cláusula de hardship
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Artigo sobre a cláusula de hardship em contratos internacionais.TRANSCRIPT
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A CLUSULA DE HARDSHIP NOS CONTRATOS DE COMRCIO
INTERNACIONAIS
Maria Anglica Homem de Corra Leite Advogada do escritrio Marcos Martins Advogados Associados. Master of Law em Direito dos contratos, Mercado financeiro e de capitais.
1 Introduo
O crescente desenvolvimento das relaes comerciais internacionais nas ltimas
dcadas vem demandando alternativas eficazes, cleres e criativas por parte dos
operadores do direito, para fins de adequao e harmonizao das situaes
concretas, que se apresentam cada vez mais complexas, a estruturas contratuais
eficientes, capazes de atender da melhor maneira possvel aos interesses das partes
contratantes.
Isso porque, num cenrio internacional carente de normas soberanas e
automaticamente vinculativas para as partes, um instrumento contratual bem
elaborado pode significar, num primeiro momento, a resposta rpida e eficiente para
eventual conflito que venha a surgir durante a vigncia do acordo, antecipando
solues e afastando problemas. Em ltima anlise, pode contribuir para a sensvel
diminuio dos custos de transao, na medida em que torna desnecessria a
atuao dos tribunais arbitrais ou judiciais.
Nesse sentido, uma forma encontrada para preservar do ambiente negocial de
adversidades que possam comprometer o equilbrio contratual, levando
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inexecuo do inicialmente avenado, foi a insero nos instrumentos contratuais de
clusulas que possibilitam a reviso e a adaptao das minutas nova realidade
experimentada pelas partes, ou pelo menos por uma delas.
Nesse contexto, inserem-se as clusulas como a de hardship, cujo principal escopo
o de permitir a flexibilizao e a adequao do instrumento contratual, promovendo
a realizao de um novo entendimento entre as partes quando da ocorrncia de
circunstncias que alteram fundamentalmente o equilbrio contratual, as quais
podem, inclusive, interferir no objeto da avena durante a vigncia do instrumento e
impedir a sua execuo. Em outras palavras, a clusula de hardship possibilita s
partes envolvidas a repactuao das obrigaes contradas e suas condies de
exeqibilidade, quando da ocorrncia de fatos que alterem substancialmente as
circunstncias iniciais avenadas, que causem um rigor injusto a um dos
contraentes.
Assim, situaes imprevistas de desequilbrio econmico-financeiro, ocorridas
durante a vigncia de instrumento contratual que possua previso de hardship,
passam a ser facilmente contornadas por meio da renegociao, com a possibilidade
de substituio da prestao onerosa por uma mais adequada nova realidade
ento estabelecida, preservando-se a relao contratual e fazendo com que o
contrato desempenhe sua funo econmica e atinja seu fim econmico precpuo,
ainda que de maneira diferente do inicialmente avenado.
Por outro lado, em uma mesma situao de desequilbrio, ocorrida durante a
vigncia de um contrato que no possua previso especfica nesse sentido, no
restar outro caminho s partes que no a resoluo da avena, o que certamente
tornar-se- um transtorno imensurvel aos envolvidos.
Dessa forma, a soluo de controvrsias advindas de instrumentos contratuais no
mbito internacional, por meio da utilizao de clusulas aleatrias, como as de
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hardship, traz maior segurana e tranqilidade s partes envolvidas, vez que
erradica a onerosidade e o desequilbrio supervenientes, promovendo a adequao
da avena e a manuteno da relao estabelecida entre as partes.
Importante lembrar que o instituto em comento est fundado essencialmente na
renegociao, e no na exonerao de responsabilidade de um dos contratantes.
Desse modo, ainda que este tenha sofrido grande prejuzo, passando a ser a parte
frgil da relao, no se podem afastar as obrigaes que contraiu, sob pena de se
causar injustias parte contrria. Nesse sentido, a clusula de hardship deve ser
encarada como um processo equilibrador do contrato, capaz de proporcionar s
partes a busca da estabilizao econmica, fundamental para a manuteno de
qualquer acordo.
bem verdade que a clusula de hardship pode, em vez de proporcionar a
manuteno do contrato ento em desequilbrio, com a reformulao de suas
clusulas, dar ensejo a uma nova avena, com novo objeto e outras obrigaes. No
entanto, no se pode negar que, de uma forma ou de outra, a clusula de hardship
impe s partes o dever de renegociar, visando sempre a manuteno da relao
negocial entre os envolvidos, seja no prprio contrato reformulado, seja em uma
nova avena, afastando o enfrentamento judicial ou arbitral dos envolvidos.
2 Princpios norteadores dos contratos de comrcio internacionais
Os contratos de comrcio internacionais, por envolverem objetos e/ou partes cujos
elementos vinculam dois ou mais sistemas jurdicos extraterritoriais, ficam, muitas
vezes, rfos de um regulamento soberano e automaticamente vinculante para as
partes envolvidas. Dessa lacuna legal podem advir conflitos, que, via de regra, so
difceis de serem solucionados. No se pode negar que os Tratados e Convenes
Internacionais fazem sua tentativa de regulao ampla, mas, de fato, no abrangem
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toda e qualquer matria, haja vista a diversidade das relaes humanas e a
sazonalidade dos negcios empresariais, e tampouco englobam todos os pases
existentes, e com os quais se podem firmar contratos.
Nesse contexto, figuram os chamados Princpios Gerais de Direito. Com sua misso
de guiar, e por que no dizer limitar, a autonomia da vontade das partes,
notadamente quando se est diante das tais lacunas supramencionadas, os
princpios constituem verdadeiros orientadores das relaes internacionais.
Com relao clusula de hardship, os Princpios jurdicos envolvidos so,
notadamente, os seguintes: Pacta Sunt Servanda, Rebus Sic Standibus, Teoria da
Impreviso e Equilbrio Contratual. Outrossim, no se pode deixar de lembrar a
importncia dos Princpios do Unidroit, que so voltados exclusivamente aos
contratos de comrcio internacionais, e que vm sendo cada vez mais utilizados
pelos operadores do comrcio internacional.
O Pacta Sunt Servanda, mais conhecido como o princpio da fora obrigatria,
determina que o contrato deve prevalecer e ter fora de lei entre as partes. Assim, a
vontade dos contraentes, manifestada por meio de um instrumento contratual, faz
nascer uma vinculao absoluta, de onde so criados direitos e obrigaes que
devem ser cumpridos como regra incondicional. No entanto, esse princpio,
justamente por essa sua caracterstica absolutista, enfrenta muitos problemas,
sendo objeto de algumas crticas e discusses acirradas.
J o princpio do Equilbrio Contratual busca a manuteno da equidade entre as
prestaes, de modo que uma das partes no obtenha vantagem excessiva em face
da outra. Vale dizer que, via de regra, a paridade jurdica no instrumento contratual
corresponde igualdade em termos econmicos, sendo certo que o instrumento
contratual que desrespeite essa condio de equilbrio deveria ser considerado
ilegtimo, posto que em desconformidade com a justia comutativa. Nesse sentido, a
incluso da Clusula Rebus Sic Standibus no instrumento contratual traz maior
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conforto s partes, j que faz com que as obrigaes ali estabelecidas sejam vlidas
enquanto estiverem presentes as mesmas circunstncias do momento de formao
da avena. Assim, na hiptese de ocorrncia de fato alheio vontade das partes,
capaz de alterar significativamente referidas circunstncias, de maneira a obstar o
cumprimento de determinada obrigao, o acordo poder ser revisto. Ressalta-se
que o fundamento desta afirmao est justamente na modificao e/ou extino
das circunstncias originais, que deram ensejo ao contrato ento em desequilbrio.
Outrossim, no se pode deixar de lembrar que os Contratos de Comrcio
Internacional, durante sua vigncia, esto sujeitos a toda e qualquer alterao
advinda dos ambientes poltico, econmico e cultural no qual se inserem, os quais
so alvo de constantes evolues. Nesse contexto, a Teoria da Impreviso mostra-
se extremamente importante, notadamente quando se est diante de um contrato
comutativo, que tenha sofrido alterao radical das condies econmicas no
momento de sua execuo, por conta de evento imprevisvel, de maneira que um
dos contraentes passa a experimentar uma onerosidade excessiva em face do outro.
Por fim, faz-se imprescindvel a meno aos princpios do Unidroit, que so frutos de
uma pesquisa intensa, realizada durante anos por um grande nmero de juristas de
diferentes pases. Referidos princpios vm ganhando espao na prtica negocial
internacional, tanto pela sua contribuio para a previsibilidade do regime jurdico,
como pela segurana que traz s partes contraentes. Bem por isso, tm sido
expressamente pactuados em inmeros contratos comerciais internacionais, ainda
que, dependendo da eleio de foro dos mesmos, possam ser limitados pela
legislao nacional dos pases envolvidos. No obstante, no se pode negar que
esses princpios representam um grande avano para a formao gradual de um
regime jurdico nico, a ser utilizado para a soluo de conflitos no mbito do
comrcio internacional, suprindo a lacuna hoje existente.
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3 O Harship
O hardship pode ser definido como uma situao imprevista, alheia vontade das
partes, ocorrida durante a vigncia de um contrato, capaz de alterar de maneira
significativa o equilbrio das prestaes das partes envolvidas. Podem ser
consideradas como situaes de hardship, dentre outras, alteraes imprevistas
ocorridas na conjuntura social, econmica e poltica de um pas, que possam afetar
de maneira substancial o contrato.
Na verdade, o hardship convalidado pelo efetivo prejuzo causado s partes pela
situao imprevista, ou, ao menos, a uma delas, tornando a execuo do contrato
demasiadamente onerosa para um dos contraentes. Seu principal escopo o de
promover a renegociao da avena, com fundamento na cooperao mtua, de
forma a manter ntegra, ainda que de maneira diversa do inicialmente contratado, a
relao entre as partes.
Importa ressaltar que a clusula de hardship, em que pese ainda no estar
unanimemente firmada nos juzos arbitrais como sendo de uso do comrcio
internacional, passa a ter grande relevncia na medida em que prope um
remanejamento dos riscos aos quais esto sujeitas as partes em qualquer relao
contratual, notadamente nos contratos de longa durao. Bem por isso, est cada
vez mais presente na prtica comercial internacional, funcionalizando o contrato e
preservando a estabilidade das relaes comerciais.
De se ressaltar que a clusula de hardship um mecanismo inserido no contrato de
acordo com a discricionariedade das partes, fato este que j demonstra a inteno
dos contraentes de manter uma relao baseada na boa-f, na cooperao e no
desejo de que a avena possa perdurar no tempo.
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Todavia, a anlise do caso concreto o que determinar, em ltima instncia, se o
hardship poder ser invocado, apesar de contratualmente previsto. Isso porque, para
a configurao de uma situao de hardship, faz-se necessrio o preenchimento de
alguns requisitos, tais como a imprevisibilidade, o desequilbrio contratual, o
conhecimento pela parte lesada acerca do fato posteriormente concluso do
contrato, dentre outros.
4 Consideraes
Muito h a dizer sobre o tema, tendo em vista a importncia dos fundamentos a ele
relacionados para os Contratos de Comrcio Internacional. Conforme j
mencionado, crescente a preocupao da doutrina jurdica com a questo do
equilbrio/desequilbrio contratual, notadamente nos contratos internacionais de
longa durao. Isso porque a relao contratual tem sido, cada vez mais, entendida
como um fator social e econmico, e, portanto, absolutamente vulnervel aos
acontecimentos externos, sejam eles culturais, mercadolgicos, financeiros ou de
qualquer outra ordem, os quais esto em crescente evoluo.
Desse modo, de suma importncia que o direito contratual busque mecanismos
originais, cleres e eficazes para as questes que se apresentam no mundo
globalizado. Nesse contexto, a Clusula de Hardship vem de encontro a essas
necessidades, trazendo uma soluo democrtica, efetiva e justa, na medida em que
promove a renegociao entre as partes, trazendo-lhes de volta o equilbrio na
relao contratual e cooperando, em ltima anlise, para o atingimento dos objetivos
comuns dos envolvidos.
E no apenas por seu carter facilitador que o estudo da Clusula de Hardship,
sua origem, efeitos e aplicabilidade e a maneira como foi recepcionada pelo Direito
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brasileiro passam a ter grande importncia, mas tambm por ser referido instituto
objeto de certas controvrsias.
Por fim, no se pode deixar de salientar que o presente trabalho no se presta a
esgotar o assunto, tampouco tem a pretenso de analisar todos os prismas pelos
quais a Clusula de Hardship pode ser encarada. Ainda assim, faz uma tentativa de
contribuir, de maneira singela, com o estudo do tema, de fundamental importncia
para as relaes contratuais internacionais.
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