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Aula 09 - Inadimplemento das obrigações Breves considerações O estudo do inadimplemento das obrigações passa pelo estudo da responsabilidade civil por ilícito contratual. A responsabilidade civil normatizada nos arts. 927 e ss, do Código Civil, é referente à responsabilidade extracontratual. A responsabilidade contratual está nos arts. 389 e ss, do Código Civil. O inadimplemento é estudado à luz da culpa, devendo ser analisado se o inadimplemento se deu com ou sem culpa. Ação de indenização O inadimplemento dá azo à propositura de ação de indenização, da mesma forma que na responsabilidade extracontratual. Prazo prescricional para a propositura da ação Correntes: art. 206, § 3º, CC - 3 anos TJSP - prazo de 3 anos se aplica somente à responsabilidade extracontratual. Prazo é de 10 anos por ausência de previsão expressa. CJF - Enunciado 418 - art. 206, § 3º, é aplicável a ambas modalidades. O STJ ainda não tem uma posição. Pressupostos da responsabilidade civil O art. 186, que versa sobre o ato ilícito, contém todos os pressupostos da responsabilidade civil explícita e implicitamente: "aquele que por ação ou omissão” = conduta; "voluntária ou fruto de negligência ou imprudência” = dolo e culpa; "causar dano a outrem” = dano; implicitamente está o nexo causal. Inadimplemento involuntário Ocorre sem culpa do devedor, mas sim por caso fortuito ou força maior. Em regra, não haverá responsabilidade civil (art. 393, CC). Exceções: clásula de assunção (assume) da responsabilidade pelo caso fortuito e pela força maior (art. 393,CC) , sendo vedada nos contratos de adesão (art. 424, CC); caso fortuito ou força maior gera o dever de indenizar se o fato ocorre após a mora, sendo um dos efeitos da mora, exceto se o evento ocorreria ainda que a obrigação houvesse sido cumprida (art. 399, CC); se o comodotário antepuser a salvação de seus bens ao bem objeto do comodato, ele se responsabiliza pelo caso fortuito ou força maior (art. 583, CC). Conceituação de caso fortuito e força maior O art. 393, parágrafo único, do Código Civil, conceitua o caso fortuito ou força maior como fato necessário cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. A doutrina minoritária entende que os dois conceitos representam a mesma coisa. Sustenta que os efeitos são os mesmos. A posição majoritária, que entende que caso fortuito e força maior têm significados diferente, apresente seis correntes de conceituação. Entretanto, para fins do presente estudo, serão abordadas apenas a posição clássica e a posição atual do STJ:

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Aula 09 - Inadimplemento das obrigações Breves considerações

O estudo do inadimplemento das obrigações passa pelo estudo da responsabilidade civil por ilícito contratual. A responsabilidade civil normatizada nos arts. 927 e ss, do Código Civil, é referente à responsabilidade extracontratual. A responsabilidade contratual está nos arts. 389 e ss, do Código Civil. O inadimplemento é estudado à luz da culpa, devendo ser analisado se o inadimplemento se deu com ou sem culpa.

Ação de indenização

O inadimplemento dá azo à propositura de ação de indenização, da mesma forma que na responsabilidade extracontratual. Prazo prescricional para a propositura da ação Correntes: art. 206, § 3º, CC - 3 anos TJSP - prazo de 3 anos se aplica somente à responsabilidade extracontratual. Prazo é de 10 anos por ausência de previsão expressa. CJF - Enunciado 418 - art. 206, § 3º, é aplicável a ambas modalidades. O STJ ainda não tem uma posição. Pressupostos da responsabilidade civil

O art. 186, que versa sobre o ato ilícito, contém todos os pressupostos da responsabilidade civil explícita e implicitamente: "aquele que por ação ou omissão” = conduta; "voluntária ou fruto de negligência ou imprudência” = dolo e culpa; "causar dano a outrem” = dano; implicitamente está o nexo causal. Inadimplemento involuntário

Ocorre sem culpa do devedor, mas sim por caso fortuito ou força maior. Em regra, não haverá responsabilidade civil (art. 393, CC). Exceções: clásula de assunção (assume) da responsabilidade pelo caso fortuito e pela força maior (art. 393,CC) , sendo vedada nos contratos de adesão (art. 424, CC); caso fortuito ou força maior gera o dever de indenizar se o fato ocorre após a mora, sendo um dos efeitos da mora, exceto se o evento ocorreria ainda que a obrigação houvesse sido cumprida (art. 399, CC); se o comodotário antepuser a salvação de seus bens ao bem objeto do comodato, ele se responsabiliza pelo caso fortuito ou força maior (art. 583, CC).

Conceituação de caso fortuito e força maior

O art. 393, parágrafo único, do Código Civil, conceitua o caso fortuito ou força maior como fato necessário cujos efeitos não era possível evitar ou impedir. A doutrina minoritária entende que os dois conceitos representam a mesma coisa. Sustenta que os efeitos são os mesmos.

A posição majoritária, que entende que caso fortuito e força maior têm significados diferente, apresente seis correntes de conceituação. Entretanto, para fins do presente estudo, serão abordadas apenas a posição clássica e a posição atual do STJ:

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Posição clássica

Caso fortuito: evento praticado pelo homem. Força maior: evento decorrente da natureza. Entretanto, essa conceituação está defasada. Exemplo disso é que a enchente (força maior) e greve (caso fortuito) hoje já não são mais eventos que podem obstar o adimplemento de uma prestação, pois já fazem parte da rotina de certas pessoas. Dessa forma, o STJ adota um posicionamento diverso hodiernamente.

Posição do STJ

Em razão da defasagem da posição clássica, o STJ adota uma conceituação diversa: Caso fortuito: fato imprevisível. Força maior: previsível, mas inevitável. Caso do Morumbi Shopping - shopping não foi obrigado a indenizar por ser caso fortuito, completamente imprevisível.

Fortuito externo e fortuito interno

O fortuito interno é ligado à atividade do devedor; enquanto o fortuito externo não tem essa ligação. No fortuito interno, deve haver responsabilidade civil, mas no externo não deve haver.

Inadimplemento voluntário Ocorre com culpa do devedor. Haverá responsabilidade civil. Consequências da responsabilidade civil Segundo o art. 389 do Código Civil, podem ser exigidos em ação indenizatória: perdas e danos; atualização monetária; juros; e honorários advocatícios. I. Perdas e danos a) dano material: art. 402, CC: prejuízo patrimonial, financeiro e econômico. Pode se manifestar como um dano emergente ou como lucro cessante.

Dano emergente: dano positivo porque se caracteriza pelo prejuízo efetivo. Lucro cessante: dano negativo porque se caracteriza pelo o que se deixou de ganhar. Ex.: taxista que tem fica sem seu carro em razão de um acidente; prejuízo em razão de morte (alimentos). Obs.: o lucro cessante pode ocorrer por parte de pessoas jurídicas em razão de inadimplemento contratual. b) dano moral dano moral próprio: gera dor, angústia, sofrimento, amargura, tristeza, etc. dano moral impróprio: violação de direitos da personalidade. Ex.: direito à imagem. Ambos coexistem ou se anulam? A posição majoritária é que ambos convivem simultaneamente. É possível haver dano moral em uma relação contratual? Pode ocorrer em razão de ilícito contratual. Ex.: fotógrafo contratado para o casamento que não comparece no evento. Dano moral in re ipsa: manifestação do dano moral próprio ou impróprio que é presumido pela simples ocorrência do fato.

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Somente é dano moral in re ipsa nos casos consagrados pela jurisprudência. Casos: pais que demandam perda dos filhos; inclusão indevida nos cadastros de restrição ao crédito; súmula 388 do STJ - devolução indevida de cheque caracteriza dano moral; extravio de bagagem por companhia aérea; abandono afetivo. A presunção do dano moral in re ipsa é relativa. Ex.: inscrição nos cadastros de restrição de crédito pode não gerar o abalo ao crédito se a vitima já tiver o seu nome cadastrado diversas outras vezes. Dano moral em ricochete: dano moral próprio ou impróprio que atinge terceiros. Ex.: veterinário que faz castração em uma cadela, que por negligência do profissional acabou morrendo. Além do dono, as pessoas que moravam na mesma casa também fazem jus à indenização. Súmula 227 do STJ - admite o dano moral da pessoa jurídica.

c) dano estético: gera um prejuízo estético permanente em alguma parte do corpo humano. Se tiver como reparar o dano estético com cirurgias plásticas, o dano é material.

A posição majoritária é de que o dano estético é um dano autônomo ao dano moral (súmulas 387 e 37 do STJ). Obs.: o mesmo fato pode gerar danos materiais, morais e estéticos

II. Juros

São acréscimos ao capital, não se confundindo com atualização monetária. a) juros compensatórios: são estabelecidos em contrato de mútuo feneratício (empréstimo de dinheiro).

b) juros moratórios: são devidos no caso de retardamento culposo de uma obrigação. Passíveis de serem cobrados em razão do inadimplemento.

Juro moratório legal: decorrente da lei. Após a revogação do art. 192 da CF, a matéria sobre juros não é mais uma matéria constitucional, sendo regulada pela legislação infraconstitucional, principalmente pelo art. 406 do CC, que estabelece a taxa do juro moratório, quando não houver convenção entre as partes e para os casos em que deve ser observado obrigatoriamente os juros legais, a taxa em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional. Alguns sustentam que é a taxa SELIC e outros que é a taxa do art. 161 do CTN. Crítica doutrinária à taxa SELIC: é híbrida, contendo juros e correção monetária, não podendo distingui-los. Também é uma taxa variável, gerando insegurança jurídica. Enunciado 20 do CJF: é partidário da taxa do CTN (1% ao mês).

Entretanto, a jurisprudência ainda é dividida. A Corte Especial do STJ está prestes a pacificar a matéria.

Juro moratório convencional: é estabelecido pelas partes. Será que é possível estabelecer qualquer patamar de juros? Deve haver um teto, que está fixado no art. 5, do Dec. 22.626/33 (Lei de Usura), que o máximo que pode ser convencionado a título de juro é o dobro da taxa legal. É cobrado a partir da citação do réu (art. 405, CC). Obs.: a Súmula 54, STJ, que estabelece que é a partir do evento danoso é aplicada à responsabilidade extracontratual. Por que os bancos cobram mais que o permitido na lei? Súmula 596 do STF: Não se aplica a Lei de Usura às instituições financeiras.

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III. Atualização monetária

Tem o objetivo de devolver o poder de compra da moeda, corroído pela inflação. IV. Honorários advocatícios

Enunciado 161 do CJF: Para a cobrança de honorários advocatícios é necessário a atuação do profissional da advocacia. Portanto, uma empresa de cobrança não pode cobrá-los. A verba de honorários sucumbenciais pertence ao advogado (art. 23, Lei 8.906/94). Na ação de indenização, faz parte do dano os honorários advocatícios desembolsados pela vítima. Enunciado 426 do CJF: A verba de suculência do Estatuto de Advocacia não se confunde com a verba do art. 389 do CC. A posição foi referendada pelo STJ no REsp 1.134.725/ MG. Espécies de inadimplemento O critério de diferenciação das espécies de inadimplemento é o da utilidade, que deve ser analisado à luz da boa-fé objetiva, verificada no caso concreto. Inadimplemento absoluto: se a prestação se tornar inútil após o inadimplemento. Ex.: vestido de noiva. Inadimplemento relativo: a prestação ainda é útil ao credor após o vencimento. Está existindo apenas uma demora no cumprimento da obrigação. Ex.: dinheiro para banco. Mora

Ocorre nos casos de inadimplemento relativo. Espécies de mora

Mora accipiendi - mora do credor ou mora creditoris. Mora solvendi - mora do devedor ou mora debitoris. Mora ex re - mora automática. Dies interpelat pro omine: no dia seguinte ao vencimento, automaticamente, ocorre a mora. Mora ex personae - exige a interpelação, pois não há vencimento da prestação.

Adimplemento substancial

Tem origem na Inglaterra com o nome de substantial performance. Essa tese não encontra nenhum parâmetro legal no ordenamento, mas o STJ vem entendendo que há aplicação no Brasil por força dos arts. 421 e 422 do Código Civil. É o adimplemento parcial próximo do total, que retira do credor um dos efeitos da mora, que é o direito de exigir a extinção do contrato. Ex.: pagamento de 75 parcelas do total de 80, diversamente do pagamento de somente 05 parcelas do mesmo total. O STJ entende que nos contratos de seguro de veículos, com o pagamento de 03 das 04 parcelas obstam a extinção do contrato pela seguradora, restando somente a cobrança da quarta parcela, não podendo se imiscuir de uma possível indenização ao segurado.