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As palavras gestuais de Denise Stoklos: A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico. de Davi Giordano de Davi Giordano
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As palavras gestuais de Denise Stoklos:
A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico.
(Davi Giordano*)1
Do dia 11 a 21 de outubro de 2012, Denise Stoklos trouxe para o Rio de Janeiro uma
experiência única do Teatro Essencial. A artista foi convidada pela equipe do Espaço
Sesc Copacabana para realizar a leitura de sete peças do seu repertório de solos
teatrais, seguidos sempre de debates no final. A proposta conceitual do evento ‘’As
palavras gestuais de Denise Stoklos’’ é justamente revelar como a linha específica do
Teatro Essencial encontra na palavra um lugar potencialmente criativo de imagens,
gestualização e visualização. O público carioca teve a oportunidade de acompanhar a
leitura de sete peças escolhidas na sequência cronológica da trajetória do Teatro
Essencial e de assistir, no último dia do evento, a versão montada do seu último
espetáculo ‘’Preferiria Não?’’.
Este texto surge de minha própria iniciativa como um pesquisador que estuda o
Teatro Essencial desde 20102. No caso, a escrita surgiu a partir da experiência de
1 Em fase de graduação em Artes Cênicas - Habilitação em Direção Teatral pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Formação complementar de Cinema e de Crítica de Arte, tendo cursado disciplinas do curso de Artes Combinadas na Universidad de Buenos Aires (UBA), na qual foi aceito como aluno estrangeiro para o convênio de programa de intercâmbio acadêmico bilateral (agosto 2010 - julho 2011). Atualmente, é aluno bolsista PIBIC do projeto de investigação ''Encenações do Comum'' sob orientação de Denilson Lopes. Também é ator formado pela Casa das Artes de Laranjeiras (CAL). Como artista, pesquisador e profissional, tem o interesse em desenvolver sua carreira como ator, diretor, dramaturgo e crítico de arte. Suas pesquisas apontam para as seguintes àreas de interesse: Autoria Criativa no Solo Teatral, Crítica de Arte, Artes Combinadas (interações dinâmicas e contemporâneas entre Teatro e Cinema), Teatro e Cinema Latinoamericanos, Novas Tecnologias nas Artes Combinadas e Engenharia do Entretenimento. 2 No caso, eu estudo o que venho a chamar de ‘’Autoria criativa no solo teatral’’, sendo o Teatro Essencial uma das
principais gamas da minha pesquisa. O primeiro texto que escrevi sobre o trabalho da artista Denise Stoklos foi
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acompanhar todos os dias de ‘’As palavras gestuais de Denise Stoklos’’. Ao longo
dessas duas semanas, eu organizei todas as minhas notas e questões a partir de um
''testemunho teórico-crítico'' sobre as leituras do repertório e a recepção do público
carioca. Minha preocupação principal foi colocar-me como um pesquisador voyeur de
todas as percepções e colocações propostas tanto pela artista Denise Stoklos e suas
leituras como incluí também os comentários dos espectadores, o que me permitiu fazer
um levantamento comparativo de todos os dias.
Primeiramente, vale fazer um pequeno apanhado das peças que foram escolhidas
para as leituras do repertório com o objetivo de situar melhor o leitor deste texto.
Abaixo segue a ordem das peças lidas:
-Casa. Peça escrita em 1990 foi um dos marcos iniciais do Teatro Essencial. A dramaturgia
apresenta de forma embrionária as principais questões que iriam estar presentes ao longo dos
trabalhos de solos performances de Denise Stoklos: a metalinguagem como potência criativa, a
abordagem da humanidade advinda do Amor e da Morte, arte como elemento de contestação
estética-política-social, a anulação de elementos cênicos e a consequente aposta somente
naquilo que é essencial 3 para a constituição da cena (ator-performer, texto, espaço de
compartilhamento da experiência artística e público-espectador). A peça foi lida no dia 11
(quinta-feira).
publicado na revista Lindes de Sociologia e Arte do governo argentino. O texto se chama ‘’O Teatro Essencial sob uma perspectiva minimalista’’ e desenvolve uma relação entre o Teatro Essencial e a Arte Minimalista (GIORDANO, Davi. ''O Teatro Essencial sob uma perspectiva minimalista''. In: Revista LINDES, Nº2 - Julio 2011 - Buenos Aires - Argentina. ISSN: 1853 5798). O texto se encontra no seguinte link: http://www.revistalindes.org.ar/numeros_anteriores/numero_2/articulos/Giordano_O_Teatro_Essencial.pdf 3 O Teatro Essencial surge como uma proposta artística-teatral na qual o ator é “autor, diretor e coreógrafo de si
mesmo’’. Para mais informações, sugiro a leitura do meu primeiro texto ‘’O Teatro Essencial sob uma perspectiva minimalista’’ onde há um detalhamento sobre o conceito.
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-Um fax para Colombo. Peça escrita em 1992 funciona como um ato-manifesto no qual o
corpo da atriz opera como ação de contestação e questionamento latino-americano em relação
aos sistemas europeus de dominação e opressão. Aqui já encontramos um exemplo de
encenação que opera através do distanciamento para abordar a crítica e o humor ácido das
relações patriarcais. Denise Stoklos desdobra as memórias coloniais da nossa cultura para
transformá-las em atualidades cênicas, o que consequentemente estimula no espectador a
imaginação de uma crítica social. É um exemplo de como a artista usa de sua arte para
combater a violência e instaurar a liberdade. A peça foi lida no dia 12 (sexta-feira).
-Amanhã será tarde e depois de amanhã nem existe. Peça escrita em 1993 na verdade se
trata de uma escrita que se assemelha mais a uma prosa. O livro foi originalmente publicado
como um ‘’romance essencial’’. Denise Stoklos escreveu a partir do sentimento da perda de
muitos de seus amigos em função do surgimento e crescimento da AIDs nos anos oitenta.
Dessa maneira, ela traz para a cena reflexões sobre a junção simultânea da vida e da morte. A
peça foi lida no dia 13 (sábado).
-Des-Medéia. Peça escrita em 1994 é uma atualização cênica do mito grego de Medéia,
porém recriado sob a ótica subjetiva de Denise Stoklos que traz humor crítico e aproximações
da Grécia com a cultura brasileira. A personagem de Medéia se transforma na própria
personificação do Brasil como a pátria que é constantemente traída. Por sua vez, o
personagem de Jasão serve como metáfora da ‘’política pública’’, ou seja, o governo que trai a
sua nação. A peça foi lida no dia 14 (domingo).
-Desobediência Civil. Peça criada em 1997 é uma adaptação dramatúrgica que Denise
Stoklos fez a partir dos textos de Henry David Thoureau e Paulo Freire. Em cena, o corpo da
atriz é veículo de questionamento tanto das possibilidades de submissão como de
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enfrentamento das obrigações civis. Questões como educação e cidadania são transformadas
em poética cênica. A peça foi lida no dia 18 (quinta-feira).
-Vozes Dissonantes. Peça escrita em 2000 é uma reflexão nacional sobre a comemoração
dos 500 anos daquilo que se convencionou chamar Descobrimento do Brasil. A performer
através de sua ‘’voz ressonante’’ traz para a cena as diversas possibilidades de releitura que
questionam a História Oficial. Dessa forma, revemos a História do Brasil através de outros
pontos de vista. Uma linda homenagem de amor à cultura da pátria e um estímulo de
comunhão das vozes de todos que levantaram a construção da nacionalidade brasileira. A
peça foi lida no dia 19 (sexta-feira).
-Calendário da Pedra. Peça escrita em 2001. Inspirado na escrita minimalista de Gertrude
Stein, o texto aborda a trajetória de um ano na vida de uma personagem metaforizada pela
figura de uma ‘’pedra’’. A peça investiga questões como a duração para refletir sobre a
passagem do tempo e suas possibilidades de provocar mudanças no ser humano. A peça foi
lida no dia 20 (sábado).
-Preferiria não? A peça é a mais recente do Teatro Essencial e teve sua estreia em 2011.
Trata-se de uma adaptação do livro ‘’Bartleby, o escriturário’’ escrito em 1860 por Herman
Melville. Neste espetáculo, Denise Stoklos investiga o procedimento dramatúrgico advindo da
fita de Möbius a partir da qual há um intercâmbio mútuo atriz-personagem. A peça foi
encenada no dia 21 (domingo).
Não pretendo aqui fazer uma análise profunda de nenhuma leitura das peças em
específico. Ao invés disso, estou interessado no levantamento de questões surgidas
nas articulações da experiência como espectador ao longo de todos os dias do evento.
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Por isso, não abordo somente os momentos das leituras, mas também coloco o que
observei do lado de fora antes de entrar na sala do Espaço Mezanino e também o que
foi ocorrido nos debates seguidos após as leituras.
Posso registrar, por exemplo, que sempre antes de entrarem no espaço de
apresentação, ainda no hall do lado de fora, era comum ouvir um espectador que
estava levando um amigo pedir que seu acompanhante desligasse o celular. Havia
uma nítida preocupação para que o celular não tocasse no meio do espetáculo. É
interessante perceber que o público de Denise Stoklos já conhece a preocupação da
artista em manter uma profunda concentração durante as apresentações de seus
trabalhos. Isso evidencia que a concentração para o Teatro Essencial é uma parcela
de contribuição estendida na responsabilidade do próprio espectador. A doação é
sempre troca, um prazer compartilhado mutuamente. Acredito que essa atenção
especial notada no público específico do Teatro Essencial já denota a primeira chave
de aproximação na relação espectador / espetáculo.
Uma primeira indagação que tive quando soube do evento ‘’As palavras gestuais de
Denise Stoklos’’ foi: assistir Denise Stoklos fazendo uma leitura? Isso para mim de
certa maneira soava estranho, porque ao falar de Teatro Essencial automaticamente a
minha memória é tomada de imagens cênicas em função da potente criação de
movimentos/ações que a performer consegue desdobrar com tanto vigor em seus
espetáculos. Pensei: ‘’como ela fará a leitura de algo que é tão visual? Como ler algo
que foi feito para ser visto e ainda assim ser significado?’’. Contudo, logo no primeiro
dia, percebi que a falta de composição cênica em função da leitura não invalidou a
necessidade psicofísica e corporal tão característica de Denise Stoklos. Ao entrarmos
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na sala do espaço Mezanino, observamos uma sala preta vazia que combina
diretamente com a proposta minimalista do Teatro Essencial. No palco, apenas uma
pequena mesa, uma cadeira e um copo de água. Imediatamente após a entrada de
todos os espectadores, Denise Stoklos entra pela porta da esquerda trazendo em suas
mãos o texto da leitura do respectivo dia, cumprimenta o seu público, atravessa o
espaço, se dirige até a mesa e senta. Logo que começa, ao emitir o som da primeira
palavra, já notamos que Denise Stoklos ultrapassa os limites de uma simples leitura.
Os pés inquietantes da performer sempre buscam em baixo da mesa as imagens do
que ela lê e expressa. A voz da performer é o instrumento para encontrar a existência
do gesto dentro da palavra. Palavras-imagens-sons, todo o texto ressoa e flutua pelo
espaço Mezanino do Sesc Copacabana. Este efeito de fluência na criação de imagens
revela como cada palavra é transformada em presença cênica. Noto que em todos os
dias de leitura, houve alguns espectadores que fecharam os olhos para vislumbrar de
maneira mais concentrada a experiência do estímulo e da imaginação.
No primeiro dia de leitura, apesar da forte chuva, o público esteve presente para
conhecer a dramaturgia ‘’Casa’’, escrita em 1990 quando teve sua estreia no Teatro La
Mama em Nova York. Como a seleção das peças foi feita de acordo com a ordem
cronológica de criação, tivemos a oportunidade de ver o amadurecimento do Teatro
Essencial ao longo dos anos. Em ‘’Casa’’, a performer desdobra a situação de uma
pessoa solitária dentro de uma casa para investigar os sentimentos das relações do ser
humano com tudo aquilo que está ao seu redor. A performer produz um mundo infinito
de imagens para ‘’des-cenarizar’’ a peça. A dramaturgia esclarece tanto pelas rubricas
como pelas falas que a montagem não faz uso de cenário, não há construção de signo
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cênico material. O espaço desse ambiente sugerido apenas pelos estímulos
imagéticos e pela intensidade da presença da performer nos traz a metáfora de que o
mundo não tem paredes.
Apesar de ‘’Casa’’ ser uma das dramaturgias mais antigas, notamos que existe por
parte da artista uma imensa capacidade de sempre estar potencializando as
atualidades de seus espetáculos. Talvez o melhor motivo que explique isso seja a
maneira como Denise Stoklos aborda diretamente a essência da natureza humana.
Ainda que sejam temáticas históricas, como no caso de ‘’Um fax para Colombo’’ e
‘’Des-medéia’’, o mais interessante de tais espetáculos é a maneira como tanto a
dramaturgia como a encenação conseguem dialogar diretamente com o espectador de
hoje. No caso dos dois espetáculos citados acima, o tempo histórico é concentrado e
ativado no tempo presente – o que revela a experiência representada do tempo
histórico no teatro e seu caráter de atualização. Vale comentar que tais peças foram
escritas nos anos de 92 e 94; contudo, é interessante perceber que Denise Stoklos
continua sempre renovando seus espetáculos ao longo dos anos. Conforme seus
solos se apresentam em diversos locais, eles adquirem mais amadurecimento a partir
do contato com o público. Sobre isso, podemos tomar o ocorrido na leitura de ‘’Um fax
para Colombo’’. Ao tratar diretamente sobre o tema da colonização na América Latina,
o texto se aproxima mais das nossas questões culturais, já que toda a nossa História
se desenvolveu a partir da vinda dos europeus para o nosso continente. Contudo, no
debate do quarto dia de leitura, quando um espectador pergunta por que Denise
Stoklos vem com pouca frequência ao Rio de Janeiro, ela responde que não
compartilha esta impressão. Diz que vem com certa regularidade para nossa cidade
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assim como viaja com seu trabalho para outras lugares do Brasil, já que atualmente
está investindo com mais força no circuito nacional. Na conversa, a performer
compartilha que está o tempo todo em ritmo de viagem, em movimento tempo-espaço,
e que essa é uma das características da vida mambembe dos artistas de teatro. No
fluido da questão, ela conta que as recepções de seus espetáculos possuem diversas
ressonâncias de acordo com o público de cada local. A vivência de cada espectador
permite que seus espetáculos ganhem sempre novas leituras de recepção. Como
exemplo, ela comenta que as condições de miséria abordadas em ‘’Um fax para
Colombo’’ são vistas de diferentes formas em cada lugar do mundo. Enquanto que no
Brasil o público identifica tais questões diretamente com a fome e a falta de recursos
básicos para a sobrevivência; na Europa onde existe uma maior estabilização
econômica, a miséria estimula nos espectadores um sentimento relacionado à solidão
humana.
De acordo com a percepção que Denise Stoklos mantém a partir do contato com
público de cada local onde se apresenta, ela opera procedimentos de renovação na
dramaturgia e na cena para que seus espetáculos não fiquem datados e se
mantenham sempre vivos. Em relação a isso, vale fazer uma comparação da escolha
do primeiro e do último espetáculo (‘’Casa’’ e ‘’Preferiria não?’’). O primeiro foi escrito
em 1990 na época do surgimento do uso massivo da internet. Isso estimulava o
espectador daquela época a assistir a narrativa desse personagem dentro de uma casa
quase como um anúncio do que estaria para se configurar como a era dos reality
shows. Enquanto isso, em ‘’Preferiria não?’’, Denise Stoklos insere na narrativa do
escriturário nova-iorquino de 1860 as relações com o uso das novas mídias
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contemporâneas como o facebook4. A discussão sobre a internet traz para a cena o
caráter de anonimato dos personagens que Denise Stoklos cria para suas
dramaturgias. Raramente eles recebem um nome específico. A proposta é que
qualquer espectador possa encontrar em tais personagens alguma identificação,
independente das questões de gênero, idade, raça, lugar etc.
Em relação a isso, posso dizer que ao longo do evento, havia um público bastante
heterogêneo. Observei desde a vinda de um público idoso até crianças que eram
acompanhadas pelos seus pais. No meio disso, é importante registrar a vinda de
jovens estudantes de artes cênicas e profissionais de teatro de longa experiência na
carreira. Vejo a diversidade de espectadores como uma qualidade rica de aproximação
e criação de público que são constantemente promovidas pelo Teatro Essencial. Com
quarenta e quatro anos de experiência no teatro, Denise Stoklos consegue ao mesmo
tempo manter o interesse do seu público de origem como de sempre estar atraindo a
atenção da nova geração. Podemos dizer que o Teatro Essencial toca diretamente na
questão do humano na medida em que conscientemente busca a representação do
outro. Isso se torna mais nítido em ‘’Amanhã será tarde e depois de amanhã nem
existe’’, onde refletimos que viver é olhar aquele que está do nosso lado. Percebemos
que o ser humano é uma reserva de experiência e que as relações entre as pessoas
estabelecem construções de saberes. Denise Stoklos busca no teatro o ritual do
encontro entre as pessoas como a criação de um espaço-tempo compartilhado para
falar da natureza humana sem fins utilitaristas. Aceitar que o outro existe só para ser é
4 É importante comentar que Denise Stoklos usa o seu facebook como uma forma de comunicação e divulgação
dos seus espetáculos. A artista sempre se preocupa em postar comentários, reflexões e anúncios de seus trabalhos, o que permite que seu público esteja sempre informado sobre a sua trajetória.
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na verdade aceitar a si mesmo. O Teatro Essencial não busca o público como um
consumidor comercial. Denise Stoklos não faz entretenimento forçado. O seu teatro
se torna uma possibilidade de evento, de relação, de troca constante de pensamento,
diálogo, afetos e questionamentos.
No primeiro dia da segunda semana do evento (quinta-feira, dia 18), Denise Stoklos
preparou uma dinâmica diferente dos dias anteriores. Ao invés de fazer uma leitura
corrida do texto, ela escolheu partes específicas na medida em que lia e fazia
interrupções explicativas para comentar parte do processo de criação do espetáculo.
Além disso, ela trouxe o vídeo de uma gravação de quando ‘’Desobediência civil’’ foi
apresentado no Teatro La Mama em Nova Iorque. A leitura foi realizada
simultaneamente com a exibição do vídeo. Os que estiveram presentes vivenciaram
uma experiência rara, tendo em vista que dificilmente Denise Stoklos permite o acesso
direto ao registro visual de algum de seus espetáculos. Ao longo de sua carreira, ela
sempre se preocupou muito com o caráter da presença, da instauração da experiência
do instante e do encontro do público com a obra de arte. Por esse motivo, a artista não
acredita que seu teatro se enquadre em qualquer outra mídia a não ser o próprio
veículo teatral. Inclusive antes de exibir o vídeo, Denise Stoklos comenta que o mesmo
foi gravado em formato despretensioso, apenas para fins de registro e memória de seu
acervo.
Enquanto ela lia, o vídeo era exibido sem som. Como espectadores, ficamos
revezando o nosso olhar entre a leitura que era feita naquele momento -Denise Stoklos
ao vivo 2012-, e o vídeo que era exibido -Denise Stoklos vídeo 1997-. Fomos
colocados numa situação de difícil escolha. Por breves momentos, a imagem do vídeo
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nos sugava completamente, porque estávamos diante do registro de uma apresentação
feita há mais de dez anos. Isso criou um curto-circuito interessante para nós
espectadores, apreciadores dessa oportunidade única de escutar a voz e assistir ao
registro de como foi realizada a montagem. Somente no final da leitura, Denise Stoklos
pediu que seu assistente Augusto aumentasse o som para que escutássemos a música
de Elis Regina. Ela conta que todos os seus espetáculos terminam com uma música
da cantora5. No vídeo, vemos Denise Stoklos ser ovacionada pelo público americano.
Ouvimos o som de uma espectadora da plateia do La Mama dizer ‘’I love you, Denise’’.
Ela aproveita a situação para comentar que, independente do lugar e da língua6 em
que estão sendo apresentados, os seus espetáculos sempre conseguem tocar os mais
diversos públicos ao redor do mundo. A poética teatral presente em seus espetáculos
revela a mobilização através da capacidade sensível de compreender as questões
universais, como a força da sobrevivência humana.
Na sexta-feira (no dia 19), na leitura de ‘’Vozes Dissonantes’’, houve um
acontecimento inédito em relação aos outros dias do evento. O espetáculo começou
numa vibração altamente contagiante. O riso se perpetuou imediatamente de um
espectador para o outro. O jogo cômico se instalou de uma maneira multiplicada. Ao
longo da leitura, o humor irônico estimulado pela dramaturgia e pelo belo trabalho de
interpretação da atriz levou o público para um riso sem fim. A progressão da leitura
5 Em 1982, Denise Stoklos criou o solo performance ‘’Elis Regina’’ como forma de fazer uma homenagem para a
artista que lhe serviu de inspiração ao longo de sua carreira. Denise Stoklos não chegou a conhecer Elis Regina em vida, por isso fez o espetáculo como uma forma de realizar o encontro entre ambas no palco. 6 Denise Stoklos é uma das artistas brasileiras que mais circulou com seu trabalho ao redor do mundo: 33 países.
Ela costuma apresentar os seus trabalhos em outras línguas (no caso: português, inglês, francês, espanhol, ucraniano, russo e alemão).
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acompanhou o desenvolvimento do riso debochado para uma crescente visão crítica e
política da construção da cultura nacional. Chegando ao final, a interpretação de
Denise Stoklos alcançou um estado de revolta e indignação. Enquanto fazia a leitura,
suas mãos batiam fortemente na mesa. Uma folha de papel do texto que ela fazia a
leitura voou pelo espaço sem que isso tivesse sido ensaiado ou planejado. No final da
leitura, todo o público foi tomado por um sentimento de comoção. Percebemos que por
trás do humor, havia um desejo da artista de trazer para a sala de teatro a consciência
de nossa história. Antes de finalizar formalmente a leitura, todos imediatamente se
levantaram para aplaudir de pé. Foi a primeira vez que isso aconteceu em todos os
dias do evento. Entre os barulhos das palmas, ouvíamos sons como o soluçar de
algumas pessoas chorando. Terminados os aplausos, todos se sentaram. Ninguém
conseguia falar nem a própria Denise Stoklos. Houve a necessidade de um silêncio
para absorver por mais um instante tudo aquilo que havia sido provocado. O título do
espetáculo ‘’Vozes Dissonantes’’ se tornou concreto. Após um minutos de silêncio, ao
tomar novamente a palavra para si, Denise Stoklos começa o debate agradecendo aos
poucos que estavam presentes porque vieram ao teatro por opção, enquanto que
muitos outros optaram por deixar suas ‘’vozes dissonantes’’ em casa para assistir ao
último capítulo da novela7. A plateia desse dia estava bem mais vazia do que de
costume, fato que ocorreu ironicamente no dia em que a peça escolhida tratava de
comemorar a nacionalidade. ’’Comemorar’’ quer dizer ‘’memorar juntos’’. E juntos
estávamos apenas aqueles que fizeram a opção de vir ao teatro. Não éramos muitos,
7 ‘’Vozes dissonantes’’ foi apresentado no mesmo dia em que estava sendo exibido o ultimo capítulo da novela
‘’Avenida Brasil’’ da Rede Globo de Televisão.
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mas como sempre comenta Denise Stoklos, amor de público é igual ao amor de filho.
Não se mede pela quantidade. É um sentimento múltiplo na existência da cada um.
O final dessa leitura revelou como o público foi afetado pela mistura das mais diversas
sensações (riso, choro, comoção, consciência crítica etc). Isso também pode ser
observado em ‘’Calendário de Pedra’’. O texto foi originalmente escrito para ser uma
tragédia. No debate, após a leitura desta peça, Denise Stoklos assume que antes da
estreia em 2001, uma mulher que estava presente num dos ensaios comentou que
havia adorado ´´aquela comédia’’. Ao ouvir este relato, Denise entendeu que na
verdade o que para ela parecia uma tragédia apresentava um grande potencial de
comicidade. A partir dessa conscientização, ela foi repensando a escritura de seu
espetáculo. Contudo, o que pretendo trazer para esta discussão é que todos os
espetáculos do Teatro Essencial ultrapassam as fronteiras dos gêneros. Talvez seja
um falso problema tentar definir os gêneros dos espetáculos de Denise Stoklos.
Instala-se um lugar híbrido no qual encontramos justamente toda a riqueza de nuances
do Teatro Essencial: a capacidade de levar os espectadores para múltiplos lugares de
sensações, lógicas, leituras, surpresas etc. Inclusive no próprio debate, Denise Stoklos
afirma que o teatro opera como um lugar lúdico, onde temos a licença poética para
brincar livremente com os fatos da realidade. Como exemplo disso, ela comenta que o
teatro é o local onde o clown ri da insuficiência de si mesmo. O teatro não é o lugar da
conclusão, mas das tentativas de elaboração. Percebo que para o Teatro Essencial
existe sempre um canal tragicômico que perpassa todas a suas peças. O humor
funciona como instrumento crítico para compreender as condições históricas e sociais,
o que ajuda a situar o nosso papel como ser humano nos dias de hoje.
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Já no último dia do evento, pudemos assistir a encenação da sua peça mais recente
‘’Preferiria não?’’. Inclusive, é importante comentar que o mesmo espetáculo havia tido
uma curta temporada no Rio de Janeiro neste mesmo ano entre os dias 5 e 15 de abril,
ou seja, cinco meses antes. Aqueles que estiveram presentes na primeira temporada
do espetáculo no Rio de Janeiro puderam notar como a mudança do palco italiano do
Teatro Nelson Rodrigues para a sala do espaço Mezanino do Sesc Copacabana trouxe
para o espetáculo uma dinâmica maior na interação público - espetáculo. Como
comentei no início do texto, a sala preta do espaço Mezanino combinou diretamente
com a proposta minimalista do Teatro Essencial. Além disso, a curta distância platéia-
palco sem nivelamento maior do palco em relação ao chão permitiu uma imersão direta
do nosso olhar com o corpo da performer e a sua elaboração psicofísica na contação
da narrativa. O espetáculo ganhou linhas de força mais vibrantes na instalação da
conectividade comunicacional.
Como experimentação dramatúrgica para ´´Preferiria não?´´, Denise Stoklos aborda a
metáfora da fita de Möbius8 para falar da experiência de quando uma coisa continua
diretamente na outra, não havendo começo nem fim. Isso revela que nós estamos nos
renovando perpetuamente. Estamos sempre ganhando novas condições, porque
somos um repertório contínuo de experiências. Por isso, os espetáculos do Teatro
Essencial sempre despertam no espectador a consciência crítica para não deixar que a
sociedade nos esvazie. Nesse sentido, é válido constatar que as peças do Teatro
8 ‘’Uma fita de Möbius é um espaço topológico obtido pela colagem das duas extremidades de uma fita, após
efetuar meia volta numa delas’’. Para este espetáculo, a fita de Möbius serve como a metáfora da adaptação dramatúrgica que Denise Stoklos fez a partir do livro ‘’Bartleby, o escrituário’’ de Herman Melville. No caso, há um desdobramento de continuidade na interação atriz e personagem. Ambas estão interligadas por um processo no qual não há um fim entre elas, mas sim uma infinita continuidade.
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Essencial nunca acabam quando as portas se abrem e o público vai embora. Elas
continuam na memória do espectador. Posso constatar que muitos alegaram sair das
leituras com uma sensação de tonteira e de mobilização de suas sensações. Não
utilizo a palavra ‘’tonteira’’ no sentido de um vago mal-estar, mas sim ao tentar
expressar uma sensação de perda de equilíbrio, porque somos deslocados do lugar
comum e levados para outros estados de reflexão.
Notas sobre algumas curiosidades observadas no diálogo entre Denise Stoklos e
seu ‘’público essencial’’:
As leituras são sempre seguidas de debates, momentos importantes quando é
permitido um espaço de troca e diálogo entre a performer e o seu público. A produção
coletiva do diálogo é a possibilidade de extensão da criatividade dos espetáculos
incluindo a observação crítica do espectador, o que permite o amadurecimento
gradativo das peças ao longo dos anos. É importante comentar que o Teatro Essencial
é composto por um repertório de espetáculos os quais estão sempre voltando em
cartaz. O que permite justamente a continuidade dos trabalhos é a preocupação do
Teatro Essencial em estar todo o tempo buscando o diálogo com a atualidade do seu
espectador. Ao longo de todos os dias, eu fazia notas das observações e questões
levantadas durante esses encontros. Coloco abaixo casos que considerei
interessantes para deixar registrado nesse ´´testemunho teórico´´9:
9 Não faço referência aos nomes dos espectadores, até porque não conheço diretamente todos os que estavam
presentes ao longo dessas duas semanas. Contudo, a minha preocupação principal foi sempre colocar-me como voyer-crítico. Isso é, busquei instalar a minha presença através da observação do que ocorreu antes, durante e
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-Denise Stoklos comenta que ficou receosa com o primeiro dia, porque não sabia se haveria
público. Estava chovendo bastante do lado de fora. Ela agradece pela vinda das pessoas e
comenta que ela considera ter o melhor público do mundo. Ela diz que a sua imagem não está
associada a uma figura mercadológica. Logo a vinda do público para o seu teatro é um gesto
infinito de opção crítica e consciente. No mundo da era do excesso de informação, o teatro se
torna uma resistência, porque é uma arte que trabalha sobre ideias, ideologias e
questionamentos. Logo, o teatro se torna um instrumento de libertação. Para ela, a visitação
do público é a sinalização de reconhecimento, sendo motivo que a faz seguir trabalhando
exaustivamente.
-uma espectadora revela que assistiu ‘’Casa’’ em 1992 e que naquela época ela odiava teatro.
Ela conta que o trabalho de Denise Stoklos apresentava uma linguagem muito diferente, o que
a surpreendeu enormemente. A partir daquela experiência, ela começou a frequentar mais o
teatro. Ela termina a sua fala dizendo que fez questão de trazer para essa leitura o seu filho e
o seu sobrinho.
-no terceiro dia de leitura (‘’Amanhã será tarde e depois de amanhã nem existe’’), uma
espectadora contou que ao assistir a leitura, ela lembrou imediatamente das performances de
Marina Abramovich e de como a imagem da artista sérvia sempre vinha em sua mente ao
pensar em Denise Stoklos.
-um espectador presente no terceiro dia de leitura comentou que esteve presente no dia
anterior; e que segundo suas impressões, o público do segundo dia saiu muito calado. Houve
após as leituras. Além disso, é importante comentar que em relação às falas transcritas, há uma pequena margem de criação, porque não utilizei gravador de áudio. Primeiro porque não era permito pela produção do evento, segundo porque eu fiz uso da minha memória como estratégia proposital para aquilo que impactasse maior curiosidade e interesse.
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poucas perguntas no debate e o público logo em seguida foi embora; parecia que a questão
proposta pela peça ‘’Um fax para Colombo’’ estava resolvida. Em comparação, o público do
terceiro dia estava mais receptivo. O debate foi muito mais caloroso. Segundo este
espectador, o momento da leitura do terceiro dia deu uma resposta para o ocorrido no dia
anterior.
-no quarto dia do espetáculo, uma espectadora pergunta se a ordem das peças foi feita
segundo a cronologia de criação do repertório e se os dias escolhidos para as leituras tinham
sido propositais. Denise Stoklos responde que a escolha das peças seguiu sim a ordem
cronológica de sua criação, porém que os dias escolhidos para a leitura não tinham vínculo
proposital com a estética específica de cada peça. A espectadora conta que pensava que sim,
porque a leitura de ‘’Um fax para Colombo’’ se deu no dia 12 de outubro (dia do Descobrimento
das Américas). Denise Stoklos se surpreende, porque constata a informação e revela que não
havia sido proposital, mas que as suas obras sempre estão abertas para a construção de
sentidos que o público pode configurar; daí a relevância de troca mútua na relação obra de arte
/ recepção do espectador no que diz respeito ao Teatro Essencial. As conexões estabelecidas
pelo espectador fazem com que o impossível se torne presente somente a partir da experiência
de um tipo de trabalho que se predispõe a isso. No dia 18 (quinta-feira), na fila de espera antes
de entrar na sala de apresentação, eu escuto uma conversa de duas senhoras que comentam
o ocorrido. Uma delas diz: ‘’Isso não foi coincidência, foi sincronicidade’’. Deixo a minha
curiosidade registrada.
-Denise Stoklos conta que recentemente foi informada pelo seu irmão que ela recebeu uma
homenagem. O seu irmão estava no aeroporto e comprou a revista ‘’Claúdia’’, edição de
comemoração dos 51 anos da revista. Saiu uma matéria especial que escolhia 51 mulheres
que haviam mudado a história da humanidade, e que Denise Stoklos estava entre uma delas.
As palavras gestuais de Denise Stoklos: A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico. de Davi Giordano de Davi Giordano
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O público do teatro aplaude imediatamente como retribuição pelo prestígio. Denise Stoklos
agradece e diz que se sentiu muito feliz pelo elogio e reconhecimento de seu trabalho.
-Um espectador protesta dizendo que ficou imensamente incomodado pelo fato da mesa de
leitura de Denise Stoklos não ser transparente. Ele disse que sentiu muita vontade de ver todo
o corpo da performer em movimento enquanto ela fazia a leitura, principalmente o movimento
de suas pernas e dos seus pés, e pediu que a produção do Sesc trocasse a mesa. O público
ri.
-Denise Stoklos revela que possui uma enorme preocupação para fazer o tempo do espectador
valer à pena. Uma espectadora idosa disse que naquele dia a leitura havia recompensado o
prazer de ter ido ao teatro. Denise Stoklos agradece.
-uma espectadora elogia a maneira como Denise Stoklos consegue provocar humor em seus
espetáculos e pergunta se o humor é um instrumental crítico. Denise Stoklos responde que é
possível fazer esta consideração e para isso cita o autor Henri Bersgon (‘’O Riso’’) para
comentar que ‘’o riso liberta’’.
-Uma espectadora conta que havia ido numa leitura anterior e voltou pelo impacto que a
experiência lhe havia causado. Nisso, ela conta que conversou com uma amiga no telefone
antes de ir novamente assistir a leitura do dia 18. A sua amiga perguntou o que ela havia
achado e ela respondeu: ‘’Ela (Denise Stoklos) é uma indignada’’. A amiga pergunta: ‘’E o que
você achou da leitura?’’. Ela responde: ‘’Achei um canto de força para a vida’’.
-No debate após a leitura de ‘’Desobediência Civial’’ no dia 18, uma espectadora comenta que
a proposta da dramaturgia em fazer uma relação entre os textos de Henry David Thoureau e
Paulo Freire fizeram com que ela se lembrasse de temas como políticas públicas de cultura e
educação. Denise Stoklos aproveita o pretexto e revela que está dando andamento para um
projeto que irá abrir novos caminhos para sua carreira: que é a junção teatro – cidadania –
As palavras gestuais de Denise Stoklos: A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico. de Davi Giordano de Davi Giordano
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educação – cultura. Denise Stoklos conta que sente a necessidade de levar o teatro para além
da moldura convencional da caixa preta. Diz que agora está numa fase mais madura de sua
vida e que o caminho da ‘’arte educação’’ é a possibilidade que ela tem para compartilhar o seu
repertório de referências adquirido ao longo de sua jornada profissional; e que nesse momento
ela não quer ‘’fazer reserva de mercado’’. Ao invés disso, ela precisa passar essa experiência
acumulada para estar junto com uma maioria pensante e sensível. Por isso, ela anuncia seu
futuro projeto que será realizado no Rio de Janeiro no Complexo do Alemão.
-no meio do diálago caloroso e intenso, Denise Stoklos fica contente e diz: ‘’O debate já está
virando um fórum’’. Vemos uma expressão de felicidade no rosto da artista.
-uma espectadora comenta que veio anteriormente na leitura de ´´Um fax para Colombo´´ e
que desde aquele dia, ela continua lembrando precisamente sobre partes do texto. Ela
comenta que inclusive quando toma banho, o texto continua ressoando dentro dela. No final,
ela pergunta sobre a publicação e venda dos livros das peças, porque precisa entrar
novamente em contato com o texto que recentemente assistiu.
-no dia 19 na leitura de ‘’Vozes Dissonantes’’, no momento do debate, um espectador se
manifesta: ‘’Vir aqui apesar da ‘Carminha10’, isso é o que me faz tomar um choque’’.
-um espectador pede um momento para falar: ‘’Há doze anos, vi Vozes Dissonantes neste
mesmo espaço do Sesc. Há anos eu procuro algo parecido no teatro e não encontro. Eu só
gostaria de te agradecer’’.
-quando já estávamos para chegar no fim do debate do dia 19, Denise Stoklos fez um apelo
para o espectador: ‘’Vamos dançar, porque é frutífero...é bom...não há outra forma’’. Vale
esclarecer que ela fez uso da palavra ‘dançar’ dentro do contexto da leitura de ‘’Vozes
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O espectador faz referência a uma personagem popular da telenovela que está sendo exibida durante o momento do debate.
As palavras gestuais de Denise Stoklos: A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico. de Davi Giordano de Davi Giordano
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dissonantes’’. ‘Dançar’ como buscar nossa voz que ressoa, aquilo que segue criando um eco e
multiplicando uma sensibilidade de reflexão artística e social.
-uma bailarina toma a palavra para contar que ao assistir um espetáculo de Denise Stoklos em
São Paulo, ela sentiu a necessidade de trazer para o seu trabalho de dança um pouco da
linguagem teatral. Ela pergunta para Denise se ela pretende em breve dar um curso sobre o
Teatro Essencial. Denise Stoklos responde que possui tal desejo, e comenta que só realiza
cursos quando há uma instituição ou órgão patrocinador que viabilize a realização de um curso
coletivo onde os participantes não precisem pagar pela experiência. Aproveita e comenta que
sempre se preocupou em não colocar valores altos para os ingressos de seus espetáculos,
porque ela está sempre preocupada no acesso e viabilização de sua arte para o público.
Considerações finais
É interessante pensar que as experiências do Teatro Essencial nunca terminam
quando as portas do teatro se fecham. Os espectadores saem pensativos, refletindo e
ainda imersos na experiência teatral. Há uma mistura de sensações que considero
difícil traduzir em palavras neste escrito. As imagens e os textos dos espetáculos
seguem ecoando planamente no imaginário, no inconsciente e no estado de ânimo
daqueles que estiveram presentes nas experiências das leituras.
Isso pode ser constatado pelo fato de sempre no final de todas as leituras, ao sair da
sala de apresentação, o público rodeava a mesa onde se encontravam os livros do
Teatro Essencial que estavam disponíveis para venda. Isso revela que a vibração
instalada pelas leituras despertava nos espectadores o desejo de conhecer um pouco
mais sobre o repertório do trabalho de Denise Stoklos. O sucesso dos livros foi tão
As palavras gestuais de Denise Stoklos: A experiência do teórico-espectador como voyeur-crítico. de Davi Giordano de Davi Giordano
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grande que no último dia da primeira semana, quase todos os livros já haviam sido
vendidos. O que necessitou que a produção trouxesse mais livros de São Paulo para a
segunda semana do evento.
Todos os dias do evento possuíam um caráter relacional intrínseco. Tais encontros
transformaram o espaço do Mezanino num local de convívio no qual se estabeleceram
modos de contato e invenção de relações. Observei que muitos espectadores
estiveram presentes na maioria dos dias, o que revela que há um público bastante fiel.
O Teatro Essencial é um elemento de ligação que forma nos espectadores a metáfora
de uma gelatina conectiva e aglutinação dinâmica.
As leituras foram possibilidades únicas de entrar em contato com parte considerável
do repertório do Teatro Essencial. A minha impressão é que as leituras funcionaram
como possibilidades de encontros com as questões mais tocadas pela obra da artista:
o Amor e a celebração da vida. Através da experiência artística de assistir às leituras,
passamos por um processo de reflexão metafísica sobre a nossa condição de atuante
no mundo. Ao terminar este texto, gostaria que a minha curiosidade crítica em relação
ao Teatro Essencial se multiplique e alcance outras pessoas que estejam interessadas
em pensar numa maior articulação arte – vida como instâncias mutuamente
necessárias para o sentido da existência humana. O Teatro Essencial está presente
em cada um que acredita na possibilidade do teatro como renovação humana, como
valor político e social.