social, gerado
5 H imensa literatura sobre o assunto. O grfico anexo, conhecido como taa de champanhe, do Relatrio de Desenvolvimento Humano 2005 p. 37 da verso inglesa. Uma excelente anlise do
agravamento recente destes nmeros pode ser encontrada no relatrio Report on the World Social
Situation 2005, The Inequality Predicament, United Nations, New York 2005; O documento do Banco
Mundial, The next 4 billion, que avalia em 4 bilhes as pessoas que esto fora dos benefcios da globalizao, igualmente interessante IFC. The Next 4 Billion, Washington, 2007; estamos falando de dois teros da populao mundial. Desde o incio da crise financeira em 2008, os nmeros vm se
agravando, atingindo agora com fora os prprios pases ditos desenvolvidos.
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essencialmente por avanos tecnolgicos da rea produtiva, mas apropriado pelo setor
que qualifica de indstria de servios financeiros: A indstria de servios financeiros est condenada a sofrer uma horrvel contrao. Na Amrica a participao desta
indstria nos lucros corporativos totais subiu de 10% no incio dos anos 1980, para 40%
no seu pico em 2007. Gera-se uma clara clivagem entre os que trazem inovaes tecnolgicas e produzem bens e servios socialmente teis os engenheiros do processo, digamos assim e o sistema de intermedirios financeiros que se apropriam do excedente e deformam a orientao do conjunto. Os engenheiros do processo criam
importantes avanos tecnolgicos, mas a sua utilizao e comercializao pertencem a
departamentos de finanas, de marketing e de assuntos jurdicos, que dominam nas
empresas. um sistema que gerou um profundo divrcio entre quem contribui
produtivamente para a sociedade e quem remunerado.6
Ao juntarmos os dois grficos, o do New Scientist sobre os megatrends histricos, e a
da taa de champagne do Relatrio de Desenvolvimento Humano, chegamos a uma concluso bastante bvia: estamos destruindo o planeta, para o proveito de um tero da
populao mundial. Estes so os dados bsicos que orientam as nossas aes futuras:
inverter a marcha da destruio do planeta e reduzir a desigualdade acumulada.
importante lembrar que a nossa principal medida de progresso, o PIB, no mede
nenhum dos dois, pois no contabiliza a reduo do capital natural do planeta,
contabiliza como positiva a poluio que exige grandes programas de recuperao, e na
realidade apresenta-nos apenas a mdia nacional de intensidade de uso da mquina
produtiva.7 E lembrar tambm que o motivador principal dos investimentos privados, o
lucro, age contra ambos: tem tudo a ganhar com a extrao mxima de recursos naturais
e a externalizao de custos, e no tem nada a ganhar com quem tem pouca capacidade
aquisitiva. A motivao do lucro a curto prazo age naturalmente tanto contra a
preservao como contra a igualdade.
O desafio do acesso ao trabalho digno
A desigualdade e a sustentabilidade esto diretamente ligadas aos desequilbrios na
incluso nos processos produtivos. A mo de obra, a nossa imensa capacidade ociosa de
produo, mais parece um problema do que uma oportunidade. Na forma atual de uso
dos fatores de produo e das tecnologias, a incluso produtiva a exceo. No Brasil,
temos em nmeros redondos 200 milhes de habitantes. Destes, 130 milhes esto em
idade ativa, entre 15 e 64 anos de idade, pelo critrio internacional. Na populao
economicamente ativa, temos 100 milhes de pessoas, o que j aponta para uma
subutilizao significativa. As estatsticas do emprego, por sua vez, mostram que temos
neste ano cerca de 40 milhes de pessoas formalmente empregadas no setor privado,
com carteira assinada. Podemos acrescentar os 9 milhes de funcionrios pblicos do
pas, e chegamos a cerca de 50 milhes. Ainda assim, estamos longe da conta. O que
fazem os outros? Temos empresrios, sem dvida, bem como uma massa classificada
como autnomos, alm de cerca de 10 milhes de desempregados. No conjunto,
6 No original, The financial-services industry is condemned to suffer a horrible contraction. In America the industrys share of total corporate profits climbed from 10% in the early 1980s to 40% at its peak in 2007 The Economist, A Special Report on the Future of Finance, January 24th 2009, p. 20 7 Ver em particular o relatrio de Amartya Sen, Joseph Stiglitz e Jean Paul Fitoussi, Report by the
Commission on the Measurement of Economic Performance and Social Progress, disponvel em
www.stiglitz-sen-fitoussi.fr
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forma-se um imenso setor de pessoas classificadas no conceito vago de informais, avaliados em 40% da populao economicamente ativa.8
O fato essencial para ns que o modelo atual subutiliza a metade das capacidades
produtivas do pas. E imaginar que o crescimento centrado em empresas transnacionais,
grandes extenses de soja (200 hectares para gerar um emprego), ou ainda numa
hipottica expanso do emprego pblico, permitir absorver esta mo de obra, no
realista. Evoluir para formas alternativas de organizao torna-se simplesmente
necessrio.
O drama no Brasil representativo de um universo mais amplo: O emprego informal representa entre a metade e trs quartos do emprego no-agrcola na maioria dos pases
em desenvolvimento. A parte dos trabalhadores informais na fora de trabalho no-
agrcola varia entre 48% na frica do Norte e 51% na Amrica latina e o Caribe,
atingindo 65% na sia e 78% na frica sub-sahariana9
Assim, o drama da desigualdade que vimos acima no constitui apenas um problema de
distribuio mais justa da renda e da riqueza: envolve a incluso produtiva digna da
maioria da populao desempregada, subempregada, ou encurralada nos diversos tipos
de atividades informais. O conjunto das propostas que surgem a partir da OIT sobre o
trabalho digno, as vises do Banco Mundial sobre os 4 bilhes de excludos dos
benefcios da globalizao, e um conjunto de iniciativas de desenvolvimento local encontram aqui a sua lgica: um PIB que cresce mas no inclui as populaes no
sustentvel. Estamos falando de quase dois teros da populao mundial a quem se
trava o acesso ao financiamento, s tecnologias, ao direito de cada um ganhar o po da
sua famlia.10
A deformao das prioridades
A tabela abaixo, extrada do Relatrio de Desenvolvimento Humano de 1998, apresenta
a deformao das prioridades do uso dos recursos no planeta. A leitura simples: no se
conseguem os 6 bilhes anuais suplementares para universalizar a educao bsica, mas
se conseguem sim 8 bilhes para cosmticos nos EUA, e assim por diante. Os valores
so baixos, pois so dlares que valiam mais na poca, mas o contraste evidente. As
cifras mais recentes apenas se agravaram. Os 780 bilhes de dlares em gastos
militares, em 2008 j somam 1,5 trilho. E se pensarmos nos trilhes de recursos
pblicos transferidos nesta crise para intermedirios financeiros privados, teremos uma
idia d uma idia do grau de absurdo das prioridades.
8 IPEA Brasil, o estado de uma nao mercado de trabalho, emprego e informalidade Ipea, Rio de Janeiro, 2006 Na sua expresso mais direta, o setor informal encarado como gerador de empregos de baixa qualidade e remunerao, ineficincias e custos econmicos adicionais, constituindo uma distoro
a ser combatida...Em 1992 o percentual da informalidade era de 51,9%, atingiu 53,9% em 1998, voltando a 51,7% em 2003 e caindo para 51,2% em 2004. A drstica reduo do setor informal nos ltimos anos deve-se evidentemente poltica de incluso produtiva dos ltimos 10 anos, o que nos leva
aos 40% projetados acima. A informalidade um desafio praticamente para a totalidade da Amrica
Latina. (pp. 337 e 339) 9 UN The Inequality Predicament, New York, 2005, p. 30 10 Temos hoje inmeros estudos que apresentam propostas prticas tanto para a informalidade, como para
a desigualdade de gnero, a mudana da jornada de trabalho, polticas locais de incluso e outras, dada a
extrema diversidade das situaes herdadas, inclusive o aproveitamento inadequado de universitrios.
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Na realidade, o que precisa ser expandido hoje no mundo so os servios bsicos
essenciais da humanidade, e muito menos os bens fsicos de consumo. Em particular, h
coisas que no podem faltar a ningum. O planeta produz quase um quilo de gros por
dia e por habitante, e temos um bilho de pessoas que passam fome. Os dez milhes de
crianas que morrem de fome e de falta de acesso gua limpa e causas semelhantes,
constituem um escndalo insustentvel. Mas do ponto de vista do investimento privado,
resolver problemas essenciais no rende, e o conjunto da orientao das nossas
capacidades produtivas se v radicalmente deformado.
Gastos Anuais em Dlares
Educao Bsica para todos
$6 bilhes*
Cosmticos nos EUA $8 bilhes gua e servios sanitrios bsicos
$9 bilhes
Sorvetes na Europa
$11 bilhes
Sade reprodutiva das mulheres
$12 bilhes
Perfumes na Europa e nos EUA
$12 bilhes
Sade bsica e nutrio
$13 bilhes
Rao para animais de estimao na Europa e EUA Entretenimento Corporativo no Japo Cigarros na Europa Bebidas alcolicas na Europa Drogas no mundo Gastos militares no mundo
$17 bilhes $ 35 bilhes $ 50 bilhes $ 105 bilhes $ 400 bilhes $ 780 bilhes
* Estimativa de custo anual adicional para alcanar o acesso aos servios sociais bsicos em todos os
pases em desenvolvimento.
Fonte: Euromonitor 1997; UN 1997g; UNDP, UNFPA, ed UNICEF, 1994; Worldwide Research,
Advisory and Business Intelligence Services, 1997.
Human development Report, 1998, New York, p. 37.
Aparece como inevitvel, no horizonte poltico, a democratizao das decises sobre
como so utilizados os recursos econmicos do planeta, incluindo aqui no s os
recursos dos oramentos pblicos, mas a orientao das aplicaes dos gigantescos
recursos de fundos de penso e dos grandes intermedirios e especuladores financeiros.
No podemos continuar a andar completamente deriva em termos da priorizao dos
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nossos objetivos. O uso dos recursos que so o resultado dos esforos do conjunto da
sociedade, deve obedecer a uma viso sistmica e de longo prazo, obedecendo s
prioridades crticas de reduzir os desastres sociais e ambientais.
O caos financeiro
A crise financeira mais recente explode em 2008, mas na realidade ela pertence ao caos
financeiro crescente que se estende aos setores produtivos e gera a crise da dvida
pblica. Trata-se essencialmente de uma crise de governana, de como administramos
os nossos recursos. Um resultado positivo que as pesquisas sobre a crise esto
trazendo luz sobre as engrenagens do sistema.
O Swiss Federal Institute of Technology (ETH na sigla alem) de Zurich publicou o
primeiro mapa da rede global de controle das corporaes (The network of global
corporate control), contribuio de primeira importncia. Mostra basicamente que 737
grupos controlam 80% do universo das grandes corporaes transnacionais, e que um
ncleo duro de 147 corporaes controla 40%. Destas, 75% so corporaes de
intermediao financeira. So nmeros muito impactantes. Muitos intuam naturalmente
esta realidade, ao acompanharem durante anos noticias dirias de grupos econmicos
adquirindo controle uns dos outros, no processo contnuo de concentrao. Mas ter o
mapa deste poder uma contribuio fundamental. E quando os grupos so to poucos,
no preciso recorrer a nenhuma teoria conspiratria: nada que no se resolva no
campo de golfe. O grau de concentrao tambm expande o risco sistmico, por causa
da imensa volatilidade e do montante de recursos envolvidos. A prpria dimenso dos
grupos envolvidos em atividades diversas pelo planeta afora torna a gesto racional e
focada praticamente invivel, e o poder poltico que os grupos manejam torna o
processo democrtico uma fico.11
11 http://dowbor.org/2012/02/a-rede-do-poder-corporativo-mundial-7.html/
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Exemplo de algumas conexes financeiras internacionais. Em vermelho, grupos europeus, em azul norte-
americanos, outros pases em verde. A dominncia dos dois primeiros evidente, e muito ligada crise
financeira atual. Somente uma pequena parte dos links aqui mostrada. Fonte Vitali, Glattfelder e
Fattiston, http://j-node.blogspot.com/2011/10/network-of-global-corporate-control.html;
A crise tambm trouxe tona a importncia dos parasos fiscais e do dinheiro ilegal de
forma geral. James Henry, que foi economista chefe da McKinsey coordenou a pesquisa
para o Tax Justice Network, e mostra que o volume de recursos ilegais est entre 21 e 32
trilhes de dlares, para um PIB mundial da ordem de 70 trilhes. Ou seja, trata-se de
algo entre um tero e metade do PIB mundial. Ao comentar as pesquisas em relatrio
especial, The Economist adotou a cifra provvel de 20 trilhes. Igualmente importante
o fato de no se tratar de dinheiro em cofres em ilhas paradisacas, mas basicamente de
gesto de recursos de evaso fiscal, lavagem de dinheiro de drogas, corrupo, comrcio
ilegal de armas e semelhantes, nas mos dos grandes bancos em Delaware, Miami e
Londres. Encontram-se ai Goldman&Sachs, Barclays, UBS, HSBC e outros bancos de
primeira linha, basicamente os mesmos que esto gerando a crise financeira mundial e
que constam da lista de bancos da pesquisa do ETH. Todos eles esto sendo
processados ou j condenados por manipulao fraudulenta da Libor e Euribor e assim
por diante. A pesquisa realizada por 86 jornalistas de 36 jornais de diversos pases, no
quadro do ICIJ (International Consortium of Investigative Journalists) j comeou a
apresentar os nomes de algumas das principais empresas e fortunas pessoais ilegais. A
pesquisa de James Henry estima que o dinheiro brasileiro em parasos fiscais da
ordem de 520 bilhes de dlares, cerca de 25% do nosso PIB. Os dados do ETH, da
TJN, do Economist e do ICIJ convergem. 12
12 James Henry - The Price of off-shore revisited -
http://www.taxjustice.net/cms/front_content.php?idcat=148; The Economist, Special report, The missing
20 trillion, 16/02/2013; ver tambm o nosso http://dowbor.org/2012/12/os-caminhos-da-corrupcao-uma-
visao-sistemica-dezembro-de-2012-25-p.html/
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O resultado final do controle dos intermedirios financeiros sobre as atividades
econmicas mostrado no estudo do ETH, e da expanso do dinheiro ilegal e no
regulado em parasos fiscais que apresentam diversas pesquisas, uma concentrao
recente de renda nas ltimas dcadas. No grfico abaixo, constatamos que nos Estados
Unidos, nos ltimo trinta anos, os 20% mais pobres tinham praticamente mantido a sua
situao, os 60% intermedirios mostraram pouco progresso, enquanto os 19% mais
ricos melhoraram de maneira significativa. Mas a tendncia marcante do processo pode
ser vista na linha de cima que apresenta a evoluo do 1% de mais ricos no topo da
pirmide.13
Em termos da mega-tendncias econmicas, sociais e ambientais, portanto, estamos
deriva. Estamos destruindo o planeta em favor de uma minoria, para ampliar a oferta de
bens sem critrios de prioridade de uso ou de impacto ambiental e social, concentrando-
nos em tecnologias de ponta sem assegurar os mecanismos de acesso correspondentes.
Temos como pano de fundo a imensa tarefa de organizar a transio para outro
paradigma energtico produtivo, a era ps-petrleo. E os recursos financeiros do
planeta, que deveriam ser orientados para enfrentar estes desafios, giram soltos em
sistema especulativos surrealistas, sem prestar contas a ningum. Sempre haver quem
espere que uma mo invisvel resolva estes desafios. Quem aqui so os sonhadores?
O desafio cada vez mais bvio que o nosso esquema geral de governana, baseado em
foras caticas de mercado, com um pouco de regulao pblica e com as organizaes
da sociedade civil tapando os buracos ou consertando as falhas mais dramticas,
simplesmente no funciona. Estamos enfrentando a necessidade de um novo contrato
social.
Variaes do nvel de renda nos EUA de acordo com os nveis sociais 1979-2009
13 Congressional Budget Office, " Trends in the distribution of household income between 1979 and
2007" updated 2012 Manire de Voir, Le Monde Diplomatique, n.125, oct-nov 2012, p. 61
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II RESGATAR A CAPACIDADE DE GESTO PBLICA
Na discusso de um outro mundo que esperamos seja possvel, temos de evoluir cada
vez mais para o como fazer, para os mecanismos de gesto correspondentes, para a
descoberta das brechas que existem no sistema no sentido da sua transformao. O
mundo no vai parar em determinado momento para passar a funcionar de outro modo.
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13
Cabe a ns introduzir, ou reforar, as tendncias de mudana. A anlise dos processos
decisrios e a busca de correes tornou-se central.
O que emerge como eixo central de reflexo, portanto, a inadequao dos processos
decisrios nas diversas tendncias crticas que temos de enfrentar. Enfrentar o desafio
ambiental planetrio exige processos colaborativos e a construo de uma cultura de
pactos pelo bem comum, ou pelo menos para evitar o desastre comum. A ruptura do
ciclo da pobreza e da desigualdade implica no deslocamento da viso tradicional que
atrai investimentos para onde se situa a capacidade de compra, e portanto envolve a
mudana da chamada governana corporativa. O processo de incluso produtiva dos
quase dois teros de excludos envolve uma outra lgica do emprego, formas mltiplas
e diferenciadas de insero na produo de bens e servios. O resgate destas prioridades
reais do planeta e da humanidade envolve por sua vez uma participao muito mais
significativa do Estado, que com todas as suas fragilidades ainda constitui o melhor
instrumento de coordenao de esforos sociais de que dispomos. Mas se trata de um
Estado muito mais regulador do conjunto dos esforos da sociedade. indispensvel o
resgate da viso sistmica, da viso de longo prazo, e dos mecanismos de planejamento.
Estamos falando, na realidade, da construo de uma outra cultura poltica.
Naturalmente, todos nos sentimos pequenos frente a processos de mudana deste porte.
E podemos achar que colocar os desafios to alto no realista. O fato que ningum
nos est perguntando se queremos ou no enfrentar a tarefa. O aquecimento global no
est esperando que estejamos de acordo, nem o esgotamento do petrleo, nem a
explorao sem controle dos mares, nem a perda de cobertura florestal, nem o vrus da
Aids, e a lista longa. Outras formas de gesto so inevitveis, a nica pergunta realista
se queremos pagar um preo menor agora, ou muito maior mais frente.
Reforar e democratizar o Estado
As crticas ao tamanho do setor pblico refletiram no passado recente uma viso
ideolgica e conhecimento fragmentado da realidade. Nas palavras de um diretor da
cole Nationale dAdministration, a famosa ENA, melhorar a produtividade do setor pblico constitui a melhor maneira de melhorar a produtividade sistmica de toda a
sociedade. O Relatrio Mundial sobre o Setor Pblico, elaborado pelas Naes Unidas
em 2005, mostra a evoluo que houve a partir da viso tradicional da Administrao Pblica baseada em obedincia, controles rgidos e conceito de autoridades, transitando por uma fase em que se buscou uma gesto mais empresarial, na linha do
public management que nos deu, por exemplo, o conceito de gestor da cidade no lugar do prefeito, e desembocando agora na viso mais moderna que o relatrio chama
de governana participativa ou responsive governance.
Esta ltima forma de organizao implica que no espao pblico a boa gesto se
consegue por meio da articulao inteligente e equilibrada do conjunto dos atores
interessados no desenvolvimento, os chamados atores interessados, ou stakeholders. uma gesto que busca responder, ou corresponder aos interesses que diferentes grupos manifestam, e supe sistemas amplamente participativos, e em todo caso mais
democrticos, na linha da governana participativa, alm da ampliao da transparncia de todos os processos.
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14
A evoluo da administrao pblica tradicional (Public Administration) para o New
Public Management se baseou numa viso privatista da gesto, buscando chefias mais
eficientes. A evoluo mais recente para o responsive governance, que traduzimos aqui
por governana participativa, est baseada numa proposta mais pblica, onde as chefias
escutam melhor o cidado, e onde a participao cidad, atravs de processos mais
democrticos, que assegura que os administradores sero mais eficientes, pois mais
afinados com o que deles se deseja. a diferena entre a eficincia autoritria por cima,
e a eficincia democrtica pela base. A eficincia medida no s no resultado, mas no
processo.
O quadro abaixo ajuda a visualizar esta evoluo:
Evoluo do conceito de governo
Administrao
Pblica
Nova Gesto
Pblica
Governana
Participativa
Relao cidado-
estado
Obedincia Credenciamento Empoderamento
Responsabilidade da
administrao
superior
Polticos Clientes Cidados, atores
Princpios
orientadores
Cumprimento de leis
e regras
Eficincia e
resultados
Responsabilidade,
transparncia e
participao
Critrio para sucesso Objetivos
quantitativos
Objetivos qualitativos Processo
Atributo chave Imparcialidade Profissionalismo Participao
(UN, World Public Sector Report 2005, p. 7)
O modelo de governana... enfatiza um governo aberto e que se relaciona com a sociedade civil, mais responsabilizada e melhor regulada por controles externos e a lei.
Prope-se que a sociedade tenha voz atravs de organizaes no governamentais e
participao comunitria. Portanto o modelo de governana tende a se concentrar mais
na incorporao e incluso dos cidados em todos os seus papeis de atores interessados
(stakeholders), no se limitando a satisfazer clientes, numa linha mais afinada com a
noo de criao de valor pblico.... A teoria da governana olha para alm da reforma da gesto e dos servios, apontando para novos tipos de articulao Estado-
sociedade, bem como para formas de governo com nveis mais diferenciados e
descentrados...A abertura (openness) e transparncia constituem portanto parte deste modelo emergente (UN, World Public Sector Report 2005, p.13)
O novo modelo que emerge est essencialmente centrado numa viso mais democrtica,
com participao direta dos atores interessados, maior transparncia, com forte abertura
para as novas tecnologias da informao e comunicao, e solues organizacionais
para assegurar a interatividade entre governo e cidadania. A viso envolve sistemas de gesto do conhecimento mais sofisticados, com um papel importante do aproveitamento das novas tecnologias de informao e comunicao.
Para a discusso no Brasil e na Amrica Latina, estes pontos so muito importantes.
Tm a virtude de ultrapassar vises saudosistas autoritrias, e tambm a pseudo-
modernizao que colocava um manager onde antes tnhamos um poltico, resultando
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15
numa mudana cosmtica por cima. uma evoluo que busca a construo de uma
capacidade real de resoluo de problemas atravs das pactuaes necessrias com a
sociedade realmente existente. Esta sistematizao de tendncias mundiais vem dar
maior credibilidade aos que lutam pela reapropriao das polticas pela cidadania, na
base da sociedade, em vez da troca de uma soluo autoritria por outra.
A alocao racional de recursos
A alocao de recursos feita por intermedirios, sejam eles governo, bancos,
seguradoras, fundos de penso, planos de sade, ou os gigantes planetrios que
chamamos de investidores institucionais. Todas essas instituies recolhem recursos sob
diversas justificativas. Mas so intermedirios, ou seja, trabalham com dinheiro que
do pblico, e deveriam destinar os recursos a atividades fins.
O governo, principal intermedirio, aloca os recursos segundo um oramento discutido
no parlamento e aprovado em lei. Fato importante: o governo tem de assegurar a
captao dos recursos que vai investir. A poltica fiscal (fazenda) e a aplicao
(planejamento) tm de estar casados na pea oramentria. No conjunto do planeta, os
governos so os maiores gestores de recursos, e quanto mais rico o pas, maior a
participao do governo nesta mediao.
A tabela abaixo interessante, pois mostra esta correlao rigorosa entre o nvel de
desenvolvimento e a participao do setor pblico. Nos pases de renda baixa, a parte do
PIB que cabe ao governo central de 17,7% , elevando-se numa progresso regular
medida que chegamos aos pases de alta renda.14 Falar mal dos governos parece ser um
consenso planetrio, mas precisamos cada vez mais deles, inclusive nos Estados
Unidos.
Paises de: Governo central, porcentagem do PIB, incio anos 2000
Baixa Renda 17,7
Renda mdia baixa 21,4
Renda mdia alta 26,9
Alta renda 31,9 Fonte: Finance and Development, IMF, Dez. 2007
Note-se que se trata, na tabela acima, dos gastos do governo central apenas, os gastos
pblicos totais so bem mais amplos. H uma dcada os gastos do governo americano eram de 34,3% do PIB, comparados com 48.2% na zona europia, uma distncia de 14
pontos; em 2010, o gasto americano esperado de 39,9% do PIB comparado com
47,1%, uma distncia de menos de oito pontos percentuais.15 Lembremos que a cifra equivalente no Brasil de 36%. Na Sucia, que ningum vai acusar de ser mal gerida,
de 66%. E so cifras anteriores interveno do Estado para salvar os bancos.
Seja qual for a poltica adotada, portanto, essencial assegurar a qualidade da alocao
de recursos por parte do maior ator, o governo. Essa correlao entre o nvel de
14 Schieber,George; Lisa Fleisher e Pablo Gottret - Gettting Real on Health Financing, Finance and
Development, International Monetary Fund, Dezembro de 2007
http://www.imf.org/external/pubs/ft/fandd/2006/12/schieber.htm 15 The Economist, March 14th-20th 2009, p. 37, citando dados do Newsweek.
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prosperidade do pas e a participao do setor pblico no misteriosa: simplesmente, o
mundo est mudando. Antigamente, ramos populaes rurais dispersas, e as famlias
resolviam muitos dos seus problemas individualmente, com a gua no poo e o lixo no
mato. Na cidade generalizam-se os investimentos sociais, pois precisamos de redes de
gua e esgoto, de guias e sarjetas, de redes escolares, de sistemas de segurana, destino
final de resduos slidos e assim por diante, evidentemente assegurados com forte
presena do setor pblico. So servios de consumo coletivo.
H que levar em conta igualmente, nesta presena crescente do setor pblico em todo o
planeta, a mudana da composio inter-setorial das nossas atividades. H poucas
dcadas, o que chamvamos de atividades produtivas eram essencialmente atividades
industriais, agrcolas e comerciais. Hoje passam a ocupar a linha de frente as polticas
sociais. Vale lembrar que o maior setor econmico dos Estados Unidos no a indstria
blica, nem a automobilstica, mas a sade, com 16% do PIB, e crescendo. No Brasil,
somando a populao estudantil, os professores e gestores da rea educacional, estamos
falando de 60 milhes de pessoas, quase um tero da populao do pas. As polticas
sociais esto se tornando um fator poderoso de reestruturao social, pelo seu carter
capilar (a sade tem de chegar a cada pessoa) e a sua intensidade em mo de obra. So
reas onde, com a exceo dos nichos de alta renda, o setor pblico tem prioridade
evidente, frequentemente articulado com organizaes da sociedade civil, outra rea em
expanso, caracterizando um setor pblico no governamental. A economia social e
suas variantes ocupam um lugar crescente no conjunto das atividades econmicas.
Um terceiro eixo de transformao social a evoluo para a sociedade do
conhecimento. Hoje quase todas as atividades envolvem uma forte incorporao de
tecnologia, de conhecimentos dos mais variados tipos, do conjunto do que temos
chamado de intangveis, ou de imaterial. Quando o essencial do valor de um produto est no conhecimento incorporado, mudam as formas de organizao
correspondentes. Na base est um amplo processo social que envolve as pesquisas dos
mais diferentes setores, a generalizao do acesso educao, e os sistemas de difuso
de informaes que elevam a densidade de conhecimento no conjunto da sociedade,
com fortssima participao de recursos pblicos em todos os nveis. A tendncia
natural os conhecimentos se tornarem bem pblico (creative commons), pela
facilidade de disseminao que as tecnologias modernas permitem, e pela compreenso
que gradualmente penetra na sociedade de que o conhecimento se multiplica melhor
quando se compartilha. O conhecimento um bem cujo consumo no reduz o estoque,
pelo contrrio.
Estes so megatrends, macro-tendncias que transformam a sociedade, e que exigem de
ns sistemas de gesto muito mais diversificados, descentralizados e flexveis. Estamos
evoluindo para a sociedade em rede, para sistemas densamente interativos e
colaborativos. Alianas e parcerias entre diversos segmentos sociais, envolvendo reas
tanto pblicas como privadas, nos diversos nveis de organizao territorial, esto se
generalizando. A urbanizao leva a uma ampliao acelerada das dinmicas da gesto
local, em que as comunidades se apropriam do seu desenvolvimento. As polticas
sociais geram processos participativos, a sociedade do conhecimento nos leva para
processos colaborativos em rede.
O que est acontecendo na realidade um choque do futuro generalizado, e tanto a
queda do muro de Berlim como a pilantragem irresponsvel de Wall Street apenas
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despertaram, inicialmente na esquerda, depois na direita, a compreenso de que as
mudanas precisam ser sistmicas. O business as usual (BAU), de ambos os lados do
espectro poltico, est saindo fora de cena. So as relaes de produo no sentido
amplo que mudam, e com isso os mecanismos atuais de regulao tornaram-se em boa
parte obsoletos.
O papel do Estado aparece assim como central, inclusive na dimenso mundial da crise.
Dada a extrema fragilidade dos instrumentos planetrios de governana, o eixo
estratgico de construo dos novos sistemas de regulao passar mais pela articulao
de polticas nacionais do que propriamente pela esfera global. O Estado aparece assim
com uma funo reforada no plano dos equilbrios internos, e no plano da redefinio
das regras do jogo entre as naes.
O potencial da gesto local
Com a passagem do milnio, a humanidade tornou-se dominantemente urbana. Isto
implica uma outra racionalidade nos processos decisrios e nas instituies que nos
regem, pois hoje cada regio ou localidade tem um ncleo urbano que pode administrar
o seu desenvolvimento, e este ncleo torna-se por sua vez um articulador natural do seu
entorno rural, ponto de convergncia de uma gesto racional do desenvolvimento. Hoje
ainda predominam iniciativas setoriais como Cidades Saudveis, Cidades Educadoras,
Agenda XXI Local e assim por diante, mas gradualmente estamos evoluindo para
iniciativas integradas como Bogot Como Vamos, Nossa So Paulo e tantas outras.
O desenvolvimento local permite a apropriao efetiva do desenvolvimento pelas
comunidades, e a mobilizao destas capacidades vital para um desenvolvimento
participativo. Inmeras experincias no mundo tm mostrado que o interesse individual
das pessoas pelo seu progresso funciona efetivamente quando ancorado no
desenvolvimento integrado do territrio. Com sistemas simples de seguimento de
qualidade de vida local, e o condicionamento do acesso aos recursos estruturao de
entidades locais de promoo do desenvolvimento, gera-se a base organizacional de um
desenvolvimento mais equilibrado. J se foi o tempo em que se acreditava em projetos
paraquedas: o desenvolvimento funciona quando participativo, com um razovel equilbrio entre o fomento externo e a dimenso endgena do processo.
A racionalidade da alocao dos recursos exige em ltima instncia uma avaliao
eficiente do uso final dos emprstimos, coisa bastante mais trabalhosa do que o
comrcio de derivativos outras atividades especulativas. O agente de crdito no nvel
local, que conhece o seu bairro e a sua comunidade, as necessidades e os potenciais da
regio, torna-se de certa maneira um credenciador da solidez dos usos finais dos
recursos. trabalhoso, exige conhecer a realidade das pessoas, fazer o seguimento, mas
a nica maneira de transformar as poupanas de uns no aumento da produtividade de
todos, a chamada produtividade sistmica do territrio.
ampla a experincia nesta rea, desde o Grameen Bank no Bangladesh, at as ONGs
de intermediao financeira da Frana, a constituio de Bancos Comunitrios de
Desenvolvimento e de Oscips de crdito em numerosos municpios no Brasil, a
evoluo das experincias de microcrdito do Banco do Nordeste. A exigncia da
aplicao local da poupana da populao, com regras mais amplas de compensao
entre regies ricas e pobres atravs da rede pblica, dever permitir o financiamento
tanto da micro e pequena empresa, como de organizaes da sociedade civil
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empenhadas em projetos sociais e ambientais, investimentos pblicos locais e regionais
em saneamento, manuteno urbana, e semelhantes.
Os diversos programas sociais do governo brasileiro, desde o Bolsa Famlia at o Luz para Todos, convergem no seu impacto de dinamizar o acesso local a recursos, mesmo nas regies mais pobres do pas. Esta convergncia agora reforada com o
programa Territrios da Cidadania que representa um programa anti-recessivo de recorte rooseveltiano capaz de compor - ao lado do PAC16 (necessita de um rodap)-
uma poderosa alavanca, no apenas para resistir s turbulncias atuais, mas para
deflagrar uma nova dinmica de crescimento, mais equilibrada do ponto de vista
regional, e capaz de incorporar, de fato, as populaes do campo ao desenvolvimento do
sculo XXI. So cerca de 20 bilhes de reais para 120 regies do pas. Esta viso, de
apoio ao desenvolvimento local, tanto responde a uma poltica anticclica como
democratizao do governo e ao resgate das desigualdades.
No conjunto, est se desenhando em parte graas crise financeira de 2008 mas sobretudo pelo acmulo de desequilbrios crticos um Estado mais descentralizado, mais participativo, mais democrtico nos seus processos decisrios, mais transparente
no plano da informao, e com maior papel articulador dos diversos agentes de
transformao da sociedade.
No conjunto, naturalmente, se os instrumentos de gesto pblica constituem um vetor
chave de transformao, no h como ignorar a profundidade da mudana cultural que
necessria para que o prprio Estado mude. O que temos pela frente, uma mudana
civilizatria, com a dimenso que isto significa, e com a janela de tempo relativamente
curta que temos pela frente. A conscincia dos desafios e o sentimento de urgncia
penetram lentamente nas mentes das pessoas. A nossa tarefa, trabalhar nesta tomada
de conscincia e ajudar na construo dos rumos.
III ESBOOS DE AGENDA
Est na moda dizer que o estatismo ruiu com o muro de Berlim, e o neo-liberalismo
com o muro de Wall Street. Morreram, na realidade, as vises simplificadoras dos
processos decisrios da sociedade. A viso dicotmica que nos deu o estado burocrtico
do Leste europeu de um lado, e a arrogncia corporativa exemplificada por Wall Street
por outro, que esto em crise. A sociedade complexa moderna j no comporta este
tipo de simplificaes. Temos de desenvolver processos mais flexveis e diferenciados
de regulao, no estrangulando os processos decisrios, mas aproximando-os das
necessidades reais da sociedade, com mais transparncia e democracia. Como
sociedade, desejamos no somente sobreviver, mas viver com qualidade de vida. E isto
implica elencarmos de forma ordenada os desafios e as respostas. So os resultados
mnimos a serem atingidos, com os processos decisrios correspondentes.
As propostas, ou linhas de ao sugeridas abaixo, tm um denominador comum: todas
j foram experimentadas e esto sendo aplicadas em diversas regies do mundo, setores
ou instncias de atividade. So iniciativas que deram certo, e cuja generalizao, com as
devidas adaptaes e flexibilidade em funo da diversidade planetria, hoje vivel.
16 PAC Programa de Acelerao do Crescimento, um dos programas centrais do governo federal brasileiro no sentido de dinamizar a expanso de infraestruturas, gerar empregos, reforar a incluso
(PAC Social) e enfrentar a crise financeira global.
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No temos a iluso relativamente distncia entre a realidade poltica de hoje e as
medidas sistematizadas abaixo. Mas pareceu-nos essencial, de toda forma, elencar de
forma organizada as medidas necessrias, pois ter um norte mais claro ajuda na
construo de uma outra governana planetria. No esto ordenados por objetivos, pois
a maioria tem implicaes simultneas e dimenses interativas.
1 - Resgatar a dimenso pblica do Estado
Como podemos ter mecanismos reguladores que funcionem se o dinheiro das
corporaes a regular que elege os reguladores? Se as agncias que avaliam risco so
pagas por quem cria o risco? Se aceitvel que os responsveis de um banco central
venham das empresas que precisam ser reguladas, e voltam para nelas encontrar
emprego?
Uma das propostas mais evidentes da ltima crise financeira, e que encontramos
mencionada em quase todo o espectro poltico, a necessidade de se reduzir a
capacidade das corporaes privadas ditarem as regras do jogo. A quantidade de leis
aprovadas no sentido de reduzir impostos sobre transaes financeiras, de reduzir a
regulao de banco central, de autorizar os bancos a fazerem toda e qualquer operao,
somado com o poder dos lobbies financeiros tornam evidente a necessidade de se
resgatar o poder regulador do estado, e para isto os polticos devem ser eleitos por
pessoas de verdade, e no por pessoas jurdicas, que constituem fices em termos de
direitos humanos. Enquanto no tivermos financiamento pblico das campanhas,
polticas que representem os interesses dos cidados, prevalecero os interesses
econmicos de curto prazo e a corrupo.
2 - Refazer as contas
As contas tm de refletir os objetivos que visamos. O PIB indica a intensidade do uso
do aparelho produtivo, mas no nos indica a utilidade do que se produz, para quem, e
com que custos para o estoque de bens naturais de que o planeta dispe. Conta como
aumento do PIB um desastre ambiental, o aumento de doenas, o cerceamento de acesso
a bens livres. O IDH j foi um imenso avano, mas temos de evoluir para uma
contabilidade integrada dos resultados efetivos dos nossos esforos, e particularmente
da alocao de recursos financeiros, em funo de um desenvolvimento que no seja
apenas economicamente vivel, mas tambm socialmente justo e ambientalmente
sustentvel. As metodologias existem, aplicadas parcialmente em diversos pases,
setores ou pesquisas. A ampliao dos indicadores internacionais como o IDH, a
generalizao de indicadores nacionais como os Calvert-Henderson Quality of Life
Indicators nos Estados Unidos, as propostas da Comisso Stiglitz/Sen/Fitoussi, o
movimento FIB Felicidade Interna Bruta todos apontam para uma reformulao das contas. A adoo em todos as cidades de indicadores locais de qualidade de vida veja-se os Jacksonville Quality of Life Progress Indicators tornou-se hoje indispensvel para que seja medido o que efetivamente interessa: o desenvolvimento sustentvel, o
resultado em termos de qualidade de vida da populao. Muito mais do que o output,
trata-se de medir o outcome.
3 - Assegurar a renda bsica
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. A pobreza crtica o drama maior, tanto pelo sofrimento que causa em si, como pela
articulao com os dramas ambientais, o no acesso ao conhecimento, a deformao do
perfil de produo que se desinteressa das necessidades dos que no tm capacidade
aquisitiva. A ONU calcula que custaria 300 bilhes de dlares (no valor do ano 2000)
tirar da misria um bilho de pessoas que vivem com menos de um dlar por dia. So
custos ridculos quando se considera os trilhes transferidos para grupos econmicos
financeiros no quadro da ltima crise financeira. O benefcio tico imenso, pois
inaceitvel morrerem de causas ridculas 10 milhes de crianas por ano. O benefcio de
curto e mdio prazo grande, na medida em que os recursos direcionados base da
pirmide dinamizam imediatamente a micro e pequena produo, agindo como processo
anticclico, como se tem constatado nas polticas sociais de muitos pases. No mais
longo prazo, ser uma gerao de crianas que tero sido alimentadas decentemente, o
que se transforma em melhor aproveitamento escolar e maior produtividade na vida
adulta. Em termos de estabilidade poltica e de segurana geral, os impactos so bvios.
Trata-se do dinheiro mais bem investido que se possa imaginar, e as experincias
brasileira, mexicana e de outros pases j nos forneceram todo o know-how
correspondente. A teoria to popular de que o pobre se acomoda se receber ajuda,
simplesmente desmentida pelos fatos: sair da misria estimula.
4 - Assegurar o direito de ganhar a vida
Toda pessoa que queira ganhar o po da sua famlia deveria poder ter acesso ao
trabalho. Num planeta onde h um mundo de coisas a fazer, inclusive para resgatar o
meio ambiente, absurdo o nmero de pessoas sem acesso a formas organizadas de
produzir e gerar renda. Temos os recursos e os conhecimentos tcnicos e
organizacionais para assegurar, em cada vila ou cidade, acesso a um trabalho decente e
socialmente til. As experincias de Maharashtra na ndia demonstraram a sua
viabilidade, como o mostram as numerosas experincias brasileiras, sem falar no New
Deal da crise dos anos 1930. So opes onde todos ganham: o municpio melhora o
saneamento bsico, a moradia, a manuteno urbana, a policultura alimentar. As
famlias passam a poder viver decentemente; e a sociedade passa a ser melhor
estruturada e menos tensionada. Os gastos com seguro-desemprego se reduzem. No
caso indiano, cada vila ou cidade obrigada a ter um cadastro de iniciativas intensivas
em mo de obra. Dinheiro emprestado ou criado desta forma representa investimento,
melhoria de qualidade de vida, e d excelente retorno. E argumento fundamental:
assegura que todos tenham o seu lugar para participar na construo de um
desenvolvimento sustentvel. Na organizao econmica, alm do resultado produtivo,
essencial pensar no processo estruturador ou desestruturador gerado. A pesca ocenica
industrial pode ser mais produtiva em volume de peixe, mas o processo desastroso,
tanto para a vida no mar como para centenas de milhes de pessoas que viviam da pesca
tradicional. A dimenso de gerao de emprego de todas as iniciativas econmicas tem
de se tornar central.
5 - Reduzir a jornada de trabalho
A sub-utilizao da fora de trabalho um problema planetrio, ainda que desigual na
sua gravidade. No Brasil, conforme vimos, com 100 milhes de pessoas na PEA, temos
40 milhes formalmente empregadas no setor privado, e 9 milhes de empregados
pblicos. A conta no bate. O setor informal situa-se na ordem de 40% da PEA. Uma
imensa parte da nao se vira para sobreviver. No lado dos empregos de ponta, as pessoas no vivem por excesso de carga de trabalho. No se trata aqui de uma exigncia
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de luxo: so incontveis os suicdios nas empresas onde a corrida pela eficincia se
tornou simplesmente desumana. O stress profissional est se tornando uma doena
planetria, e a questo da qualidade de vida no trabalho passa a ocupar um espao
central. A redistribuio social da carga de trabalho torna-se hoje uma necessidade. As
resistncias so compreensveis, mas a realidade que com os avanos da tecnologia os
processos produtivos tornam-se cada vez menos intensivos em mo de obra, e reduzir a
jornada uma questo de tempo. No podemos continuar a basear o nosso
desenvolvimento em ilhas tecnolgicas ultramodernas enquanto se gera uma massa de
excludos, inclusive porque se trata de equilibrar a remunerao e, consequentemente, a
demanda. A reduo da jornada no reduzir o bem estar ou a riqueza da populao, e
sim a deslocar para novos setores mais centrados no uso do tempo livre, com mais
atividades de cultura e lazer. No precisamos necessariamente de mais carros e de mais
bonecas Barbie, precisamos sim de mais qualidade de vida.
6 - Favorecer a mudana do comportamento individual
Neste planeta de 7 bilhes de habitantes, com um aumento anual da ordem de 75
milhes, toda poltica envolve tambm uma mudana de comportamento individual e
da cultura do consumo. O respeito s normas ambientais, a moderao do consumo, o
cuidado no endividamento, o uso inteligente dos meios de transporte, a generalizao da
reciclagem, a reduo do desperdcio h um conjunto de formas de organizao do nosso cotidiano que passa por uma mudana de valores e de atitudes frente aos desafios
econmicos, sociais e ambientais. No apago energtico do final dos anos 90 no Brasil,
constatou-se como uma boa campanha informativa, o papel colaborativo da mdia, e a
punio sistemtica dos excessos permitiu uma racionalizao generalizada do uso
domstico da energia. Esta dimenso da soluo dos problemas essencial, e envolve
tanto uma legislao adequada, como sobretudo uma participao ativa da mdia.
Hoje 95% dos domiclios no Brasil tm televiso, e o uso informativo inteligente deste e
de outros meios de comunicao tornou-se fundamental. Frente aos esforos necessrios
para reequilibrar o planeta, no basta reduzir o martelar publicitrio que apela para o
consumismo desenfreado, preciso generalizar as dimenses informativas dos meios de
comunicao. A mdia cientfica praticamente desapareceu, os noticirios navegam no
atrativo da criminalidade, quando precisamos vitalmente de uma populao informada
sobre os desafios reais que enfrentamos. Grande parte da mudana do comportamento
individual depende de aes pblicas: as pessoas no deixaro o carro em casa (ou
deixaro de t-lo) se no houver transporte pblico, no faro reciclagem se no houver
sistemas adequados de coleta. Precisamos de uma poltica pblica de mudana do
comportamento individual.
7 - Racionalizar os sistemas de intermediao financeira
A alocao final dos recursos financeiros deixou de ser organizada em funo dos usos
finais de estmulo e orientao de atividades econmicas e sociais, para obedecer s
finalidades dos prprios intermedirios financeiros. A atividade de crdito sempre
uma atividade pblica, seja no quadro das instituies pblicas, seja no quadro dos
bancos privados que trabalham com dinheiro do pblico, e que para tanto precisam de
uma carta-patente que os autoriza a ganhar dinheiro com dinheiro dos outros. A recente
crise financeira de 2008 demonstrou com clareza o caos que gera a ausncia de
mecanismos confiveis de regulao no setor. Nas ltimas duas dcadas, temos saltado
de bolha em bolha, de crise em crise, sem que a relao de foras permita a
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reformulao do sistema de regulao em funo da produtividade sistmica dos
recursos. Enquanto no se gera uma relao de foras mais favorvel, precisamos
batalhar os sistemas nacionais de regulao financeira. O dinheiro no mais produtivo
onde rende mais para o intermedirio: devemos buscar a produtividade sistmica de um
recurso que pblico.
A Coria do Sul abriu recentemente um financiamento de 36 bilhes de dlares para
financiar transporte coletivo e alternativas energticas, gerando com isto 960 mil
empregos. O impacto positivo ambiental pela reduo de emisses, anti-cclico pela
dinamizao da demanda, social pela reduo do desemprego e pela renda gerada,
tecnolgico pelas inovaes que gera nos processos produtivos mais limpos. Tem
inclusive um impacto raramente considerado, que a reduo do tempo vida que as
pessoas desperdiam no transporte. Trata-se aqui, evidentemente, de financiamento
pblico, pois os bancos comerciais no teriam esta preocupao, nem esta viso
sistmica. (UNEP,Global Green New Deal, 2009). Em ltima instncia, os recursos
devem ser tornados mais acessveis segundo que os objetivos do seu uso sejam mais
produtivos em termos sistmicos, visando um desenvolvimento mais inclusivo e mais
sustentvel. A intermediao financeira um meio, no um fim.
8 - Taxao das transaes especulativas
Uma das alternativas mais frequentemente sugeridas, a taxao das transaes
especulativas. Na linha da antiga proposta de James Tobin, uma taxa de por exemplo
0,20% sobre cada transao reduziria drasticamente a lucratividade dos que tm como
atividade o constante movimento de capitais, ao que apresentada pelos
especuladores como aumentando a fluidez do mercado, quando na realidade gera
comportamentos de manada que joga preos de papis e de commodities para cima e
para baixo e desorganiza qualquer atividade de planejamento organizado da produo e
do investimento produtivo. Um segundo importante efeito de uma taxa deste tipo que
todas as transaes passariam a ser registradas, o que reduziria drasticamente os
imensos volumes de movimentos ilegais, em particular a evaso fiscal e o uso de
parasos fiscais. Trata-se de uma medida necessria, ainda que no suficiente, para a
desintermediao das transaes, e reduo dos diversos tipos de atividades alavancadas
(cary trade etc.). A recente aplicao no Brasil de uma taxa de 6% sobre capitais que
entram mostra o potencial de polticas nacionais de racionalizao dos fluxos
especulativos.
Particular ateno precisa ser dada aos intermedirios que ganham apenas nos fluxos
entre outros intermedirios com papis que representam direitos sobre outros papis e que tm tudo a ganhar com a maximizao dos fluxos, pois so remunerados por
comisses sobre o volume e ganhos, e geram portanto volatilidade e pro-ciclicidade,
com os monumentais volumes que nos levaram por exemplo a valores em derivativos da
ordem de 630 trilhes de dlares em dezembro de 2011, quase 10 vezes o PIB mundial.
A intermediao especulativa diferentemente das intermediao de compras e vendas entre produtores e utilizadores finais apenas gera uma pirmide especulativa e insegurana, alm de desorganizar os mercados e as polticas econmicas.17
9 - Repensar a lgica dos sistemas tributrios
17 Os dados sobre os derivativos emitidos (outstanding derivatives) podem ser consultados no site do BIS,
de Basilia.
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Uma poltica tributria, equilibrada na cobrana, e reorientada na aplicao dos
recursos, constitui um dos instrumentos fundamentais de que dispomos, sobretudo
porque pode ser promovida por mecanismos democrticos. O eixo central no est na
reduo dos impostos, e sim na cobrana socialmente mais justa e na alocao mais
produtiva em termos sociais e ambientais. A taxao das transaes especulativas
(nacionais ou internacionais) dever gerar fundos para financiar uma srie de polticas
essenciais para o reequilbrio social e ambiental. O imposto sobre grandes fortunas
hoje essencial para reduzir o poder poltico das dinastias econmicas (10% das famlias
do planeta dono de 90% do patrimnio familiar acumulado no planeta). O imposto
sobre a herana fundamental para dar chances a partilhas mais equilibradas para as
sucessivas geraes. O imposto sobre a renda deve adquirir mais peso relativamente aos
impostos indiretos, com alquotas que permitam efetivamente redistribuir a renda.
importante lembrar que as grandes fortunas do planeta em geral esto vinculadas no a
um acrscimo de capacidades produtivas do planeta, e sim aquisio maior de
empresas por um s grupo, gerando uma pirmide cada vez mais instvel e menos
governvel de propriedades cruzadas, imprios onde a grande luta pelo controle do
poder financeiro, poltico e miditico, e a apropriao de recursos naturais. O sistema
tributrio tem de ser reformulado no sentido anti-cclico, privilegiando atividades
produtivas e penalizando as especulativas; no sentido do maior equilbrio social ao ser
fortemente progressivo; e no sentido de proteo ambiental ao taxar emisses txicas ou
geradoras de mudana climtica, bem como o uso de recursos naturais no renovveis.18
Particular ateno dever ser dada s taxas sobre emisso de gases do efeito estufa, que
devero desempenhar um papel importante em termos de captao de recurso, e podero
constituir um fundo de primeira importncia, para o equilbrio ambiental. Est se
tornando evidente que o mercado de carbono simplesmente no suficiente como
mecanismo de dissuaso das emisses. A aplicao de taxas sobre as emisses j em curso na Sucia, na Noruega, ou na Itlia tecnicamente simples, e o seu uso generalizado permite que os usurios particulares ou industriais sejam obrigados a
incorporar nas suas decises econmicas os custos reais indiretamente gerados para toda
a sociedade, inclusive as futuras geraes.
10 - Repensar a lgica oramentria
O poder redistributivo do Estado grande, tanto pelas polticas que executa por exemplo as polticas de sade, lazer, saneamento e outras infra-estruturas sociais que
melhoram o nvel de consumo coletivo como pelas que pode fomentar, como opes energticas, incluso digital e assim por diante. Fundamental tambm a poltica
redistributiva que envolve poltica salarial, de previdncia, de crdito, de preos, de
emprego. A forte presena das corporaes junto ao poder poltico constitui um dos
entraves principais ao equilbrio na alocao de recursos. O essencial assegurar que
todas as propostas de alocao de recursos sejam analisadas pelo triplo enfoque
econmico, social e ambiental. No caso brasileiro, constatou-se com as recentes
polticas sociais (Bolsa-Famlia, polticas de previdncia etc.) que volumes relativamente limitados de recursos, quando chegam base da pirmide, so incomparavelmente mais produtivos, tanto em termos de reduo de situaes crticas e
18 Susan George traz uma ilustrao convincente: um bilionrio que aplica o seu dinheiro com uma
conservadora remunerao de 5% ao ano, aumenta a sua fortuna em 137 mil dlares por dia. Taxar este
tipo de ganhos no aumentar os impostos, corrigir absurdos.
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consequente aumento de qualidade de vida, como pela dinamizao de atividades
econmicas induzidas pela demanda local. A democratizao aqui fundamental. A
apropriao dos mecanismos decisrios sobre a alocao de recursos pblicos est no
centro dos processos de corrupo, envolvendo as grandes bancadas corporativas, por
sua vez ancoradas no financiamento privado das campanhas.
11 - Facilitar o acesso ao conhecimento e s tecnologias sustentveis
A participao efetiva das populaes nos processos de desenvolvimento sustentvel
envolve um denso sistema de acesso pblico e gratuito informao necessria. A
conectividade planetria que as novas tecnologias permitem constitui uma ampla via de
acesso direto. O custo-benefcio da incluso digital generalizada simplesmente
imbatvel, pois um programa que desonera as instncias administrativas superiores, na
medida em que as comunidades com acesso informao se tornam sujeitos do seu
prprio desenvolvimento. A rapidez da apropriao deste tipo de tecnologia at nas
regies mais pobres se constata na propagao do celular, das lan houses mais
modestas. O impacto produtivo imenso para os pequenos produtores que passam a ter
acesso direto a diversos mercados tanto de insumos como de venda, escapando aos
diversos sistemas de atravessadores comerciais e financeiros. A incluso digital
generalizada um destravador potente do conjunto do processo de mudana que hoje se
torna indispensvel.
O mundo frequentemente esquece que 2 bilhes de pessoas ainda cozinham com lenha,
rea em que h inovaes significativas no aproveitamento calrico por meio de foges
melhorados. Tecnologias como o sistema de cisternas do Nordeste, de aproveitamento
da biomassa, de sistemas menos agressivos de proteo dos cultivos etc., constituem um
vetor de mudana da cultura dos processos produtivos. A criao de redes de ncleos de
fomento tecnolgico online, com ampla capilaridade, pode se inspirar da experincia da
ndia, onde foram criados ncleos em praticamente todas as vilas do pas. O World
Economic and Social Survey 2009 particularmente eloquente ao defender a
flexibilizao de patentes no sentido de assegurar ao conjunto da populao mundial o
acesso s informaes indispensveis para as mudanas tecnolgicas exigidas por um
desenvolvimento sustentvel.
12 - Democratizar a comunicao
A comunicao uma das reas que mais explodiu em termos de peso relativo nas
transformaes da sociedade. Estamos em permanncia cercados de mensagens. As
nossas crianas passam horas submetidas publicidade ostensiva ou disfarada. A
indstria da comunicao, com sua fantstica concentrao internacional e nacional - e
a sua crescente interao entre os dois nveis - gerou uma mquina de fabricar estilos de
vida, um consumismo obsessivo que refora o elitismo, as desigualdades, o desperdcio
de recursos como smbolo de sucesso. O sistema circular permite que os custos sejam
embutidos nos preos dos produtos que nos incitam a comprar, e ficamos envoltos em
um cacarejo permanente de mensagens idiotas pagas do nosso bolso. Mais
recentemente, a corporao utiliza este caminho para falar bem de si, para se apresentar
como sustentvel e, de forma mais ampla, como boa pessoa. O espectro eletromagntico
em que estas mensagens navegam pblico, e o acesso a uma informao inteligente e
gratuita para todo o planeta, simplesmente vivel. Expandindo gradualmente as
inmeras formas alternativas de mdia que surgem por toda parte, h como introduzir
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uma cultura nova, outras vises de mundo, cultura diversificada e no pasteurizada,
pluralismo em vez de fundamentalismos religiosos ou comerciais.
13 Resgatando a capacidade pblica de planejamento
Com uma populao de 7 bilhes, e 80 milhes a mais a cada ano, presso crescente
sobre os recursos naturais, desigualdades explosivas e um sistema financeiro catico,
estamos voltando ao planejamento como um instrumento necessrio de governana.
No mais uma questo da eterna disputa ideolgica sobre a dominncia do estatal ou
do privado, mas uma compreenso de que na sociedade mista realmente existente, as
esferas empresarial, pblica e da sociedade civil tm de construir um novo pacto social
para o bem comum. O planejamento centralizado e controlado pelo estado apenas
mostrou as suas limitaes, mas sem planejamento democrtico, construo de
consensos e gerao de sinergias entre os diferentes agentes envolvidos, no h
perspectiva para a capacidade de governo que necessitamos. No quadro dos atuais
desafios, o que nos falta no so os recursos, mas sim instrumentos para utiliz-los de
maneira mais organizada. O planejamento econmico, social e ambiental, ao colocar em
pblico e antecipadamente as opes de desenvolvimento, e ao permitir que sejam
discutidas, uma condio necessria para um processo decisrio mais democrtico. O
imenso progresso que j conseguimos na capacidade de organizar informao, de torn-
la disponvel para todos os nveis da sociedade, abre uma amplo leque de oportunidades
para um sistema de alocao de recursos simultaneamente centrado no bem comum, na
democracia econmica e na eficincia da gesto.
A lista de propostas e sugestes pode evidentemente alongar-se. O fato que mais inspira
esperana a multiplicao impressionante de iniciativas nos planos da tecnologia, dos
sistemas de gesto local, da expanso dos movimentos sociais organizados, das
iniciativas de economia solidria, do uso da internet para democratizar o conhecimento,
da descoberta de novas formas de produo menos agressivas, de formas mais
equilibradas de acesso aos recursos. O Brasil neste plano tem mostrado que comear a
construir uma vida mais digna para o andar de baixo, para os dois teros de excludos, no gera tragdias para os ricos. Inclusive, numa sociedade mais equilibrada, todos
passaro a viver melhor.
Carlos Lopes Sub-Secretrio Geral da ONU, encarregado do UNITAR em Genebra (www.unitar.org) e
da Escola de Lderes da ONU em Turim (www.unssc.org). Especialista em desenvolvimento pelo
Instituto de Altos Estudos Internacionais e Desenvolvimento da Universidade de Genebra tm tambm
um Doutoramento em Histria pela Universidade de Paris 1, Panthon-Sorbonne. Tm numerosa
bibliografia publicada e faz parte de 12 conselhos acadmicos. As opinies aqui expressas so pessoais.
Ignacy Sachs, eco-socioeconomista nascido na Polnia em 1927, com estudos superiores no Brasil, na
ndia e na Polnia. Desde 1968, professor da Escola de Altos Estudos en Cincias Sociais em Paris
(E.H.E.S.S.) onde criou e dirigiu sucessivamente o Centre International de Recherches sur
l'Environnement et le Dveloppement (C.I.R.E.D.) e o Centre de Recherches sur le Brsil Contemporain
(C.R.B.C.). Consultor em vrias ocasies da Organizao das Naes Unidas, tendo participado dos
preparativos da Conferncia de Estocolmo sobre o Meio Ambiente (1972) e da Cpula da Terra de Rio de
Janeiro (1992). A sua bibliografia acessvel no site: http://bit.ly/4AYaHu
Ultimo livro publicado no Brasil: A terceira margem - em busca do ecodesenvolvimento, Companhia das
Letras, So Paulo, 2009.
Ladislau Dowbor professor titular no departamento de ps-graduao da Pontifcia Universidade
Catlica de So Paulo. consultor de diversas agncias das Naes Unidas, governos e municpios, bem
como do Sebrae e outras instituies. Seus livros e artigos podem ser acessados na ntegra no site
http://dowbor.org, na linha do Creative Commons (livre acesso no comercial) Contato: