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CÁSSIA ALVES LIMA
COMPOSIÇÃO E VARIAÇÃO SAZONAL DA COMUNIDADE DE AVES
DE SUB-BOSQUE DE MATA SECA, CERRADO E MATA CILIAR
ADJACENTES NO NORTE DE MINAS GERAIS
Montes Claros, Minas Gerais Junho de 2011
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CÁSSIA ALVES LIMA
COMPOSIÇÃO E VARIAÇÃO SAZONAL DA COMUNIDADE DE AVES
DE SUB-BOSQUE DE MATA SECA, CERRADO E MATA CILIAR
ADJACENTES NO NORTE DE MINAS GERAIS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas da Universidade Estadual de Montes Claros, como requisito necessário para a obtenção de título de Mestre em Ciências Biológicas.
Orientador: Dr. Lemuel Olívio Leite
Montes Claros, Minas Gerais Junho de 2011
v
À Mariana Carvalho.
“Mais bonito que o canto dos pássaros são os seus vôos,
pois nem todo canto é de alegria, mas todo vôo é de liberdade!”
vi
AGRADECIMENTOS
À minha família, principalmente aos meus pais que nunca deixaram de acreditar
em mim. Ao Renan, não só pelo companheirismo, carinho e paciência que teve, mas
também pela ajuda com as análises, gráficos e revisões. À Laurinha, grande amiga que
me ajudou em muitos momentos, da graduação ao mestrado. Obrigada pelas correções,
conversas e apoio.
Ao pessoal das aves! Àqueles que passaram pelo Laboratório, aos que
continuam e aos que estão apenas começando. É bom poder ter com quem conversar e
dividir os aprendizados. Gostaria de agradecer especialmente a todos que participaram
das coletas do CT-HIDRO, Lemuel, Raíssa, Danimel, Paulinho, Helma, Karen, Thalita,
Janiele. Obrigada também à Jannyne, que muito me ajudou nos últimos meses. Todos
deixarão saudades, cada um da sua forma!
À Universidade Estadual de Montes Claros, ao PPGCB e os professores, que
muito me ajudaram a trilhar todo este caminho. Em especial ao Professor Anderson
Medeiros que me orientou nos primeiros semestres do curso. Sua ajuda foi fundamental
para que eu chegasse até aqui! Também aos professores que compõem a banca
avaliadora. Suas sugestões e críticas serão imprescindíveis para a melhora deste
trabalho. Em especial gostaria de agradecer ao meu orientador Lemuel O. Leite, que
acreditou em mim e no meu trabalho. Deixo aqui o meu “muito obrigada” pelos
ensinamentos desde a graduação, que foi quando começou todo o nosso trabalho. Com
certeza aprendi muito com você.
Aos colegas de mestrado, todos eles, mas em especial Gabi, Raissinha, Iuri, José
Bento e Cleandson, pelas discussões filosóficas, pelas ajudas com trabalhos e análises, e
pelos sábios conselhos nos momentos de desespero. Também aos Luizes Eduardo e
Falcão e ao João. Valeu pelos momentos de descontração, e também pelas ajudas
vii
durante o mestrado. Com um carinho enorme gostaria de agradecer à Raissa e Gabi,
que por serem pessoas incomparáveis, a ordem aqui é meramente por tempo de
chegada! Primeiro à Raissinha, companheira de laboratório por tanto tempo. Obrigada
pela paciência nas diversas vezes que te procurei para perguntar sobre alguma análise. E
à Gabi, que me mostrou que boas amizades surgem mesmo quando achamos que nosso
círculo já está fechado. Sou grata pela ajuda com o abstract e por me obrigar a estudar
estatística.
Muito obrigada por me ajudarem no meu crescimento!
viii
SUMÁRIO
Lista de Figuras ............................................................................................................... ix
Lista de Tabelas.............................................................................................................. xii
Resumo .......................................................................................................................... xiii
Abstract ......................................................................................................................... xiv
1. Introdução .................................................................................................................. 01
2. Material e Métodos ..................................................................................................... 07
2.1. Área de Estudo ...............................................................................................07
2.2. Amostragem da Avifauna...............................................................................10
2.3. Análises Estatísticas....................................................................................... 11
3. Resultados ................................................................................................................. 14
4. Discussão .................................................................................................................. 24
5. Referências Bibliográficas ........................................................................................ 33
6. Anexo.......................................................................................................................... 43
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Localização e delimitação da APA da Bacia do Rio Pandeiros, situada nos
municípios de Bonito de Minas, Cônego Marinho e Januária, no extremo norte do
Estado de Minas Gerais. Fonte: Modificado de Rezende et al. (2011).. ....................... 07
Figura 2: Precipitação pluviométrica média dos municípios de São Francisco (1961-
1990) e Januária (1976-1990), onde parte da APA da Bacia do Rio Pandeiros está
inserida. Fonte: Modificado de 5º Disme. ...................................................................... 08
Figura 3: Temperatura média do município de Januária (1976-1990), onde parte da APA
da Bacia do Rio Pandeiros está inserida. Fonte: Modificado de 5º Disme. ................... 08
Figura 4: Fitofisionomias estudadas na Área de Proteção Ambiental Estadual Rio
Pandeiros e sua caracterização nos períodos seco e chuvoso. Floresta Estacional
Decidual nos períodos seco (A) e chuvoso (B), Mata Ciliar nos períodos seco (C) e
chuvoso (D) e o Cerrado nos períodos seco (E) e chuvoso (F). ..................................... 09
Figura 5: Rede de neblina montada durante o período chuvoso em uma das áreas
amostrais localizada no Cerrado da APA – Rio Pandeiros. ........................................... 11
Figura 6: Algumas espécies de aves capturadas no Cerrado da APA Rio Pandeiros. a)
Chlorostilbon lucidus; b) Celeus flavescens; c) Formicivora melanogaster; d)
Thamnophilus capistratus. ............................................................................................. 14
x
Figura 7: Algumas espécies de aves capturadas na Mata Seca da APA Rio Pandeiros. a)
Tangara cayana; b) Dacnis cayana; c) Tityra cayana; d) Hemitriccus
margaritaceiventer; e) Basileuterus hypoleucus; e f) Thalurania furcata. ................... 15
Figura 8: Algumas espécies de aves capturadas na Mata Ciliar da APA Rio Pandeiros.
a) Chloroceryle americana; b) Galbula ruficauda; c) Picumnus albosquamatus; d)
Cantorchilus leucotis. .................................................................................................... 16
Figura 9: Abundância (A) e riqueza (B) acumuladas de aves de sub-bosque ao longo de
três diferentes fitofisionomias da APA Rio Pandeiros - Cerrado, Mata Seca e Mata
Ciliar (média± EP, letras diferentes acima das barras indicam diferenças significativas).18
Figura 10: Ordenação das áreas de amostragem na APA – Rio Pandeiros utilizando-se
análise de Correspondência Destendenciada. As elipses foram delimitadas para destacar
os dois agrupamentos observados. (a) Agrupamento formado apenas pelo Cerrado; (b)
agrupamento formado pelas áreas de Mata Seca e Mata Ciliar (triângulo = Cerrado,
quadrado = Mata Ciliar, círculo = Mata Seca)............................................................... 19
Figura 11: Abundância relativa das guildas de aves de sub-bosque distribuídas ao longo
de três diferentes fitofisionomias da APA – Rio Pandeiros - Cerrado, Mata Seca e Mata
Ciliar (média ± EP, letras diferentes acima das barras indicam diferenças significativas).
Abundância relativa de aves insetívoras entre as fitofisionomias (A); Abundância
relativa de aves frugívoras/granívoras entre as coletas (B) e entre as fitofisionomias (C);
e Abundância relativa de aves onívoras entre as coletas (D).......................................... 21
xi
Figura 12: Ordenação das aves insetívoras capturadas nas áreas de amostragem na APA
– Rio Pandeiros utilizando-se análise de Correspondência Destendenciada (DCA). As
elipses foram delimitadas para destacar os dois agrupamentos observados: (a)
Agrupamento formado apenas pelo Cerrado; (b) agrupamento formado pelas áreas de
Mata Seca e Mata Ciliar; triângulo = Cerrado, quadrado = Mata Ciliar, círculo = Mata
Seca). .............................................................................................................................. 22
xii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1: Análise de Deviance do modelo mínimo adequado mostrando os efeitos do
ambiente e da época de coleta na abundância, riqueza e abundância relativa de aves
insetívoras, onívoras e frugívoras/granívoras ao longo de três diferentes fitofisionomias
da APA – Rio Pandeiros. ............................................................................................... 17
Tabela 2: Abundância total (n) e abundância relativa (%) das guildas de aves de sub-
bosque nas diferentes períodos amostrados (meses) ao longo de três diferentes
fitofisionomias da APA – Rio Pandeiros – Cerrado, Mata Seca e Mata Ciliar. ............ 20
Tabela 3: Resultado da Análise de Espécies Indicadoras mostrando as espécies
indicadoras presentes nas diferentes fitofisionomias estudadas na APA – Rio Pandeiros.
Valores máximos de indicação (%) referentes às espécies e níveis de significância
obtidos pelo Teste de Monte Carlo (p). Grupo indicado corresponde ao ambiente no
qual cada espécie apresentou valor máximo de indicação, sendo este superior a 25% e
com p<0.05. .................................................................................................................... 23
xiii
RESUMO – Composição e Variação Sazonal da Comunidade de Aves de Sub-Bosque
de Mata Seca, Cerrado e Mata Ciliar Adjacentes no Norte de Minas Gerais.
LIMA, Cássia Alves. Ms. Ciências Biológicas. Universidade Estadual de Montes
Claros. Junho, 2011. Orientador: Dr. Lemuel Olívio Leite.
A sazonalidade ambiental tem grande importância na ecologia de aves, uma vez que
esta culmina em grandes variações na disponibilidade de flores, frutos e folhas. Tal
variação na disponibilidade do recurso alimentar de um ambiente constituí um fator
ecológico importante na composição e dinâmica das comunidades de aves. Diante disto,
este trabalho teve como objetivo principal avaliar a importância das Matas Ciliares do
médio São Francisco como refúgio para a avifauna de Cerrado e Mata Seca durante a
estação seca do ano. O estudo foi conduzido na APA – Rio Pandeiros, no norte do
estado de Minas Gerais. Na área foram amostrados três tipos de vegetação, sendo estes
Mata Seca, Mata Ciliar e Cerrado, todos adjacentes. A avifauna foi amostrada com
redes de neblina, no início e final das estações seca e chuvosa. Foram capturados 373
indivíduos, distribuídos em 67 espécies de aves e 26 famílias. As análises mostraram
que o Cerrado apresentou os maiores valores de abundância e riqueza de aves, sendo
que o mesmo também apresentou composição diferente dos ambientes de mata. Das
quatro guildas estudadas, a análise da composição das guildas tróficas mostrou que
apenas os insetívoros foram influenciados pelo ambiente, enquanto as demais guildas
não apresentaram influência das variáveis estudadas. Nossos resultados ressaltam que a
Mata Ciliar constituí um importante refúgio para as aves dos ambientes próximos,
principalmente a Mata Seca, cuja avifauna depende da Mata Ciliar em todas as épocas
do ano. Diante da interdependência entre os ambientes de mata, sugerimos a
necessidade de preservar tanto os fragmentos de Mata Seca quanto as Matas Ciliares
adjacentes para a conservação efetiva das aves encontradas nestes ambientes. Além
disto, a conservação das áreas de Cerrado ainda existentes na região estudada é
indispensável, já que sua avifauna apresenta baixa capacidade de utilizar ambientes
próximos. Assim, os resultados mostraram a necessidade de conservação de todo o
mosaico de vegetação, como aspecto imprescindível para a manutenção de várias
espécies da avifauna encontrada na região da APA-Rio Pandeiros.
Palavras Chave: Guildas tróficas, sazonalidade, semi-árido, riqueza e abundância de
aves.
xiv
ABSTRACT – Composition and Seasonal Variation of Bird Community of Understory
in Adjacent Dry Forest, Cerrado and Riparian Forest in Northern Minas Gerais.
LIMA, Cássia Alves. Ms. Ciências Biológicas. Universidade Estadual de Montes
Claros. Junho, 2011. Orientador: Dr. Lemuel Olívio Leite.
Seasonality is very important in the birds ecology, because it culminates in large
variations in the availability of flowers, fruits and leaves. This variation in the
availability of food resources of an environment constitutes an important ecological
factor in the composition and dynamics of bird community. Thus, the aim of this
study was to investigate the importance of Riparian Forests of the middle San Francisco
River as a refuge for birds of Dry Forest and Cerrado (a Brazilian savanna) during the
dry season. Field work was conducted at the APA - Pandeiros River in the northern state
of Minas Gerais. In this area, we sampled three different vegetation types: Dry
Forest, Riparian Forest and Cerrado, all adjacent. Birds were sampled with mist nets at
the three areas, at the beginning and end of the dry and rainy seasons. We captured 373
individuals, belonging to 67 bird species and 26 families. The analysis showed that the
highest abundance and diversity of birds were observed in Cerrado areas, which also
had different community composition in relation to forested environments. From the
four analyzed guilds, the community composition analysis indicated that only
insectivores were influenced by the vegetation types, while the other guilds had no
influence of the studied variables. Our results highlights that the Riparian Forest is an
important refuge for birds of immediate environments, especially the Dry Forest, which
its avifauna depends on the Riparian Forest in all seasons. Given the interdependence
between the forested environments, we suggest the need to preserve both the fragments
of Dry Forest and adjacent Riparian Forest for the effective conservation of several
birds found in these environments. Moreover, the conservation of the Cerrado areas still
existent in the studied region is indispensable, since its avifauna has a low capacity to
use immediate environments. Thus, the results pointed out the need for preservation of
the whole mosaic of habitats as an essencial aspect for the maintenance of several bird
species found in the region of the APA-Pandeiros River.
Key Words: trophic guilds, seasonality, semi-arid, richness and abundance of birds.
1
1. INTRODUÇÃO
As diferentes formas topográficas e as variações climática e geológica do estado
de Minas Gerais culminam na presença de fitofisionomias diversificadas, que vão desde
áreas de campos abertos (Cerrado) às Matas Ombrófilas e até mesmo Matas Secas
(Mata Atlântica) (Mello-Barreto 1942, Oliveira-Filho et al. 2006). Estas fitofisionomias
muitas vezes apresentam vegetações bem características, além de inúmeros ambientes
particulares inseridos no domínio dos biomas Cerrado, Mata Atlântica e Caatinga
(Oliveira-Filho 2006). Especificamente, a região norte do estado de Minas Gerais
caracteriza-se por possuir uma vegetação adaptada a um clima severo, marcado pela
baixa precipitação pluviométrica distribuída em um curto período do ano (Fernandes
2002). Assim, esta região se inclui no domínio da Caatinga em sua parte norte e
noroeste, transitando para o Cerrado ao sul e a oeste (Brandão 1994).
Embora os diferentes biomas existentes em Minas Gerais (Cerrado, Mata
Atlântica e Caatinga) apresentem relevância para a conservação da biodiversidade no
país, o conhecimento sobre a avifauna em alguns de seus remanescentes florestais ainda
é insuficiente. O Cerrado é um bioma que apresenta predominância de vegetação
xeromórfica semidecídua, composto por formações vegetais que podem variar de
campos abertos à florestas mais densas (Eiten 1972). Contudo, sua formação mais
comum é o Cerrado sensu stricto, que apresenta árvores baixas, tortuosas, com
ramificações retorcidas, muitas vezes com sinais de queimadas. A Mata Atlântica
também apresenta diferentes formações vegetais (IBGE 2011), com variáveis níveis de
caducifolia, sendo que no norte de Minas Gerais encontramos principalmente a Mata
Seca.
Caracterizada como fitofisionomia da Mata Atlântica (i.e., Espírito-Santo et al.
2010), a floresta estacional decidual, “Mata Seca”, apresenta uma das maiores taxas de
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desmatamento no Brasil, devido principalmente a alterações antrópicas para introdução
de cultivos e pastagens (Altieri 1998, Espírito-Santo et al. 2009, Quesada et al. 2009).
Esta fitofisionomia é marcada por singularidades como a alta deciduidade foliar, que
pode chegar a 90% (Murphy & Lugo 1986, Nascimento et al. 2004, Scariot & Sevilha
2005). A Mata Seca é, provavelmente, a fitofisionomia menos estudada em Minas
Gerais e poucos levantamentos foram realizados a respeito da fauna desta região. Todos
estes fatores levaram as áreas de Mata Seca norte-mineiras a serem consideradas de
importância biológica extrema e classificadas como prioritária para conservação e
pesquisa científica, sendo também considerada uma área importante para aves (Tabarelli
& Silva 2002, Silva et al. 2004, Develey & Goerck 2009).
Assim, as principais formações vegetais do estado de Minas Gerais vêm
sofrendo crescentes ameaças antrópicas, como é o caso do Cerrado (Klink & Machado
2005) e Mata Atlântica (Stotz et al. 1996, Collar et al. 1997, Ribon et al. 2003). Neste
contexto, conhecer as características básicas das espécies que ocorrem nestas áreas é de
fundamental importância para compreender a atual distribuição destas e gerar
informações relevantes para futuros programas de conservação. Este aspecto é apontado
por autores como Santos (2003), que relata a necessidade de inventariar a fauna e flora
local como um fator importante para a preservação de qualquer ambiente. Além disto, é
importante avaliar as diferentes fisionomias da área em estudo (Silva & Bates 2002,
Vielliard 2000), uma vez que cada formação pode apresentar características particulares
(Klink e Machado 2005) e por conseqüência composição de espécies únicas.
Diante deste tipo de estudo é possível direcionar os esforços de forma que alguns
aspectos ecológicos importantes sejam esclarecidos, como, por exemplos, a composição
e os parâmetros de riqueza e abundância de espécies existentes nas diferentes formações
presentes na região, bem como sua estrutura trófica (Klink & Machado 2005). A riqueza
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e abundância de espécies de aves são importantes medidas para monitoramento de
mudanças ambientais assim como na proposta de estratégias de manejo (Naeve et al.
1996, Palmer et al. 2008). Além disto, a composição da comunidade local também é um
aspecto ecológico importante, já que as comunidades podem variar no espaço e tempo
(Clements 1916, Whittaker 1975). Outra ferramenta utilizada tem sido a avaliação da
estrutura trófica de assembléias de aves a partir do estudo das guildas alimentares
(Willis 1979, Motta-Júnior 1990, Aleixo & Vielliard 1995, Aleixo 1999).
O uso das guildas tem grande importância prática na utilização das aves como
bioindicadores ambientais, já que podem mostrar as respostas das espécies às mudanças
do ambiente (Milesi et al. 2002, Arcos et al. 2008). As guildas podem ainda fornecer
informações importantes sobre a conservação do ambiente (Piratelli & Pereira 2002).
Por exemplo, a presença de aves insetívoras é considerada um indicativo da qualidade
de do ambiente, pois as aves desta guilda respondem negativamente aos efeitos da
fragmentação (Sekercioglu et al. 2002).
Os impactos antrópicos têm sido objeto de estudo de muitos trabalhos (i.e Aleixo
1999, Sekercioglu et al. 2002, Ribon et al. 2003), contudo, uma dada comunidade pode
estar sujeita a alterações ambientais que necessariamente não ocorrem por interferências
antrópicas. Na região tropical a maioria dos habitats apresenta sazonalidade climática
associada principalmente ao regime de chuvas, culminando em grandes variações na
disponibilidade de flores, frutos e folhas (Van Schaik et al. 1993). Estes padrões de
crescimento e perda foliar, de floração e de frutificação estão relacionados não apenas à
produção primária do ambiente, mas também à produção secundária. No Cerrado, a
porcentagem de perda de folhas varia bastante entre diferentes espécies e é bastante
assincrônica (Oliveira 1998). Já nas Matas Secas, a grande perda foliar durante a
estação seca e a produção de folhas concentrada na estação chuvosa resultam numa
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acentuada variação na abundância de artrópodes (Wolda 1978), que são a base da dieta
de muitas aves (Schubart et al. 1965, Poulin et al. 1994, Mallet-Rodrigues et al. 1997,
Piratelli & Pereira 2002, Lima et al. 2010). Ainda sobre as Matas Secas, a floração e
frutificação ocorrem em maior quantidade na estação seca, representando um
importante recurso para aves nectarívoras e frugívoras (Gentry 1990, Lack 1987). Desta
forma, disponibilidade do recurso alimentar para as diversas guildas de um ambiente é,
então, um fator ecológico importante na composição e dinâmica das comunidades de
aves (Greenberg 1981, Almeida 2003). Assim, a heterogeneidade temporal em uma
escala sub-anual, representada pela sazonalidade ambiental, tem grande importância na
ecologia de aves de ambientes tropicais.
Em função da sazonalidade, nos períodos de escassez de alimento as Matas
Ciliares podem garantir refúgio e recursos alimentares para comunidades animais de
ambientes de Cerrado adjacentes. Como visto por Ragusa-Netto (2006), a procura de
frutos por tucanos em áreas de Mata Ciliar aumenta em épocas secas do ano. Segundo
Naiman e Décamps (1997), as Matas Ciliares são aquelas que se desenvolvem nas
margens de cursos d’água e lagos e geralmente são diferentes, em estrutura e
composição florística, da vegetação em áreas distantes da água (Ribeiro & Walter 1998,
Carvalho et al. 2005). Apesar de seu potencial em receber espécies de ambientes
adjacentes, as Matas Ciliares podem apresentar algumas espécies características, que
são restritas as essas matas por estarem ligadas a fatores físicos, como água corrente ou
a estrutura arquitetural da vegetação (Silva & Vielliard 2004).
O regime de sazonalidade marcante e a distribuição de ambientes em fragmentos
(naturais ou não) favorecem a movimentação de algumas espécies entre hábitats para a
obtenção de recursos (Cavalcanti 1992). As Matas Ciliares são ambientes com estrutura
florestal e disponibilizam alimento de forma mais regular durante o ano (Cavalcanti
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1992), além de serem abrigos importantes tanto para comunidade de aves residentes
quanto migratórias (Treviño et al. 2001, Arcos et al. 2008). Nestas matas muitas
espécies de plantas frutificam continuamente (Antunes & Ribeiro 1999, Lenza & Klink
2006), além de apresentar menor deciduidade foliar, permitindo que a comunidade de
insetos herbívoros oscile menos do que em ambientes com maior queda foliar. Segundo
Tubelis e Cavalcanti (2001), as aves do Cerrado podem apresentar um deslocamento
sazonal entre matas de galerias e os Cerrados stricto sensu. Assim estas matas podem
ser importantes para estas aves, como observado também por Silva e Bates (2002), em
que proximadamente 50% das aves do Cerrado dependem de ambientes florestais,
evidenciando a importância das matas de galeria na manutenção da avifauna do
Cerrado. Deste modo, as Matas Ciliares são ambientes reconhecidos pela sua
importância na manutenção e incremento na riqueza de espécies, em especial de aves
(Schulze & Riedl 2008).
Apesar das evidências descritas sobre utilização de Matas Ciliares por animais
de Cerrado e da escassez de estudos sobre a dinâmica da avifauna de Mata Seca,
nenhum estudo sistemático foi realizado com o objetivo de avaliar o fluxo de
organismos entre estes três ambientes. Especificamente no semi-árido norte-mineiro,
estudos sistemáticos realizados com aves são escassos e as informações sobre este grupo
se limitam a registros de ocorrência. Portanto, estudos que visem entender o fluxo de
indivíduos entre ambientes sazonais e Matas Ciliares são de grande importância para
conhecer a biologia básica das espécies, além de fornecer dados importantes para
elaboração de futuros planos de conservação.
Diante do exposto, o presente trabalho teve como objetivo geral: i) avaliar a
importância das Matas Ciliares do médio São Francisco como refúgio para a avifauna
de Cerrado e Florestas Estacionais Deciduais durante a estação seca do ano. Os
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objetivos específicos foram: (ii) verificar a influência do ambiente e da sazonalidade na
riqueza e abundância de aves de sub-bosque; (iii) verificar a influência dos ambientes e
sazonalidade sobre a abundância relativa das guildas alimentares; (iv) avaliar a
composição de espécies e de cada guilda trófica em relação aos períodos de coleta e aos
tipos de ambientes; (v) avaliar as espécies características de cada ambiente estudado.
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2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. Área de Estudo
O estudo foi conduzido na Área de Proteção Ambiental Estadual Rio Pandeiros
(APA – Rio Pandeiros), extremo Norte do estado de Minas Gerais. A APA está
localizada na margem esquerda do médio São Francisco, e compreende parte dos
municípios de Bonito de Minas, Cônego Marinho e Januária (Figura 1). A bacia do Rio
Pandeiros possui precipitação média anual entre 1057.4mm e 1132.9mm, com estações
seca e chuvosa bem definidas, ocorrendo nos meses de abril a setembro e de outubro a
março, respectivamente (Figura 2). A temperatura média anual é de 24°C, oscilando
entre 32,3°C e 17,7°C (Figura 3) (IGA 2006).
Figura 1: Localização e delimitação da APA da Bacia do Rio Pandeiros, situada nos municípios de Bonito de Minas, Cônego Marinho e Januária, no extremo norte do Estado de Minas Gerais. Fonte: Modificado de Rezende et al. (2011).
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Figura 2: Precipitação pluviométrica média dos municípios de São Francisco (1961-1990) e Januária (1976-1990), onde parte da APA da Bacia do Rio Pandeiros está inserida. Fonte: Modificado de 5º Disme.
Figura 3: Temperatura média do município de Januária (1976-1990), onde parte da APA da Bacia do Rio Pandeiros está inserida. Fonte: Modificado de 5º Disme.
Segundo Ribeiro e Walter (1998), na área da bacia do Rio Pandeiros podem ser
distinguidos alguns tipos de vegetação, dentre eles o Cerrado, Mata Ciliar e Floresta
Decidual (Figura 4). As Matas Ciliares normalmente apresenta-se como um tipo
florestal sempre verde, constituídas de árvores altas, acima de 20 metros e com um sub-
bosque com árvores baixas, como arbustos, subarbustos (Naiman & Décamps 1997).
Também podem ser observados alguns cipós. Na região da APA as espécies
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encontradas nesta fitofisionomia também apresentam influência das formações vegetais
próximas, como a Mata Seca e o Cerrado (Rodrigues et al. 2009).
Figura 4: Fitofisionomias estudadas na Área de Proteção Ambiental Estadual Rio Pandeiros e sua caracterização nos períodos seco e chuvoso. Floresta Estacional Decidual nos períodos seco (A) e chuvoso (B), Mata Ciliar nos períodos seco (C) e chuvoso (D) e o Cerrado nos períodos seco (E) e chuvoso (F).
O Cerrado da APA – Rio Pandeiros, em sua grande parte, apresenta dois
estratos: o arborescente, que se apresenta mais ou menos contínuo e aberto, e o baixo,
que é formado por gramíneas, subarbustos e poucas ervas. As espécies desta formação
apresentam expressiva queda foliar, com ocorrência de diferentes grupos fenológicos
relacionados à produção e queda de folhas (Franco et al. 2005, Lenza & Klink 2006).
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Atualmente considerada uma fitofisionomia da Mata Atlântica, a Floresta Estacional
Decidual apresenta cobertura vegetal densa, com árvores de 15 a 30m no estrato mais
elevado, além de muitas espécies de madeira de lei. A vegetação das Matas Secas
dispõe apenas da umidade proporcionada pelas chuvas, e devido à influência da longa
estiagem pode perder até 90% de sua folhagem nos meses de julho a agosto (IGA 2006).
2.2. Amostragem da Avifauna
O estudo da avifauna foi realizado durante o ano de 2008, nos meses de
fevereiro (final do período chuvoso), maio (início do período secos), setembro (final do
período seco) e novembro (início do período chuvoso). Na APA- Rio Pandeiros,
próximo ao Balneário, foram avaliadas áreas de Cerrado, Mata Seca e Mata Ciliar, com
três pontos amostrais em cada fitofisonomia. Para a captura das aves foram utilizadas
dez redes de neblina por ponto amostral (redes do tipo mist net, medindo 12 metros de
comprimento e 2.5 metros de altura, e malha de 16 milímetros) (Figura 5). As redes
foram abertas logo ao amanhecer e checadas em intervalos de 30 minutos,
permanecendo abertas por 6 horas. Desta forma, cada fitofisionomia contou com um
esforço amostral de 180 horas/redes por coleta, totalizando 2.160 horas/rede no final do
trabalho.
Todas as aves capturadas foram acondicionadas em sacos de pano e logo em
seguida identificadas com auxílio de literatura especializada (Ridgely & Tudor, 1989;
Ridgely & Tudor, 1994; Sick, 1997). As espécies foram caracterizadas quanto a suas
guildas tróficas de acordo com Schubart et al. (1965) e Sick (1997). Toda a
nomenclatura utilizada seguiu o proposto pelo Comitê Brasileiro de Registros
Ornitológicos (CBRO, 2011).
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Figura 5: Rede de neblina montada durante o período chuvoso em uma das áreas amostrais localizada no Cerrado da APA – Rio Pandeiros. 2.3. Análises Estatísticas
Para verificar a influência do ambiente e da sazonalidade na riqueza e
abundância de aves de sub-bosque foi construído um modelo linear generalizado (GLM)
a fim de testar cada uma das variáveis resposta, sendo que cada modelo continha como
variáveis explicativas ambiente e época da coleta. Os modelos foram analisados usando-
se a distribuição de dados do tipo Poisson, podendo ser corrigida para Quasipoisson em
casos de sobredispersão. Para verificar a influência dos ambientes e sazonalidade sobre
a abundância relativa das guildas alimentares também foram construídos GLMs. Para
cada uma das guildas encontradas foram construídos modelos cuja variável resposta era
a abundância relativa da guilda e como variáveis explicativas fitofisionomia e data de
coleta. Como as variáveis resposta constituíam dados de proporção, para estes modelos
foi utilizada a distribuição de dados do tipo Binomial, podendo ser corrigida para
Quasibinomial em casos de sobredispersão. Os modelos foram construídos a partir de
um modelo completo, cujas variáveis foram simplificadas via backward. Este
12
procedimento consiste na retirada das variáveis não significativas (p > 0.05) uma a uma,
até obter o modelo mais simples. Todas as análises foram realizadas no R-Program (R
Development Core Team 2008).
Com o objetivo de identificar os padrões de ocorrência de espécies e de cada
guilda trófica em relação aos períodos de coleta e aos tipos de ambientes, foi utilizada
uma Análise de Correspondência Destendenciada – DCA (Gauch 1982). Este método
foi utilizado para ordenar os dados de composição das espécies de aves associadas aos
ambientes de Mata Seca, Cerrado e Mata Ciliar, no início e fim das estações seca e
chuvosa. A análise foi realizada no Past Program (Hammer et al. 2001).
Para avaliar a significância dos grupos formados a partir da DCA foi utilizado o
pós-teste ANOSIM. Esta análise é um teste não paramétrico que mede a diferença entre
dois ou mais grupos, a partir de diferentes medidas de distância (Clarke 1993). Assim, o
teste avalia se há diferenças em estruturas multivariadas definidas à priori, com uma
comparação par-a-par dos diferentes grupos. Como os dados utilizados no estudo foram
de abundância de indivíduos, foi utilizada a matriz de similaridade de Bray-Curtis. O
índice de similaridade Bray-Curtis é recomendado por Hammer et al. (2001) nas
análises de dados de abundância. A comparação par-a-par entre todos os pares de
grupos foi realizada através do pós-teste ONE-WAY-ANOSIM. Neste tipo de análise o
valor obtido pela correção de Bonferroni é conservativo (Hammer et al. 2001), sendo
esta correção utilizada para evitar o erro tipo I (rejeitar uma H0 verdadeira – falso
positivo) em análises de múltiplas comparações. As diferenças foram consideradas
significativas quando p < 0,05 e a análise foi realizada no Past Program (Hammer et al.
2001).
Para determinar as espécies características de cada ambiente estudado foi
realizada uma análise de espécies indicadoras (ISA - Indicator Species Analysis),
13
proposta por Dufrêne e Legendre (1997). A representatividade de cada espécie foi
avaliada com base na abundância total da mesma em cada um dos ambientes estudados,
sendo consideradas todas as espécies capturadas com as redes de neblina. Para tal, a
análise usa a freqüência e a abundância das espécies nos ambientes, e produz um valor
de indicação variando de zero (não-indicador) a 100 (perfeito indicador). A
significância da indicação de cada item foi testada utilizando o teste de Monte Carlo
com 1000 permutações. Os itens que apresentaram p < 0,05 e valor de indicação
superior a 25% foram considerados indicadores (Dufrêne & Legendre 1997). A ISA foi
realizada no programa PC-ORD (McCune & Mefford 1995).
14
3. RESULTADOS
Ao longo das quatro coletas foram capturados 373 indivíduos, distribuídos em
67 espécies de aves e 26 famílias (Anexo 1). O ambiente que apresentou maior riqueza
acumulada foi o Cerrado, com 43 espécies, seguido da Mata Ciliar e Mata Seca, com 38
e 29 espécies, respectivamente (Figuras 6, 7 e 8). As três famílias mais abundantes
foram a Tyrannidae, com dez espécies, e Thraupidae e Trochilidae, com cinco espécies
cada.
Figura 6: Algumas espécies de aves capturadas no Cerrado da APA Rio Pandeiros. a) Chlorostilbon lucidus; b) Celeus flavescens; c) Formicivora melanogaster; d) Thamnophilus capistratus.
15
Figura 7: Algumas espécies de aves capturadas na Mata Seca da APA Rio Pandeiros. a) Tangara cayana; b) Dacnis cayana; c) Tityra cayana; d) Hemitriccus margaritaceiventer; e) Basileuterus hypoleucus; e f) Thalurania furcata.
16
Figura 8: Algumas espécies de aves capturadas na Mata Ciliar da APA Rio Pandeiros. a) Chloroceryle americana; b) Galbula ruficauda; c) Picumnus albosquamatus; d) Cantorchilus leucotis.
Em relação à abundância, o Cerrado apresentou o maior número de capturas,
162 indivíduos, enquanto na Mata Ciliar e na Mata Seca foram capturados 119 e 92
indivíduos, respectivamente. Os modelos (GLM) mostraram que a riqueza e a
abundância não foram influenciadas pelo período de coleta (início e fim das estações
seca e chuvosa) (Tabela 1). Contudo, a relação dos ambientes estudados com a
abundância de aves foi significativa (Tabela 1) (Figura 9).
17
Tabela 1: Análise de Deviance do modelo mínimo adequado mostrando os efeitos do ambiente e da época de coleta na abundância, riqueza e abundância relativa de aves insetívoras, onívoras e frugívoras/granívoras ao longo de três diferentes fitofisionomias da APA – Rio Pandeiros. Variável resposta Variável explicativa GL Deviance P
Abundância ambiente 2 23.8 0.026
Riqueza ambiente 2 9.3 0.035
Abundância relativa de insetívoro ambiente 2 101.8 <0.01
Abundância relativa de onívoro época de coleta 3 17.8 0.022
Abundância relativa de frugívoro/granívoro ambiente 2 17.0 0.003
Abundância relativa de frugívoro/granívoro época de coleta 3 12.1 0.045
A ordenação (DCA) mostrou que a composição do Cerrado é diferente dos
demais ambientes florestais, não sendo observada diferença entre a Mata Seca e Ciliar.
Esta diferença na composição entre os ambientes de mata e o Cerrado pode ser
observada em relação ao eixo 1, que apresentou autovalor igual a 0.5798 (Figura 10).
Contudo, não foi encontrada diferença na composição da avifauna em relação ao
período de coleta, tanto dentro do mesmo ambiente quanto entre todos os ambientes.
Na análise das guildas alimentares foram consideradas quatro guildas, sendo
estas constituídas por aves insetívoras, frugívoras/granívoras, onívoras e nectarívoras
(Tabela 2). Também foram registradas outras duas guildas, dos carnívoros e piscívoros,
representados apenas por um único indivíduo de Glaucidium brasilianum (Mata Seca) e
Chloroceryle americana (Mata Ciliar), respectivamente. Estas duas guildas foram
excluídas das análises devido à baixa abundância de indivíduos. No Cerrado, a guilda
que apresentou maior valor de abundância relativa em todas as coletas foi a dos
insetívoros, sendo o mesmo resultado observado na Mata Ciliar (Tabela 2). A Mata
Seca, em contrapartida, não apresentou o mesmo padrão, sendo que nos diferentes
períodos de coleta diferentes guildas apresentaram os maiores valores de abundância
18
relativa, com destaque para os insetívoros em abril, onívoros nos meses de maio e
setembro e nectarívoros em novembro (Tabela 2).
Figura 9: Abundância (A) e riqueza (B) acumuladas de aves de sub-bosque ao longo de três diferentes fitofisionomias da APA Rio Pandeiros - Cerrado, Mata Seca e Mata Ciliar (média± EP, letras diferentes acima das barras indicam diferenças significativas).
19
Figura 10: Ordenação das áreas de amostragem na APA – Rio Pandeiros utilizando-se análise de Correspondência Destendenciada. As elipses foram delimitadas para destacar os dois agrupamentos observados. (a) Agrupamento formado apenas pelo Cerrado; (b) agrupamento formado pelas áreas de Mata Seca e Mata Ciliar (triângulo = Cerrado, quadrado = Mata Ciliar, círculo = Mata Seca).
Contudo, os GLMs criados para avaliar a influência dos períodos amostrados e
do ambiente sobre a abundância relativa das guildas (Tabela 1) mostraram que a
insetívora (Figura 11A) foi influenciada apenas pelo ambiente. A guilda
frugívora/granívora apresentou influência tanto da época de coleta (Figura 11B) quanto
do ambiente (Figura 11C). Já os onívoros foram influenciados apenas pelo período da
coleta (Figura 11D). A análise também mostrou que os insetívoros e
frugívoros/granívoros foram os grupos mais abundantes no Cerrado. Já os onívoros,
embora não apresentem diferenças na abundância entre as fitofisionomias, mostraram
ser o grupo mais abundante em setembro, aspecto também observado nos
frugívoros/granívoros.
20
Tabela 2: Abundância total (n) e abundância relativa (%) das guildas de aves de sub-bosque nas diferentes períodos amostrados (meses) ao longo de três diferentes fitofisionomias da APA – Rio Pandeiros – Cerrado, Mata Seca e Mata Ciliar.
Guilda Cerrado Abril Maio Setembro Novembro n (%) N (%) N (%) n (%)
Insetívoros 37 72.5 23 76.7 16 51.6 27 54 Onívoros 2 3.9 4 13.3 10 32.3 8 16 Nectarívoros 8 15.8 0 0 1 3.2 3 6 Frugívoro/Granívoro 4 7.8 3 10 4 12.9 12 24 Total 51 30 31 50 Mata Seca Insetívoros 6 35.3 5 19.2 6 28.6 10 37.1 Onívoros 4 23.5 10 38.5 9 42.9 4 14.8 Nectarívoros 4 23.5 10 38.5 2 9.5 11 40.7 Frugívoro/Granívoro 3 17.7 1 3.8 4 19 2 7.4 Total 17 26 21 27 Mata Ciliar Insetívoros 18 69.3 14 70 20 45.5 13 44.8 Onívoros 4 15.4 4 20 10 22.7 12 41.4 Nectarívoros 3 11.5 1 5 8 18.2 2 6.9 Frugívoro/Granívoro 1 3.8 1 5 6 13.6 2 6.9
Total 26 20 44 29
21
Figura 11: Abundância relativa das guildas de aves de sub-bosque distribuídas ao longo de três diferentes fitofisionomias da APA – Rio Pandeiros - Cerrado, Mata Seca e Mata Ciliar (média ± EP, letras diferentes acima das barras indicam diferenças significativas). Abundância relativa de aves insetívoras entre as fitofisionomias (A); Abundância relativa de aves frugívoras/granívoras entre as coletas (B) e entre as fitofisionomias (C); e Abundância relativa de aves onívoras entre as coletas (D).
22
As ordenações feitas através da DCA mostraram que a composição de cada
guilda não varia entre os diferentes ambientes e períodos de coleta, exceto pela guilda
dos insetívoros. Apenas os insetívoros apresentaram agrupamentos significativos em
relação ao ambiente. As aves insetívoras presentes no Cerrado formam um único grupo
em relação ao eixo 1 da ordenação (autovalor = 0.7441), enquanto as espécies desta
guilda nos ambientes de Mata Seca e Ciliar formam um segundo grupo (Figura 12).
Considerando-se todas as coletas realizadas, a análise de espécie indicadora
mostrou que a Mata Ciliar, assim como o Cerrado, apresentaram espécies indicadoras
(três e seis espécies, respectivamente), enquanto a Mata Seca não apresentou nenhuma
espécie indicadora (Tabela 3). Em contrapartida, a análise não apontou nenhuma
espécie indicadora nos ambientes estudados quando os períodos de coleta foram
analisados separadamente.
Figura 12: Ordenação das aves insetívoras capturadas nas áreas de amostragem na APA – Rio Pandeiros utilizando-se análise de Correspondência Destendenciada (DCA). As elipses foram delimitadas para destacar os dois agrupamentos observados: (a) Agrupamento formado apenas pelo Cerrado; (b) agrupamento formado pelas áreas de Mata Seca e Mata Ciliar; triângulo = Cerrado, quadrado = Mata Ciliar, círculo = Mata Seca).
23
Tabela 3: Resultado da Análise de Espécies Indicadoras mostrando as espécies indicadoras presentes nas diferentes fitofisionomias estudadas na APA – Rio Pandeiros. Valores máximos de indicação (%) referentes às espécies e níveis de significância obtidos pelo Teste de Monte Carlo (p). Grupo indicado corresponde ao ambiente no qual cada espécie apresentou valor máximo de indicação, sendo este superior a 25% e com p<0.05.
Espécie Valor da indicação (%) P Grupo indicado Galbula ruficauda 52.5 0.004 Mata Ciliar Phaethornis pretrei 40.4 0.024 Mata Ciliar Cantorchilus leucotis 33.3 0.025 Mata Ciliar Hemitriccus margaritaceiventer 61.3 0.001 Cerrado Tolmomyias flaviventris 54.9 0.002 Cerrado Lanio pileatus 50.0 0.009 Cerrado Thamnophilus pelzelni 42.8 0.009 Cerrado Cyclarhis gujanensis 33.3 0.026 Cerrado Formicivora melanogaster 33.3 0.034 Cerrado
24
4. DISCUSSÃO
A riqueza e abundância de aves encontradas foram maiores no Cerrado do que
nas Matas Seca e Ciliar. Assim como Piratelli e Blake (2006), encontramos maior
abundância de aves de sub-bosque no Cerrado do que na Mata Ciliar. Os maiores
valores tanto de riqueza quanto de abundância apresentados pelo Cerrado podem ter
ocorrido devido ao fato do Cerrado apresentar quantidade de recursos alimentares
(frutos e insetos, principalmente), arbustos e árvores suficientes para atrair e proteger
sua avifauna (Gouveia & Felfili 1998, Pinheiro et al. 2002, Piratelli & Blake 2006).
Outro aspecto importante é que algumas das áreas de mata seca e ciliar estudadas
apresentavam maior impacto antrópico do que o Cerrado devido à presença de um
Balneário e atividades turísticas relacionadas a este, podendo afugentar parte da
avifauna nestes ambientes. Além disto, na APA-Rio Pandeiros as Matas Secas
amostradas encontram-se dispostas como manchas naturalmente disjuntas, sendo estes
fragmentos muitas vezes pequenos. Desta forma, o resultado indica que estes
fragmentos de Mata Seca podem não ser auto-sustentáveis, aumentando ainda mais a
dependência pelas Matas Ciliares.
A época de coleta não influenciou a riqueza e abundância de aves nos ambientes
estudados, embora a literatura cite que mesmo em ambientes com sazonalidade menos
marcante seja observada diferença nas taxas de captura entre as coletas (ie. Mata
Atlântica - Mallet-Rodrigues & Noronha 2003). Uma possível explicação seria que
algumas espécies podem apresentar comportamentos de forrageamento diferenciados
nas épocas de menor disponibilidade de alimentos. Alguns trabalhos têm descrito que
algumas espécies de aves típicas do Cerrado, dentre elas Cypsnagra hirundinaceae,
podem variar sua dieta e comportamento de forrageamento diante da variação na
disponibilidade de recurso (Jedlicka et al. 2006, Ragusa-Neto 1997).
25
Os resultados ainda sugerem que, especificamente para a Mata Seca, parte de
sua avifauna possa buscar abrigo e local de forrageio em ambientes próximos durante
todo o ano, contribuindo para baixas taxas de captura neste ambiente. Como as áreas de
Mata Seca estão próximas das Matas Ciliares pode ser que o deslocamento das aves
entre estes ambientes seja facilitado, resultado este também evidenciado pelas análises
de ordenação. Nesse contexto, nosso estudo não corrobora a hipótese de que a Mata
Ciliar apresentaria maior abundância na estação seca devido ao fluxo de animais dos
ambientes adjacentes em busca de alimento e abrigo. Contudo, podemos inferir que o
uso da Mata Ciliar pelas aves de Mata Seca não se restringem apenas aos períodos
secos, mas sim que existe um deslocamento entre estes ambientes durante todo o ano.
Isso destaca a importância das Matas Ciliares na manutenção da avifauna das Matas
Secas, sendo o inverso também observado em alguns momentos.
Quanto à composição, o Cerrado mostrou-se diferente dos demais ambientes,
enquanto não foi observada diferença entre as Matas Seca e Ciliar. Este resultado pode
estar associado ao fato do Cerrado muitas vezes oferecer frutos fora do pico de
frutificação (Gouveia & Felfili 1998), diminuindo os efeitos da sazonalidade sobre sua
avifauna. Sendo assim, esta característica pode explicar porque as espécies do Cerrado
permaneceram neste ambiente em todas as épocas de coleta, fato que não foi observado
para as aves de Mata Seca e Mata Ciliar. Neste caso específico, a Mata Seca apresentou
semelhança na composição com a Mata Ciliar, mostrando que sua avifauna usa a Mata
Ciliar com mais freqüência do que a avifauna do Cerrado. A menor deciduidade foliar
observada nas Matas Ciliares (Ribeiro & Walter 1998) pode contribuir para que estas
sejam importante fonte de abrigo para a avifauna da Mata Ciliar, principalmente durante
os períodos mais secos. Além disto, as Matas Ciliares também possuem invertebrados
aquáticos que podem funcionar como importante fonte de recurso para a avifauna deste
26
ambiente (Gray 1989). Ao oferecer recursos alimentares (i.e. insetos herbívoros e
frutos) durante o ano todo, a Mata Ciliar também é um importante sítio de alimentação
para uma avifauna específica, incluindo grandes frugívoros (Piratelli & Blake 2006,
Gouveia & Felfili 1998) e outras espécies dependentes de mata.
Uma vez que tanto a Mata Ciliar quanto o Cerrado apresentam recurso suficiente
o ano inteiro para manter sua avifauna, a diferença na composição entre estes ambientes
pode ter sido mais influenciada pela estrutura da vegetação (ambientes abertos e
florestais; Develey & Stouffer 2001) do que pela disponibilidade do recurso. As
espécies florestais, na maioria das vezes, evitam atravessar ambientes claros e abertos,
enquanto as espécies de ambientes abertos podem até usar as bordas das matas, mas não
costumam adentrá-las. Neste contexto, Piratelli e Blake (2006) mostraram que o
Cerrado sensu strictu compartilha poucas espécies com Matas de Galeria e mais
espécies com o Cerradão, que é uma formação mais aberta quando comparada à Mata
de Galeria (Ribeiro & Walter 1998). Logo, o fluxo de aves entre formações abertas e
florestais é menos intenso do que em ambientes com porte arbóreo mais semelhante,
corroborando o resultado obtido no presente estudo em que o maior compartilhamento
de espécies ocorreu entre as Matas Seca e Ciliar.
Outra explicação seria que o deslocamento da avifauna entre as Matas ocorre em
uma escala menor do que a sazonal, podendo ser até mesmo diário. Além disto, a
direção do fluxo das aves pode variar entre as estações, em virtude da variação sazonal
na disponibilidade do recurso. Assim as aves da Mata Seca visitariam a Mata Ciliar,
principalmente, durante a estação seca e as aves de Mata Ciliar utilizariam a Mata Seca
durante a estação úmida. No decorrer da estação chuvosa o número de folhas novas na
Mata Seca é grande, e relacionado a este evento está o aumento na disponibilidade de
insetos herbívoros, evidenciado pelos maiores números de perda foliar relatados no
27
início desta estação (Janzen 1981). Desta forma, a explosão no número de insetos
herbívoros na Mata Seca na estação chuvosa pode atrair algumas aves da Mata Ciliar,
podendo explicar a semelhança na composição destas duas matas durante todo o ano.
As mudanças na composição da comunidade de aves podem ser avaliadas não
apenas em um nível de espécies, mas também no nível de guildas tróficas. As análises
sobre as guildas alimentares mostraram que os insetívoros foram mais abundantes no
Cerrado, independente da época de coleta. Isso porque, embora a abundancia de insetos
varie ao longo das estações, a vegetação do Cerrado disponibiliza recurso para os
insetos herbívoros durante todo o ano, sendo a presença destes observada mesmo nas
épocas mais secas do ano (Ribeiro & Walter 1998, Marquis et al. 2001, Pinheiro et al.
2002, Bendicho-Lopez et al. 2006), garantindo recurso para as aves. Além disto, em
ambientes com sazonalidade marcante cada guilda de insetos pode responder de forma
diferente em função da mesma (Pinheiro et al. 2002). Ainda segundo Pinheiro e
colaboradores (2002), no Cerrado a abundância de Diptera, Homoptera, Lepidoptera e
Orthoptera não apresenta relação com a sazonalidade, enquanto Isoptera, Coleoptera e
Hemiptera apresentam o pico durante a estação chuvosa. O período chuvoso
corresponde à estação reprodutiva da maioria das aves de sub-bosque (Piratelli et al.
2000, Marini & Durães 2001), garantindo maior disponibilidade de alimento para a
prole. Assim, o recurso estaria disponível para as aves insetívoras durante todas as
épocas de coleta, podendo explicar a predominância desta guilda no Cerrado. Outro
aspecto importante é que os insetos generalistas presentes nas Matas Secas talvez
possam migrar para o Cerrado na estação seca (Neves et al. 2010), constituindo uma
fonte a mais de recurso para sua avifauna.
As aves onívoras, por apresentarem uma dieta mais ampla e muitas vezes
oportunista, quando comparadas às aves especialistas, podem se sobressair diante da
28
variação na oferta de recurso (Motta-Júnior 1990). Isso porque além do consumo de
insetos e frutos, muitas espécies onívoras se alimentam de folhas novas e partes florais
(Manhães 1993). Sendo assim, a predominância destas aves durante o mês de setembro
provavelmente está relacionada com o pico de floração e frutificação na área, que ocorre
principalmente entre os meses de julho a novembro (Santos et al. 2010). Além disto, o
período de maior abundância de onívoros compreende ainda parte da época seca, na
qual se observa uma diminuição na disponibilidade de insetos (Wolda 1978). Isto pode
acarretar na diminuição na quantidade de insetívoros, normalmente a guilda mais
abundante, e aumento de espécies onívoras, que se sobressaem devido à sua dieta
generalista, aumentando assim a proporção dos onívoros em relação às outras guildas.
Assim como os onívoros, os frugívoros/granívoros apresentaram maior
abundância na época de frutificação da maioria das espécies de ambientes sazonais
(Santos et al. 2010, Pezzini et al. 2008, Gentry 1990, Lack 1987), que se concentra nos
períodos próximos ao início da estação chuvosa. Os frugívoros/granívoros ainda
apresentaram relação significativa com os ambientes estudados. A maior quantidade
desta guilda no Cerrado, quando avaliado o acumulado das coletas, também pode ser
explicada pelo fato de algumas de suas espécies zoocóricas oferecerem frutos fora do
pico de frutificação (Gouveia & Felfili 1998, Oliveira 1998), mesmo que em menor
quantidade. Além disso, o Cerrado apresenta um estrato herbáceo dominado
principalmente por gramíneas (Eiten 1972), que são praticamente ausentes nos
ambientes de mata. Estas gramíneas apresentam produção de sementes fortemente
influenciada pela pluviosidade, que pode variar sazonalmente ou anualmente (Eiten
1972), justificando porque a época de coleta também foi uma variável importante na
abundância desta guilda.
29
A composição das guildas não variou entre os ambientes e as épocas de coleta,
com exceção dos insetívoros. Mais especificamente, a análise da guilda dos insetívoros
mostrou que o Cerrado apresentou composição diferente dos ambientes de mata. O
resultado pode estar relacionado ao tipo de recursos disponível em cada um dos
ambientes, podendo determinar quais espécies de insetívoros estarão presentes em cada
local. Dentro de cada guilda alimentar, diversas táticas de forrageio e especificidade por
determinados alimentos podem ser encontradas (i.e. Remsen & Robinson 1990,
Fitzpatrick 1980). Um exemplo seria que algumas espécies da família Tyrannidae e
também aquelas que apresentam tática de forrageio do tipo gleanner (investigadores) é
positivamente associadas aos invertebrados aquáticos como plecópteros e
quironomídeos adultos em zonas ripárias de florestas temperadas (Gray 1989).
Embora fosse esperado que a avifauna do Cerrado buscasse abrigo e recursos na
Mata Ciliar nos períodos de seca (Cavalcanti 1999, Piratelli & Blake 2006), a diferença
na composição da avifauna do Cerrado e das Matas Seca não corroboraram esta
hipótese. As análises mostram ainda que a composição, tanto da avifauna total, quanto
apenas os insetívoros, não apresentam relação com a sazonalidade. Deste modo, os
resultados sugerem que, mesmo sendo um ambiente sazonal, o Cerrado apresenta
recurso suficiente para manter sua avifauna, independente do período de coleta. O
resultado também pode estar relacionado ao fato de que pelo menos metade das espécies
de Cerrado são mais tolerantes a ambientes abertos (Silva 1995), facilitando a
permanência destas mesmo nos períodos mais secos do ano.
Avaliando a comunidade de cada ambiente de forma mais específica,
destacamos a presença de algumas espécies indicadoras, como P. pretrei (beija-flor-de-
rabo-branco-acanelado), que é uma espécie que habita diferentes ambientes, como
florestas secas, jardins, matas de várzeas, Cerrado, matagais, dentre outros (BirdLife
30
International 2011), e que neste estudo esteve associada a Mata Ciliar provavelmente
devido à disponibilidade de recursos florais. As outras duas espécies presentes na Mata
Ciliar são C. leucotis (garrinchão-de-barriga-vermelha) e G. ruficauda (ariramba-de-
cauda-castanha), aves comumente encontradas nas matas de galeria e ribeirinhas, tendo
preferência por áreas úmidas próximas de corpo d’água (Ridgely & Tudor, 1994; Sick
1997, Nóbrega & Pinho 2010), sendo estas características destas matas.
Neste sentido, a presença de espécies que estão diretamente relacionadas às
Matas Ciliares poderia também indicar a conservação desta mata (Arcos et al. 2008).
Isso devido ao fato das Matas Ciliares apresentarem algumas espécies características,
que são restritas as essas matas por estarem ligadas a fatores físicos, como água corrente
ou a estrutura da vegetação, apesar de seu potencial em receber espécies de ambientes
adjacentes (Silva & Vielliard 2004). Diante disto, o fura-barreira (H. rectirostris) e o
arredio-do-rio (C. vulpina) são espécies que também merecem atenção, embora não
tenham sido consideradas espécies indicadoras, provavelmente devido à baixa taxa de
captura. H. rectirostris é uma ave endêmica do Cerrado e característica de Matas
Ciliares (Silva 1995), especialista e que forrageia preferencialmente em folhas secas
presentes no solo e a pouca distância do rio (Faria et al. 2007). Já a C. vulpina habita
regiões de várzea, matas ribeirinhas e de galeria (Sick 1997, Zimmer 1997).
Ainda sobre as espécies indicadoras, o Cerrado apresentou um maior número de
espécies indicadoras, dentre estas L. pileatus (tico-tico-rei-cinza), que foi a única
classificada como granívora. A presença desta espécie indicadora no Cerrado pode estar
associada à presença de gramíneas neste ambiente. Embora a produção de sementes por
estas gramíneas seja sazonal, L. pileatus não apresentou uma relação significativa com a
época de coleta. Isso porque mesmo sendo classificada como granívora, é comum
encontrar grande quantidade de insetos em sua dieta durante todas as épocas do ano
31
(Lemuel Leite, dados não publicados). As demais espécies indicadoras do Cerrado
pertencem à guilda dos insetívoros, e a presença destas aves pode ser um forte
indicativo de qualidade ambiental. Segundo Sekercioglu (2002), a presença destas aves
de sub-bosque é negativamente influenciada pelo tamanho dos fragmentos estudados.
Ainda segundo Sekercioglu (2002) e outros autores (Stouffer & Bierregaard 1995), é
esperado que esta guilda seja uma das primeiras a desaparecer em virtude dos impactos
antrópicos. Além disto, a grande quantidade de espécies indicadoras, comparado aos
demais ambientes, e a importância dos insetos na dieta da guilda, reforçam a idéia de
que este recurso está disponível para a sua avifauna durante todo o ano.
Assim, a manutenção das áreas de Cerrado ainda existentes na região estudada
é imprescindível, uma vez que a comunidade de aves do Cerrado não apresentou fluxo
para os ambientes de mata próximos. Nossos resultados ainda indicam que, mesmo
sendo um ambiente sazonal, o Cerrado apresenta recurso suficiente para manter sua
avifauna, independente do período de coleta. Sobre os ambientes de mata concluímos
que as Matas Ciliares constituem um importante refúgio para as aves de Mata Seca, uma
vez que estas não apresentam distinção na sua composição. Deste modo, ressaltamos a
interdependência entre os ambientes de mata e sugerimos que para uma conservação
efetiva das aves encontradas em ambientes de mata não basta a conservação das matas
secas isoladamente. Isso porque este estudo mostrou que as aves de Mata Seca
necessitam deste mosaico de habitats, pois o fluxo das aves entre os ambientes de mata
seca e ciliar pode ser uma premissa fundamental para manutenção das comunidades de
aves. Assim, enfatizamos a necessidade da conservação não só dos ambientes isolados,
mas de todos os mosaicos de habitat na paisagem da região.
32
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Atlantic Forest. The Condor 101: 537–548.
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habitats secundários da pré-Amazônia maranhenses e interação com modelo nulo.
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Anexo 1 – Lista de aves de sub-bosque capturadas em três ambientes diferentes na Área de Proteção Ambiental do Rio Pandeiros. Ambientes: ms. (Mata Seca), mc. (Mata Ciliar), c. (Cerrado). Guildas: I (Insetívoros), Fg (Frugívoros/Granívoros), N (Nectarívoros), O (Onívoros), P (Piscívoro), Ca (Carnívoros).
Nome do Táxon Nome popular Ambiente Guilda
Columbidae
Claravis pretiosa pararu-azul ms Fg
Leptotila verreauxi juriti-pupu c,ms,mc Fg
Cuculidae
Coccyzus melacoryphus papa-lagarta-acanelado c I
Strigidae
Glaucidium brasilianum caburé ms Ca
Trochilidae
Phaethornis pretrei rabo-branco-acanelado c,ms,mc N
Chlorostilbon lucidus besourinho-de-bico-vermelho c N
Thalurania furcata beija-flor-tesoura-verde ms,mc N
Amazilia fimbriata beija-flor-de-garganta-verde c,ms,mc N
Heliomaster squamosus bico-reto-de-banda-branca c,mc N
Alcedinidae
Chloroceryle americana martim-pescador-pequeno mc P
Galbulidae
Galbula ruficauda ariramba-de-cauda-ruiva c,mc I
Bucconidae
Nystalus maculatus rapazinho-dos-velhos c,ms I
Picidae
Picumnus albosquamatus pica-pau-anão-escamado mc I
Veniliornis passerinus picapauzinho-anão c,ms I
Piculus chrysochloros pica-pau-dourado-escuro mc I
Celeus flavescens pica-pau-de-cabeça-amarela c I
Thamnophilidae
Formicivora melanogaster formigueiro-de-barriga-preta c I
Herpsilochmus atricapillus chorozinho-de-chapéu-preto c,mc I
Thamnophilus capistratus choca-barrada-do-nordeste c I
Thamnophilus pelzelni choca-do-planalto c,ms,mc I
Dendrocolaptidae
Sittasomus griseicapillus arapaçu-verde c,ms,mc I
Lepidocolaptes angustirostris arapaçu-de-cerrado c,mc I
Furnariidae
43
Nome do Táxon Nome popular Ambiente Guilda
Furnarius leucopus casaca-de-couro-amarelo ms,mc I
Hylocryptus rectirostris fura-barreira mc I
Synallaxis frontalis petrim c I
Cranioleuca vulpina arredio-do-rio mc I
Pipridae
Neopelma pallescens fruxu-do-cerradão c O
Tityridae
Myiobius atricaudus assanhadinho-de-cauda-preta mc I
Tityra cayana anambé-branco-de-rabo-preto ms I
Pachyramphus viridis caneleiro-verde c I
Pachyramphus polychopterus caneleiro-preto c I
Rhynchocyclidae
Incertae sedis
Leptopogon amaurocephalus cabeçudo c,ms,mc I
Tolmomyias sulphurescens bico-chato-de-orelha-preta c,ms I
Tolmomyias flaviventris bico-chato-amarelo c,mc I
Hemitriccus margaritaceiventer sebinho-de-olho-de-ouro c,ms I
Tyrannidae
Camptostoma obsoletum risadinha c,mc I
Myiopagis viridicata guaracava-de-crista-alaranjada c,ms,mc I
Phaeomyias murina bagageiro c I
Legatus leucophaius bem-te-vi-pirata c O
Myiarchus tyrannulus maria-cavaleira-de-rabo-enferrujado c,mc I
Pitangus sulphuratus bem-te-vi c,mc O
Myiodynastes maculatus bem-te-vi-rajado c,ms O
Megarynchus pitangua neinei c O
Myiozetetes similis bentevizinho-de-penacho-vermelho ms,mc I
Cnemotriccus fuscatus guaracavuçu c I
Vireonidae
Cyclarhis gujanensis pitiguari c O
Corvidae
Cyanocorax cyanopogon gralha-cancã c O
Hirundinidae
Stelgidopteryx ruficollis andorinha-serradora mc I
Troglodytidae
Troglodytes musculus corruíra ms,mc I
Cantorchilus leucotis garrinchão-de-barriga-vermelha mc I
Polioptilidae
Polioptila dumicola balança-rabo-do-rio-negro mc I
44
Nome do Táxon Nome popular Ambiente Guilda
Turdidae
Turdus rufiventris sabiá-laranjeira mc O
Turdus leucomelas sabiá-barranco c,ms,mc O
Turdus amaurochalinus sabiá-poca c,ms,mc O
Coerebidae
Coereba flaveola cambacica c N
Thraupidae
Nemosia pileata saíra-de-chapéu-preto ms O
Lanio pileatus tico-tico-rei-cinza c,ms,mc Fg
Tangara sayaca sanhaçu-cinzento c,ms,mc O
Dacnis cayana saí-azul ms O
Conirostrum speciosum figuinha-de-rabo-castanho c,mc O
Emberizidae
Volatinia jacarina tiziu c,mc Fg
Sporophila nigricollis baiano ms Fg
Parulidae
Basileuterus culicivorus pula-pula mc I
Basileuterus hypoleucus pula-pula-de-barriga-branca ms,mc I
Basileuterus flaveolus canário-do-mato c,ms,mc I
Icteridae
Molothrus bonariensis vira-bosta mc O