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CURSOS ON-LINE – DIR. PENAL – CURSO BÁSICO PROFESSOR JÚLIO MARQUETI www.pontodosconcursos.com.br 1 AULA: 2 3.10 – DA TIPICIDADE NOS CRIMES CULPOSOS. Como já sabemos, para haver tipicidade, necessário que o fato concreto se amolde ao tipo penal. Primeiro falaremos da conduta culposa (fato concreto) e, posteriormente, trataremos do fato abstrato, isto é, do tipo penal. Ressalto, desde já, que ao tratar dos crimes culposos o legislador se vale de técnica peculiar. Ele não descreve com precisão a conduta culposa. Enfaticamente afirma o legislador que haverá crime culposo quando ao agente der causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia 1 . No entanto, não define, casuística e precisamente, o que é uma conduta culposa. Diz-se, daí, que é necessário um juízo de valor para se saber ter ocorrido imprudência, imperícia ou negligência por parte do agente. O que faz do tipo penal que admite a modalidade culposa, um tipo penal aberto 2 . Assim, trataremos primeiramente da conduta concreta (acontecimento social) e, posteriormente, do tipo penal (fato abstrato), isto é, da norma penal. 3.10.1 – DA CONDUTA CULPOSA . No crime culposo, o que indicará a existência ou não da culpa é a falta de cuidado com que age o sujeito ativo do crime. Para, entretanto, sabermos se houve ou não falta de cuidado, devemos estabelecer um paradigma. 1 Art. 18 - Diz-se o crime: Crime culposo II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. 2 Tipo penal aberto é aquele que para sua compreensão depende de um juízo interpretativo, sem o qual não seria possível afirmar que o fato concreto se amolda à norma descrita no tipo.

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AULA: 2

3.10 – DA TIPICIDADE NOS CRIMES CULPOSOS.

Como já sabemos, para haver tipicidade, necessário que o fato concreto se amolde ao tipo penal. Primeiro falaremos da conduta culposa (fato concreto) e, posteriormente, trataremos do fato abstrato, isto é, do tipo penal.

Ressalto, desde já, que ao tratar dos crimes culposos o legislador se vale de técnica peculiar. Ele não descreve com precisão a conduta culposa. Enfaticamente afirma o legislador que haverá crime culposo quando ao agente der causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia1. No entanto, não define, casuística e precisamente, o que é uma conduta culposa.

Diz-se, daí, que é necessário um juízo de valor para se saber ter ocorrido imprudência, imperícia ou negligência por parte do agente. O que faz do tipo penal que admite a modalidade culposa, um tipo penal aberto2.

Assim, trataremos primeiramente da conduta concreta (acontecimento social) e, posteriormente, do tipo penal (fato abstrato), isto é, da norma penal.

3.10.1 – DA CONDUTA CULPOSA.

No crime culposo, o que indicará a existência ou não da culpa é a falta de cuidado com que age o sujeito ativo do crime. Para, entretanto, sabermos se houve ou não falta de cuidado, devemos estabelecer um paradigma.

1 Art. 18 - Diz-se o crime: Crime culposo II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. 2 Tipo penal aberto é aquele que para sua compreensão depende de um juízo interpretativo, sem o qual não seria possível afirmar que o fato concreto se amolda à norma descrita no tipo.

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Quando tratamos, linhas atrás, da conduta, falamos que, pela teoria finalista da ação, toda conduta só é considerada conduta relevante para o direito penal quando dirigida a um fim. No crime culposo a conduta do agente é dirigida a uma finalidade lícita. Mas, por falta de cuidado, ele dá causa a um resultado danoso não querido.

É o que ocorre com o motorista de um veículo que pretende ultrapassar uma via preferencial e, por falta de cautela – imprudência -, dá causa a um acidente de trânsito, levando outrem à morte.

Nota-se que sua conduta era dirigida a um fim lícito: ultrapassar a via preferencial. No entanto, por falta de cuidado, ocorreu resultado diverso do pretendido: acidente de trânsito.

Há, observe você, uma contradição entre o querido e o efetivamente ocorrido. Aqui está a pilastra do crime culposo, isto é, uma conduta dolosa inicial, dirigida, é certo, a um fim lícito, e um resultado não querido pelo agente.

O resultado só será imputado ao agente quando, nas circunstâncias em que se encontrava, fosse possível exigir um atuar diligente, cuidadoso. Se, eventualmente, o resultado era imprevisível, não poderemos imputá-lo ao agente.

Só será dele exigida uma conduta que, nas mesmas condições, exigir-se-ia de um homem comum, mediano. Aqui, o paradigma.

Observar-se-á, então, no caso concreto, qual seria a conduta do homem mediano, comum. Fazendo mentalmente a substituição dos protagonistas, chegaremos à conclusão de que agiu ou não o agente sem a cautela necessária.

Haverá conduta culposa quando o agente não tomou os cuidados necessários. E necessários são os cuidados que se exige de qualquer um. Portanto, o dever jurídico de cuidado é imposto a todos nós.

A falta de cuidado, que se manifesta através da imprudência, negligência e imperícia, faz com que o agente não preveja o resultado danoso, apesar de previsível.

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A previsibilidade objetiva, isto é, a possibilidade de qualquer prever o resultado, existiu. Houve, também, a previsibilidade subjetiva, isto é, a possibilidade de o agente, nas condições em que ele se achava, prever o resultado danoso, também existiu. Apesar de previsível, não houve previsão por falta de cuidado. Não prevendo o previsível, deu causa ao resultado danoso, isto é, agiu culposamente.

O crime culposo ocorrerá, então, quando o agente não prevê o previsível (imprevisão do previsível) e, com isso, dá causa a um resultado danoso, não querido.

ATENÇÃO:

Ausência de previsibilidade objetiva: Se a qualquer homem, até o mais diligente, não era possível prever o resultado, a conduta é atípica, já que o resultado era imprevisível. Diante do imprevisível não há como se exigir comportamento cuidadoso. Há exclusão da tipicidade.

Ausência de previsibilidade subjetiva: Se ao agente não era possível prever, diante de suas condições pessoais, o resultado danoso. Não há exclusão da tipicidade, pois, não previu o previsível. Mas, ausente a culpabilidade (reprovabilidade da conduta), já que dele não era exigido outro comportamento. O fato é típico, mas não culpável. Há crime, mas não haverá aplicação de pena.

Crime culposo:

Conduta + previsibilidade objetiva + imprevisão.

Crime culposo culpável:

Conduta + previsibilidade objetiva + previsibilidade subjetiva + imprevisão.

A conduta culposa, segundo o legislador, se manifesta através da imprudência, imperícia ou negligência. De cada uma das modalidades, discorrerei no tópico seguinte, quando irei tratar da previsão legal do crime culposo.

Síntese conceitual: O crime culposo ocorrerá quando o agente não prevê o previsível. Portanto, quando estivermos diante da imprevisão do previsível.

Por ora, cuidamos da denominada culpa inconsciente, isto é, daquela em que o agente não antevê o resultado danoso, pois ela (culpa inconsciente) pressupõe a ausência de previsão, em que pese previsível o resultado danoso.

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Da culpa consciente nos ocuparemos mais adiante, em tópico isolado, tendo em conta sua peculiaridade. Mas, desde já ressalto que nela (culpa consciente) há pelo agente previsão do resultado danoso, o qual por ele não é aceito. É muito próxima do dolo eventual (item 3.2.1.3).

3.10.2. – PREVISÃO LEGAL DOS CRIMES CULPOSOS.

Já falamos que de regra os crimes são dolosos. Quando ao legislador interessa responsabilizar aquele que age culposamente, expressamente o faz. Assim, no silêncio do legislador, o crime somente é admitido na modalidade dolosa. É o que se extrai do parágrafo único do artigo 18 do CP3.

Observe os crimes de furto e de homicídio. No crime de furto, o legislador só o admite na modalidade dolosa. Já no homicídio, admite-se, além da dolosa, a modalidade culposa.

Quando prevê a possibilidade de responsabilizar-se o agente também a título de culpa, o legislador se vale de técnica peculiar. Ele não descreve a conduta que considera culposa. Somente diz que, se o crime é culposo, a pena será de tanto a tanto.

Observe abaixo a previsão legal do crime de homicídio culposo. O mesmo ocorre com a lesão corporal culposa.4

Homicídio culposo § 3º Se o homicídio é culposo:

3 Crime culposo Art. 18 - Diz-se o crime : II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente. 4 Lesão corporal culposa § 6° Se a lesão é culposa: Pena - detenção, de dois meses a um ano.

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Pena - detenção, de um a três anos.

O legislador não descreve a conduta culposa, como o faz casuisticamente com as condutas dolosas. Não descreve a conduta culposa, mas, no artigo 18, II, do CP, conceitua o que considera como crime culposo. Para ele considera-se culposo o crime quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.

Art. 18 - Diz-se o crime: Crime culposo II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia. Parágrafo único - Salvo os casos expressos em lei, ninguém pode ser punido por fato previsto como crime, senão quando o pratica dolosamente.

Para sabermos então se a conduta constitui um crime culposo, primeiramente devemos observar o tipo penal incriminador, oportunidade em que vamos notar se é ou não admitida a modalidade culposa. Posteriormente, analisaremos a conduta do agente em concreto para saber se realmente incorreu em imprudência, negligência ou imperícia.

Imaginemos alguém que por falta de cuidado pretendendo levar a sua bolsa, tenha levado a bolsa alheia. No caso, houve subtração de coisa alheia móvel para si. Fato que se ajusta ao tipo penal do furto5. Observamos que a conduta não foi dolosa, pois por falta de cuidado levou a bolsa alheia.

No entanto, não houve crime de furto, pois o legislador não admite furto na modalidade culposa. Assim, já no primeiro momento notamos que a lei não admite a modalidade culposa. Portanto, a conduta é atípica.

Agora, observe a situação daquele que por descuido, imprudência, tenha ingressado indevidamente na via preferencial e, com seu veículo automotor, tenha causado um acidente de trânsito do qual decorreu a morte de outrem. No

5 Furto Art. 155 - Subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel: Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa.

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caso, o legislador admite crime de homicídio culposo (artigo 121, parágrafo 3º, do CP). Assim, notamos ser possível o crime culposo, já que a lei admite a modalidade culposa.

Necessário, agora, perquirirmos (analisarmos) a conduta do agente para sabermos se realmente agiu culposamente, para só então termos como certa a tipicidade da conduta.

Já sabemos que o legislador admite a modalidade culposa. Devemos observar se a conduta foi culposa ou não. Conduta culposa é aquela em que o agente causa um resultado não querido por falta de cuidado. A falta de cuidado se manifesta através da imprudência, negligência ou imperícia. Estas são as conhecidas modalidades de culpa (item 3.10.3).

Se o agente agiu com falta de cuidado e o tipo penal admite a modalidade culposa, responderá ele, desde que tenha dado causa a um resultado danoso, já que o crime culposo é necessariamente material, por crime culposo.

Observe o caso do bebê que engatinha ao lado da piscina. No caso houve negligência, descumprimento do dever de cuidado, por parte de quem estava obrigado a zelar pelo bebê. Mas, apesar da negligência, não ocorrerá o crime culposo se o bebê passar incólume pela piscina e seguir engatinhando até a sala de estar, por exemplo.

Não ocorreu o resultado necessário para que viéssemos ater um crime culposo. Se eventualmente ocorresse a morte, estar-se-ia diante de crime de homicídio culposo. Já se viesse a ocorrer a lesão corporal, o crime seria de lesão corporal culposa.

O crime culposo é inexoravelmente material, ou seja, é daqueles em que o legislador descreve a conduta, de forma peculiar é certo, e o resultado, sendo este absolutamente necessário para que o crime se consume.

3.10.3 – MODALIDADES DE CULPA.

De acordo com o que dispõe o artigo 18, II, do CP, a culpa se manifesta através da imprudência, negligência ou imperícia. É o que a doutrina denomina modalidades da culpa.

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Imprudência é um agir de forma abrupta, sem cuidado. Trata-se de uma conduta positiva arriscada ou perigosa. Exemplo: Dirigir em alta velocidade em via molhada ou esburacada.

Negligência é o deixar de fazer por falta de cuidado. Aqui, há uma inatividade, uma inércia, ou seja, é uma conduta omissiva. Exemplo: Deixar remédio ou instrumento perigoso ao alcance de criança. Deixar criança sozinha próxima à piscina.

Imperícia é a falta de aptidão para o exercício de profissão, arte ou ofício. É a imprudência no exercício de arte ou ofício. Exemplo: acidente de trânsito causado por motorista profissional.

A distinção entre a imprudência e a negligência é evidente. Na imprudência temos um agir (fazer). Já na negligência a inércia (não fazer) decorre da falta de cuidado. No que tange, todavia, à imperícia devemos observar que a conduta guarda relação com o exercício profissional, artístico ou de ofício. Há, na realidade, uma ausência de aptidão para a atividade. Normalmente, a imperícia é um agir (conduta positiva) sem cuidado no exercício de atividade que exige conhecimento técnico.

3.10.4 – CLASSIFICAÇÃO DOUTRINARIA DE CULPA.

Agora, vamos tratar da classificação da culpa, observando a opinião consensual da doutrina. Não nos caba aqui entrar em discussão doutrinária ou jurisprudencial a respeito do tema. Nosso objetivo é somente expositivo.

Culpa inconsciente: É a culpa por excelência, ou seja, é a culpa típica, onde não há previsão do previsível.

Culpa consciente: É uma espécie de culpa, onde o agente antevê o resultado danoso possível, mas não aceita sinceramente que ele ocorra. Aqui, estamos falando de uma culpa onde há a previsão do resultado.

Culpa imprópria: Há um erro acerca dos elementos constitutivos do tipo penal. O agente, por descuido, incide em erro e, com isso, causa um resultado desejado. Só que sua vontade vem maculada por um equivoco, um erro. É o que ocorre com o caçador que, acreditando estar diante de um animal, dispara sua arma de fogo e alveja seu companheiro de caça. Outro exemplo: A, acreditando estar diante de uma situação de legítima defesa, dispara contra B que, ao colocar a

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mão no bolso, pretendia pegar uma caneta esferográfica e não sacar uma arma. Se o erro é inescusável, isto é, superável ou vencível, tendo o agente deixado de tomar as cautelas necessárias, responderá por crime culposo. Assim, a culpa imprópria decorre de erro de tipo essencial inescusável.

3.10.4 – DA TENTATIVA E DA PARTICIPAÇÃO NOS CRIMES CULPOSOS.

Enveredaremos, agora, por campo tempestuoso. Não há consenso na doutrina acerta dos temas que vamos tratar. Mas, não nos interessa entrar em discussão sobre tais temas. Aqui, mais uma vez nosso objetivo é expositivo.

3.10.4.1 – Da tentativa no crime culposo.

Os crimes culposos são crimes materiais. Questão interessante é saber se eles admitem a tentativa. Creio eu que a tentativa não condiz com crime culposo. Há tentativa quando o agente inicia a execução de um crime, mas não consegue consumá-lo por circunstâncias alheias à sua vontade.

Como no crime culposo a vontade do agente não é dirigida ao resultado que, por falta de cuidado, deu causa, não vejo como possível tentar-se o que não se quer.

Até agora tranqüilo, mas o tema fica intrincado quando passamos a tratar das espécies de culpa onde a previsão do resultado existe. É o caso da culpa consciente e da culpa imprópria.

Vejamos cada uma delas. Na culpa consciente o agente antevê o resultado, mas não o aceita como possível. Como não aceita o resultado, não o busca, não o quer. Assim, não é possível responsabilizá-lo por crime tentado, quando o resultado não querido não se efetiva. Exemplo: O atirador de elite que se coloca em posição para, em legítima defesa de outrem, matar o bandido que com uma arma ameaça a vítima que esta subjugada a sua vontade. Dispara, mas acerta a vítima. No caso houve homicídio culposo (culpa consciente). Mas, se ele não acerta a vítima, responde por crime de homicídio culposo tentado. É certo que não. A tentativa não é possível na culpa consciente, apesar da antevisão do resultado.

Já na culpa imprópria, alguns doutrinadores admitem, em tese, a tentativa. É o caso daquele que acreditando estar em legitima defesa, dispara contra seu desafeto acreditando que este iria sacar uma arma, quando na realidade estava retirando do bolso o maço de cigarros. Houve, no caso, erro de tipo. Se inescusável, o agente responderá a título de culpa (culpa imprópria). Pensemos que o agente tenha errado os disparos, responderá ele por crime tentado na

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modalidade culposa. Assim, na culpa imprópria, em tese, é possível a tentativa. Ressalto que a conduta do agente é dolosa, dirigida a um fim, que é causar a morte ou lesão corporal. Todavia, a responsabilidade é a título de culpa.

3.10.4.2 – Da participação no crime culposo.

Para lembrarmos, quando falamos do concurso de agentes, dissemos que:

1- autor é aquele que realiza o núcleo do tipo penal, o verbo inserto no tipo penal.

2- Co-autor é aquele que executa, juntamente com o autor, aderindo a seu querer, o verbo do tipo penal (autoria em conjunto).

3- Partícipe, por sua vez, é aquele que colabora para o ilícito, sem, todavia, realizar a conduta descrita no tipo penal.

No crime culposo é possível a autoria colateral, isto é, vários autores sem adesão de um à vontade do outro. É o que ocorre quando vários motoristas provocam acidente de trânsito, sendo que todos atuaram de forma incauta, sem cautela. Mas, não é isso que nos interessa. Aqui, nos interessa saber se é possível a participação no crime culposo.

Partícipe é aquele que colabora para o ilícito. Se o crime culposo pressupõe resultado não querido é possível colaborar para sua efetivação, PERGUNTO. Acredito que sim. Mas, a colaboração não levará à participação, mas sim à co-autoria.

Observe o caso do motorista que instado por seu acompanhante a imprimir velocidade excessiva em seu veículo. O motorista está agindo com falta de cautela e o seu acompanhante também, pois está instigando seu companheiro a ultrapassar o limite de velocidade. Ambos aqui incorreram em crime culposo, caso de suas condutas decorra resultado danoso. Mas ambos são autores, pois incorreram em imprudência.

Assim, no crime culposo, não se a participação. Quando estivermos diante de conduta que denote participação em crime culposo, estaremos falando de co-autoria.

No crime culposo admite-se co-autoria, mas não participação.

3.11 – ANTIJURIDICIDADE (OU ILICITUDE).

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Agora vamos tratar do último elemento conceitual de crime. Dispensaremos atenção então à antijuridicidade, ou seja, à ilicitude da conduta. Para que tenhamos crime, adotada a teoria finalista da ação, devemos ter um fato típico, doloso ou culposo, além de antijurídico ou ilícito.

Antijuridicidade (ou ilicitude) é contrariedade da conduta frente ao ordenamento jurídico. Em algumas oportunidades, apesar de constituir fato típico, a conduta não é antijurídica, pois agasalhada, acobertada pelo ordenamento jurídico. Ela é jurídica e não antijurídica. É o que ocorre quando alguém em legítima defesa mata outrem. O fato é típico, mas não é antijurídico.

A tipicidade do fato dá a ele, “prima facie”, conotação de antijurídico, isto é, de ilícito. A ilicitude ou antijuridicidade será excluída quando, apesar de típico, o fato estiver acobertado por uma causa de justificação.

Assim, ocorre quando estiverem presentes as excludentes da ilicitude ou descriminantes. Tais hipóteses de exclusão da ilicitude estão arroladas na Parte Geral do Código Penal, oportunidade em que serão aplicadas a todos os crimes, na Parte Especial do Código Penal, quando, então, só incidirão em relação a crimes específicos e também em leis esparsas.

A nós, todavia, interessa somente as hipóteses mencionadas na parte geral do Código Penal. Portanto, trataremos de forma sucinta da legítima defesa, do estado de necessidade, do exercício regular de direito e do estrito cumprimento do dever legal.

3.11.1 – DESCRIMINANTES DA PARTE GERAL DO CÓDIGO PENAL.

O Código Penal, em sua parte geral, precisamente no seu artigo 23, cuja literalidade segue, arrola as hipóteses de exclusão da ilicitude.

Exclusão de ilicitude Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: I - em estado de necessidade; II - em legítima defesa; III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito. Excesso punível Parágrafo único - O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

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Trataremos de forma sintética de cada uma das causas de exclusão. O agente para que seja beneficiado por uma das excludentes deve agir do modo em que a lei prevê.

A conduta do agente deve se ajustar ao modelo descrito na norma penal permissiva para que ocorra a excludente da ilicitude. Além de tipicidade formal deve também haver o “animus” (vontade) de agir de acordo com a lei. Portanto, deve o agente saber que está agindo, por exemplo, em estado de necessidade.

Observe o estado de necessidade. A lei descreve o que considera estado de necessidade. Assim, só ocorrerá a excludente se agente agiu de acordo com a lei e com vontade de fazê-lo.

Estado de necessidade Art. 24 - Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar de perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, nas circunstâncias, não era razoável exigir-se. § 1º - Não pode alegar estado de necessidade quem tinha o dever legal de enfrentar o perigo. § 2º - Embora seja razoável exigir-se o sacrifício do direito ameaçado, a pena poderá ser reduzida de um a dois terços.

No caso da legítima defesa, assim também ocorre. Assim, para que ocorra a legítima defesa necessário que o agente atue de acordo e com vontade de fazê-lo de acordo com o que dispõe a lei.

A legítima defesa está prevista no artigo 25 do CP, cuja literalidade segue.

Legítima defesa Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.

Só ocorrerá a legítima defesa quando o agente souber da injusta agressão. Caso não o saiba, não será beneficiado.

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Observe, por exemplo, a situação daquele que pretendendo matar seu desafeto, encontrá-o e desfere vários tiros, oportunidade em que já morto, descobre-se que ele portava uma arma e iria matá-lo.

Como não sabia estar em legitima defesa, não será beneficiado, apesar de se ajustar sua conduta ao tipo penal que a prevê.

O exercício regular de direito e o estrito cumprimento de dever legal não possuem descrição precisa no Código Penal. O legislador somente os arrola como hipóteses de exclusão de ilicitude. A doutrina, entretanto, define cada uma delas.

Assim, enquanto os conceitos de legitima defesa e estado de necessidade eu encontro na Parte Geral do Código Penal. O estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de direito encontrarei na doutrina o seu conceito.

Guilherme de Souza Nucci, define em seu Manual de Direito Penal, Editora RT, o estrito cumprimento de dever legal e o exercício regular de direito. Para ele, estrito cumprimento dever legal, é, em síntese, a ação praticada em cumprimento a um dever imposto por lei e, por sua vez, exercício regular de direito, é o desempenho de uma atividade ou a prática de uma conduta autorizada por lei.

Arrola, referido autor, como exemplos de estrito cumprimento do dever legal: 1- a execução de pena de morte feita pelo carrasco, quando o sistema jurídico o admite; 2 - a morte do inimigo no campo de batalha, quando em guerra.

Já como exemplos de exercício regular de direito, traz à colação as seguintes hipóteses: 1- tratamento médico ou intervenção cirúrgica quando admitida em lei; 2- a coação para impedir suicídio (artigo 146, parágrafo 3º, II, do CP).

Observe que, ocorrendo qualquer das causas de exclusão da antijuridicidade (ou ilicitude), não há crime, já que para existir crime necessário que, além de fato típico, tenhamos a antijuridicidade.

Terminada a análise dos elementos constitutivos do crime, devemos dispensar atenção a alguns tópicos isolados, mas que exigem conhecimento da matéria já exposta. Falaremos do erro de tipo, do erro de proibição, descriminantes putativas e do crime preterdoloso ou preterintencional.

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3.12 – DO ERRO DE TIPO.

O erro de tipo vem tratado pelo legislador no artigo 20 do CP. O dispositivo legal nos traz seu conceito e sua conseqüência legal. No entanto, o legislador não distingue o erro evitável(inescusável) do inevitável (escusável). Então, traremos, imediatamente abaixo, a letra da lei e discorreremos a respeito do tema.

Erro sobre elementos do tipo Art. 20 - O erro sobre elemento constitutivo do tipo legal de crime exclui o dolo, mas permite a punição por crime culposo, se previsto em lei6.

Quando se fala de erro sobre os elementos constitutivos do tipo penal, está se falando de erro essencial, ou seja, erro que incide sobre as elementares do tipo penal.

Elementar é o elemento sem o qual o crime não existe. Observe mais uma vez o crime de furto. A expressão “coisa alheia” é elementar do crime, pois se não houver a subtração da coisa alheia, mas sim de coisa própria, não há que se falar em crime de furto.

Aqui, devemos observar os elementos do tipo penal. Portanto, devemos observar a letra da lei, para, dela, extrairmos suas elementares. Como “coisa alheia” é elementar do crime de furto, quando pretendendo levar a coisa própria o agente leva a coisa alheia, incorreu em erro de tipo.

6 PROCURADOR DO BACEN – 2002 – ESAF. 83- Um caçador, no meio da mata, dispara sua arma de fogo sobre um objeto escuro, supondo tratar-se de um animal, e atinge um fazendeiro. Nesta hipótese, restou configurado: a) erro sobre a pessoa. b) erro de proibição. c) erro provocado por terceiro. d) erro de tipo. e) aberratio ictus. Gabarito oficial: D

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No erro de tipo a elementar do tipo se apresentar ao agente de forma divorciada da realizada. No exemplo dado não era pretensão do agente levar a coisa alheia, mas sim a coisa própria. No caso, diante do erro de tipo, há a exclusão do DOLO.

Se o erro for, apesar de essencial (pois incide em elementar), evitável, será ele inescusável, e, com isso, exclui-se o DOLO, mas o agente responde a título de CULPA. Portanto, no erro de tipo evitável, exclui-se o DOLO, mas não se exclui a CULPA.

No caso do furto, se o erro é evitável ou inevitável, a conseqüência é a mesma, já que não se admite o crime de furto culposo. Assim, a simples exclusão do dolo, faz da conduta ser atípica.

No homicídio, por sua vez, o erro de tipo essencial evitável (inescusável), exclui o dolo, mas não exclui a CULPA, sendo certo que o agente responderá por crime de homicídio culposo, já que a modalidade culposa de homicídio existe.

Quando o agente incorre em erro de tipo essencial evitável (ou inescusável) e o crime for daqueles em que se admite a responsabilidade a título de culpa, estamos falando da CULPA IMPROPRIA. Assim, culpa imprópria é aquela que decorre de erro de tipo vencível, superável, inescusável (item 3.10.4).

A matéria constantemente é objeto de questionamento nos concursos públicos. Portanto, muita atenção (observe a questão da nota de rodapé numero 6).

SINTESE CONCEITUAL.

1- Erro de tipo: é o erro que ocorre frente aos elementos constitutivos do tipo penal. Será essencial quando incidir em suas elementares e acidental quando incidir em suas circunstâncias.

2- Evitável é aquele que poderia ser evitado pelo agente caso ele tivesse sido diligente, cuidadoso. Exclui o dolo, mas permite responsabilização a titulo de culpa, se o crime é daqueles que admite a modalidade culposa.

3- Inevitável é aquele que, por mais diligente que fosse o agente, incidiria no erro. Exclui o dolo e a culpa. A conduta então é atípica.

4- Culpa imprópria é aquela que advém do erro de tipo essencial vencível, superável, evitável, inescusável.

3.12.1 – ERRO QUANTO A PESSOA.

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Quando o erro recai sobre a pessoa, objeto material do ilícito, ele não leva à exclusão do dolo ou da culpa. Observe que o agente não errou sobre os elementos constitutivos do tipo penal. Há, aqui, na realidade um erro acidental. Se acidental, não gera a atipicidade da conduta. Também não gera a isenção de pena.

Dê atenção à redação do dispositivo legal (artigo 20, parágrafo 3º, do CP), cuja literalidade segue abaixo.

Erro sobre a pessoa § 3º - O erro quanto à pessoa contra a qual o crime é praticado não isenta de pena. Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime.

Recordemos o conceito de objeto material do crime. Objeto material do crime é a coisa ou a pessoa sobre a qual recai a conduta do agente. Não se confunde com objeto jurídico (ou bem jurídico) protegido pela norma.

No crime de homicídio, o bem jurídico protegido pela norma é a vida. Já o objeto material é o homem (ser humano) sobre o qual recai a conduta delituosa. Nos crimes contra o patrimônio (exemplo: furto), o objeto jurídico protegido é o patrimônio e o objeto material pode ser, por exemplo, um relógio, a carteira, o dinheiro etc...

No erro quanto à pessoa, o agente não se equivoca sobre o bem juridicamente protegido. Na realidade ele sabe que pratica crime contra a pessoa, seja homicídio ou lesão corporal.

Equivoca-se, entretanto, quanto à pessoa sobre a qual recai o crime. O erro, então, ocorre frente o objeto material do delito. É o caso de A pretendendo matar B, seu pai, dispara contra C, seu irmão, que traja roupa de seu pai. Ocorreu aqui erro sobre a pessoa (objeto material do crime) e não sobre o bem jurídico protegido pela norma: a vida.

O erro é acidental. Assim, não tem as mesmas conseqüências do erro de tipo. O agente, no caso em tela, responderá como se tivesse efetivamente alvejado o seu pai. É o que preceitua o artigo 20, parágrafo 3º, “in fine”, do CP, quando diz que: “...Não se consideram, neste caso, as condições ou qualidades da vítima, senão as da pessoa contra quem o agente queria praticar o crime...”.

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Aqui, então, despreza-se a qualidade da vítima efetiva, para ter-se como praticado o crime contra a pretensa vítima. No exemplo dado é como se tivesse matado o seu pai e não o seu irmão.

SINTESE CONCEITUAL:

Erro sobre a pessoa: há erro no que tange ao objeto material (pessoa) sobre a qual recai a conduta delituosa.

Conseqüência jurídica: não há exclusão do dolo ou da culpa e nem mesmo isenção de pena, já que o erro foi acidental. O agente responderá como se tivesse praticado o crime contra a pretensa vítima, desprezando-se, assim, as condições ou qualidades da vitima efetiva.

Quadro sinótico:

Dolo.

Inevitável = exclui

Culpa.

Essencial

Erro de tipo Evitável = exclui DOLO.

(Artigo 20 CP)

Acidental Não exclui a Culpa.

Responde por crime culposo.

Não há exclusão do dolo ou da culpa.

(ex: erro quanto a pessoa – art.20, p.3º, CP).

3.13 – DO ERRO DE PROIBIÇÃO.

O erro de proibição é tratado, sob a rubrica de “erro sobre a ilicitude do fato”, no artigo 21 do CP, cuja literalidade segue abaixo.

Erro sobre a ilicitude do fato

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Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço. Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

Trataremos do erro de proibição de forma sintética. Quando, todavia, formos tratar dos elementos da culpabilidade, dispensaremos maior atenção ao tema.

Como do próprio texto legal se extrai, o erro de proibição (ou erro sobre a ilicitude do fato) não se confunde com o desconhecimento da lei. Este é inescusável. É pressuposto inarredável que todos conhecem a lei. Assim, a simples alegação de desconhecimento da lei, não escusa o indivíduo de sua responsabilidade penal.

O erro de proibição não é o desconhecimento da lei. Aqui, quando se fala em erro de proibição, está se falando de erro acerca do lícito ou ilícito, do justo ou do injusto, do certo ou do errado. É um juízo profano acerca do injusto. Não poucas vezes o indivíduo, apesar de desconhecer a lei, sabe que a conduta é errada, injusta, ilícita.

Então, trataremos do juízo profano sobre o certo ou errado, justo ou injusto. Aqui está a ilicitude. Quando acredito lícita determinada conduta que é, na realidade ilícita, houve erro de proibição ou erro sobre a ilicitude do fato.

Erro de proibição ou erro sobre a ilicitude do fato é o erro que incide sobre a norma de proibição que emana da lei penal. O agente acredita ser lícita conduta que a rigor é ilícita.

Observe o caso daquele que planta no quintal de sua casa “cannabis sativa L” (maconha), acreditando que o entorpecente pode ser utilizado para fins medicinais. Sabe que é substância entorpecente. Mas acredita que é lícito utilizá-la para fins medicinais.

No caso não houve erro de tipo, pois os elementos constitutivos do tipo, especialmente, a elementar entorpecente, se apresentam ao agente de forma inequívoca. Ele, todavia, se equivoca sobre a ilicitude do fato. Estamos diante do erro de proibição ou erro sobre a ilicitude do fato e não do erro de tipo.

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De acordo com o legislador quando o erro é inevitável (escusável, invencível), há isenção de pena. Todavia, quando o erro é evitável (inescusável, vencível), ocorrerá diminuição da pena.

No parágrafo único do artigo 21 do CP, o legislador define o que entende por erro evitável. Para ele, será evitável quando o agente atua sem consciência da ilicitude, quando, pelas circunstâncias, lhe era possível tê-la.

Atenção: O erro de proibição não gera conseqüência sobre a conduta, pois, diferentemente do erro de tipo, não exclui o dolo ou a culpa. Ele, erro de proibição, atua sobre a culpabilidade (item 3.16). Terá, então, reflexo sobre a aplicação da pena. Se invencível, exclui a culpabilidade, o que leva à isenção de pena. Caso, entretanto, vencível, a culpabilidade é reduzida, oportunidade em que a pena será diminuída.

Síntese conceitual:

1- Erro de proibição (erro sobre a ilicitude do fato) é o erro que incide sobre o justo ou justo, certo ou errado. Não se confunde com o desconhecimento da lei.

2- Evitável (vencível, superável, inescusável) é o erro que poderia ter sido evitado, já que o agente poderia, diante das circunstância, ter consciência da ilicitude do fato.

3- Inevitável (invencível, insuperável, escusável) é o erro que, nas circunstancias em que o agente se encontrava, não poderia ser evitado. Portanto, não tinha ele condição de possuir consciência da ilicitude, mesmo que pretendesse tê-la.

Quadro Sinótico:

Vencível (superável, inescusável) = diminui a pena.

Erro de proibição Reduzida a culpabilidade.

(Art.21 do CP)

Invencível (insuperável, escusável) = isenta de pena.

Exclui a culpabilidade.

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Observe a questão que segue. Note você que a resposta correta será facilmente obtida por exclusão. Todavia, não podemos deixar de lado que a resposta data como correta é passível de crítica. No âmbito da questão, entretanto, não há dúvida que, por exclusão, é a única que satisfaz.

AUDITOR DO TRABALHO (FISCAL DO TRABALHO) ESAF – 2003 – Prova 2 27- No tocante ao erro quanto à ilicitude do fato, pode se afirmar que: a) quando for evitável não se permite a redução da pena. b) é considerado evitável o erro se o agente atua ou se omite com a consciência da ilicitude do fato. c) o engano recai sobre elemento do tipo penal e exclui o dolo. d) diz respeito às causas de exclusão da ilicitude. e) é também conhecido como erro de proibição, sendo o desconhecimento da lei escusável. Resolução: Não podemos nos esquecer que o erro sobre a ilicitude também é conhecido como erro de proibição. A dúvida que paira e saber se o erro sobre a ilicitude do fato exclui da ilicitude ou se exclui a culpabilidade. Aqui, todavia, a dúvida é resolvida pela própria questão. Comentemos cada uma das alternativas. A alternativa A está incorreta, já que o erro quanto a ilicitude do fato, quando evitável, a própria lei determina que seja reduzida a pena. A alternativa B não tem melhor sorte, já que a lei quando define o erro evitável, diz que será considerado evitável o erro quando o agente atua sem consciência da ilicitude do fato. Assim, incorreta a alternativa B. A alternativa C trata de hipótese de erro de tipo e não de erro de proibição, pois afirma que o erro incide sobre elemento do tipo penal, excluído o dolo. Incorreta, portanto, a alternativa C. A alternativa E, por sua vez, vem a afirmar que o erro sobre a ilicitude do fato é também conhecido como erro de proibição. Até aqui perfeitamente correta. Mas a alternativa está incorreta, pois no seu final, afirma que o erro de proibição, também conhecido como erro sobre a ilicitude do fato, é a mesma coisa que desconhecimento da lei. O desconhecimento da lei não se confunde com erro de proibição ou erro sobre a ilicitude do fato. Assim, incorreta a alternativa E. A alternativa D está correta. Mas ela não exaure todas as possibilidades de erro de proibição. O erro pode incidir sobre as descriminantes (vide item 3.11.1), oportunidade em que está tratando das hipóteses de exclusão da ilicitude. Erro sobre a ilicitude do fato há também em hipóteses que não seja de descriminantes, oportunidade em que não tratará de exclusão de ilicitude.

Gabarito oficial: D.

Erro sobre a ilicitude do fato Art. 21 - O desconhecimento da lei é inescusável. O erro sobre a ilicitude do fato, se inevitável, isenta de pena; se evitável, poderá diminuí-la de um sexto a um terço.

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Parágrafo único - Considera-se evitável o erro se o agente atua ou se omite sem a consciência da ilicitude do fato, quando lhe era possível, nas circunstâncias, ter ou atingir essa consciência.

3.14 – DESCRIMINANTES PUTATIVAS.

O legislador trata das descriminantes putativas no artigo 20, parágrafo 1º do CP. Observe você que as descriminantes putativas estão previstas no dispositivo que trata do erro de tipo.

Entretanto, é equívoco pensar que elas só existem quando houver erro de tipo. Aqui, não nos cabe entrar nessa discussão doutrinária. Nosso objetivo é de forma clara estabelecer o conceito e conseqüência que decorre das descriminantes putativas.

Antes, todavia, de tratarmos das conseqüências e da natureza do erro que lhes deram causa, devemos conceituá-las. O próprio legislador conceitua descriminante putativa. Imediatamente abaixo, segue sua previsão legal.

Descriminantes putativas § 1º - É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo.

Ocorrem as descriminantes putativas quando o agente, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, acredita estar, por exemplo, em legitima defesa, quando, na realidade não está.

Observe o caso de Joaquim, desafeto de João, que fora no dia anterior por este ameaçado de morte. Diante de tal ameaça Joaquim passa a portar arma de fogo. Estando armado, encontra João que, incontinenti, leva a mão ao bolso. Joaquim, com isso, saca de seu revolver e mata João, pois acreditava que este iria sacar igual instrumento para matá-lo. Morto João, descobre-se que ele iria pegar um maço de cigarros em seu bolso.

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No caso, Joaquim acreditou que estivesse diante de uma situação de legítima defesa. Houve erro de tipo incidente sobre a elementar “agressão injusta” exigida para que tivéssemos a excludente da ilicitude.

Tal erro leva à isenção de pena, caso inevitável. No entanto, se evitável, o agente responde a título de culpa, caso se admita a modalidade culposa.

Não nos interessa aqui perquirir se o erro foi de proibição ou erro de tipo. Apesar da imperfeição da redação legislativa. A nós interessa somente saber que, havendo descriminante putativa, haverá isenção de pena se o erro foi inevitável e, caso evitável, admitir-se-á a responsabilidade a titulo de culpa.

Quadro Sinótico:

Erro evitável = exclui dolo, mas admite culpa.

Descriminantes

Putativas.

Erro inevitável = isenta de pena.

Síntese conceitual:

Descriminantes putativas: Descriminantes são as hipóteses de exclusão da ilicitude ou da antijuridicidade. Putatividade significa algo imaginário ou que se apresenta como verdadeiro. Normalmente decorre de engano, equívoco, erro. Assim, descriminante putativa ocorrerá quando por engano o agente acredita estar acobertado por uma excludente da ilicitude, quando na realidade não está.

Erro: há erro quando o agente, diante das circunstâncias, agredida em algo que não existe.

Erro evitável: é aquele que poderia ser evitado, caso houve uma maior diligência. Exclui dolo, mas admite responsabilização a título de culpa.

Erro inevitável: é aquele que, por mais diligente que seja o agente, não tem ele condição de superar o equívoco. Isenta de pena.

3.15 – CRIME PRETERDOLOSO OU PRETERINTENCIONAL.

Necessário, aqui, que partamos do pressuposto de que iremos observar o tipo penal (a letra da lei). Não daremos atenção ao crime como um fato social, mas

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sim a ele como conduta descrita na lei. Veremos então que alguns crimes admitem um resultado mais grave, que os qualificam.

São os denominados crimes qualificados pelo resultado. De acordo com o legislador pátrio, responderá pelo resultado agravador aquele que lhe deu causa ao menos culposamente. Observe a redação do artigo 19 do CP, cuja literalidade segue.

Agravação pelo resultado Art. 19 - Pelo resultado que agrava especialmente a pena, só responde o agente que o houver causado ao menos culposamente.

Notamos, então, que o resultado agravador pode decorrer de comportamento doloso (dolo direto ou indireto) ou de culpa do agente.

No crime de latrocínio (roubo seguido de morte), por exemplo, o resultado agravador, morte, pode decorrer de comportamento doloso do agente ou de conduta culposa. Não há diferença. Assim, havendo dolo ou culpa quanto ao resultado agravador, o agente responderá por crime de latrocínio (artigo 157, parágrafo 3º, do CP)7.

Crimes há, entretanto, em que o resultado agravador só pode existir na modalidade culposa, oportunidade em que estamos diante dos denominados crimes preterintencionais ou preterdolosos.

Assim, preterintencional ou preterdoloso é o crime em que o tipo penal exige que o resultado agravador seja ao agente imputado a título de culpa, sob pena de estarmos diante de um outro ilícito.

7 Roubo qualificado. Art. 157 - Subtrair coisa móvel alheia, para si ou para outrem, mediante grave ameaça ou violência a pessoa, ou depois de havê-la, por qualquer meio, reduzido à impossibilidade de resistência: Pena - reclusão, de quatro a dez anos, e multa. § 3º Se da violência resulta lesão corporal grave, a pena é de reclusão, de sete a quinze anos, além da multa; se resulta morte, a reclusão é de vinte a trinta anos, sem prejuízo da multa.

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(Dica: Não se esqueça do pressuposto de que estamos observando a letra da lei e não o crime como fato social, concreto).

É o que ocorre com o crime de lesão corporal seguida de morte (artigo 129, parágrafo 3º, do CP). Observe abaixo que a própria lei exige que o resultado morte não decorra de dolo do agente.

Lesão corporal seguida de morte § 3° Se resulta morte e as circunstâncias evidenciam que o agente não quis o resultado, nem assumiu o risco de produzi-lo: Pena - reclusão, de quatro a doze anos.

Caso o evento morte venha a decorrer de dolo, direto ou indireto, não estaremos diante do crime em tela, mas sim do crime de homicídio. Então, observe que a vontade do agente é praticar lesão corporal. Mas, por culpa, ele se excede e causa a morte. Aqui, há lesão corporal seguida de morte.

Caso que adquiriu notoriedade nacional, foi aquele do índio Galdino, onde vários rapazes, no Distrito Federal, atearam fogo nas vestes do índio que estava dormindo ao relento.

Muito se discutiu sobre qual o crime cometido, homicídio ou lesão corporal seguida de morte.

Se o resultado morte decorreu de dolo (direto ou indireto), estar-se-ia diante de um crime de homicídio (animus necandi = vontade de matar). Caso, entretanto, não houvesse a vontade de matar, tendo o resultado decorrido de culpa, falar-se-ia em leão corporal seguida de morte (crime preterdoloso).

No caso em tela, houve a imputação de crime de lesão corporal seguida de morte, sendo que o resultado adveio de culpa dos agentes.

Também é crime preterintencional ou preterdoloso o crime de lesão corporal qualificada pelo resultado aborto8. 8 Lesão corporal Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:

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No crime preterdoloso, há dolo no antecedente e culpa no conseqüente. Assim, as lesões corporais são dolosas e o resultado agravador, aborto ou morte, decorre necessariamente de culpa do agente. Se o resultado decorrer de dolo, estaremos diante, respectivamente, de crime de aborto e de homicídio.

Ressalto, mais uma vez, que crime qualificado pelo resultado é o gênero do qual decorre o crime preterdosolo.

Crime preterdoloso:

Misto: Dolo + Culpa.

Dolo = ANTECEDENTE (exemplo: Lesão corporal).

Culpa = CONSEQUENTE (exemplo: Morte).

Resultado não querido = culpa.

Ex: Lesão corporal seguida morte ou aborto.

Atenção: O crime de latrocínio é um crime em que o resultado morte, para o legislador, pode advir de dolo ou culpa do agente, o que não o desnatura. Assim, se o resultado decorre de dolo há latrocínio. Caso, entretanto, decorra de culpa, ainda, assim, estaremos diante do crime de latrocínio. Portanto, é um crime que pode ser cometido com preterdolo (dolo no antecedente e culpa no conseqüente). O crime preterdoloso, por sua vez, depende de o resultado advir de culpa do agente, sob pena de, em sendo doloso o comportamento, estarmos diante de um outro crime.

Observe a questão e a resolução que seguem abaixo. Dê atenção especial à alternativa que trata do preterdolo. Trata-se de uma questão aparentemente complexa. Mas, basta atenção para resolvê-la de forma satisfatória.

Procurador da Fazenda Nacional 2006 (ESAF) - Gabarito_1.

Pena - detenção, de três meses a um ano. Lesão corporal de natureza grave § 2° Se resulta: V - aborto: Pena - reclusão, de dois a oito anos.

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87- Geraldo pratica a conduta X. Sem desejar, porém, assumindo o risco, tendo mentalmente, antevisto o resultado, danifica o patrimônio de Ciro. A conduta de Geraldo, no aspecto subjetivo, identifica : a) dolo direto. b) dolo eventual. c) culpa inconsciente. d) culpa consciente. e) preterdolo. Resolução: Dolo direto não houve, já que o agente diante da antevisão do resultado (representação) não o buscou, uma vez que não o desejou. Culpa inconsciente não houve, já que nesta não pode haver a antevisão do resultado. Antevisão é inerente à conduta dolosa. Excepcionalmente, antevisão (representação) haverá na conduta culposa. É o que ocorre na culpa consciente, em que o agente antevê o resultado, mas não o aceita, não se conforma com o resultado, não assume o risco de produzi-lo. Preterdolo também não há, já que neste o resultado decorre de culpa, isto é, não é antevisto pelo agente, apesar de previsível, não há a efetiva previsão. Resta-nos, tão-só, o dolo eventual. No dolo eventual o agente antevê o resultado e diante da possibilidade de concreção, apesar de não desejá-lo, com ele se conforma, assumindo o risco de produzi-lo. Assim, no dolo eventual, o agente aceita como possível um resultado antevisto e indesejado. Comando da questão deixa muito claro que o agente assume o risco de produzir o resultado. Correta a alternativa B. Gabarito: B (gabarito oficial B).

3.15.1 – Tentativa no crime preterdoloso.

Como o resultado naturalístico leva efetivamente à consumação do crime, cremos que os crimes preterdolosos, como os culposos, são necessariamente materiais.

Todavia, apesar de fracionável no tempo a conduta (atos), não se admite a tentativa, pois o resultado agravador, necessário para a consumação, deve decorrer de culpa do agente.

Se o resultado necessita decorrer de culpa, não há que se falar em tentativa de crime preterdoloso, pois não posso tentar um resultado que não quero e que nem mesmo assumi o risco de produzir.

Assim, nos crimes preterdosoloso ou preterintencionais, como nos crimes culposos, não há que se falar em crime tentado.

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Observe o crime de lesão corporal seguida de morte. O agente age dolosamente buscando causar lesão corporal na vítima. Todavia, por falta de cuidado, dá causa à morte. Se o evento morte ocorreu por culpa, não há como tentá-lo. Se, por sua vez, o evento morte não ocorre, estaremos diante de lesão corporal consumada.

Nos crimes preterdolosos ou preterintencionais não se admite tentativa.

3.16 – DA CULPABILIDADE.

Ao falarmos do conceito analítico de crime (item 3.1.1), oportunidade em que dispensamos atenção a seus elementos conceituais (fato típico e antijurídico), dissemos que a culpabilidade, quando adotada a teoria finalista da ação, não é elemento conceitual de crime. Assim, crime há sem que haja culpabilidade. Esta, todavia, passa a ser pressuposto para aplicação de pena.

Também, naquela ocasião, afirmamos que o nosso trabalho, apesar da maioria da doutrina não fazê-lo, levará em conta a teoria sufragada pelo legislador, ou seja, a teoria finalista da ação.

No entanto, por opção didática, resolvemos tratar da culpabilidade imediatamente após termos falado dos elementos conceituais de crime. Ressalta-se que a disposição da matéria não é sintoma de que culpabilidade é elemento conceitual de crime.

3.16.1 – DO CONCEITO E DOS REQUISITOS (OU ELEMENTOS).

Culpabilidade é a reprovabilidade da conduta; e, ser reprovável, é pressuposto para se aplicar pena. A pena, portanto, só se dirige àquele que praticou uma conduta reprovável, àquele que é culpado, àquele que tem culpabilidade.

Dica: A culpabilidade nada mais é que aquele conceito leigo de culpa. Culpado é aquele que praticou uma conduta reprovável. Aqui, então, de forma simplista, vamos pensar que culpado é aquele que tem culpabilidade. Esta, por sua vez, é a reprovabilidade da conduta.

Então, culpabilidade é um juízo de censura que recai sobre o fato e sobre seu agente. Quando, por exemplo, determinado jogador de futebol erra uma cobrança de pênalti, diz-se que foi ele o culpado pela derrota de sua equipe.

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No Direito Penal, entretanto, a censurabilidade de recai sobre uma conduta que já se concluiu ser fato típico e antijurídico. Portanto, adotada a teoria finalista da ação, a conduta já é criminosa. Sendo, agora, culpável, o seu autor está sujeito à aplicação da pena.

Conceito: Culpabilidade é o juízo de censura que recai sobre a conduta e seu autor.

A culpabilidade só existirá quando presentes, de forma cumulativa, simultânea, os seus requisitos que são: 1 - Imputabilidade; 2 - Potencial consciência da ilicitude; e 3 - exigibilidade de conduta diversa.

Trataremos de cada um deles, nos tópicos seguintes.

3.16.2 – DA IMPUTABILIDADE PENAL.

Imputabilidade penal é a condição ou qualidade que possui o agente de sofrer a aplicação de pena. E, por sua vez, só sofrerá pena aquele que tinha ao tempo da ação ou da omissão capacidade de compreensão e de autodeterminação frente o fato.

Assim, imputabilidade é a capacidade de o agente, no momento da ação ou da omissão, entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se frente tal fato. Somente o imputável sofrerá pena.

Para ser imputável o agente deve ter capacidade de: 1- entender o caráter ilícito do fato (compreensão das coisas) e 2 - determinar-se de acordo com esse entendimento (capacidade de dirigir sua conduta considerando a compreensão que anteriormente teve).

A lei pressupõe a imputabilidade. Extraordinariamente, o legislador arrola as hipóteses de exclusão da imputabilidade. Assim, em princípio todos são imputáveis.

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De acordo com Fernando Capez9, a imputabilidade apresenta um aspecto intelectivo, consistente na capacidade de entendimento, e outro volitivo, que a faculdade de controlar e comandar a própria vontade.

3.16.3 – HIPOTESES DE EXCLUSÃO DA IMPUTABILIDADE.

Partindo do pressuposto de que todos, maiores de 18 anos de idade, são imputáveis, o legislador, no artigo 26 e seguintes do CP arrola as hipóteses em que a presunção é arredada, ou seja, as hipóteses em que há a inimputabilidade.

Observe, primeiramente, a redação do disposto no artigo 26 do CP, cuja literalidade segue.

Inimputáveis Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Notamos, então, que, de acordo com tal dispositivo, serão considerados inimputáveis:

1- O doente mental.

2- Aquele que tem desenvolvimento mental incompleto.

3- Aquele que tem desenvolvimento mental retardado.

Observe, entretanto, o que dispõe o artigo 27 do CP sobre os menores. A letra da lei segue abaixo.

Menores de dezoito anos

Art. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.

Notamos, agora, que além daqueles casos mencionados no artigo 26, o legislador considera também inimputável o menor de 18 anos de idade. Para o legislador, aquele que não completou 18 anos de idade tem desenvolvimento mental

9 Capez – Fernando (Curso de Direito Penal – Parte Geral – editora Saraiva).

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incompleto. Trata-se de uma presunção absoluta. Assim, basta ser menor para ser considerado inimputável.

No entanto, mais adiante, no artigo 28, inciso II, parágrafo 1º, do CP, o legislador prevê outra hipótese de inimputabilidade. Trata da embriaguez completa que decorre de força maior ou caso fortuito. Observe a letra da lei. Artigo 28, II, § 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Diante de tais dispositivos, podemos arrolar as seguintes hipóteses de inimputabilidade:

1- Doença mental.

2- Desenvolvimento mental incompleto ou retardado.

3- A menoridade.

4- A embriaguez completa que decorre do fortuito ou de força maior.

Trataremos de cada uma das hipóteses de exclusão da imputabilidade. Primeiramente, vamos tratar da menoridade, onde, diferentemente das demais, impera presunção absoluta.

3.16.3.1 – DA MENORIDADE.

Aquele que, ao tempo da ação ou da omissão (atividade), era menor de 18 anos de idade, é considerado inimputável, pois o legislador presume, de forma absoluta, que o menor tem desenvolvimento mental incompleto.

A presunção é absoluta. Assim, não admite prova em sentido contrário. Basta demonstrar-se a menoridade que o sujeito não sofrerá aflição penal, pois inimputável.

Questão interessante é saber quando o agente adquire a maioridade penal. O sujeito passa a ser considerado maior para efeito penal quando adquire 18 anos completos.

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Considera-se completados 18 anos de idade no dia do 18º aniversário do sujeito, independente da hora em que tenha nascido. Assim, já na primeira hora de seu 18º aniversário o sujeito passa de inimputável para imputável.

O disposto no artigo 27 do CP é retratado na Constituição Federal10. Assim, maioridade penal é matéria constitucional. Não pode o legislador ordinário tratar, como o fez recentemente com maioridade civil, de maioridade penal.

3.16.3.2 – DA DOENÇA MENTAL E DESENVOLVIMENTO MENTAL INCOMPLETO OU RETARDADO.

Aqui, sob a mesma rubrica, vamos tratar daquele que é doente mental e daquele que tem desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Não é nosso objetivo discutir os motivos que levam à patologia ou o desenvolvimento mental incompleto ou retardado. Mais nos interessa as conseqüências.

Doente mental é aquele que acometido de alguma patologia não possui condição de discernimento das coisas.

Tem desenvolvimento mental incompleto ou retardado aquele que não possui ainda condição de compreensão das coisas. Tem desenvolvimento mental incompleto aquele que, não completou seu desenvolvimento mental, mas com o tempo o completará. Já o retardado é aquele que não tem o desenvolvimento mental completo e jamais o terá, pois não possui condição pessoal para progredir.

Tanto o doente mental, como aquele que tem desenvolvimento mental incompleto ou retardado, será considerado inimputável, desde que seu aspecto biológico (o desenvolvimento mental incompleto ou retardado e a doença mental) lhes retire a capacidade plena de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se diante de tal situação.

10 Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.

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Assim, preste atenção, não é a condição biológica que gera a inimputabilidade. Para que ocorra a inimputabilidade, necessário que a condição biológica leve à retirada da capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Pelo legislador foi adotado o sistema biopsíquico. Há, então, necessidade da condição biológica agregada com a condição ou deficiência psíquica.

Assim, por exemplo, aquele que é doente mental, por si só, não é considerado inimputável. Será inimputável quando a sua condição biológica peculiar lhe retirar a capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Observe, com muita atenção, a redação do artigo 26 do CP, cuja literalidade segue.

Inimputáveis Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

De acordo com o dispositivo, fica fora de dúvida que pelo legislador o aspecto biológico não basta. Necessário que a condição biológica dê causa à retirada completa da capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Inimputável = aspecto biológico + aspecto psíquico.

Inteira incapacidade de entender e de determinar-se.

Doença mental ou desenvolvimento mental retardado ou incompleto.

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3.16.3.4 – DA EMBRIAGUEZ COMPLETA.

O nosso legislador, no artigo 28 do CP11, cuja letra segue abaixo, com o objetivo de espancar qualquer dúvida, afirma de forma peremptória que a emoção e a paixão, bem como a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos, não excluem a imputabilidade penal.

Não excluem a imputabilidade:

1- a emoção e a paixão.

2- A embriaguez, voluntária ou culposa.

Embriaguez: Estado de intoxicação aguda decorrente do álcool ou substância análoga.

Voluntária: Aquela em que o agente embriaga-se voluntária e livremente.

Culposa: Aquela em que por descuido o agente se embriaga. (ex: aquele estando sob efeito de medicamento para emagrecer ingere, por falta de cautela, álcool).

No entanto, o que nos interessa é o disposto no artigo 28, II, parágrafo 1º do CP, onde o legislador arrola mais uma hipótese de exclusão a imputabilidade. Em tal dispositivo que segue exposto, o legislador afirma que a embriaguez completa que decorra do caso fortuito ou de força maior, exclui a imputabilidade, pois o agente é isento de pena.

§ 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

11 Emoção e paixão Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal: I - a emoção ou a paixão; Embriaguez II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.

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Precisamos, antes de tudo, conceituar embriaguez completa. Ao depois, falaremos dela decorrente de fortuito ou força maior.

Embriaguez completa: é a intoxicação aguda. Diz-se completa, uma vez que leva à falta de coordenação motora e confusão mental, não tendo o agente mais consciência e vontade livres12.

Força maior: Ocorre quando o agente não sabe que está ingerindo substância que causa a embriaguez. Observe a hipótese daquele que está hospitalizado e recebe dose de morfina. Tal substância causa embriaguez.

Caso Fortuito: Ocorre, por sua vez, quando o agente é embriagado sem que externe para tanto sua vontade. Tal embriaguez decorre normalmente de coação física ou moral irresistível.

Aqui, como causa excludente da imputabilidade, necessário que a embriaguez seja completa e decorra do fortuito ou de força maior.

No entanto, não basta que ocorra a embriaguez (aspecto biológico). Necessário, ainda, que do estado de embriaguez o agente seja inteiramente privado da capacidade de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Portanto, mais uma vez, há a conjugação de fator biológico com fato psíquico. Assim, relevante, para a inimputabilidade, o aspecto biopsciológico ou biopsiquico.

Inimputável = aspecto biológico + aspecto psíquico.

Inteira incapacidade de entender e de determinar-se.

Embriaguez completa que decorra do fortuito ou da força maior.

Atenção : Se a embriaguez é completa, mas não decorre do fortuito ou da força maior, sendo, portanto, voluntária ou culposa, não há a retirada da imputabilidade. Caso completa e decorra de força maior ou caso fortuito, 12 Grecco – Rogério (curso de Direito Penal – Parte Geral – editora impetus).

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necessário que ocorra o aspecto psíquico, ou seja, privação da capacidade de discernimento.

Por enquanto, nos interessa somente fixar as hipóteses de exclusão da imputabilidade. No próximo tópico vamos continuar nossa exposição tratando da semi-imputabilidade e das conseqüências que advém da inimputabilidade.

Necessário que tenhamos, por ora, a certeza absoluta de que ao inimputável não haverá a aplicação de pena.