brasil 21 #3

20
A luta dos Xavantes, Guaranis Kaiowá e Nhandeva pela demarcação dos territórios ANO 1 NÚMERO 3 Dezembro de 2012\ Janeiro de 2013

Upload: rosangela-menezes

Post on 06-Mar-2016

217 views

Category:

Documents


1 download

DESCRIPTION

Trabalho como freelancer com diagramação e edição

TRANSCRIPT

Page 1: Brasil 21 #3

A luta dos Xavantes,

Guaranis Kaiowá e Nhandeva

pela demarcação

dos territórios

ANO 1 NÚMERO 3 Dezembro de 2012\ Janeiro de 2013

Page 2: Brasil 21 #3

Vários conflitos envolvendo a demar-

cação de territórios indígenas estão

acontecendo no centro do país e a

terceira edição da Revista Brasil 21 destaca a re-

sistência dos moradores não declarados índios em

abandonar a reserva de Marãiwatsédé, na região de

Estrela do Araguaia, no Mato Grosso. E também a

demarcação das terras dos povos Guaranis Kaio-

wás e Guaranis Nhandeva em Paranhos, no Mato

Grosso do Sul. Além disso, outra questão agrária

atinge o norte do país: cerca de 50 famílias foram

expulsas da fronteira com a Bolívia e há cinco anos

esperam pelo assentamento prometido pelo IN-

CRA.

A entrevista é com o fundador da Rede Brasi-

leira de Informação Ambiental Vilmar Berna, o

jornalista fala sobre comunicação, Meio Ambien-

te e o futuro da sustentabilidade no Brasil. Outro

destaque da edição é a lista de sites para exercitar

o consumo colaborativo, prática comum nos Es-

tados Unidos e na Europa, que chegou ao país e

tende a diminuir o consumismo, já que estimula o

empréstimo de objetos pessoais.

Boa leitura!

Olá, leitor!

Equipe Brasil 21

Ano1 Número 3 Dezembro de 2012\Janeiro de 2013

Editoração gráfica:Rosângela Menezes

Arte: Rosângela Menezes

Colaboladores:Allan GomesCarlos MelloBeatriz AguiarJéssica Sant’AnaRegina MirandaTaynara Macedo

EdiçãoRosângela Menezes

Capa: Marcello Casal\ABr.Contra Capa: Gurgel Chugh

Contato:[email protected]@ revistabrasil21

Carta ao leitor

Page 3: Brasil 21 #3

Sumário 4 EM FOCO

ENTREVISTA

ENERGIA

Conflitos no assentamentosdos serigueiros do Rio Mamu e nas demarcações dos Guaranis

Acaba o prazo paraos não-índios abandonarema região de Marãiwatsédé

Os avanços do país no Ano Internacional daEnergia para Todos

Fo

to: M

arce

llo C

asal

Jr./

AB

r.

ECONOMIAConsumo colaborativochega ao país e traz vantagenspara o Meio Ambiente

8

CAPA 10

Vilmar Berna falasobre a democratização doJornalismo Ambiental

16

18

Fo

to: W

ilso

n D

ias/

AB

r.F

oto

: Her

mín

io N

unes

Page 4: Brasil 21 #3

EM FOCO

Agosto de 2008

Seguireiros brasileirosdo Rio Mamu, , na Bolívia,foram expulsos

Novembro de 2009

O Itamarati e a OIM foram até Extremo para aplicar oFormulário de Preferência.

Novembro de 2009

O INCRA recadas-trou os Brasivianos, que seriamreassentadas no Acre,

Março de 2012

Brasivianos continuam sem terra

Cerca de 50 famílias

esperam pelo assentamento

prometido pelo Governo

Federal

As negociações sobre o assenta-mento de 50 famílias brasilei-ras expulsas do Rio Mamu, na Bolívia, ainda não chegou ao fim. Segundo o Secretário Ge-

ral da Embaixada Brasileira em La Paz, Kaiser Pimentel de Araújo, o processo está em anda-mento junto ao Instituto Nacional de Coloni-zação e Reforma Agrária (INCRA). Os extrati-vistas reclamam da demora do processo, que se estende há cinco anos.

As expulsões começaram a acontecer quan-do o presidente Evo Morales assumiu o poder na Bolívia, em 2006. Ele iniciou um projeto de reformar agrária que não permitia a presença de estrangeiros na faixa de terras fronteiriças pertencentes ao seu país. Com isso, as famílias brasileiras de seringueiros e coletores de cas-tanhas tiveram que deixar o local onde mora-vam.

Em 2008, as famílias expulsas reivindicaram as terras da região do Rio Mamu, na província de Frederico Román. A justificativa dada pelo grupo foi que eles já estavam instalados ali há pelo menos 50 anos e, por isso, tinham laços culturais e históricos com o local. O pedido foi negado pelo governo boliviano e eles foram obrigados a se instalar em Vila Extrema, distri-

Por: Jéssica Sant’Ana

4 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

to de Porto Velho. Os extrativistas pedem que seja feito um re-assentamento em ter-ras rondonienses ou acreanas.

A migração de fa-mílias brasileiras para a região do Rio Mamu se intensificou com a chegada da pecuária na região amazôni-ca, na década de 70, quando houve des-truição de seringais nativos.

Última reuniãoentre os colonos eo representante daembaixada brasileira em La paz

Fo

to: D

ivul

gaç

ão

Page 5: Brasil 21 #3

Terras para os Guaranis

Kaiowa e nhandeva

Por: Carlos Mello

Mais um conflito envolvendo tribos indí-genas ocupa espaço na mídia nacional e

internacional. Em um afastado rincão do Bra-sil, o município de Paranhos distante 469 km de Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, é palco da batalha dos índios Guarani Kaiowá e Nhandeva para ver reconhecido o direito ao terri-tório originário. Na pacata cidade, que faz fronteira com o Paraguai, cerca de 600 índios vivem nas al-deias da região e desenvolvem ativi-dades como a caça, pesca e agricultura familiar: não há conflitos entre os habitantes e os guaranis, o clima de tranquilidade é ga-rantido pelas autoridades policiais, que atuam junto à comunidade indígena.

Os Guaranis das aldeias Potrero Guasu e Arroyo Korá lutam pela criação de suas terras indígenas, onde poderão desen-volver os rituais e atividades típicos da etnia. Os estu-dos antropológicos e as demarcações foram realizadas pela Funai em 2009. Mas, a a área continua embargada pela Justiça. Após sete dias da homologação, o Supremo Tribunal Fe-deral (STF) concedeu uma liminar aos do-nos de uma fazenda

4 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

Os povos indígenas lutam pela demarcação do território no município de Paranhos, no estado do Mato Grosso do Sul

Fo

to: M

arce

llo C

asal

Jr./

AB

r.

Ládio Veron

é filho do

cacique

MarcosVeron,

assassinado

em 2003

Page 6: Brasil 21 #3

6 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

de 184 hectares existente na região e suspendeu o decreto que demarcava o território de sete mil hectares para os Gua-ranis. A maioria dos fazen-deiros busca diante do Poder Judiciário o direito à indeni-zação pela desapropriação de suas terras, entretanto alguns vociferam discursos agudos e inflamados contra a criação das terras indígenas.

As aldeias são comandadas pelos capitães. Eles são res-ponsáveis pelas decisões da da comunidade e têm autoridade para representar os integran-tes da tribo diante das auto-ridades do governo. A aldeia 07 Cerro é comandada pelo capitão Pedro, que dá exem-

plo de excelência em gestão de recursos coletivo. O capitão afirmou que, sempre busca inverter as conquistas finan-ceiras para o bem coletivo da comunidade. A aldeia possui plantações de mandioca e mi-lho. Além disso, existe uma

grande área sendo preparada para a ampliação do plantio do milho e a criação de uma plantação de soja. A pecuária extensiva também está nos projetos da aldeia, que já pos-sui um rebanho de quase 100 cabeças de gado.

Guaranis se reunem em Aty Guasu

Fo

to: M

arce

llo C

asal

Jr./

AB

r.

A tradicional assembleia Gua-rani reúne lideranças de to-das as comunidades da etnia existentes em Mato Grosso do Sul, além de idosos, crian-ças, homens e mulheres que se encontram para discutir os problemas e as principais reivindicações de cada terra, aldeia ou acampamento gua-rani sul-mato-grossense. Este ano, a assembleia ocorreu en-tre os dias 28 de novembro e 1 de dezembro, na Aldeia Lagoa Rica-Panambi, e contou com a presença de representantes de vários órgãos da estrutu-

ra federal, como a presidenta da Fundação Nacional do Ín-dio (Funai), Marta Azevedo. Essas mesmas autoridades participaram, no dia 30 de no-vembro, de um encontro para

tentar achar soluções para o conflito fundiário entre índios e fazendeiros, que há décadas disputam terras no estado.

No documento aprova-do ao fim da assembleia, os índios fazem uma série de reivindicações e voltam a cri-ticar o governo federal pela "morosidade em demarcar as terras indígenas" já identifica-das. Os Guaranis exigem que os governos federal e estadual consultem a Aty Guasu sobre qualquer iniciativa ou proce-dimento que afetem os inte-resses indígenas e pedem que

Por: Alex Rodrigues *

Soldados da Força Nacional garantem a paz entre os moradores e os índios

“Conclamamos

toda a sociedade

a continuar a exigir

do governo a

demarcação de

todas as nossas

terras”

*Texto publicado na Agência Brasil dia 1 de dezembro de 2012

Page 7: Brasil 21 #3

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 7

medidas mais eficazes sejam tomadas para garantir a vida das lideranças, so-bretudo daquelas de comunidades em áreas de conflito.

A Aty Guasu também pede mais atenção e recursos à saúde indígena, alegando que os Guaranis são vítimas de um processo de "etnocídio" e estão "condenados a um sistema de saúde sucateado", no qual faltam profissionais dispostos ou aptos a atender as áreas in-dígenas. Situação semelhante à encon-trada no campo da educação indígena, de acordo com o documento entregue às autoridades.

Os índios também criticam o Po-der Judiciário, que, no documento, é classificado como o maior "executor de penas que causam a morte de nosso povo". "Processos de demarcação há anos se arrastam nos porões do Judi-ciário; ordens de despejo são dadas a todo o momento e indiscriminada-mente [...] quando é obrigação do gov-erno brasileiro garantir escola, saúde, alimentação e documentação para nos-so povo, onde quer que ele esteja", criti-cam os líderes indígenas presentes à Aty Guasu, afirmando que o Estado só age para garantir os direitos indígenas quando pressionado pela repercussão midiática e social de certos temas.

"Repudiamos todas as violências, ameaças às lideranças e mentiras le-vantadas contra nossos parentes e re-afirmamos para toda a sociedade que estamos unidos com o mesmo objetivo. Não permitiremos que outros povos sejam massacrados como o nosso. Por isso exigimos a demarcação das ter-ras do povo Terena, Kinikinau e Ofaié, além da imediata devolução das terras do povo Kadiwéu".

Fo

tos:

Mar

cello

Cas

al J

r./ A

Br.

Lideranças indigenas,

anciãos e rezadores das

tribos Guaranis Kaowá

e Nhandeva se reuniram

em Douradina para Aty

Guasu, assmbleia

tradicional que

discute os problemas

enfretados pelas

comunidades

Page 8: Brasil 21 #3

8 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

ECONOMIA

Brasileiros descobrem o consumo colaborativoA troca, compartilhamento e intercâmbio de bicicletas,carros e objetos podem ser a saída para sustentabilidadePor: Jéssica Sant’Ana

Um dos fenômenos mais in-teressantes que surge em resposta à crise econômica mundial é o consumo cola-borativo. Essa prática consiste

na expansão de diferentes formas de acesso a produtos e serviços sem a necessidade de adquiri-los. A lógica é simples: compartilhar ao invés de comprar. Ou seja, um espaço que permita que as pessoas troquem e aluguem objetos que são poucos utilizados ou que não tenham mais serventia em seu dia a dia.

Para facilitar o contato entre os interes-sados, grande parte das transações acontecem através de sites e redes sociais. As ofertas são as mais variadas possíveis: serviços de aluguel de carro, empréstimo de ferramentas, trocas de roupas, doações de livros ou qualquer coisa que – para o dono – não tenha mais tanta utilidade. Isso dá sobrevida aos bens reutilizáveis, ajuda a economizar dinheiro e a transformar con-sumidores passivos em colaboradores ativos.

A ideia nada mais é do que uma adap-tação da velha prática do “pegar empres-tado com o vizinho”. A transformação desse hábito em uma tendência mundial aconteceu devido a três fatores que modi-ficaram o comportamento do consumidor. São eles: crise econômica de 2008, preocupa-ção ambiental e difusão do acesso a internet.

A filosofia desse movimento é baseada na teoria dos 3Rs: redução do consumo de resíduos, reutilização dos produtos e reci-clagem ao final da vida útil. A revista Times, dos Estados Unidos, publicou um artigo em 2011 que coloca o consumo colaborativo entre as “10 coisas que vão mudar o mun-do”. O que faz a proposta ser tão atraente é a transformação de um bem em um serviço.

Essa tendência é mais forte nos Estados Unidos e na Europa. Por lá, os sites de trocas são uma febre e o pensamento colaborativo já

Vantagens do Consumo

Economia do usuário

COLABORATIVO

12 Redução de resíduos

3

4

Reutilização dos produtos

Reciclagem ao�nal da vida útil

5 Solução de mobilidade

Page 9: Brasil 21 #3

DeslocaAí – o site é um dos mais populares portais de consumo colaborativo e oferece aluguel e troca de produtos e serviços diver-sos. Acesse: www.descolaai.com Dois Camelos – é um aplicativo para Face-book que facilita a troca de produtos entre os usuários cadastrados. Atualmente, conta a página conta com mais de 43 mil usuários e quase 5 mil ofertas. Acesse: http://apps.face-book.com/doiscamelos

BuscaLá – o site promove troca ou aluguel de móveis, eletrônicos, artesanato, acessórios esportivos, entre outros itens. Acesse: http://buscala.com.br/ Zazcar– é a primeira empresa de compartilha-mento de carros na América Latina. Oferece todos os benefícios de um carro particular, sem ter que arcar com os custos e responsa-bilidades de um dono de automóvel. Acesse: www.zazcar.com.br Livra Livro – é um site destinado a troca de livros entre os usuários. Disponibiliza gêneros variados. Acesse: www.livralivro.com.br Núcleo Educativo da Casa das Rosas – promo-ve, mensalmente, uma feira de troca de livros, gibis e brinquedos. A Casa das Rosas está si-tuada na Avenida Paulista, 37, São Paulo. Para mais informações acesse: http://nucleoeduca-tivocasadasrosas.blogspot.com.br/ Escambo Chique – é um evento mensal, cha-mado de “Desapegue”, voltado ao público feminino. Promove a troca de peças de ves-tuário usadas como roupas, calçados e aces-sórios. Acontece no Bar do Santa, na Vila Ma-dalena (SP). Para mais informações, acesse: www.desapegue.com.br BBzum – é uma loja de aluguel de brinquedos. Oferece cerca de 600 produtos para aluguel diário, quinzenal ou mensal. Acesse: www.bbzum.com.br

Airbnb – é um mercado comunitário para as pessoas anunciarem e reservarem acomoda-ções em todo o mundo a preços populares. Acesse:www.airbnb.com.br

Colabore você também

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 9

chegou até nas crianças. Existem empresas que desenvolveram eventos de comparti-lhamento que incentivam, desde cedo, o pensamento sustentável. É o caso do site Swap que promove campanhas de trocas de livros e uniformes em escolas infantis.

No Brasil, essa prática está no come-ço, mas já há plataformas que oferecem opções para quem deseja trocar ou alu-gar um objeto ou serviço. É o caso da Zazcar, uma empresa que oferece o ser-viço de compartilhamento de carros na cidade de São Paulo. O site começou a funcionar em 2009 e a meta para 2013 é passar dos dois mil usuários atuais para 30 mil e de uma frota de 60 para 500 car-ros. O consumidor, ao alugar o veículo, paga apenas pelo período de utilização. Segundo o site da empresa, um carro compartilhado retira outros 13 das ruas.

O site DescolaAí, criado pelo enge-nheiro Guilherme Brammer foi o pre-cursor dessa nova tendência no país. Acessando a plataforma, o usuário tem a opção de buscar os produtos que pre-cisa ou disponibilizar aqueles que têm para troca ou aluguel. Assim que a de-manda e a oferta forem identificadas, eles vão ser colocados em contato para decidirem qual a melhor maneira para fazer a transação. O DescolaAí conta também com a opção de se criar grupos privados e corporativos para as trocas.

Em entrevista ao site Ideia Susten-tável, o empresário afirmou que o fator mais importante do consumo colabo-rativo é a economia. O empréstimo de produtos diminui a necessidade da com-pra, o que reflete na extração de novas matérias primas. Além disso, quem não podia pagar caro por um produto agora pode ter acesso a ele por um preço mui-to menor, o que é um benefício social.

Page 10: Brasil 21 #3

CAPA

Page 11: Brasil 21 #3

MarãiwatsédéApós uma batalha judicial de 17 anos, começou a desapropriação dos não-índios da reserva Marãiwatsédé, ho-mologada por decreto aos Xavantes. Alguns moradores resistem em sair do local desde o dia 6 de dezembro, prazo máximo para abandonar a região, localizada no Posto da Mata, no Mato Grosso.

Por: Allan Gomes e Regina Miranda

Foto: Wilson Dias\ ABr.

Page 12: Brasil 21 #3

12 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

A população dos mu-nicípios Alto Boa Vista, Bom Jesus do Araguaia e São Félix do Araguaia,

no nordeste do Mato Grosso, vive em clima de guerra desde o início de novembro. Os policiais da For-ça Nacional de Segurança Pública, Polícia Rodoviária Federal e solda-dos do Exército Brasileiro estão na região para garantir as notificações e posterior desocupação da Terra Indígena Marãiwatsédé.

Após uma batalha pelos tribu-nais do Brasil, que começou em 1995, os indíos Xavantes, ocu-pantes originais da região, conse-guiram, em 1998, a demarcação homologada por um decreto pre-sidencial e, desde então tentam re-tomar a área, pois segundo as lideranças indígenas, os índios ocupam aquele território desde a década de 60.

Em junho de 2011, o Tribunal Regional Federal, em Cuiabá, sus-pendeu o cumprimento da deso-cupação da terra indígena, tendo em vista a aprovação de projeto de lei estadual, que propôs a permuta da área pleiteada pelos Xavantes por outra dentro Parque Nacional do Araguaia. Algumas lideranças indígenas, MPF, Advocacia Geral da União e Funai se manifestaram contrárias à permuta.

Para os agricultores que vivem

na área, essa seria a maneira mais eficaz de evitar um conflito na re-gião. Alguns moradores mais exal-tados ensaiam resistência ao cum-primento da desocupação desde o dia 7 de dezembro. Mas a grande maioria demonstram ser pessoas pacíficas que apenas lutam pelo direito à propriedade.

Com a chegada da data para retirada dos posseiros, a batalha judicial ganhou novos episódios na disputa, pelos 165 mil hecta-res, que cortam os três municípios mato-grossenses. Desde o dia 6 de dezembro todos os ocupantes não-

-índios da região devem abandonar o local, caso o mo-rador não deixe a área será utilizada força policial. Por conta disso, o cli-ma de conflito têm se acirrado desde a primeira semana de dezembro. As

notificações foram divididas para serem distribuídas em quatro eta-pas: na primeira foram notificados os grandes fazendeiros, na segunda fase os médios produtores, depois os pequenos agricultores e no final os habitantes do povoado do Posto da Mata.

Ainda assim, os agricultores agarram-se à três alternativas que podem impedir sua retirada do local. Uma delas é a aceitação da proposta feita pelo governo do Es-tado de permuta de uma área no Parque Estadual, localizado mais a leste da área atual onde os índios

Os índios Xavantes ocupam

a região do Alto da Boa Vista, São Félix do Araguaia

e Bom Jesus do Araguaia, desde a

década de 60.

“Faz 21 anos que

estou nesta área, se

eu sair vou perder

tudo, não tenho para

onde ir. Então, eu

prefiro morrer aqui”

Fo

to: M

arce

llo C

asal

Jr./

AB

r.

Page 13: Brasil 21 #3

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 13

seriam colocados para manter os produtores no mesmo lugar. O Congresso Nacional preci-saria aprovar a medida. Outra saída seria anu-lar o decreto presidencial que criou a reserva e a terceira é a reversão da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que autorizou a desintrusão. Forças políticas de Mato Grosso, Tocantins e Goiás têm trabalhado fortemente nas duas últimas hipóteses.

Mas, a população que vive na região não está de acordo com as ações da Funai. Os mo-radores do povoado alegam que têm títulos legítimos de propriedade rural e que a região não seria apropriada para os Xavantes. Para a vice-prefeita eleita de Alto Boa Vista, Irene Ro-

cha, a saída é levar os índios para o Parque Na-cional do Araguaia. “O certo era eles irem para lá porque eles seriam mais beneficiados do que estão aqui, teriam uma vida digna, creio que eles teriam hospital, teriam tudo pra sobrevi-ver, uma lavoura, plantar, porque assim como nós plantamos eles também sabem trabalhar, falta alguém pra dar os mecanismos pra eles sobreviverem”. Segundo Irene Rocha, o maior problema é que o assentamento do INCRA não tem estrutura para os moradores e falta in-clusive estrada de acesso para o local. “Se eles ao menos tivesse um lugar a população ficaria contente. A insegurança que nós já vivemos aqui é muito grande, eu quero paz”, declara.

Page 14: Brasil 21 #3

14 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

A Maraiwatsédé é uma reserva indígena ex-tensa, não tanto quanto o Parque Indígena do Xingu com 2 milhões de hectares, mas cinco vezes maior que o Parque Nacional da Cha-pada dos Guimarães, por exemplo, que tem 30 mil hectares.

No ano de 1980, a gleba rural, denomina-da de Suiá-Missú, que é a área da Terra Indí-gena Marãiwatsédé, foi vendida para a petro-lífera italiana Agip. Em 1992, a multinacional foi pressionada a devolver a terra ao governo brasileiro durante a Eco92, no Rio de Janei-ro. A Funai afirma que neste mesmo ano, a região começa a ser ocupada por não índios e que atualmente os índios ocupam uma área que representa apenas 10% do território a que têm direito.

Ativistas das questões etnoambientais le-varam o assunto para a Rio +20, conferência da ONU realizada no Rio de Janeiro em ju-nho deste ano. Representantes dos Xavantes, do Judiciário Brasileiro e de ONGs ligadas ao tema debateram a situação da região em disputa: “Houve uma decisão de retirada dos Xavantes de sua terra pelo governo brasilei-ro durante o período da Ditadura Militar, e essa decisão foi cumprida com celeridade. Depois, o governo voltou atrás e decidiu restituir essa terra aos índios Xavantes. Essa decisão foi feita há mais de 20 anos e até hoje ainda não foi cumprida, então existem duas medidas diferentes pra mesma situ-ação: quando se trata de defender direitos adquiridos pelos povos indígenas e quando se trata de defender interesses ecônomicos”, defendeu Marcelo Astrini, do Greenpeace Brasil, no documentário A terra não termina de Marcelo Bichara, que registrou a presença dos Xavante e sua atuação durante a confe-rência.

Maraiwatsédé em disputa

A Terra Indígena

Marãiwatsédé, foi vendida

para a petrolífera italiana

Agip, que foi obrigada

a devolvê-la em 1992

Fo

tos:

Wils

on

Dia

s/ A

Br.

Page 15: Brasil 21 #3

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 15

ENTREVISTAVilmar Berna

O fundador daRébia fala sobrecomunicação, MeioAmbiente eimparcialidade

O e s c r i t o r V i l m a r B e r n a f u n d o u a Rede

Brasileira de Informa-ção Ambiental (Rébia) em 2003 e tem 10 livros publicados, entre eles: Como fazer educação ambiental, Criação e ação humana e O Desa-fio do mar. Em 1999, ga-nhou no Japão o Prêmio Global 500 para o Meio Ambiente, concedido pe-las Organizações das Na-

ções Unidas e em 2003 ganhou o Prêmio Verde das Américas. Berna participou de várias or-ganizações em prol da democratização da infor-mação ambiental: UNI-VERDE em São Gonçalo (RJ), Defensores da Terra no Rio de Janeiro (RJ) e há nove anos está à frente da Rébia. O escritor tam-bém é fundador e colabo-rador da Revista do Meio Ambiente e do Portal do Meio Ambiente, ambos vinculados a Rébia.

Por: Taynara Macedo

Fo

to: D

ieg

o G

urg

el

Vilmar Berna recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU para o Meio Ambiente em 1999

Page 16: Brasil 21 #3

Brasil 21- Como surgiu a iniciativa de criar a Rede Brasileira de Informação Ambiental (Rebia)?Vilmar Berna - A Rebia surgiu de um contexto aonde percebemos que o principal problema para a sociedade de hoje é fazer a mudança entre o modelo de desenvolvimento predatório e o modelo de desenvolvimento sustentável. E para essa transição ocorrer é necessário ter informação de qualidade, que permitisse a ela fazer escolhas melhores, que a informação tivesse mais qualidade. A informação sozinha não produz necessariamente uma mudança no rumo da sustentabilidade. Uma pessoa, por exemplo, que esteja dominada por valores gananciosos, vai usar a informação, mesmo que de qualidade, para se apropriar de um recurso, para dominar melhor e controlar melhor algo que esteja em risco de acabar. Utilizando a água como exemplo, uma pessoa gananciosa pode querer se aproveitar melhor disso, quando a ideia é exatamente contrária. Você precisa

trabalhar a informação e os valores. O jornalismo às vezes tem certa dificuldade em lidar com a questão dos valores, porque isso envolve a cidadania e entra numa outra área onde o jornalista questiona, o engajamento. Ele pensa: “Eu tenho que ser um jornalista, tenho que passar a informação da realidade, não tenho que ter compromisso

de junto com essa informação, fazer um convencimento da sociedade de que ela tem de seguir para esse ou aquele caminho. Não considero isso um papel meu”. Já o professor começa a trabalhar mais a questão dos valores, mas é importante que o jornalista compreenda que a informação não é neutra, que o papel que ele exerce não é neutro.

Não existe neutralidade na comunicação, dependendo da maneira como você aborda um assunto você vai fortalecer uma visão de mundo ou outra. Então o jornalista precisa estar muito atento sobre o papel social dele.

A Rebia surge nesse contexto, onde trazemos o jornalista para esse debate, mas não queremos apenas o jornalista, queremos o educador ambiental, o professor e todo aquele que lida com a necessidade de cumprir uma função social, de comunicar alguma coisa no campo da sustentabilidade, para a sociedade, que não é só o jornalista, são vários outros profissionais.

A Rebia não nasce como uma rede de jornalistas, mas como uma rede de pessoas comprometidas com a questão da democratização da informação ambiental, como uma estratégia para que a sociedade possa fazer escolhas melhores no rumo do desenvolvimento sustentável. B.21- Entre as duas Conferências das Nações Unidas, a Eco-92 e a Rio+20, quais foram as principais

16 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

Fo

tos:

Her

mín

io N

unes

“Há um novo

mundo acontecendo,

um mundo de

sustentabilidade,

onde esse modelo

predatório não tem

mais lugar”

Page 17: Brasil 21 #3

mudanças na abordagem do tema? Houve avanços?V.B.- Em duas décadas nós tivemos uma mudança profunda de comportamento e de consciência das pessoas. Aconteceram alguns avanços muitos relevantes, mas a diferença entre a intenção e o gesto ainda é muito grande. Não podemos negar a existência da mudança, ela aconteceu, mas também não podemos esquecer que ela ainda não foi o suficiente para fazer a virada do modelo. Nós ainda continuamos requerendo mudanças de atitudes. As pessoas sonham em ter um mundo melhor, mais sustentável, mas as atitudes e os comportamentos não vão em direção dessa mudança. Acredito que ainda existe a necessidade de fazer a grande virada.B.21- Como o senhor se envolveu com as causas ambientaisV.B.- Cada pessoa tem algo na sua vida que lhe toca o coração para ir em direção de alguma causa que ultrapassa a sua missão profissional. No meu caso, o que me moveu não foi a leitura de nenhum texto,

não foi algo que escutei, foi um momento da minha vida: aos 14 anos de idade, quando é natural que o jovem esteja querendo buscar caminhos. Eu sempre fui pacifista, era uma época da ditadura militar e então eu vivi um episódio no Rio Grande do Sul, durante uma caçada, onde os jovens estavam caçando animais e

eu estava no canto de uma tenda quando vi um ratão-do-banhado com seus filhotes assustados na minha direção, como se fosse pedindo ajuda e aquele “olhinho” olhou para mim, parecia que estava se comunicando comigo, então na mesma hora parece que ele me disse tudo. Desde então aquilo marcou o resto da minha vida, porque passei

a me dedicar para a causa ambiental, estudei, aprendi, mas aquele momento foi mágico para mim.B.21- Qual a importância para o senhor de que o jornalismo ambiental passe a ser abordado na academia?V.B.- É uma ilusão acharmos que apenas o jornalismo vai cumprir a demanda de toda a complexidade da sociedade. É uma ilusão acharmos também que o curso de graduação vai conseguir suprir todas as demandas. Talvez o jornalismo ambiental seja algo para ser estudado na pós-graduação, entretanto, na graduação as pessoas já precisam conseguir passar para o futuro profissional, que, diga-se de passagem, não só o jornalista, o engenheiro, o professor, todas as outras áreas de atuação. Há um novo mundo acontecendo, um mundo de sustentabilidade, onde esse modelo predatório não tem mais lugar, isso de uma maneira geral para qualquer profissão. Mas para se aprofundar nisso, acredito que as universidades devem tratar o tema nos programas de pós-graduação.

“A pessoas

sonham em ter

um mundo

melhor, mas as

atitudes não

vão em direção

dessa mudança”

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 17

Fo

tos:

Her

mín

io N

unes

Page 18: Brasil 21 #3

ENERGIA

ONU incentiva crescimento através da economia verde

Há pouco mais de dois séculos, as má-quinas a carvão simbolizavam a mo-dernidade e o poder do homem na

Revolução Industrial. Usado como substituto para a lenha nas máquinas a vapor, o carvão mineral se tornou a principal fonte de energia primária usada nas usinas termoelétricas para a geração de eletricidade. Para o homem mo-derno, o uso de combustíveis fósseis deveria significar desenvolvimento. Hoje se sabe que não é bem assim.

Cerca de 2,7 bilhões de pessoas no mundo dependem de madeira, carvão, carvão vegetal ou resíduos animais para cozinhar e aquecer a residência. De acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU), isso é uma grande barreira para a erradicação da pobreza, já que o problema da energia nos países industriali-

zados está intimamente ligado com o desper-dício e a poluição, e não ao abastecimento das cidades. Por este motivo, a ONU instituiu 2012 como o Ano Internacional da Energia Susten-tável para Todos, com o objetivo de incentivar o uso da energia sustentável como fator para o crescimento econômico.

A energia sustentável, diferente dos modos convencionais de produção de energia, é reno-vável e limpa, com pouco ou nenhum índice de emissão de CO2 (dióxido de carbono), prin-cipal causador do efeito estufa. Na categoria de fontes de energia alternativa entram os ge-radores de energia eólica, solar, hidroelétrica, geotérmica e outras menos conhecidas, como a energia das marés. No entanto, os índices de energia produzida de forma limpa ainda são baixos: segundo a Agência Internacional de Energia, as fontes de energia renovável são res-ponsáveis por apenas 14% da produção energé-tica mundial. A estimativa é que esse número alcance 17% até 2030.

Do outro lado do oceano- No Brasil, o mer-cado de energia sustentável ainda é incipiente, mas apresenta alguns avanços. Atualmente, 43,9% da Oferta Interna de Energia (OIE) são resultantes de fontes renováveis, em compara-ção com a média de 6% nos países desenvolvi-dos. Dono da matriz energética mais limpa do mundo, o Brasil teve um aumento de 9,1% na

No Ano Internacional da Energia Sustentável para Todos, 43,9% da energia brasileira são resultantes de fontes renováveis como a eólica e a biomassaPor: Beatriz Aguiar

18 www.brasil21.net dezembro 2012\janeiro 2013

Fo

to: F

or

Des

igne

r

Page 19: Brasil 21 #3

oferta de energia em 2010 – a que mais contri-buiu foi a eólica, com um aumento de 50,5%, seguida pela biomassa, com 18,1% a mais de rendimento que no ano anterior.

Desde a criação do Programa de Incen-tivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), em 2002, pelo Ministério de Minas e Energia (MME), o Brasil vem apresentando consideráveis investimentos na área. Segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o valor das cotas para custeio do Proinfa será de R$ 2,58 bilhões em 2013; em contrapartida, o montante de energia elétrica gerado pelas 130 usinas integrantes do projeto atingirá 11 mil-hões de megawatts-hora (MWh).

Entre os estados brasileiros, o Ceará se desta-ca como um dos maiores produtores de energia limpa no país. Dados da Associação Brasileira de Energia Eólica (ABEEólica) atestam que o Ceará é responsável por 35% da matriz energé-tica nacional, resultado do investimento de R$ 2 bilhões no setor, que permitiu a construção

de 17 parques de energia renovável no estado. A novidade é o investimento na produção de energia a partir da força das marés: em Porto do Pecém, em São Gonçalo do Amarante (CE), foi construída a primeira usina do gênero na América Latina, com a produção ainda mod-esta de 100 quilowatts (KW), o suficiente para abastecer 60 famílias.

Apesar disso, o estado com maior participa-ção na produção de energia sustentável é São Paulo, com 55% do total produzido por fontes limpas. A vantagem vem na área de pesquisa e produção, que conta com maior infraestru-

tura para o desenvolvimento de métodos de produção da bioenergia no Brasil. Os dados apontam que 80% da conta de luz paga pela classe média em São Paulo nos dias de hoje correspondem aos gastos com aquecimento de água. Caso metade da cidade instalasse painéis solares para gerar energia, seriam economiza-dos R$ 8 bilhões e reduzida a emissão de 300 mil toneladas de gás carbônico no ar da cidade anualmente.

Diante de tantos investimentos, o cenário é promissor para a produção de energia susten-tável no Brasil. No futuro, a expectativa é que as residências aliem a produção de energia por meio de painéis solares a outras medidas para reduzir gastos e tornar as cidades mais ecológi-cas: melhor planejamento das casas, plantação de flores e jardins nas avenidas e parques da cidade, investimentos em telhados verdes e geração de energia eólica, entre tantas outras possibilidades para uma cidade sustentável. No futuro, quem sabe, a resposta da energia sus-tentável não resida na própria natureza, como se fazia antes da Revolução Industrial.

O Ceará é um dos destaques em energia limpa no país

O estado com maiorparticipação na produçãode energia sustentávelé São Paulo, com 55%das fontes limpas

dezembro 2012\janeiro 2013 www.brasil21.net 19

Fo

to: R

aheg

o

Page 20: Brasil 21 #3

Na próxima edição:

TurismoOs melhores destinos para o

tura

deAven