as ideas liberaes, ultimo refugio dos inimigos da religiao e do trono

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r'vá _A. As 5 É? (l 'y .. IDÉwzs LIBERJEs, ULTIMO REFUGIO DOS INIMIGOS fã” DA RELIGIÃO E D0 THRoNo. Obra traduzida da Lingua Italiana, da se gunda edição feita em Florença em 1817, e destinada á instrucção da' Mocidade Portugueza , P.0 R JOAQUIM JQSE PEDRO LOPES.. LISBOA: NA IMPRESSÃO REGIA. ANNo 1819. m Com licença.

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As Idéias Liberais, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religião e Do Trono. Obra traduzida da língua italiana, da segunda edição feita em Florença em 1817, e destinada a instrução da Mocidade Portuguesa, por Joaquim José Pedro Lopes. Lisboa, 1819

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Page 1: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

r'vá _A.

As 5 É? (l'y ..

IDÉwzs LIBERJEs,

ULTIMO REFUGIO

DOS INIMIGOS

fã”

DA

RELIGIÃO E D0 THRoNo.

Obra traduzida da Lingua Italiana, da se

gunda edição feita em Florença em 1817,

e destinada á instrucção da' Mocidade

Portugueza ,

P.0 R

JOAQUIM JQSE PEDRO LOPES..

LISBOA:

NA IMPRESSÃO REGIA. ANNo 1819.

m

Com licença.

Page 2: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono
Page 3: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

PREFAÇÃO Do TRADUYCTOR.

\

Assim como tem havido grande

cuidado nos falsos_.Filosofos do Secu

lo em disseminarem entre a incauta

Mocidade as máximas , e principios

oppostos áboa ordem civil, e ao culto

da Religião , conspirando todos elles

para a propagação de seus erros por

todos os meios possiveis, tambem não

tem faltado homens de saber e cons

tancia, que arrostem , como valentes

campíões , contra esses fataes inimi

gos do Altar e d'o Throne, vencendo

e anniqfuilando seus sofismas , e for.

mando hum clique incontrastavel á

torrente devastadora, que , com o no

me de Ideas e Instituições ,Eber-aos,

se diffun'dio nos ultimos tempos na

Europa; Ideas apregoadas pelos seus

seqnazes como as mais sãs e as mais

uteis aos Governos e aos Povos; mas

`que infelizmente a experiencia tem

K .ostradø Serem. as mais ruinosas a

eews , e as mais Ãremendas âquelles ,

2

ui...

Page 4: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

4

cavando a huns e outros hum abysmo

de desgraças. Como este mal tem

subtilmente grassado por toda a par

te ,ç não deixão os dominios da Coroa

de Portugal de ter sentido algum -tan

to os seus effeitos, se bem que menos

que os outros Estados Europeos : ao

ouvirmos os discursos de al uns sujei

tos ,'e ao vermos o proce imento de

outros, facilmente se descobrem os

symptomas da gangrena moral de

que estão inficionados seus corações;

e o homem observador, ao passo que

penetra a hypocrisia de muitos dos

sequazes das falsas doutrinas , se ad

mira da audacia de outros , que as en

sinão, e põem por obra ás bandeiras

despregadas. A fatalindifferen a que

se nota em tudo , d'onde proce e? He

in'differente o Negocíante sobre o mo

do de enriquecer, seja anhando lici

tamente , seja rouban o , huma vez

que aRe'liãião para elle he hum mero nome. le indifferente o Magistra

do sobre dar sentença justa ou injus

ta, huma vez que não teme hum Deos

que o há de julgar. He indifferente o

lEcclesiastico sobre a modestia, e so

bre o digno desempenho do seu ca

`racter , huma vez que considera a

Religião como unico .meio de ganhar

Page 5: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

5

a vida: e assim o Militar ,~_o.A~rti-st-a,

o Nobre , e o Plebeo, seja qual for

a sua classe. Hum-homem indifferen

te no que toca ârReligião, por força.

o. ha de tambem ser no que toca ao

bem do Estado , e nunca tem zelo por

cousa alguma. que lhe não traga. pro

veito. Eis-aqui o. estado em que a

falsa Filosofia quer constituir o ho

mem , o que infelizmente em grande

parte ha conseguido; buscandosobre

tudo imprimir assuas chamadas Ideas

liberaes , que a esse fim conduzem,

nos tenros corações da Mocidade. Co

mo hum bom antídoto contra este ve

neno , tomei o trabalho de traduzir e

publicar a presente Obra , tendo em

vista a Mocidade, que passa das Au

las , ou da casa paterna ao commer

cio do Mundo , para que prevenida

evite os. laços que .nelle a esperão.

He hum erro nos Pais e nos Mestres

occultar aos mancebos os perigos , e o

conhecimento , com a devida refuta

ção, das doutrinas perniciosas: como

podem evitar-se os males que se não

conhecem, e os sofismas revestidos de

illusoria e apparente verdade? He re

gra muito mais segura conhecer pre.

Viamente o mal , e o modo de o evi

tar. Fação pois os Pais e os Mestres.

Page 6: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

6

ler esta, e outras obras de igual na

tureza , aos mancebos , para que em

seus corações se arreiguem as maxi.

mas sãs , e conducentes â sua felicida

de nesta vida e na futura , e ara

1 que estejão armados contra as ci adas

da falsa Filosofia.

Procurei nesta , assim como nas

mais Obras que , ara utilidade pu

blica , tenho publicado , explicar-me

em huma linguagem clara e verda

deiramente Portugueza , não vestida

.á anti a, nem remendada com termos

estran s, (pois. que as palavras, Fi.

nanças, Conducta , Club , e outras

desta natureza de que algumas vezes

uso , já estão naturalizadas . não só

em bons escritos , mas em Diplomas

Regios), fazendo assim que não seja

menos digna por este lado asua leitu

ra. Praza ao Ceo que este meu traba

lho seja agradavel e util aos Portu

guezes , como espero.

Page 7: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

A s

mÉAs LIBEiRAEs.

INTRODUGÇÃQ

OMundo se enganou' summamente

quando, ao ver no anno de 1804 pros

crever-se em França a Democracia,

Se persuadio que oeasâra finalmente a

Revolução; pouco porêmr- tardou que

Bãoconheeesee o seu engano. Bem de.

pressa percebeo a Nação Franeeza

que, procurando livrar-se dos horroâ

res da anarquia , se tinha submettido

lo jugo do mais pezado despotismo,

que jamais affligio o genero huma

HO; e até mesmo os diversos Potenz

tados da Europa quasi subitamente

reconhecêrão que a nova exaltação

dO Chefe do Povo Francez, bem lon

ge de os consolidar nos seus thronos ,

Como se haviã'o lizonjeado , não fize

1% mais que mudar a forma da. sua.

Page 8: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

8'

oppressão. O Governo Monarqui'ca

se tinha de novo introduzido em Fran

'ça ; mas os seus passos erão bem di

versos dos do Governo, que tinha sub

sistido naquella Nação antes do anno

de 1789; e era difficil que não acon

tecesse assim, pois que tanto o novo

Mónarca , como os que o cercavão e

formavão a sua Corte e os seus Con

selhos , todos erão filhos da Revolu

ção. O primeiro , tendo principiado

a sua carreira politica entre osangue

e a mortandade , continuou tambem

no throno a respirar sómente mortan

-dade e sangue: e os outros, tendo sa

boreado a doçura do commando e da

rapina durante a democracia , nada

mudárão do seu habito porterem dei

xado os esquâlidos despojos do Jaco

binismo , e por se verem d°improviso

eondecorados com Ordens e com Ti

tulos. Toda a época do passado Go

verno lmperial, assim como a das

novas Monarquias que â sua sombra ,

â maneira de representações ou scenas

de theatro ,` se tinhão visto surgir em

diversas partes da Europa, se devem

por tanto com justa razão considerar

como hum proseguimeuto da Revolu

ção , e esta não cessou propriamente

senão com os portentosos aconteci

Page 9: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

9

mentos dos annos de 1814 e 1815 , os

quaes, tanto em Fran a , como no

resto da Europa, recon uzírão e sen

târão nos seus thronos os respectivosantigos legítimos Soberanos. o

Se porém ao presente. estão derru

bados todos estes monstruosos Gover

nos , continúão desgraçadamente a

reinar no animo de muitos homens as

horríveis e erroneasmnximas, ue

derão origem â Revolução , so re

que elles se fundavão.l Todos aquelles

que nascêrão depois do anno de 1789,

ou que nessa época , por sua tenra

idade, ainda não tinhão idéa alguma

fixa , continuão a estar em grande

parte a egados aos depravados prin

cipios os direitos originarios dos ho

mens , e da soberania do Povo, que

bebêrão com a educação. A adhe

são aos mesmos principios deve ser

ainda mais forte naquella caterva im.

mensa de pessoas , que , tendo exer

cido empregos civis e militares, ou

nas extinctas Democracias , ou nas

novas Monarquias produzidas pela

Revolução , provârão a doçura destas

duas especies de Governo, tão pródi

gas para com os seus sequazes. Estas

duas classes de pessoas , assim como

os libertinos e os incrédulos , tem

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10

grande interesse em propagar as 'ditas'

maximas erroneas , pois que so por

meio da sua propagação se podem li

zonjear de ver resurgir os sobreditos

Governos revolucionarios , aos quaes

por avareza , por ambição , por im

moralidade tanto estavão afferradas :

e huma indubitavel prova dlisto he o

transporte , que hoje se manifesta em

se fallando nas chamadas Idéas e

Instituições liberaes.

Este vocabulo , considerado em si

mesmo , he totalmente destituídov de

sentido , pois não apresenta idéa al..

guma determinada; mas tem hum sen

tido muito grande , e assaz funesto

no espirito daquelles , que com tanta

frequencia o empregão nos seus dis~

cursos e nas suas obras impressas.

Debaixo desta denominação de Ideas

e Instituições liberaes , entendem elles

a maior parte das maximas que derão

origem âRevolução Franceza , e que

por espaço de mais de vinte annos

encherão o Mundo de horrores e car

nificinas; e principalmente se apre

sentão caracterizados com esta mesma

denominação os seguintes principios ,

a saber : o Governo Constitucional ,_

ou aRepresentação Nacional; os pre

tendidos Delictos de Opinião; a To

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ll

lerancia indefinita em materia de Re

Ií ião; a Lei immoral do Divorcio;

a iberdade indefinita da Imprensa.

A todos he com effeito notorio quan

tos fautores estas erroneas maximas

achárão em Hespanha , quando na

Primavera de 1814 ella tornou a sub

metter-se ao seu antigo legítimo So

berano. Erão em tão grande nume

ro, que chegarão a formar hnma es

Peflíe de seita , que então , e agora

mesmo se conhece pelo nome de Li

beraes. Todos aquelles que compu

nhão as Cortes , e que tinhão com

tanta gloria contribuído para livrar

oReino do jugo estrangeiro que se

he queria impôr , apenas vírão co

roados os seus nobres esforços, logo ,

Por huma contradicção daquellas que

tão familiares são aos homens , pre

tendêrão que o restabelecido Monar

cä houvesse de modelar o seu novo

Governo pelas mesmas maximas , e

principalmente pela primeira , con

cernente ao Governo Constitucional,

não vendo ao menos que, se elle fosse

tao frouxo , ou tão pouco previsto,

que annuisse ás suas representações,

In depressa se acharia a Nação en

volvida. nos inconvenientes e nos de

Sastres , para evitar os quaes , com

/

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12

admiração de toda a Europa , tinha

combatido pelo espaço de seiscom

pletos annos. e

O mesmo apego ás pretendidas Idéas

liberaes se vio em França , e justa

mente na mesma época. Todosrolha

vão a Representa ão Nacional como

o unico Palladio a Nação, tendo-se

esquecido de que , tanto durante a

Democracía, como sob o Governo

Imperial, não -havia esta mesma Be

presentação Nacional produzidobom

effeito algum. ' A liberdade da Impren

sa era outro objecto que interessava

toda a Nação , sem reflectir que a.

essa liberdade era devedora da con

tagião das maximas que tinhão pro

duzido- a Revolução. E pelo que to

ca á Tolerancia indefinita em materia.

de Religião , ou alias â indifferença.

total de todos os Cultos , continuava

esta erronea doutrina' a ter então em

França tantos sequazes , que huma

das cousas que entre huma grande'

porção daquelles habitantes mais des

agradava na pessoa de Luiz XVIII.,

era a sua exactidão no diario exerci

cio dos deveres religiosos, e das pra

ticas de piedade.

Tambem se tem igualmenteim-ani

festado , e de não equívoco modo , a.

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adhesâ'o ás pretendidas Idêas liberaes `

em alguns dos outros Estados , que

com a quêda de Napoleão tiverão a

fortuna de verem restabelecidos os

seus antigos Governos legítimos. Em

hum desses Estados foi tão grande o

enthusiasmo pelas ditas máximas er

roneas , e sobretudo pela primeira ,

que ao dirigirem-se os Deputados da

Nação a felicitarem o novo Soberano

restabelecida , chegarão ao ponto de

lhe pedirem o estabelecimento do

Governo Constitucional, ou da Re

presentação Nacional, apezar de não

ter alli jâmais existido d"antes tal es

pecie de Governo.

Outra prova da grandissima pro

pagação actual dos erroneos princí

pios, que se pretendem adornar com es

te especioso nome de Idéas liberaes,

he que Buonaparte invocou tambem

este nome, quando no mez de Março

do anno de 1815 poz os pés em Fran

ça. A7 sua chegada á Capital , todos

Os facciosos envelhecidos nas turbu

lencias da Revolução , ou nos occul

tos meneios do Despotismo, se apre

Sentá/rão em torno delle. Bem via el

e que com tal cortejo não podia il

hldir a parte sã da Nação ; porém

Sabia que o nome de Idéas liberaes

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14

tinha então geral acceitaçãoma Eu

ropa : no mesmo acto por tanto em

que estava resoluto, e, por assim di

zer , obrigado a introduzir hum des

potismo mais pezado que aquelle , a.

que se entregâra antes da sua queda,

proclamou que o seu novo Gover..

no havia de ser o reinado das Ideas

liberaes.

Os vocabulos que não se podem

definir, e que não tem huma signifi

cação exacta , inflammão por sua li

geireza o animo do povo, e auxilião

admiravelmente o genio das Revolu

ções. Para precaver por tanto que os

Governos, que nestes ultimos tempos

fizerão a infelicidade da Europa , não

tornem a pullular em prejuizo do ge

nero humano , releva derrubar a ar

vore arrancando-a pela raiz. He ne

cessario rasgar o véo , com que debai

xo do insignificante , mas fascinador

nome de Idéas eInstituiçõ'es liberaes,

se procura cobrir aos olhos dos sim

plices a natural deformidade das ma- '

Ximas, que derão lugar aos sobreditos

monstruosos Governos. He necessario

mostrar que estas mesmas máximas

não se poderião propagar geralmen

te em nação alguma , sem que nella

se vissem renovados os horrores, em

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15

que desgraçadamente se vio envolta

a França depois do anno de 1789. E

este he justamente o alvo do livro

que offereço agora ao publico.

Não me lizon'eio certamente de que

em virtude delle se convertão os se

quazes das pretendidas Idéas liberaes.

David Hume reflectia muito bem , nos

seus Ensaios , que não ha elequencia ,

que possa convencer aquelles que não

querem deixar-se persuadir ; e neste

caso exactamente se achão as pessoas

de que fallo. Afferradas, como atraz

disse , por ambição , por interesse,

porimmoralidade aos derrubados Go

vernos novos , tão desastrados , não

tem outra esperança de os verem re

mrgír senão diffundindo e 'generali

Zando, por assim dizer , a contagião

dos principios , que forão a princi

Pal causa das revolu ões politicas,

de que se vio agita a desde 1789

grande parte da Europa. Para esse

effeito , como a ultimo refugio , re

correm ás Idéas liberaes, procurando

rfiproduzir debaixo deste nome a

quelle mesmo systema , que pelas

Suas funestas consequencias tão odio

8° Se tinha tornado a todos os ho

mfllfl de probidade. Ora , emmude

W › o frustrar estes Apostolos da re

Page 16: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

16

bellião e da impiedade , não pode ser

obra dos Escritores, mas sim dos Ma.

gistrados. O favor em que depois do

meado do seculo passado entrou a.

Economia Politica, que veio a ser a.

Sciencia da moda, fez que o cuidado

principal dos Governos se diri isse a.

procurar habeis Ministros de äazcn

a e Commercio , não escrupulisan

do muito na escolha dos outros , e

sobretudo daquelles que erão encar

regados da segurança publica , ou

quando muito exigindo que nestes

houvesse meramente a honra. Esta

bastava com effeito algum dia ; pois `

que os delictos não dizião respeito de

ordinario senão ás pessoas particula

res, passando seculos primeiro que se

ouvisse fallar de hum attentado con

tra a authoridade do Governo , e se..

gurança do Estado. Porém as cousas

estão de todo agora mudadas. O lou

vavel modo de pensar antigo sobre o

.respeito e submissão, que se deve aos

Reinantes, está presentemente muito

alterado em grandissimo numero de

`individuos.

Se bem Icom tudo eu me não lizon

jeie de fazer desenganar .aquelles, que

.se achão afferrados aos principios tur

-bulentos e inreligiosos da Revolução,

Page 17: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

17

que ao presente procurão cohonestar

com aespeciosa denominação de Ideas

e Instituições liberaes, nem por isso

perderei o animo , nem julgarei ter

trabalhado em vão. Se esta minha

obrinha não fôr favoravelmente aco

lhida pelas pessoas prevenidas a fa

vor das indicadas maximas , poderá.

prometter-se huma sorte mais feliz

nas mãos da tenra mocidade que ain

da não entrou -no theatro do Mundo.

Para eu alcançar a sua approvação ,

não preciso desejar senão que lhe che

gue ás mãos este meu livro. A lin

guagem sim les e clara da verdade,

que nelle re uz , se fará sem duvida

sentir com toda a sua força desta clas

Se de leitores sinceramente dados ã.

instrucção , e totalmente afastados

das preoccupaçõ'es e das paixões , que

entre as pessoas provectas ordinaria

mente retardão os seus progressos.

Deste modo a mocidade , firmemente

persuadida da enormidade e da funes

ta influencia das máximas Vque tem

produzido tantos males , quando das

aulas passar ao comme-rcio do Mun‹

do , resistirâ fortemente ás insinua

ções daquelles que as patrocinão.

Quando por fim estas máximas cessa

'Em de existir, e asociedade se achar

Page 18: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

18

'composta de huma nova geração mais

virtuosa , e mais bem instruída, :en

tão triunfará. inteiramente d'o›erro

a verdade, seu terei; plenamente al

cançado ol meu intento. '‹ r'

. I", `

` e

1 ` Ú ‹

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'19

cAPLTULo 'Ii

De huma preoccupação que tem con

tribuído muito para accreditar as ma

aa'mas erroneas e pernicz'osas do mo

derno Filoszqfismp. Os fautores das

idéas liberaes ., a. __ƒim de espalharam

00m maior segurança os mesmos er‹

ros, pracar'a'o ¡mina-ar novamente a

mesma preoccupapão.

As Idéas liberaøs, 'segundo os seus

fantores, não são mais que o resulta.:

do dos progressos da; civilização e das

luzes; de modo quo. aquelles vque não

as adoptão ., 'são a seus olhos consided

rados como totalmente estranhos a. es

te novo estado de civilização e decultura. 4 I .

Quando pelo' meadodo Seoolo pas;

sado os Filosofos principíârão a dif

flmdir os mesmos erroneos principios ,

servirão-se do mesmo artificio para.

08 acreditarem. Fizerão `os maiores

elogios do novo. genero. de sapieucia 9

de que se gloriašão de ser invento

2

Page 20: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

20

*res , ao qual imprudentemente derão

-o nome de Filosofia. Não se fartavão

lde exaltar até as estrellas o Seculo

decimo oitavo , porque tinha tido a

jactancia de levar a razão a tão alto

gráo de elevação, denominando-o por

antonomasia o Seculo Illuminado, o

Seculo da Filosofia ; e teve com ef

feito em demasia todo o seu exito

este artificio. As pessoas superficiaes ,

frivolas, e dissi adas, que vivião no

bolicio do Mun o, e que ambiciona

vão nellc figurar , aspirârão todas a

se mostrarem iniciadas neste novo ge

nero de saber, que vião alçado atan

ta honra , e o conseguião com pou

co trabalho; bastava que mostrassem

desprezo de todas as maximas e de

todas as instituições , que nos passa

dos tempos se havião sempre venera

do como fundamento da boa ordem e

do bem da sociedade.

vPara que este mesmo artificio não

roduza tambem a mesma funesta il

usão no Seculo decimo nono , he acer

tado primeiro que tudo demorar-nos

hum pouco em avaliar exactamente

este novo genero de Filosofia , que

tem com arrogancia insultado todos os

conhecimentos dos seculos preceden

tes , .como se os homens tivessem até

Page 21: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

21'

agora estado cegos: he justo se pa

tenteie toda al fraqueza destagran

de preoccupação para' com o Seculo

decimo oitav . ›

Em primeiro lugar pois; se se tra

ta das Sciencias concernentes ao es

tudo e contemplação da Natureza,

ou que lhe dizem respeito, os predi~

cados de honra , que em tanta'copi'a

a cada pagina se tem prodigal-izado

ao mencionado Seculo decimo oitavo ‹,

dever-se-hião aliàs attribuirl ao Se

culo decimo setimo. Foi este-o Secu'

lo em que a Filosofia sahio verda

deiramente da barbaridade em que

tinha por longo tempo-jazida , e no

qual as suas differentes partes fizerão

os maiores progressos. E com effeito ,

sem nos unirmos ao sentimento por

certo muito exaggerado de tantos ho

mens aliàs doutos , os quaes não apre

cião nimiamente os descobrimentos

feitos em nossos dias sobre a Electri

cidade , e sobre as diversas qualida

des do ar relativamente â Quimica;

pode-se francamente asseverar que

taes descobrimentos , como qualquer

outro de que se possa jactar o Seculo

decimo oitavo , quer pelo numero,

quer pela sua importancia , não são

de modo algum para se compararam

Page 22: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

22

com aquelles, verdadeiramente admi

raveis , por meio dos quaes no pre

cedente Seculol decimo setimo os Ga..

lilêos , os Cavalieris, ,os Torriceliis,

os Vivianis , os Cassinis, os Kepleros , os Newtons , os Leibnitzes , Vel

tantos outros genios crcadores , illus

trârão , e levárão a tão grande per

feição a Estatica , a Astronomia , a

Optica, e geralmente Vtodas as partes:

da Filosofia , e da Mathematica ;'e pe..

los quaes a Geografia , a Nautica ,. a.

-Hydrostâtica , e em huma palavraV

todas as Artes, vreceberão tantos au.

xilios novos. z

Ajunte-se a isto, que se hum dos

principaes louvores dos mencionados

grandes homens consiste em terem a

final descobertos) verdadeiro caminho

que se deva seguir para penetrar com.

segurança: nos segredos da Natureza ,. i

e se todos os Fysicos antes delles se

não tinhãopor outro- motivoextra

viado, senãov porque se tinhão lizon

jeado de explicar a `Natureza imagi

nando cansa-s, e descendo destas apóz

os effeitos, quandoldevêrão de come

Içar da consideração d¬estes para che

garem ao descobrimento dlaquellas;

que fincapé se podia jamais fazer

para o adiantamento das Sciencias

Page 23: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

112934

fysieas nos systems: tão Am;cpmizkõoiop

de Maillet , de l'a Metrio .,. do Robin

net, defBaiHy , .e .de tantosoutrofi #61

poculadores do Seculo decimo oiítê.,

v0, qzue da admiK-öflfil Obra da' CRQG'ÇÉÍQ

formânão huma gmâgonça ,. na qml

oridiclllo .e .o absurdo .dispmäo áposz

fia asuperioxƒidade.? E gueoutra. _cqur `

sa contém realmentsbsees mesmosisysf

ums mais que .hypothoses a. swmf

pias vagos , ml Gklrmnšlz, Bflgfišlhqãw

ecmditos romances? . z; ‹

Pois se Ldos $oiencias , .com se .ch.a‹‹

mão exactaso, passarmos â Qogsjdogë;

,ção das Scionoiasmoraes.,Y war-sonho,

que essa tão deoaoázads suippnioraiado

do Seculo dooimø oitaynfiñøfhfišmr

nos _insubsistente , coxaggemdp. f sta

he .vordsdegigfamfinta ñ. :Paí'ófh 6m W

08 Filosofos modergps. s'e ,mezfao' de

nxcellenoiñ và 6,35.. mailil'ëodfiafiççl'k

*28, olles' se gâabãa de. kilomšmrñêwz;

zlâmmoe voltado-z osmens- estudos é*

Utilidade 1101 , 13.. 55391555) :çfimp

08 bemfeitomsfldo «nero Lhwwiuwyfi"

io Lorem libertâdm s - preosnninêgofêsg

que .agrilhoavzãzo os, nosflm êMQP êêëëâ

dos: masquom não sabe qpçfiqdg. a

me dos - Filasbäos fmodsrnøfi fconäésêfi

-em ,huma ô IlSfQI'mQçãQf,mêglRfi¬¿flƒë-'

.palavras 2.l m épodfi.:w‹ `Brqsomsf

Page 24: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

24

ignorar, que elles entendem por erros

e preoccupaçõ'es todas as opiniões e

todas as instituições , que em todo o

tempo tem sido olhadas como bases

da felicidade do homem , e da socieda

de? A pugnar contra estas opiniões e

instituições geralmente recebidas se

reduzem'todas as obras moraes e me

tafysicas , que ha hum Seculo a esta

parte tem sabido â luz na Europa. As

sim , as Sciencias moraes, e puramen

te intellectuaes são a parte em que o

decimo oitavo Seculo ainda perde

mais, huma vez que se compare com

os outros que o precedèrão ;V e bem

longe de lhe competir o pomposo ti

tulo de Seculo illuminado, de Seculo

filosofico , merece antes ser chamado

Seculo de trevas, e de ignorancia.

Mas isto , que deve ser o cúmulo

da humiliação para a Filosofia mo

derna, he tal, que ainda mesmo nes

tes seus extravios não tem ella sequer

o mérito da invenção , e he servi] e

plagiaria em tudo aquillo que tem

pretendido dar-nos como resultado dos

seus mais preciosos descobrimentos.V

Alguns homens de peito, nos quaes

o zelo pela manutenção do Culto cor

respondia ás luzes de que erão dota

dos , tomarão por empreza descobrir

l

Page 25: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

25

este plagio dos Filosofos modernos

naquella parte dos seus erros, que res

peita â Religião ; e demonstrârão, que

no ataque do Christianismo nada mais

fizerão estes Filosofos, que repetir as

mesmas objecções apresentadas em ou- '

tro tempo por Celso , Porfyrio , eJu

liano, calando as victoriosas respos

tas dadas a estes pelos antigos Apo

logistas ; e que no combater a. Reli

gião natural não fizerão mais, que pôr

de novo em campo as opiniões e os

erros de Demócrito, de Anaxâgoras,

de Thales , e de Epicuro, que Cice

ro , Seneca, e Plutarco tinhão soli

damente refutado. E este assumäto,

que tem sido levado á maior evi en

cia, mediante huma exacta confronta

ção da doutrina filosofica antiga e

moderna , não deo pouco auxilio â

causa da Religião; pois que esses ho

mens , que se tinhão deixado alluci

nar , tornarão a crer, vendo que os

escritores em que elles admiravão pe-`

regrina agudeza , e extraordinaria

força de juizo , não erão mais que

huns mesquinhos repetidores dos so

fismas, e das difficuldades tantas ve

zes refutadas`

Não he tambem menos certo , que

0 mesmo plagio commetterão os Fi

Page 26: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

26

losofos modernos no tempo em que

espulhãrão as .suas tão decantadas.i theorías antimonarquicas. Rousseau ,

que foi entre elles o primeiro que fal

lou 'dos direitos originarios- dos ho

mens .. e da soberania do povo, tem

passado por hum engenho superior.

Oen'thusiasmo pela sua Obra do lCon.

trato lSocial excedeu quantos elogios

jámais tenha talvez tido algum outro

livro moderno; e a mesma Assembléa

Nacional de França o considerou co

mo author do novo systema politico

introduzido então naqueile Reino. E

entretanto esta theoría da pretendida'l

soberania do povo , que constitua to

do o fundamento daq'uella tão -exaslta

da Obra, não he mais que a renova

ção de' huma opinião e de hum›systema , queV a-paixão, e oespirito de re

bellião edepartido suggerí'rão ahuns

poucos de escritores do seculo decimo

sexto, e do' decimo setfimo, os quaes

forão logo victoriosamente Jcombati

døs (1).

(l) Sobre o assumpto deste plagio commettido pelo Escritor, cujas ideasA se Vorem

inteiramente originam; tive occusi'ão 'de .fal

lar no meu Discurso Historico Politico so

Page 27: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

2'2

`fliesumindzo por tanto'as reflexiíeol

até aqui feitas , creio poder concluir ,

que nada he mais insubsistente que

esta grande ¡frreve'nçãoV a favor da

Filosofia moderna, e do Seculo deci.

mo oitavo em que ella se introduzio.

No dito Seculo realmente se escreveo ,

e se fallou mais de Filosofia que no

bre a aiztlioridnde do Pon'tifice Romano ,

publicado em 'Genova em~ 'Setembro de

1815, e ainda mais difiusámente me esten

di sobre o mesmo objecto na Obra, que dei

áluz no principio do anno de 1800 'imi

pressa em Veneza na Olficina de Giacomo

Storti. Neila demonstrei que esta doutri

na da pretendida soberania do povo, que os

Filosofos modernos ollião como hum feliz

resultado da razão humana chegada á sua

maior maturidade, outra cousa com effei.

to não he mais que humu repetição dos er

roneos principios de `Buchflmm , de Bota

*mflm do fingido Junio Bruto, de Sidney,

de Milton , e dos outros au'tliores, qu;I

escrevèrão para sustentar e fomentar maio

is rebelliöes que nos ditos dois Scoulos

XVl e XVII perturba'rão a Inglaterra e -a

França, e os quaes, por este seu institutov

e deprimirem a Authoridade Real, forãp.

Então denominados, e ainda na Historialx

df' Direito Publico se deuourinão Malan

comacos, i

Page 28: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

28

Seculo anterior, e em qualquer outro ,

mas todos esses escritos não valem

certamente as Obras daquellcs ho

mens, que no mencionado seculo de

cimo setimo fizerão com seus maravi

lhosos descobrimentos mudar a face a

quasi todas as Sciencias ; o que foi

muito bem expresso pelo doutissimo

Cardeal Gerdil com o bello símile de

huma chapa de metal , a qual perde

tanto em altura , quanto ganha em

superficie (l)

Para acabar porém de destruir es

ta grande ëreven ão pela tão decan

tada nova iloso a do Seculo decimo

oitavo não basta ter demonstrado que ,

tanto pela profundidade da sabedo

ria , como pelo mérito dos descobri

mentos scientificos, elle está muito

abaixo do antecedente Seculo decimo

setimo. He além dlisso necessario fa

zer ver , que os mais celebres Filoso

fos , que neste ultimo fiorecêrão , es

tiverão com effeito bem alheios de

desprezarem aquelles principios, que

o Mundo sempre tem venerado como

fundamento principal da Sociedade,

(1) Gflrdil, Introducçà'o ao estudo da

Religião. '

Page 29: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

29

e que só nos nossos modernos tempos .

se tem querido fazer se considerem

como preoccupação e ignorancia.

Os dois homens que no sobredito

seculo decimo setimo dominârão mais

que os outros no imperio das Scien

cias sublimes sãosem duvida/Newton ,

e Lcibnitz. Ora, o primeiro, depois

de haver nos seus Principios Mathe

maticos da Filosofia natural exposto

o systema do Mundo, termina aquel

la immortal obra com algumas con

sideraçõ'es sobre os attributos do Ser

Supremo, cujos vestígios elle havia

assignalado na admiravel ordem do

Universo. Não só estava Newton in

timamente persuadido da existencia

de Deos, que em todas as Obras sup

põe sempre como huma verdade ple

namente incontrastavel; mas tambem

cria , diz Fontenelle , na Revelação;

e entre os livros de toda a especie

que trazia nas mãos , aquelle que

mais assiduamente folheava, era a sa

grada Biblia, aqual até mesmo com.

mentou (J). E pelo que respeita a

Leibnitz', todos sabem que asua Obra

principal; he a Theodicéa. Nesta por

tanto rende elle continua homenagem (l) Fontenelle, Elogio de Newton. r

Page 30: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

30

â Religião ,~ e até se pode dizer que

este livro quasi se reduz yunicamente

a desenvolver e conciliar os seus

dogmas. O mesmo espirito reli ioso

diffundio elle em huma infinida e de

outras obras ; e era a cousrzi tão ma..

nifesta, que hum celebre Naturalista

moderno se serve desta grave autho

ridade do'Filosofo Alemão para con

fundir os pretendidos Filosofos do seu

tempo , os~quaes, não tendo nem as

luzes, Bem otalento deste grande ho

mem , tinhão oy atrevimento de des

prezarem o Evangelho , evdlinspira

remfeste. mesmo desprezo atodo o ge

nero humano (l).

-v w

(Í) ,,Co`nstituo-me na obrigação de ob

,, servar , e muito essa obrigação me aprnz ,

,, `que a piedade de Leibnitz , tão verda

,, cleira` como illustrada., nenhuma occa

,, sião perdia de't'ributar ao Filosofo por

,, excellencia , o acatamento mais respei

,, toso , e o mais digno de hum ser in

telligente. Citava com complacencia até

,, as minimas palavras deste Divino Mes

,, tre , e nellas descobria sempre algum

,, sentido occulto , tanto mais hello, quan

,, to mais filosofico era. Aqiwlle que se

`,,›‹c‹›i-n|:›rm:ia em descubrir no Evangelho

,, huma tão' sublime filosofia , era huma.

\. u

Page 31: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

31

Bacon de Ver-ulamio , Descartes ,

e os dois primeiros Bernoullis, Boy

le, e geralmente todos os outros gran

des homens, que no dito Seculo deci›

mo setimo contribuirão com as suas

Obras para os progressos e para o

lustre das Sciencias fysicas, forão- do

mesmo modo summamente apegados

á Religião. O ultimo dos referidos

Filosofos , que ainda hoje se olha co

mo o Pai da Fysica experimental,

era dev tal maneira religioso , que,

vendo no seu paiz nativo dllnglaterl'a

serem por algunsy livres pensadores

atacadas a existencia de Deos., a im

mortalidade da alma , e as outras ver

dades fundamentaes lda Religião, não

se contentou de os combater pessoal

,, Encyclopedia viva, ehum dos mais pro

,, fundos engenhos que jamais -a'pparecêrão

,, na terra. Rogo aos que não tem , nemA

,, as luzes , neui o talento deste grande

,, homem , e que não possuem no mesmo

,, grão que elle a arte de duvidar filosofi

,, camente , que se mterroguem a si mes

,, mos , se á vista d'isto lhes quadra bem

,, affectarem desprezar o Evangelho; e for

,, cejarem por inspirar este desprezo a to

,, do o genero humano. ,,- Bonnet , Pa

lyngenesia , Tom. 1, par. 7, Pag. 297.

Page 32: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

32

mente ; mas , como era riquíssimo ,

fundou lições publicas , para que per

petuamente em cada hum anno se fos

sem produzindo novas provas dos

principios da Religião Cliristã , ou

se elucidassem melhor as antigas. E

a esta bella fundação he que , além

de outras muitas excellentes apologias ,

se devem os tão célebres profundos

discursos de Samuel Clarke sobre a

existencia de Deos.

Que extrava ante genero de sabe

doria he este fi osofismo do Seculo de

cimo oitavo , que tem posto todo o

seu estudo em desprezar aquelles prin

cipios, e aquellas maximas, que nos

tempos anteriores todos os homens de

maior vulto sc tinhão constituido na

Aobrigação de respeitar ! Mas os

propagadores desta nova sapiencia

tem outro motivo de se envergonha

rexn , e de ficarem confusos.

' Se pouco antes disse , que o Seculo

decimo-sétimo, tanto pela importan

cia dos descobrimentos, como pela su

blimidade do genio daquelles que fo

rão seus authores, he muitissimo su

perior ao decorrido Seculo decimo

oitavo , isso não tira, que tambem

neste ultimo não houvesse grandes ho

mens, que contribuírão para augmen

Page 33: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

33 -

tar o esplendor das soiencias ; antes

elle conta muitissimos; mas neste Vnu

mero certamente se não conta al

gum dlaquelles escritores, que, tanto

na ordem religiosa ., `como na ordem

social , tem espargido e authorizado

as maximas que tantas lagrimas nos

tem arrancado, e que os fautores das

idêas liberaes tornão a -pôr agora em

campo.

Ao ouvir otom decisivo, com queo

author do Systema da Natureza asse

vera ue omaterialismo he o resul

tado e hum .profundo conhecimento

da .N atureza., e que em consequencia

dlisso , tendo-a elle attentamente con

sultado , .tinha achado , ,, que a ma

,, teria he eterna; que -vo movimento

,, lhe he essencial ; que lo homem não

_., he livre ; que não existe absoluta

,, mente huma intelligencia suprema;

,, que a vida eterna he hum so

,, nho . . . .,, Ao ouvir, digo, ‹o ar de.

cisivo .com que o fingido Mirabaud

avança todas estas asserçõ'es , qual

uer ficaria á primeira vista inclina

o a crer , que similhante escritor,

mais que nenhum outro , havia pe

netrado os segredos da natureza, eti

nha conseguintemente espalhado gran

des luzes sobre a Eysica. Entretan

Page 34: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

34

to , lendo-se o seu livro com atten

ção, se vê, que ondey elle nãose con

tradiz , ou onde não faz iueptos ra~

ciocinios , o que quasi sempre acon

tece , não dia mais que couzas assaz

communs ', o sabidas dlaquelles mes

mos, queapenas começão a ser ini

ciados nesta faculdade; por exem

plo , he oouza que excita riso vello

no capitulo 3.° da primeira parte da.

Obra affirmar , com grandissimo ro

-deio de palavras , que todas as mu

danças da materia provém do movi

mento; e dar-nos similliaute verdade

como inteiramente nova , quando ella

se acha em todos os livros elementa

res (1). O que digo do author do Sys

'tema day Natureza, se pode com igual

fundamento affirmar de yHelvecio , de

Vla Metrie , e de todos os' outros mo

Vdemos fautores do Materialismo. Ne

'nhum delles por certo ha contribuído

de modo algum para o adiantamento

das Sciencias naturaes. Pelo contra

rio Haller , Bonnet, Deluc, e :tantos

outros , que no dito Secnlo decimo

oitavo verdadeiramente augmentâräo

(l) Veiãp-se , entre outros, as Institui

ções Fysicas deM'uscheabroec-k , cap. 1 , IB.

Page 35: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

35

o lastro' das'inesmassciencias, não só

não farão liníidion'ados de atheismo ,

mas antes se servirão' da; contempla

ção da' Natureza para oombaterem

hum tão Íinsensato systema; por onde

até nestes ultimos temposse tem ve

rificado a aurea e notissima- sentença

de Bacon,--que huma. leve tintura

de Filosofia pode conduzir os homens

ao atheismo ; mas que hum profundo

conhecimento dlella os reconduz â'Re

lígião (1).

Nada pois he mais insubsistente,

torno a dizer, que aquelles pomposos

elogios , que tanto tempo se fizerão

da nova Filosofia do Seculo decimo

oitavo. Tem ella hum falso nome de

sciencia e de luz , quando em si mes

ma não he mais que hum parto de

trevas'e de ignorancia. Destruida -es

ta prevenção , com cujo auxilio os

mimigos da Religião e dos Thronos

poderão no passado Seculo insinuar

e diffundir tanto suas fallazes e peri

gosissima-s maximas , e que ao pre

Sente a Seita dos Liberaes de novo

quizera insinnar ; eu passo immedia

ll) Bacon , de Augment. Scient. lib. 7,

op. 1.

C 2

Page 36: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

36

temente a analysar estas erroneas in'a.

ximasem todas as suas mais peque

nas relações. .E em primeiro-lugaroccorre fallar dlaquella, .que á mesma

Seita importa muitissimo ver genera

lizada, uero dizer, o Governo Cons-`

tituciona . ' L V,

II

Page 37: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

. ' \" _" \, Í . . "Í " V.. ,h

c.ÀÉ,LT II'LÓÃ ÍJIÂ . ¬ ,

-.-. v`¡

Do Govèmolfzónsfiituëíonalg' ou da Ré'

- presentaçãozNae'ibfial. f

I' ) Í\I ‹| ‹ .:Q

l'lfl `.~`-z›‹ j.. . e i A l

~~ -A' 11.1' 1 o of .1...

v 12.' r : ' , - `

He falso 'que este genero de Governo

seja a mais antiga especie de Mo

> narquiu. que se viomo .MuvzdmV o

' § í ' ' tj' 1'

-z

Debaixo da. denominação do Go;

verno Constitucional' ese entendem

aquellas Monarquia's , nas quaes a ge-`

neralidade da` Naçãopor zmeio dos

seus representantes :participa mais on

menos do exercicio daz.Anthoridade

Soberana-.f- Osescritores, que depois

do meado do 'Seculopassadb tratârão

de politica, fizerão os maiores elo

gios desta` especie de. Governo ;.atê

não reconhecem como legítimas senão

só aquellas Monarquias .,. em que tal

Governo se acha em vigor , caracte

\

Page 38: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

38

rizando todas as outras com os odiosos

nomes de violencia , de usurpação ,

de despotismo. E para córarem aos

olhos das essoas pouco iustruidas es

ta nova t eo'ria sediciosa ,Iasseverá

rão affoutamente , que os primeiros

overnadores dos homens erãoV todos

eis eonstitucionaes. nAssociedades

,, no acto de se formarem , diz Con

,, dillac, não conferírão certamente

,, hum poder arbitrario aos seus no

,, vos magistrados Seria absurdissi

,, mo ensar , que homens , que não

,, tinh o huma idéa clara. 4_e exacta. do

,, bem quc'buscavão reunindmse em

,, sociedade 9 e govern-adosú.por pai

,, xões brutaes , hajão em hum ins

,, tante passado da maior independen

,', cia. á maior1 submissão. 11.9 ' -zÍ-i i

Se leste .modbmd'e Vram'ooinar fosse

justo, dever-se-hialco-ncluir",^q`ne não

já a Monar uia Constitucional,- mas

sim' a Democracia fora a'rfórma de

governo mais antiga. que fno Mundo

se introduzíra ,I pois .que esta ultima

especie de Governo se lohegafiainda

mais ao pretendido estadode indepen

dencia' natural do que: a'lprimeira.

Pnffendorf v foi realmente fdeste pare

cer ,'e axactamente sobre o-flmdamen

to da razão. adduzida por Condillac:

Page 39: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

33

,, Nada verosirnil he , diz elle , que

,, os l_¡omens , os quaes vivião' na li

,, herdade e na. independencia do es

,, tado da natureza , podessem n"hum,

,, momento esquecer-se d°estas duas

,, tão grandes vantagens a ponto de

,, se sujeitarem zao arbítrio de hum

,, só homens.l assim que cnidârão de.

,, se unir em sociedade ,f e formarl

,,_ hum corpo politico., .1 Daqui' che

,, muito mais conveniente pensar ,_

,, que estes homens, que gozavão >daz

,, liberdade e igualdade. natural ,›

,, quando assentárão unirem-se em.

,, hum corpos, quizessem que as cou

,, mas commuus fossem administradas

,,,com commum conselho ,. ezi'ormas

,, sem conseguintemeute huma Demo

,,cracia~,¡ (1). Mas esta opinião-de

Puffendorf se oppõe ao parecer de

todos os escritores. ,_ que antes d”ell_ç_

se empregârão. em discutirqual lfosse

amais antiga forma de Governo iu

troduzida no Mundo , e os quaes se.

tinhão todos declarado pela Monar

quia ' '

Ill) Pufl'endorf, de Jure Naturae et` Gen-y

'”'m, lib. 7, cap. 5. § 4. `

(2) lie subida dos eruditos a seguinte

Page 40: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

40

Esta razão , em que se funda Puf-'.

fendorf para sustentar o seu assum

pto, não he mais que huma razão de

simples verosimilhança, que deve ce

der á verdade : senão he vedado re

correr âs _conject'uras em ponto de

historia, e se antes ellas servem mui

to de- illustralla , só he permittido fa

zellas quando _faltão os monumentos

e os factos; o que certamente não acou

tece a resâeito do assum-pto de que .

se trata. s mais antigos povos de `

que falla Moisés, os Babylonios, os `

Assyriosf, os Egypci'os, os Elamitas,

as nações que habitavão ao longo do

Jordão el na Palestina , erão todos ,

submettidos a Reis. A Historia pro

` passagem de Justino , no liv. l , cap. l.

- Principio rerum , gentium nationumque

imperium poenes Reges erut. Poderia refe- '

rir muitas outras similhantes author-idades

de escritores antigos., se não cresse que

engrossava de mais 0‹ volume do.~ Opusculo

com huma assaz facil erudição. Ellas se

achão em todas as Obras dosV Publicistas,

nos lugaresv onde tratão. da origem e for

mação das sociedades civis. b'obre este as

sumpto merece sobre tudo ver-se Here-io ,

Elemento Jurisprudentiw civilis4 , part. l -,.

sect. 10 , § 5..

Page 41: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

41

fama concorda neste' ponto com asa,

grada. Durante a longai serie *de IS'eí

culos , de que os Chinezes se jactã'o'

e que, se não he fundada em veüfarf

de, como certamente não he,‹ não deii

xa de remontar a grande antiguida

de, nunca forão governados senão por

Monarcas; e he tão estranha âquella

região aidêa de Republica ,` que ,~ eo.1

mo observa Chardin', ainda hoje'ía

não sabem entender. O, mesmo sede;

vedizer de todos os outrosV povos Asiaó

ticos; de modo que o primeiro exemlg

plo principia a ver-seflen'tre › os- Gsm

gos , e isto não nosp-rimeiro's tem?

pos 5 pois que tambem estes prinoil

piárão sendo'sujeitos a Reis. O-Go

Verno Monarquico não só he a mais

antiga, mas a unica forma de Gover;

110 que antigamente houve ; donde

vem que nos monumentos historico's

89 achão sim mencionados aquelle's,

qfle primeiro introduzírãb nas Cida

des as Aristocracias, c as Democracias,

masinteiramfente se ignora quem fo¬

rão os primeiros Reis (*).

k

(t) Porque he certo que do que he com

mummente seguido não se faz menção, como

'e faz do quesobrevem cxuaordinanamem

Page 42: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

42

_-~,§N em este. grave testemunhoda His»

toriâir v.eLfêivor da antiguidade do Go

Verno Monarquico se Apodezriaeonci»

liar. com aexpressada opinião de Puf

fendorf ., dizendo-se, como asseverão

os yFilosofos modernos , que os pri

meiros Reis se -distinguião mais pela.

euthoridade -de persuadir ,..qne pela

de mandar ; que elles não erão mais

`que os primeirosMagistmdos e osVprimeiros Capitães das suas nações ;

em summa , que elles não erão mais

que Reis constitucionaes. Os Filosofos

havia já muito tempo que ,tinhão con

/ cebido o projecto de derribar todos

osth-ronos da. Europa ; mas támbemV

nesta,parte , como relativa ao. outro

seuy projecto de destruir a` Religião ,

nãofespalhârão ao principio todo o

veneno das suas doutrinas, pois que

bem vião que os animes ainda. não

estavão preparados' pan-e` o recebe

rem , e ainda. então se não tinhão as`

te. Se os primitivos Governos fossem Ré

publicus, e depoisjeiízessem Monarquias.,

lie sem duvida que está mudança seríu ob

Ztecto de se fazer publica commemorzição

por Vmonumentos que o annunciassem á

posteridade, como couza d'anles não vista.

Page 43: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

53

senhoreado da.I opinião publica 'E da~

qui veio que não prëgirão 'de repen

te a Democracia; mas bontentãrãolse

com dizer, que os Monarcasnão do

vião menos-prezar o voto da Nação

na publicação `das leis; .'promettendoh

lhes que aquillo que em appareneiá.

houvessem perdido de authoridado no

referiram-se ás assembléas n-acionaesz,

viria a ser» amplamente compensado s `

pelo muito 'que desse 'modo virião p.

reinar no coração dos 'subdifios.'l Não

fazião por tanto ímaisque) mialtar fa

convocação dos Estados\o'lo «Governo

Constitucional ;=bèm`-odntbsfúo¬ qdov nb

dia'om que qualquèriPrifm-.ipe'äiom

vesse~ sidofiI tão mal ,acoífiseihado que

posesseI o poderdegisiatiwr 'nasu mãos

da Nação ,‹ clic: Iseria :dèr'rubado do

throno. E parammelhm' comiamA este

senostratogoma ,f ooboirão-no'oom o

vêo imposto:- da antiguidadel, asseve

rando qub :os primeioos'gReis,er,ão to. .

dos cosrštiúnoionaes. 0m. ésta'a'sserção

he inieiram'o'nto contrarimá Historia-,

guia que sel t'emos' exemplosxdesbes

eis munidos de huma authoridademais de persuadir quando mandar;

como forão. os Reis que dominavão a

Grecia nos tempos heroicpsr, e os Che

fes das Nações Germnicasidescritas

Page 44: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

4!

por Taeito , não são estes 'por' certo`os primeiros Reis de que nosifalla a

Historia. Os Egypcios, que são tal;

vez osflmais antigos/dos homens , os

Médos, os Assyrios , não-eonhecião

nenhuma. destaspe'ras com que os Filosofos «modernos quizerão Aque em to

da. a parte-fosse contrapezado o poder

dos. rinfi-ipes..` Entre estes Povos,

não menos que entre as'outras Na

çõesxda antiguidade , a idea de hum

poder absoluto , ou livre e indepen

dente: de. qualquerzprizão , “estava de

tal modo «unida- ávidéa da; Magestade

Real ,V que' Aristóteles, nos seus livros

.da‹Scieheía'civil , ‹faz a. reflexão de

que 'hum Rei .sujeito eao jugo; da-lei

não; merece; o= nome de Rei (1).V vAris

-tóteles tinha sustentado. :na mesma

-Obra , que Ia Monarquia 'ei-a. o mais

wantigo defirdos os Governos; e certa

.mente .não teria exprimido tal opi

«niãou se Íosprcimeiros Reis houvessem

`sido constituei'onaes , isto he ,› taes

.que , segundo o seu sentir, não'me

.recião'o nome de Reis (2). ^ t

322.; Lt'ski `.=1,

(Tlt :A . ' A :H ‹ 'I- ...U-I ', l .

1; 11» Aristot.`Pol`rt. Iib. 2;' e. il.

-“ (2 Que a primeira-especie de Governo

introduzida no; Mundo fosse com~‹et`t`eit0

Page 45: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

45

'E este constante vtestemunho da His..

toria a~favor da antiguidade da Mo

narquia , e da Monarquia absoluta e

independente , toma muito» maior for

ça, em) se reflectindo que apretendida

razão de verosimi-lha-nça , pela qual

Condillac , e com elle todos=os outros

Filosofos modernos crem que as mais'

antigas Monarquias for-ão todas cons

tituionaes, he destituida de todcI o fun

damento racionavel. Se os apontados

escritores peccârão contrarias regras

da boa Critica , recorrendo 'ás conje

cturas quando fallão os factos , tam

bem violârão outra lei evidentissima

da Critica , a qual prescreve , que

nunca se admittão conjecturas, que não

sejão verosimeis. E este caracter não

convcm certamente ao estado de na

tureza que nos he descrito pelos Filo

sofos , ou âquelle estado de mutua

guerra , em que elles suppõem que

viverão os primeiros homens , e no

qual, como temos visto, elles unica

não sô a Monarquia , mas a Monarquia

absoluta' e independente , he hum facto,

o qual se acha muito bem iliustrado nas

Memorias da Academia Real das Inscri

pções e Bellas Letras dezParís, no vol. VI,

pag. 480 e seg. da edição da Haya.

/

Page 46: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

46

mente se fundão para deduzirem que

as primeiras e mais antigas sociedaâ

des se hajão governado , ou de todo

democraticamente , on .de hum modo

pouco differento , como he a. Mo

narquia Constituional. Ora, nada he

mais insubsistente que esta lpretendi.

da independencia dos primeiros ho.

mens. He estranho que nos'nossos tem

pos modernos , nos quaes se tem ba

nido da Fysica as hypotheses pura

mente arbitraàrias, se tenhão introdu

zidoestas nas ScienciasI moraes e me

tafysicas , onde tem muito peiores

consequencias: 'com effeito, que hy

pothese mais'arbitraria doque esta. ,

s-qne o estadopnatural dos homens

seja hum estado de total independen

cia ? Como !\ Hum estado , em que ,

tirada toda a mutua confiança `entre

os homens , haveria huma guerra-de

todos contra todosz, será a situação a

que oEnte Supremo haja querido su

jeitar 'o genero humano? De que mo

do se pode considerar como estado

natural dos homens huma situação, ue

elles devem necessariamente aban o

nar se querem subsistir? i

_ Se o 'estado natural do. homem ,

isto he ›, aquelle a que 'o Author

da Natureza; o ha vdestinado 'f de

Page 47: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

47

ve ser necessariamente o mais confor

me â sua natureza,Y á sua constitui

ção, ás suas precisõesfe 'se todas es.

tas ciroumstancias convem perfeita-`

mente ao estado de civil subordina

ção, e não já ao estado detotwl inde

pendencia, he claro que 'esse he'o

verdadeiro estado natural dos homens.

O Ser Supremo , tendo-os sujeitado

almma communicação recíproca, quiz

que este estado de socieda e fosse ac

'companhado de huma authoridade pu

blica, pois que sem esta não poderia

a sociedade subsistir; e temendo que

elles desestimassem huma tão sauda

vel instituição , quiz que fossem natu

ralmente conduzidos a formalla , fa

zendo-os para esse effeito nascer em 'familia , econstituindo-os dlesta _manei

ra em estado que fosse a subordinação

o primeiro dos seus h'abitos.", Os p'ri

meiros homens, avezados âsubordina

ção no estado de familia'y'i forão sem

prévia deliberação, isto he,= natural

mente , levados a submetterem-se â.outhoridadef- Hum velhoL veneravel

pela idade , por huma longa experien

cia , e por huma reputação'de intei

reza e de conselho, veio naturalmente

a ser o arbitro , e o pacificadorf' das `

diversas familias juntas todas emhum'

I

Page 48: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

48

districto, e, a ouco e pouco , o moh

derador e o so crano do mesmo dis.

tricto. Aristóteles, que, como ha pou

co observâmos, se tinha declarado pe.

la antiguidade da Monarquia absolu

ta , com exclusão de todas as outras

formas de Governo , era tambem de

constante opinião , que os homens fo

rão naturalmente guiados do estado

de familia a sujeitarem-se a hum

Monarca. Platão pensava do mesmo

modo , e geralmente todos os outros

Filosofos antigos estavão persuadidos

de que os primeiros homens havião

naturalmente passado ao estado de

subordinação civil sob a authoridade

de hum Monarca; ignorando total

mente aquelle estado de independen

cia, ou de mutua guerra, em que os

Filosofos modernos suppõem se achou

o genero humanolna sua origem. Hu

ma. tal supposição he diametralmente

contraria â origem que elle teve 5 e

essa mesma hypothese se não pode

admittir de modo algum , sem que

tambem se admitta , que os homens

sahírão todos de repente bellos e ro

bustos das entranhas da terra como

os fúngãos. l, I

`Se a sociedade primitiva e origi

naria , galera, natureza poz'entre os

Page 49: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

49k

homens , fosse huma sociedade de in.

dependencia , e de liberdade , como

hoje se pretende, em vez de se terem

form-ado Governos, como realmente

aconteceo, › ter-se-'hia o genero huma

no em sua mesma origem inteiramen

te anniquilado. E como ise ha de com

effeito :suppor , que5 em hum estado

turbulento e bellicoso , qual devia

necessariamente ser este pretendido

estado f de independencia , e qual ef

fectivamente'he descrito pelos Filo

fos modernos', podessem ter lugar as

deliberações pacificas, que-estes pre

suppöem PQuem 'pode racionavelmente

pensa9,'flquefhomens habituados a le

var Çliuma- vida :barbara e feroz , sehájão d¬improvisomudado , el tenhão

abraçado o 'sabio 'conselho de se con

gregar'em , e de se sujeitarem ahuma.authoridade 2 Os Poetas aindaA que

acostumados a dar livre curso ái'sua

imaginação , quando fallão da 'fabu

la de fC'a'dmo', isto he , de 'homens lí

vres ,- e _de todo independentes 'huns

dos outros ," discorrem *mais Aajustada- ,

mente do que ffazem os Filosofos , os

quaes se gabão Il_:an'tcr(leuezractidãg,

pois que fazem que similhantes ho

mens se entregflerIx; 'aos .maiores'ex

Page 50: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

50

_ce'ssos, eacibem matando-se huns aos

foutrosv(l). . .wi-q

' z. . . . . Furit omni: faria: :uoquc

.Murta cadunt subiu' per mama vulnem fratru.

Além de todos `os factos até agora

«ponderados zpara rovar, quea pri

`.meire 'es ecie dev overno introduzida.

'no.Mun o não foinem az. Democra

.cia ,mem a Monarquia Çmstitíucio

nal; que daquella pouco dëftieneqi mas

sim Ve.:`.lVI‹_¡nm'‹;1uia absoluta.” e inde

pendente , lia outra consideração à: jque

merece ser 'notada , chegue/as duas

primeiras; especiesztde Governo; índi

cadas são; muito 4mais complicadas

`quleav ultima. A essencia da; Socieda

.de -civil consistcfznzaf submissão de» to.

âdQssosúcidadãos â vontade ,do Sobera

no. Ora *esta submissãozhe muito mais

facil. dezse comprehender quandofes

taÃunica .vontade moderadorade todom corpozàísolitieo ‹sez` acha-freíalmente

mncentr «fz-qm hnmša øpeesoaA f sim,

`como. :acontece .na/z Monatrquismi` elu

zta. , .ido zzzquel quando fa f mesma «im-ice

.1 W; ,Mui fi', tina; (...~ -'- '° UL,

:zel'zz.‹š'.`i.i..; fw» :Lumi mp :ffg

Í Metalà 5.5 ~ '52 "41'

. (j

Page 51: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

51

vontade só.. -existe z em ‹huma pessoa

moral ,_.íisto he, .cmi fhumalassembléa 5

comi-sucpede. nasâDemocracias e nas

Mouíirqmñs Ooustituuionaesz Para que

este I- ser uooliectiyodmãomteuha vmais

que' .home ívontade - -,›‹,riequerem-se ' os

maiores esforçoqidaâpoliticoƒp pornonf

sequencia ,- fpas'a formas durma, tal jes.

maieede Governo. 1 fatias; ¡necess ariolzo

mnlišoimentoàodàa propriaosciencia -;

cirwmstaneia z que-fnãozpaieee'âque zse

haja' t'podidoúverifiicar úios. primeiros

hdmênfluíâm') ob; ¬ ls' o?? Í ~ :-;- ni

'- Barbeyrao em huma judioiošsa;z nota

que pozza'haixo .daspassagomrdeiPuffendorf”I -refenida no principio do pm,l

sente antigo ,-.'.›estende:56 miIÃÊQHObflo

esta razãozda grande simpliicidedepdo

Governoi) iyIouarquico.I 'para rmntmaõil

Zel' a. «opiniãohdo t seu; Autholiíilàr'; ao

em apoio- .doz'seufmosim dmfiãnsar reh

fere'humespassagemideílfot z, oq, h

tambem era de parmemqfllfl mfuerdarf

deira Z',l_\‹1ons.rquiaz f, . assimí mOLfiue a.

mais simples,;;r.¢_ a. menossomplzicada

de todas. asmpe'ciesšdez .Gorêrno saido

.'íeimu mr). .ríi .š minor-m f d!

_ › .m-à

(l)y :Boffendorfi ,4,.Nnta .deà Barbeyrac"a0

§lV. do Cap. V- dDo Liv. Vl'L .

2

Page 52: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

52

mesmo modo fdevia necessariamente

ser tambem a'mais antiga (1)., V

' `Unem-se*'por:tanto 'ás conjecturas á.

Historia efao'sentimento' dos eabios ,

em geral; para desme'ntireme'ssa tão

gabada hypothese dos'modernos Filo

sofos, de que a. Monarquia Constitucio

nal fora` a' primeira. especie de Go

verno introdlrtidaY no 'Mundo.“ Se' pois

_ ha hoje Soberanos absolutos lnafEuro

pa `, › não YShe 'isto hum effeifiošldo 'des

potismo ,j e da usurpa ãodos *Pl-inch

Pes que _hajão attenta o contrarfos di

reitos: das respectivas'mções , 'como

ealumnids-'amente- os . F'ilosofos tem're

pétido tantas: vezes ; mas sim huma.

continuado.l e successiva progressão `

:lajquella 'especie de Governo-que: mo.

delado' 'Vinte'infimente pelo Y dos :Ghefes j

de faíàilfa, Íse fvi'o iutroduzídomo mun- z

doi assinffqüë o genero hm'nano» come- j

edu-Ja .muitiplicarz-se eai'eätender-se 1

pela face ¡im-terra; V' v :if

«'Begr zconheço~l que a; 1-' uestão 'da `

maior Iol'fm'enotí anígiglliday ef'dasf dif

ferenbes formasz-ideGoqemo hef'total- j

mente estranha â da. sua maior ou

(1) L°¢k¢y Governo. Civil~,'~'pai'te II,

Cflp- 8. ã w. .fU

Page 53: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

53

f;I

menor bondade, que he a unica que

deve interessar os homens. com

effeito , se Puffendorf ã vista da alle.

gada razão da pretendidaverosimi

lhança sustentou, que a Democracia

era a mais antiga especie de Governo.

introduzida no -Mundo ; desta sua `

presumida antiguidade não deduzio

de modo algum que .a Democracia

fosse igualmente o_melhor dos Gover

nos; antes o Vpoz muito abaixo dos

outros.› Porém os Filosofosfldo Seculo

decimo oitavo nãoestavão animados

.daquelle amor da verdade , que tive

ra unicamente em vista- o celebre Pu

blicista Alemão do Seculo decimo se

timo no exame da sobredita questão.

Não foi outra a razão- porque elles

mostrârão tanto empenho em susten

tar, contra oconstante testemunho da

Historia e dos Sabios , que as mais

antigas Monarquias erão todas cons

titucionaes , senão para fazerem ca

pacitar os simplices de que, se huma

tal forma de Governo está hoje aban

donada pela maior parte dos Estados

Europeos , proveio isso unicamente

da usurpação e do despotismo dos So

beranos , para assim animarem os Po

vos areco rarem os seus pretensos di

reitos antigos. Julguei por tanto de

Page 54: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

54

via rasgarfcste véo da 'suppoštma'ntià

guidade , com lque os F-ilosofos'mo

dernos pretender-ão cobrir Iseus sedi.

ciosos desígnios. Desempenhado este

assumpto, passo immediatamente a

analysar em si mesmaf, e em todas 'as

suas relações esta especie de Gover

no , que os fauto'res'da's idêàslibe

raes tentão reproduzir como o unico ,

que seja com ativel com a liberda

de, 1e com o em do genero: humano.

.Ill (3

l'ARTIGO II.

A' 'introducção do Governo Consti

tucional em França 1zo._reinadb de

Luiz XVI Í produzia a dissolução

da Monarquia. 1 '

He facil formar systemas em ma

teria.. de Legislação e de Governo.

Hnma 'imaginaçãofelectrizada , hum

talento Prompto , principalmente jun

tando-se-lhe a força e a elegância do

estilo , gcrão em humlmomento hum

novo 'systema de administração , que

allucina e seduz ; mos a difficuldade es

tá. 'em ligar bem os principios , e em

Page 55: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

55

os calcular sobre a pratica e sobre o

homem como realmente elle he. As

sim em Politica como em Fysica , a.

experiencia he o unico bom methodo

deestudar. E com effeito, assim eo

mo esta ultima Sciencia não por ou

tra razão existio tantos Seculos em

miseravel estado , e reduzida a huma

simples metafysica' , senão porque,

desprezado. a vereda das experien

cias, os Filosofosse abandonavão.

unicamente â imaginação e ás hypo

theses , da mesma sorte qualquer -es-V

critor que tratando de Politica não

tenha a advertencia de se ater á ob

servação , não produzirá mais que

vãs especulações impraticaveis;

Neste escolho naufragou grande

parte dos escritores, que, principian-~

do por Platão, tem tratado de Legis

lação e de Governo; mas nem por is

so estes naufragios preservárão os Po

liticos do passado Seculo de irem tam

bem dar nelle ; e até será difficil de

achar outro que conte maior numero

de simi'lhantes desastres.

Este essencialissimo defeito sobre

tudo reina geralmente naquelles li

vros , que pelo meado do mesmo de

cimo oitavo Seculo forão publicados

pelos chamados Economistas ,- e que

Page 56: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

56

em virtude deste simples nome ape

nas haverá pessoa que os confunda

com os cultores da verdadeira Scien

cia Economica. Quando ha cem an

nos o celebre Ustar'iz lançou. em Hes

Panha as primeiras sementes desta im

portantíssima faculdade , não fez mais

que estribar-se na observação , e na

pratica. Tendo visto , que a Ingla

terra e a Hollanda com menores van

tagens naturaes que a Hespanha, ti

nhão hum Commercio muito mais ex

tenso , e huma Marinha mais florida,

entrou ainyestigar as leis e os regulamentos, quel entre aquellas duas indus

triosas e intelligentes nações tinhão

produzido huma tão rande prosperi

dade e opulencia , e desenvolvendo as

propriedades e a sabedoria daquellas

eis, apontou as maximas que a sua na

ção devia seguir, assim como qualquer

outra, queaspirasse a chegar ao mesmo

estado de prosperidade e opulencia.

O discurso de Ustariz, como lhe dava

valor a experiencia, fez grandissima

sensação na Europa : e muitos escri

tores de outras nações, rincipalmen

te de Inglaterra , ten o seguido as

mesmas pizadas , e tendo-se nellas

adiantado mais , levârão a Sciencia

da Economia Publica a tal grão de

Page 57: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

57'

evidencia e certeza , que fez de im

proviso mudar a face dosEstados, que

tiverão o acordo de fazer a applica

ção destes principios. Porém huma

tão grande luz correo risco de ficar

eclipsada em seu mesmo nascimento

pela ambição dos Filosofos do Sena.

O desejo de se avantajarem em todos

os generos de Litteratura , de que

erão dominados , os induzio a não

desdenharem a Economia Politica ,

que vião andar então em tanta vo

ga ; mas como já os primeiros luga

res estavão occupados , e 'lhes não fi

caria outra gloria que repetir as ver

dades já por outros descobertas e in

culcadas , recorrêrão ao costumado

expediente da singularidade; Insul

tando orgulhosamente todos os maio

res homens que tinhão illustrado esta

faculdade , edando-se a si mesmos ex

clusivamente e por excellencia o ti

tulo de Economistas , creârão huma

nova Economia inintelligivel e ara

bica, fundada sobre o tributo unico,

sobre a indefinita exportação dos ge

neros , sobre a livre importação das

manufacturas e sobre outros muitos

paradoxos politicos inteiramente op

postos â pratica seguida pelas nações

mais intelligentes , e mais famosas

Page 58: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

58'

pela sabedoria do Governo., os lquase

paradoxos ein hum instante zterião fei-V

to desappareeer - da França V.toldos o's

frutos dos trabalhos do grande Col

bert , se opportunamente não fosse

afastado da direcção das finanças Mr.

Turgot , o nal infelizmente cria nos

especificos s mencionados empíri

cos, e jâ tinha principiado a pôr em

execução as suas receitas.

Ora, do mesmo defeito sem duvida.

se resente aquella immensa turba de

escritos, que nesse tempo os mesmos

F-ilosofos do Sena publicârão a favor

do Governo Constitucional. Nada. he

certamente mais hello e seductor que

a pintura, que-se faz nesses livros

desta especie particular /de Governo.

A parte não indzfferente, que nelle vem

a ter todos los cidadãos no exercicio da

authoridade soberana , faz que elle se

aoizz'nhe muito ao estado da natureza,

no qual todos os homens erão livres e

iguaes : debaixo de huma tal forma de

Governo não se conhece mais que o

imperáo das leis , e estas são sempre

justas eimparoiaes, porque são oresul

todo da vontade geral de todos os ci

dadãos. Para afformosearem mais es

te-quadro , :não deixavão os Filoso

fos .de pôr a par de cada. hum destes

Page 59: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

- 59

bens o contraste dos defeitos oppos-V

tos , que se achão nas Monarquias

absolutas, e que'maliciosamente con

fundião com OsV Estados despoticos;

Ora para descobrir toda a quimera

destas bellas pinturas do GovernoConstitucional nãol he preciso mais

que recorrer á pratica. Consultando

esta, nós veremos que ellas são intei

ramente .parecidas ~âquellcs retratos,

que se fazem' por oocasião de espon

saes entre pessoas afastadas , nos quaes

o pintor afformosea as feições mais

ordinarias , e occulta a sua deformi

dade o; por cujo motivo á vista do

original entra oV arrependimento , e

muitas vezes' tambem a desesperaç'ão

em quem sobre hum tão debil funda

mento teve a imprudencia de se ligar

com hum nó indissoluvel.

O Governo Constitucional introdu

zio-se em França logo no principio

da Revolução, de 1789i Os Filosofos

exultavão de ver finalmente realiza

da na pratica huma especie de Go

verno , que tantosannos havião 'pre

conizado como o melhor e omais per

feito , e repetião mil vezes ao dia,

que huma tal nação ficaria sendo o

modelo da maior felicidade ,. que se

pode gozar na terra; mas o facto em

Page 60: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

60

nada correspondeo a estas bellas pro

messas. .

No Governo Constitucional, tinhão

elles dito , como ha pouco apontei,

que as leis são justas e imparciaes,

porque são o resultado da vontade ge

ral de todos os cidadãos expressa por

meio dos differentcs Deputados da Na

ção reunidos todos em assembléa. Ora,

ao cstabelecerem esta regra , não ví

rão , ou fingírão não ver, que, huma

vez que os Deputados estão eleitos,

não consultão de ordinario os verda

deiros interesses da Nação , mas sim

unicamente as suas miras particula

res. Isto se verificou â risca na Re

volução Franceza, e merece ser bem.

observado. .

Os Deputados da Assembléa Nacio

nal não tinhão certamente direito al

gum dc despojar o Monarca da prin

cipal prerogativa da Soberana Au

thoridade, transferindo â Nação, ou

á mesma Assembléa o poder legisla

tivo , como elles fizerão na nova Cons

tituição do Reino. Similhante Cons

tituição devia-se olhar unicamente

como effeito da violencia, e da usur.

pação , ainda mesmo quando se pode

ra sustentar como verdadeira e sub

sistente a absurda theoría da Sobera

Page 61: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

'6'1

mia I'do Povoyeem consequencia dis

eo se Vquizesse conceder á Nação o

pretendidol Vdireito originario e im

`prescriptivel de fazer as leis que jul

gasse mais vantajosas a si mesma : ea razão dlisto he porque os Deputa

dos da Assemblêa não estavão para

isso authorizados. Não podião ter ou

tro direito mais que o expresso nas

procurações que receberão das Assem

léas primarias ou particulares, =em

que tinhão-sido eleitos ': e essas , co

mo todos sabem , se restringiãof 'ao

objecto de reformar os abusos das Fi

nanças, e de supprir a deficiencia do

l_šrario;H Mas se os Deputados 'da `As

semblêa 'Nacional de França de 1789 '

desprezârão as instrucçõ'es conteúdas

nas procurações dos seus .respectivos

commet'tentes`para ado tarem efa'bri'

carem hum X pretendi o s stemafide

regeneraçãdfuniversal mo elado pela

normaifdqi Contrato Social 'de lRuns'

seau ',` _eor'nmetterão i' ial prevarioaf

ção .naobra .danova egislaçãofgffliá.

que lançarão a [mão logo depois'ëde

temem ,publicado a dita nova Consti

tuição, epela: nal' 'af mesma Assem

bléa passou de onstítuinte adenomi

nar-se Legíiflàtivàl" ' '_

EI com effeitol, pedindo todas as

Page 62: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

'82

_prbcuraçõ'es das diversas Assembléas

Brimarias do Reino , quofossem os

ens ecclesiast'icos igualmente tribu

tarios como os dosV seculares , vinhão

claramente a reconhecer dfo direito do

Clero sobre-estes mesmos bens ; e a

Assembléa os\ despojou inteiramente

delles_., As procurações não' dizião cou

zaz alguma sobre- os privilegios vhono

rifioos da› Nobreza. 1,396 q-uerião que

se › derogassemf os privilegios pecunia..

rios, que he o-.mèsmo qnedizerz, que

.ficasse igualada aos outros ,contribuin

tes no pagamento dos yimpostos ; e=a.

Assemblêa os supprimio 'todos , isto

het, tanto os |honorificosfcomo os ypo'

cnnia-rios ;.e deste' modo'anniquilou-úzlI

pro riafNobifezawn. . . 1;.” ¢ ›.`- 'Epm' nenhuma. das' sobroditas pi'ocu

raçõesi se fallqvande modo algum no

Culto , io qual desde a primeiraori

gem d'a Monarquiafse achavauestabe

lecido em Frnçalfe pelo qual- tinha

adquirido o titulm.derlhzinol Chris

tianissi'm'o `;'›e. 'a .Assomblêa comahuma

Serie deoperaçõesttque sõ"á,lm¡iiedq

dezena. Heresiaqbunidàs ambals ,'rfpo- .

dião › suggerixé (11) ,comnietteo os ‹m'ai

. v- -¬‹'~ “w [0h Uma: -

1-' l

(I) Sobre a realidade' dest: ligay'qu'd no

Page 63: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

v63

sac-rilegos attentados contra este mes

mo Culto de tantol tempo dominante

no Reino : em 4 de Agosto de 1789

supprimio os dízimos ecclesiasticosf;

a 27 de Setembro despojou as Igrejas

de todos os vasos sagrados ; a 18 de

Outubro prohibio os votos religiosos;

a 2 de Novembro adjudicou á Nação

todasV as propriedades do Clero, dei'

xando-lhe porém; a.admini`straçã0 del

las na iõde Abri-l do- seguinte anno

de 1790.~tirou-lhe também esta adm'is

nistraçãoa reduziadmoizâ condição* 'de

sim les assalariado ;i.ely por fir'n 'aÃ-'2

de olho., com a sabida? Constituição

.Civilodoflerøs ,atacou ,todas as Leis

,da Igrejafylderrubouúo seul ä verao

e initualfefdestruío aësuazf u -

'_ _ _gb- ` mma., Itudo; quanto fizerão a

Assemb éa Constituinte , e a A'ssemf

LJ ' 'Il-.1. r4 :'x'iz :_ i s i ~ z;

' ia'iiir. ': .r Í'mrm r'>› =Y .'. .a

rfineiris í1 .da Resolução firssõsr os :Asseme

bléalälqçionaln s Brotestantes '409111, oslos'qfos, para. 111,.destruiçà'0. dorThrono, .por

der-_se-hu'lyek''` ,F :entre outras muitas tibia”,a que ft'e'rrlfípor titulo :` Dizinonciirtio'nV aúfr

Ffáiaài? "eäthf'oñ" ue: "dês 'iiifo'yzéviš'¡íäiifl'äwleëf f aticn'dk -pdu'r détruire 'eh

l't-añceiâtf m'Caiho ' «éra-"- Pot-.'Hw

rique'gAlelan ë 4Audui ,'-Conde ,d'En'f

thiguflhpêgpw e Sei. Inf. rf) .unem

Page 64: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

64

-blêa Legislativa , he prevaricação

da parte dos seus Deputados, que

não erãofcertamente já Deputados,

nem Representantes desde o momen

to emV que obravão directamente con

tra a vontade e contra as ordens ex- `

pressas dos seus commettentes. Todos

os artigos , e-todos os decretos da

primeira .e da vsegunda Assemvblêa são

por tanto directamente contrarios aos

poderes , =e ' or consequencia contra

-rios á vonta e geral: da Nação ,r ma.

fnifestada do melhor modo que se` po

'dia fazer; pois que 'certamente não

Lha outro meio mais se ro -de conhe

Itšero'voto'Q-e a'vonta e geral de hu

qna nação);A que-pela unanimidade e

pluralidade das<deliberaçõeš parciaes

coõnsignadas erra? maioria 'das' procura.

Bia "' ff' . ` e

Ê A mesma Assembléa não podia dis

simular esta mancha, e anhelava por

isso gran ear- actosde adhesão da

'parte dosv iversos Departamentos , e

'das povoações em particular. HMas es

;,ta multidão dê actos deadhesâo ,pda

991,1 ramláçãóizqllehumasrandePan

.te a Naçãofazia aos ,mineraiszdecre.I

.tos da -A ssemblêafi, .nãoba'stavãoz-para.

ade'gul'at '.os . bons. ~ Sabião-.selgeraL

mente os artificios com-1 que; a mesma

Page 65: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

65

Assemblêa havia multiplicado estes

actos de adhesão, e supprimido as

queixas. Não permittia se admitissem

senão as homenagens; mas fora da

sua sala só reinava a inquietação , a

magoa , a desesperação. Armava-se

metade dos `Cidadãos para snffocar

os clamores da outra; a morte, o sa

que, ~o incendio aguardavão todo

aquelle que ousasse levantar a voz; e

estava prompto sempre hum exercito

de assassinos para reprimir aquelles

que se lamentavão.

Não conseguio , verdade seja, este

perigo suffocar todas as reclamações.

.irão infinitas as representações que

vinhão de todas as partes do Reino.

Houve na mesma Assemblêa al uns

VOgaes virtuosos , que, sem nen um

temordp punhal dos assassinos , que

os seus Coryfeos tinhão lcontinuamen

te assoldadados , se atreve-rão a le

vantar a voz contra todos estes pas

sos violentos , e funestos, procuran

dO revocalla a idéas de b0a`ordem;

mas a voz destes sa'bios ficava sem

Pre vencida pela maioria dos malva

08 , e dos ardilosos de que se com

Punha. a Assembléa : de modo que.,

Pêra se não fazerem complices das

mJustiças e das atrocidades, de que

E

Page 66: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

se

ella se 'tornava culpada, tornarão t0~

Vdos o partido de se retirarem.

A Filosofia , que se envergonhava

de ter produzido tantos males , emvez da Vtão promettida felicidade ,

tambem não deixou de reclamar a

4boa ordem. Hum'dos seus mais famo

sos prosêlytos, o Abbade Raynal, `_se

incumbio particularmente d°isto,quan

do a 31 de Maio de 1791 fez ler na

.Assembléa Nacional huma sua carta

(l) , em que fazendo huma satyra lu

l

v(l) A sobredita Carta, que Rayual dirigio

á Assembléa Nacional, hé `do teor seguiu

te, traduzida fielmente do Francez:

,,Estou , eu vo-lo confesso, yestou pro

fundamente entristecido pelos crimes que

cobrem de luto este Imperio. Será pois

verdade, que 'eu me devo lembrar com

espanto ,. de ter sido hum d'aquelles

que, sentindo huma generosa indignação

contra o poder arbitrario , derão talvez

armas á licença? A Religião, as Leis,

a Authoridade Real , a Ordem publica

reclamão com effeito á razão os vinculos

que as unem a esta grande Isociedade da

Nação 'Franceza , como se, perseguindo

os abusos, lembrando os direitos dos l'o

-vos e os deveres dos Principes, os nos

sos .esforços houvessem quebrado estes

vínculos? áProximo a baixar áiescuridio

`”

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Q

`1

Page 67: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

67 `\

ubre , mas verdadeira da co ducta

a Assembléa , deplorava a arga

mente a situação presente efutura da

França. Mas estes seus lamentos vi

,, da sepultura, e a deixar esta familia im

,, meusa cuja ventura hei desejado , que

,, he o que vejo ao redor de mim P Desor

,, dens religiosas, dissensões civis, a cons,, ternação Vde huus, a tyrannia dos outros,

,, hum Governo escravo dos caprichos do

,, povo , o santuarioi das leis rodeado de

,, homens desenfreados, que querem alter

,, nativarnente ou dictallas, ou insultallas;

,, Chefes sem authoridade , Ministros sem

,, recursos; hum Rei, o maior amigo do seu

,, povo, submerso em amargura, ultrajado,

,l ameaçado, Encarcerado, e não existindo

,, a força publica senão nos Clubs, onde

,,' huns homens ignorantes e grosseiros se

,, atrevem a decidir sobre todas as questões

n Politicas. Tal he a verdadeira situação du

,, França ; não se affoutarião outros a di

n ler-vos estas verdades; mas eu me af

fouto a isso , porque vou chegando aos

meus 86 annos de idade. FaIIo-vos da

authoridade destruida; porque não pos

so parecer a ninguem suspeito de ter

saudade do antigo regimen. . . . Vós não

podeis salvar da total ruins o Estado se

" Rio retrocedendo , ou aliàs indicando

z» esta marcha retrôgrflda a vossos succes

s sores. ,,

E 2

:Iääš'šã

Page 68: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

6'8A

nhã'o 'demasiado tarde. ` A Revolução

de França he toda obra da Filosofia:

esta a 'procurou lcom as suas declama

ções impias e sediciosas, que por es

paço de quarenta annos ou mais ha

via feito contra o poder dos Reis;

e não pode por isso deixar de ser res

ponsavel por todos os maos effeitos,

que de'víão infallivelmente dimanar

de _se'teremquebrado todos os vincu

los os mais sagrados que ligavão os

homens. estes lamentos de Raynal ,

assim como os de Neker, não fizerão

mais que aviltar cada vez mais esses

que se dizem Filosofos, mostrando â

posteridade , que elles vivião na maior

ignorancia do coração humano, e da

Historia , a ponto de não conhecerem ,

que huma vez que o povo se poz em

movimento, já não ha meio de ocon

ter , 'e que a multidão, em se suble

vando , se assemelha a huma torrente

Ene rompendo as suas-comportas mu

'a de leito , e já não se pode fazer

que tome o seu primeiro curso , sem

se ter tambem a certeza se se pode

râõ levantar outros diques para a

conter no novo leito que se formou.V

A Assemblêa Nacional não deo com

effeito attenção alguma ás menciona

das representações de Raynal, e con

Page 69: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

'69

til'mou cada vez a peiorar no seu co

meçado systema del violencia edes,

traição. - r

A nova Assembléa que , em 21 de

Setembro de 17-92, debaixo do nome

de Convenção Nacional , succedeo -a

este violento Senado, ,ainda foi mais

violenta e destruidora. Levantando

(le-todo. a mascara , na. mesma sessão

primeira, do dito dia 21 , proclamou

oGoverno Republicano; e-depois'de

ter feito soffrer os mais humilhantes e

duros tratamentos ao mesmo virtuoso

Soberano , chegou ultimamente ao ex

cesso de lhe fazer dar amortc em hum

cadafalço.

Esta he a rapida progressão dos

males , a que ficou sujeita a França

depois que em 1789 se introduzio nel.

la oGov'erno Constitucional. Que eu

tão huma talinnovação politica, tan

ÍO entre os Francezes , como entre

huma grande partedos outros povos,

produzisse tão grande en-thusiasmo,

não he de maravilhar. Este generode Governo havia sido quasi Imeio lse

culo com tanto artificio proclamado

Pelos Filosofos como o melhor de to

dOS , que era mui difficil que nestes

Primeiros momentos não allucinasse a

Opinião publica , tomando o- aspecto

Page 70: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

70

venerando da felicidade nacional. Mas

a ora que se tem visto os amargosos

e feitos que elle produzio , todos os

paralogismos adduzidos a seu favor

deverião de todo tornar-se inefficazes

einuteis: e os sequazes das Ideas libe.

raes, tentando de novo fazer adoptar

similhante forma de Governo, clara

mente mostrão haverem herdado o

odio contra todos os thronos, de que

estavão animados os Filosofos, quan.

do pela primeira vez ousárão procla

mallo. Continuemos porém a consi

derar de perto e nos seus effeitos es.

ta forma de Governo , que hoje de

novo tanto se exalta.

*_

ARTIGO Ill.

Tendo-se introduzido o Governo Cons.

titucioual em França no anna de

1804 , não fez mais que aggmvar e

fazer mais intoleraoel o despotismo

do novo Monaroa.

As sediçõ'es, as discordias, as mor

tandades, os roubos, as oppress'ões e

os delictos de toda. aespecie , que tan

Page 71: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

71

io affliišírão a França durante o Go

verno emocratico, induzírão aquel

la desolada nação a restabelecer no

anno de 1804 a formar de Governo ,‹

que erto de doze annos antes havia

tão fevianamente abandonado; ou,

ara fallar com maior exactidão ,

uonaparte, valendo-se do estado de

abatimento em que por causa dos di

tos erros se achava aquella nação , te

ve a destreza de fazer que lhe fosso

conferida a Authoridade Soberana, a'

qual havia quatro annos elle já exer

citava- de facto com a modesta deno

minação de Primeiro Consul.

Esta subitaaea mudança esseneial

na forma e na constituição do Governo produzio de repenteA outras mui

tas. Os mais acérrimosRepublicanos ,1

aquelle's mesmos que tinhão votado

na orte do Rei , e que infelizmente

formavão qu-asi sós o conselho e o»

cortejoV do novo Monarca, condecora-.

dos com Ordens eTitulos , a resentá-.

rão-se d`improviso em pub ico com

hum fasto muito superior ao dos .an-

tigos Grandes, que elles pouco antes`

havião tanto deprimido e maltratado.

Os homens de letras tambem mudârãorepentinamente de linguagem ;V e seI

Pouco antes havião insultado tanto ef

Page 72: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

72

vilipendiado o Governo Monarqui..

eo , depois da mencionada mudan a. ,

fizerão delle o maior elogio: não is

simulárão ellesacontradicção, em que

vinhão a cahir com esta liguagem ,

mas assentavão se podião livrar desta

nota dizendo, que anova Monarquia ,

que então se erigia sobre as ruínas

do Goveruo popular, era inteiramen

te diversa da que tinha existido no

tempo. dos Reis , pois que na nova

› Constituição era o Poder Imperial

modificado , erestringido pela autho

ridade do Senado e do Corpo Legis

lativo ; e d°aqui` promettião a maior

felicidade â Nação; sem sequer se

lembrarem de que essas mesmas pom

posas promessas tinhão elles feito,

quando o mesmo Governo Constitu.

cional se tinha pela primeira vez in'

troduzido no anno de 1789. Ora exa`

minemos se nesta segunda época fo

rão mais bem fundados esses prognos

ticos.

Não ha duvida que depois desta

nova época de Governo Constitucio

nal esteve a França izenta dos hor

rores da anarquia, e dos partidos que

tanto na primeira aperturbârão: po

rém não pôde evitar tão grande in

conveniente sem cahir em outro igual~

Page 73: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

73

mente funesto , isto he ', no jugo do

mais duro e do mais lpezado despotis

mo, de que jâmais a istoria haja fei

to menção. V

O esplendor das victorias que os

Francezes ganhârão sob o novo Go

verno Imperial, a immensa extensão

ue vírão dar aos seus antigos con

gns, induzião a crer, âprimeira vis

ta, que a Nação tinha realmente ad

quirido huma verdadeira felicidade..

Os Oradores do novo Monarca o re..

petião sem cessar nas tribunas; e os

periodicos , que sob o seu Governo

não tinhão outro fim que extraviar a

opinião publica, tambem assim odi

zião em suas immensas folhas. Tanto

huns como os outros , embriagados

pelas ensanguentadas bandeiras ini

migas , que â maneira de troféos em

tanta copia estavão penduradas, quer

nos templos, quer na sala da Assem

bléa , não fallavão senão de similhan-~

te felicidade; mas estas bandeiras não

escondião aos olhos destes panegyris.

tas assalariados a consternação e a

miseria a que se achava reduzida a

maxima parte dos habitantes. Estas

victorias erão o fructo, `e aconsequen

cia da barbara lei da Conscripção,

que periodicamente levava todos os.

Page 74: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

74

annos em toda a extensão do Imperio.

a flor da mocidade. Estas victorias

fazião que as contribuições se pagas

sem sempre como em tempo d'e guer

ra , sendo por conseguinte immensas;

e vinha o seu pezo a carregar tanto

mais sobre a nação , quanto âs infi

nitas despezas causadas pela guerra

se ajunt-avão as de huma immensida.

de de obras publicas para transmittir

á posteridade a otencia e a preten

dida gloria. do lVibnarca que as tinha'

mandado fazer. Entre estas havia real

mente algumas que tinhão por obje

cto a utilidade publica : mas se estas.

emprezas são louvaveis quando se fa

zem â força de economias , vem aser

hum flagello quando são o fructo de

accrescentamento de tributos sobre

huma nação já delles carregada. Por

outra parte , de que servia multipli..

car tanto os canaes, os portos, as es

tradas, se pelas disposições orgulho

sas e insensatas do novo Monarca ,

achando-se quasi de todo anniquila

do o commercio , ficavão estes seus

novos vehículos inteiramente inuteis ?

Mais insensatos ainda erão os cuida

dos, que em todo o decurso do seu rei

nado tomou no que respeita á Mari-_

nha; pois que as embarcações que em

fl

Page 75: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

75

tanta copia, e com tanto dispendio se

construião em todas as costasdo Im

perio, estavão reduzidas a apodrecer

nos portos e nas enseadas pelo receio

de cahirem nas mãos de hum inimi

go , que então , mais que nunca, do.

minava em todos os mares , e que el

le tão grosseiramente havia nltraja

do.-E entretanto a Assembléa dos

Deputados nunca ousou levantar a

voz contra estas tão enormes profusões

continuas dos bens dos subditos ; as

sim como o .Senado nunca se oppoz â

continua effusão do seu sangue.

Hé por tanto falso que o Governo

Constitucional sirva de rémora ao po

der arbitrario dos Pri-ncipes , como se

tem por muito tempo procurado fa

zer acreditar. Eu ainda me adianto

mais , e di o , que suppondo hum

Principe am icioso , violento , e pou

00 cuidadoso do bem dos seus subdi

tos, esta especie de Governo unica

mente servirá de o animar a mais

augmentar o seu despotismo ; e facil

he provallo.

Quando os Filosofos fallão das As

Sembléas Nacionaes , suppõ'em sem

pre que os Deputados de que elias

são compostas , sejão outros tantos

Catões , que não tenhão em vistaf

Page 76: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

76

mais que o dever, a virtude, e o i'n`

teresse do Povo. Ora nos nossos Es

tados modernos, inveterados no luxo ,

e nos quaes por conseguinte o amor

das riquezas he hum dos principaes

motores, não formaráõ porcertoindi

viduos dessa qualidade a maxima par

te de huma Assembléa muito nume

rosa. Assim como, ainda mesmo nos

paizes onde existe o Governo Consti

tucional , o Principe he o unico que

confere os cargos todos, e por conse

guinte a riqueza, do mesmo modo as

Assembléas acabão sempre adherindo

a todas as proposições do Ministerio

e da Corte. Por isso , se hum Prin

cipe he pouco cuidadoso do bem dos

seus subditos , mas ao mesmo tempo

sagaz , estando seguro de que as leis

e as proposições mais injustas e one

rosas não acharâõ oppositores, se vai

cada vez animando mais em seu des

potismo, porque está certo que todo

o odio recahirâ nos representantes do

povo. Hum profundo escritor Inglez ,

fallando das violencias, e dos actos'

arbitrarios , que se arrogárão os diversos VGovernos da França no decur

so da Revolução , deo a razão dlisso

dizendo, que não ha despotismo mais

pezado que o que se pratica debaixo

.__T-fiifl

Page 77: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

77

das formas, e apparencia de liberdade.

Ora esta maxima de Mr. Burke se

verificou igualmente no reinado de

Napoleão. .Como este era inclinado

ás conquistas , e por consequencia `

desprezador das vidas eÀ dos bens dos

subditos , não teria certamente ousa

do levantar tantos milhões de comba

tentes , nem augmentar tanto os im

postos , se os actos concernentes a es

tas duas profusõ'es de homens e de

dinheiro unicamente houvessem de

sahir do seu Gabinete. Houvera re

ceado ser a cada momento sacrificado

á vingança publica. Elle porém se

tranquillizava, e se animava cada vez

mais a abusar do seu poder , vendo

que aos olhos da multidão se mostra

va a Conscripção como resultado das

resoluções do Senado , e a Receita e'

Despeza da Fazenda como obra das

discussões 'do Corpo Legislativo.

Page 78: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

78

ARTIGO IV.

Do Governo Constitucional considerado

debaixo de hum Principe virtuoso,

mas firme , e que sabe governar por

sz mesmo.

C onsiderei o Governo Constitucio

nal debaixo de hum Principe virtuo

so , amante dos seus subditos , mas

por sua nimia bondade incapaz de

tomar aquellas medidas fortes, que

são necessarias para reprimir os fac

ciosos; e vimos, que elle produzio a

ruína total da Monarquia. Depois eu

o considerei debaixo de hum Princi

pe ambicioso, insaciavel de conquis.

tas, e porconsequencia sem fazer ca.

so do sangue e da fazenda dos subdi

tos ; e vimos, que este não faz mais

'que augmentar o seu despotismo`

Agora , para de todo exhaurir o as

sumpto , falta considerar-se esta mes

ma especie de Governo no reinado de

hum Principe bom , virtuoso, mas ao

mesmo tempo intelligente , firme , e

que sabe por si mesmo governar.

Page 79: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

79

Debaixo de hum Principe desta na".

'turcza jãmais o Governo Constitu

cional poderá produzir algum dos in

convenientes, que ponderámos nos dois

artigos precedentes ; mas neste caso

mesmo não deixará de ser prejudicial;

e não he difficultoso provallo.

A Democracia foi em todo o tem

po olhada como o peior, de todos os

Governos ; e o principal motivo que

tem induzido os sabios a formar si

milhante juizo , he o pouco discerni

mento, a confusão , as miras de par

tícular interesse da maior parte dos

individuos que compõem as numero

ias assembléas , nas quaes , nesta cs

pecie de Governo , reside a suprema

authoridade , e que por conseguinte

decidem , sem appellação, dos mais

graves negocios do Estado. Isócrates

e Xenofonte , a pezar de nascidos em

huma Republica popular , e a mais

Popular de todos os Estados livres da

Grecia , nos deixârão huma miuda

descripção de todos os apontados in

convenientes destas assembleas (1).

Cicero , não obstante ser tambem ci

'(ll Isocnates, Orat. in .Mood-Xeno

Ph. de Repub. Athen.

Page 80: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

80

dadão de hum Estado livre , não deo

dellas mui vantajosa idéa , quando

descreveo os Comicios de Roma. Ora

estes defeitos , que se attribuírão sem

pre ás Assembléas soberanas dos Es

tados democraticos , são communs

igualmente âs das Monarquias Cons

titucionaes , ypois que pelo que toca

ao numero dos que as compõem nadadifferem estas dlaquellas.

Se Luiz XIV., em vez de se entre

gar ao genio creador de Colbert ,

houvesse convocado os Estados Ge

raes como fizerão alguns dos seus re

decessores nas grandes crises do Rei

no , certamente não teria. remediado

a desordem da Fazenda Real, nem ti

vera a satisfação de ver em hum mo

mento , como por encanto , crear-se

e estabelecer-se aquella industria ma

nufactureira , que tanta utilidade

grangeou á Nação. Se Pedro oGran

de , na execu ão do seu immortal pro

jecto Vde civi izar os seus povos, hou

vesse consultado o Senado , terião os

seus sublimes esforços sido inuteis ;

pois que a totalidade dos Russos , e

por consequencia tambem o SenadoJ

estava afferrada aos vícios e aos ha

bitos que elle se proposera extirpar ,

e que com tanta felicidade effectiva

Page 81: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

.si /

mente extirpou. E para apresentar

dlisto hum exemplo mais .chegado aos

nossos tem os , e mais conhecido de

nós os Ita ianos , se o Governo de

Toscana fôra Constitucional, e conse

guintemente Pedro Leopoldo deves

se submetter os seus bellos projectos

economicos ao exame da Assembléa

Nacional , não teria tido certamente

adita formosa porção da nossa Pe

ninsula (*) a ventura de ser felicita

da pela immortal Legislação econo

mica do mencionado Soberano ; nem

della se terião podido aproveitar as

outras nações, como tem feito. E hu‹

ma convincente prova d”isto he, que

por espaço de muitos annos rande

parte da Toscana , como to os sa

em , se mostrou decididamente con

traria a esta mesma Legislação que

tanto agora -louva , e de que com ra¬

zão tanto se gloria. -

Ha. porém outra reflexã'o igualmen

Íe persuasiva, pela qual, ainda mes

mo na hypothese contemplada no pre

sente artigo, se ve , que não deve ser

vantajoso. o Governo Constitucional.

Nesta hypothesc hum Principe aman

(*j Dn Italia.

Page 82: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

82

te' do bem dos seus subditos , e que

sej.r_ ao mesmo tempo dotado dos ta

lentos necessarios para'o' conhecer, a

Viim de não ser contrariado, ou retar

dado na sua marcha, procurará gran

gear com liberalidades e promessas

aquelles Deputados da Assembléa, que i

preceber serão mais oppostosaos seus

projectos. Mas se isto tende a conse

-guir` o llouvavel tim de sollicitar a.

execução` de huma lei, ou de hum re

gimento'util ao Estado , produz por

outra; parte hum grandissimo incon

weniento, que he introduzir a venali

dadénaflblação. E com cffeito, o exem

plo dos Oradores da Assembléa ga- ~

:irmas pela corte por mais de lar- Y

gueza's, onde Cargos ,"reduzirá todos Í

os~i>ndividuos da mesma `Nação-a desejarem 'ansiosamente serem eleitos f

paraDeputados da Assembléa, azfim `

de tirarem o mesmo proveito das' suas

opiniões. - Compraráõ -os votos , que '

são precisos para' 'serem *eleitos Be

presentantes-publicos; e deste modo

'sairá introduzisdo l a pouco e pouco

em toda a *Nação o espirito deveria

lidade ,f'e de ínteresse',›fque he sem

duvidahuo dos maiores. sérios .de

,qualquer Estado , pois destróe todos

os principios de honra e de virtude.

Page 83: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

83:

*v

' .

ARTIGO V. V› .

Differençajmportante, que se' deve fm

zer relativamente ao Governo Cons

titucional.

Com as'refiexões feitas no decurso

deste Capitulo não pretendo insinua:

que se haja. de abolir oGoverno Cons¬

titucional nas Monarquias em que .el¬

le se acha. estabelecido. São. semprer

perigosas as innovaçõ'es grandes em

materia. de Governo: os .antigos as

aborrecião; erã'ofde' voto , que nunca.

se deve emprehender couza alguma.

contra o genero de Governo em quenascemos , com pretexto de o lmelho-I

rar. E com effeito [sócrates , Xeno.

fonte , e Cicero, que , como hnípou

co observâmos, pintârão tanto' ao vi.

vo os defeitos da. , Democracia , se

portârão .não obstante isso como pa»

cificos, e zelozoseidadã'os das snazs res»`

pectivas Rêpublieas. E esta continen

cia he assâs sensata e louvavel , pois

que bem se vêem os defeitosdo Go

vernosob que se vive; mas he diffi

cil, por não dizeš- impossivel , prever

2

Page 84: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

84

aquelles que podem nascer da refor

ma, aqual muitas vezes ainda os pro

duz maiores. Ora , por esta mesma.

razão de que o Governo Constitucio

nal se não deve abolir nos Estados

em que ha muito tempo se acha esta

belecido, todos muito bem percebem

que não convem introduzillo onde el

le era desconhecido.

Por outra parte, a considerar bem

a couza , ha mui grande differença

entre estes dois casos , que eu aqui

tenho ponderado. Se esta especie de

Governo se acha ha lmuito tempo in

troduzida em alguma parte da Euro

pa , isto não se fez em consequencia

dos direitos originarios dos homens,

e da pretendida Soberania do Povo.

Estes principios erroneos, esediciosos

não forão conhecidos ,1 ao menos no

que respeita ao geral das nações , se

não por todo o meado do Seculo pas.

sado. Naquelie momento pois em que

hum Principe ao presente, adherindo

ás insidiosas declamações dos Filoso

fos,` e dos fautores das idêas liberaes,

fizesse huma tão rande reforma no

Governo dos seus stados , introdu

zindo ne'lles a Representação Nacio

_nal , viria a confirmar aos olhos da

multidão as ditas maximas sediciosas,

Page 85: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

85

em virtude das quaes se estabeleceo em

França , em 17.90, oJ mencionado Go

verno , e terminaria provavelmente

produzindo os mesmos funestos effei-tos, que por-causadielle sentio aquel

la Nação.

Esta distincçã'o', que tenho feito

entre os dois differentes casos. aqui

ponderados , me parece assâs bem fun

dada : e poderá por isso' servir de

resposta a huma objecção , que os so

breditos sequazes das ideas liberaes

talvrz não deixem de me fazer , isto

he, que o Governo Constitucional tem

existido , e existeainda em algumas

Monarquias, sem que estas liajão sof

frido as horríveis consequencias que

em França se .experimentárãm Este

facto não se pode certamente contra

dizer; mas isso em nada destroe a for

ça das razões atéagora adduzidas

para tolher qualquer Soberano de

introduzir nos seus Estados simi

lhante forma de Governo; e a ra

zão d”isto he , porque ao presente

todos os Estados da Europa se a

chão em circumstancias inteiramente

diversas das em que se achavão os

Povos , entre os quaes se introduzio

antigamente a representação nacional.

0 Filosofismo nas suastenebrosas pro.

Page 86: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

86

ducções tem* falledo' tanto dos direitos

primitivos 'dos homens; e da soberania

do Povo, e tem osprose'lytos dwquel

la fallaz sapiencia. sustentado tanto,

que em toda- a forma fade-Governo o

poder supremo reside de direito na.

Nação, representada'pelo corpo dos

Deputados congregados' -fna Assem

bléa e ue cone` ' uintemente'osReÍS a7

não são mais que os primeiros Ma

istrados ~; que ,onde 4zhouvessle hum

rincipe ltão pouco prudente que es

tabeleoesse' esta Representação Na

cional nos Estados onde

imente ella se não achava em vigor,

as cabeças provavelmente' se elec

anterior- '

*trizarião Aao ponto deL as verem bem 1

depressa. entregaram-se aos horri

:riveis excessos , que exactamente em 1

caso em tudo identico acontece

rão ha vinte e cinco unnos em Fran- 4

a, . . ,_ ‹ . `

~ He de advertir além dlisto, que por 1

huma instituição não ter produzido al

gum mão effeito em hum Estado, não se

segue por necessaria consequencia que

deva experimentar-se - igualmente a

mesma felicidade em outro Estado, para onde › essa mesma vinstituição se

quize'sse transplantar. Esta reflexão

he tão verdadeira , que Wdos osescri

Page 87: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

87

toras de maior fcredito ``em materia de;

Politica tem estabelecido como maxi-›

ma geral , fille ao transportando hum

para outro `stado huma lei, ouqfuarl-íA

quer re ulam'ento ,' se devo primeiro

que tu o examinar , se ospcestumes ,L

os caracteres , os habitosdaz noção.

para a qual se íntenta. fazeneqlia tras¬

ladação q permittem.V ¡ L. , , ¿ a; `

MylordV Bristol , Bispo .do Loodoow.:

dery, que pelo seu original ¡nododq

pensar era tão conhecido a§ê~,-de nós

osltaliaoos , - entre os '›quaes..tanto›

tempo habitou . eooabou.›seus dias ,.

achou-se hum dia aj-antar em casa de

Lord Howñ'é'no tempo'éur uouwww-tomo da lViouarquie'lí'rziueezaV en'a o

assumpto de `todos as conversaçflesfef

sobre o qual'cada'_hum`discorria ao_`

seu modo sobre o'GoYemon'ilueeon

vinha alli sustentar, ' Yeu'dö"elle_,quq

todos os .outros convidados opinevão'.pela Constituição là leza,` À*pega-ndo?

em bum~copo de vin ofzfle Champaú»

nha , -- Como'quereis , ` dissëieile ",ffqllgef

huma N ação - onde se'pod'e lie'loer'us'ularlà;I

mente ao jantar 'hum v'i'uho'` 'tã'o .espiii

rituoso , se possa, accommodar ã Copel;

tituição' de hum 'Povo ,i l>que u_äote_n.t2

outra. .bebida que huma zadazçdonrf

So cervojo3››n,`rEste ,ago eza, viva e.

Page 88: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

88

espirituosa triunfou de todas as ra›

zões contrarias , e conduzio toda a

companhia ao sentir do Conde' de

Bristol. . p

Os Francezes discorrêrão de hum

modo totalmente diverso do dos com

mensaes de Lord Howhe, e bem-depressa levârão ocastigo dlissoz. Trou

xerão em 1789 de Inglaterra o syste

ma;da Representação Nacional com a

mesma precipitação , com que vinte

annos antes tinhão trazido dalli a mo

da dos Jardin-s irregulares , e a de

andarem continuamente acavallo (l).

(l) Luiz XV, que näo amava os Filoso

fos, mas que infelizmente lhes deixou to

da a liberdade de corromperem o espirito

dos seus vassallos, plenamente conheceo a

fatal infl'uencia, que a mania por ell'es iu

troduzida de imitar os usos e costumes

Inglezes podia trazer comsigo a ruina da

Monarquia ;. edeixou de quando em quan

do escapar algumas expressões que clara

:fomenta attestavão a sua aversão a esta An

` glomania, que nos ultimos annos da sua vi

da se tinha introduzido em França-A

todos he notorio em França o apodo ver

dadeiramente agudo, que o Monarca dis

se a hum dos seus Cortezäos moços ao vol'

tar de huma das frequentes viagens que fa

zia a Londres;-¿Que tendes andado. fa~

Page 89: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

89

Mas a vivacidade da Nação France

za, e o seu grande amor da novidade

zendo em Inglaterra? lhe perguntou Luiz

XV.--Apprendre à penser. -A penser des

eheuaux sans doute. (Aprender a pensar.

-Certmnente apensar cavallosj, replicou o

Rei, e lhe voltou as costas com ar de des

prezo.

Tendo proposto Mr. Paris Duvernay,

Director da Escola Militar , ao mesmo

Principe, que introdurisse nella oestudo da

Lingua InglezaP, ` foi a proposta recebida

com frieza. Quiz o Director insistir, al

legando quantas vantagens poderião tirar

d'esse estudo .principalmente os Alumnos

da Marinha; mas o Rei positivamente o

excln'io dizendo: Ils ont perdu l'esprit de

mon royaume, 'n'erposons pas la génération

naissanie au danger d'être pervertic elle

meme. (Elles tem perdido o espirito do meu

Reino, não exponhamos a geração nascente

ao risco de _ficar tambem pervertida.)

Como entre as modas inglesas introdu

zidas em França huma das mais estimadas

era a dos Jardins irregulares e agrestes, tão

usados na Gran-Bretanha, Luiz XV indu

zio o seu Ministro Mr. Bertin a fazer aquel

les famosos Jardins Chinezes, que todo Pa

ris hia ver a Chatou perto de Neuilly. A in

tenção do Monarca era que o gosto d'elles

seestentende entre os seus vassallos , puro.

que, oppondo singularidade a singularidade,

Page 90: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

90

fizerão que não se cingisse. a copiar

o original. O Governo Constitucional

Inglez, que ella tantos annos conside

râra como a mais perfeitaConstitui

ção politica do Mundo , foi notavel~

mente alterada em França nos mes

mos rimeiros momentos em que se

intr uzio. E com effeito , ao passo

que em Inglaterra a Representação

Nacional foisempre dividida em duas

se desacostumassem diaquellas modas que lhe

pareciäo ligadas a ideas que lhe desagrado

vão, porque as julgava funestas em Moral,

em Religiio, e em Politica; mas foi-exa

ctamente por esta ligação que o gosto In.

gler-triunfou do gosto'Chinez', e que o

exemplo de Mn Bertin não tem imitado

res:` ` m .-› \\-' Luiz XV estava tio persuadidoy que , ata

tendido o caracter da sua nação , .d'esta

paixão pelas modas lngie-vzas passaria 'a

adoptar-tambem a Constituição politica da

Grã~Bretanha , e por tanto a arruinar a

Monarquia; que na occasiäo da Revolução

Parlamentar idisse hum dia ao Delfim estas

memoraveis palavras, veriñcadns em França

:io-depois á risca-:š-Á" Vós talvez chegarei:

mifm ; mas` não he muito certo que vos

succeda algumfilho vosso , ou que se sus

tente no thromw-A moda dos Rm vai

acabando.” -

Page 91: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

9 I'

Camaras , humados. Deputados do

Povo , e a outra dos Pares que repre

sentão a Nobreza; em .França pelo

contrario se concentrou inconsidena

(lamento em huma só Assembléa , o

que. visivelmente dava' huma grande

tendencia para a l'Democracia Em

Inglaterra he oRei pela Constituição

revestido das maiores prerogativas; e

em França pelo contrariowficou Luiz

XVI reduzido a não ser mais `què

hum' simples fantasma da Dignidade

Real; assim , em brevissimo espaço

de tempo foia Monarquia inteira

mente ahniquilada; e em huma gran

de Nação , -inveterada no luxo, e em

todos os vícios que dl'e le são conse

uencia, se vio com admiração intro

uzir-se aquella especie de Governo

que semlpre se Vmostrára turbulenta

até nos pequeninos Estados da Grecia;

Condillac ,'e todošIošoutms Filoso

fos que antes da Revolução exaltárão

tanto as vantagensído 'Governo Cons

titucional ,- fallavão das nossas M0

flül'quiars da Europa. como se em na.

da differissem v'dos Estados despoticos

a Asia.. Ora quem não vê nlisto a.

maior malígmidadez.,ze a mais visivel

má fé? Entre todosos Estados Chris

Íãos não ha luunÀ só que seia desposià

Page 92: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

92

co , pois que , como' muito bem-ad;

vertio Montesquieu, esta monstruosa

especie de Governo he de todo em` to

do incompatível com os preceitos da

nossa Divina Religião. Por outra

parte , o direito de propriedade, que

os Soberanos da Europa tem sempre

respeitado , a faculdade geral de tes

tar, consequencia accessoria do direi

to de propriedade , hum Código Ide

Leis civís e criminaes, pelo qual he

limitada , c restringida a authoridade

dos Tribunaes e dos Juizes, são ou

tras tantas circumstancias , que ha

muito tempo tem adquirido ás nossas

Monarquias Européas o honorifico

caracter de moderadas, que as diffe

rença essencialmente dos Reinos Asia

ticos , onde o momentaueo capricho

do Sultão , e dos Sátrapas he a uni

ca lei.Em vãoI se declama contra o poder

absoluto dosReis: em vão se diz que

a liberdade civil he o bem principal

dos homens , e que esta não se pode

achar senão nos Estados, em que aNa

ção participa do exercicio da Sobe

rania. Todos estes freios da authori

da'de dos Principes se tornão vãos e

inuteis na pratica, se esses Principes

não são virtuosos, le amantes do bem

Page 93: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

93

dos subditos. O Governo de Napoleão

he, como nós vimos 'huma recente

prova dlisto. E por isso os antigos,

que nós com grande semrazão des

prezamos, medião a tyrannia não já.

pela Constituição do Governo , mas'

sim unicamente pelo facto , ou pelo

procedimento pratico dos Reinan

tes (l).

A Europa no momento actual he

bem feliz , pois que longe de ter que

desejar ver encadeada a authoridade

dos proprios Soberanos , deve antes

anhelar que elles possão exercitar

com toda a. possivel energia o poder

de que Deos os revestio, afim de frus

trarem deste modo os esforços, que

os occultos inimigos da boa ordem

tentão pôr em pratica para perturba

rem de novo o publico socego. Em

(1) Quid interest inter tyrannurn, et re

gem? Species enim ipsa~fortunae ac licen

naapar est: nisi quod tyranni ex voluptáte

saevinnt , reges non nisi ex cansa, ac ne

cessitate? Quid ergo non reges quoque oc

cldere solent? Sed quoties id fieri publi

CQ utilitas persuadet. Tyrannis saevitia cor

‹l\ est; tyrannus antem distal: a rege factis,

non nomine. Senec. de Clem. lib. 2. cap.

ll. e 12.

Page 94: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

94

nenhum outro tempo com effeito se

dao-huma combinação de Principe:

tão virtuosos , tão benéficos , e tão oc

cupados no grande objecto do bem pu‹

blico. Se ha dois annos, com exemplo

` inteiramente novo, elles se ligârão em

estreita alliança entre sipara abate

rem aquella Potencia, que queria per.

petuar no nosso continente o ílagello

da. guerra ,a continuão a estar perfei

tamente unidos a'fim de consolidarem

com os seus conselhos o inextimavel

beneficio da paz , que com'as suas ar

mas der'à'ov ã terra. Deixamos porém

`aos Historiadores e â imparcial pos

teridade o celebrar os factos e as vir

tudes dos Soberanos Européos do rin

cipio do decimo nono Seculo. Ju guei

entretanto que devia tocar, por assim

dizer, de fugida este ponto , para

mostrar ao leitor quanto fóra de provposito os fautore's'das idêas liberaes

-tem- escolhido hum tal tempo para

apresentarem de novo em campo o

'systema do Governo Constitucional,

cujo funesto exemplo he de tão recen

te data.x

Page 95: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

95

oAPI'r Ulíol 111.'

-Dos Apratemas delicias' de opinião.

Quando pelo meado 'do Seculo pas.

sado os Filosofos concebèrão o horx

rivel projectode prostrarem todos os

thronos , 'procurârão primeiro que ` tu'

do ganhar huma perfeita impunida

de; procurando para este fim' debili

tar no espirito do .publico o horror,

que antecedentemente se tiverasem

pre ao delicto , que elles tinhão ten'

ção de commotter. Mas tambem sobre

este ponto, 'como relativo a todas'as

outras suas maquinações , não apre

nentárão logo todo o veneno da sua

doutrina ‹, pois que assim terião-no

primeiro intro'ito afastado os seus=le_i- ›

, v . 4,

-_Oontentârão~se por então com es

Ea-lhanihum grandissimo desprezo so*

re a legislação criminal, que wião

'estar' ' oralmente em vigor na Enro

a , pintando-a como incoherente, in

sman'a, e sanguinaria'. Deploravão

Page 96: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

96

com o tom mais pathetico a sorte do

genero humano , que, em hum Seculo

em que todas as outras Sciencias se

achavão tão profundadas, a. que de

cide da vida , e da honra dos. homens

estivesse ainda na infancia. Todos sa

bem quanto taes invectivas depois de

1770 se hajão repetido em todos os

Reinos. E como parecia que ellas não

tinhão outro finrmais que advogar a

causa da humanidade , produzírão

por tanto o effeito que os Filosofos

se tinhão proposto. Vendo pois estes

que o Mundo estava quasi eralmen

te prevenido contra a legis ação cri

minal datEuropa , passârão a atacar

em particular aquella parte da mes

ma legislação , que tratava dos de

lictos d”Estado , caracterizando com o

nome de méras opiniões politicas

aquelles discursos, e aquelles meneios

tendentes â subversão dos respectivos

Governos existentes r, que d"antes se

tinhão sempre posto na classe dos de

lictos de Lesa Magestade , e com ra

zão , pois que quando este delicto es

tá de todo consummado, já não ha meio

de o punir.

n He huma in'ustiça (diz o author

,, do Systema šocial) castigar hum

,, homem por mêras opiniões ;--.8e ha.

w-a-i

Page 97: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

97

cou'za , que meipert'en'pa de direitd

natural `e divino, são os meus pen.

samentos. Todas as Potencias da

terra unidas nunca conseguirâõ

obrigar-.me a pensar aquillo que

eu não quero, a ter por verdadei

ro e evidente aquillo que me pare.

ce falso e absurdo. Se jámais hou- .

ve despotismo insensato, he aquel

le que quer dominar no entendi

,, mento eua razão dos homens. av (1)

Helveci'o repetio quasi o mesmo (2);

mas como foi possivel não ver o en.

gano , por não dizer o absurdo, dess

tes raciocinios? Quando eu tenha o`

direito de pensar o que bem me pa

recer, tenho por ventura tambem odi

reito de o ensinar, de oprofessar pu

blicamente , de' o escrever, de o im..

primir? Hum sedicioso , punido por

ter perturbado com as suas maximas

o publico socego , be` castigado por

méras opiniões? Os meus pensamentos

são propriedade minha sómente enr

quanto /estão internos; nenhum poder

f z

(l) Systême Social. Parte ll, c. 5.

(É) Helvefius, -De l'homme, de se.: _fa‹

culle's intellectuclles , et de san Education ,

1.1., seu. IV. c. 17.

Page 98: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

9.8

humano pode ter inspecção nelles. Se

eu os faço depois conhecer por meio

dos discursos, dos escritos, e das ac

ções, desde esse mesmo momento mo

vem a sociedade; e a sociedade pode

preservar-se 'ustamente do damno que

a sua contagião pode'produzir, casti

gando para esse fim aquelles, que os

es alhárão.

sta nova theoria. extravagante, que

converte em meras opiniões politicas

os attentados contra o poder e autho

ridade dos Reinantes , e que em todo

o tempo forão olhados como os mais

odiosos entre os delictos , não se pode

' de modo algum sustentar sem que ao

mesmo tempo se admitta o horrivel

principio , tão exaltado da Filosofia

moderna, de que em todos os Estados

aSoberauia reside intrinsecamente no

corpo da Nação. Verdadeiramente

nem o author do Systema Social, nem

Helvecio , nem os outros escritores,

que forão dos primeiros em espalhar

esta mal entendida jurisprudencia ,

o disserão ; mas , como já observei ,

todos s bem , que os Filosofos não

espalhárao logo ao principio todo o

veneno das suas pestilentes doutrinas.

A' medida pois que elles se hião as

seuh'oreando' da opinião publica , e

Page 99: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

99

'que conseguintemente vião que se bia

avizinhando a época do cumprimento

dos seus votos pela destruição do

Throne , abandonárão toda a reserva

atêalli praticada; e sobre o revoltoso `

rinci io da pretendida Soberania do

govo undârão abertamente a sua di.

ta nova theoria , que transformava

em méras opiniões politicas osverda

deiros crimes de Lesa Magestade.

João Paulo Marat , nove annos an.

tes que surdisse a Revolução France

za , na qual por desgraça do enero

humano teve tanta parte , pu licou

hum projecto de Legislação Crimi

nal, que teve subitamente grande vo.

ga , não só na sua Nação, mas tam

bem na Alemanha , e .na Suissa, onde

pela primeira vez foi impresso (l).

Depois de na primeira parte desta

Obra , com o pretexto de estabelecer

os principios de huma boa Legisla

šão , se ter abandonado ás mais ve

ementes invectivas contra todas as

Monarquias da Europa , e de modo

que demostrava. que não contava ne

nhuma entre os Governos legítimos,

(l) Plan de Législation crimir'telle , porV

M. Mam. Neuehatä. 1780. f

, z q

Page 100: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

100

,passou no 'rincipio da segunda para

te a expen er mais claramente .o seu

modo de pensar -sobre este ponto ,

dizendo expressamente quev pela pa

lavra Soberano entendia unicamente

aNação unida emvcorpo, e por meio

dos seus Representantes. Estabelecido

este sedicioso principio, o qual, como

todos vêem, he o_mesmo do Contrato

Social de Rousseau , entra Marat a.

fallar dos crimes de Estado , os quaes

divide em duas classes , isto he , em

falsos , e verdadeiros. Na primeira

classe põe todos os attentados contra

os Principes , e na segunda os que

se commettem .contra o Estado. Mas

he bem oouçamos a elle mesmo, pois

que o absurdo das razões , com que

pretende sustentar esta nova jurispru..

dencia , se descobre logo por si mes

mo sem necessidade de refutação al

guma. _ ~

v7 De se considerarem aquelles que

tem as redeas do Governo (diz elle)

como absolutos senhores dos Po

,, vos , .quantos crimes de Estado se

,, tem introduzido, que não tem por

objecto o Estado 1 Nem podia ser

,, de outro modo; homens que querião'

,, destruir a liberdade ,. temião tudo

,, aquillo que a podia manter ; d”a-`

\

Page 101: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

101?

',, qui, para sedescartarem daquel

,, les que tinhão'o1 valor de se oppo.

,, remy a tão negro attentad'o , preci»

,, savão achallos culpados , e em bre

,, ve fizerão do amor da patria hum

,, crime. Destruida a liberdade, te

,, mèrão tudo aquillo que podia ael

,, la revocar os animos; e. por isso cri

,, írão em'crimes orecusar obedecer

,, s suas ordens injustas, o reclamaa`

,, os direitos 'do homem , o lastimar

,, os infelices opprimidos. Chega-dos

,, ao ponto de não- contarem porlEs~

,, tado senão as suas pessoas, qualifi

cârão delicto tudo aquillo que lhes

fazia sombra ; e cavon al tyrannia

abysmos debaixo dos pés dosCida.

dãos. 'Assim que o Principe se achou

,senhor do poder supremo , prodiga

lizârão-lhe os aduladores os titulos

mais pomposos, e, entre outros,ode

Sagrada Ma estade, eerigírão'emcrimes de lgaesa Magestade tudo

,, aquillo que lhe .clesagradava.,,

Supprimo-«aqui algumas outras pas

Sagens mais incendiarias 'contra as

pessoas dos Monarcasa, e continúo a

referir os raciocinios de Marat, rela-I

tivos aestes pretendidos falsos crimesdiEstado. . r i

“Nada >ha Ímais repugnante (dia

“uuuvvv-v

v.,`.`.`._.`.u`.

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102

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},

A elle) que as falsas idéas , que Le.

gistas assalariados tem dado dos

crimes d'Estado: tem elles com

prehendido debaixo diesta denomi

nação tudo aquillo que se faz con

tra o Principe, tendo ara esse fim

dividido os crimes de esa Mages

tade em differentes classes. '

,, Deixando ao Principe o titulo. de

Magestade, todos os crimes que se

commettcm contra elle são com ef

feito crimes de Lesa Ma estade;

mas estes crimes de Lesa agesta

de não são crimes diEstado. Pelo

contrario restituindo-se ao Sobera.

no o titulo de Magestade (e por

esta palavra entendo sempre ,

accrescenta elle em nota, a. Nação)

restituindmse ao Soberano , alias

ao Povo , o titulo de Magesta.

de , que só a elle pertence , he

claro que todos os crimes de Lesa

Magestade são verdadeiros crimes

d”Estado ; mas então os crimes

contra o Principe já não são cri

mes de Lesa Majestade ,, (l).

E como sc com todas estas passa

(l) Plan de Législation criminelle í);

Mural. `Edil. de Paris chez Rocheue, 1790

Seconds partia, l sect., chap. l. pag. 41 eis.

Page 103: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

103

gens tão atrevidas ellev não tivesse

exprimido assãs claramente oseu mo

do de pensar , e para que ninguem

podesse duvidar que inteiramente se

devi'ão desterrar da Jurisprudencia

Criminal os delictos de Lesa Magesta~

de no sentido em que sempre até alli

se tinhão entendido , passou Marat

depois a applicar a sua'nova theoriszI

aos casos particulares.

Em primeiro lugar, diz elle que os

escritos contra o Principe , bem lon-`

e de serem olhados 'como delictos de

sa Magestades, devem pelo contra.

rio ser permittidos e animados (1).

Diz que n°esta classe igualmente se

não devem comprehender nem as re

clamações contra o Principe , nem a

resistencia ás suas ordens injustas (2).

-Vai ainda por diante , e diz que

nem tão pouco os attentados contra

a... .Mas aqui me cabe da mão a.

penna dc horror.

Deixemos no esquecimento que me

rece este novo projecto de Legislação

criminal, formado por' hum dos mais

(l) Murat , ubi supra. Ediç. de Paris,

pag. 43. '

(2) Marat, ubi supra, pag. 45.

Min-¡- k..~``._ _M...

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104

atrozes revolucionaríos que a França .

teve: nem eu ousâra fallar d'elle, se» 1

não víra esta extravagante theoria ,

que converteo em méras opiniões po.

liticas os mais odiososdelictos de Lesa. ;

Magestade, incluida nas pretendidas i

ideas liberaes , que, como ao princi- 1

pio dissemos , andão agora em tanta !

voga no Mundo. E com effeito ', se- 1

gundo os fautores dlessas idéas,›todos i

aquelles que ha vinte annos'¿a. esta

parte tem com as suas maquinações e .

tramas contribuído tanto para a que

da dos respectivos legítimos Sobera

nos não são réos senão demeras opi

niões ! Ora , todos -conhecem muito

bem , como eu ha pouco dizia , que

não se pode admittir tão grande ab

surdo , sem que ao mesmo tempo se

admitta ohorrivel principio de Rous

seau, de Marat,‹e de todos os outros

Filosoƒos modernos ., que a Sobe

rania em todo e qualquerEstado re

side de direito' no corpo da Nação ,

e que os Reis não são mais` que Mi

nistros e primeiros .Magistrad95. do .

Povo. Restitua-se porém o verdadei

ro nome'ás couzas, e , no rigor "das

antigas leis penaessobre ocrime de

rebellião,'temão os entranhaveis íni

migos da suprema authoridade dos

E A . .1 E - A,4__.‹A

Page 105: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

105

Principcs, assim como da boa ordem

publica , temão , digo, haverem de

ficar sujeitos ás penas das menciona

das leis antigas, toda avezfque tive.

rem a tentação de se entregarem de

novo aquelles discursos, âquellas cor

respondencias , âquellcs conluios ,

áquellas tramas , que nestes tempos

atrás impunemente praticârão, e que

tão fataes tem`sido ao Mundo.

Mas prosigamos em decobrir e pôr

no seu verdadeiro monstruoso aspecto

todos os outros extravios, que os fan.

tores das idéas liberaes desejão, com

este especioso nome , fazer de novo

dominar no Mundo. Os Filosofos do

decimo-oitavo seculo , antes de pôrem

descobertamente em pratica a conju

ração contra o Throno , da qual até

agora temos fallado , trabalharão á

cerca da outra que tinha por alvo a

subversão do Altar , persuadidos de

que, em quanto os antigos sentimen

tos relifl'iosos continuassem a reinar

no espirito dos homens, e conseguin

temente se continuasse a olhar como

hum positivo dever de Religião e de

consciencia a submissão aos Monarcas

da Terra, jâmais ellos poderião con

seguir ocnmprimento do seu ssdicioso

intuito. E infelizmente se não enga

Page 106: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

106

nârão no modo que devião seguir pa.

ra effectuarem a sua mencionada cons.

piração anti-religiosa. Foi este meio

o prégarem a tolerância, ou por ou.

tros termos a total indifferença em

materia de Religião. Esta. doutrina

da tolerancia indefinita ainda não se

riscou da mente dos homens , apezar

de se terem visto os amargos fructos

que tem produzido. He huma das mui

tas maximas que se põem no numero

das idéas liberaes; e por isso he bem

que eu passe a fallar d”esta em huma

Obra, que se dirige a preservar o

Mundo da contagião d'estcs novos fan.

tores dos erros e das publicas cala

midades.

Ú___-___.

o

Page 107: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

107

CAPITULO IV.

Da Tolerancia.

An'rleo I.

O systema da Toleraneia , tão gabado

dos pretendidos Filosoƒos do Seculo

decimo oitavo , eque agora se repro

duz e se põe no numero das Idéas

liberaes, não he mais que huma cul.

pavel indifferenpa em materia de Re

ligiãa.

DEos não pode approvar cultos

que mutuamente se destroem : a jus.

tiça e a injustiça, a luz e as trevas ,

a fé e a incredulidade não podem li

gar-se entre si. Huma Religião que

tolera todas as outras , não he hum

Culto , he a destruição de todos os

Cultos; porque a indifferença para.

com todos os Cultos contradiz aber

tamente a idéa de hum'Deos sabio,

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108

unico, e verdadeiro; porque suppõ'e

rio/homem hum formal desprezo da

verdade , e indolencia em se instruir

d”ella , incompatível com oque sedeve a Deos.- H' Y - -'

A Religião Catholica, A ostolica,

e Romana .he*incontestaive mente a

unica boa , a unica segura , a unica

verdadeira. He esta huma verdade

que os Apologistas tem provado com

huma serie de deducçõ'es tão luminosas

e convincentes , que dellas tem con

cluido como. legítimo corollario não

havermeio termo entre o Catholicis

mo =e zo Atheismo.` Ora qualquer que

rofessa huma tal Religião , e está.

persuadidoda sua verdade , deve ser

apaixonadamente. afferradp a ella ,A e

conseguintemente não pode deixar de

olhar todos os outros Cultos como ou

tros tantos ultrages feitos â Divinda

defl~Não pode ter aquella indiffieren

ça- para; com todas as Religiões,À que

os Filosofos quererião ver geralmen

te'estabelccida, pois que conviria que

abjurasse a sua; cumpriria que fosse

falsario' e mentlirosm; 'e com .effeito

não depende de.I hósí olhar como falso

o que he verdadeiro., duvidar .quando

estamos convencidos 9' considerar .a

verdade eo erro' como,.cousas.indif¬

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109

ferentes. Os Hebreos', como reflecte

muito bem a este proposito hum im

pugnador do moderno filosofismo, sem

pre seguirão as mesmas maximas que

os Catholicos no ponto da Tolerancia ,

pois que , assim como estes agora, pos

suírão elles por tempos o deposito

precioso da verdade , que he huma ,

santa, zelosa, e que não se pode unir

âmentira (1). t '

A intolerancía dos Catholicos, lón

ge por tanto de merecer todas as vio

lentas diatribes com que tem sido atacada pelos Filosofos , he tambem hu-i

ma fortissima prova da verdade da

nossa Religião. OI erro pode tolerar

o erro ; mas quem teve a ventura de

conhecer a verdade , não pode deixar

de amalla, e de lhe ser muito affer

rado. 1

Quem com effeito não he de todo hos

pede na Historia , sabeI que esta into

lerancia dos Catholicos foi hum dos

principaes motivos que induzírão Hen

rique IV a abjurar oCalvinismo. To

das as .razões politicas e interesses

particulares suggerião a este Princi

(l) La vraie Fhilosophie, par le P. Elie

Hard. Paris, 1783. pag. HG. '

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110

pe que passasse ao partido dos Ca

tholicos, pois que a sua adhesão aos

Protestantes era a unica couza ue

nclle desagradava ao geral da a

ção; mas elle , que 'por desgraça ti

nha sido creado no erro , não o quiz

fazer , porque ainda não estava des

enganado. Se elle fora indifferente

em materia de AReligião , ter-se-hia

feito Catholico depois da morte de

Henrique III , pois que dando este

passo vinha a remover todos os obs

taculos, sabendo muito bem que asua

adhesão ao Calvinismo era , como já

disse, o unico defeito que a Nação

aborrecia na sua pessoa ; não se de

terminou porém a tomar similhante

partido senão no fim de quatro an

1103 , que he 0 mesmo que dizer

quando, depois de já ter atterrado a

Liga e triunfado de todos os seus ini

migos , lhe não podia já a coroa ser

disputada pela força das armas. As

circumstancias em que Henrique se

converteo , e. ocuidado que tanto tem

po empregou para conhecer em qual

das duas Religiões, que então reina

vão em França , residia realmente a.

verdade, attestão pois, torno a dizer,

que elle não era indifferente em ma

teria de Religião. Ora, entre as ou

.mll

Page 111: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

Ill

tras muitas razões que o determina.

rão , huma dellas foi esta intoleran.

cia dos Catholicos tão desacreditada`pelos Filosofos.l Tinha elle sabido do

seu amigo Sully, que cinco dos mais

acreditados Ministros da Reforma

plenamente convinhão no seu pro'e

cto de conversão, concordando to os

elles livremente que tambem na Re

ligião Catholica se podia chegar á

eterna salvação. Alguns outros Minis

tros attestárão directamente a Henri

que a mesma couza , como refere o

outo Arcebispo de París, que escre

veo a sua vida. ,,Hum historiador

,, (dia elle) refere que tendo o Rei

,, mandado fazer na sua presença

,, huma conferencia entre al uns Dou

,, tores de huma e outra greja , e

,, vendo que hn'm Ministro convinha

,, que podia salvar-se tambem na Re.

,, ligião Cathol-ica, levantou S. M. a

voz , e disse ao mesmo Ministro:

-Sois vós pois de parecerque se

pode chegar âzeterna bemaventu

rança tambem na Religião destlon

tros Senhores 2-- O Ministro respondeo,,que nada dlisso duvidava, com

tanto que se vivesse bem. Então o

Rei replicou mui judiciosamente:

-Pede pois ea prudencia que eu

“uøvuvuuuviuvuwvgu

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112

,, seja da sua Reli ião , e não da.

,, vossa ; pois que a raça'ndo a sua ,

,, eu me salvo segundo elles dizem , e

,, segundo vós dizeis ; ao passo que

,", continuando a estar na vossa , eu

,, sim me salvo segundo vós dizeis,

,, mas não segundo elles dizem (1)”.

Este raciocinio , que tanto contri‹

buio para dispor Henrique a favor

da Religião Catholica,l he com effei

to assâs concludente; e em vão Rous

seau, no seu livro do Contrato So

cial , procurou debilitallo, dizendo,

com aquelle tom de oraculo, que lhe

era tão familiar , que a razão pela

qual se diz que Henrique IV abra.

çára a Religião Romana , devera tam..

bem fazella abandonar de qualquer

homem próbo , e sobre tudo de qual

quer Principe que discorra. Clara.

mente se ve que o Cidadão de Gene.

bra allude nleste lugar á doutrina ex.

clusiva dos Catholicos contra a qual

se tinha desenfreado tanto .na mesma.l

Obra , a ponto de dizer que se de

vem tolerar todas as Religiões, excepto

aquella que se atreve a dizer: Que

fóra da Igreja não ha salvação.

- (1) Vie de Henri IV par Monseig. de

Pero/irc, Archeve'que de París.

Page 113: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

1-13

Locke , muito antes de Rousseau,

tinha sustentado o mesmo no seu Chris

tianismo raciomwel , e mais diffusa

mente ainda na sua Carta sobre a To

lerancia. Durante a sua estada em

Hollanda , aonde se retirou em com.

panhia do seu protector o Conde de

Shaftesbury , que tinha incorrido na

desgraça da Corte , contrahio gran.

de familiaridade com Leclerc , Lim

borch, e outros muitos doutos d°aquelle

paiz, huns d”elles Socinianos, outros

Ariminianos , os quaes então traba.

lhavão de acordo por introduzir huma

illimitada tolerancia entre as diffe

rentes Communhões do Christianismo

antigas e modernas, e por fazer que

todos aquelles que tinhão os nomes

de Cristãos, não só vivessem em paz

huns com os outros , mas tambem se

considerassem todos estarem na estra

da da salvação ,' qualquer que fosse

a diversidade e existisse nos do

guias, de que grão profissão.

Segundo estes principios, tão repe.

tidos nas duas apontadas Obras de

Locke., nem Sabelio quando confun

dio as tres Pessoas da Trindade, nem

0! Triteistas quando dividião em tres

a natureza e a essencia de Deos, nem

Mio e MacedonioH quando poserão

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114

no numero de creatu ras hum o Filho

de Deos , e o outro o Espirito Santo ,

nenhum sem summa injustiça podia

ser separado da Communhão da Igre

ja; todos ellescaminbárão pela estra

da da salvação ; e ainda hoje se po

derião crer asmesmas cousas que crêi

'são aquelles heresiarcas, sem temor al

um de fazer naufragio na Fé. Nãotgraternizão com effeito os Calv'mjst-as

com os Lntheranos , ainda que estes

tenhão conservado oy dogma da pre

`sença real, que os primeiros conside

rão como huma idolatria dos Catho

licos? Sómente estes ultimos , olhados

A'corno pessoas essencialmente intole

rantes, erão exclusidos no systema de

Locke do beneficio desta universal fras

'ternidade , de modo que claramen

te se ve que Rousseau, na passagem

ha uco indicada, não fez mais que

copiar o Filosofo Inglez, como os

sectarios das ,ideasigliberaes copião

actualmente hum e utro , pré ars

'do-nos de novo a doutrina da ole

á=raneia.

A Igreja Romana he realmente in

tolerante ; mas esta intolerancia que

os Filosofos , de acordo com os Hete

rodoxos , tão agramente reprovão,

nãohe outra cousa mais que a sua

Page 115: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

115

fidelidide , a sua firmeza em con.

servar em toda a sua pureza o sagra

do deposito da Divina verdade, que

ella está encarregada de ensinar , e

' de transmittir/de geração em geração

até o fim dos Seculos, do mesmo mo

' do que lhe foi pelo seu Divino Mes

'z tre confiado. Ella não soffreria que

nelle se fizesse a minima alteração.

Todo o erro , huma vez que offenda

temerariarnente as maximas da sua.

crença , deve ser rejeitado do seu

seio. Esta inflexibilidade de sentimen

to tem a. sua. origem na infallibilida-`

de, que ella faz profissão de susteni tar , como hum dos pontos fundamen

fl taes da. sua doutrina. Crera que os

renunciava, se depois de ter pronun

ciado sobre qualquer dogma , couti

nuasse a admittir á sua communhão

aquelles, que se fizessem refractarios

e rebeldes ás suas decisões. Se podes

se dissimular e trahir huma unica das

verdades do seu Symbolo, cessaria de

ser huma depositaria fiel, e a Bali.

gião que ella ensina não sería já con

siderada como huma Religião* essen'.

cialmente verdadeira , cujos dogmas

e cujos preceitos dimauavãso da Au- `

tboridade Divina. A \

Eis aqui em que sentido a Igreja

2

Page 116: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

116

Romana he e deve ser necessariam-en.

te intolerante; sem que por outra. par

-te possa por isto merecer a nota de

ser perseguidora. =Esta calumnia , que

`tanto resôa a cada pa ina das obras

tenebrosas dos preten idos Filosofos

do décimo-oitavo Seculo, e que elles

-tomárão do famoso Commentario fi

losofico de Bayle , não tem outro fun

damento mais que a confusão , mali

ciosamente feita por este fantasioso

escritor , da Tolerancia theologica

com a Tolerância civil, a qual he

sem duvida outra cousa.

Debaixo desta ultima denominação

se entende a liberdade concedida pelo

-Governo aos que se uem differentes

.Cultos , fóra da Re igião dominante

do Estado , de se uirem os ritos e adisciplina'dlella, eensinarem os seus

dogmas nas suas assembléas, ede pro

fessarem mais ou menos publicamente

'o seu exercicio. E para fallar em

concreto dos nossos rEstados Catholi

cos da Europa, esta denominação de

tolerancia civilzdesigna a permissão,

que, segundo as convenções, os tra

Vtados , as leis , tem os sectarios do

Lutheranismo, do Calvinismo , eIdas

outras Seitas heterodoxas introduzido ,

depois da .pretendida reforma do Se

Page 117: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

117

culo decimo-sexto , de professarem o»

seu exercicio de hum modo mais ou

menos extenso, mais ou menos limi

tado. Mas ou conceda hum Soberano

Catholico aos Heterodoxos esta tole

rancia ,' ou lha negue , o que ainda

he melhor , quando se possa fazer

sem comprometter a segurançaV , e a

tranquillidade do Estado ,z he fóra de

toda a duvida que similhante toleran

cia nada tem com a tolerancia theo

logica , que he a que interessa aos

Filosofos estender, e radicar na opi

nião dos homens. EsteÀ genero. de t0- .

lerancia , como temos mostrado em to

do o decurso do presente artigo , se

reduz em ultimaanalyse a huma in

ditferença total para com todos os

cultos :V erro abominavel , e que não

pode sobejamente ser. detestado por

hum Catholico; pois que não só o

levaria a abjurar a sua Religião,

mas. terminaria fazendo-o cahir nas

trevas e nos erros do Atheismo, como

no artigo seguinte mostrarei._

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118

s

*I

An'rmo II.

A indifferença em materia do Religião a

conduz necessariamente ao Atheismo. l

Fatal influencia, que hum tal systems

tem por sua natureza na Sociedade.

Voltaire, que os Filosofos do Secu

lo decimo oitavo olhão com razão

como o fundador e Patriarca da sua

seita , escolheo para atacar a Religião

hum methodo , cujas pizadas Bayle

lhe havia apontado ; que foi, espar

ir hum ar de indiffercnça sobre to

das as verdades, que formão o objecto

da crença dos Christãos. Desde os

primeiros momentos em que entrou

na carreira litteraria, logo deixou en

trever este systema , do qual nunca

deixou de fazer o uso mais funesto

em todo o decurso da sua longa vida.

AHenriade (ou Henriqueida), que he

exactamente huma das suas primeiras

producçõ'es , he huma prova d'isto;

pois que se bem á primeira vista pa

rece este Poema consagrado â victo

ria da Fé sobre o erro , sem embar

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ll,

go d'í'sso, considerando-o bem, se ve

que elle tinha.- por objecto espalhar

a doutrina da indifferença total em

materia de Religião. Tal he com ef'

feito o caracter que Voltaire constam

temente dá ao seu Hei-oe; e a authoó

risar esta doutrina. se dirige a maior

parte dos discursos que lhe põe na

boca. Deste modo, prestando o Poeta

a Henrique o seu proprio modo de

pensar, persuade os leitores de quees

se era effectivamente o do grande Rei.E dlaqui se formou a opinião , quasi

geral , de que Henrique não tinha

mudado de Religião senão por inte

resse e por politica , e que da sua

conversão lhe não fioára mais que hu.

ma absoluta. indifferença para com

todos os Cultos. ~

Antes de Voltaire publicar o dito

seu Poema da Henriade, communicou

o manuscrito a João Baptista Bons?

sean. Este célebre Lyri-oo facilmeli.~

te percebeu a contradicçäo que ha'

via entre o objecto do Poema , e o

espirito que o dictâra: aconselhou

por tanto o author que supprimisz

se as frequentes invectivas» contra a

Igreja Romana , contra os Papas ,

contra os Frade: , e em geral contra

todas as intitniçõea do Catholieismo.,

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120

fazendo-lhe ver que hum Poema

Epico não deve ser tratado como hu

ma Satyra. Porém o projecto, que

Voltaire havia concebido, de mudar o

espírito religioso da sua nação, não

lhe permittio render-se a estes conse

lhos dietados pela razão, e pelo bom

gosto. Sahio a obra á luz como tinha

sido imaginada; e o bom Henrique,

a quem nunca lembrou dogmatizar,

mostrou-se aos olhos do publico em

ar de hum dissertador, que solta pom

'lposamente sentenças filosoficas , sem

he importar se ellas convem ou não

ao seu caracter , e á pessoa que de

ve representar.

Quando, no primeiro Canto, Hen

rique aporta â Ilha de Jersey , e se

apresenta ao Solitario da mesma Ilha,

lhe diz :

,, Hélás! Un dieu :i bon, qui de l'homm:

est le maitre,

En eut e'té servi, s'il :wait voulu l'êire. ,,`

,, Ah ! Hum Deos tão bom , qu' he se

nhor do homem,

D'elle fôra servido , se quizera» ,,

› Qual' he o fito desta máxima , que

o Poeta põe na boca do seu Heroe?

He evidentemente o fazer todos os

homens indifferentes sobre o artigo da

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121

Religião , lançando a culpa do mes

mo Deos a causa dos seus erros.

Mas este dogma característico do

moderno Filosofismo ainda torna a.

apparecer de hum modo mais repu

nante no segundo Canto , no qual

enrique , fallando com a Rainha.

Isabel, lhe diz:

Je ne décide point entre Geneve et Rome.

,, Entre Roma e Genebra não decido. ,,

E não decide elle realmente com o

facto , combatendo pelo partido de

Genebra , contra a Religião de Ro

ma, e implorando o soccorro de Isabel

para fazer triunfar o primeiro sobre

as ruínas da outra .P Convinha por

outra parte a Henrique , Chefe de

hum destes dois partidos, lançarigual

mente sobre ambos elles os horrores

das guerras civis ? Em fim , se elle

não via a verdade mais em huma que

na outra Religião, porque não abra

çOu lo o aquella que lhe abria a es

trada ão throno , e cuja profissão te

ria feito cessar huma guerra sangui

nosa com os seus proprios subditos?

Vê-se pois que ocaracter, que Vol-y

taire dá aHenrique IV , ara\otrans.

fOrmar em. hum Filoso o do Seculo

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122

decimo oitavo , não só he contra as

condiçô'es e regras da Epopéa , a qual

exige que se fação fallar os Heroes

conforme o caracter das pessoas que

representão, mas tambem os senti

mentos de humanidade que formavão

particularmente o caracter de Henri.

que. Se este Principe fôra de todo

indifferente em materia de Religião,

devia logo ao principio da Liga fa

zer-se Catholico, como já disse no ar

ti o precedente; pois que elle bem

sa ía, que não era a sua essoa que

desagradava 'ao geral da ação, mas

sim unicamente a sua crença. Devia

procurar poupar aos seus subditos os

orrores da guerra civil , adoptando

a antiga Religião do Reino. Esta

mudança, que , segundo o Cantor da

Henriade, era indifferente ao seu He

roe relativamente á consciencia, não

o podia ser ao seu coração. A huma

nidade e o patriotismo de Henrique,

unidos aos seuspartieulares interes

ses, e â felicidade dos povos sobre que

era chamado a reinar, não o devião

deixar hum só instante em duvida so.

bre o partido que lhe convinha to

mar; de outra sorte sería insensato o.y

seu procedimento , eaté atroz, fazem.

do aguerra aos seus subditos por hum

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123

culto , em que elle não cria. E entre

tanto unicamente sobre o desprezo de

todas estas considerações he que se

tem estabelecido a opinião da sua

pretendida indifferença em materia,

de Religião.

Depois de ter publicado a Henriade

fez Voltaire huma viagem aInglater

ra. Condorcet, seu discípulo mimoso ,

e que foi tambem o compilador da

sua vida , refere que na Sociedadedos Livres Pensadores dla nella Ilha.

concebeo elle o projecto e destruir

todas as preoccupaçõ'es , de que era

escravo o seu paiz natal. Por preoc

cupações já ao principio eu disse que

se devia na nova linguagem filosofica.

entender tudo aquillo, que aexperien

cia. dos Seculos havia consagrado pa

ra manter os povos na pratica dos

seus differentes deveres, e principal

mente depois tudo aquillo , que a Fé

propõe mais respeitavel á crença dos

Christãos. E com effeito , rcgressado

que foi Voltaire da Inglaterra , an

ciava pôr em execução o seu indica

do pro'ecto. Mas ou fosse que os ou

vidos os seus concidadãos ainda não

estivessem dispostos a receber aberta

mente positivas impiedades , ou que

elle temesse os procedimentos dos

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-124

Magistrados, os quaes ainda-naquel

le tempo não tinhão affrouxado o

rigor das antigas leis concernentes á;

censura dos livros , continuou ainda

algum tempo a usar de contempla.

ções; contentando-se, como fizera an

teriormente na Henriade, com di'ffun

dir o indifferentismo. A Zaíra he a

producção , que elle principalmente

escolheo para este fim. Infinitas são com

effeito as passagens que nesta Traše~

dia, ainda hoje mesmo representa a,

e tão applaudida, se encontrão diri

gidas todas a inspirar esta perfeita

indifferença de todos os Cultos.

' Eis aqui como a Heroina do Dra

ma se exprime sobre este ponto logo

na primeira scena :

Je le vois trop , les soins qu'øn prend de

nótre enfance

Forment nos sentimens , nos mwurs, notre

croyance.

J'cusse été près du Gange, esclave desfaur

Dieux ,

Chrétienne dans Paris, Musulmane en ces

lieux.

L'instruclion fait tout , et Ia main de nos

pères

Grave en nos lfaibles cwurs ces prémiers

caracteres,

Que l'eremple et Ie tems nous vicnnem re.

trøcer , '

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125'

Et que peutêlre en nous Dieu seu] peu!

ez'facer.

,, Bem vejo, u educação da nossa infancia

Nos forma opiniões, costumes , crença.

No Ganges fôra d'ldolos escrava ,

Fôra em París Christã, como aqui Moura.

Faz tudo o ensino, e em nosso tenro peito

Grava a paterna mão taes caracteres,

Que nos vem avivar oexemplo , e o tem

Po r

E que em nós talvez só Deos riscar pode. ,,

Não ha duvida que as instrucções

da infancia inspirão as maximas do

Culto que reina no lugar onde cada

hum nasce ; demais, ,todos os objectos ,

que cereão o homem no decurso da

sua educação, tendem a confirmallo

nas mesmas maximas , que por isso

se pode dizer que são quasi bebidas

com o leite ; mas pregoar no theatro

similhante doutrina , erigilla em má

xima em hum lugar , onde não he

possivel fazer séria discussão , apre

sentar de hum modo vago , e sem'o

mais pequeno correctivo este mesmo

principio, que he susceptivel de hum

sentido assaz perverso , não era acaso.

offerecer aos espectadores ideas peri

gosas , das quaes ,estão sempre assaz

propensos a abusar? Não era espalhar

Page 126: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

126

dúvidas sobre a verdade da. sua Reli

gião , fazendo-lhes crer que não são

Christãos senão por prejuizo da edu

cação, e em ultima analyse persua

dir-lhes que os differentes cultos que

ha no Mundo , são em si mesmos de

todo indifferentes?

\ Voltaire, nlesta sua tão famosa Tra.

gedia , tende igualmente a inspirar

indifferença para com todas as Reli

iõ'es, quando em outra scena põe na.

šoca de Zaíra a seguinte exprobação

contra o mesmo Deos:

Eh .' porqvoi mon amam n`est il pas ne'

pour lui?

Orosmcme est il fait pour être sa victime _?

,, Ah! por que o amante meu lhe não

pertence? ,

He para ser sua victirna Orosmano? ,,

Com estes dois versos dá o Poeta

a conhecer aos espectadores , que to

das as Religiões são totalmente in

differentes , com tanto que seja hum

homem virtuoso , como elle tanto ha

via estudado pintar o amante de Zaí

:ra ; mas ainda se exprime sobre este

objecto mais claramente nos outros

dois versos seguintes , com os quaes

acha. Zaíra que o titulo de Christie

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127

nada accrescentaria mais ao mérito

de Orosmano , e que lhe devem bas

tar as suas virtudes.

Ge'ne'reux, bienƒaisant, justa, plein de ver/us.

S'il étail né Chrétz'en, que serait il de plus .9

,, Liberal, bemfeitor, e virtuoso ,

Se nascem Christão, que mais tivera? ,,

Estas passagens irreligiosas espa

lhadas pela Tragedia Zaíra , assim

como na Henrimde , e em outras que

taes producções , não tinhão outro

objecto mais que tactear , por assim

dizer, o gosto do publico , e prepa

ratto a acolher favoravelmente ouovo

genero de Filosofia, que Voltaire se

havia proposto introduzir na sua na

ção. As circunstancias the forão fa

voraveis ; pois ue a corrupção dos

costumes que , pois da morte de

Luiz XIV. , da Corte do Regente se

introduz'i'o nas grandes sociedades ,

promettia huma segura e facil adim..

são á nova maneira de pensar em ma.

teria. de Religião , que , como se

disse , Voltaire se havia proposto ge.

neralizar entre os seus compatriotas;

assim, deixando todos os ti ruídos res

peitos , que eontinou ainda. a obser

var por. algum tempo depois da sua

volta de Inglaterra, tirou a máscara

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128

\

de todo , e começou a atacar directa

mente a Religião de seus pais.

Nelle tomou a irreligião hum cara

cter de odio, e de furor, que não ‹:o

nheceo limite algum , e sustentou este

seu novo papel com huma pertinacia,

que nada pôde affrouxar. Nada com

effeito escapou â sua critica atrevi

da ; o Deposito da Revela ão , osDo mas os Ministros, os Msilagres,

as rofecxas, a Tradição, a Lithur

gia , em summa, tudo aquillo que até

então fora objecto da publica vene

ração , ficou sujeito aos seus sacri

legos sarcasmos. O seus numerososdiscípulos o auxiliârão tambem Vad

miravelmente neste execravel proje.

cto de desterrar da terra o Christia

nismo , e estabelecer sobre as suas

_ruinas o Deismo: assim, quando nos

passadosSeculos apenas se achavão

alguns incredulos entre os libertinos ,

ou entre alguns homens de letras ni

miamente orgulhosos do seu saber;

pelo meado do Seculo passado de tal

modo se tinhão multiplicado em todos

os Estados e em todas as classes da

Sociedade , que mais de huma pes

soa disse , que a incredulidade era a.

grande heresia do 'décimo oitavo Se

culo. Mas não continuarão os Filo

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129

sofos por muito tempo a prêgal' o

Deismo ; bem depressa lhe substitui.

rão o Materialismo. v

Esta he a terrivel progressão que

ha tido , e em assazI breve espaço de

tempo , o systems daquella total in.

differença em _materia de Religião

tão gabada do Filosofismo do decimo

oitavo seculo debaixol do especioso e

illusorio nome de Tolerancia. O pré.

gar por tanto a Tolerancia he o mesmo

que pregar o Atheismo, visto que ella

aeste necessariamente conduz; e o pré

gar o Atheismo h'e o mesmo que pregar

a destruição dos fundamentos da Moral,

das virtudes , dos deveres do homem,

e de todos os vínculos da sociedade.

He verdade que o author do Sys

tema da Natureza, que no Seculo pas.

sado foi o mais atrevido pregoeiro do

Atheismo , asseverou com toda a af

fouteza, que' não he a Religião, mas

sim as Leis , quem sustenta a Socie

dade. Helvecio, e outros muitos dis

serão o mesmo ; porém esta opinião

ha dois mil annos já que se acha re

futada até pelos Poetas , sendo sabida,

ãamlmente a seguinte passagem de

oracio (l). I .

(1) ode xxiv. sí, as.

Page 130: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

13'0

Quid leges sine moribus

Vime prlyíciunt .9

,,l)e que servem as leis sem bons costumes P”

f v Não ignoro que os escritores acima

citados tambem elogião muitissimo

`a Moral, e apontão os seus preceitos;

mas tambem sei que, se tem havido

no mundo contradicção e extrava an

eia , he esta. A moral do Materia ista

he huma palavra totalmente sem sen

tido; he huma couza absolutamente

inintelligivel: “Se eu sou hum ser

-,, puramente material , n (reflecte

muito bem hum escritor, 'que refu.

tou'o livro do Systems da Natureza,)

a: se eu sou hum ser puramente mate.

rial, se o meu procedimento, bom

ou mão, virtuoso ou vicioso, util

ou nocivo , he huma coneatenação

de acções igualmente necessarias,

como o são todos os outros movi.`

mentos do Universo ; e em summa

se a todos os respeitos e em todos

os instantes da minha vida eu não

sou mais que huminstrumento pas.v

sivo nas mãos da necessidade , en

tão sou necessariamente aquillo que

,, sou, eque devo ser. O homem hon.

~,, rado e de bem he huma maquina

,, de beneficencia ; o malvado he huma

31

n

'n

:a

:a

a;

n

L”

'n

n

5,

Page 131: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

131

¡,' maquina do'crimes ; o homem de'

,, bil e pusilla'nime huma maquina de

remorsos ; o Athêo huma maquina.

,, dezblasfemias; exactamente do mes.

,, mo modo -qnc hum moinho he hu.

,, ma maquina de moer ,' e hum ro.

,, lojo huma maquina para medir q

,, tempo . . . Pergunto eu, (prosegue o

mesmo escritor) se isto são principios

,, sobre que se possa fundar systema.

,, al um de moral? Eu certamente os'

,', ac o mais proprios para fazer. an;

,, dara cabeçaâ roda, do que para:

,, nos estimularem â virtude

Em vão. o Author do Systema da

Natureza , para sustentar que, ainda

que se exclua a Religião, se não ex

clue a' Moral, assevera' que a carrcié

ra da virtude he. inseparavel da nos

sa felicidade. nl'ndicar (diz elle) aoz

,, homem os seus deveres, he indiear

i, lhe os meios que deve pôr em pra..

,4, tica para chegar ao. termo que in.

,, eessantemente se porpõe , que' he a

a, felicidade; Prova! que huma acçãoli, he do seuV dever ', he provar-lhe que

n na Pratica elle o'hrarâ de hum mo

(l) oxions philosophiques sur Ie.

swfêmeiglz Ia~Nature~, por M. Holland.

831,”1773" I 2

Page 132: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

132

do conforme aos 'seus verdadeiros

interesses ,e que pelo contra^rio,omit

tiudo-a , diminuirá o numero dos

,, sentimentos agradaveis, que houve

,, ra podido grangear.” (1) Bellas

promessas são estas, hmas frequentis

simamente se achão desmentidas pela

experiencia. Em mil occasiõ'es suc'ce-,

de que o exercicio da virtude , bem

longe de ser acompanhado de felici

dade, comsigo traz os maiores males;

em consequencia do que , se a Moral

não tivesse outros motivos que nos

propor, mais que os interesses desta

vi'da , fora huma bem quimerica sci

eneia (2). Pelo contrario tudo muda

,7

,7

(l) Passagem exit'rahida por Mi'. Hol

land, ubi supra. _

(2) Nada ha com effeito mais quimerico

que a moral dos atheos fundada unicamen

te nos interesses d'esta vida. Como hum tal

systema foi repetido em tantos livros ,

por isso seduzio por algum tempo ainda

alguns homens doutos, os quaes aliàs não

tinhão riscado do seu coração a Religião.

Neste numero se achou o proprio Mr. De

Luc, celebre Professor de Gottinga , que

adiante bei de ter occasiâ'o de nomear, co

mo bum Filosofo que ha feito os maiores

serviços á causa da Religião; mas como não.

Page 133: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

133

com a ersuasão de que` em praticar

a virtu e sigo a Vontade de hum De

tinha depravado ocoraçã'o, por isso se des-\

eu anou, inteiramente do seu= erro ; e isto

lh succedeo em consequencia das sabias

reflexões que lhe fe; outro célebre Filoso

fo , o qual tambem havia sido ulluciuado

pelo mesmo fallaz systema.-“Mr. De Luc

,, (diz hum respeitavel escritor que abaixo

, terei tambem occasião de nomear hon

,, rosamente) Mr. De Luc creo por muito

,, tempo nos deveres do homem bebidos

z, em suas affeições , e nas relações natu

,, raes; mas dissuadiofse d'isto` pelas refle‹

›, xões que lhe suggerio a anecdota , que

,, os nossos leitores nos levaráõ a bem lhe

,, refiramos. Estava hum celebre Professor

,, de Filosofia Moral em Edimburgo (o

,, Cavalheiro Pringle , Medico da Rainha

,, d'Inglaterra , e. Presidente da Sociedade

,, Real de Londres antes do Cavalhei

,, ro Banks) conversando com Mr.

,, De Luc; e tendo-lhe este offerecido

,, o Livro intitulado Moral Universal, ou

,, os Deveres do homem fundado na Natu

,, roxa , recusou aquelle ancião a offerta,

n dizendo” :ZFuL por espaço de alguns

annos Proffessor dessa pretendida sciencia;

tinha exhaurido as bibliothecas e a minha

cabeça, paral achar os seus fundamentos;

mas quanto mais procurava persuadir os

meu; discipulos, menos confiança tinha eu

s.

Page 134: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

13.4

os,`a.o qual devo tudo , que não que;

senão a minha verdadeira felicidade,

que vê os meus mais occultos pensa

mentos , que desapprova até os simples

desígnios viciosos que›ser~á-o vremune

rado'r infallivel do homem de bem , e

o castigador dos _maos: adoptado o

systema da Religião , 'não duvidohum só instante da natureza dos meus

deveres; op onho então os interesses

da eternida e'aos do momento pre-_

no que lhes ensinava, de maneira que por

fim mudei de vocação, e dei-me outra vez

ä Medicina, queffóra o objecto dos meus

primeiros-estudos. Continuei com tudo `por

'algum fitempo a examinar quanto epparecia

sobre este assumpto , que eu me não 'sen

tira em estado de ensinar com convicção;

mas larguei finalmente mão d'isso, reconhe

cendo bem profundamente que sem huma

sancção. divina immediata das leis moraes,

e sem leis positivas acompanhadas de mo

tivos exactos e 'urgentes , não podem con

vencer-se os `homens de queree devão sujeitar

a nenhum Codigo similhante , nem con

Çordar sobre elle entre si. De então para

cá, não 'leio obmfalguma de More'l , senão

a Biblia, e sempre o faço com prazer no

vo.:Mr. de Bonald, Legislativa: Primiti-`

ve; tom. III, chop , 3., de `I'Edumtàm re¬

,_igimse. ' t

Page 135: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

1,315V

sente; a minha consciencia, revestida.`

da authoridade do Ser Supremo, falla

mais imperiosamente ao meu coração ,'

e torna~se a regra de todos os meus

pensamentos , e de todas as minhas

acções, qualquer quexseja o resultado,

feliz ou infeliz , que ellas (possão ter;

assim , vem a Religião a ar a maior

eonsistencia á moral, ou, para melhor

dizer , constitue a sua essencia.

De mais, se os escritores, que de

pois do Seculo passado prégârão com

tanto ardor o materialismo, poderão

á força de declamações, e paralogis

mos persuadir que a Religião he to'

talmente estranha ao bem da socieda

de ; huma tão extravagante theoría

já agora felizmente se não pode apre

sentar , pois que tem contra si a im.

periosa authoridade da experiencia.

ancemos huma. rápida vista sobre os

primeiros principios do grande aronè

tecimentos da Revolução de 1789, e

veremos que fôrão realmfnte hum ef-. .

feito da irreligi'ão. A contemplação

de hum facto visivel, e assaz recente,

fará por certo mais impressão no ani

mo do leitor, do que poderia fazer hu

ma longa repetição de todas as razões

que , começando de Cicero até os nos

sos, ultimos tempos , se tem trazido.4

Page 136: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

136

para provar que de lmodo nenhunr

pode subsistir huma. soçiedade de

Athêos.

Í *e

ARTIGO III.

yA Revolução de França de 1789 de

z

ve-se manifestamente attribuir a

‹ 'Irrehgiãm

Em todo o tempo se oppoz aos

Athèos , que o sn' systems quebra

hum dos maiores vínculos da socieda

de , fazendo de todo desapparecer a.

santidade do juramento. Foi o jura

mento quem sustentou por tanto es

paço de tempo as leis de Lycurgo

em Esparta. A santidade dojuramen

to foi tambem muitissimo tempo o_

esteio da Republica Romana, tendo

a salvado dos mais urgentes perigos;mas á medida que o Epicnreismol alli

corrompeo os costumes , destruindo o

temor dos Deoses, nenhum caso se

foi fazendo dos mais sagrados empe

nhos, e foi-se apressando a decaden

eia de Roma..

Ora este mesmo espirito de irreli-A

Page 137: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

` 1'37

gião .' que , zombando da santidade

do juramento , tanto contribuído pa

ra a decadencia do antigo poder dos

Romanos , foi tambem a causa dos

terríveis acontecimentos politicos, que

depois de 1789 trouxerão comsigo

a total ruína. da Monarquia Fran¬

ceza.

Quem conhece a historia da obra-_

dita Revolução , sabe que quando ,

pelos fins de Março de 1789 , o ter

ceiro Estado , ao qual incautamente

se tinha concedido o direito da dupla.v

representação, deo o atrevido passo

de se declarar Assembléa Nacional,

recusârão as Guardas Francezas fazer

o serviço costumado, dizendo que se'

tinhão alistado para defender a'

patria , e não para a opprimir. E

quandí, depois da demissão de Ne

ker, opovo correo ás armas, asGuar

das Francezas se unírão ás Compa.

nbias dos Cidadãos amotinados. A

mesma prevaricação commetteo huma

parte do Regimento de Provença , e

por ão do de Ventimiglia. As tropas

de rest tambem. se unirão â Guarda

Civica , e o mesmo fez em Bordeos

arte do Regimento de Champanha.

m summa não ha lugar algum de

duvidar que a Revolução houvera si-_

Page 138: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

/

138'

do suffocada em sua mesma origem ,v

se a causa de Luiz XVI. fôra susten-V

tada por aquellas tropas, que ao alis¬

tarem-se haviãojurado defendello até

a ultima gota de seu sangue.

Se pois o espirito de irreligiã'o,

que fez desprezarem as tropas a. san

tidade do juramento , produzio a'Fe-,

volução , â mesma. cansa se devem

manifestamente attribuir todos os er

ros, de que no seu mesmo principio

veio acompanhada, e que nunca ces-,

sárão de a seguir.

Embriagado o povo com o triun¬

fo de haver derribado a Bastilha , e

tendo neste encontro principiado a.

manchar-se de sangue, já se não ali.,

menta que dos mais horriveisespecta

culos, e pede em altos gritos cabeças

illustres. Foulon , Conselheiro d”Esta.

do , he immolado pela multidão , e

acompanhão as mais vivas acclamaçõ'es

o exangue corpo arrastado pelas ruas

da Capital. Berthier de Savigny , seu

genro, e lntendente de París , ho

mem por todos os titulos respeitavel,

participa com elle de igual sorte ; e

quando entre todas as Nações , ainda

as menos polieiadas , os supplicioa:`

dos grandes criminosos compungem

os corações de todos, a morte do dito

Page 139: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

‹ 139

virtuoso Magistrado não suspende tão

sanguinario encarniçamento ; dece

pão-lhe a cabeça, que levão em tri

unfo ; arrancão-lhe o coração , que

dividem embocadinbos , e yos entre

lação nos topes ; mutilão todos os

Seus membros , que depoisatê cortão

em pedaços juntamente com os seus

vestidos: ame-sma effervescencia, eos

mesmos horrores se praticavão naquel

le tempo em todas as Províncias do

Reino; de sorte que parecia que o

Povo Francez se tinha em hum ins

tante convertido em huma nação de

Iroquez'es, e de C'annibaes.

Os Gentios convínlião não haver

cousa que podesse civilizar os selva

gens , senão as impressões religiosas;

e -he exactamente pela qualidade de

interprete dos Deoses , que Horacio

(1) loliva Orfêo de ter humanizado

es antropófagos, e de lhes ter inspi

rado hum justo horror aos seus detes

taveis banquetes.

Sylvestres homines racer, interpresque Dem.

num .

Credibus, et victu fmde deternuit Orpheur,

(1) Horacio, Arte Poetica.v.391 e-sya.

Page 140: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

HO

`,‹, Ori'eo, sagrado interprete dos Deoses,V

Horrorisou os homens inda brutos

De se. darem¬a morte, _e. se_ tragarem. ,,

Estes estimaveis effeitos de adoçar*V

os costumes dos homens , e de os fa-.

zer menos sanguínarios, tem-se attri.`

buido sobreI tudo ao Christianismo

Qra , depois que os Francezes, adhe

rindo aos escritos dos Filosofos , não

só abandonârão a Religião de seus

pais, mas demais amaís princip-iârão

a ter huma indifferença total”, e até

hum positivo desprezo para com toda

a sorte de Culto , vierão a cahir no

mesmo estado dos selvagens. Os hor

rores até agora mencionados são'disto

huma boa prova; porém forão muitol

maiores .aquelles, a que depois se en

tregou este mesmo Povo tão conheci

do pela sua amenidade , e tomado tão

brutal em hum momento._ As cruelda

des praticadas a 2 de Setembro (de

1792) em París com Ecclesiasticos en

cerrados na Igreja do Carmo fazem

estremecer , e em. tal occasiãepode

se tambem dizer , que os Francezes

se. fizerão antropófagos, poisque até

che ârão algumas mulheres ao exces

so e beberem o sangue, que corria`

daquelles _martyres.

Page 141: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

1141

_ Montesquieu disse, que ainda quam

do *a Religião fosse inutil ara o po

vo, não o sería para aque les quees.

tão â testa do Governo dos Estados,

pois que sendo superiores ás Leis,

não podem ter outro freio senão aquel.

le ydo que se‹~chama Rei dos Reis , c

Senhor dos Senhores. Destituidos des

te-freio ,' não são mais que animaes

bravíos; eesta sentença se realizou na

Revolução de França. l

Depois de alli ter sido introduzidaa

Democracia, e mortoo Rei, os Jaco

binos , que desde de 1790 , quando

ela primeira vez se unírão 'em Club,›

Eavião dado tantas provas do seu ca~

racter acerbo e sanguinario, tinhão

se apoderado de toda a authoridade,

e dominavã-o só'por'meio do terror e

do sangue. Para sahirem melhor com

o seu projecto , sob pretexto de se

opporem âs-contraqevoluçõ'es verda.

deiras ou imaginarias, proclamárão o

Governo Revolucionario , que devia

durar até a paz. ~Mas se as crueldades

até agora descritas fazem estremecer,

não tem comparação com aquellas a

que esteve sujeita a França durante

este' reinado de Terrorismo, e confes

so-que Anão tenho cores com que as

pinte. Com effeito , quando eu dis

Page 142: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

Piz

sesse , que a França naquelle tempo`

se permittio eouzas, que não praticam`

rião os Iroquezes , e os Cannibaes ;4

quando dissesse , que no espaço de'

erto de dois annos ficon mais asso:

fada do que se Genserico e A°tila,

seguidos de quinhentos mil combaten-I

tes, proporcionados ao' seu furor , a'

tivessem atravessado; quando dissesfi'

se , que em tão breve espaço se reno

vârão não só os horrores' e' as atroci.

dades, em que se vio Roma'envolta

desde os tempos de Sylla até Domif

ciano , mas tambem aquellas que emf

diversos Seculos, e entre diversas na

ções commettêrão os mais odiosos'y

tyrannos ; quando finalmente disses.

se, que Robespierre', que era a alma

dos Jacobinos , reunia em si mesmo

todos os furores que dominârã'o todosos monstros vomitados em diversosV

tempos pelo'inferno, diria mui pou

co e faria huma mui debil` pintura

da `infeliz situação da. França nos

dois annos que durou o sobredito neió

nado do Terror.

E se bem, com a morte deBDloesó'

pierne , eahio o Governo Revolucio-f

nario , nem por' isso a França deixou

de ser inundada del sangue. Devia o

Tyranno necessariamente arrastar na

Page 143: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

143

sua queda tudo aquillo que se acha

va com elle ligado ; 'e nos primeiros

transportes da publica indignação era

impossivel que hum movimento de

reacção se não Idesse a conhecer , e

' u_e a sede da vingança não se esten

esse contra o maior numero de i-n

dividuos, que tinhão parte com este

monstro no Governo Revolucionario.

_ Estes horrores tambem cessârão por

haver «faltado materia â vingança;

'mas para ser feliz não basta deixar

de ter suspenso sobre a cabeça o cu

tello dos tyrannos , ou não ter que

temer o punhal, e os fachos'dos amo

tinados. Todos os grandes politicos

temobservad'o, que a Democracia ten

de naturalmente â anarquia , ou ao

despotismo ; e a passada Republica

Franceza confirma cada. 'vez mais a

verdade diesta theoría. Des de -ospri

lmeiros movimentos da Revolução até

ao principio do reinado de Robes

-pierre esteve a-França sujeita â anar

quia. Com a introducção do Governo

'Revolucionario passou a ser vietimaAdo despotismo , sem por outra parte

se livrar dos filnestos'effeitos d'a- anar

`quia,.-pois' que Robespierre, que pre

cizava dos Jacobinos, se via obriga-do

a deixar-lhes a liberdade de rouba

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144

re'rn ,` e de commetterem toda a quaz

lidade de delictos ; pois todos sabem

muito bem, que agrande tactica dos

Jacobinos consistia justamente no's

saques e nos outros movimentos po

pulares. Ora , se com a Constituição

do anno terceiro Republicano, ou de

1795 , cessou aV anarquia, não cessou

o' despotis'mo; não fez mais que pas.

sarxa diversas mãos , pois'ao des o

'tismo de Rob'spierre succedeovo esà

potismo dol Directorio.A

Esta nova Constituição do anno

terceiro, acceita pela Nação por meio

de Barras, não concezlia ao Directorio

.senão oPoder Executivo, e' até os at

tributos dfeste lhe limitava muito , su

jeitando-o em todos os'casos mais pon.

derosos ás determinações dos dois Con

selhos; e o Directorio pelo contrario,

apenas se vio instalado, lo'go assumio

toda a soberania representativa da Na

ção, esoube tomar tão bem as suas me

didas para se manter nesta usurpaçã'o,

que todos aquelles Membros dos di

tos Conselhos que se quizerão oppor

a similhante attentado, forão punidos

com de redo e confiscação.

Debaixo do Governo Consular , que

succedeo ao do Directorio , pareeeo

que a França havia finalmente che

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145

ado a hum estado feliz ; mas, além

de não ter nesse tempo tambem esta

do izenta Vde desordens , e assaz gra

ves, deve-se reflectir, que este novo

Governo era huma molla , que estava

comprimida para melhor poder a seu

tempo desenvolver toda a sua elasti

cidade. E com effeito, aquelle , que

estava â testa do mesmo Governo,

tão depressa ôde a oderar-se de to

da a authori ade , lbgo desenvolveo

o maior despotismo que jamais se ha

visto reinar sobre a terra: até seguio

o trivial expediente dos tyrannos de

sonhar conjuraçõ'es para se descartar

das pessoas que temia. E se debaixo

do novo Governo Imperial os Fran

cezes não tinhão que temer o ferro

dos anarquistas, ou dos algozes , a.

desmedida avidade de conquistas, de

que era dominado o novo Soberano,

fez derramar mil vezes mais sangue

do que se vertêra em todo o tempo

da Revolução.

Por fim cahio tambem este Gover

no. A reversão do antigo le itime

Governo , que a parte sã da Ração

havia vinte e cinco annos tanto de

sejava , e ao qual por conseguinte

acertadamente deo o titulo de Dese

jado , parecia quIeÇ, depois de tantos

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146

males , asseglií'aria ao Reino huma

felicidade permanente. Della com ef

feito principion a gozar; porém não

durou senão só dez mezes; e a sua.

nova infelicidade tambem proeedeo

d”aquelle 'espirito irreligioso , que

tanto se havia dilatado pela Nação,

l-como veremos no artigo seguinte.

.A R T'I e o IV.

A nova revolução succedida em Fran

pa em Março de 1815, deve tambem

visivelmente attribuir-se d Irrelí

gião.

Vie-se no artigo precedente que

a Revolução que houve em França

`em 1789 , e que tantos males produziu

não só naquelle Reino , mas tambem

em grande .parte dos outros Estados

da Europa , ho'uvera sido suffocada

`em s'uaorige'm, se oespirito de Irre

-ligião , .que precedentemente se havia

~espalhado tanto naquella Nação , e

que tinha até inficionado as tropas,

'não as induzíra a uniram-se aos

amotinado's , desprezando desta ma'

Page 147: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

147

neira a santidade do juramento que

tão intimamente as ligava. á causa do

Rei. Ora, que a este mesmo despre.

zo do juramento., e conseguintemente

ao espirito d'Irreligiãoi, se deva at

ftribuir o novotranstorno grande, suc

cedido na mesmo Nação em Março

do anno de 181.5 , he inutil que eu

me demore a demonstrallo , pois que

a todos he notorio que a tentativa do

Usurpador não teve mais apoio que

a prevaricação das tropas; e por is_

so unicamente me ein irei a lembrar

ao leitor, por assim izer, de passa

gem, algumas ci'rcumstancias de facto ,

pelas quaes se mostra, que naquella

segunda revolução ainda foi mais vi

-sirel o desprezo da Religião.

No anno de 1789 era quasi geral

na Na ão o fermento contra a Corte;

ji des e os fins de 1787 havia princi.

piado a tomar hum aspecto de posi.

tiva rebellião pela grande contesta

ção ue se excitou então entre o Rei

e os arlamentos, os quaes recusárão

registrar o Edicto dos Emprestimos

Successivos , imaginados para. reme.

diar o grande vacuo, que se tinha des

coberto nas Rendas. Havião os Par.

lamentos de França já em outras oc

casiões mostrado Krepugnancia em se

2 t

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, 148

prestarem aol registro ldos Edictos

ãReaes; mas aque nesta occasião mos

trou o Parlamento de París , e .que

em breve foi seguida por todos os

outros Parlamentos do Reino, era de

huma natureza totalmente diversa , e

claramente fazia ver que os Membros

da primeira Magistratura estavão

A tambem imbuidos das maximas da nova

Filosofia contra o poder absoluto dos

VReis ; e com effeito não contentes os

Parlamentos com seterem o'pposto ao

`prescrito registro , sustentârão con

secutivamente esta sua nova resisten

cia com representações, nas quaes a

cada palavra ressumbrava hum ar de

independencia , e que só por si erão

bastantes para animar o povo â re

volta , como com effeito produzírão.

z-E se este uniforme aspecto sedicioso

detodo o Corpo da Magistratura vi

.nha a dar grande pezo ao artido

«contrario á Corte, deo-lhe infe izmen

te muito maior pezo a circumstaucia

Lde se achar á testa do mesmo Corpo

~~o proprio Primo , Principe do Rei

(o Duque d'Orleaus). Era isto hum

facto que todos vião; mas poucos, ou

talvez nenhuns, conhecião as occultas

.maquinações horrendas, que elle pu

nha «em pratica para proseguir os

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149

seus projectos de ambição e de -vin-¬

auça , e sobre tudo aquelle , verda

eiramente infernal , e açambarcar

e remettcr para foraido Estado qwasi

todo ogrão do paiz', por~cujo estrata

gema , tendo no meio da mais abun

dante colheita subido desmedidamen

te o preço do genero mais necessario

ao sustento da vida , acabou orpovo

de perder algum (E: ueno restoida.

adhesão .â pessoa ` ei , que todos

já olhavão como absolutamente in.

digno do throno , -visto que faltava

até ao pri-meire e mais sagrado dever

de qualquer reinante , 'qual he o'de

sustentar o seu povo.V Astropas .por

tanto que vião , que o fermento con..

tra a Corte 'não só eraz geral, mas que

além d`isso se achava sustentado por

quanto havia maior e mais respeita.

vel na Nação , poderão talvez com

certa boa fé' ter~se illudido sobre anatureza doj'uramento ,V coml que-'se

achavão ligadas â causa do Rei. l'In'

capazes de julgar por si mesmas :de

que 4parte estava aâz razão , podécã'o

ter-se deixado seduzir da apparencia,

e 'ulgar por conseguinte que -,» como

o eiparecia aos olhos detodosfobrar

contra.Y os. verdadeiros interessesƒda.

Nação, tambem não erão obrigadasaM sustentallo. i

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1:50

Ora, dearènhima similhante appa

rencia. enganadora podião cer-tamen

te ser allucinadas as tropas que noI

anno 1815 , a pezar do seu juramento ,

bandonârão Luiz XVIII. Quando'

Ê'umanno' antes o Seriado deolafrou

Napoleão deposto do Throne , havia

já muito tempo que ogeral da Nação

não podia ísupportai' o seu jqêo vio

lento, lraparee , e'sanguinario. aquel

la oonjuncção vie-se na verdade' o

amor proprio nacional hum pouco

offendido , por dever em hum instan

Ite renunciar aqueilas immensas 'con

quistas , que havião sido o fructo de

tantos annos -de guerra , e que 'tantohavião isllnstrado o valor das armas

Francesas. .Mas todos reflectião , que

-a Frans. *propriamente dita , bem

longe e ter tirado vantagem d”essa

tão grande fdilataçño :dos seus con

fins, antes d”ah'i tinha tiradoprejuizo,

visto que não ffieera isso mais f sue

animar o Soberano a emprehender

l'novas expedições, as quaes Vfazião de

dia -a dia peiorar o 1flagello da. `cons

eripção , e o pezo dos ftrifhutos, ue

enão os `dois :grandes zol›j|eotos.4:la an

felãeidade , e 'doulescontentarmento ge.

mal. *As tropas e'rão a unica'pan'te da

äaçãzo., que não pensava deste Cmodo.

Page 151: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

151"

Tislião prestado o seu juramento a L'uàd

íz` XVIII., mas no fundo do seu sora»

ção continuavão a estar laffeiçoodas a

Napoleão; e farão ellos sós as que

tuniânão e effeituásão aconspiração,

que denovo opoz nothrono. _A todos

com effeito he notorio-o triste aoolhi,

mento, que ao mesmo Napoleão -fizef

rãotodas as povoações, por onde pas.

seu ao transferi-se do lugar do desem.

barque .a París. A parte meridional

do Reino, que hum anno antes, quan,

do era levado tr Ilha dlElba , tanto o

havia. insultado , .coherente sempre

øomsigo mesma, mostrou omaior en,

thusiasmo possivel pela causa dev

Luiz XVIII., apenas-se ouvia a noti,

oia de que o- Usurpadozrftinha posto

o pé nas suas praias : e senão mos,

trârão este mesmo enthusiasmo os has

bitantes das outras Províncias por

onde elle atravessou , esses mesmos

não deixárão- de lhe testemunha:I a

sua má vontade; não podendo op.

por-se á sua assagem , e iêmiitoznu-z»`

nos eombatel'o , porque a pequena

escolta, que trouxera do lugar doseul

desterro , se bia a cada passo engros

aando pela vergonhosa adhesão das

tropas Reaes , receberãoarm çom hum

triste silencio, que visivelmente indi»

Page 152: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

152

cava quanto desapprovavão o seu

attentado.

Não tinhão por tanto as tropas o

minimo pretexto , que a seus olhos

Vpodesse palliar a enormidade do per

jurio que hião commetter va: clara

mente se ve , que , de todo msensiveis

aos motivos religiosos, que as devião

conter de perpetrar tão grande pre

varicação, não considerârão mais que

os refiexos do maior interesse, que ti

nhão de tornar a servir hum homem ,

que só respirava guerra; exactamen

te do mesmo modo que em Roma , de

pois da decadencia da Religião e dos

costumes , as Legiões, a despeito- de

seus reiterados jnramentos, assassina

vão ou depunhão o Imperador para

erearem outro , que lhes promettia

maiores liberalidades.De ois dlestes dois memoraveis e

xemp os dos males, que no decurso de

vinte cinco annos visivelmente occasio

nou â França o desprezo da santida

de dojuramento, que he omesmo que

dizer o Atheismo, ninguem certamen

te poderá pô-r em duvida, que a Reli

gião não seja absolutamente necessa

ria â subsistencia e á felicidade dos

Estados, como pensavão todos os sa

Bios da antiguidade 5 e por isso de

Page 153: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

153

verá detestar o dogma da Toleran

cia , que os fautores das idéas libe

raes procurão de novo insinuar; do

gma , o qual , como temos demonstra

do no decurso do presente capitulo ,

não se pode generalizar em huma na.

ção , sem que ella, s'e ache envolta

em breve espaço de tempo nas trevas

e nos erros do Atheismo. _ ` j

E maiormente por tanto se confirma.

râ o leitor na subsistenci'a desta antiga

maxima , que a Religião não he in

differente ao bem dos Estados, ven

do ``no artigo seguinte , que da nim'ia

mente grande extensão `do vicio 'op

posto tenistirado'ia .França , e conti

nua ainda areinar nella, outro terri

vel excesso, e talvezro maior a que

os homens possão ter chegado. ¬ ... ' " v I

. 1›.`›

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Page 154: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

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ݒ.V

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~› An'rieo V.

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ä grande multršplicaução das suicidio; ,

,que depois do; meado do __secu'lo'pas

"sado começou e haver em _Franpd

deve .tambemf's'er considerada 90m

huma 'funesta' consequencia da Irreligiã'o'. __ q t '

-u

' .':Y g

Em França, assim como em outra

qualquer Nação , houve sempre ho.

mens que attentárão contra sua proF

çprãa vida; mas estes casos erão mui

to raros. Para que algum se abando

nasse a este excesso , de que nunca

se vio entre osbrutos vestígio algum,

era preciso, que afor a de huma pai

xão , ou de alguma esventura , em

seu entendimento operasse hum geral

transtorno, que inteiramente lhe tirasse

todo o uso da razão. Ora, as cousas

sobre este ponto devião necessaria

mente mudar-se, ecom effeito se mu

dárão , depois que huma Filosofia es

tragadora ensinou aos homens, que a

morte he o fim de tudo.

Page 155: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

[55

Hum escritor Franca de algilmmé¬

rito, ue em 1783 entrou a impugnar

esta fa laz sapiencia, lqzue já tinha en

tão šr'mcipiado a genexalizar-ee m

sua. ação , apresenta hum quadro

dos suicídios, que por aquelle tempo

snooedáão -em França., o -qual cent»

mente faz horror. ,,Contai 'no Rei;

,, mo (diz elle) trinta Províncias com

,, sideraveis, e em eadaPmviaeia eo.

,, mente dez Cidades notaveis pelo

,, numero dos seus habitadores: Tre»

,, zentas Cidades. Não ha nenhuma

,, destas Cidades em que noespaço

,, de dez annos , se não tenhizo visto

,, pelo .menos einoo zpessoas que se

,, hajão dado .a morte. Eis-a ui mil

,, e quinhentos suicídios em ez am

,, nos. .Ajuntai a estes mil equinbem

,, tos mil edemntas pessoas, que, pe

,, do menos , pereoem cada :anno `em

,, París ászsuae p i . ias mãos , ná

,, vista de todos; digo á vásta de to»

,, dos , lpois: que muitos morremflo.

w mesmo modo em segredo ; estando»

,, averiguado que no anno de 1m

,, houve mil quatrocentos etres suici

,\, dios na Capital e seu termo-Do

,, ze mil suicídios em dez .annoa

,, Do que resulta., vque a doutrina .da

,, nova Filosofia custa. â França em

Page 156: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

156

,, dez annos treze 'mil equinhentos

;,›“'dos seus habitadores (1). . r

-nDepois da dita época' de' 1783 , ã.

qual se refere zo calculo agora expen

dido, assim como alrreligiãovse dila

tou cada vez mais em França, tam

bem o furor dos suicídios notavelmen

teraugmentou. E toda a pessoa que

residia por algum tempo naquella re.

gião ,~ e sobretudo na Capital,A certa

mente meynão ha de taxar de'exage

rado.: Filósofos lizonjeiros e Latrozes,

esta he a felicidade que vós promet..

tieis ás .nações e aos homens , sse', ad

herindo ásvossas instituições , se li

vravão dos temores e das ameaças da

Religião , que›vós caracterizaveis de

vãos fantasmas l' Quando ha meio se

culo principiastes a dar-vos a conhe

cer ao Mundo,'o augmento da`= popu

lação era para vós hum objecto sa

grado; dizieis que por este signal se

conhece principalmente se huma na

ção. avança' para a felicidade. E a

vossa doutrina , em vez de produzir

hum tal effeito , tem pelo contrario

. ‹ . _. › e 4 › '

,(IlflLa '-vfaie philosophie , par le P. Hu.

fal. ut Pari: chez IQuillot , 1783 ,l Pag'

265 ,^ e 266.l i, _ '

Page 157: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

'157

concorrido para diminuir as popula

ções que já existião.

~ Mas esta diminuição d'homens não

he a unica consequencia funcsta da

grande multiplicação dos suicídios,

occasionada pelo progresso da Irre

ligião. Ha outra ainda muito mais

terrivel , e tal , que deve atterrar a

sociedade , e aquelles que a Provi

dencia ha posto â sua. frente para a

governarem. Que segurança pode ha

ver com homens, que estão dispostos

a commetter tão grande horror? Não

está a vida dos cidadãos continua'menú

te exposta ao seu furor e á sua rai

va 3 Se o apego, que anatureza ins

pira. â propria conservação, não he

capaz de tolher o Athéo de attentar

contra a propria vida , que \motivo_

poderá contello de attentar contra `a

dos outros .P Sabidos são a este pro

osito os dois seguintes versos do ce

ebre Corneille na Tragedia de Cinna.:

Quelque soin qu' il se dorme , et quelque

ordre qu'il liemze , `

Qui me'prise sa vie est maitre de la tienne.

,, Por mais que cuide em si , que bem se

reJa , ` ' '

Quem sua vida despreza rouba 'a tua. ,,

As leis são certamente .de todo in

Page 158: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

158 \

suffioientes para espantar huns mal

vados, que nada temem truncar o fio

__ de seus dias , e que por meio do sui

` eidio estão seguros de fugir da infa

mia do supplicio. Podem tudo com

metter affoutamente, visto que, depois

de terem sacrificado os outros , estão

promptos a sacrificar-se a si mesmos,

se virem que não podem escapar im

punes.

Estas dolorosas reflexões não são

nem na minima lparte exageradas;

pois que , torno arepetir , as leis não

tem authoridade alguma sobre os ho

mens, que tem hum refugio seguro

para se esqurvarem a sua vingança.

A Religião he o unico meio que po

de conter os ulteriores progressos de

tão terrivel excesso. Se a firme cren

ça de huma vida futura tornasse a.

substituir nos homens o insensato as

pecto do nada , por certo não se lem

'brarião mais de attentar contra os

¬seus proprios dias. Huma coragem

animada è sustentada pela Fê os ele

'varia a cima de todas as adversida

des. Horrorizar-se-hião de enviar a

este pretendido nada huma alma re

servada a todos os. resentimentos do

.Author da vida , justamente irrita

do pelo desprevo de hum beneficio.,

Page 159: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

159

que he o fundamento de todos'os om

lmss '

Conheço quanto seja difficil , que

homens envelhecidos no desprezo ',

e no odio de todos os principios re.

lígiosos se convertão; mas sem que

perca de todo a esperança d'esta ven..

turosa conversão , pois que a Provi.

dencia-, quando quer, sabe por occul.

tas vias operar as maiores mudanças

nos corações dos homens : os actuaes

Governos da Europa devem tomar o

maior interesse em que a geração nas

cente não se embeba nas mesmas er

roneas maximas; e isto está absoluta

mente em seu poder fazello.

-i-.I

.ARTIGO VI.

Corollarz'o de quanto se tem exposto no

presente Capitulo. Importancz'a de

unir a, Educação moral e religiosa

la' Educação civil e litteraria.

O s .authores da Revolução de Fram

fa para se assegurarem de que a Re

igião , que elles , com exemplo to~z

talmente desconhecido até então , ha

Page 160: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

160

vião inteiramente expulsado da sua

nova organização social , fosse para

sempre apagada até do espirito e do

coração dos Cidadãos, banírão das

escolas publicas todo o conhecimen

to, ainda 0 mais leve, das leis divi

nas, e oexercicio de todas as praticas

de piedade: e o resultado sahio como

elles desejavão. A mocidade educada

durante a Revolução offerecia huma

depravação , de que nem em Fran

ça , nem entre outra nação alguma

se havia jâmais visto exemplo.

A fim por tanto de que a Religião

torne a reinar no espirito e no cora

ão dos homens, cumpre seguir hum

systema totalmente contrario. He pre

cizo que â educação civil e litteraria

se torne a unir a educação moral e

Christã: e .para produzir tão deseja

do effeito, parece que não pode haver

melhor meio que confiar o ensino da

mocidade âs Corporações Religiosas.

Esta idéa não he minha , mas de hum

escritor Francez ainda vivo , e não

Ecclesiastico , o qual havia obser

vado de perto acorrupção e a immo

ralidade , que se tinha introduzido na

sua nação desde que a educação da

mocidade havia deixado de estar nas

mãos das ditas Corporações Religio

Page 161: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

161

sas. Referirei succintamente as razõ'es

com que Mr. de Bonald sustenta es

ta sua idêa.

O systema de educação (diz elle)

deve ser perpetuo, universal, unifor

me; d°ahi , epois de se ter demorado

alguma cousa em pôr em toda a. evi

dencia este principio , ajuuta como

necessaria consequencia: ,, Cumpre

,, pois que a educação seja confiada

,, a hum corpo, pois que fóra de hum

,, corpo não pode haver nem per

,, petuidade, nem generalidade, nem

uniformidade. ,,

Refiecte depois d°isto Mr. de Bo

nald , que este corpo educador não

pode ser puramente secular. ,,Onde

existiria em tal caso (diz elle) o

vinculo que asseguraria a sua per

petuidade , e por conseguinte a uni

formidade P Sería o interesse pes

soal? Porém os seculares terão, ou

poderão ter familia. Pertencerâõ

mais â sua familia que ao Estado,

mais aos seus filhos que aos filhos

dos outros , mais ao seu interesse

particular que ao interesse publi

co; pois que o amor de si mesmo,

de que a Filosofia tem pretendido

fazer o laço uuiÊi-sal dos homens,

Menu» 'uma'

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Page 162: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

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ás

5)

11o e será seimpfre o motta] Vinimigo

do amor dos outros. ` -

,, Se os mestres são solteiros (prm

segue Mr. de Bonhifd) , ainda 'que se

g, jão seculares , não poderáõ fazer

3,

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3,

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É»

,1

a,

corpo entre si. A fortuita aggre

gação de pessoas ,- que hoje entrão

neste corpo ‹para terem meio de

subsisteneia , e 'que delle sahi'ráõ

ãmanhã se poderem obter melhor

estabelecimonto', não formará de

modo algum hum-a 'sue-cessão de in.

dividuos addrietos á instrueção pn

blica. Por outra. ›par'be-, 'que ai de

familia ouáa'râ coinfiar seus fi hos a.

eelibaltarios folia moral fiiio estalú

asseguraäa porz une. 'disciplina m

âigiosà 2 Se pelo contras-io este;

professores publicos são casados.,

como poderá 'o Estado assegurar .a

homens carregados de filhos , e am'

mados coh'sequedtemente de huma

'justa ambição de adquirir bens.,

como poderá oEstaelo , digo, asse

guranlhes ordemados *tão avulta

dos, que os afastam perpetuamen

te de abraçar 'alguma especulação

mais lucrativa? Se por in'tuiftos de

economia 'se reuuissem 'todos no

memo-edificio jun-tamento oo'm as

Page 163: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

168

suas mulheres e os seus filhos , se

ría impossivel a concordia: se se

lhes permittisse viverem separada

mente , serião incalculaveis as des.

'n' Pezas n

Estas poucas reflexões bastarião a

Mr. de Bonald para sustentar o seu

assumpto da. grande importancia. de

confiar a educação publica ás Coral

porações Religiosas. Mas assim como

isto ha. sido hum objecto das maiores

declamações dos Filosofos , tambem

elle não deixou deresponder atodasas

suas objecções. Tomou principalmente

ã sua conta océlebre Quimica Mr. de

Chaptal, pois que este havia ajunta..

do todas as objecções em hum Rela.

torio , que no anno de 1800 apresen.

tou ao Conselho d°Estado de París, so-f

bre o assumpto da educação publica.

Se as Corporações Religiosas , di

zia. o referido Relatorio , possuião

a arte de transmittir os conhecimem

tos já existentes , raramente ellas se

elevavão ao mérito da invenção: con.

servavão ,› mas nãoaprefeiçoavão,

nem inventavão. Outro defeito, que

sr sa

a,

`n

u e

- (l) De Bonald , Legislativa Pfimih'oe,

com. Ill,` C. 7,-Paiís Leoa. - . . .

\ 2

Page 164: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

164

Mr. de Chaptal exprobava ás ditas

Corporações Religiosas, era ode ensi

narem como outras tantas verdades as

opiniões consagradas por longa tra

dição nas Escolas. O terceiro vicio

finalmente , e o maior de todos, era.

o de dominarem imperiosamente sobre

o espirito dos seus discípulos , e de

jâmais proporem a dúvida, que he o

que excita e desenvolve as faculdades

\ do entendimento humano.

Estas increpaçõ'es , como todos co

nhecem , envolvem-se humas nas ou

tras , e todas se reduzem a negar ás

Corporações/Reli iosas o talento da. in

venção. Ora Mr. e Bonald não se mos

tra de modo algum perplexo com es

ta objecção , apresentada por tantas

formas differentes por Mr. de Chaptal:

,, Mestres que nada inventão (respon

de elle) formão discípulos que inven

`,, tão ; porque he muito mais o me

,, thodo do ensino do que o engenho

,`, do Mestre quem desenvolve no dis.

,, cipulo o espirito dlinvenção. Os

,, mestres dos nossos maiores inven

,, tores, de Descartes, de Malherbe,

,, de Corneille , de La Bruyere , de

,, Bossuet, erão certamente muito in

,, feriores aos seus discípulos. E en

,, tão , tem-se em França inventado

Page 165: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

165

t.-ua..-`...`..

:33,33--`.3`._.--

“save

“um”

mais e melhor depois que a educa

ção deixou de ser confiada ás Cor

poraçõcs Religiosas? . . . . . Duran

te a Revolu ão gozou-se da maior

extensão da liberdade , e bem lou.

ge de se com rimirem os vôos da

imaginaçãoe otalento, se deolivre

curso a todos os desvarios , a todas

as extravagaucias do espirito huma

no. Que resultou d°ahi que fosse

rande, util, ou sequer engenhoso?

aperfeiçoamento de alguns metho

dos , algumas nomenclaturas feitas

com mais arte e melhor ordem, ou al

gum invento mecanico, que em par

te nenhuma se pratica, nem mesmo

em casa do seu inventor: mas quan

tos erros em Moral, quantos absur

dos em Legislação , quantas cineas

em Politica , quantas sandices em

Litteratura, quantas imposturas em

Historia , quanta obscenidade nas

.Artes dlimitação , que decadencia

até na Lingua l E quanto devemos fi.

car humilhados, vendo que tão gran

de vôo permittido â imaginação e

ao enio, tanta extensão dada â li

ber ade de pensar tudo, e de dizer e

escrever quanto vem á cabeça, não

haja produzido , nem sequer na Ar;

te Dramatica , nesta Arte em que se

Page 166: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

IGG

-. quiz fazer consistir o Palladio 'da v

Moral, o supplemento das Leis, e

,, o primeiro meio (Pinstrucção pu.

,, blica, huma Obra, a penas huma.

,, unica Obra , que possa sobreviver

ás circumstancias que a fizerão nas

,, cer , e aos panegyristas que tan

,, to a preconizârão! (l) ,,

Se Mr. de Bonald demostrou con

ceder por hum momento ao seu ad

versario a mencionada imputação da

pouca aptidão das Corporações Relí

iosas sobre o ponto da invenção,

não tardou que o não combatesse

tambem neste eutrincheiramento que,

como se ha visto , constituía todaa.

força das suas objecções. “Quantos

,, felices descobrimentos em Fysica,

:a diz elle, quantos inventos engenho

:a sos em Mecanica não tem sahido

a: do recolhimento dos Claustros 1,,

Enumera lVlr. de Bonald diversos des

tes benemeritos Cenobitas, cujos no

mes ainda hoje resplandecem nos An

naes das Sciencias. Mas ainda se po

deria augmeutar muito o seu nume

ro, se da França, que elle teve qua

si unicamente em vista, se passasse a

(l) Bonald, ubi supra.

Page 167: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

lê?

gyrar por todos as outras .regiões

Àcultos da Iilfliu'opa` Não acabaria tão

.depressa , se aqui .ou quizesse com

tar Vsó os que pertonoem â. Italia. Re

mqttendo portanto o leitor â Historia

.Litteraria de Tiraboschi, oinginme

hei a apontar alguns daquolles que

pertenciãonnicamonte ás Communi-v

dados Religiosas encarregadas da edu

cação da mocidade., o que demais a

mais viverão nestes. ultimos tempos,dosl quaes por conse uencia se não

faz .mon ão na dita istoria. , que,

como to os sabem, acaba no fim do

seculo dooimo setimo` . '

Ro orio Bosohoyioh ', que julgo

soro oa razão poder contar entre os.

nossos Sabias Italianos, visto que oa

.tenra idade de quatorze annoa entrou

em Roma na Companhia de Jesus , e

.passou a ma orparte da sua vida na

Italia , onde. tambem :terminou seus

dios, ho author de huma infinidade

.de demobrimentos e observações to

ialmente novas na. Algebra, na Gen

metria , na Astronomia , ena Fysica.

A Cortezde França, levada da Vgran

de celebridade do seu nome ,i oçha

mou de ois de 1770 a.París para Di,

.rector a» Optisê da ,Marinhaa o oorf

respondeu plenamente â expectaçãfl

Page 168: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

168

ue d'elle houve, tendo com estima.

issimas obras novas illustrado mui

to esta Sciencia , assim como to.

das as outras partes da Astronomia

(1). Por esta mesma grande re uta

ção, que tinha o nome de Boschovreh, o

havia anteriormente aSociedade Real

de Londres escolhido para irlâ Cali.

fornia, e observar asegunda passagem

de Venus; mas por algumas circums

tancias não pôde acceitar esta incum

bencia.

Contemporaneamente ao Boscho

vich tinha e Companhia de Jesus na

Italia outro célebre Mathematico na

pessoa de Vicencio Riccati. E'mulo,

e talvez superior ao Conde Jácome

seu pai, não só deo maior clareza, e

extensão ás regras , e aos methodos

achados por outros na Algebra; mas

elle mesmo inventou alguns inteira

mente novos: e tambem no Tratado

das Series, e nas Instituições .Analyti

oas ensinou muitas novas e interessan

tes verdades; por cujo motivo foi de

(l) Roger. Joseph. Boschovich Opera ad

Opticam et Astronomiam maxima ea: parte

nova , et omnia hucusque inedita. Bassani,

1785.

Page 169: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

169

nominado , e ainda hoje he conside.

rado, o Pai da Algebra sublime na

Italia.

O Padre Paulo Frisi , Barnabita Mi

lanez, fallecido no fim do seculo pas.

sado , era tambem reputado geralmente por hum Mathematico daprimeiraÀ

ordem. A Academia das Sciencias de

Berlin , que tinha coroado a sua bel

la dissertação sobre o movimento diur.

no da terra, fez brazão de o alistar

entre os seus Socios; o que igual

mente fizerão o Instituto de Bolonha ,

a. Sociedade Real de Londres, a Aca

demia das Sciencias de París, e a de

Petersburgo. Não deixavão os maio

res Sabios da Europa de consultallo

nos pontos mais abstrusos da Astro

nomia e das Mathematicas. E hum dos

primeiros pensamentos dos Estrangei

ros cultos, que chegavão a Milão, era,

como eu mesmo presenciei por mui

tas vezes , poderem fallar com este

meu celebre concidadão, que com os

seus profundos escritos tanto havia il

lustrado a serie das Sciencias Natu

raes. /

A Sciencia da A ua , que he tal

vez a parte das lãathematicas mais

util á sociedade, teve no P. Lecchi,

Jesuita Milanez, hum dos seus maio

Page 170: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

170

res illustiu'idores` Newton , Hüighens;

Maclaurin , Euler, Çlairaut, Mauper

tuis, D°Alembert, tinhão contribuído

muito para os progressos da Hydros

tática no que toca á parte puramen

te theoriea; mas esta parte ,, bem que

Se possa reputar a mais sublime e a,

mais nobre , he com tudo demasiado

' abstracta para oder servir do utili

dade alguma. or outra parte , os

Hydraulioos, que, destituidos dos prin

ci pios scientificos, sómente proeurão

avançar na pratica , estão muito su

jeitos a errar , principalmente se as

trata de operações grandes , e total

mente novas. Ora o P. Lecehi tem o

merecimento de ter reunido no mais

eminente grão huma e outra couza: e

na Hydrostátiea emaminada nos seus

principios deo â Europa huma da;

Obras mais instructivas , mais exa

ctas , o mais conformes â verdade,

que sobre tal assumpto se hajão pu

blioado.

~› No. mesmo tempo vivião na Italia

outros dois illustres Mathematicos,

que tambem aos conhecimentospra

ticos relativos â Hydraulioa união as

mais subtis , e sublimes theorias fun

dadas em calculos; pela qual razão

forão tão uteis as nossas regiões, tal

Page 171: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

171

vez mais que nenhuma outra 'parte da

Europa sujeitas aos estragos dos rios

e das torrentes : hum he o P. Frisi

acima honrosamente mencionado ; o

outro oex-Jesuita Ximenes, Mathema.

tico de Pedro Leopoldo, G-rã_Duque

de Toscana.

Quem tiver ouvido fallar de Ele

ctricidade não ignorarâ tambem o

nome do PJ João Baptista Beccaria,

Religioso Piemontez das Escolas Pias ,

e quanto esta curiosa e interessante

parte da Fysica seja devedora ás suas

fadigas , e ás suas observações. Não

ha experiencia que elle não fizesse , e

varias'se de diversos modos; nem fe

nómeno , que escapasse â sua pene.

trante vista ; a electricidade natural

foi pelo mesmo P. illustrada com tanto

estudo como a artificial; e tambem

intentou examinar aquillo que nin.

guem tinha aindafeito , isto he , a

electricidade da atmosfera quieta e

serena, de modo que ocelebre Fysico

lnglez Priestley asseverou com toda a

razão na sua famosa Historia da Ele

c'tricidade , que o P. Beccaria pela

extensão do seu trabalho neste gene¬

ro excedeo tudo quando sobre tal ma;

teria se havia feito antes edepois del

le. O proprio Franklin tributou ao seu

Page 172: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

172

mérito hum testemunho não menos

honorifieo, e ainda muito mais lizon

geiro , pois fez traduzir epublicar no

idioma ln lez o Curso completo da

Sciencia eectrica publicado pelo P.

Beccaria no anno de 1772.

Quantas luzes não diffundio o P.

Pino , Barnabita Milanez , sobre os

fósseis e sobre os mineraes E Com as

suas viagens scientificas , e com as

suas profundas observações illustrou

muitissimo estes dois interessantes ra

mos da. Historia Natural; e o seu no

me he por isso collocado entre os dos

Voltas , dos Fortis, dos Fontanas,

que nestes ultimos tempos tanto con

tribuírão para o adiantamento dlesta

Sciencia , ao presente tão cultivada

na Europa , mas que teve o seu pri

meiro renascimento na Italia ha secu

lo e meio por obra do celebre Bolo

nhez Aldovrandi , que oPlinio Fran

cez chama com razão o mais douto,

não menos que o mais laborioso. de

todos os Naturalistas (1).

As Sciencias Naturaes , em que os

Religiosos até agora nomeados tanto

(l) Bouffim, Hist. Nat. tom. I, Disc.

Prelimin.

Page 173: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

173

ss distinguírão , não são porém os

unicos generos de estudos , que são

precisos aos4 interesses da Sociedade,

e que constituem o seu ornamento. E

se daqui se passa a considerar todos

os ramos 'da grande arvore dos conhev

cimentos humanos, que novo e vasto

campo se não abre á gloria litteraria

das Ordens Religiosas, que se occupa

vão na educação da mocidade!

A Metafysica , por exemplo, que

os Filosofos modernos avalião em na

da , e que até desejârão ver banida

da classe das Sciencias , he hum estu

do do maior interesse para os ho

mens , pois lhes descobre as maravi..

lhas do Mundo intellectual , como a

Fysica as do Mundo material. A” Me

Vtafysica he que nós devemos as pro

vas da existencia do Ser Supremo,

das suas infinitas perfeições , da im

materialidade da nossa alma, e da sua

distincção do corpo , não obstante o

'laço incomprehensivel que os reune.

He ella quem nos mostra a differença

essencial do justo e do injusto , quem

nos descobre nas :leis eternas da ordem

a base de toda a moral. Mas exacta.

mente por estes nobres fins da Metafy

sica he que os chamados Filosofos do

Século decimo oitavo se desvelárão

Page 174: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

174

tanto em a desacreditar: era natural

que huns homens interessados em pro

pagar o materialismo procurassem

afastar o Mundo do estudo daquella.

Sciencia , na qual seus erros se acha.

vão tão antecipadamente confutados;

.e teve o seu artificio em grande parte

o melhor exito: digo em grande parte,

porque, se he fóra de toda a duvida. ,

que ncnhumaoutraoouza lia favoreci

do tanto os rapidos progressos do ma

terialismo nos nossos dias, he tambem

certo , que este estragador systema, o

qual nos abate até a condição dos

brutos , em nenhum outro tempo ha

tido maior numero de excellcntes im..

pugnadores: entre estes merece prin

cipalmente ser mencionado o P. Ger

dil, fallecido não ha muitos annos com

as honras da Purpura Romana. Ne

nhum certamente melhor que este

doutissimo Barnabita, que ao mérito

de profundo Theologo e de excellen

te Filologo unia o de ser o maior`

Metafysico do seu tempo , soube des

cobrir e pôr na sua verdadeira luz a

incongruencia e absurdo da famosa

hype-these de Locke sobre apossibi

.lidade da materia pensante (I).

i /l/ Gerdil, Dissert. swf l'immok'rinfiü

de l'ame contre Mr. Locke. -

Page 175: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

y175

› Oestudo da Litteratura amena tam'

bem he de grande interesse para huma

Nação. Ella se divide, como as Scien

eias , em varios ramos, enenhum' ha',

que não tenha sido cultivado com

gloria pelas Corporações Religiosas,

'que se applicavão á educação da mo~

cidade; ' ' '

Bourdaloue passa ainda hoje entre

õ Francezes por hum dos mais elo

quentes lhomens da sua lingua, assim

como Ségneri goza -da mesma repu

tação entre nos os ' Italianos. Estes

dois celebres Jesuítas são olhados tam

bem peias outras Na ões como mes.

tres da arte oratoria o'pulpito , ge.

nero de elequencia talvez unico que

se cultivo com honra nos Estados mo'

dernos da Europa , pois que, atten

dida a sua constituição politica , dii

versa total-mente da dos Gregos e dos

Romanos , veio nelles a faltar nativ

ralmente a grandeza dos objectos em

que se empregavão os E”schines ,aos

_lsócrates , os Demósth'enes , os Tull

lios, os .Homensiog e provavelmente

a eloquencia se houvera de'to'd'o per.

dido, se os Qradores Christãos, voltan.

do dos interesses 'temporaes aos espi

rituaes eeternos, não houvessem crea~

do hum-novo genero de arte 'orato

Page 176: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

`176

ria inteiramente desconhecido pelos

antigos.

O Somasco Genovez Frugoni he ge

ralmente olhado como o Principe dos

Lyricos Italianos do decimo oitavo

seculo; pela variedade dos metros,

dos assumptos e do estylo , pela su

, blimidade dos pensamentos, pela. ma

gnificencia, e belleza das imagens , epor outros muitos primores poeticos,'y

forma , a `juizo de muitos , huma no

va época na Lyrica Italiana. Ao lado

porém de Frugoni não desmerecem

Betinelli , e Bondi.

A Historia de Hespanha por Ma

rianna , a das Guerras de Flandres

or Famiano Estrada , a Historia da

gaz de Westfalia de Guilherme Bour

geant são de admiravel belleza. Es

tes tres Jesuítas continuão a occupar

ainda hoje hum assaz distincto lugar

entre os Historiadores modernos. A

Obra do ultimo he huma das mais

classicas da Sciencia do Direito Pu

blico, e não ha Negociador, ou ho

mem d”Estado que a não tenha con

tinuamente nas mãos. ›

A Historia Litteraria- he hum ge

,nero dlestudos nascido nos nossos tem

.pos modernos. Quasi todas as_Nações

tem huma Historia Litteraria mais

Page 177: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

177

ou menos extensa , mais ou menos

boa; mas a grande Obra de Historia

Litteraria , a Obra pela qual fica a

Italia nesta parte notavelmente avan.

tajada ás outras Nações, he a plena e

completa Historia da Litteratura Ita.

liana de Tiraboschi. Quando este em.

dito ex.Jesuita tinha acabado de pu.

blicar a sua Historia , hum seu con

frade Hespanhol , mas que habitava

entre nós , e conhecia muito bem a

nossa lingua , começou a dar â luz a

sua Obra da origem , progressos , e

estado actual de toda a Litteratura.

O annnncio deste titulo fez ao princiz

pio julgar , que hum plano tão vasto

e atrevida , que ninguem até alli ti.

nha concebido, sería superior ás for.

ças de hum só homem. Porém depois

que sahio â luz toda a Obra do Ab.

bade André , fallârão os Doutos de

outro modo , não se fartando de ad

mirar nella a vastidão da erudição,

a profundidade dos juízos, e oexqui~

sito do discernimento. '

A Chronologia, que tanta li a ão

tem com a Historia , teve no lle

tau o maior illustrador; e com effei

to a sua grande Obra intitulada De

Dootrina Temporum , a sua Uranolo

gia , o o seu Rationlrçíium temporum

Page 178: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

l78

^ são ainda hoje, a juizo dos doutos de

todas as noções, o mais precioso the

souro , de qšue esta. Scieneia se pode

gloriar. ' - -1 '

Se o P. Mabillon he geralmente

consideradocomo o creador da Diplo

matiea, bemsabem'os eruditos quan

to o Jeanita Papebroquio he tambem

bellemeribo dlesta Sciencia totalmente

desconhecida dos antigos, e que além

de ser tambem muitonecessaria ahum

Historiador, he de grande utilidade

aos Estados , emesnu) ás familias

particulares , para a-intelligencia e

verificação dos titulos e dos perga

minhos antigos. Com as suas origi

naes e eruditissimas investigações ,

que são aos olhos dos Críticos os mais

preciosos ornamentos da grande Obra.

dos Bollandistas , traçou Papebro.

quio , porassim dizer, as primeiras

linhas desta Sci-encia. , que forão co.

mo os fundamentos d°aquella soberba

fabrica , que com tanto louvor seu

erigio depois o sobredito immortal

Benedictino Francez.4

O nome de Sinmond', que o'ccupa

tão eminente lugar entre os mais

profundos Theologos , vive ainda e

viverá eternamente! nos Fastos da

Littemtura pela sua delicada critica,

` J'.

`\

Page 179: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

179

epela sua escolhida erudiçã'o. AObra

que elle publicou sobre os Capitula

res de Carlos o Calvo , e de outros

lmperadores posteriores, contém the

souros que os Críticos se não fartão

de admirar. E Baluzio , que tanta

gloria grangeoucom a sua douta e

critica edição de todos os Capitular'es

dos Imperadores Frances , não teria.

provavelmente podido matter mão a4

esta. grande Obra, se não fora prece.

dido do dito trabalho parcial do Je

'suita Sim/loud.

A Numismatiea , parte tão impor

tante das Anti _uidades , quanto nãodeve ella á diligencia el âs doutas far

digas do P. Hardouin? Com as meda

lhas e com as moedas na mão elle se .

fez senhor das antigas Cidades e eo.

lonias ; fixou a sua posição, estaba-'

leceo os seus limites , e descobrio as

suas prerogativas e propriedades.

Corn esta segura guia,woom aqual il»

`lustrou tanto a Geografia antiga , es

palhou tambem muita-s luzes na Chrof

nologia, assignalando as épocas pro

prias de algumas nações que tinbão

esc ado aos C-l'rronólogos.v O Jesuita

Ha ouin pela profundidade da sua

¡erudição soube-fazer uteis e interes

M 2

Page 180: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

-180 '

r'

santos até os seus fantasticos, mas en

genhosissimos paradoxos.

O P. Ferrari e o P. Marcelli des

pertârão na nossa Italia 0 bom gosto

das inscripçõ'es Latinas , que parece

unicamente serem as dignas. O pri

meiro compozy dlellas hum volume ,

álém de outras muitas que andão

soltas ; e o segundo não só fez hum

|volume ainda maior das suas inscri

'pções, mas tambem nos deixou a arte

de as compor.

Todos estes grandes .homens , que

até. agora tenho mencionado , e cujos

nomes viveráõ' em quanto tiveremestima as lSciencias e as Letras, não

só erão Claustraes, mas de mais a mais

j pertencião _ a Corporações Religio

sas que tinhão por instituto appli

car-se âweduca ão da mocidade : por

tanto, depois de similhante enumera

ção , certamente não ficará no animo

do leitor a menor duvida sobre a fri

volidade da nota de incapacidade que

tanto lhes exprobão os Filosofos.

' Não ignoro quanto elles tem decla

mado contra o methodo praticado em

todas as sobreditas Communidades Re

ligiosas , de terem por muitos annos

occupado os rapazes no estudo da

Page 181: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

181

Lingua Latina. A todas estas inve-`

ctivas porém se pode responder com`

o exemplo dos homens mais abaliza

dos nas Sciencias, na Litteratura , e

até nas mesmas Artes amenas , que

todos bebêrão nos antigos escritores

classicos desta Lingua a mais copiosa

porção do seu discernimento, da sua

erudição, e das suas invenções. Nem

para divertir a grande força de si

milhante exemplo serviria o dizer,

como realmente se ha dito , que a

Lingua Latina poderia mais facil

mente , e ainda melhor aprender-se

em huma idade menos tenra , como

se aprende o Francez , o Inglez , o

Alemão. As Linguas vivas podem-se

aprender em qualqueridade, mas não

he possivel adquirir hum perfeito co

nhecimento das Linguas doutas , se

huma pessoa nellas não he iniciada ,

por assim dizer, na infancia. As de

clamações dos Filosofos tem tambem

nesta parte sobejamente prevalecido

sobre o antigo s stcma; mas o resul

tadonão ha si o feliz. Em vez de

continuar a trazer a tenra mocidade,

como se fazia al um tempo, no estu

do daV Lingua atina , abrio-se-lhe

huma carreira mais ampla; procurou

se exercitar a sua memoria sobre hu

Page 182: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

182

ma grande quantidade de objectos,

fazendo-lhe aprender Resumos de

Geografia, de Historia, de Mitholo.

gia, e até de Geometria, e de Fysi¬

ea. Aexperiencia parecia que se decla¬ l

râra a favor do methodo novo, pois que

hum rapazinho de dez ou doze an

nos, nos actos publicos que se fazião

no fim do anno escolastico, mostrava.

huma universalidade de conhecimen

tos, que admirava os circumstantes, e

fazia conceber aos pais as mais lizon.

jeiras esperanças. Mas o facto não`

tardou em fallar imperiosamente a.

favor do methodo antigo , tendo›se

visto que estes rapazes tão maravi

lhosos na idade de dez edoze annos, se

tornão ineptos na de trinta; e he bem

natural que , ao passo que se avezão

desde a infancia a belisear muitos

objectos, do mesmo modo quando são

adultos se occupão menos vivamente

em hum só. Não deixarei finalmente

de accrescentar que este mesmo aban

dono da Lingua Latina , occasionado

pelas vãs declamações dos Filosofos,

tem sido prejudicial até mesmo ao

estudo das Scicneias. Não sendo já

estas tratadas em Latim , como algum

dia se praticava, mas sim na Lingua.

nativa, convem que os doutos de hu-z.

Page 183: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

l 183

:na Nação, ou renunciem aproveitar.

se das luzes conteúdas nas obras dos

Sabias das outras, ou he preciso que

tomem a resolução de aprender as dif

ferentes Linguas respectivas , o que

não pode deixar de os afastar mui.

tissimo do estudo mais interessante,

das Sciencias que elles professão. O

mesmo Mr. D” Alembert , posto que

haja sido sem duvida o maior de

tractor dos Latinistas modernos, (l)sem embargo d¬isso se vio obrigado a.

reconhecer , e exactamente em vista

da razão aqui adduzida, que as Scien

cias devem sempre ser tratadas em

Latim ; se bem que na pratica elle

contradisse esta sua theoria , visto

que todas as suas Obras Mathemati

eas são escritasana sua propria Lip.

gnfalas he inutil , que eu me entrete

nhamais ytempo ' a lr'efutar aV i-mputat

ção tão repetida dos Filosofos sobre

a pretendida incapacidade das Cor.

porações Religiosas na educação da

mocidade, pois que tambem n°isto el

les não erão de boa fé. O- que lhes'

(l) Veja-seáD' Alembert-Sobre a Lali~

sidodødos Materias. v `

Page 184: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

184

desagradava em similhante systema

não erão os defeitos da instituição

litteraria, mas sim a applieação que

se praticava em unir á mesma tam..

bem a educação moral e Christã.

Bem vião elles que em quanto por

meio dos ditos institutores amocidade

viesse a beber, por assim dizer, com

o leite os sentimentos e os deveres'

religiosos , sería impossivel chegarem

elles a conseguir o seu projecto de

extinguir o lume da Religião sobre

a face da terra. Ora a união destes

dois generos de educação he o que

justamente constituía o mérito do

systema de educação das Corporações

Religiosas. Se a Religião he sem du

vida alguma o que ha mais coheren

te para a humanidade , que obriga

ção se não deve a huns institutores,

que fazião todos os esforços por ins

pirarem desde os mais tenros annos o

respeito , o amor , e os sentimentos

d¬ella 2 O principal desígnio de cada

hum dlestesI institutores era fazer cur

var o espirito ainda docil da mocida

de â veneração devida ao Ser Supre

mo , expor os motivos que ha deo

amar , e apontar os meios-pelos quaes

só lhe podemos agradar. A estas ins.

.trucgões se unia o exercicio da ora.

Page 185: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

185

ção , as differentes praticas diarias

de piedade ; em summa , nada se

omittia de quanto podia fazer ger

minar em seus animos as virtudes do

Christianismo. Tudo se reune na ida

de das paixões para afastar-nos das

práticas e máximas de piedade ; por

isso he summamente interessante, que

desde a mais tenra idade ellas tenhão

lançado em nossos animos as mais

profundas raizes. Quintiliano cria

que a escóla em que se houvesse

aprendido a bem viver , seria mui

preferível áquella em que se houvesse

aprendido a bem fallar (1). Segundo

esta maxima do homem mais perito

que teve a antiguidade no ensino da

mocidade, as escolas das Corporações

Religiosas merecerião toda a preferen

cia , ainda mesmo quando tivessem

defeitos sobre ,o ponto da educa ão

litteraria. Ora , quanto se não con e

eerâ mais a importancia de huma tal

preferencia , depois de se ter prova.

do com a maior evidencia, que ainda

mesmo nesta parte ellas não deixavão

nada a desejar?

Este yadmiravel enlace dos ditos ,

o

l

. (l) Quintil. l. l , c. 2.

Page 186: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

186"

dois genero's de educação be o que ti.

nha feito conceber ao immortal Chan

celler Bacon a mais alta. idea da ca

pacidade dos Jesuítas para a educa

ção da mocidade. EstawaÀ elle tão

convencido d”isto , que fazendo-se su

perior n` todas as preocoupações do

partido Protestante , no qual nasce'

ra. , veio por fim a invejar os Jesuítas

ã Igreja Romana (1).

Similhantes homens respeitaveis ,

penetrados e embebidos (Testa estima ,

que o grande Bacon fazia da summa.

applicação dos Jesuítas no unirem a.

educação litteraria com a educação

religiosa , chegárão ao ponto de di

zerem , ,que aRevoinção de França

não houvera acontecido ,. se prêvia~~ mente se não tivessem destruidona.l

quelle Reino os Jesuítas. Eu não re

petirei o mesmo , pois q'ue só Deos

,.

(l)/“N_obilissime\ para priscz disciplina

(sciiicet educationis) revocáta est niiquate¬

nus , quasi posxliminio in Jesuitarum

collegiis, quorum cum intueor indus

triam , soiertiamque , tam in doctrina

excolenda, quam in moribus informan

dis , iliud occurrit Agesiiai de de Phar

,, nabaso: Tnlz's cum sis, utinam noster es~

,, ses.” - Bacon, De Augment. Scimlidrum.

,1

J)

,J

l,

5

Page 187: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

¡87

pode saber o que neste caso houvera

acontecido. 0 'que sobre Vesite ponto

posso dizer com certeza he, 'que aRe.lvol'ução de França se executou prin

cipalmente por obra de mancebos ,

isto he , de pessoas que principiârão

a sua educação depois do anuo de p

1762 , época da destruição dos Jesui‹

tas no dito Reino. Esta circumstan

oia de facto conhecida de todos ac

crescenta grandissimo pezo ás citadas

razões de Mr. de Bonald sobre a ne

cessidade de confiar de novo ás Cor.

porações Religiosas a educação da

mocidade , pois mostra que o seu sys

tema tem a seu favor a, grave autho.

ridade da experiencia.

A importancia d'este mesmo syste

ma de Mr. de Bonald se conhecerá aim

da mais pelo que me resta adizer soâ

bre as pretendidas idéas liberaes, por

onde se conhecerá melhor ainda quam

to continúa a estar depravada a opi'

nião em materia de Religião.

ll

Page 188: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

me

' o_APITULo v. \

Do Divorcio.

ARTIGO I.

Voltaire , asseverando que o Evange.

lho permitte o divorcio em caso de

adulterio , não fez mais que copiar

os Heresiarcas do decimo sexto Se

colo.

l

Grande numero de pessoas tambem

conta a permissão do divorcio entre

las idéas e instituições liberaes , con

siderando-se como couza conforme ás

luzes do Seculo e aos progressos da

Religião; porém já mostrei no Capi~

tulo l.° que este tão decantado proresso das luzes , pelo l'que toca ás

bciencias moraes, não consiste em ou

tra couza. que' em contrariar as ideas

geralmente recebidas , sobre tudo na

ordem da Religião : e este he sem

Page 189: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

189

duvida o motivo por que os Filosofos

modernos pregão tanto a favor do

Divorcio. -

Sei que o Antesignano dos mesmos

Filosofos francamente asseverou que

Jesu Christo declarou odivorcio per.

mittido em caso de adulterio; e dlisto

toma novo argumento para .invecti

var contra os Papas, dizendo ser cou

za bem singular que a Igreja Catho

lica tenha com o seu rigor passado

tanto além do seu mesmo fundador

(1). Mas quem ignora o abuso que

este escritor fez das Divinas Escri

turas P `

Voltaire , fazendo estas exproba.

ções aos Papas , não fez mais que co

iar os Heresiarcas do decimo sexto

geculo : não contentes estes de terem

avançado , que o Matrimonio dos

Christãos pode ser dissolvido por dif

ferentes causas , como pretenderão

Luthero , e Melancton , ou somente

pelo adulterio de hum dos dois conju

ges , como opinava Calvino , vomi

tárão as maiores injnrias contra a

Igreja Romana, tratando de tyrannia

(l) Quest. sur I'Éncyclop. Art. Adub`

tère. _ -w . f

Page 190: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

190

a prohibiçio que -ella faz aos Fieis

de se divorciarem, sob qualquer pre

texto que seja, para passarem depois

.a outras nupcias: o que deo lugar ao

Concílio de Trento de produzir na

vigesima quarta sessão o Canon seti-`

mo que pronuncia Ana'thema contra to..

dos aquelles , que ousarem dizer que a

Igreja esta' em erro quando ensina,

como sempreensinou, conforme a Dou.

trína do Evangelho, e dos Apostolos,

que o vinculo do matrimonio não po

de ser dissoivido por pescado de adul

terio de huma` das duas partes.: E que

kos Padres do Concílio na formação

deste Decreto sehajão realmente ati

do ao que Jesu Christo ensinou, e os

Apostolos , he couza que bem facil

mente comprehenderáõ' até as pessoas

que nenhuma noticia tem dos estudos

Theologicos. ,

Jesu Christo disse em S. Marcos

(l): Aquelle que largar sua mulher, e

casar com outra, commette adulterio

com esta. E em S. Lucas , que todo

o homem que larga ou repudia a sua

i l(l) “Quicumque dimiserit uxorem, et

aliam. duxerit, `adulterium comânittit su

per eam.,, Marc. c. X, 30 ll. - ~

Page 191: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

191I

mulher , e casa com outra, commette

hum adnlterio (l). Quem diz aquelle

que, todo o homem, como nota Santo

Agostinho , não exceptua ninguem

(2). Por isso claro está que os textos

dos dois mencionados Evangelhos com.

prehendem tanto aquelle que toma

por motivo de se tomar a casar oadulterio de que a mulher he Iculpa

da , como qualquer outro~ pretex

to. , ~ r

Nem oSalvador fallou de outro moi.

do em S. Mattheus , digão o que qui..

zerem os Lutheranos , e os Calvinis

tas, os quaes se fundão em hum tcx- z

to de Cap. XIX deste Evangelho para a

sustentarem¬a sua opinião favoravel

ao divorcio. v 1

O Douto Abbade Bergier, respon

dendo aos indicados ímpios sarcasmos

de Voltaire , que tinha renovado o

erro dos Protestantes , refiecte muito

bem , que a. resposta de' Jesu Christo

'E'

¡me! 1 . - i _”

(l) "Omnis, qui dimittituirorprn- suam,

et alteram ducit moechatur' š et"qúi di: *

miuam a viro ducit , moechatur.” Lu'ç.

c. XVI, 'Í'Hi Y ' 'r "

a (2) S. Augustin. De Conjug. adult.` cnp'.

11, " 12'.: um . J n

Page 192: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

192

referida por S. Mattheus no vei-seta

9.° do dito Cap. XIX , era relativa ã.

pergunta dos Fariseos , e á questão

que reinava entre elles sobre o verda

deiro sentido da Lei de Moysés , que

alguns delles tinhão desfigurado, pre

tendendo que o marido tinha authori

dade de repudiar a mulher por qual

quer causa de desgosto, se bem outros

mais sensatos sustentavão, que isto não

era permittido senão no caso de algu

ma falta de castidade. “Jesu Christo,

(diz o mesmo escritor) docidio a ques

,, tão a favor dos ultimos, declaran

,, do que Moysés não tinha tolera

do o divorcio senão por motivo de

,, infidelidade , nisi obfornicationem.”

Por isso em S. Marcos , prosegue o

mesmo escritor, quando não já os Fa

riscos , mas sim os seus discípulos lhe

perguntãrão em particular sobre es

teassumpto do` divorcio , e que por

conseguinte já se não tratava de in

terpretar o verdadeiro sentido da

Lei de Moysés , mas unicamente se

tratava de saber o que se devia pra

ticar na nova Lei da Graça , elle

decidio sem restricçã'o p' algum , e

absolutamente , que quando hum dos

lesposos usa do divorcio , e se torna

a casar ', commette hum adulterio

Page 193: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

193

(1). E a mesma decisão, como 'á dis

semos ,deo tambem segundo S. ucas.

Mas quando mesmo se insista uni

camente sobre o Evangelho de S.

Mattheus , não he difficil mostrar a.

insubsistencia da doutrina dos Hete

rodoxos , pois ue tudo conspira no

citado Cap. Xlä do dito Evangelis

ta para fazer ver que o Matrimonio

he indissoluvel em todos os casos.

Com effeito, se alli o divino Redem

ptor declarou , que a Lei de Moysês

permittia. abandonar a mulher por

motivo de adulterio , remontou ao

mesmo tempo â maior antiguida

de, e fez ver, que em virtude da ins

tituição primitiva , e da Lei natu

ral, o matrimonio era em todos os

casos indissoluvel. Ensinou aos Fari

seos que he Deos oseu author, tendo

unido por meio do matrimonio o ho

mem e a mulher com hum laço tão

legítimo , que he muito maior que

aquclle que ha entre os filhos e seus

pais , e que, se bem omarido e amu

lher sejão dois individuos , não for

. g. l., v . .1 Liu-X.. l _

T. . . .em ,_,u .

(l) Bérgier , Trabad'o'historico e do -

matico da verdadeirallfleligião. Tomo I ,

cap. XI, Art. Il, palçigr. 17.

Page 194: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

194

mão todavia mais que huma só car

ne. Do que veio a concluiu como re

gra e preceito geral , que do nenhum

modo he permittido ao homem sepa

rar aquillo que Deos ajuntou, (1)..

E para que não se cresse que Moy

sês,- concedendo aos Hebneos repudi

ar mas mulheres vem caso de adulto.

rio , havia derogado aquella divina.

Lei noimernente á primitiva institui

ção do mattinmnio, declarou igual

nwnts'Josu Çhristo 'nesta oceasião aos

Farisaos , que essa licença era vmais

huma. ¡espcoie de tolerância forçada. ,

que huma vemdadoira petmiseãoo. .Moy

sés não .nos concedeo desqwitardes-uos

de mois-sas mulheres , lhes disse Jesn

AChristo ,› senão pela dureza dovasso

l

*V o i.

XY) ,,Et accesserunt fadz eum Pharísei

tenmmaes eum, et `dicemes: *Si 1icet homi

mi diwittere mwrem quaoumque.ze|c cau

sai? *Qui respondem, ait giga-'Non Ie

“gipçig , guiaA . ui .fecit _homimâuoÁ iniíio,

_mascn-Lum et aeniinwm -feoit zeos: _zçt- dixit š

-Propter hoc diriúttet homo "patrern , et

naum, et adbâfirfàbit .vzsQri _SWÇzfiLemut

duo in carne una.-ltaque `jam non sunt

.duo ,- sedafinaíeomz'Qnbd em Dgus om;,I 0m0.imn. Bwtní ,'ZH_ I

Cap. XIX. -4, :5, 6. ' ‹

Page 195: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

195

› cqração; mas não se praticou assim no

principio (1). Estas palavras do divi,

na Redemptor , não se praticou assim.

no principio, evidentemente mostrão a

-exprohação que lhes fez de serem elles

nisto os violadores da instituição Di,

visa; e que por consequencia erão

` indescul aveis no seu procedimento.

0 que fgz dizer com razão a. Santo

› Agofiinho , que quando Moysés per.

` mittio aos Aliqrâlirecuâr repudiarern suas

mulheres , deu a conhecer coml isto

*me mais .lhes lançava em resto Os

r Seusöivomiss, do que lhes sPPrPvs

i Vê 2- .

› 08 disÇiPHIOS que 88 achar/'ão Href

8612148' ao discurso que Jssll Qhusfq \

fu aos Farisees, nãs 0 istarpfetárãs

ds astro mudo. qse Per huma. lu

*fi Probibisãs de fwrgiivqrmz en.

do'elles y,~ .eus nã? 1mm Vsus esperar

(l) “ Diçunt illi; Quid efgo 'Mqyses

mandavit dare .libelhlfs .fevediii rf? .difrit*FTF ?._‹Aitl illis; Quoniapi Mqyse ad dq

nuam 'cordi'sfàëstri 'permisit'vebis 'mittere

llšflegvestras 5 ah initio antem nou fuit81°' n-Ibid. Ú 7, 8. ` h ' `

(2.) “Que is g sxprsbatio Qtius, quam

Ê'Pfl'bvflmerv n must» ..-Augwf~ De

°"° (Jung-,pan

Page 196: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

196

.modificação alguma do rigor da Leidivina concernente â Vindissolubilida

de dol matrimonio , concluírão , que

não convinha casar (l).

Mas ainda `quando fosse verdade

que a maneira com que S. Mattheus

referio a resposta , que deo Jesu Chris

to aos Fariseos incluisse alguma le

ve obscuridade , nem por isso seria

menos bem fundada a doutrina da

Igreja Catholica sobre a absoluta in

dissolubilidade do matrimonio por di

reito divino; pois que S. Marcos e

S. Lucas explicârão tão claramente

o pensamento e a ordem do Divino

Salvador , que não ha o_minimo lu

gar de duvidar , que elle prohiba o

casar de novo tantoáquelles cujas mu

lheres se achão culpadas de adulte

rio , como aos que pudessem allegar

outros pretextos para passarem a se

undas nupcias em vida de suas mu

heres: e em consequencia, como pro

segue o mesmo Doutor , não se pode

dar outra interpretação ás palavras

de S. Mattheus huma vez que se não di

(4) “Dicunt ei discipuli ejus: Si ita est

causa hominis cum uxore, non expedit

nubere.n Matth. Cap. XIX. :Í 10.

Page 197: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

197

ga, o que seria huma impiedade,

que os Evangelistas se con-tradisse.

tão l .

O(A)postolo S. Paulo, que certa

mente era hum bom interprete da

doutrina de Jeso Christo, diz tambem

em termos geraes. , e sem fazer ex.

cepção alguma , no Cap. 7.° da pri

meira Epistola aos Corinthios que a

mulher está ligada â lei do matrimo

nio em quanto vive seu marido. E o

mesmo repetio em outro lu ar do dito

Cap. 7.° : ,,Quanto âquel es que já.

,, são casados , não sou eu , mas o

,, Senhor, que dá este mandamento,

,, que a mulher se não separe nunca

,, de seu marido z e quando delle se

,, haja de separar, permaneça sem

,, casar com outro , ou se reconcilie

,, com o marido ; e tambem o mari

.. do jamais abandone sua mulher.”

Este mesmo eral e illimitado preceilO foi repetizglo pelo Apostolo no 72

Capitulo da Epistola aos Romanos.

Se a mulher durante a vida do mari

(ll “Sancti Matthei locus ab alliis Evan

gelistis ita explanatus est , nulla ut super

sit flifficultatis umbra.” S. August. DE

CWug. adult. lib. I, cap. 11.

Page 198: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

19'8

do , dit ellef, se despoâaf com outro

hoi'nem Sei'ã ëbusiderada comi) adul

tera. ›

,àEstas palavras do Apostolo tantas

,, vezes repetidas, tantas vetes ineul

,, cadas , são verdadeiras , diz Santo

,, Agostinho, são-vivas, são sãs, são

ela-ras. Hume mulher, segundo S.

Pauloi (prosegue o mesmo santo

Doutor) não pode vil' 'a ser esposa.

de outro homem 5 em quanto não

tiver 'ce'ssad'o lie o ser do primeiro

com quem se despozou, e não po

de cessar de ser sua mulhex` senão

pela morte' deste marido, nem mes

mo pelo seu adultetio. He verdade

que sep'ei'uiitte repudiat huma mu

lher por commette'r adulterio, mas

nem por isso fica desatado o vincu

,, lo do matrimônio; e isto ainda

,,› mesmo que o seu marido jâmais se

,, reconciliasse com ella (1). ,,

,2

u.e

7,

77

7,

97

8,

S)

,7

3)

7)

(l) “Haec verba Apostoli, tot-ies inculcata,

vera sunt , viva sunt, sana sunt, plana

sunt.l Nullius viri posterioris mulier uxor

esse incipit, nisi prlioris esse desierit. Esse

autem desi'net uxor pr'ioris, si' 'mofiátui" vir

ejus,` `non si fo'rnicetur; Iicite igitui' dimit

titur èonjux oh causam fornicaii'o'ni's ,`nec

carebit illo yineulo, etiam si nanquim re.

Page 199: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

199

Poderia citar outras muitas passa

gens d'este grande Doutor, tendentes'

aprovar que omatrimonio dos Chris

tãos, por direito divino, he indisso

luvel em todos os casos , sem exce

ptuar sequer o de adulterio. Restrin

gir-me-hei porém a referir a seguin

te reflexão. ,, Se o adulterio , diz el

,, le , fosse huma razão sufficiente

,, para dissolver o matrimonio, se

,, guir-se-hia dahi a monstruosa e

,, abomiuavel consequencia` de que o

,, delicto de huma mulher lhe sería

,,tão favoravel , que por este seu

,, grande attentado contra a fidelida

,, de conjugal , não só ella se livra

,, ria de hum marido de que não gos

,, tava., mas até por meio deste seu de

,, licto cessaria de ser culpada; por

” que desligando este mesmo seu de

,,licto o seu matrimonio , eessaria

,, ella de seradultera (1). n

concilietur viro; carehit autem si mortus

fuerit vir ejus.,,-S. August. Iib. II. Adul

tmais Conjug. cap. 5.

ll) “Quomam si per conjugis adulterium

°°njugale solvitury vinculam , .sequitzur illa

Pfrversitas, quam cavendam esse monstru

VI, ut te mulierp'er impudicitiam solvatur;

00 vinculo, quae si solvitur , libera eric'

Page 200: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

200

O matrimonio na Lei nova foi ele.

vado á dignidade de Sacramento. Os

Hereges, que o negão, fechão' intei

ramente os olhos â luz , pois que a

authoridade S. Paulo no Cap. V. da.

Epistola aos Efesios he sobre este

Ponto sobejamente clara e terminante ;

ora esta he mais outra razão pela qual

Santo Agostinho faz ver que o ma

trimonio dos Christãos he absoluta

mente indissoluvel. ,,Tendo sido por

`,, Jesu Christo elevados â di nidade

,, de Sacramento , recebeo, iz elle ,

,, hum novo grâo de indissolubilida

,, de que não tinha na Lei antiga. ,,

Os outros Padres e Escritores Eccle

siasticos , tanto anteriores como pos

teripres a Santo Agostinho , forão tam

bem scm discrepância alguma do mes

ino parecer, que omatrimonio he por

direito divino indissoluvel, ainda mes

mo no caso de adulterio; o mesmo se

pode dizer dos Concilios , e dos Pa

pas , tanto assim , que os Padres do

a lege viri, eideo quod insipientissimè di

citur, non erit adultera, si fuerit cum alio

viro ,. yquia per adulterium Iiberata est a

priori viro.” S. Augustim' lib. 2. De Adult.

Conjug. Cap. 5.

Page 201: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

À201

Concilio de Trento , ao formarem o

dito Canon VII da Sessão vegesima

quarta , com todo o fundamento asse

verârão , que a doutrina conteúda no

mesmo Canon he realmente a que a

Igreja em todo o tempo ensinou (l).

(l) Esta doutrina da indissolubilidade

do matrimonio em todos o casos , compre

hendido tambem o de adulterio , foi cla

ramente exposta , antes de Santo Agosti

nho, por S. Clemente Alexandrino /Slrom.

Iib. 2), e por Origenes (Homel. 7 in Mat

th.) E contemporancamente, e depois do

mesmo grande Bispo de Hippouia, susten

tárão a mesma doutrina Santo Ambrosio

(no livro 1.' de Abrahamo cap. 4). _S. João

Chrisostomo. /HomeL 17 in MatlhJ,S. Je‹

ronymo (in Epitaphio Fabioloe ad Ocea

uum , seu epist. 50, et in Epist. 147 ad

Amandum); S. Basilio (no Livro da Vir

gindade , e na Homelia 7 , sobre a obra

dos sei: dias) ; Lanfranc (na 10 carta a

Thama's Bispo d'York); e IvoI de Chartres

(na Carta 125.) f ,

E pelo que toca aos Concilios, além da

decisão já referida,. e subida de todos, do

Concilio vde Trento no Canon 7_,da sessão

XXIV , podem citar-se ,o Concilio de

Elvira , Canon 9 ; o de Milevi _, Canon

17; outro de Africa, ao qual tinha assig

tido Santo Agostinho, Canon 69 ; `o pri

Page 202: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

202

He por tanto falso que aactual dis

ciplinada Igreja concernente á geral

meiro' Concilio de Arles, Canon 10; e o

Concilio Ecumenico de Florença.

Finalmente, pelo que toca aos Pontifices `

Romanos, poderá ver-se a Carta 3 de In

nocencio Iud Exuperi.; Innocencio III, no

cap. Gaudemus, de Divortiis; e Eugenio

IV no Decreto enviado aos Armenios. Es

te Descreto era concebido nos termos se

guintes: “Quamvis ex causa fornicationis

liceat thori separatione facere, non tamen

alium matrimonium contrahere fas est, cum "

matrimonii vinculum legitime contracti per

petuum sit. ,,-Assim se vê claramente

que a Igreja, por constante tradição ensi

nou sempre , que o matrimonio he de tal

sorte indissoluvel, que não se .pode desatar

nem mesmo por causa de adulterio.

Sei que se tem objectado, que alguns

Padres tem sustentado que mesmo na Lei

nova he permittido dissolver o matrimonio

pelzrcausa acima indicada; fe citão-se en

tre outros S. Justino na primeira Apologia

dos Christãos, dirigida á cerca do an'no de

150 ao 'Imperador Antonino, e Tertulliano

no Livro 4 contra Marcião. Mas isto he

hum erro. Se' se lerem com nttenção es

tes escritores, conhecer-se-ha que elles não

fullárã'o senão da separação 5' em quanto ao

thílaino e á habitação , que elles julgárão

permitti'da, quando a mulher he convenci

Page 203: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

203

é absoluta prohibição do Divorcio

sejaA Obra da ambição e da politica

dos Papas , como assevera o Corifeo

do moderno Filosofismo, sem intlical`

porém quaes sejão estes motivos de

ambição e de politica , que o indu

zirão a. fazer huma tão importante

mudança na Igreja (l). Das reflexões

feitas em todo o decurso do presente

artigo Se manifesta claramente , que

ella neste ponto tambem sempre en.

slnou la. mesma constante doutrina..

Alguns Escritores , tanto entre os

Protestantes., comorentre os Filosofos,

para provaremque a Igreja Romania

v

i

da de adulterio;` e ver-se-ha por conseguiu-_

.te que nenhum dos' Padres disse que (le-_'poisl d'aquellá separação he permittido 'ao

marido casar com oufra mulher durante i!

:vitlá' d'aqueila que repudibu: excepto'uúi‹

camem'e Laétaneio, o quai era secular, e

hum Rhetorico criado na Corte do Im~

p'eradoficønatantino., e não instruido _de

iodo .na ddoutrina _da igreja. ,Cria elle quea excepção feita porV Jesu'Cliristo em S.

Matthias ,u S,e___‹levia entender lconforme a

disposição das Leis Romanas, que permit

fliO~o divoreio.V '

(l)fVoltaire,»'Q¶eat`. sur I'Encyciopedó

Grliêfi Adúltemí. › . `-_ '

Page 204: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

204

não sustentou sempre a doutrina actual

sobre o divorcio, tem citado as Leis

de Theodosio , de Valentiniano, e de

Anastacio , insertas no Codigo de Jus

tiniano no titulo dos Repudios. Os

tres mencionados Imperadores, dizem

elles, erão Christãos, e com tudocom

as suas citadas Leis permíttirão aos

conjuges poderem tornar a casar depo

is de se terem separado. Este modo de

discorrer nã'o só he contrario â Logi

ca , mas. tambem' ao simples bom sizo.

He o mesmo que se , quinhentos ou

seis centos annos atraz ,~‹ citasse alguem

o Codigo Napoleão , para provar

que no principio do decimo nono se

culo tinha. aIgreja Romana approva

do o Divorcio. Nos primeiros temposí

da. Igreja erão as Leis dos Im erado

res mui diversa couza_que as eis de

' Jesu Christo .: e S. Paulo e Papiuia

no ordenavão couzas que erão entre

si muito diversas , como observou S.

Jeronymo (1).

Justiniano nas suas novas Consti

tuições abrogou a maior parte das

(l) “Aliae sunt leges Caesarum, aliae

Christi : aliud Papinianus ,\ aliud Paulus

noster praecipit.”-HyerenimrEp 30

Page 205: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

205

Leis Romanas favoraveis ao Divor

cio, e exactamente por serem oppos

tas â Lei de Deos: e se algumas con

tinuârã'o asubsistir, não foi por mui

to tempo. A' medida que o Chris

tianismo se hiadilatando entre os po

vos , e sobre tudo desde que toda. a'

Europa se achou convertida á Fé,

cahírão em desuso todas as antigas

LeisRomanas que approvavão o di

vorcio , eprevaleceo` inteiramente so

bre ellas a disposição do Direito Ca.

nonico, de modo que com toda asem

razão na Encyclopedia Methodica , e

em outras obras modernas aliàs sãs ,

se citou a Polonia como hum exem

plo sempre subsistente de hum Reino

-Catbolico , em que he permittido o

divorcio.

ARTIGO II.

\

Hefalso que o Divórcio haja sido sem~

pre authorisado na Polonia.

Este erro vem de que em nenhu

ma outra parte são mais frequentes as

dissoluçõ'es do matrimonio que na Po

lonia. Se em yez de se aterem ao

Page 206: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

20.6

simples facto , considerassem os meti..

vos que o produzíi'ão, não terião os

apontados authores avançado tão ligei

ramente similhante asserção, O author

da Obra intitulada Codigo Matrimonial

provou sem réplica, que as sentenças

pronunciadas na Polonia sobre esta

materia não são, fundadas na faculda

de que alli exista de fazer divor..

cio , mas sim na grandissima facili

dade de admittir as causas de _nullida

tde , e d°ahi tira por tanto huma con

”sequencia totalmente contraria ao seu.

tir dos escritores , de que temos fal

_lado. “0 uso da Polonia , diz elle ,

longe de estabelecer a authorisaçãø

do divorcio, antes demostm 0 con

trario, Quando .Se dissolve hum ma.

trimonio contrahido por força, suc

cede, que se julga que não interveio

jâmais 0 consentimento; esendo es

,, te a basedo matrimonio , por isso

,, se julga nunca haver sido verda.

,, deiro matrimonio; Depois , não se

,, achão¬outros meios de permittir a

,, dois conjuges , descontentes da sua.

,, sociedade _. que formem outra, de

4, novo, senão declarando não whe

,s vide vinculo quem haja ligado;

a .e M0 he huma Prova sessivel de

s, que ,se houvesse. .vins'uloseéstç mãe

,1

9)

i,

,1

H

,7

Page 207: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

,207

à, podia deixar de ser indissoluvel.

.,, Assentado isto , quer os`Juizes se

,, jão mais, ou menos faceis em admit

,, tir as provas cf'eata nullidade do

,a vinculo matrimonial, sempre aLei

,, fiea em pé, O Juiz pode prevari

,,, car; mas a Sua, Vmesma prevarica.

,, lção , longe de abolir aLeii, mostra

,, a orça do seu imperio, da qual se

,, não pode subtrahir senão por meio

,, de hum delicto.” .

Se a índole de hum simples artigo

o pormittisse ,_ poderia referir outros

similhantes esoriptores, que se impo.

serão o dever de refutar esta falsa

idéa do que o divoroio propriamente

.dito haja sido sempre na Polonia per

mitiído. .Nãozposso porém deixar de

referir huma. passagem z de Benedicto

XIV ,' ,pois que-o Leitflr olhará como

deçisiva ,a sua authoridade. ,4 w

Resoluto este grande Pontifice are;

pzrezaro curso dasdemasiado frequen} o

tes .dissoluções de .Wimønio na' Poj

lonian' dirigia para yesse effeito diver

sos Breves' aos Bis os daquellešpaiz; i

msq-uaes depois lhes haver ,feito

sentir 'os ¡move/Mentes dfisso, vai, 422!,- .

pondo as anais' cousasdç medo Seguiu;

to.: ff Estamos (dis 10116). .WSBMÃMPS a

a, que 'a âesøsdenmfi eøwfusãow de

Page 208: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

208

J,

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que acima fallamos , e que reinão

na Polonia, provêm pela maior par

te da maneira porque ahi se con

tratão e celebrão os matrimonios.

Muitas e muitas vezes deixa de as

sistir a isso oproprio Parroco; dâ

se âs vezes, sem elle o saber, acom

missão a hum simples Clerigo seja.Y

qual for; concedem-se tambem fre

uen'temente dispensas de banhos,

de modo que, apezar de não haver

alguma causa legitima e urgente,

não se dá lugar sequer a huma

denuncia. Fecha-se com isto todo e

qualquer caminho pelo qual se pos

sa vir no conhecimento se o matri‹

monio foi celebrado com a neces

saria liberdade de hum e do outro',

e se ha ou não entre hum e outro

algum impedimento por cujo mo

tivo o mesmo matrimonio já con

trahido deva consecutivamente ser

dissolvido. D'ahi nascem frequen

tissimas contestações sobre a nulli

dade dos matrimouios ainda que

celebrados â face da Igreja. A°s

vezes pretendem que o matrimonio

se contrahíra ou por violencia, ou

por temor, sem o livre consenti

mento de hum dos dois espozos; Ou

tras vezes pmduz-se e oppõe-se

\

Page 209: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

209

hum impedimento , o qual , bem

que legítimo , podéra. ter-se desco

berto antes de se contrahir o matri

` monio, se premeditadamente ecom

apostasia o não tivessem querido

esconder. Outras vezes, eisto acon

tece com mais fre uencia , faz-se

depender a nullida e do matrimo

nio do motivo de se haver celebri

do perante outro Sacerdote em vir

tude de huma commissão, quer do

VParroco , quer do Bispo , a qual

se não deo vsegundo as formulas or

dinarias e estaveis. Não ha certa

mente algum .que não comprehen

da que tudo isto , abrindo facil

mente a estrada ao delicto , lie cau

sa de que o beneficio canonico da

appellação , que concedemos nas

nossas ultimas Letras , e do qual

poderia gozar hum dos éspozos por

,, meio da obtida sentença de nulli

.,, dade, vem por estas fraudes e sub

,, terfugios a_ ficar impedido ; .e por

,, consequencia, que, com gravissimo

,, escandalo da gentede probidade ,

,, são tão fre uentes na Polonia as

,, dissoluções o matrimonio. ,,

Estas dissoluções do matrimonio

não são pois, torno a dizer , funda.

das na Polonia na permissão do di

“v “e

uuuauwuugqvuuuvv-Vu-“»u~q~¢-uuuuqvuuu

u v

Page 210: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

210

vorcio , mas sim em razões de nulii.

dade e impedimentos dirimentes , dos

quaes :e abusa. Se existira similhan

to permissão, o douto e zeloso Ponti

fice não deixaria de em seus Breves

desenganar aquella nação Catholicis

tina. e tão respeitosa para com a San

ta Sé , sobre hum erro tão opposto

aos principios do Evangelho. D"a.qui

concluo em ultima analyse , que em

todos os Estados Catholicos, sem ex

oeptuavr algum , sempre ha. sido pro

hibido o divorcio.

‹-.__

Al'rloo III.

Das Lei; de França de 1792 , e 1803

a favor do Divorcio.

Aprimeira vez que em hum paíz

reputado Catholico se ha visto publi

car huma Lei a favor do Divorcio,

foi em França no me: de Setembro

de 1792` Mas bem se sabe que na

quella época não tinha a Religião

Catholica naquella região mais que

huma existencia meramente nominal.

Os seus verdadeiros Ministros pros

I

Page 211: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

211 '

critos , desterrados por paizes estran

geiros , estavão substituídos por in.

trusos, por scismaticos , os quaes não

formavão mais que hum vão simula..

cro de Igreja. Ainda entre estes ulti

mos alguns houve que reclamarão al

tamente contra o escaudalo da nova

Lei. Tal foi principalmente hum oer.

to Mr. Gracian , intruso de Ruão, o

qual foi perseguido pol` ter sustenta

do em huma sua Pastoral a absoluta

indissolubilidade do vinculo do ma

trimonio. Mas este clamor de hum

Bispo sem missão, que barreira podia

oppor â torrente da impiedade que

devastava então aquella' outrlora tão

florente porção da Igreja Universal?

Esta. Lei de 1792 , obra de huma.

Assembléa que tinha arruinado a Cons

tituição politica e religiosa de hum

vasto reino , nada offerccia extraor

dinario. O que verdadeiramente cau

sou singular assombro foi ver succes

sivamente Napoleão propor huma si

milhante Lei ao Corpo Le islativo.,

hum anno depois de ter pällicado a

Concordata , por meio da qual tanto

blazonava. ter restabelecida com todas

as suas premgativas o Culto ÁCatholi

co em França.

. O pretexto wddmoido pelos seus ora.

. 2

Page 212: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

212

dores para' córârem esta contradicçã'o

he digno do motivo que havia inspi

rado a Lei. Era isto , dizião elles,

orque havia em França seguidores

se differeutes Cultos que admittião o

divorcio ; razão verdadeiramente ri

dicula , e digna de hum tal legisla

dor! Como se , po-r contentar os filhos

de Luthero e de Calvino , os quaes

não formavão em França senão huma

pequena parte dos habitantes , fôra

precizo compro-metter a delicadeza da

consciencia da totalidade moral de

Nação , que professava a ReligiãoCatholical i

Além do que, os sectarios que Na

poleão tinha em vista favorecer , não

admittem o divorcio senão por causa

de abandono ou de adulterio. A sua

Lei, mais.` geral, sim era sujeita aal

gumas restricções , mas estas erão tão

vagas , que condescendia com todos

os caprichos , e favorecia todas as

paixões. Hum Legislador mais reli

gioso emais coherente teria feito hu

ma Lei fundada no preceitoevange

lico , a fim de declarar prohibido â

Nação Catholica o divorcio; salva

huma excepção particular para os

Protestantes nos dois casos authorisa

dos pela sua doutrina. Mas Buona

Page 213: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

l

213

parte tinha miras mais distantes; e

hum secreto desígnio, que facil era de

perceber. Entrava nos seus projectos

remeter os preceitos de Jesu Christo

ao numero das opiniões puramente

theologicas , e avezar insensívelmente

d°este modo os Catholicos â prevari

cação. Tudo isto conduzia a. pouco e

pouco ao grande systema da indiffe

rença de todos os Cultos, o qual tan

to tinhão a peito os Filosofos.

___

ARTIGQ IV.

Opposição do Divorcio ao bem

da Sociedade.

Se o Divorcio he visivelmente con-

trario aos principios do Evangelho,

não o he menos â ordem social debai

xo de todas as relações de utilidade

publica que hum Legislador deve ter

em vista , a fim de que as suas orde

nações produzão o commodo da Na

ção; o que bem provou o Abbade de

Rastignac na sua bella obra intitula

da : Accord de la Revelation et de la

Raison contre le Divorce.

Page 214: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

IÁ214

Tambem ' o Abbade Bergier depois

de ter amplamente provado , na sua.

já mencionada Apologia da verdadei

ra Religião , que o divorcio he con

trario ao Evangelho , não deixa de

~se espraisr do mesmo modo sobre a.

sua opposição ao bem da sociedade.

Demonstrou elle concludentemente que

o divorcio he contrario ao interesse

dos filhos , offende o direito natural

das mulheres, pcrjudica a pureza dos

costumes , e arma finalmente hum la

ço â fidelidade dos Àesposos, pois que

aquelle dos dois conjuges, que desgos

tar do seu estado , se sentirá movido

a. ser infiel , para dar ao outro hum

motivo de se divorciar.

Muito antes de qualquer destes dois

escritores , e exactamente pelo fim ldo

decimo sexto seculo , tinha o coorde

nador' do Cathecismo Romano , com

pilado em consequencia dos Decretos

do Concílio de Trento , exposto di ver

sas vantagens consideraveis que , aín

da a respeito da ordem social, se de

rivão da Lei da indissolubilidade do

matrimonio (1). _

1 (l) “Ac ne alicuizvideatur durior ma

trimonii lex, quod nulla unquam ratione dis

Page 215: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

215

Como porém a anthoridade d'estes

escritores , por mui respeitavel que

seja , poderia não ser talvez de gran.

de pezo aos olhos de certas pessoas

que reprovão anteci adamente tudo

aquillo que provem apenna dos Ee.

clesiasticos ; juntarei aqui a opinião

'solvi possit, doceudnm est, quae sint cum

ea ntilitates conjunctae. Primnm enim hm

mines iu conjungendis matrimoniis virtü:

tem patins, et mornm similitudinem, quam

'divitias, et pulchritudinem spectandum Bb

se intelligunt.: qua quidem re communi

societate maxima consuli , ncmo dubimrç

potest. Praeterea si divortio matrimonium

dissolveretur, vix unquam dissidendi causa:

`liominibus, quae iis ab antiquo pacis et pd

dicitiae hoste quotidie objicientur, deesseutí.

Nunc vero cum fideles secum cogitant,quam

vis etiam conjugii convictu et consuetu

dine carea'nt, se tamen matrimonii vinculo

-contriotos teneri, omncmqne- alterius uXim'iS

du'cendae spam sibi praecisam essel ea re

fit, ut ad iracuudiom, et dissidia tardiores

esse cousueverint. Quod si interdlum etiam

divortium faciunt, et diutius coniu is def

siderium ferre non possunt, et 'amle pei

amicus reconciliati ad ejus convictum` re'

deaut.” Catherbis. Rom. e.: 'decreto 'Sad

Com-.f Tridm. jun» Pit' V. P.~M.'Udil|í|1š

Cap. s. quam. m. z e .~ 4; fz

Page 216: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

216

de David Hume , hum dos oraculos da

Filosofia moderna. No decimo oitavo

dos seus Ensaios abertamente se de

clara contra o divorcio, e bem pode

cada qual imaginar que elle certa

mente não tomou do Evangelho os

argumentos com que apoia o seu sen

timeuto.

Pode-se consultar tambem o excel

lente escrito de Mr. de Bonald atraz

louvado , que tem por titulo: Du Di

vorce consídèré au dixneuvieme siecle.

Este author , que ainda vive e goza

de grande reputação de probidade

'entre a sua nação , tinha composto

este discurso com a intenção de fazer

sentir ao Legislador da França , em

1803, os inconvenientes da Lei anti

christã , e immoral de 1792 , e im

pedir assim , que ella não fosse de

novo consagrada pelo Codigo Civil

que então se compilava. Fazia elle

principalmente observar que odivor

cio se torna mais funesto á medida

que huma nação mais se vai estra

ando, porque se faz mais frequente.

, l que elle. prova com o exemplo do

Povo Romano, entre o qual o divor

cio, se bem authorizado pela Lei, foi

por longo tempo summamente raro,

e não se tornou frequentissimo senão

Page 217: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

_ 217

nos ultimos tempos da Republica,

quando a corrupção dos costumes se

tinha feito excessiva (l). Juvenal,

que vivia exactamente no dito tem.

po , exercitou o seu éstro satyrico

contra as .matrouas Romanas, que ti

nhão achado o segredo de permuta

rem oito maridos cada cinco annos.

Muitos escritores Protestantes do

passado seculo decimo oitavo, es an

tando-se desta excessiva multip ica

(l) D'esta louvavel conducta dos Roma

nos antigos de não se aproveitarem da lei

que permittia o divorcio, temos huma au

thentica prova em Valerio Maximo, o qual

no Liv» 2, cap. `l nos diz que a Republi

ca Romana Ââ tinhaexistido mais de 500

annos primeiro que se ouvisse fallar do

repudio das mulheres; e que Spurio Car

bilio foi o primeiro que repudiou sua

mulher corn o pretexto da esterilida

de , a fim de casar com outra. O mes

mo Historiador ajunta , que , se bem es

te pretexto parecesse toleravel , com tudo

não deixou de ser o mesmo Spurio Cal-bi

lio geralmente vituperado porque, como

_todos dizião , não devia preferir á fé con

jugal o desejo de ter filhos._“Qui quam

,, tolerabili causa motus videbatur, repre

,, hensione tamen'no'n'raruit, quia nec

,, cupiditatem quidem liberorum conjuga

,, li fidei praeferri debuisse arbitrabatur. ,,

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218

ção' dos divorcios que havia'entre os

seus, e pelo mesmo motivo que a

Ptoduzio. entre os. antigos Romanos,

desejavão ardentemente ver sobre este

onto restabelecida a doutrina da

greja Catholica , que os seus avós

tão temeraria e tão ligeiramente ha

vião ,oondemnado no decimo sexto.

o .Accrescentarei a isto , que na Ca

mara dos Pares dllnglaterra, de cuja

jurisdicção dependem as causas do

divorcio, tem muitos membros respei

taveis varias vezes declarado os seus

votos pela inteira abolição deste uso,

como unico meio de suspender os seus

escandalos. ,

Assim , entretanto que os escritores

mais (rapazes de fazerem authori'dadc,

e os homens mais distinctos pela sua

moral ainda mesmo nas nações pro

testantes, abertamente reprovavão o

divorcio , applicava-se o pretendido

restaurador do .Culto Catholico em

Fran a a consolidallo na sua nova

Le is ação.

` as se depois da época de 1803 ti

verão todos os bons a mortificação

_de verem estender-se aLei anti-chris

tã e immoral do Divorcio até por

diversos paizes Catholicos, podem ao

presente tranquillizar-se de todo , pois

Page 219: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

219

ã se tem restabelecido neste tão de.

licado ponto a ordem das couzas. O

Soberano da minha patria foi o pri

meiro que rendeo esta homenagem â

Religião e á' moral ; por quanto no

mez de Maio depl814 , quando , de

pois da derrota de Napoleão , as suas

victoriosas falanges pozerão pé no

territorio Veneziano, o primeiro acto

de authoridade que exercitou , foi

proscrever a dita Lei do Divorcio;

exemplo que brevemente foi imitado

pelos outros Principes Catholicos ue

na mesma época entrarão na posse os

seus antigos dominios.

Page 220: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

, 220

'cAPITULo VL

Da Liberdade da Imprensa.

ARTIGO I.

Os Filosofos modernos tem artificiosa.

mente confundido a liberdade da

Imprensa com a liberdade de pen.

sar , e tambem dlesta nos tem dado

huma noção totalmente falsa.

Aliberdade da Imprensa he a ulti

ma das idéas pretendidas liberaes, que

eu me hei proposto examinar neste

opusculo. Sobre este objecto não teria

eu na verdade precizão de me esten

der muito , antes me poderia limitar

a duas alavras , dizendo , que este

he infelizmente o meio pelo qual se

tem espalhado tanto oveneno das ma

ximas irreligiosas e anti-sociaes que

ha vinte cinco annos aesta parte tan

tas lagrimas tem produzido no Mun

Page 221: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

221

do. Porém os Filosofos tem ha mais

de meio seculo repetido incessante.

mente , que a liberdade da Imprensa

he a principal salva-guarda da feli

cidade das nações , tem-se soltado tan

to contra os Principes e contra os

Ecclesiasticos por semostrarem affer

rados aos antigos regulamentos sobre

a censura dos livros , olhando simi

lhante proceder como o ultimo grão

do Despotismo Sacerdotal e Ministe

rial; que para encaminhar em tão

interessante objecto a opinião publi.

ca, creio não ser inutil descobrir to

da a fraqueza dos sofismas com que

se tem chegado a depravalla.

O Marquez Gorani , que na nossa

Italia foi hum dos primeiros e mais

ousados promulgadores do filosofismo

ultramontano, depois de ter, nas suas

Investigações sobre a Sciencia do Go

vcrno , feito os maiores elogios da li

berdade de pensar, que considera como

a mais nobre prerogativa do homem,

assa. a fallar nestes termos da liber

dade da Imprensa: “A liberdade de

fallar, de escrever, e de publicar

cada hum os seus pensamentos he

huma consequencia necessaria da

liberdade de pensar. De que servi

ria com effeito esta ultima facul

r

Page 222: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

222

3,

2,

,7

37

Mah»

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a:

:1

,7

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5,

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37

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H

dade , de 'que serviria investigar

verdades , e couzas uteis, se fosse

vedado communioallas aos outros?

Por meio de similhante prohibição

he 'que o Despotismo Sacerdotal e

Ministerial tem reduzido tão pou

cos verdadeiros omens de Estado,

e poucos livros bons sobre a scien

cia do Governo. Se fosse possivel

anniquilar a'faculdade de publicarsos proprios pensamentos , não se

chegaria jamais a libertar os po,

vos do flagello dos erros e da ty

rania, a reformar os costumes, as

leis, os Governos, a conter em de

ver os Ministros , aquelles princi..

paes inimigos dos homens, a dar a

conhecer os males e os remedios, a.

assegurar penas aos delictos e re

compensas á virtude , a comparar

as opiniões proprias com as dos

outros , e a aproveitar suas idéas

para aperfeiçoar os conhecimentos

proprios ; em fim o genero huma.noV condemnado a huma perpetua

infancia não poderia jamais sacu.

dir o jugo dos seus tyrannos , nem

regenerar-se (1).” -

(l) Goreni, Ricerche su la scienza del

Governo, tom. 1, cap. 60.

Page 223: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

223

VEste modo de discorrer do Marquez

Gorani , que he commum a todos os

outros livres ensadores do seculo de

cimo oitavo, lÊe em todas as suas partes

vicioso, e inconcludente. A liberdade

de pensar, e a de fallar, e escrever,

são duas couzas entre si inteiramente

diversas e distinctas. E a razão d"isto

se manifesta promptamentepor si mes

ma, pois que em quanto temos dentro de nós mesmos os erros, não po-V

dem estes fazer damno algum á socie

dade , o que não succede quando se

expõem com as palavras , e .muito

mais com os escritos. Mas já que os

Filosofos tem artificiosamente confunà

dido estas duas couzas tão oppostas

entre si , julguei não sería inutil se

uir os seus raciocinios ; e antes de

šallar directamente da liberdade da

Imprensa, julgo interesse da obra en

treter-me hum pouco sobre o erro do

principio de que elles a fazem deri

var ç demonstrando para esse'effeito`

que aliberdade de pensar, sobre que

ellesítanto tem escrito , não he outra

eouza mais que a libertinagem e a

soltura. E creio que não posso satis»

fazer melhor este empenho do que

seguindo passo a passo os raciocinios

e as idêas do Escritor de que todos

Page 224: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

224

tomârã'o este do ma característico do

moderno Filoso smo.

João Antonio Collins , o discipulo

predilecto, e intimo amigo de Locke,

depois de ter abalado os alicerces da

moral e da Religião , tirando ao ho

mem a liberdade , levou mais longe

este seu audaz desígnio dando ao mes

mo homem a funesta licença de exa

minar as liberdades reveladas e de

submetter a Fé ã razão. Fez elle pri

meiro isto com hum opusculo sobre o

uso da Razão, mas depois mais par

ticularmente , e , por assim dizer ,

ex professa , no seu famoso discurso

sobre a liberdade de pensar , que pu

blicou em 1713 , por occasião de ter

sido aggregado a huma sociedade de'

livres-pensadores, que então se tinha

erigido em Inglaterra.

Collins principia estabelecendo co

mo principio e axioma, que rege to

do o seu discurso , que nada se deve

crer sem exame; d`ahi faz consistir a

liberdade de pensar no uso do enten

dimento para procurar e descobrir o

sentido de huma proposição conside

rando a natureza das provas pró e

contra , a fim de formar cada hum o

seu juizo, segundo ellas parecem mais

ou menos fortes. /

Page 225: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

22

' Esta definição, que Collins, da

liberdade de pensar -, app icada ás

Sciencias Naturaes he justissima; e

todos pensarião tambem que a suain

tenção seria realmente restringir a

sua mencionada definição dentro d”es

tes justos limites ; tanto mais que na

época em que elle `publicou o 'seu dis

curso sobre a liberdade de pensar

reinava ainda geralmente o Peripaõ

tecismo, o qual foi sem duvida hum

grande obstaculo aos progressos e ao

adiantamento das Sciencias. Mas deo

infelizmente ao seu systema huma ex

tensão muito'maior. Corn effeito, em

todo 0 fio do -mesmo discurso não

cessoufelle de applicar a sua aponta

da definição igualmente âs verdades

reveladas; o que certamente não ho

lícito fazer: assimpois, Anão se pode

de modo algum duvidar que o prin

cipal fim: do seu livro não haja sido

deprimir vemy geral. a Revelação , o

em particular o Christianismo. _

Verdadeiramente , ainda em ordem

á Religião , 'de todo nãoflhe excluído

o meio do exame..v Dev-e ,porémlhum

tal exame ter por objecto sóa exis

tencia , , e não 'áv o fundamento da.

verdade , o qual he de Lsua natureza

impenetraveh Tudo p) que .pode em,

Page 226: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

226

gir a este respeito. hum prosélyto he

ser convencido .da solidez das provas

sobre que aV Relirrião se funda , e que

motivos de credu idade citão osTheoú

logos. .

- Em vão por tanto Collins , e .com

elle os seus dois-nacionaes e coeta

neos Tindall e Tolando , como tam

bem todos os nossos' modernos incre.

dulos incessantemente gritão , que a

evidenciavhe ro fundamento da persua.

são e concluem f, que não se pode

acreditar aquillo que se não concebe

claramente. .A evidencia'he sem du

vida o fundamento da persuasão: mas

ha diversos gen'eros de evidencia e de

certeza. A certezamoral, aqual, bem

como a' certeza fysica , tem por ob'jeú

cto os factos, pode ser levada a. tal

grão de convicção, que vença até as

mesmas provas fysicas. Os nossos mais

caros interesses ,r os nossos deveres , e

a nossa conducta na vida civil repou

são unicamente sobre provas moraes ,

tanto assim, que , 'se nctlzas. não se ti.

vesse confiança, não poderia subsistir

a sociedade. Ora a certeza moral ho

exactamente a que se deve principal- ,

mente procurar em materia de Reli..

gião; e atendo-nos â mesma, quam

do veneramos ossacrosantos mysterios

Page 227: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

` fi'í

_GÍÍ Clírištišl'ui'šuiol bém ltfli " 'dê 'nós

mostr'àfz'nós êréaúíos eisâên àtóé; no.

íno _'hös' exprobã'ô 'os 'incré'dülds 'É'j visñioš pelo* contrário` _âá'li'sarl da. ñia'iof:

racionalidade' pôiü estamos iu'tirhaé

flelrrtjeperšuädidosj que a Religião;

gif” propõe. â, nossa õrèuça' ,, vem

'ea mente de `D'eos'. Celso tambem

vicupçrava 'o mesmo éóé' Christsô'ä'du

seu tempo' ;‹f comparam-.os -ã _gentaiha

'né se dè'fxaénganärj dos charlataesz32x ` dba'vai-'lhés que tirflläho'sempfäna

Bo' a estas alàvras :` não examiñeis

ñádc , frias rédë', ë' à' v'ošsa' ƒä v'bs sal;

üär'á.' Más Órifgehés, que nos refereéq'tâ À«fzzƒf' tabagãq éalqgúúíçssa .hà-ee!i

só, a fé úcó'ú çptiínaméutéf, com tam-.

Bem ó~ näó sñéiiáfsq sé fazer` os' m0.

âéfiiq'é ú djâôlõgistâs fiés§~çfldéndó' aos

Dêist'as os n ssöS'ÊFIÍÍ os; _ I '

' *f H'é acá'šó' argumfe'r'í ö ,` (diz muito

ea z «fé éf'ó õšifóafifim'oâás'óbszditosI riiaišmé'fe'res ä blo`` istas) z 'he

,, acasqwguzúsbwnéú fi-ç'i ffi'é là limn fi'dm'éni fqüë näšéçšqsgfóçgis,', e'égugiraíí. para' asšévérar quêz'he' -

,, sie*ptcllänajitƒ:xy tudo.quántp"'_elfé ës"u:.f

,',' fáí lu'víre1 d'atsncórès? Podiây 16

,; san -lötréufafi ass-suis» v de: masno qbáñtó* óWídizeÊPEHI a'plfiaíeii'ëit

2

Page 228: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

228.

parece que tem todos os mais ra.

zoaveis motivos para crer que essa

luz e essas cores são outros tantos

absurdos. Na sua-mente huma pers;

pectiva encerra contradicção, hu~

ma superficie plana não pode pro

duzir no seu es irito huma sensa.

ão de profundidade. Para elle a

uz, hum espelho, as cores, todos

os fenomenos 'que d`aqui nascem,

são outros tantos mysterios. Parece

que .tem razão' de assim estar er

suadido; não tem de tudo isto ¡dêa

alguma ; quanto se lhe diz a este

respeito he para elle incomprehen

sivel: Ina sua fantasia não tem tão

pouco fundamento algum com que

, possa revestir de qualquer imagem

,, hum fantasma seja qua for, fabri

,, cado aseu capricho. D'esta incom

”.prehensibilidade , d”esta falta de

,, idêas e de fundamentos assaa

,, deduzir a impossibilidade a cou

,, za: discorre elle, ou delira. ? Pois

,, que! ha de a possibilidade das co.

,, res ser medida pelo cego de nasci

,, mento só pela insufiiciencia. que,, Item de formar idêa diellas ela

',, força do seul entendimento 2 ão

,, tem ` elle outros fundamentos que

“NUM”

`XUUU

2.2.

W

n.

H.

:a

:1

.1:

n

n

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u

Page 229: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

229

,Í lhe. facão crer aquillo que não po;l

,, de comprehender (l)?,,

O exemplo do cego de nascimento.,

continuo eu , he exactamente o caso'

de Collins, de Tindall, de Tolando, e'

de todos os outros Filosofos incrédu

los. Rejeitão temerariamente os myste.

rios , unicamente porque os não com-I

prehendem , se bem por outra parte'

enhão todos os maiores motivos de.

crer, ue aReligião, que os propõe `,'

de nen um modo nos pode enganar.

Quantos e quaes não são com effeit'o'

estes motivos que induzem 0 homemp

Christão a crer verdadeira a sua Rel'

ligião , e em conse uencia a prestafi

o seu assenso a toäas as verdades ¡_

que ella ensina , ainda que al umas.

sejão totalmente incomprehenslveis 2'

As profecias precedentes â verifica-.

ção e realizadas exactamente com'os*

factos ; os multiplicados martyriosá;

força dos mais crueis tormentos; a'

propagação da Fê executada pelas'

pessoas mais debeis, e mais desconhe

cidas , e por meio deV maximas as

mais contrarias â natural inclinação'

dos homens , e em hum tempo em que

(1) Beègier , Deimgo reƒ'utado por u'

mesmo. Carta I. '

Page 230: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

*ea

*WW M. www a mts; qm; a

tyranma. er'ãrqfiz l “a p _QJAQlq gli):

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êmamiçadfls âmmiâfls. dQC ristiamis.

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Jç e_ q `(ida irgepqehepqivel de Jqq

hlrjsƒo; tuqp, .mpI qugqmp. attesta.l qq

.bristãq que.. lxãv ppfle Pensar 8.8 um

Bim; instante pt_n “ão Ser Chrislt_o¿

falam 1m a Qonviáêçao q'àe 119118 nr°¬

dmcm çqäes solihos fun amentqç dê;

Ygrdadç gi Sua. Religião, E têgtq

wi: oÇhx'IpÇiQ iq não gffëdígq › ¡1.011!

äçƒÍ? lrçfundar Os mystççigs que ag

glggigq prgpãe â_ çuq ogçnça., quan.1

mesma qrqçm naturçza ha,

kummlaltiëão de» ffiflómfiflofl ›. O» 6°.

mxfikëiqfi z Que São. Supfirioffis à razãa

1m gua por; lyajs qperfeiçpgãa qufi.

ag] ._ He esta ,lmqlqração que foi ad;V

.apiilzayelmepiç mêmejada ppl' Leibgitq

:lyrefutação de Tolando. ,_ o qqa1,'

symiíhantemente a Collins, como` aci‹_

ma tocámos , regeitava tambqmA a. Re,J

Vglaçã , só porque não. podia com`

Fgehen er evidentemente os seus mys¬

erios (l).

'(l) Leibnitz , vol. V. npag. 142 ¬ç, Seg.É

Page 231: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

231l

Para sustentar o seu lystema da lia

bem-dade de pensar ainda .mesmo em

materia de Religião, adduz Collins o

infinitonumero das seitas que , nas.eidasv das differentes interpretações

da Escritura, inundârão a Christan

dade; e do escandalozdas heresias tia

ra arrogante hum argumentoI para

impedir toda a qualidade de confiam

ça no que a. Igreja ensina. Para esse

effeito emprega huma grande parte

do seu' discurso em recordar com

affectação ao espirito i do Legisla.

do! as divisões que nos diversos tem.

pos se excitárão entre' los Ministros da.

Religião , .afim~defdesaol'editar omes..

mo Ministerio. Se alguns tem avan

çado opiniões inconsideradas, ou sus-

tentado sentimentos extravao'antes, Se

alguns Theologos no calor das dispu‹

tas se tem mutuamente censurado com»

amargura hum pouco demaziada; tu

do isto he contado com complacencia ,

e exagerado com má fé para o fazer

redundar em prejuizo do Cbristianis

mo; como se este devesse ser respon

savel pelas loucuras e excessos d'sv

:Aunolationunrulae Subitaneae ad Tolau

di Iibrum. `- - -'

Page 232: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

232)

quelles que o professão": 'e comedia,

essas o iniõ'es ,sobre que existe al-ó

guma discrepância -entre'os Theolo.'

os, fossem rhuma -pr-ova de que a

äeligião nada offerece firmc,'em que

o Christão possa fundadamente esta

belecer a sua crença. Este metho

do tão commum a todos os incré

dulos era tirado de Collins funda

do sobre esta maxima ,- que tudo o

que está sujeito .a.dis uta. deve ser

considerado .oomo'duvi oso e incerto.

Masnão he acaso evidente ,i que com

tal principio se poderião igualmente

arruinar-'as mais 'importantes verdaé:

des da mesma leiflnaturalf, pois que

algumas d”ellas, forão vivamente ata¬

oadas pelos vFilosofos tanto antigos

como modernos? No-nascimento mes

modo. Christianisnio selevantárão no

seu seio similhantesdivisões , das qnaes

se tem validoflfios lnoredu-los para im

pugnarem a Divindade. Porém o que

assegura plenamente os fieis sobre es

te assnmpo de escândalo he ,- que el

las forão previstas e predictas (l), e

que ao mesmo tempo, para nos firmar

(ill-NF, 9 510' Romi a l7~ I!

ml Tim. Vl, 3. i

Page 233: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

233 e .

na Fê; se havia annunciado queolm

ferno , que as suscitava , jámais

revalecoria contra Jesu Christo. A.

Eeligião de nenhum modo poderia fi;

car responsavel por estas divisões ,

ois de nenhuma sorte foi causa d'el

fas ; que provêm só das paixões ou

dos extravios daquelles que recusão

reportar-se â authoridade que Jesu

Christo estabeleceo na Igreja para

terminar definitivamente as contesta

ções suscitadas pelos espiritos iuquie¬

tos que sc revoltão contra esta divi

na authoridade , e que de tudo se

aproveitão para excitar turbulencias

e dissensões.

O discurso de Collins sobre a liber.

dade de pensar encerra infiuitos ou.

tros paradoxos , cujo exame serviria

cada ves mais de patentear a insub¬'

sistencia do systema , e a má fé do

author. Mas essa discussão excederia

muito os limites de hum mero artigo,

que já sahio assaz extenso. Por outra

parte o fim que me propurl no pre;

sente Capituhr não he a liberdade de

pensar , mas sim a liberdade da Im.

prensa. Entretanto assentei entreter

me até agora em demonstrar que os

Filosofos nos tem dado huma. noção

assaz enganosa da primeira ,› tendo

Page 234: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

23!

confundido com a racionavel liberda-i

de de filosofar, necessaria ao progres¬

so e perfeição das Scienoias , a soh

tura e a libertinagem do espirito que

não respeita verdade alguma ; a fim

de todos se convencerem de que hum

principio tão absurdo não podia ser

o fundamento da liberdade da Im.

prensa. O homem he senhor` de abn.

ser do mais hello dom ue Deos lhe

deo, isto he, da faculda e de discor.

rer; mas nem por isso tem o minimo

direito de communicar aos outros os

seus devaneios. A` razão manifesta-so

por si mesma , como acima disse, e

acontece que em quanto temos dentro

de nós mesmos os erros , não podem

estes produzir damno algum , o que

não succede quando se manifestão

com as palavras , e muito mais com

os escritos. '

Prevírão os Filosofos que se daria

esta facil resposta ao seu dito erroneo

principio de que a liberdade da Im.

prensa he huma consequencia neces.

saria da liberdade de pensar; e para

sustentarem hum tão absurdo parado.

xo, imaginárão outro ainda mais ex

travagante , como veremos no artigo

seguinte , e he , que nenhum livro

pode ser pernicioso.

Page 235: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

za:

An'rxeo II.

Emtmoqgqnte apiniċo do Author do

. Systema da _ atureza , degque ne.

¡thum liqrq possa ser pernicioso.

n Não, tomamos jâmaís , diz este

,, escritor , diffu dir idéas entre os

,, homens. São eTlas uteis? Frutifi

,, cão pouco a pouco._ São falsas?

,, Servirâõ de fazer apparecer a ver.

” dade em todo a. gua luz; rir-se-zhão

,, do , seu author , ou o desprezarâõ..

x, Nenhum livro pode ser perigoso,

,, SObre tudo se contem verdadesá

,, nem tão pouco elle o seria se con.

u tivesse principios evidentemente.

,, contrarios á experiencia e ao Vbom

,, sm (1).”Este raciocinio. de modo nenhum

he justo , responde hum escritor 1%ue

refuton muito bem o Systema da. › a

tureza. ,, Podem existir , d'iz elle , e

(J)y Syttemq de Ia Nmre, tqm, II, cep.V

3.

Page 236: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

23s

com effeito existem Obras assaz

nocivas na sociedade. Que! direis

acaso, que aquelles escritores, que

pintão o vicio como deleitavel , 'e

a virtude como huma simplicidade;

que empregão todos os adornos da

eloquencia , e da poesia em meter

a ridículo , e destruir os sagrados

principios do bom procedimento

e da probidade dos homens , direis,

torno a dizer, 'que estes escritores

não fazem mal algum , que jámais

envenenão a mocidade, que jámais

corrompem coração algum mal pre..

catado contra o vicio, que não in

troduzem 'âmais a discordia , e a

infelicidade nos casamentos , nas

familias , em todas as classes da.

sociedade? (1),,

:Nenhuma obra pode jamais ser

perigosa , diz o fingido Mirabeau. i:

Dizei pois antes, responde Mr. Hol.

land, que o erro e a mentira nun

ca podem prejudicar; dizei que os

seus apostolos são personagens in

nocentes, dizei que hum corrupto:

nunca he perigoso , pois que hum

homem que estabelece e .que espa.

F*

pa

(l) Holland, Rqƒ'ul. do Syst. da Nata,

g. 286.

Page 237: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

237

lha principios falsos não he mais

que hum corru'ptor (l). ,, A'

“ Quereis , prosegue este escritor ,

,, que nos contentemos com rir de hum

,, homem que .espalha mãos princi

pios; mas entretanto que vós rirdes

da. sua loucura, elle deitarâ a per

der os vossos filhos , ersuadirâ â.

vossa consorte que afi elidade con

jugal he huma ridicula simplicida

de; o vosso mordomo aprenderá

,',, das suasl ições a roubar-vos sem re

,, morso algum (2). ,, ,

He eouza verdadeiramente sin u

lar, que o author do Systema da a

tureza tenha sustentado ao mesmo

tempo , que hum bom livro he util,

e quehumllivro máo nunca possa

produzir mal , como se o homem nãoosse accessivel senão á verdade. Con-l

cedo que hum livro mâo possa con

t'ribuír para fazer apparecer a ver

dade em maior esplendor , em razão

das refutapô'es', a que possa dar ocea

sião. Had isto exemplos, e ainda não

muito distantes. Os Deistas que im

pugnârão a Revelação ,l e'os Atheos'. ` Jr' rt

1

UV'

u

uuquov ¡Duque-a

' \

. ll)v Íbidem, pag. 286. , . .zi

Ibidcm, pag. 287, › f. A '“

u hr

-'›

\

Page 238: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

éâë

'qüë ñegârãd á existencia de Deöš,tem sido excêllenInëu'xentel refütados

pôry mil p'enñas doutas, de modo l'ue

s'g' 'pç'de'dizer que _os fqllaz'es sy te;

Íñas d”estas duas differentes classes; de

incredlllós tem sérvidd de pôr' a Rd;

Iigiãô em 'maíör' luz. Mag pó; isto

íílãõdge vem' a _tirar o pr'éjufzó e ii fu:

ílësfairifluencíà 869' rn'áos Íivi'oíi, Es:

`iaš refutaçöes'”sô ëáhbín de óñdi'ifafíö

úàé' mãos' d'aš peésó'às ' que' e'âamifiãuàs' c'óuzas' dê bLó-zéz*a fé, e que fi'efihúm'

interesse: tem de' 'se deixarem Êéršijaí

dir do' e`í'_'1'o. Ajtmte-šé , ¡wir!l féflez

été, m-lücó _b'ém à esfq pm âózâfmâíV Mn;

Hõnânfl ', qúe- 'à verdade éwútigâ';

é qúe põr' 'corisegui'nte exéítâ muifô'

menos curioâiágde db q'uç fâzjqerbó,

que' s'e' a `re'sél'ltl'z có'm' todoš' 018 âttfm

ctivós' a 1íoviäaãè. ,, Se'r'iíá'* ` ' por

,r eiempfd , discótrer. müitä ¡Ima! ,I

,, Ponãei'á'éfle ,_ diizér que óš' cšèxƒ'itps'

£ iéénciosbs' são nteis`,' Í`*öró[pë po.

115m da'r' dôcfàsiãq de' a 'u'ñ'á bons)

,,`1 tfatadbš de' rhdr'al. As' pešsbfãís 'lq'üè'

,,zmai$' áivigalñêntë bebem ó Wenenb*

,; q'u'e' sè"lli'es' ã'preâëñt'a' ," sä'‹'›'j'u'sta.1

,f maquellaswe» de_mo.d.0_, neâ

,, nhum lem os bons livros. Isfio sed,, ria omesmo, “Vsê'gi'ae' .'cójño

v se outro , valid “ Mui aštüfákhäi'

Page 239: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

239

a latão a grandes brados entre 'o po.

vo apregoar e vender perniciosos

elixires, dissesse : deixei-o, que de

pois» virá algum douto Medico , que

em tendo examinado o veneno que

vende ocharlatão, provarâ solida.

mente que se não deve fazer dlelle

uso algum (l). ,,

O rende equívoco , ou para me.

lhor šizer, amâ fê do author do Sys

tema da Natureza , e de todos os ou

tros que tem discorrido do mesmo

modo . consiste em quererem que as

opiniões, que yrespeitão â Religião,

aos costumes, e â ordem publica, se*

'äo consideradas como os systemas de

_ ysica` e os roblemas de Geometria.

Estas duas u timas especies de escri

tos jámais perturbão. o repouso. da

sociedade, bem que muitas vezes ex~

citem mui vivas disputas entre os dou

tos'. Mas não succede assim com as

opiniões que acima apontdi; tomenws

porz exemplo dellas o Atheismo~,z¡o

qual he justamente huma das.` que,

mais que nenhuma outra, os Filosofos

tinhão a eito propagam, elemfavor

da qual abricârão a sua theoria. da

3:33:333

(1) Holland, ubi supra, pag. 289.

Page 240: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

240

liberdade indefinita da Impremia.I A

maior parte do genero humano creo

sempre , que, em se tirando aDivina v

dade, se vinhão atirar ao mesmo tem

po todos os principaes motivos da

virtude , e alargar-se a redea âs pai.

Xões. Ora o Atheo do matistatraba

lha por quebrar o me hor- vinculo da.

sociedade, aquelle que os homens em

todos os tempos tem considerado eo:

m-'o o mais forte freio daspaixões.

Leibnitz era de sentimento inteiras

mente op osto ao do author do Sys-f

tema da atureza sobre este objecto

dos mãos livros. Estava tão persuadiú

do de que pode haver e realmente

ha obras perniciosas , que vendo no'

seu tempo os livres pensadores d`Inâ

glaterra espalharam livros nos quaes

era vivamente atacada a Religião,

declarou abertamente , que virião a

produzir por fim huma Afunesta revo

` lução geral f no mundo. Como este

vaticinio desgraçadamente se verifi

cou, e por outra parte he pouco sas

bido, julguei não sería inutil fazello

conhecer ao leitor.

Page 241: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

241

AnTrGo III;

Predicção de Leibm'tz sobre huma res

volução, que as' doutrinas irreligios

sas, que nv seu tempo começavão a

diƒƒundiràse, havião de produzir get

ralmente em toda a Europa. ›

Apredicção de quefalla'mo's acham

se nor'E'nsaio que este grande homem

compoz~sobre o entendimento humano ,

para .servir de correctivo ao de Locke

sobre ‹o mesmo assumpto, que elle

justamente collocava entre os livros

perigosos. ›

Começa Leibnitz d'este modoz¬

.Ha toda a razão de tomar precau

ções contra as más doutrinas, que

temiinfluencia nos costumes , e na

pratica da piedade. Se a equidade

quer que se poupem, as pessoas, a

Religião prescreve se represente, em

toda a parte onde se. poder, o mão

effeito dos seus dogmas , quando

são -nocivos , quaes são com effeito

aquelles que são contra a provi

dencia- de hum DQeos-perfeitamente

.vv 'uv

u w

-vou-Mw”.

-quasi-nu

Page 242: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

242

sabio , bom , e justo, não menos

,, que contra a immortalidade da 'alô`

,, ma , sem fallar de outras muitas `

, opiniões peri osas relativamente â.3, moral, e âor em politica.” Dlaqui

passa'a responder ä' 'objecção' , tantas

vezes repetida até os nossos dias,

que a favor do Atheísmo se deduz da.

vida t'ranquil'la e re ular de Spino

sa , de Hobbes , e e alguns outros

Atheos mais decididos; dizendo mui

to bem , que as razões porque'estes

cabeças de seita obrárão 'contra os

seus principios cessão inteiramente

'em se fallando dos' seus sequazes. Edepois 'passal â' predio ão'v de que se

'trata , que he concebida nestes ter

mos ': ,, As Vditas más doutrinas insi-'

,, nuendo-se pouco apoucovno espiri

,, to dos homens do mundo Y, que re

,, .geitão os outros , .assim como nos

,, livros da moda, dispõe todas as

,, couzas vpara a revoluçãogeral ,9, deV que está ameaçada a Europa. ,,

Quem não ve nestas ultimas pala

v-ras claramente designada a terrivel

revolução que succedeo diante 'de

nossos olhos depois doI anno de 1789?

Leihnitz disse,` que a revolução seríageral.; Se eum'v esta expressão elle

__quiz significar , o que he mui pra.

u` w

u

Page 243: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

243

Varal , que a 'revolução'nada havia

de poupar, que tudo havia de arruiê

nar, fácil he reconhecer se esta pará

te do vaticinio foi confirmada pelo

acontecimento. Mas se elle quiz dar .

a'en'ten er que a revolução šería ge.

ral no sentido de que se estender-ia

com effeito atodos os Estados da Eu

ropa , devemos cpnvir , que isto se

não verificou; porém os mesmos mo;

tivos que obrârão em França pene

trârão tambem 'nos outros Estados, e

nelles obrão com mais ou menos for

ça. Este mesmo meu opus'c'ulo he d'is;

to huma prova, visto que por nenhum

outro motivo o emprehendi, senão`

para. combater as sobreditas Idéas'

ibe'raes, ao presente tão diffundidas

pela Euro ai e que, como tenho'v

mostrado esde o principio à não são'

outra couza mais que as mesmas 'mas'

limas erroneas que operárão em' Frans'

ça a revolução. ` 4 z

^ Quando Leibnitz ha cem anno's fiz

esta predícção , aindaa irreli iãojesfi

tava mascarada , e só cfontava'luím'pequeno numero de sequazes.Í Estava

além disso encerrada em huma re

gião que o mar separava deltotlo o;

nosso continente ; mas as couzas mu;

darãoJ pouco depãis da sua morte.”

` 2

Page 244: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

244

Na viagem que , justamente por yaquel..

le tempo, fez Voltaire a IInglaterra.,

concebeo, como já dissemos, o ímpio

/projecto de dar a conhecer e intro

duzir na sua nação as o iuiõ'es atre~

vidas de Tolaudo , de indall , de

Collins , e de todos os outros livres

pensadores daquella Ilha; e no seu

regresso a França , se dispoz logo a.

'pollo em execução, sem reflectír ,

que os mencionados escritores erão

abominados entre os seus'compatrio

tas em geral, alguns dos quaes até

os tinhão victoriosameute refutado.

A elegância, e ligeireza do seu esty.

lo fizerã'o que a nação Franceza che

gasse ávidamente â boca a envenena

da taça ; iufinitos outros escritores

da mesma nação seguirão as pizadas

A de Voltaire ; e como a língua Fran

ceza havia já meio seculo se achava

de posse de ser conhecida por todas

as pessoas cultas das outras na ões,

assim passou a conta ião a iu ectar

bem depressa quasi to a a Euro a.

Ora que diria o grande Leigmitz

se tivesse vivido até os infelices tem

pos em que o espirito de irreligião

tanto se tinha tornado perversoe di

latado P Se elle tanto se queixou da

simples duvida de Locke sobre apos

Page 245: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

245

sibilidade da materia pensante, quan.to maiorA não fôra a sua magoa , ven

do Voltaire , e a immensa turba dos

discípulos converter esta duvida em

huma asserção formal .P Que diria el

le do atrevimeuto do author do Sys

tema da Natureza, o qual, não já em

hum livro de Geometria , e portanto

inaccessivel á multidão , como tinha

feito Spinqsa , massim na sua nativa

linguagem, com estylo chão, intelli

ivel a todos , sustenta que não ha'

eos? Certamente crè'ra , que estava

chegado o tempo de se verificar asua

predicção ; como não deixârão 'de

assim o pensarem e dizerem tantoshomens grandes, os quaes , Vaddictos'

como elle sinceramente â Religião'e"

ao bem da sociedade, viverão no tem-j'

po em que esta contag'ião'irreligiosa'tanto se tinha dilatado.V v ' *i '. ' "

Í u .l ; ..

('I .`_“v' v :\l‹t' |p v .|".', l`

. v -\ v' I

'\ i' . f ‹ I-u.'| nl .i . r 11.1.' '10) ,_

Page 246: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

. . .' .~-'| (-f".f .. ' U '

.-:,-':'I."" `›

*Is , - v ' í

,A «AR'rrooll-Vf.v

Í De algumas 'mediações litterarias

mais recentes sobre a Re'voluà

' pão ,lf'ranoezarV¡Hu

Padre Neuville, hum dosmaiores

Oradoresilque a Companhia de Jesus

teve em França,,de lois de haver em

hum panegyrico de šanto Agostinho,

que recitou perto,¡ de .trinta annos an¬

tes |da Revolução feito hum ` quadro

espantoso, mas verdadeiro., dos erros

domoderuo Filosofismo , 'que via tão

dilatado na. sua Nação ,^ _fez aseguinte

exclamação z. 'í Oh santa Religião de

,,› Jesu Ohristo'l Oh throno dos nossos

,, Reis i oh França! oh Patria! oh

,, Pudor l oh Decencia l So eu não

,, devesse gemer como Christão , não

~,, cessaria jâmais como cidadão de

,, chorar sobre os ultrages , que de

,, continuo aqui se fazem , e sobre a

,, tristosorte , que se prepara. Com

,, tinñão ainda aestender-se, e a con-_

,, solidar-se estes horríveis _systcmas ,

:z Seu veneno devorado; não tardará

\

Page 247: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

247

eg:eeeesreezezeeeaee-:se:aem consumir os principios , o apoio,`

oesteio. necessario e essencial do Es..

tado; Amor do Soberano e da Pa

tria , laços de familia e da socie.

dade., desejo da estima e da repu‹

tação publica , soldados intrepi.

dos , Magistrados desinteressados,

amigos generosos, esposas fieis, fi

lhos respeitosos, ricos bemfeitores,

~ não espereis tornallos a ver em hum

ovo , entre o qual ~o prazer e o

Vinteresse forem a unica deidade, a.

unica lei, a unica virtude, o uni

co bem. Então no mais.florente Im¬

yperio cumpre que tudozse derro

que, se abysme , se anniquile. Pa

ra o destruir não será precizo que

Deos fulmine os seus raios. Poderá

' o Ceo deixarsá Terra o cuidado de

o vingar. Arrastrado da vertigem

e do delírio da Nação , cahirâ o

Reino, o precipitar-se-ha n”hum abys

mo de anarquia , de` confusão, de

l'ethargo , de inaeção., Ee 'do rui.na' (l) Í” V ' v _

Se esta passagem do P. Neuvillev,

mais qnehum simples vaticinio , `¶aa¬

rece huma descripção da Revolução

l(l} Õeuvres du Neuuillcitoin, III.:

Page 248: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

248

de' França' ,Í feita de pois do aconte.

cimento, igualmente clara , exacta,

e talvez ainda mais miuda nos seus

effeitos , he.indubitavelmenteV a pre..

dicção que o P. Beauregard , outro

celebre Jesuita , fez treze annos antes

da Revolução , pregando na Cathe¬

dral de París. Patenteaudo os pro.

jectos do Filosofismo , fez dlimprovi.

so , no tom dos Profetas , retumbar

as abobadas do templo com estas pa.

lavras, tão vergonhosamente cumpri

das pela Revolução : ,, Sim , contra o

,, Rei; contra o Rei, e contra a Re

,, ligião conspirãoI os Filosofos. O

,-, machado e o martello estão em suas

,, mãos , e não esperão mais que o

,, momento favoravel de derrubarem

,, o Throno e o Altar. Sim , os vos¬

,, sos templos, Senhor, serão despo.

,, jados, e destruídos, as vossas ess

,, tas abolidas` o vosso culto proscri..

,, to: mas que escuto, grande Deos,

,, que vejo! .Aos oanticos inspirados,

,, ue retumbavão nestas sagradas

,, abóbadas'em vosso louvor , succe

,‹, dem cantigas lúbrioas e profanas!

,, E tu , infame deidade do Paganis.

,, mo, impudica Venus, vens atrevi.

',, damente occupar neste sitio o lu»

,, gar do Dcos _vivo, sentarste no

Page 249: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

249'

;, throno-do Santo dos Santos , e re

,, ceber o criminoso incenso dos teus

,, novos adoradores (l). ,,

Poderia referir outras muitas pro

fecias'similhantes , pois que tanto os

Bispos, como ainda mesmo alguns dos

Magistrados nas censuras que fazião'

das Obras dos Filosofos, jâmais dei.

xavão de representar o deploravel

exito a que a contagião das suas ma

ximas havia de 'infallivelmente con

duzir a Nação. Todos sabem que de

pois do meado do seculo passado se

cuidou em Parísna construcção do

famoso templo de Santa Genoveva,

mais conhecido ainda pelo nome de

Pantheon. Ora , hum Poeta engenho.80, Vendo llevantar este grandioso edi

ficio em hum tempo em que a deca

denciavda Reli ião se tornava cada

dia mais visivš, dirigio o seguinte

(l) Esta passagem verdadeiramente pro

fetica, que por muitos dias foi o assumpto

de todas as- conversações da Capital, acha

se referida em muitas obras, e ultimamen

te tambem 'na nova e volumosa Biografia

Universal, qu'e actualmente imprime em

París o lmpressor- Michand. Veja-seo tom.

III, pag. 652. e

Page 250: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

250?

pêzame â Piedade , ãue 'ellechámg

tardia , por ter differi o tanto: tempo.

a execução de tão belle obra.

Templum augustum, ingens, regina auufi

gi! in urbe,

Urbe et Patrono Virgine digna domus.

Tarda m'mis, Pietas, vanos moliris honores;

.Non sunt haec caeptis tempora digna luis.

Ante Deo in summa, quam templum erexe

ris urbe,

Impietas templis, tollet, et urbe Deum.

Templo augusto, e magestoso

Na Capital se levanta,

D'ella edificio, e da Santa. v

Padroeira, digno e`homfoso. g

Rendes tarde em demazia

Balda'dos cultos, Piedade;

D'essaeinpreza utilidade `

“Nãofirar'ás hóje em dia.Y Antes de o templo acabares

N'alta Cidade,l ha de vir

A lmpiedade a Deosy banir

Da Cidade e dos Altares. -.~

' Não estaxido este tempo ainda aca.

Vbado em 1790 , época. do pleno triun.

fO da Impiedade em França, sobeja.

rnen'te se verificárão os versos profe

ticos que acabamos vde referir : mas

foi sobre tudo a. 11 de Jul-ho do se.

guinte anno , quando o esqueleto de

M

Page 251: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

25!

šoltairo foi alli collocado como huma

iviqdade, que 'este vaticinio recebeo

l_itteral, exacto , e decisivo cumpri.

mento. . _ ` '

_.I

ARrIGo V.

De humafalsa razão de utilidade, que

tem contribuído muito. ara acredi.

tar o systema da liber ade da Im

prensa. r

Aliberdade. Imprensa , diz o

Marquez _Gorani já, acima citado, he

absolutamente necessaria para a pros,

peridade de differentesvl ramos lucrati`

vos do commercio , quaes são a Arte

typografica , a do Papel , o negocio

dos livros (l). A_ mesma couza tinha

entretanto. sido re etida .por todos. os

outrosseqtarios dl) filqsofismo. Mas

similhante razão he tãobaixa/e des

prezível , que sería pura perda de

(l) Goreni, no citado _Cap. 60 do tom. l.,

das Investigações sobre a Sciencia da Le‹

gisleção. . ,- , . .

Page 252: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

ési

tempo entreternio¬noš a refiitalla'. 'Quepezo pode com Ieffeito ter aos olhos

de hum homem 'cordato 'esta utilida

de, á vista do damno que da sobre'di'.

ta desenfreada liberdade pode vir â

Religião , aos costumes, em summa.

ao verdadeiro bem do Estado? E com

tudo a consideração desta mesquinha

utilidade he o que , talvez mais que

nenhum outro motivo , ha contribuído

para fazer que alguns Governos- ado

ptassem tão erroneo systema.

Hum dia que diante do Delfim , fi

lho de Luiz XV , epai do Rei actual

se fallava dos livros contrarios â Re

ligião , e que se procurava justificar

a sua circulação , como couza que fa.

vorecia hum interessante ramo de

commerci'o: “Ai d'aquelle reino, res.

,, pondeo elle , que pretendesse enri

,,' uecer-se com similhante qualida

,f, 'de de commercio , pois sacrificaria

,', riquezas šverdadeiras e duraveis a

,, riquezas ficticias e efímeras, que

,, destruirião a virtude dos cida

,, 'dãos. ,, ' '

Este Principe, que agrandes talentos naturaes iuni'a os mais extensos co.

nhccimentos , .hum coração recto, eo.

ragem , grande firmeza, e cuja pre`

matura morte foi huma verdadeira

Page 253: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

253

_victoria para o Filosofismo , estava

intimamente persuadido, que a desen

freada licen a. .de fallar e de escreverera averdadseira fonte de todas as de‹

sordens roprias do seculo decimo oi

tavo. ,, oje em dia , dizia elle, qua

,, si ,se não escreve que para tornar

,,, desprezível zaReli ião, e odiosa a

Monarquia. Quasise não vê sahir

â luz hum livro ,V em que a 'Reli

gião não seja tratada de supersti

ão e de quimera, e em que'os

eis não sejão representados como

outros tantos tyrannos, e a sulalau

-,, thoridade como hum .insupportavel

.,, deSPOtismo. ,, (1) 1 r

-O acontecimento da Revolução fez

lconhecer cada vez mais quanto era

racionavel a aversão ue tinha o Del

fim â liberdade da mprensa, pois

lie incontestavel , como tantas vezes

se ha dito , que este mesmo funesto

“vamu”

muuuuv

(I) Sobre esta grande opposição do Del

`fim ás maxima: erroneos dos modernos Fi

`iosoi'os , além de todas as Biografias de

París, podera' tambem ver-se a sua Vida

escrita pelo Abbade Proyart , assim como

as Memorias para a Historia d'este Prin

cipe, recolhidas e publicadas pelo célebre

P. Griffet, Jesuita, em 2 vol. de sf.

Page 254: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

254\

acontecimento he obra dos livros

pestilenciaes que por mais de meio

seculo antes havião cooperado para

depravar em todas as couzas o antigo

modo de pensar d'aquella nação. E

huma tal circunstancía de facto deve

ajuntar grande força ás razõesaté

agora ex endidas contra os parado

xos dos ilosofos dirigidos a favoreó

cer a liberdade illimitada da impren.

ea. Creio d'este modo poder com boa

razão concluir que , bem longe de se

haver de abandonar o antigo systema

da censura dos livros , antes se deve

ter'summo cuidado neste objecto. Al

gumas observações que exporei no

artigo seguinte manifestarão mais

claramente esta necessidade.

Page 255: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

255

. .

›!«_ ' 'An'rroío VI.

Fraudes ue se podem usar , e que

- 'com ejg'bito se temV raticado para

oladir os saudaveis e feitos da consu..

ra dos livros.

Sealleligião fôra atacada só di

rectamente, sería mui facil a incum

bencia da revisão dos livros.` Mas es

te não he o unico genero' de assa'lto

que ella tem recebido , sobre' 'tudo

nos nossos modernos tempos. A cons..

piração 'dos Filosofos para atotal ex

tincção `desta. luz divina ha sido tão

sagaz 'e engenhosa , `lquenão se con

tentârão com atacar a Religião com

obras abertamente destinadas a que-1

brarfesta móla a mais forte dc todos'

os Estados. Revestida a Irreligião de

toda la sorte de 'figuras , amalgamou'»

secotn `asmaterias, que por sua na‹

tureza' parecião ser-lhe mais hetero-`

geneasf- Historia , Geo rafia , Fysi

ea ,-_Astro_nomia‹, em= uma palavra '

'todas as~Sciencias farão mais ou mea ~

nosfinfeotãdas d1ella; de modo que pa'

Page 256: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

255

reeia que ninguem podia applicar-se

aos estudos scientifims ,. nem menos'

aos da amena litteratura, sem'se achar

a cada passo reprezado'4 por algum

insulto feito ás mais venerandas ver

dades do Christianismo. ¬.z,à-.¡z z

- lVlasV sobre tudo da Historia Nato;

:ral `he que sefliiez'o` maior abuso- neste

malvado proposito de .affastãr da Re.

ligião os ânimos f;='~e como este artifi

cio *teve infelizmente grande exite;

não-"sè1'§^‹inutil fallarmos d°elle hum

pouco no presente- artigno, dirigidoa

mostrar `, não fisó y'aíabsolute; necessidaz

de da censura"dos-li-vlros , Vmastanu

bem quanto ella :deva ser. eintelligente

e perspicaz. é* n. .ê- za. `

Virão-fos Filosoibs que apelar-.dos

seus grandes. esforços fem ‹ diffuudirem

a inoredulidade; 'uãošcontarião entreos seus proselytosr'senão'I homens sui

4peri'ifáaes e viciosos Vgazeique: as pes-õ

'soas instruídasfe que por-.seu'roguler

procedimento Ànão tinhãoà interesse` em

sacudir áo jugo da Religião; jamais se

entregarião aos seus" p'armlogismos

tantas ' vezes pulverizados pelosvautiäVos 'è pelos modernos Apelogistes. f A

'm pois de ganharem osuffragie d'ess

te respeitavel enšero ¡ie-leitores.. mó'

correrão 'depois ~¿do .' meado; .doÍ .século

›') 1.- Hr J.`

Page 257: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

257

passado â Historia Natural , que vião

ser então 'a Sciencia da moda: e eisa`

aqui como elles procedêrão em tão

criminoso projecto. ~

A Religião Christã' suppõ'e neces

sariamente a verdade da revelação

Moysaica. Ora Bouffon, Maillet, Le

Cat, eoutros similhantes Naturalistas

modernos , pretender-ão fazer depor

aNatureza contra a Historia de Moy

sés , assegurando aos homens , que tu

do na Natureza contradizia o livro do

Genesis. Ecomo este genero de argu

mento parecia directo, enão admittia.

réplica, fez humainfinidade de incré

dulos ainda mesmo entre as pessoas

instruidas que se não tinhão deixa

do illudir pelas outras razões dos es

critores incrêduios.

Verdade he que hum tal argumen

to, por forte que fosse â primeira'vis

ta , não conseguio demover o homeml

bem arrei ado na Fê. A Religião

Christã, izia elle, está demonstrada

verdadeira por huma infinidade de

provas directas e aptas a produzirem

a maior convicção em qualquer es

pirito racionavel. Por tanto estou seu

guro , concluia elle , que tudo isso

ge parece oppor-se-lhe não he ver

deiro, pois que a Eiáerdade não po

Page 258: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

258

de ser contraria á..verdade.-Y Masestas

essoas bem-arreigadasna Fé; infeâ

lizmente erão-poucas. A in'differença

em materia de Religião., como já.

-mostrámos , esta-va já nimiamente es

palhada por toda aparte; daqui veio

que .este argumento tirado dos pre.

'tendidos novos descobrimentos relati

'vos á Historia Natural , .contribuio

'muitissimo para introduzir a increó

dulidade , até nas pessoas doutas , mas

que. não tinhão profundo conhecimem

to damesma sciencia. . .

Sobretudo veio isso a dar grande

pezo, e hum apoio mui forte a hum-a

`objecção que contra a verdade da His

toria Moysaica.,í e porconseginte con

tra a divindade do Christianismo, se

havia muitoantes .tirado da preten

dida anti uidade da Chronolo ia dos

Chinas. ã'odos sabem quanto oltai

're , e os outrosiescritores da sua esto

fa, ñzerão valer esta objecção._ Outros

homens igualmente grandes a .tinhão

destruído, demonstrando até a maior

evidencia , `que todas as Chronolo

gias, ue'n'ãotem por.base o Gene

'sis são abulosas (l): ecom effeito ha.

~ (l) Teria demeziadamente allongado o

Page 259: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

259

¡víastem'p'o que .já- uingu'em o'uzav'a

` presentalla; mas depois que as obras

¡irèsente' artigo se quizesse referir sequer

os nomes dos authores e das obras em que

se acha solidamente refutáda esta preten

dida grande antiguidade das Chronoiogias

Chinezas. assim como as dos Caideos e dos

Egypcios, em que-tanto insistírio os Filo

Sofos modernos com o perverso intuito de

'deprimirem a_Histoi-ia do Genesis. Cingir

¡ne-hei por tanto a referir o` ,que sobre isto'

brevemente, mas com summa profundidade

'e erudição , disse o celebre Filosofo e Ma

thematico Itaiano P. Frisi.-“Solent etiam

,, opponi portentosa'e illae Chaldeorum, Egyf'

,, ptiacum, Sinieusium chronoiogiae. Fama

,, est Chaldeo's Alexandri magni tempori.

,, bus, observatio'nes astronomicas jactita'sse

,, 473000;annis ante institutas : A quamvis

,, Porphyriuls et Berosus, quiAntiochi secu

,, io vixerunt, nuilas 1093 vetustiores me:

moraverint. Egyptii tres dinastaru'm series,,v recensebant, Deorum, Heroum, Regum,

quibns imperium»36525 traductum fuis‹v

,,. se asserebant ad VNectflnebum usque, qui

,, ab Ocho Persarum rege. victus, ac put

,~, sua est' ante Alexandri magui expeditio-l

V.,, nes. Sinenses denique'imperium fami

,, .lim . Hia , ,demandatuçn fuisse dicunt

, piusquam 2000 annis ante Christum.

,, Septem alios .reges, qui simul plusqnam

,, seculorom septem intervallo imperaverint,

à, priores statuunt: allifsque insuper ¡mma!

2 .

u o

u. o

y

Page 260: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

:so

dos modernos Naturalistas musik-ario

darem ao Mundo huma antiguidade

Í,

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9!

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'3)

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vu

nis antiquitutis. At si accurate exploras

traditionum hujusmodi originem, ai quz.

ras quæ eorumdem seculorum aut pros

xime posteriorum saltem monumenta, et

scriptores sint tantae 'nntiquitatis , testes

ne unus quidem in medio proferri pote

rit. Sune Confueius anno ante christum

551 natus , cum fiorentissimo imperii

tempere, et ante combustionem libro

fumi veterum scripsisset , missis veluti

nimium dnbiis , quae sub dynastis Hia

et Change uccidernnt,` a familiae Tchan.

imperio exorsus est; anno scilicet' nee

ante christum. Antiquitatum earumdem

fabnlas, contradictiones, mendacia, natis

jam explicarunt Marshamus in Canone,

Witsius in Egiptíacis, et Duhalt in Si

nae descriptione; ut mirum sit Abba

tem de Prades Lutetiae Parisiorum pu

blice recoxisse hanc crambem , et cyclo

Sinensi quodam , ut Belgicarum episto

larum author ostendit , male intellecto

imperii totius epocham longe ante dilu

vinm constituisse. ,, 'Pauli Frisii Medi

iationes quædam methaphisicm, tom. II.

Disserl. variar. pag. 206, 107. -- Luca!

l 762.

Ea'

Este Abbade de Prades de quemfalla

grande homem que acabo de citar, acha

se intimamente ligado com D'Qlembert

Page 261: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

26.1

muito maior que aquella que Moysës

indicou,-tornou a ter grande voga..

. Porém odivino Salvador não aban- ~

donou tão ponho a` sua Igreja. nesta

collisão. A Providencia Divina , que

logo no nascimento do Christianismo

fez qzue este fosse abraçado: por_di

versos Sabios do Paganismo..,'‹ para

-que o Vpodessem defender contra as

armas que a Filosofia: então empunhêh`

va' ara o derrubar; a Providencia

Divina. ,- que dispoz que nascessena

.Africa Agostinho `rio/:mesmo dia em

que nas costas dlAlbião Eveio Pelagio

ao mundo; que -aoslinnovadores do

decimo - sexto Seculo oppoz Ignacioae

a Sociedade porrelle instituida;~e ue -

jârnais ha permittido que se- intro u..zisse erro algum sem qne'sse suscitas'

sem _novos Apologistas ; esta'mesma

e Diderot, eersz hum dos seus follabora

dores na compilação da Encyclopedia. Por

instigaçäo . destes .dois .grandes Corifeos do

partido filosofico , sustentou o Abbade de

Frades 'no anne 'de 1751frm .Sorbona-hu

mas Conclusões publicas, onde entreoutros

muitos erros havia huma *these tendente

visivelmente a propagar o materialismo, a

qual excitou contra eller a indignação de

todos os bonsfporrcujo mot'mo foi obriga

V,zdo a ,saliir` de Reino.. . v . rar.V '

Page 262: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

262?

Divida' Previdência emtou'si'mäh'ahé

tcs- Varões possantes'; que igualmenterepeilissem'te'st'elnovo' enero de`ata¬

que; de ƒ'q'ub tenho falado. * "o '

=›'()omo~B_uifouf'e1_-a5 o- mais'forte, e o

mais 'estimado die todos os' Piaui-alis-l

tas;L que tentáräq contradizer. a `ver,

dado da' Historia Moysaica , por ter

para' esse effieito* nas sua: Epocas do

Natureza , aibem dizer arcada pagi,

na,'procurado provar-,'que o Mundo'

he' muito maisantigo do quese mos;tra da 'mesma' Historia ; Àdo mesmo mo¬

do não muito/d ois Io douto err-Je»l`

suita Flamengo Abba'de 'Feller pu,

blieou huma refiitação das'Epoeas -da

Natureza , que' geralmente se` reco

nhece' ser (mui solida ; o proprio

Buffon 'a considerou tão grave e vi-`

ptor'iõsa, que não deixou de empre¬

gar~todo o seu crédito para impedia'

_que ¡se' espalhasse fpelp: Reino (l). 1.;

› 'u' sz' 1:1).v ' .JLH $51.12

,_ i

- I -~ 4~ .u'r;'.'- .1

~-'(l) Oswmthores' 'Jansenism'das bem co

nhecidas'Noticinr Liueruries de Pai-ir, e

pezav» de tão' interessadas em desacreditàrem

' os .Jesuítas ,'Ye em 'particular yeste doutissi

mo-Manltenedor d'a Religião e+da anthoriz

dudeda SanmlSéâ, wirãwse'com-tudo obri

gfldofl tambem. e fuer-juro? Vii m bella

Page 263: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

263

Similhantes outros homens douto:

tra'tárão :Jcontemporaneamen-te esse

mesmo louvavel assumpto , entre 'os

quaes merecem sobre tudo ser mencim

nadosfi' os celebres'f Naturalistas Sans

sure ie Dolomieu. Sem de nenhum mo

do se deixarem fascinar da'grande fa

mwaque geralmente havião subido os

degan'tes romances do Plinio moderno,`

l'econhecèrãoV ederãofal-ém d'isso pro;

vás assazl convincentes dir-pouca. anti¬‹ '

guidade dosnossos continentes.. Mas

nenhum deo - tão grande extensão a;

similha'nte empreza ,^ nema executou

com -tãoffel-iz exito , como. ocelebre

Professor' Ide Gottiliga` Mnw-De'iàuc'.)

E tanto mais julgouv elle devia-*tomar

v ›t `1)'4.". ,e-li.

vii

refuta'ção das fEpocas daírNqmtçzq. Esta

homenagem não suspeita seiecha Vna folh'd

de 5 =de Março de 1784; 'uaqnal se'lê d

seguinte i. “ Depuisy une. .vimgtaioe diannéesi

que l'abbé'Feiiew habite iarpaye-deLiègeg¡u_.piumeféoonde a produit quantité d'zé-V

erits dont queiquns sont estimés. Par, exem

pleson examen impartiei des.Ep ues de.

M. de Buffon , passe pour une re utati'org

fort soiide; et l'euteur même de i'Hisltoire

Natureile ,' i'a trouvée' sÍ-accabiante, 'q\fil_

a employé effica'cementlson credit-pour'en'

empêçher le débit'dans' lemoyaumei-,z fl '

Page 264: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

264

este encargo; , quanto, ~ sendo compa

triota e' amigo deY Rousseau , sabia,

gua-esta retendida grande ontignà~

.ode do undo era hum dos princi.

paes .ar mentos , e talvez o. unico',

que tin a impedido que elle , de Dois.

ta, se fizesse Christão. Rousseau tinha

Iesistido a todos os p.a.ralogismos-.dos

incredulos; todos lhe paeecião mui

fracos ,; mas'os: argumentos de Buffon

sobre a theoriazda terra, cuja illusão

elle nãojconheeia ponnão serem anã,

` logoszeosnseus estudos, o seduzírão e

infelizmente o oonservârão no Deismo.

Vendo por tanto Mr.. De Luc, que

o systemaparadoxo, ou, para melhor

dizer,z o romance destesnovos. Natura

listas, tinha vindo a. ser o principal

argumento dos~ .incredulos contra a.

Revelação, não poupou fadiga a. fim

de demonstrar ,a sua. ineubsistencia.

. Desceo :ao fundo `do mar ,ge ás en.

tranhas) dadfteflal .parar-arrancar aos.

ditos 'escritores e voltar contra ele

les ‹ mesmos' Aaquellas › armas que rev

tendião ter alli achado contra a- is

toria-de Moy'sés. A obra com que'

elle tão felizmente .desempenhou hum

tal a'ssumpto tem o titulo de Carta:

Çeológicas _, án. ,naes._paro esse fim

remetio o leitor.. Q'erdadeheque quem

Page 265: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

265

não he versado na .Historia Natural 3

ou que não tem ao menos'alguma tin;tura dlella , não poderá plenamente

tomar-lhe o gosto : todos porém po

derâõ'v optimamente comprehender a

indizivel força de sexta das ditas Car.

tas, â qual sereferem todas as outras.,

e que 'por todas as razões se pode

olhar como hum Commentario fysieo

dos onze primeiros Capítulos do Ge‹

nesrs. .+- J . ' . ~

Assentei estenderane hum pouco-so

bre este 'objecto do grande'damno _ti-'

rado das obrasfque 'de hum'modo in

directo atacãrão a Religião,l para que

não só se conheça cada vez 'mais a

necessidade dos anti os regulamentos

sobre a censura dos švros; mas tam

bem para que seentenda quanto os

sujeitos encarregados dessa 'inspecção

devão ser cantos e perspicazes. Sem

esta grande circunspecção bem longe

de corresponder ao intento para que

se instituío a mesmaCensura , não

se faria mais que augrnentar o mal;

pois que alicença que se veria á fran'te'da obra'seria humacilada armadaI

ás pessoas simplíces e'pouco instrui~

das ,para lhes fazer adoptar sem des

confiança alguma os erros , que nella

se. poderlãocoater. _a-zf. ‹

Page 266: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

266

,- Nada direi da introducção das o.

bras já impressas, sendo claro que a

estas tambem se deve estender a neces.

sidade da censura. Se todos os Gover.

nos fossem igualmente vigilantesv em

não permittirem que se imprim'ão li

vros perniciosos , seria com effeito

inutil talcautéla; mas como isto não

he de esperar, e como em alguns pai

zes a liberdade da i'mprensa- se Vacha

tambem authorizada pela mesmaconsà

tituição do :Estado,'‹' todos muito bem

conhecem, qluede nada serviria ter su.

jeitado a huma sabia revisão as Obras

que se imprimem ,. onde se deixasse

livre campo-â introducção das que

Sahem'á- luz nos outros Estados. Fôra

certamente de' desejar que esta-pro.

videncia se tivesse'posto em pratica

em toda a parte lha meio seculo ,-a.n.

tes f ue 'Yo Filosofismo- inundasse o

Mun o dèflsuas tenebrosas'produ'cà

ções `;'!fn'r'as ainda que ao presente já.

seja assaz' tarde›,f'näo.deixará de pro

duzir utilidade, pois fará- que não

`lavre mais"a corrupção;` Por outra

'pai-'te' ,- para impedir afunestaé influ'

e'ncia dos l'iv-ros mãos , lque existem ,

não podem f faltar efficazes meios. Sc

Os Magistrados- mandão. .def4 vez em

quando fazer visita ou`dar busca aos

Page 267: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

267

armazéns dos mercadores para desce-_ .

brirem ›se- ha fazendas que se- tenhão

sonegado ao pagamento dos direitos;

porque não lse poderião praticar as

mesmasúnvestigações nas lojas e ca

sas dos Livreiros a firn de impedir a

venda e circulação das obras perni

ciosas? Pelo que toca ás Bibliothe.

cas publicas , as quaes podem ser

grande causa de corrupção , conten

do tantos livros bons como mãos, tem

os nossos Estados Catholicos grande

vantagem em comparação dos paizes

_heterodoxos; e com effeito, assim eo.

mo nos primeiros he vedado por dever

de consciencia ler livros prohibidos,

se para isso 'a pessoa não tiver a de

vida licença; do mesmo modo aquel.

les que estão encarregados das Bi

bliothecas não costumão ermittirV a

leitura das mencionadas o ras, senão

se a resenta essa licença. Tem a Igre

ja omaua sido mui calumniada so

bre o ponto do Indice dos livros pro

hibidos , como se co'm isto quizesse

Éerpetuar'no Mundo a ignorancia.

ste amargo vituperio se acha repe

tido em infinitos livrinhos, tanto. dos

Protestantes, como dos Filosofos; mas

tambem nesta parte não tardou que a

não justificassemos factos. Os livros.,

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268

que com as suas maximas perniciom

eonduzírão o Mundo aos luctuosos

apertou de que apenas acabamos de

sahir , todos immedíatamente â sua

publicação forão proscritos , e repro

vados no Indice.

. . .

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Page 269: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

269

coNcLUsÃa”

Povos , que depois de haverdes es.

tado por muitos annos sujeitos a Go

vernos rapaces, immorâcs, e tyranni.

cos , tendes voltado ao dominio dos

vossos antigos legítimos Soberanos,

ponderai bem a vossa presente felicida

de; não vos deixeis lseduzir dos novos

enãodos que os occultos inimigos da

Re igião e da Sociedade vos apresen

tão para vos fazerem recahir nas pas;

sadas desventuras. As maximas que ha

annos tanto -se exaitã'o sob o especie

so nome de idéas e de instituições li

beraes são aquellas mesmas que, tan

to na ordem moral'como na ordem po

litica produzir-ão todos os males que ,

de 1789 para cá , do mais inaudito

modo affligírão e assolârão tão cruel

mente a França. Eu me lizonjeio' de

o ter'evidentemente provado no de

curso desta'obra; mas analysamfi) ao.

mesmo tempo debaixo de todos. osseuë

Page 270: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

'270

aspectos as referidas maximas, tenho

feito ver até a ultima evidencia, queelias se não poderião generalizar emV

qualquer Estado, sem que sobrevies

,sem logo as mesmas terríveis conse

quencias.

Porém ainda não tenho dito tudo,

e para inteiramente exhaurir a ma

teria me falta expor o argumento

mais convincente de todos; quero di

zer , a manifesta desapprovação que

Deos fez dlessas mesmas maximas, ten

do-se elle opposto de hum modo tão

sensível á continuação do horrivelestado de couzas que , apozl a geral

propagação das máximas sobreditas,

se tinha introduzido no Mundo.

A Democracia, que se estabeleceo ení

França, durou apenas tres annos des-I

de que se.a'doptou o Governo Consti

tucional; depois de ter vexa'do e op-l

primido aquelles infelices habitantes

com todo o genero-de' desgraças , aca

bou' dando lugar ao mais pezado des

potismo , de que as historias nos te

nhão -deixado lembrança. O homem

soberbo ;'¡ que , aproveitando-se dês

ltramente do-abaztirnento em que esta

va. a- Nação por tantos'males soffri

dos Í, ~fez zoom' que se lheoonferisse-a

soberana au'tboridade', em -vez ~de usa!

v

Page 271: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

271'

d'ella para' sarar tantas feridas, como

facilmente podera fazer , não fez se

não dilatallas mais. Era pouco a seus

olhos senhorear oReino, que passava

pelo mais florente da Europa ; para

dominar imperiosamente sobre todo

o nosso continente , não lhe faltava

mais que levar as armas ao Dwina e

ao Wolga , e va sua desmarcada am

bição lhe fez conceber tambem este

projecto. Mas entretanto que elle ha

via já começado a executallo , acon

tecimentos de natureza totalmente di

versa se preparavão nas secretas dis

posições .da Providencia. para pôr

or huma vez termo Naos males do

undo. ,

'_Buonaparte parece ter sido destinav'do para realizar na sua pessoa do

modo mais assombroso o antigo ada

gio , que Deos cega aquelles qrue quer

perder :Quos perdera vult upiter,has dementnt ::. A uerra ,dlHesp-a

nha, que durava havia quatro annos,'

não apresentava no de 1812 mais que

lmm aspecto assaz ruinoso. A tactica

adoptada pelos Hespanhoes fazia inu

teis os grandes exercitos empregados

pela França na conquista do seu paiz ,

Vconsumia-os inscnsivelmente , e pu

nha-os no ycaso de. frequentemente usa

Page 272: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

272

eessitarem de numerosos reforços para

se sustentarem. O insensato conquis‹

tador os privou (Testa vantagem com

o_emprehender a guerra cont-ra aRus.

sia.

O Imperador Alexandre tinha feito

toda a especie de sacrifícios , e offe

recia fazer ainda os maiores a fim depreservar dleste flagello os seus subdi

tos. A infracção do Tratado de Tilsit,

por meio do qual se tinha. obrigado

a romper toda a sorte de commercio

com a Inglaterra não podia ser alle

gada por Napoleão como justo moti

vo de guerra , pois que elle mesmofora o primeiro adnr o exemplo dliss

so.` Com o seu tão odioso systema

das licenças infringia elle pro rio to

dos os dias os seus famosos ecretos

de Berlin e de Milão, que, como to

dos muito bem sabem , tinhão por ob.

cto a mesma prohibição de toda a

qualidade de commercio com a Inglafi

terra.

Esta guerra da Russia, tão injusta

no principio que ahavia dictado, co.

mo adlHespanha, era ainda mais im

politica pelas funestas consequencias

que devia naturalmente ter sobre a

pessoa do seu author. E com effeito ,

além da impossibilidade moral de sus‹`

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273

.isentar ao mesmoztempo. duas guerras

offensivas a oitocentas leguas de disf

iancia huma 'da outra; podia acaso

conceber-se nada mais perigoso , que

entranhar-se com hum grande exercito

:nos desertos da Russia , a travéz das

brenhas ,' dos rios,` dos pantanos; onde

não» jh'avíaz estradas sufficient'ëmente

cfapazes para transportar a artilheria;

as bagagens, os viveres, onde se de,

yião arrastar os rigoresdo clima ,. as

intempéries das estações ,. a subitauea

passagem .de huma seccuraextrema ás

maisz copiosas. chuvas, dos calores da

canicula aosfriosdo Polo glacíal 3,y e

onde finalmente `os povos erão affeiâ

çoadissimosao seuGovemo ,não tenõ

do entre elles ainda penetrado _aqueló

la-tallaz cultura; que em outras' para

_tes tinha feito acha-r tantos adherenõ

tes aos exercitos.~1'e,voluçionarlos da

França 2.-Como podem .por tanto deja `

:ar de ver-sena guerra da Russia os

symptomas, d'aquellaz cegueira com

, ue Deos prepara oeastigo exemplar

-g'aquellss que tem determinado pera

derf'e provar d'esteI modo ás Nações

'qua os~_instrumentos_ da sua colerza se

nouverteml em; _victimas, da sua vingaú

dora justiça? v _, v ‹-.

e. Estamesmfizçegušitsz. .quelevouNag

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274

poleäo a emprebender tão ineonsidera'

dainente similhantešuerra, não se lhe

tirou dos olhos nas ifferentes opera

ções -da mesma guerra. Caminhava

a marchas forçadas atravez da Lithu

`ania na coufiança de sorp'render os

Russos; porém quando chegou aWil

na , já havia dois dias que elles ti

nhão abandonado esta Cidade , quei

mando tudo oqne comsigo não podiãolevar. O fructo dlesta operação foi a

perda de vinte mil cavallos do exer

'eito Francez', osflquaes perecèrão por

falta de forragem, e que elle nos seus

boletins disse terem ficado afo ados

em hum diluvio de trinta e seis oras

a fio. Vin ou-se `d”esta prudente reti

rada dos ussos com hum sarcasmo,

dizendo nos mesmos boletins, que era.

mais difficil podellos alcançar que

vencellos. Seguírão elles ainda depois

este plano de campanha tão sabiamen.

te combinado; assim, de posto em pos

to o atrahíräo até Moscow , onde os

'elementos pareoeo haverem-se todos

oonjurado para 'anniquilarem o seu

exercito , e obrigarem-noáquella de

zastrosissima retirada` que lhe custou

a perda de trezentos mil'- combatentes,

de immensa artilheria, da sua Caixa

Militar-,e que fez eahir em poder do

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'52%

vê'néeaór tàdó o frucfó das meias 'do

Vencido. › A' dNesta expedição da Russia, Bu'ónaä

parte, tão incous'idefad'o nos seus cóliit

selhos , como temera'rio nas' suas 'er'mJ

prezas, se deixou demorar pelo G'abiá'

'netede Petersburgo 'com huma nego:ciação que 'retardoul üilnte dias a suà.

retirada, e a tornou mais difficultósa'r

ignorou totalmente o Tratado de Pai

èntre esta Corte e a Po'rt'a Ottoma'na ,

pelo qual o inimigo teve' á sua dispo;

siçã'o hum novo exercito que o v'eãioií

de* continuo pelos flancos. Em summa

todos' os'- acontecimentos ,` militares ou?

politicos, concorrião para verificar os

secretos' design'i'os da* Providencia sos

bre' este homem , o qual parecia pre:

eipita'r-se ell'e proprio para asua'perz'

da debaixo- 'd'a ómnipo't'enlfe tflão' d'a.:`

quelle, fqu'e dfieue queria fazer hum'

rand'e exemplo das 'extravagancias

` `m`fllias.

- Depois desta' fatal retirada , chega'B'uortapart'e só a París, e, semI` a mir

sima li'riqiiietm;ã‹› pelo grande luto*

que havia ec'casíonado em' toda a em.Í

t'ensã'ddo Imperio , não se' occupou

senão 'nos meios de poder reunir

entre eäier'eit'ó.v A actividade que poz'

naJ execução destesš preparativos, foi'

2

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' 276

ão grande , que apenas' erão assa

dos tres mezes depois da sua vo ta, e

já se achava em estado de entrar de

novo em campanha â testa de hum

exercito reorganizado como por en

_anto. As tropas dos Principes da Con

;ederaão do Bheno , tornados seus'

'Vassal os , e que elle obrigava a to.

mar parte em todos os seus extrava.

gantes projectos, tinhão igualmente

sido postas em hum pé respeitavel;

de modo que os dois exercitos reuni

dos em nada cedião, ao menos a res

peito do numero . áquelles que no an

no recedente elle havia sacrificado

na ussia. -

Í A campanha de 1813 abria-se com

a sanguinosa batalha de Lutzen, on.

de a artilheria Franceza tirou' aos

Russos e aos Prussianos a victoria, ue

o valor e a íntrepidez mostravão l es

devião segurar. Se Napoleãotivera

sabido aproveitar este momento para.

offerecer a paz aos seus inimigos en.

tão amedrentados , fôra honrosa pa

ra as suas armas , gloriosa para elle,

e proveitosa á França e aos seus al.

liados. Com esta victoria tinha elle

restabelecida a sua reputação mili.

tar , e apagado ao mesmo tempo a

' deshonra e amemoria dos desastres da

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277

precedente campanha ,' ela qual fiÃ

'carião responsaveis os" e ementos ;"è

ao titulo de primeiro Capitão do seu

Seculo ajuntaria o outro mais'lizoni

jeiro de Pacificador da Europa. Os

seus inimigos lhe tinhão poupado os

rimeiros passos , propondo-lhe ele

les mesmos hum armisticio para con.

cordarem nas bases em que se pudesl

se negociar de boa fé. Se Buonapartc

se houvera então recordado da maxi-y

ma de Machiavello , que huma perƒi.

dia pode ser algumas vezes util , mas

que pelo contrario huma reputação

md sempre he perigosa ; fôra aquella

huma bella occasião de desvanecer a.

dolorosa impressão do seu procedimen

to contra os Priucipes da Hespanha,

desenvolvendo ao tratar do armisticio

huma lealdade, que se jul ava pouco

análoga ao seu caracter. ševia além

d”isso temer, que continuando aguer.

ra , imitassem os confederados ao prià

meiro revez o exemplo da Prussia, a

qual se tinha apartado da sua allian-Í

ça , e voltassem contra elle as suas

armas, como fizera esta Potencia. E

tanto mais parecia que devia apreciar

este perigo, quanto olmperador d”Aus-'

tria sobre isto mesmo` lhe mandou dar'

saudaveis conselhos por meio doG-ea'

Page 278: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

us

21.6191 Bulma ,_ 9 «qz al estava tambem.

encarregado de asse .orar a Napoé

leão , que 86 Se m9 rasss obstizuads

em`~reeusar condições lzuiequadas de

paz,` .o seu Soberano se veria obriga

šlo a. fazer causa commuu; com osseus

.inimigos .

Cumpre tambem aqui notar os

Pet-'vlws juízos d'aquella Providencia.

que .lhe tinha posto nos olhos huma

Yenda para lhe esconder a vistaI do

PrecipiciQ» as qual. caminhava a lar,

'os sassos, .Os .conselhos do Impera¬

_or 'Austria fprão desprezados , [o

'á Buonaparte devorava com o pen,

samento os Estados deseu sogro, como

huma preza, que não odia fugir das

çuas mãos, Rpmpeo el e o armistico;

e o fructo .que tirou d'este seu furor

uçlƒ-reírp , foi a perda da batalha de

íerpsick , que reduz'io o seu exercito

a huma extremidade, de que não pô,

de tornar a resurgir; afastou da sua

causa todos os seus alliados , queIl_nuito havia já aspiravão a sacudir

o jugo , que lhes havia imposto 5 e

armou contra si a Europa em pezo.

_ _Buonaparte se reduzio a preparar

terceiro exercito ; mas primeiro que

este estivesse em estado de se pôr eu;

campo, já os alliados tinhão passado

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279'

0' Rheno ; -inundavão as bellas Pro..

vincias Franeezas do Nascente e do

Meiodia , e se hião aproximando â

Capital do Imperio. Posto que re.

duzido a-esta dura extremidade, po‹

dia. ainda obter a paz ; allucinado

porém por algumas efémeras vanta‹

gens das suas armas, persistio em não

se arredar de condições tão orgulho

Sas , que irritârão justamente os seus

inimigos : dobrârão estes os seus es

forços; e no dia 30 de Março veio fi

nalmente a arrancar-se este flagello,

que ameaçava a civilização Européa.

de huma proxima destruição.

Que o gigantesco Imperio de Naa

poleão se não sustentasse depois da.

sua morte ., ao menos em toda a sua.

grande extensão , era couza que tal

vez se podia prever, e atê varias pes.

soas mui sensatas assim o pensârãmV

Mas nenhuma por certo sonhou jamais

de prognosticar, que similhaute dis.

solução havia de acontecer havida

do seu mesmo fundador, como acon

teceo. Ora quem `nãoV ve neste-terrñ

vel acontecimento a mão daquelle

que, como diz Job, desata o bol'driéV

da espada dos Reis , e flies cinge'os

rins com huma corda - que expõe os

Principes soberbos ao desprezo dos Poa

Page 280: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

280'

vos, wealth aquelles que estavão' oppriämidos (1)? Quem não ve nesta'l gran¬

de 'humilhação de Napoleão renovado

o' terrivel exemplo do orgulhoso Rei

de Babylonia , que queria engulír a

terra , e foi elle proprio em hum me;

mento destruído por Cyro'? 1 "

Esta visivel mão do Omnipotente

somentefoi desconhecida por aquelle

homem que ella tinha principalmentel

em vista. Napoleão, em vez de se hn..

milhar diante de Deos, e de' ser grato

á moderação dos seus vencedores, os

quaes lhe deixarão ainda hum thro

no, pequeno semz duvida , e quasi

nullo em comparação daquelle de que

decahíra , mas muito superior a tudo

aquillo que quinze ou dezeseis annos

antes teria podido desejar; medita no

seio do seu asylo novos pro'ectos de

ambi ão, e de ruína, sahe su itamen,

te da Ilha dlElba, e senta-se de novo

no throno da França. Mas inuteis es»

forços l Deos , que hum anno antes

u rv-rv 1.. .u .r -.v..r n ._ r I . s ›.¬ I

(l) “Baltheum regurn dissolvit, et praeq

__çingit fune renes eorum....Effundit` deti-A

pectionem super príncipes , eos, qui op-.

pressi fuerunt, relevans.” Job. XII. Ú

8,...21, ' ' '

Page 281: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

2813

tinha'obrãdd tantos" 'p'rodi'gios 'para

livrar o genero'humano do flagello

do seu oppressivo Governo . não ~p'er-¬

mittio, que _a França e a- Europa fi.

cassem muito tempo suspensas sobre

› o seu permanente destino. Anova _poó

tencia de Buonaparte he an'ni'quiladaí, depoisl de hum reinado de tres

mezes , depois de huma campanha de.tresA diasl- Hel transportado a acabar

os seus dias a =mais de quatro mil le-'

guas de nós , e reduzido assima hu

ma. verdadeira impotencia de poder

tornar a perturbar a Europa, aquel-k

la Europa , ' que tres annos antes era'

nimiamente limitada á sua ambição,

e â sua insaciavel avidez de conf

quistas. ' ` >

Mas não são menos sensiveis os

prodígios que a mão do Altíssimoobrou â nossa vista em apoio da. Re.-V

ligião. Se os infinitos triunfos , que

por dezoito inteiros seculos a Igreja

tem ganhado sobre todos os seus ini¬

migos, não tivessem ainda sufficien..

te força no espirito dos incrêdulos

para os'reduzirem a reconhecerem o

eumprimento das promessas de Jesu

Christo sobre a estabilidade da mes.

ma; as provas d'esta sua alta pro.

noção, que de _ha vinte annos a esta

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282

parte se tem renovado ã vista mesmo

dos ,incrédulos , são tão multiplica.

das , e tão resplandecentes, que de

vem para sempre confundir todas as

duvidas , confirmar a fé dos Chris.

tãos , e unillos cada vez mais â sua

Mãi a Santa Igreja Catholica Roma.

na , a unica animada , e sempre diri‹

'gida pelo Espirito Santo.

Os Filosofos do seculo decimo oi.

tavo não se lizonjeavão de ver reali.

zado o seu projecto de fazer desappa..V

recer o Christianismo da face da ter.

ra , em quanto existisse esta Igreja,

que como Mestra e directora de to.

das , ha sempre vigiado que em ne.

nhuma, ainda que remota região, o

espirito do erro enxovalhasse as divi

nas instrucções. E como não davão

credito algum ás palavras de Jesu

Christo , com que a havia assegura.

do de que as portas do Inferno 'á.

mais contra ella havião de preva e‹

cer , persuadião-se que , privados os

Papas dos seus dominios temporaes ,

havião de pouco a pouco infalli.

velmente vir a perder tambem 0 exer

cicio do seu poder espiritual. Daqui

veioy cingirem-se a invectivarem con.

tra a soberania temporalV da Santa

Sé , a fimde poderem deste modo

Page 283: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

288

chegar maisefficazmenta , e com maio;

presteza a arruinar o seu poder espi.

ritual. Mas não era tão facil como

isso destruir 4huma posso do .mais de

dez seculos, consagrada pela venera

ção dos Povos Ve dos Principes,; e os

seus insidiosos sofismas mascaradol

com hum falso zelo de Religião aca

barião cahindo de todo no esqueci.

¡nento , como exactamente aconteceu

aos de Arnaldo de Brescia , o qual

no dundecimo seculo tinha espalhado

as suas primeiras sementes , se não

sobreviera o terrivel acontecimento

que derrubou a mais antiga e a mais

bella Monarquia da Europa. -

Os primeiros authores da Revolu

ção de França , que não odiavão me

nos a Religião Catholica , do que

aborrecião o Governo Monarquico, en'

trarão 'plenamente nas miras do Fi

losofism'o â cerca do indicado projecto.de arruinar e destruir a authoridadel

espiritual dos Papas por meio do to

tal anniquilamento da sua Soberania

temporal. Assim , depois de terem

_com a Constituição Civil do Clero in

troduzido o scisma na Nação; depois

de terem assassinado huma multidão

,de Ministros do Sanctuario , e obri

gado .os .outros todos a ssoopderem-se

Page 284: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

~ m

ou a emi rarem; depois de terem. fe-'I

chado to as :as Igrejas ,^ 'elsubstitnido

nellas , em lugar da adoração do Deos

vivo , o'ridiculo'c'ulto da Deoszi Ra

zão , desthronizárão no principio'de

1798` 'o -Papa Pio VI , ao qual' dois

annos antes Buenaparte , como Ge.

neral das Tropas do Directorio , ti.

nha tirado tres das suas mais bellas

Províncias. A im iedade mascarado

com a capa da ilosofia triunfava

por assim ver preenchidos os seus

votos , e exclamava em sua exulta.

ção pouco mais ou menos como ou

trlora Frederico Barbarroxa (1): Em

. (i) Frederico I. Imperador, denominado

Barbarroxa, insultava o Summo Pentifice,

pelos annos 1160 com os seguintes versos:

Roma diu titubam, variisque erroribus arto,

Corruet, et mundi desine: esse caput.

Roma ha muito vacillante ,

D'erros varios agitada,

Deixará, no chão prostrada,

- De ser 'do Mundo a Imperunte.

O Papa Alexandre III lhe respondeo

com estoutro distico:

Niterí: incauum nuvem dissolvere Petri:

Flucluat; as! nunquam mergitur illa ralis.

Em vão tudo pões por obra

Para de Pedro aft'undares

A Barca; ella sobre os mares

IFluctúa, e ja'mais soçobra.

Page 285: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

285

não havendo Papa , nãoV ha Igreja.

Mas similhante triunfo foi de lassaz

curta duração. A desthronização do

Papa não tardou de ser seguida por

novos 'acontecimentos , que visivel

mente manifestãrão os desígnios da

Providencia , de que falla Bossuet em

hum passo que nestes ultimos tempos

tem sido tantas vezes referido pelo

escritores (l). -

(I) Como alguns dos leitores. poderáõ

não ter visto a passagem, assente'i re'f'erile

la aqui por modo de notam-H" Dieu vous

,, loit que l‘Eglise Romaine, la mere coma

,, m-une de tous les royaumes, dans la suite

,, ne fut dépendante d’aucun royaume dnnl

,, le temporel, et que le sièo'e où tous les

,, fideles doivent garder -l'umté , à la fit;

,, -fut mis au dešsus des partialités que les

,, divers i-nterêts et les jalousies d’état

,, pourraient causer. . . . . L’Egiise , pro

,, segue o Prelude, indépendante dans son

,, Chef de toutes les puissances temporel

,, les, se voit en état d'exercer plus libre

5, ment pour le bien commun. et pour'la,, commune protection des rois cln'étiemil

,, cette puissance celeste de regir lealâmes

,, et tenant en main la balance droite, au

,, milieu de tant d’empires, souvent eum-_

À, mis., elle entretientl'unité, dansjgut la -‹

,, corps , tantôt par d'inflexibles décrets; f

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1 _ 253

f A muitav idade e as moléstias de Pio

Sexto ., o seu dester'ro para paiz dis

;,ltzzntôt par des sages temperemens. , Bos

Suet, Discour's sur l'Um'té de' I'Egliir'e. l

Esta judiciosa retiexão do- diouto Bispo

de Meanx se acha ainda' mais desenvolfvida

na Historia Ecclesiasticado Abba'de Fle'uify'.

Este* se empregouv principalmente em das.

truir a ob'eeção que contra4 a dita opinião

daquelle relado se podia deduzir do es-'

tado.da›..primitiva Igreja, em. que .os Papas

certamente não erão Soberaiios.-"Tant

_`,, que t'Empii-e Romain 'subsiste , diz

i, dia , .il~rent-`ermoit dans sa vaste étendue

,,,p‹reeque toute la cbrétieoté; mais depuis

A“que l'Euiope est~divisée etrplusietm

,, princesz iudépeudaos'l les une' d'es autres,

,, si le Papo eu: -été»~mjet de Pon d'eux.,

,, il cut été à craiodre' qire'les autres n'euss

,y sent eu- peine à le recon'noitre' pour pèrc

,, common, et. que lestectiismes n'eusscn't

,,› été frequensl. On 'peut doneV croire que

,, dest par un effet pmiculier de la Proó

,, vidermel que le Papo: sfesttrotrvé indép'enõ

5, dont' èt maitre díu'n atue aissez puiesant

i, pour nlètrey pas uisémcwt opprimé'l pal

,gi les autres' ysouveiuiiis, sfin qnfit foiÀ

,, libre deixe lf'eaercieefi de sa pisissanee

A,y spirituelie, et qu'ilE put conteui'r plue

,,‹facilem'en't'A Vtous les' autres' evêqeeo

,~, dans; leur devoir.,,--Fieury ,- Quutfilo

InexDiecoun sur' I'Hisfoire' Ecclesíhsä'qudv

i 4I ¡ - . vt

Page 287: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

287

tante , fazião prever que a Sé Apos

tolica não tardaria muito que não fi

ca-sse privada do seu Chefe. Era de

recear que os Cardeaes, dispersos,

se não podessem reunir em Conclave

para lhe darem hum Successor, e que

não ficasse d'este modo a Igreja pri.

vada do Supremo Pastor por mais

tempo do que exigião as necessidades

do rebanho. Mas aquelle vque tinha

promettido estar com ella até a con.

summação dos Seculos velava do alto

dos Ceos na sua defensão. _

AlgunsCardeaes , expulsos de Ro.

ma ao mesmo tempo que o venera

vel Summo Pontifice , tinhão-se re

tirado ao territorio Veneziano , uni

co paiz da Italia , em que a Religião

šozava ainda de todos os seus direitos

ebaixo da protecção'do Imperador

Francisco. Em breve se lhes reunirão

os Cardeaes que na mesma occasião se

tinhão retirado ás suas casas pater

nas na Lombardia , no Piemonte , e

na ¡Liguria O fundado temor de hum

rompimento entre a França e a Aus

tria fez tomar este' partido a todos os

sobreditos Purpurados ,. pois que a

renovação das hostilidades 'lhes teria

impedido a jornada. »0_s-out`ros Cars

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238

deaes, quese tinhão refugiado na' Sia

cilia, tambem não tardárão em seguir

. o mesmo exemplo; de modo que,- quan

do em 29 de Agosto de 1799 acontec

cco em Valença do Delfinado a mora

te do. virtuosissimo Pontífice , já se

achavão todos os respeitaveis Mem.

brõs do Sacro.Collegio reunidos em

Veneza. ' v ~ , \

O Conclave se abriõ no principio

deaDezembroz Pio~Setimo foi eleitos.

-M de Março do seguinte anno de 1800.

E como as. ~falanges do Directorio',

derrotadas. pelas armas Austro-Russas,

tinhão alguns mezes antes evacuado

inteiramente a. Italia, não encontrou

o" novo Pontífice difficnldade alguma.

em passar a Roma ; assim, supposto

que a Impiedade , como'parecia não

se poder duvidar,- com oarre'bata

mento de Pio Sexto1,'e 'com a disperâ

'são dos Cardeaes , se houvesse pro.Vposto dissolver. o Governozda Igreja,

:e fazerI cessarza _suceessão dos Sum

vmos Pontifices, devia ficar bem con.

fusa vendo os meios que a Provider»

"cia tinha sabido pôr em obra paradar comttanta promptidão e tãocru

nonicamentei'hutn' suecessor ao Papa,

o qual tinha perecido ,victi “ _ Vdapesi;

›,~¬-,

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iss

iégniç'ãô ,. e para facilitar a -Pió'mo o caminho sralaosua Sede ,zelCa-i

pital dos seus' stadosr.-__í -. , .1;1

Porém a Igreja. , que 5 lmimo! diz

AAgostinho , he destinada. a; caminhar

na Terra entre _as consolaç'ões ,do SelV

nhor e as perseguições' do Mundo, nãó'

conserva porniuito tempo osl seus

vestidos d'e gala..` Excitouëse .contraI

ella `hunia nova borrasca_;. e isto (o

que jámais ninguem esperâra) foi porlparte dlaquelle mesmo homem ¡ que

pouco antes havia. sido .o proprio quê

procurara restabelecer emFrança ó

Culto Catholico ; signal evidente de

que em dar similhante passo não teve'

em vista maisque oseuparticularim

teresseye a olitica. Napoleão de' ‹ .is

de ter por ois annos inteirbs fati a..

'dotincessantementelPio VII com so lí;

eitações,__ .que tendião directamente a.

- fazer arrei ar aquella. Nação Doca;

hos da i'rre igião e do scisma, e que

elle` melhor vqueniizfuem .sabia que

o Papa não podia . e modo nenhuni

conceder., tirou finalmente a mascara

ele-,todo no principio de Jupho dê1809.; Foi oÍ Papa duramente arraslv

Irado Vde desterro em desterro , e a

cadaginstzante ensopado em amargu;

ta. Apartãrão. do serio lado ,os seus

Page 290: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

ZM

eMlbëiresínatbs ," osrquaes forãomesmo amado. injuriosamentc perseúv

uidos , .assim como f infiuito's outros

šécleai-acticoa.` f .

*1. lllstay .segundaflperseguição constem

noúws Fiéis mulfiofmais do que fizes

ra a quase exeitá'í'aino tempo de-Pio

Sexto '9 pode rque` além de setI muito

mais atraz., apresentava caracteres de

duraçäw que ¡afsoutra não tinha. No

principio de 1798l havia todas as ap.

gerenciais: de' que a Republica Fran

ceeamio tardaria muito em se dissol.

ver5 Mu pelaforçaiexterna, ou pelo

desgolt'o interior da Nação. Mas es

tasesperanças Vsegundo todos os cal.

eulos da Politica , não as havia em

Junho de mos. Nesta ultima êpoea a

duração da nani-poção dos Estados da

Igreja parecia ligada á de hum Im

perio., cu'a dominação naEuro a pa

recia' dev ra ser sem limitet ecla

tando Roma asegmida Cidade da :sua

colossal dominação , investindo com

o titulo 'Ide Rei de Roma `o herdeiro

presumptivo da sua Coroa., anuuns

oitiva Napoleão abertamente que ou

'Estados Romanos deviãc ser lolhados

como perdidos para sempre ' pelo seu

amigo `e legítimo Soberano. .Mas ht

Wctameute quando faltão eo recur

Page 291: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

291'

Íös Ílúiüahos q'ue mais se uiahifesíá. 8

fésplandece nos acontecimentos o deà '

'do da; d'extra do Altíssimo. A.Rbovià

dencia, q_11`e`'_zombaI d'e todos .oscalcuá

los'dá.. Politico; fë'l com efifeito quea colossal Poteiibià so ' lque gëmião

tantos-Sobhranõs le tantos Povos I, sé

'destsuisse ‹'e` ,abysinasse com huma

promptidão e Com ëircunstancias, 'quo

visivelmènte manifestão o úrilla " re. E

1mm dos primèiios èffeitos d°es a mai;

'ravilh'osa .rèvoluçãm (le que he diffiioil achar outro lexè'mplona Historia;

foi :justamèote orfegresso do. Sili'n'md

Pontífice _âA Capital- dos seus Estados 5

è o' seu l_i'vJ'e röstgbblc'cimèñto na suaSêdeo. '7" › . , I.. 4: "I

.__f Foiho mesmo Palacio de Fohtais

hebieau ', em qué `läízzxjwl'eãoftinha, tie,

ao dezoito mez'e's prëàdvPio VII; qué

elle reneb'eo o decroiofdo. Senado que'

u'declarava doposto Vdo Thronü ; coó

mo qué Dèos, do theati'o do' _'seu in

ao'lente triunfo sobre «Chefe-do.` lI rw

já , 'quizom fake; o 'da sua hum lisa

ção ,Ve 'da süa queda. _ ' A. _ z

ä;- Asseuhoreando-sa dos Estados dz

Igm'á , tinha Napoleão' ass' u_ado a

Pio _ II a ¡zongrua dodois mi äes de

francos (oitocentos mil cruzados), 'os

quaes “elle comanteéqentz rç'cuspu, .o.2 À

Page 292: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

292

de que nunca quizK receber a minima

orção. Foi á mesma assignação de

sois milhões de francos que' o ávido

Usurpador,`Y ue tirava cada anno hum

milhar de mi hões aos povos subjuga.

dos ,sâse vio reduzido por. huma com

venção, na qual se presenciou nego-fciar elle mesmo minuciosamentel afa.

culdade de levar comsigo para a

Ilha d`Elba 'os mais dos effeitos que

podia. ' . a l.

.1.0' re resso do Sumrno Pontifice â

Capita dos seus Estados, combinou;

secam a época da viagem de Buona;

arte para'o seu novo Imperioziuhoi

.jAcodem de toda a parte os povos ao

encontro do primeiropara lhe tribu.

tarem 'os expressivos testemunhos da

sua..profunda veneração , como ou.

' telora seítinhão visto apressurarem-se

a'seguirem` os'passos dos Athauasios ,

dos Chrisostomos, e de tantos outros

coufessores chamados aofiscio dos seus

rebanhos.` A- sua marcha vhe a cadainstante' suspensav pelo zeloV dos fieis

que entre si dispu'tão ahonra del pu-_

vxar a sua carroagem Pau'a'o` conduzig

rem como em triunfo. Correm igual.

mente as' povoações ao 'encontro de

Buonap'arte'; mas sójpa-ra ozeuchereui'

écrieláwbsriu ¡Lfimëãr lhe. Refis!!.. _ ' r 'e

Page 293: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

293

¡Ssfi'lhosa-rrancados de' seu seio para:Ierem'sacrificados' át sua ambição; os

paiszl'he mostrão os .seus.,campos ta;

- ados pelas tropasinimigasë, cuja vin

gança onseu` extravagante delírio ti

.nha justamente provocado ;vos man,

cebos, que formavãoz'a. esperança e 'o

esteio de suas familias; ihe exproba

virão o ser elle a cansa de `severem

mutilados z; segue-o .por` toda a 'parte

a execução publica; crescem a cada

:passo _os perigos na. sua jornada; não

Vse .pode esquivar ao V'furor popular

senão disfarçado , `ez artificiosamente

confundido entre os :da sua escolta;

.e com huma' precipitada fugida , .que

.mil lanços` de vileza da .sua patte'fià

.zerão ainda? finais' `vergonhosa. ~ "" “r

p Adiversa sorte 'que fo diaV 3'0 de

Março' de -18I4iez provar a PioVlI;

e ao seulOppr'essorí'as d'iffezrentè's ein;

jcunstancias , .que `.acon'lpanh'ín'ãoiaI

viagem zdmpriznieiro ,v'e'a dos un*

'glo ,z 'attestã'o por tante' ode' hum modo

`señsiv,elí,`¿ quee'xistm hum Deos rèmn'

iiemdor ,'í e vingador',. huma'Prdvif

¡íeíncia ,.; que dispõe zdetodos. os facon:

tec'imentos .pelo triunfo da 'virtudeperseguidaTe" peia punição'do'lviciõ

.fslía ,- .e ffinašmnte. “que a ReligiãoàVue o pri'méírö honrnucom' .a suahe;

Page 294: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

fl9!

pica -fiml'ennig a 'qua o 'outro' um

qfltrajõúyhe vepdadçira, é lie-divina.

E havpnáfiaiwda, .'pessàaäàztão í'nsølflsa?

tašç fóu', .paga melhor (kizer,4 tão ce'»

gas ^,` aq'ub persistão 'ainda em secou?

šervarem :nas trevas dbi'lühèisçng qu

dazlnçredqlidade ?\. v `‹-. ê .J

Hum ›grafnde› Ro'i dqfsenulo passm',A

do, que se divartig lem áè'çartea'r com

ps~ Filosdfos , "mas dos =quaes plçnag

'mentacunhpcia .ítoüds os gicfpiposf, ~_e

:que sempre ¡se :guapdmg 'üvad'o'ptar os

principiosvdâell'asf np governo das "geug

lpovos », ¬à.› que; tanto fsç'dedi'cava , e

pelo ~que,_' não menos que .pela'suz

grande perícia nã'sçiènçi'af 'das armas'x

viviráflfletemmhenrtç 'Eua .memnria dos

windourosqi *Freduriáo-flléí, escrevia,

pm VLUIS? aq flôçifêqfFmncn 'dos 'Im.

pics; Os Pfllosoƒas Vnvinwíio' abertamente

ps'l ~ alícçroes “do "Thrp'rgo ' Pontifícia, Tag

ldo -f estäl'perdida a,- heƒprecim hum' mig

lagre para salvar-I a Ifgrqja. «'›E.'v`ós te-.

veis a conšotaçãwde 1a fe'wwrfvlr'd‹z.s'V . e

da lhe fa'z'erdes. o Pfepitafiq~(4i)..‹ -Eía

`ois,!_ (1'`e_1_›1.1'í:a` judiciosàmentç húfn'gag

gia Biapo Fça'qoez depqis'de - té; Teféé

.fr , v,

e* -T'ff' "Twfxf'a- H. .V _

.5 t/T) YCo'rrÉà'pô1'íllív'zea Hu; :RM :Qiøpràu 3

www w?

.^."›Y -v ‹ .

Page 295: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

m5 e

:ido 'a nieúèioladai passa' m'_ danado

do :Rei ,`) ,›, Eia .pois !.-› I Cliefliaâdos

,', Incrednlos yhe morto; .o Reidiiilø'â

,, sofo he mortoq ea Igreja'iem-not.

,, brevivido a ambos ellos ; zos, rails..

3, gres qpe edito Principe. julgará.

,, necessarios. para 1salvar humorada'

,, outra , sem os esperar , nem. crer

,, nelles , effectivamente se operárão

,, em menos de quinze annos ,,confir.

,, mando-se deste modo cada vez mais

,, as promessas de Jesu Christo sobre

,, a erpetuidade da igreja. Porta:

,, in cri non praevalebunt adversas eam

a 1)' n '

, . ¡(Àh! não sejamos insensíveisa estes

novos prodígioído` níisericordia, que

.em tão 'brevevespaço de tempo se

obrârão duas vezesdiante de nossos

olhos em apoio da Religião , e ,da

Igreja , para nos não vermos no ca.

so de exprimentarmos os prodígios da

(l) Mandement de Monseigneur Pisani

de 1a Gaude, Eoô ue de Namur, ou Clør¬

gl et aux fideles e :rm diocese pow ordon

mr une messc solemuelle suis-ie d'un Te

Deum en action de gface: de Ia de'lioranco

_de nótre V.Saint Pêro, Pie VII , e: de im;

remar triomphanc à ¡Romøú ' - _

Page 296: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

fla sua» justiça irritadu'rCada Seclflo

tem tido 'seu caracter diaincäggš'tah,

`to; I'nos' vícios ,› como nàs A

Incredulidade foi o- vicio do Seculq

decimo oitavo; zfaçaàmos que a vittu,

,de opposta seja o caracterxparticular

flçpScculQ dçcimo ngqofioiakfiawfll ,Q

agiografia? qampàazàáizwâpufäim u

015': fi'fgqo'ea aiízafflfsvšmáš'lfi . wii-m ,f

«Hyu1:.’.'..u: “1' ‘

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Uïtltÿ%T-Ô"-1V5Ü 3‘ !"L?“.';;s.'-iî‘.' *2-23 '›'.""`›~.'-'

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Page 297: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

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‹ uni'.Ruim 'Ju-i Lui) l:1 .- r

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Do. .que .contém este Volume.

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-aiii rñg) 'Jxx'w '_ ` 'ii . '-.Pagai

sb ` -n~-`~fi`s- ~` i à»

PRsfiçãp do' mducton . s ç ,3.I

Introduççãazuww-g ¬' - ¬ `-V - - _7,

EAF. I.- De huma preoccupaçãa .

guetsm'contvn'bm'do muito para. . 1,

accreditarƒns .maximus erroneas

.me pemicámaszwtnzmãderno Fila;

sofismo. Os fautores. das ideas' `›

.5 vliberam: ,..a jim de espalharam . .

com maiarƒaagurança. as' mesmos' ._ â

erros ,qlrøcu'r'ãa insinuar' naum. ,imen'te ‹a'. mesmo preocoupäçãq.- 19.

CAP. IL 'DaGavemO Constitu-‹ . ›

ciouab, `ou da Representação

NaCl-Ofifllf g' f\3 .1- 1- -› e 37¬

ART. L: Hefalsa que estegenef

' ro de. Goma aaja` a mais am, ;.

tiga especie de Monarquia que ~.

se viene Mundo. f “-. -` í- ibid.

email. Áintrodueção doaGa- 'x

' ”gzç›íu°.flans_1imçianalrem Image .w

Page 298: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

298

no reinado de Luiz XVI pra.

duziaaíxüsmbqpãadaJ/[owz

quía. v D U G O 9 O I' 54.

ART. HL' Iendors'ç, introduzido

o (Siomn'noi Ê'ons'tituoiohal em

Françmno anno de 1804, não

fez 'mais ue aggravar e fazer

mais: in' ' emulmošodapotjsmá

do novo Monarca. -. ~ - ¬ 70.

ALTMIV, Do Governo Constitu

cional considerado debaixo 'da.f'fhum Principe Íuiiiiuošmíf `

.'Ljírme ,~c que-sabe governarfpor

si mosaico-.mf uma: z... .J . 13.8,

AivraV-fi Diƒƒaronçu importante, .\- à

que :adm fizzer ›ralativomm f-'â

ao Governo .Uonstiwdmlu -I 83.

vCAE III. Bospwotøâsošdelictor z: '

de Ú' r ' v 'Ie 311.'lá'* .š v 950

CAPö V'L Dafiflmmfuciau .-: 107.

Ami-Im Owsystmazda Toileram ~

.ã bia f, -' tãøzfg'n'bado do: pfetondià

. dos- Fiiosoƒos dolstmloädeoimo'á/ )

oitavoyí'øquafiagovb sc reprv.t ' -z

.Tduz'o-se-pãe no mumeroydas '

Idéaâ* libehuei-.àxë uãoQhe maisi '. i

` que fkamawoutpauefindiƒfermça h?

em'Wnflwm v Iwdu

ART. --›I'I.'- - A lincliƒ'ƒ`91rzaáøg,'è'í'omvnva- Tz .'f

teria deâReligiãoKco ' ` nom..zz'lfafidmenu v Ê'Àâflúnfu 4

\`

_

Page 299: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

295

írzƒbtmvfi, 'q'ueflihuíra iafsystšñíaxr* 3.

tem por suaI naturäâa na. Sooi'e- Í

.€.`›3d'asle, - v -- .-- ~- 9- ›-~\ v' -fl 113

Anrfifll. ¡A'Revolação deFrän... '- :à

-Y ça -defll'zs'e dweesefimaniƒesea- .

meme'aü'ribuir sí Irml'igião - E1361

.hier-IV. «A nova revolução .mc-f.

` çedi'da' mFranga em_~.Ma1fiça de.v .1.

" 1815 , deve tamõmm-visáoelmen»te attribuirase sí .I1.~.r`x›,lig~:¿ão.,` - 1:48,

.Ann-'VJ 14. gwmdle Wz'ldfiplions ' '1

ção =dos suicidi'es, que depois. si.' ido-meadg .da Sabado: .pmsado 'wi

cpmëgšouha 'haver 'cms França, 'ä

deve-.tmbem ser msíderada -y e,

comoI 'numa funestu womequem .ni.Ez da- Ir-religião. Í -ff ›- 1 1 vU- '154.

.An'rnYIlyà Comando de quanto'1"*°*- X

' se tem eoposto no _ "answer #10.

o _ pitulo. Importancw de um? 0"» o ,1

Educação mara'lwe lmligãwus a' faEdueupãa m'vü, e zlimmsia. -al-ss.

CAP' V.ó--!›Do 'Divuhcim .s n. 'f 9188-.

.ABL-L' 11 iVoltaswyossevemndoque .' K0 Evangelho pemitte «'a 'divorw É.

.2 Feio. em'oase'çie adoötsn'o \,`:`z não` l

fezmzois :que eopiur'o's Heresior-é às..cas do decimo zssmto -Seculm ~ - ibid.

`An'ra'llz ú He falsoyusâoâDivan- I:--1 .

i Acio›.h‹zj‹¡` sàdossemp'r'e autñoñsa-us=t

'-ÂifyiiQMíPQkQÍGn-z v 'v avi s» 12051

Page 300: As Ideas Liberaes, Ultimo Refugio Dos Inimigos Da Religiao e Do Trono

y eee _ i `

.hu-.Tm *Des de Fm”, '.

de 179,2 , e 1803 a _'fmionl do

.' Divorcío.. - _., ___... ._ - e 210.Agir. I'V,\.V Opposição do Diver-_cio ao Vbem da Sociedade; _- .. 213.

CAP.'VI.-¬ DaLiberdade da Im. . "

Tensa. Q v n o u p _ .ART. I. Os. Filosofds modernostem artiƒiçiosamente confundido

.na liberdade ' de Imprensa com

o liberdade de pensar ,l_e tambem'fdlesta .nos tem defdo huma I. '

flopã'o totalmente' falsa. e; - .‹- ibid.

AMLIIE xtravagante eopinião z. .da .Authondo Systemazda Na- w

tureza , .zde que. nenhum' liw'o'V .o

.epossa- saw-«pernicios'om'fr-vfi - .-' 235.

Anrúlll. Pfedicpão deLeibnitz. Y

sobrezhuma revolução, que as .e

doutrinas irreligioeas , que Yno

sew'tempo" 'começae'ão 'a diffun. .

. 'dir-se, havião-'de produzir ge. ,lJ ralmente em todau 'Eui'opav'V ‹ 241'-`

Àm'. IV.`l De algumas predic- .› :'.

,ções litterarias mais recentes so.4

bre à Revolução .ll`r:1›ze,~ezsa-` - 2.246*

ART. V. De humd'ƒalsu razão,

.É de utilidade, que tem contribuà

do muito. para .acreditar o sys..

tema .deliberdade da Impren-V 1

- Sap~1' v' a o ø Q .nf- Io'zálo

'5

'i

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301

'Alvin VVI. YI‹`'raudc.‹›' que sepodem

usar , e que com effeito se tem

praticado para eludir os sauda

veis efƒeitos da censura .dos Ii'- ,

,vrOš- e - - e - e 4- -2551

Conclusão. . . .. - - _ .1,2697

«

ERRATAaÊ

Pag. Lin. Erro: ' Emendas..

20 26' demorar-nos demorarmo-nos

37 8 do de v" ,.

8! 8 preceber perceber Í "

122 5 tambem ns' ~ tambem contra os

135 11-42 depois do Seculo desde o Seculo A

137 2 contribuído '. contribuío

140 23 com Ecclesi- › com os Ecclesi-'

asticos aslicos

200 5 S. Paulo de S. Paulo

202 12 separatianc :eparationemü

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