capítulo 5 civil obrigações prn

Upload: samanta-santos

Post on 08-Jan-2016

8 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Obrigações

TRANSCRIPT

  • 29

    5 DAS OBRIGAES DE DAR

    5.1 CONCEITO

    Na obrigao de dar, o devedor apenas se compromete a entregar ou restituir alguma coisa, mvel ou imvel. Vejamos, primeiramente, a entrega, que visa:

    A) TRANSFERIR A PROPRIEDADE, OBJETO DA PRESTAO:

    Essa obrigao surge, geralmente, em decorrncia do contrato de compra e venda, ocasio em que o vendedor se compromete a transferir a propriedade, objeto da prestao, para o comprador. O contrato de compra e venda no transmite a propriedade, mas apenas cria a obrigao de transferi-la, mesmo que o preo haja sido pago. H apenas uma obrigao, uma promessa de transferir o domnio, pela entrega da coisa. Deixando o vendedor de entreg-la, no pode o comprador requerer-lhe a reivindicao, por faltar-lhe o domnio que ainda pertence ao vendedor. O comprador tem somente o direito de mover ao de indenizao nos termos do art. 389 do CC: No cumprida a obrigao, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualizao monetria segundo ndices oficiais regularmente estabelecidos, e honorrios de advogado.

    Se for um bem mvel, o cumprimento da obrigao se dar pela tradio (entrega) real do bem, surgindo, ento, um direito

  • 30

    real de propriedade para o credor. A propriedade das coisas no se transfere pelos negcios jurdicos antes da tradio (CC, art. 1.267).

    Vale dizer, s o contrato no transfere a propriedade; preciso, alm do contrato, a tradio, ou seja, a entrega do bem. que, somente o vnculo obrigacional no tem o condo de fazer adquirir a propriedade; tratando-se de um mvel, preciso, ainda, a entrega do bem.

    B) CEDER A POSSE DO OBJETO DA PRESTAO:

    Numa obrigao de dar, o devedor pode, apenas, comprometer-se a transferir a posse de uma coisa. Assim, seja para transferir a propriedade, seja para ceder a posse da coisa, o adquirente ser simples credor antes da tradio. O proprietrio de um imvel que se compromete a alugar sua propriedade, s se exonera da obrigao, mediante a entrega do imvel para o uso do locatrio (posse direta). Antes da posse, o senhorio ser apenas um devedor da prestao da coisa.

    C) RESTITUIR O OBJETO DA PRESTAO:

    Se algum ocupa um prdio a ttulo gratuito, por emprstimo, surge um contrato de comodato. Ao vencer o prazo, o comodatrio (devedor) deve devolver o que j do credor. Somente com a entrega do imvel que a obrigao cumprida pelo comodatrio.

    O que se destaca na obrigao de restituir coisa certa que a coisa determinada pertence ao credor, diferentemente da obrigao de dar coisa certa, esta pertencente ao devedor.

    5.2 ESPCIES DE OBRIGAO DE DAR

    O nosso Cdigo Civil trata de trs espcies de obrigao

    de dar: obrigao de dar coisa certa, de dar coisa incerta e de restituir.

  • 31

    A) OBRIGAO DE DAR COISA CERTA

    A obrigao de dar coisa certa aquela que consiste na entrega de uma coisa certa e determinada. O objeto da prestao uma coisa individualizada, delimitada, distinta de todas as outras da mesma espcie.

    B) OBRIGAO DE DAR COISA INCERTA:

    A obrigao de dar coisa certa distingue-se da obrigao de dar coisa incerta. No primeiro caso, o devedor, para cumprir a obrigao, dever entregar uma coisa que tenha indicao precisa, individualizada; j no segundo caso, exige-se apenas a indicao do gnero (a marca de um televisor, por exemplo) e a quantidade (um, dois, trs etc.), porque a coisa ser individualizada atravs da escolha, quando a obrigao for solvida.

    A escolha, portanto, foi o sistema adotado pelo legislador para tornar certa a coisa incerta, o que ocorre no momento da execuo da obrigao.

    C) OBRIGAO DE RESTITUIR:

    A obrigao de restituir, como j vimos, o compromisso assumido pelo devedor de devolver o que j do credor. O devedor devolve coisa certa, recebendo o credor o que j lhe pertencia, como ocorre, por exemplo, na locao, no depsito ou no comodato. 5.3 PRINCPIOS BSICOS QUE VIGORAM NAS OBRIGAES DE DAR COISA CERTA

    a) Na obrigao de dar coisa certa, o devedor se compromete a entregar ou restituir coisa individualizada, determinada, distinta das outras coisas. Conseqentemente, no poder entregar coisa diversa, ainda que seja mais valiosa, para se desobrigar da obrigao assumida. Este considerado o mais importante princpio que orienta o sistema da obrigao de dar coisa certa.

  • 32

    b) Outro princpio que tambm rege a obrigao da dar coisa certa o consignado pelo artigo 233 do Cdigo Civil, in verbis: A obrigao de dar coisa certa abrange os acessrios dela embora no mencionados, salvo se o contrrio resultar do ttulo, ou das circunstncias do caso.

    O Cdigo, portanto, abre duas excees:

    1. - se o contrrio resultar do ttulo, as partes podero pactuar expressamente a excluso dos acessrios. Se algum se obriga a entregar, por exemplo, um automvel contendo um rdio, implicitamente obrigou-se a entregar tambm o acessrio, o rdio. Para que o rdio seja excludo da obrigao, necessrio que clusula especial e expressa conste do contrato.

    2. - se o contrrio resultar das circunstncias do caso, isto , se as circunstncias do negcio tornarem evidente a excluso dos acessrios, no se aplica a regra constante do art. 233. No caso de venda de uma casa, explica Levenhagen, pode ou no estar implcita tambm a entrega do fogo. Se do contrato constar expressamente essa entrega, nenhuma dvida poder ser levantada. Em caso contrrio, porm, de recorrer-se s circunstncias do caso, o que vale dizer, deve-se recorrer aos usos e costumes. que geralmente o fogo da casa no colocado pelo proprietrio, mas por quem vai habit-la. Nesse caso, - finaliza o saudoso comentarista - ser imprescindvel que se deixe esclarecido no contrato, ou se esse for omisso, a deciso dever basear-se em provas e nos usos e costumes locais12.

    A distino entre o acessrio e o principal, que se encontra na regra do art. 92 do Cdigo Civil (Principal o bem que existe sobre si, abstrata ou concretamente; acessria, aquele cuja existncia supe a do principal). Um automvel o principal, porque existe sobre si, ou seja, exerce a sua funo e finalidade, independentemente de qualquer outra coisa; o rdio que nele se encontra uma coisa acessria que s pode existir vinculado coisa principal. 12 Ob. e vol. cits., p. 19.

  • 33

    A distino entre a coisa principal e a coisa acessria est em que, a extino da principal acarreta a da acessria, visto que esta no pode sobreviver quela. Por exemplo, o aval uma garantia acessria da dvida e sendo a dvida, que o principal, extinta, tem-se que o acessrio segue o mesmo destino.

    5.4 RESPONSABILIDADE PELA PERDA OU DETERIORAO DA COISA CERTA ANTES DA TRADIO

    Pode acontecer que a coisa certa, antes da tradio, se

    perca ou se deteriore. Como ficar a situao para o devedor ou para o credor? Quem sofrer o prejuzo?

    O legislador brasileiro apresenta, ento, a teoria do risco que consiste em determinar qual dos dois, o devedor ou o credor, dever arcar com o prejuzo pela perda ou deteriorao da coisa, antes da tradio.

    5.4.1 Perda ou perecimento do objeto sem culpa do devedor

    Se a perda da coisa certa ocorrer no espao de tempo entre

    a constituio do vnculo obrigacional e a tradio prometida pelo vendedor (devedor), independentemente de culpa do possuidor, a obrigao de entregar ficar resolvida para o devedor, e o dono da coisa sofrer o prejuzo, conforme o velho princpio romano: res perit domino (a coisa perece para o dono). Como a transferncia do domnio depende da tradio e esta no se deu, o vendedor arcar com o prejuzo, devolvendo a quantia que, por acaso, tenha recebido.

    Se ficar provada a culpa do devedor, este arcar ainda com perdas e danos (CC, art. 234).

    Assim, se uma casa se incendeia por causa de um raio ou se uma coisa roubada, a execuo da obrigao se torna

  • 34

    impossvel devido existncia de caso fortuito, ou de fora maior, exceto se ele (devedor) se responsabilizou, expressamente, pelo advento do fortuito, ou se estiver em mora (CC, art. 399) Este artigo interessante conhecer: O devedor em mora responde pela impossibilidade da prestao, embora essa impossibilidade resulte de caso fortuito ou fora maior, se estes ocorrerem durante o atraso; salvo se provar iseno de culpa, ou que o dano sobreviria, ainda quando a obrigao fosse oportunamente desempenhada.

    Caso fortuito ou fora maior tem o seu conceito no pargrafo nico do art. 393 do Cdigo Civil: O caso fortuito ou de fora maior verifica-se no fato necessrio, cujos efeitos no era possvel evitar ou impedir. Entende-se por caso fortuito o acontecimento natural, sem controle pela vontade ou pela fora humana. Exemplo clssico o raio do cu, puro evento de origem natural, assim excludente do encargo indenizatrio (in RT 702/67). 5.4.2 Perecimento do objeto da prestao com culpa do devedor

    Se o devedor agiu com culpa (negligncia, imprudncia ou

    impercia), ou com dolo (inteno de prejudicar), motivando o desaparecimento do objeto da prestao antes da tradio, responder pelo equivalente e mais as perdas e danos.

    5.4.3 Deteriorao da coisa sem ou com culpa do devedor

    Se na obrigao de entregar, a coisa se perde apenas

    parcialmente (deteriorao), antes da tradio, devemos distinguir duas hipteses: a culpa ou no por parte do devedor.

    1) No havendo culpa, o credor poder optar entre: a) resolver a obrigao e, se j pagou o preo, receb-lo de volta; b) aceitar a coisa no estado em que ficou, abatido no seu preo o valor que perdeu (CC, art. 235).

  • 35

    Portanto, o legislador concede a escolha ao credor, porque a coisa alterada j no a mesma originria e, ainda, h o principio pelo qual o credor no obrigado a receb-la. Receber se houver interesse (situao subjetiva).

    2) O inadimplemento culposo acarreta a responsabilidade do devedor. Quem no cumpre obrigao responde por perdas e danos. Se houver culpa do devedor, portanto, este arcar ainda com perdas e danos, e o credor poder optar entre: a) exigir o equivalente mais a indenizao de perdas e danos; b) aceitar a coisa no estado em que se acha e reclamar a indenizao pelas perdas e danos.

    5.5 RESPONSABILIDADE PELA PERDA OU DETERIORAO DA COISA NA OBRIGAO DE RESTITUIR

    Na obrigao de restituir coisa certa, o devedor obrigado a devolver uma coisa determinada pertencente ao credor e que apenas estava em seu poder, como o caso de emprstimo de coisa infungvel para o uso.

    Imaginemos a existncia de um contrato de comodato, isto , o proprietrio empresta um veculo para uso do comodatrio, por 10 dias, sem retribuio alguma, ficando este com a obrigao de restitu-lo. Essa espcie de contrato s d vantagem a uma das partes, por ser de concesso gratuita, um emprstimo para uso, diferentemente do mtuo, que contrato de emprstimo a ttulo oneroso. Conseqentemente, por ser um contrato essencialmente unilateral de coisa infungvel, origina obrigaes s para o comodatrio e a principal delas consiste na restituio ao comodante da coisa dada em emprstimo, no prazo fixado e nas condies em que foi emprestada.

  • 36

    5.5.1 A coisa perde-se sem culpa do devedor na obrigao de restituir

    Suponhamos que, no intervalo de tempo entre a entrega e a

    restituio, o veculo se perca, por caso fortuito, ou se incendeie por causa de um raio. Quem arcar com o prejuzo?

    Como na obrigao de restituir, o dono da coisa o credor, tambm quem sofre a perda fortuita da coisa, antes da tradio, ficando o devedor liberado da obrigao de restituir.

    5.5.2 A coisa perde-se por culpa do devedor

    Se a coisa se perder por culpa do devedor, vigorar o

    disposto ao art. 239 do CC, segunda parte: Se a coisa se perder por culpa do devedor, responder este pelo equivalente, mais as perdas e danos.

    5.5.3 A coisa deteriora-se sem culpa do devedor

    Na hiptese de deteriorao da coisa a ser devolvida, sem

    culpa do devedor, o credor dever receb-la, como ela se encontra, sem direito indenizao alguma (CC, art 240).

    5.5.4 A coisa deteriora-se por culpa do devedor

    A coisa deteriorou-se por culpa do devedor, vigorando o

    disposto no art. 239 do CC: Se a coisa se perder por culpa do devedor, responder este pelo equivalente, mais perdas e danos.

    5.6 OCORRNCIA DE MELHORAMENTOS E ACRSCIMOS NA OBRIGAO DE DAR COISA CERTA

    Assim como a coisa pode se perder ou se deteriorar antes da entrega prometida ou antes de devoluo, tambm podero

  • 37

    ocorrer melhoramentos ou acrscimos mesma, ocasionando-lhe uma mudana para melhor em seu valor.

    1) At tradio, - diz o art. 237 do CC - pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poder exigir aumento no preo; se o credor no anuir, poder o devedor resolver a obrigao.

    Por conseguinte, enquanto no se d a tradio13, os melhoramentos e os acrscimos pertencem ao devedor, tenha ou no feito despesas ou empregado trabalho neles, pois o senhor da coisa principal. Como a res debita no a mesma da ocasio da construo da obrigao, porque houve mudana no estado fsico da coisa para melhor, e considerando-se que o devedor no est obrigado a entregar outra coisa certa ainda que mais valiosa, bem como o credor tambm no obrigado a receber outra, a lei autoriza ao devedor exigir aumento de preo correspondente valorizao; caso o credor no concorde, o devedor poder desfazer o contrato, voltando-se a situao no estado anterior. A parte final do artigo acima transcrito de uma clareza to ofuscante que no admite dvida: se o credor no anuir, poder o devedor resolver a obrigao, exceto se o devedor agir com m-f, promovendo melhoramento ou acrscimo para ter maior proveito na hora da tradio, no se aplicando a regra aqui exposta.

    2) Se na obrigao de restituir a coisa, ocorrem melhoramentos ou acrscimos no espao de tempo entre a constituio da obrigao e a tradio da coisa principal, sem que o devedor faa despesa alguma ou empregue trabalho algum, lucra o credor, por ser o dono da coisa, sem pagar nenhuma indenizao.

    Se, porm, a coisa restituvel sofrer melhoramento ou aumento devido ter o devedor empregado trabalho ou dispndio, aumentando o valor do bem, tem-se que verificar se o devedor possuidor de boa-f ou de m-f (CC, art. 242).

    13 Tradio = entrega.

  • 38

    a) se o devedor possuidor de boa-f ter ele direito indenizao pelas benfeitorias ou pelo aumento, podendo exercer o direito de reteno da coisa, isto , de conservar a posse da coisa principal at que o credor lhe pague o valor correspondente das benfeitorias necessrias e teis.

    b) se o devedor possuidor de m-f, ter ele somente direito indenizao pelas benfeitorias necessrias, aquelas despesas feitas para a conservao ou para evitar a deteriorao da coisa; no lhe assiste o direito de reteno pela importncia destas, nem o de levantar as volupturias (CC, art. 1.220).

    Se no lugar das benfeitorias, existirem frutos, antes da tradio, o devedor adquire os frutos separados; os pendentes devem ser devolvidos sem nenhum pagamento de indenizao, pelos motivos j expostos. Os colhidos por antecipao devem ser devolvidos ao credor ou indenizados. 5.7 DA OBRIGAO DE DAR COISA INCERTA

    O Cdigo prev a existncia de obrigao de dar coisa incerta, desde que o objeto da prestao seja determinvel pela indicao do gnero e quantidade, ou seja, substituvel por outra da mesma quantidade e qualidade, a obrigao ser possvel. A coisa incerta ser indicada, ao menos, pelo gnero e quantidade (CC, art. 243).

    Portanto, a coisa incerta pode ser objeto da obrigao de dar desde que seja indicada pelo menos pelo gnero e quantidade, pois, atravs da escolha, a coisa incerta se transmuda para coisa certa. Nas coisas determinadas pelo gnero e pela quantidade, a escolha pertence ao devedor, se o contrrio no resultar do ttulo da obrigao, diz o art. 244 do CC.

    A regra, portanto, a escolha pertencer ao devedor, exceto quando expressamente o ttulo constitutivo da obrigao constar ser o credor quem far a escolha. Pode, at, o ttulo firmado

  • 39

    determinar que um terceiro faa a escolha. Isto significa que, se as partes no estipularem a quem compete a escolha, o direito de escolher pertence ao devedor.

    Mas se a escolha pertencer ao devedor, este no poder dar a coisa pior, nem ser obrigado a prestar a melhor (segunda parte do art. 244). Como o devedor no obrigado a dar o melhor, obviamente, se a escolha couber ao credor, este no poder ficar com os melhores.

    Uma vez feita a escolha, a obrigao passa a ser orientada pelos princpios da obrigao de dar coisa certa. Antes da escolha, no poder o devedor alegar perda ou deteriorao da coisa, ainda que por fora maior, ou caso fortuito ( CC, art. 246), isto porque o gnero nunca perece (genus nunquam perit).