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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA CENTRO DE EDUCAO PROGRAMA DE PS GRADUAO EM EDUCAO - PPGE

CONHECIMENTO CIENTFICO E O SABER POPULAR SOBRE OS MOLUSCOS NOS TERREIROS DE CANDOMBL DE RECIFE E OLINDA, ESTADO DE PERNAMBUCO

MARIA CONCEIO DA SILVADissertao apresentada

Coordenao de Ps-Graduao em Educao, da Universidade Federal da Paraba, como parte dos

requisitos para obteno do ttulo de Mestre em Educao, rea de

concentrao em Educao Popular.

Orientador: Dr. FRANCISCO JOS PEGADO ABLIOJOO PESSOA 2006

MARIA CONCEIO DA SILVA

CONHECIMENTO CIENTFICO E O SABER POPULAR SOBRE OS MOLUSCOS NOS TERREIROS DE CANDOMBL DE RECIFE E OLINDA, ESTADO DE PERNAMBUCO

Dissertao

apresentada

Coordenao de Ps-Graduao em Educao, da Universidade Federal da Paraba, como parte dos requisitos para obteno do ttulo de Mestre em Educao, rea de concentrao em Educao Popular.

Orientador: Dr. FRANCISCO JOS PEGADO ABLIO

JOO PESSOA 2006

BANCA EXAMINADORA:

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___________________________________________________ DR. FRANCISCO JOS PEGADO ABLIO DME/CE/UFPB (Orientador)

________________________________________________ DR. JORGE CHAVES CORDEIRO DME/CE/UFPB (Membro)

_______________________________________________ DR. JOS ETHAM DE LUCENA BARBOSA - UEPB (Membro)

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EPGRAFE

NEGRA ALAISou mulher negra batalhadora Lutando por alforria, alimentao Querendo emprego, sade e educao Denunciando em forma de cano Sou mulher negra, sou sim Alafin Sou negra alai Lutando por igualdade Sou to capaz quanto voc O racismo do esquadro verdade muito forte A pena de morte A esterilizao Genocdio para o povo negro, no As malungas organizadas Pelo fim da mutilao Ao machismo dizendo no Encontramos no Omnira A libertao (Ceia Ax e Snia Silva)

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DEDICATRIA

Aos meus pais Maria e Joo; minha filha, Natureza, rebento do meu mais puro amor; Ao meu Baba e minha Ya, guardies de minhas heranas tnico-religiosas; Aos meus irmos e irms de sangue e de f; Aos profissionais que contriburam com esta minha caminhada.

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AGRADECIMENTOS

A Olorum e a todos os Orixs pela luz que recebo e que repasso. A minha me Maria Jos e ao meu pai Joo pela vida e labor da criao. A minha filha Natureza, pela compreenso e fora. Aos meus irmos Brasiliana, Snia, Das Dores (in memria), Wilson, Edmilson e Wellington. Ao Professor Dr. Francisco Jos Pegado Ablio, orientador da pesquisa que, com amizade, competncia, dedicao soube me mostrar que todo o saber cientfico deve estar a servio das classes populares (nosso povo) e por compartilhar de minhas lutas, alegrias, sofrimentos, desiluses e esperanas, elementos necessrios para a concluso deste trabalho. Aos membros da Banca Examinadora, Dr. Jorge Chaves Cordeiro e Dr. Jos Etham de Lucena Barbosa, pela lisura de suas anlises. Ao Manoel Nascimento Costa, meu orientador de todas as horas, e Djanira Alves, sacerdotes do nosso Ax Ancestral. Aos Babalorixs, Marcelo Efrem, Toinho de Oxum e Vadinho de Oxal e aos Ogns Pessoa e Lomy Lodo, pela sabedoria e disponibilidade em socializar conhecimentos. s Yalorixs Maria do Bonfim, Me Lau de Oxal e Judite de Oxum, pela grandiosidade e respeito com que tratam os fundamentos religiosos e por no hesitaram em compartilhar comigo os seus saberes. A todos os Terreiros visitados, pela maneira carinhosa com que fui recebida. minha famlia em Joo Pessoa Isabel Cristina Humberto, Zenildo Humberto e filhos pelo acolhimento durante esses anos de estudo, sem o qual teria sido impossvel concluir esta etapa de minha formao acadmica. Vocs foram meus anjos-da-guarda! Aos meus amigos e s minhas amigas da Turma 2003 que, principalmente a amiga e irm Genoveva Batista e famlia, que com sorrisos, ligaes telefnicas, 6

e-mails, sugestes, divises de despesas, acolhimento, tornaram-se fonte de inspirao e nimo para enfrentar os desafios e desvendar a floresta do conhecimento acadmico. Ao Professor Dr. Henrique Cunha Jnior, pelo resgate da nossa africanidade. A escritora e jornalista Jussara Rocha Koury, pelo apoio e carinho. Enfim, a todos e a todas que acreditaram no potencial de minha pesquisa e se colocaram disposio para sua concretizao.

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RESUMO

Estudos sobre a relao Saber Popular e o Conhecimento Cientifico podero contribuir para resgatar a re-significao do Ensino e a funo Social e Poltica dos Espaos Educativos. Baseado neste princpio, este trabalho de dissertao teve como objetivo principal de compreender as relaes entre o saber popular e o conhecimento cientfico, com nfase no uso dos moluscos nos terreiros de candombl de Recife e Olinda PE. A metodologia utilizada se caracteriza como uma pesquisa qualitativa, utilizando os seguintes procedimentos metodolgicos: observao participante (fenomenologia), atravs de entrevistas com Babalorixs e Yalorixs; pesquisa documental; oficinas pedaggicas; coleta e registro das espcies de moluscos utilizados no Candombl e levantamento das concepes e/ou percepes de Natureza das crianas que freqentam os terreiros. Dos sete entrevistados (4 Babalorixs e 3 Yalorixs), todos afirmam a importncia dos moluscos nos rituais dos terreiros de Candombl, principalmente os 4 mais sagrados moluscos, Cauri, Ibi, Aru e o Ikoto. O Bzio (Cypraea sp.) o molusco mais sagrado, representando fora, poder e sabedoria. A concha usada para If, para adivinhao, para a palavra do Oxal e para todo o tipo de iniciao. Nas atividades com as crianas, 22 no total, a que mais se destacou foi a oficina pedaggica com os desenhos, os quais expressaram vrias formas de rvores harmnicas, com a presena do sol, flores e pssaros demonstrando laos afetivos e/ou religiosos com a Me-Natureza. De uma maneira geral, em sua maioria constatou-se uma Concepo Romntica e Naturalista sobre a Natureza. Os moluscos marinhos, gastrpodes principalmente, so importantes comercialmente devido a sua utilizao como alimento, na fabricao de objetos e adornos e de medicamentos base de clcio. Devido ao uso e coleta desses animais de forma indiscriminada, no estado de Pernambuco existe atualmente 6 espcies de gastrpodes ameaados de extino. Atualmente, a EtnoConservao de recursos naturais tem sido vista como uma resposta adaptativa das populaes locais, para neutralizar perdas naturais e econmicas no ambiente. No caso especfico dos terreiros de Candombl est sendo desenvolvido um trabalho contnuo de Educao Ambiental com os babalorixs e yalorixs e este trabalho vem a contribuir para uma proposta de um projeto, junto aos terreiros de Candombl de Recife e Olinda, para a uma conservao da fauna de moluscos, uma vez que estes podem ser substitudos por outros elementos naturais e/ou simblicos nos rituais sagrados da religio.

Seo 1.01 Palavras Chaves: Conhecimento Cientfico, Conhecimento Popular, Religio do Candombl, Moluscos.

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ABSTRACT Studies about the relation "Popular and the Scientific Knowledge" will be able to contribute to rescue the re-significance of Social, Teach function and Politics of the Educative spaces. Based on this principle, this work had as main objective to understand the relations between the popular and scientific knowledge, with emphasis in the use of the molluscs in the Candombls terreiros from Recife and Olinda, Pernambuco state. The methodology from characterizes as qualitative research, using the following methodological procedures: participant comment (Phenomenology), through interviews with Babalorixs and Yalorixs; documentary research; pedagogical workshops; it collects and registers of the molluscs species and survey with the childrens, that frequent the Candombls terreiros, about Nature conceptions. Of the seven interviewed (4 Babalorixs and 3 Yalorixs), all affirm the importance of the molluscs in the Candombl`s rituals, mainly the 4 more sacred molluscs, Cauri, Ibi, Aru and the Ikoto. The mollusc (Cypraea sp.) it is the most sacred, representing force, power and wisdom. The shell is used to If, divination, to the Oxal and all the type of initiation in Candombl`s religion. In the activities with childrens, 22 in the total, the one that more was distinguished was the pedagogical workshop with the drawings, which had expressed some forms of harmonic trees, with the presence of the sun, flowers and birds demonstrating affective and/or religious bows with "Nature mother". In a general way, in its majority a Romantic and Naturalistic Conception were evidenced about the Nature. The mollusk marine, gastropods mainly, are important commercially its use as food, in the manufacture objects, adornments and medicines to the calcium base. The use and it collects of these animals of indiscriminate form, from the Pernambuco state currently there are 6 threatened gastropods species of extinguishing. Currently, the EtnoConservation of natural resources has been seen as a positive reply of the local populations, to neutralize natural and economic losses in the environment. In the specific case of the Candombl`s terreiros he is being developed a continuous work of Environment Education with Babalorixs and Yalorixs and this work comes to contribute for a projects proposal, in the Candombl`s terreiros from Recife and Olinda, for the molluscs conservation, a time that these can be substituted by other natural and/or symbolic elements in the sacred religion rituals.

Seo 1.02 Key words: Popular Knowledge, Scientific Knowledge, Candombl religion, Molluscs.

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SUMRIOEPGRAFE .......................................................................................................... 04 DEDICATRIA ................................................................................................... 05 AGRADECIMENTOS .......................................................................................... 06 RESUMO ............................................................................................................. 08 ABSTRACT ......................................................................................................... 09 LISTA DOS QUADROS ........................................................................................ 13 1. INTRODUO GERAL ................................................................................... 14 1.1. CINCIA, RELIGIO E A CULTURA AFRO-BRASILEIRA: TECENDO ALGUMAS CONSIDERAES GERAL ............................................................. 15 1.2. ETNOCONHECIMENTO: AS RELAES ENTRE O SABER POPULAR E O CONHECIMENTO CIENTFICO ........................................................................... 20 1.3. A IMPORTNCIA SCIO ECONMICA - MDICA E CULTURAL DOS MOLUSCOS ......................................................................................................... 22

1.3.1. MOLUSCOS UTILIZADOS COMO MOEDAS ............................................ 23

1.3.2. PRODUO DE PROLAS ....................................................................... 23

1.3.3. MOLUSCOS UTILIZADOS NA PRODUO DE ARTESANATOS E ADORNOS ........................................................................................................... 24

1.3.4. OS MOLUSCOS NA ECONOMIA EM GERAL ........................................... 24

1.3.5. OS MOLUSCOS E SUA IMPORTNCIA NA FARMACOLOGIA E MEDICINA ............................................................................................................ 24

1.3.6. CONQUILIOLOGIA E A ARTE DE COLECIONAR CONCHAS .................. 25

10

1.3.7. OS MOLUSCOS E A HISTRIA ................................................................ 26

1.3.8. OS MOLUSCOS E A HISTRIA POPULAR .............................................. 27

1.3.9. MITOS E FABULAS: O IMAGINRIO MALACOLGICO ........................... 27

1.3.10. NUTRIO: IMPORTNCIA ALIMENTAR DOS MOLUSCOS ................. 27

1.3.11. MALACOCULTURA ................................................................................. 28

1.3.12. SAMBAQUIS ............................................................................................ 29

1.4. OS MOLUSCOS E SUA UTILIZAO NAS RELIGIES ............................. 30 2. OBJETIVOS ..................................................................................................... 32 2.1. Geral .............................................................................................................. 32 2.2. Especficos .................................................................................................... 32 3. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS ......................................................... 33 4. CARACTERIZAO DA REA DE ESTUDO E POPULAO ALVO DA PESQUISA ........................................................................................................... 36

4.1. CULTURA E RELIGIO NOS TERREIROS DE CANDOMBL DE RECIFE E OLINDA, PERNAMBUCO .................................................................................... 37

5. RESULTADOS E DISCUSSO ....................................................................... 40 5. 1. AS PERCEPES DOS BABALORIXS E YALORIXS DO CANDOMBL SOBRE OS MOLUSCOS ..................................................................................... 40

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5.1.1.

O

Cauri

(Buzios,

Buzo)

Cypraea

sp.

(Mollusca,

Gastropoda,

Prosobranchia, Mesogastropoda, Cypraeidae) .................................................... 44

5.1.2. O Ibi (Igbin, Aru-do-Mato ou Caracol Gigante Africano?) ..................... 46

5.1.3. O Aru ou Uru Pomacea lineata (Spix, 1827) (Mollusca, Gastropoda, Prosobranchia, Mesogastropoda, Ampullariidae) ................................................ 48 5.1.4. O IKOTO (principalmente Achatina sp.?) ................................................... 50 5.2. A EXPLORAO DA FAUNA DE MOLUSCOS E A EXTINO DE ESPCIES NO ESTADO DE PERNAMBUCO ..................................................... 51

5.3. OS MITOS E A SIMBOLOGIA SOBRE OS MOLUSCOS NOS TERREIROS DE CANDOMBL ................................................................................................. 53 5.4. OS MOLUSCOS NO JOGO DE BZIOS: RELIGIO, CONHECIMENTO E PSEUDO-CINCIA? ............................................................................................. 55 5.5. CONCEPES SOBRE NATUREZA DAS CRIANAS QUE FREQUENTAM OS TERREIROS DE CANDOMBL PSEUDO-CINCIA? .................................... 58 5.6. SENSIBILIZAO DOS ATORES SOCIAIS DO CANDOMBL: UM PROJETO DE EDUCAO AMBIENTAL E CONSERVAO DA FAUNA DE MOLLUSCA........................................................................................................... 60

6. CONCLUSO E CONSIDERAES FINAIS .................................................. 63 7. REFERNCIAS ................................................................................................ 65 8. ANEXOS .......................................................................................................... 73

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LISTA DE QUADROS

Quadro I Os Orixs, o uso e a importncia dos moluscos nos terreiros de Candombl............................................................................................... 41

Quadro II Moluscos Gastrpodes marinhos ameaados de Extino no estado de Pernambuco (de acordo com TENRIO et. al., 2002) ....................... 52

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1. INTRODUO GERAL

O que sabemos uma gota, o que ignoramos um Oceano (Isac Newton).

Atualmente, acredita-se que a relao Saber Popular e o Conhecimento Cientifico ser uma das propostas que busca resgatar a re-significao do Ensino e a funo social e poltica dos Espaos Educativos, j que, segundo o nosso saudoso Paulo Freire, A educao um ato poltico e todo ato poltico um ato educativo (FREIRE, 1978). Para tanto, este trabalho visa examinar a luz das ferramentas conceituais da analise de discurso e do EtnoConhecimento sobre os moluscos nos terreiros de Candombl de Recife e Olinda, no estado de Pernambuco, com o intuito de desconstruir as concepes de origem Eurocntrica, to arraigada, no Senso Comum, no pensamento acadmico, no sistema educacional e no imaginrio do afro-descendente. A escolha do tema foi motivada pelo interesse de conhecer e aprofundar a contribuio dos povos Afro-descendentes das Religies de Matriz africana na construo do desenvolvimento e da religiosidade brasileira, em face de sua invisibilidade histria como protagonista scio-cultural e poltica, mesmo sendo a guardi de sabedoria ancestral e construtora da nossa base cultural. Empregamos nossa audcia para fazermos uma discusso que raramente tecida nos espaos que dialogam sobre a Educao Popular AfroBrasileira (BENTES, 2002), mas especificamente, a Religiosidade Popular de Matriz Africana. O que nos encoraja, tambm, a escrever o presente trabalho a tentativa de elaborar um pensamento que prope matizes diversas e leva a evadir-nos no terreno terico-metodolgico unidimensional, uno e totalitrio, fruto da nossa formao positivista que nos enrijece, impedindo-nos de perceber modos de sociabilidade para alm da Histria moderna e suas anlises empricas

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racionalistas que, geralmente no conseguem indicar novos horizontes para compreenso mais ampla das sociedades contempornea (LUZ, 2002). Hoje estamos entrando num novo paradigma. Quer dizer, estamos emergindo uma nova forma de dialogao com a totalidade dos seres e suas relaes com a natureza (LEFF, 2002). Evidentemente permanecemos no paradigma clssico das cincias com seus famosos dualismos como diviso do mundo entre material e espiritual, a separao entre a Natureza e a Cultura, entre o ser humano e mundo, razo e emoo, feminino e masculino, Deus e mundo e a Atomizao dos Saberes Cientficos. Para tanto, foi realizado o exame inicial do pensamento de autores/as, imprescindvel para conhecer os fundamentos bsicos da Cincia Malacologia e da religiosidade Afro-brasileira. Com base na anlise de dados colhidos na pesquisa, apresentamos um sistema EtnoCientfico, indicando brevemente elementos fundamentais de sua estruturao, assim como desenvolvemos um trabalho de investigao para contribuir num processo de Conservao da fauna de moluscos e para a preservao da identidade e da cultura-religiosidade no Candombl.

1.1.

CINCIA, RELIGIO E A CULTURA AFRO-BRASILEIRA: TECENDO ALGUMAS CONSIDERAES

Quem diz que a Religio no se harmoniza com a Cincia ignorante tanto de uma quanto da outra (Albert Einstein).

Entre os povos aportados em terras brasileiras, todos menos um, entraram pelos braos do Cristo Redentor, pela porta da frente desta nao, recebendo as melhores terras, escolhendo os estados de acordo com as tradies, religio e pelo clima de origem do pas de origem, como foi o caso dos contingentes alemes, italianos, polaneses, japoneses, etc. O nico contingente que entrou pela porta da cozinha sem nada para receber e tudo para dar foi o Africano. de se

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admirar a fora demonstrada por essas populaes entrada pela porta da cozinha que apesar disso so uma das matizes da formao da cultura brasileira. Quando pensamos em tradio religiosa dos negros no Brasil, nos remontamos imediatamente ao momento em que nossos antepassados chegaram na condio de escravos, originrio do Golfo da Guin e de Angola, no final do sculo XVI, para servir ao poder vigente que como sabemos era branco e cristo. Populaes inteiras do continente africano foram arrancadas com violncia das suas terras, das suas culturas e das suas tradies e trazidas como escravos para a Amrica. (...) como esquecer os enormes sofrimentos infligidos com menosprezo dos mais elementares Direitos Humanos s populaes deportadas do Continente Africano? Como esquecer as vidas humanas destrudas pela escravido? (Joo Paulo II, 1992). Demos, ento o primeiro passo para manter viva a nossa transmisso oral, quando estvamos misturados nas senzalas e depois nos centros urbanos da poca colonial, diversos povos tiveram que superar as diferenas lingsticas e reconstituram sua religiosidade, identificando os elementos comuns de suas crenas at que surgisse o Candombl Brasileiro. Para o poder escravocrata permitir a sobrevivncia das crenas dos nossos ancestrais significava fortalecimento daquela populao de anticristo, na viso ignorante do colonizador, que jamais compreenderia o universo do panteo africano que trazia para eles, medo, mistrio e incompreenso que resultou numa forte perseguio ao Candombl at os dias de hoje. A religio dos Orixs est ligada noo de famlia numerosa, originria de um mesmo antepassado, que engloba os vivos e os mortos (VERGER, 1981). O Orix seria, em princpio um ancestral divinizado, que em vida, estabeleceram vnculos que lhe garantiam um controle sobre as foras da Natureza, como o trovo, o vento, as guas doces ou salgadas, ou, ento, assegurando-lhe a possibilidade, de exercer certas atividades como a caa, o trabalho com metais ou, ainda, adquirindo o conhecimento das propriedades das plantas e de sua utilizao O poder do seu ax, do ancestral-orix teria, aps a sua morte, a

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faculdade de encarnar-se momentaneamente em um de seus descendentes durante um fenmeno de possesso por ele provocada. No Estado de Pernambuco, j no Sculo XVII h registro da Religio AfroBrasileira, sendo classificadas em quatro vertentes: Xang, Catimb ou Jurema, Umbanda e Xang Umbanizado. Se no Catimb, o cruzamento com as tradies indgenas marca principal, na Umbanda com o espiritismo de Kardec que se d o cruzamento. Entretanto, no Xang que as tradies africanas so a maior referncia, sendo, portanto, o Xang Umbanizado uma expresso utilizada para casas que cultuam tanto os orixs como os mestres. A pureza do Candombl tanto do ponto de vista religioso, quanto do ponto de vista folclrico, tem sido ameaado por elementos inescrupulosos que, no af da popularidade e do enriquecimento ilcito, tm elevado aos que professam esse culto a uma desconfiana geral, condenando outras religies destacadamente monotestas e at mesmo correntes espiritualistas, radicadas ao Espiritismo (SILVA, 1997). O termo Candombl hoje designa uma variedade de ritos, (re) criados no Brasil por africanos e seus descendestes, no contexto de amplos contactos InterEtnicos de povos da costa ocidental africana, falantes de Ioruba que se volta para o culto dos Orixs e se inspira na tradio nag (TRINDADE, 2005). Por este prisma, falando sobre religiosidade popular brasileira THEDORO (1996) menciona que do mesmo modo que a frica Ocidental, a religio impregnou e marcou todas as atividades do nag brasileiro, estendendo-se, regulando e influenciando os demais grupos culturais. Assim como os nags, as demais naes que deram escravos ao Brasil professam, desde suas origens, e com ligeiras variaes locais, a chamada religio se apia numa fora suprema, geradora de todas as coisas, mas, abaixo dela, existem e so cultuadas foras da natureza e espritos dos antepassados. O Candombl um culto entusistico em que, atravs do transe e da possesso, certos iniciados encarnam os espritos invocados. Estes so tambm propiciados com sacrifcios e oferendas diversas, e podem ainda comunicar-se com os humanos atravs do cdigo ritual de um jogo divinatrio (If).

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A palavra Candombl de origem Banto, regio africana entre a Nao Gge e Nag e significa casa onde batem os ps. tida como crena originaria da Nigria e composta de vrias naes que, aps lutas tribais, subudividiram-se em: Angola, Congo, Gge, Nag (Yoruba), Ijex e Ket, etc. Estas naes distinguem-se tanto na qualidade de seus deuses Orixs, quanto na forma dos atabaques, nos dialetos, nas nomenclaturas, nas vestimentas e nos rituais (TRINDADE, op. cit.). A religio tradicional negro-africana, reposta nos terreiros, bem no seio de uma sociedade como a brasileira, que regulada por uma moderna ideologia ocidental possibilitou a coexistncia e a interpenetrao multisseculares de duas ordens culturais: a branca e a negra. Desta forma se entende que a cultura negra vem funcionando como uma fonte permanente de resistncia e dispositivos de denominao e, tambm, como mantenedora de equilbrio emocional do negro no Brasil. De maneira geral, podem ser apontadas como religies negras (THEODORO, 1996):

O Culto Nag (proveniente da Nigria, implantados pelos iorubas e seus descendentes, de lngua Ioruba chama as foras da natureza de Orixs);

O Culto Jeje (proveniente do antigo Daom, implantado por descendentes da famlia real do Abomey, pelos fon ou mina, de lngua Jeje chama as foras da natureza de Voduns);

O Culto Banto (proveniente de vrios pases Candombl Congo, Candombl Angola, Omolok, Candombl de Caboclo, Umbanda, Jar etc. chama as foras da natureza de Inquices).

O Mito o discurso em que se fundamentam todas as justificativas da ordem e da contraordem social negra. Est intimamente ligado ao universo do simblico, que representa a ordem ou organizao do meio que circunda o homem desde o momento em que nasce indo alm da sua morte.

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Na cultura negra, os mitos so indicadores de caminhos e meios para a aquisio, transformao ou transferncia de ax. O Ax se transmite numa relao interpessoal e dinmica, num processo de comunicao direta, onde a oralidade bsica e fundamental. O ax se desenvolve na comunidade-terreiro que funciona como um centro irradiador de todo um sistema cultural, do qual a oralidade um de seus elementos, mas que deve ser visto em funo do todo. Desde cantigas, textos mticos, histria de seres ou animais,

acontecimentos importantes ou lendas, tudo explicita o universo cultural negro, sendo instrumentos de comunicao e ensino. Os membros da comunidadeterreiro aprendem uma lngua especifica, vivem em funo de uma hierarquia determinada pelo conhecimento maior ou menor de cada um, segundo concepes filosficas, estticas, alimentares, musicas e de danas que se relacionam diretamente aos mitos, lendas e refres. Tal transmisso se faz atravs do rito, que uma forma viva e participante, na qual se revivem e reforam o sistema de conhecimentos e de relaes do grupo. Pode-se concluir, ento, que na cultura negra, o som, a palavra so elementos mobilizadores, que conduzem ao, que propiciam ax. No ritual, o Orix invocado, respondendo por intermdio do transe individual do participante do culto. Assim, o individuo que fala sempre imediato, concreto, pois s dessa forma se transmite o ax, indispensvel dinamizao das trocas e da existncia. Cada ato de comunicao nico, renascendo apenas no ritual. Graas aos orixs, cada elemento individualizado do ponto de vista espiritual, no sendo, porm, um ser isolado nem autnomo, j que est ligado aos antepassados da humanidade, da nao a que pertence, do terreiro e de sua prpria famlia. Com o orix, cada pessoa participa dos poderes que governam todas estas substncias. Assim, por intermdio do segredo do ritual, se ligam e se constituem os vnculos comunitrios, evidenciando-se a potncia do sagrado que surge desta fuso do individuo na natureza, atravs da dimenso csmica. PRANDI (2005) afirma que depois de passar por muitas mudanas e de ter se propagado por todo o pas e adentrado os diferentes segmentos sociais, as

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religies afro-brasileiras ainda conservam a imagem de culto de mistrios e segredos, o que muitas vezes resulta numa idia de perigo e risco no imaginrio popular. Isso tem servido dos orixs desde sua formao no Brasil, mas essas religies sem duvida tero caminhado adiante do processo de legitimao social, j no se escondem da policia nem se limitam mais a parcelas fechadas da populao (PRANDI, op. cit.). A divulgao profana de aspectos da religio pelas artes, especialmente a msica popular, que atinge as massas pelo rdio e pela televiso, ter sem dvida contribudo para reduzir a marginalidade da religio dos deuses africanos, embora concorra tambm para afirmar esteretipos e confirmar velhos preconceitos. Religio que agora de todos, o Candombl enfatiza a idia de que a competio na sociedade bem mais aguda do que se podia pensar, que preciso chegar a nveis de conhecimento mgico e religioso muito mais densos e cifrados para melhor competir em cada instante da vida, e que o poder religioso tem amplas possibilidade de se fazer aumentar.

1.2. ETNOCONHECIMENTO: AS RELAES ENTRE O SABER POPULAR E O CONHECIMENTO CIENTFICO

O Conhecimento surge no Homem quando ele comea a se relacionar com o mundo. Portanto a Cincia faz o Homem Saber, ou seja, ter conscincia das coisas (MARTINS, 2001). Sendo a Cincia um modo de conhecimento, como j afirmava Lvy Strauss, o Homem no se limita apenas a adquirir conhecimento, mas tambm a produzir conhecimento, de forma criativa e inteligente (MARTINS, op. cit). A Pedagogia, enquanto Cincia da Educao tem incorporado no seu interior as polmicas sobre Conhecimento e verdade, que desafiaram o reinado do Positivismo. H mais de 30 anos que o conhecimento oficial, baseado no Racionalismo Cientificista, questionado pela Teoria Crtica da Educao pela

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Nova Sociologia da Educao inglesa, e mais recentemente, por educadores Neomarxistas alm de Ps-Modernos referenciados na obra de Michel Focault (LIMA, 2001a). No obstante, as pedagogias inspiradas no pensamento PauloFreireano insistem em partir do conhecimento do sujeito, obtido tanto de suas experincias singulares quanto das suas vivncias no coletivo, no que diz respeito, vida, ao trabalho e s lutas sociais. Assim, reconhecer o Etnoconhecimento implica em reconhecer a especificidade das formas de apropriao, ou seja, de uma Etnoaprendizagem, base para uma Etnoeducao. Mais recentemente, sob a influncia das Prticas Sociais e Simblicas (DIEGUES, 1998) e da Fenomenologia (SATO, 2001), emergiu fortemente na educao o debate acerca da Multireferencialidade, da EtnoMetodologia e da EtnoPesquisa Crtica. Apesar da diversidade, todos estes referenciais confluem para um ponto comum: o questionamento do conhecimento oficial com a nica cincia possvel (MACEDO, 2000). A Pedagogia, indubitavelmente, tem muito que aprender com a

Antropologia, a EtnoBiologia (EtnoEcologia, EtnoZoologia, EtnoBotnica, etc.) (CAMARGO, 2001). Mas, como em todo processo dialgico, tambm tem muito que ensinar. O desafio da Inter e da Transdisciplinaridade, do ponto de vista acadmico, parece, por vezes, mais difcil de superar que o abismo da falsa dicotomia Saber Cientfico - Saber Popular (LIMA, 2001b).

O conhecimento vulgar ou popular, s vezes denominado senso comum, no se distingue do conhecimento cientfico nem pela veracidade nem pela natureza do objeto conhecido: o que diferencia a forma, o modo ou o mtodo e os instrumentos do conhecer. (MARCONI & LAKATOS, 2004).

Portanto, valorizar o conhecimento popular, senso comum das comunidades tradicionais ou dos grupos sociais minoritrios tambm contribuir para uma Educao Popular e favorecer a construo de um conhecimento socializado significativo.

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O saber no nos torna melhores nem mais felizes, como afirmava Kleist, mas a Educao pode ajudar a nos tornarmos melhores, se no mais felizes, e nos ensinar a assumir a parte prosaica e viver a parte potica de nossas vidas. (MORIN, 2004).

1.3. A IMPORTNCIA SCIO ECONMICA - MDICA E CULTURAL DOS MOLUSCOS

O filo Mollusca constitui um dos grupos de invertebrados marinhos mais numerosos do globo, tem sido descritas aproximadamente 150.000 espcies vivas e mais de 35.000 espcies fsseis (TENRIO et al., 2002; BRUSCA & BRUSCA, 2002). Apresentam as mais variadas formas e habitats, sendo encontrados em todos os continentes e ambientes terrestres e aquticos, porm as espcies marinhas so mais abundantes. So popularmente conhecidos pelos nomes de caramujos, caracis, bzios, lesmas, mariscos, ostras, polvos e lulas. Os moluscos, por serem um dos filos mais antigos do planeta, com mais de trezentos milhes de anos desde a era Paleozica do Cambriano, so ainda, pouco estudados a respeito de suas influncias na vida do ser humano (MORAES & BRAVIN, 1998). A diversidade de interaes que as culturas humanas mantm com os animais tanto pode ser estudada do ponto de vista das disciplinas da Cincia ocidental, tais como zoologia, psicologia e etnologia, quanto pela perspectiva de EtnoCincia, mais particularmente de EtnoZoologia (COSTA-NETO, 2000). O autor supracitado faz uma reviso da literatura sobre estudos na rea de EtnoZoologia realizados no Brasil publicados at 1999. Foram listados 246 ttulos, destes apenas 9 referem-se a EtnoMalacologia, e de um modo geral os trabalhos enfocam os bivalves de importncia alimentar. A seguir apresentamos a importncia e uma descrio de diferentes tipos de uso dos Moluscos pela populao Humana.

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1.3.1. MOLUSCOS UTILIZADOS COMO MOEDAS

Conchas de gastrpodes constituam o dinheiro de vrias raas nativas raa Wampum de ndios americanos (STORER, 2002). Para os Iroqueses Wampum significa fileiras de conchas multicolores; Prolas de Bivalves eram utilizadas como moedas no Japo; O Cauri (conchas preciosas do tipo porcelana Cypraea moneta e C. annulus), na frica Oriental a mais conhecida concha-moeda ainda no sculo XIX era utilizada em vasta escala do Sudo a China e nas ilhas da Malsia (BIFANO, 1998); Conchas de Scaphopoda (Dentalium sp.), enfiadas em cordes foram o dinheiro dos ndios da Costa do Pacfico da Califrnia at o Alasca (SILVA, 2003); Em algumas civilizaes 20.000 conchas equivaliam a um saco de pele e 6.000 conchas U$ 1,00. Uma esposa jovem virgem valia de 60.000 a 100.000 conchas (equivalente de U$ 20 a 40,00), enquanto que as mais velhas valiam de 20.000 a 25.000 conchas (U$ 6,00);

1.3.2. PRODUO DE PROLAS

Algumas prolas formam-se em moluscos bivalves de gua doce, mas os tipos mais valiosos provem de ostras Perlferas marinhas (Pinctada margaritifera) do Golfo Prsico e do Oceano ndico. Os japoneses introduzem artificialmente pequenas partculas no manto e ento mantm os bilvalves, Pinctada sp., em agregados durante vrios anos, at que as prolas cultivadas sejam completamente formadas; A camada nacarada das conchas de bivalves de gua doce da famlia Mycetopodidae utilizada como ncleo de prolas cultivadas (BOFFI, 1979).

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1.3.3. MOLUSCOS UTILIZADOS NA PRODUO DE ARTESANATOS E ADORNOS

Os homens primitivos utilizavam as conchas de moluscos como pratos, talheres, vasilhas e enfeites (MORAES & BRAVIN, 1998); Na Itlia h grandes indstrias que utilizam a Madre Prola na fabricao de botes; Algumas espcies do gnero Diplodon (gua doce), devido sua grande espessura da concha, so empregadas nas indstrias de botes; Na China, algumas espcies de caracis tm sido utilizadas para a purificao da gua nas tecelagens da seda (MORAES & BRAVIN, op.cit.); Vrias espcies tem sido utilizadas na fabricao de Cortinas, abajures e artesanatos, tais como o Strombus goliath; Importantes na fabricao de cermicas e porcelanas muitos materiais de porcelanas so decoradas com temas malacolgicos - no Caribe o mesogastrpode Strombus gigas utilizado na fabricao de porcelana;

1.3.4. OS MOLUSCOS NA ECONOMIA EM GERAL

Conchas de ostras so usadas em estradas e fornecem Clcio para galinhas; As conchas de mariscos (Anomalocardia brasiliana) tm sido utilizadas como agregado na fabricao de elementos de pisos para moradia (NISHIDA et. al, 1998); Pequenas lascas de ncar dos bivalves de gua doce Mycetopodidae so includos nos pisos de Granilite (BOFFI, 1979).

1.3.5. OS MOLUSCOS E SUA IMPORTNCIA NA FARMACOLOGIA E MEDICINA

A literatura malacolgica cita a utilizao popular do molusco pulmonado terrestre Megalobulimus paranaguensis como medicamento ou remdio para o

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tratamento de certas doenas e ferimentos, em particular o muco produzido por animais vivos para cicatrizao de feridas, no interior do Estado do Paran (MORRETES, 1949, 1953). Atualmente, o muco produzido por escargots/caracis se apresenta com grande potencial na rea da indstria de produtos medicinais para a cicatrizao de feridas; As ostras so excelentes para o tratamento da Anemia contm vitaminas A e D em abundncia e sais minerais em grande quantidade, principalmente Ferro, Mangans e Cobre; Estudos e Pesquisas sobre o colgeno, encontrado em abundncia em clulas de caracis durante o inverno, tm sido utilizados na cura do Reumatismo; Hematologia os ovos dos caracis de jardim contm um elemento qumico que identifica os grupos sanguneos humanos, reduzindo acentuadamente o custo dos servios de transfuso; Nas ostras est contida uma substncia de alto poder antivrus e antibacteriana, que quando usada causa uma inibio do crescimento dos vrus da influenza de 90 a 99,9%;

1.3.6. CONQUILIOLOGIA E A ARTE DE COLECIONAR CONCHAS

Calgola (O Imperador) (40 d.C) formou expedies com o propsito de coletar conchas; Na Frana a Coleo do rei Louis XIII (1635) foi considerada a maior e a mais completa coleo real do sculo XVIII; Maria Thereza (1717-1780), Imperatriz da ustria, grande aficcionada s conchas, tinha um Museu em Viena; Em 1784, o botnico ingls James E. Smith comprou a coleo de conchas de Linnaeus por 1000 libras; Rara e considerada a mais bela concha do mundo a Glria do Mar (Conus gloriamaris); Algumas conchas chegam a valer 30.000 dlares (OLIVEIRA & ALMEIDA, 2000);

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1.3.7. OS MOLUSCOS E A HISTRIA

Carta de Pro Vaz de Caminha ao Rei de Portugal Porto seguro, ilha da Vera Cruz, 01 de maio de 1500: ... foram alguns buscar mariscos e apenas acharam... cascas de berbiges e amijoas, mas no toparam com nenhuma pea inteira... (REIGOTA, 2001); Gastrpodes terrestres nativos da familia Strophocheilidae, popularmente conhecidos como Ibi ou Aru-do-Mato, vm sendo consumidos pelo homem no territrio brasileiro desde tempos pr-hispnicos e histricos; Escavaes arqueolgicas na regio costeira catarinense de Laranjeiras, ao Norte de Florianpolis, revelaram que a espcie Psiloicus oblongus j era consumida pelos habitantes da regio (da tradio Itarar), entre os sculos IX e XII, uns 7 sculos antes da chegada dos europeus portugueses, no sculo XVI (AGUDO, 2002); Os imigrantes Italianos descobriram o Ibi (Psiloicus oblongus,

Megalobulimus granulosus) nos cafezais da regio costeira do Estado de So Paulo, no inicio do sculo XX, e passaram a consumi-lo, sendo preparado da mesma maneira que os escargots/caracis europeus. Foram encontrados adornos com prolas em tmulos Egpcios que datam mais de 3000 anos a C. Clepatra usava colares de prolas de ostras, em forma de pras; Os portugueses davam o nome ao Murex senegalensis de Mrice, como se v na estrofe de Os Lusadas de Luis Vaz da Cames (SANTOS, 1982):

Ns da sua companhia, se mostrava Da tinta que d o mrice excelente A vria cor, que os olhos alegrava.

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1.3.8. OS MOLUSCOS E A HISTRIA POPULAR

Nas Crendices Amaznicas, muitas caboclas amazonenses justificam vcios secretos com a expresso fazer uru (referindo-se ao gastrpode Pomacea conhecido como lol ou Aru) que significa o mesmo que Lesbianismo (SANTOS, 1982); Populaes ribeirinhas do Estado do Par consomem o Teredo (turus) na cultura popular teria funes afrodisacas (viagra do mangue); Plnio em sua obra Histria Natural diz que viu um Trito que buzinava atravs da concha de um molusco na grota da Lusitnia (SANTOS, op. cit); Os moluscos, em geral, so usados nas propagandas e desenhos animados de Tv e/ou como charge de humor;

1.3.9. MITOS E FABULAS: O IMAGINRIO MALACOLGICO

Sobre o imaginrio, DIEGUES (1998, pg. 131), descreve: Esse oceano era tambm a morada de monstro, considerados como uma transgresso da natureza e para os quais o mar se prestava como abrigo perfeito, porque ele tambm afrontava Deus. A presena de monstros era constante na cartografia medieval e das descobertas e mesmo quando dela desaparece, continua na literatura sob a forma de polvo gigantes descritos por Jlio Verne e Vtor Hugo. A contrrio do mar aberto, perigoso e temido, a lagoa de Araruama:... dava o peixe, o camaro, os mariscos, e era boa, no comia o que era dos pobres. Era mais que uma me, a lagoa azul. De dentro de suas guas vinha a abastana, do fundo de suas terras, as conchas que queimavam (...) DIEGUES (1998, pg. 217).

1.3.10. NUTRIO: IMPORTNCIA ALIMENTAR DOS MOLUSCOS

Vrias espcies de gastrpodes so utilizadas na alimentao humana (Trochidae, Turbinidae, Strombidae, Cassididae, Olividae, Volutidae, etc); Helix

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pomatia o verdadeiro Escargot (traduo Francesa de Caracol) muito apreciado na Europa; Haliotis muito apreciado no Japo e no oeste do EUA; Thais haemastoma utilizada como alimento pelos Caiaras Brasileiros; O Brasil possui cerca de 60 espcies de moluscos comestveis (marinhos, de gua doce e terrestres); Nas Filipinas, h regies em que o povo consome todo tipo de moluscos, inclusive o Conus venenoso, que fervido e servido com arroz (BIFANO, 1998). Os mariscos so relativamente pobres em calorias e constitui boa fonte de protenas, em percentagens que podem rondar os 20%, ferro (menos que a carne) e de outros minerais como o zinco e o cobre. A maior parte das espcies tambm fornece uma boa quantidade de vitaminas do complexo B e Iodo e no so excessivamente ricos em Sdio. Mesmo os mariscos com mais colesterol tm pouco mais do que carne de vaca magra, vitela ou carne de porco. A quantidade total de gordura normalmente no ultrapassa os 3% e a gordura saturada tambm reduzida - alm de cidos gordos da srie Omega 3 (protetores face s doenas cardiovasculares) embora em quantidades reduzidas (disponvel em

http://www.saudemais.pt/nutricao/0006/moluscos.html, acesso em 21/09/2003); Diga-se, por curiosidade, que 12 a 14 pequenas ostras fornecem 182 miligramas de zinco, aproximadamente dez vezes mais do que as necessidades dirias preconizadas. Mytella falcata (Mytilidae) possui elevada quantidade de protenas o teor protico equivale ao da carne de frango e de boi; Os bivalves de gua doce da famlia Mycetopodidae so utilizados como alimento para o homem e aves de corte (BOFFI, 1979).

1.3.11. MALACOCULTURA

Existe diversas denominaes para a produo de moluscos em cativeiro e/ou fazendas: Strophocheilicultura criao de Aru-do-Mato (Ibi);

Helicicultura (escargot) criao do Helix aspersa, Helix lucorum e Helix pomatia, sendo consumidos de 50 a 100 toneladas por ano (mundo);

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Ostreicultura (ostras) aproximadamente 1.000.000 toneladas por ano no mundo; Mitilicultura (Mexilho) aproximadamente 500.000 toneladas por ano; O Japo consome por ano 30.000 toneladas de moluscos e a Frana (Paris) 500.000; A ostreicultura e a mitilicultura so atividades bem sucedidas no litoral de Santa Catarina, o autor usou espcies de bivalves da infauna, com potenciais para o cultivo. Levando-se em conta o aspecto, o sabor, a textura e a aceitao para o consumo destacando-se as espcies: Atrina seminuda; Cyrtopleura costata; Dosinia concentrica; Iphigenia brasiliana; Lucina pectinata e Trachycardium muricatum (SILVA et al. 1999).

1.3.12. SAMBAQUIS

Na costa brasileira ocorre grande nmero de pequenas elevaes constitudas, predominantemente, de conchas marinhas. So conhecidas como Sambaquis ou Casqueiros. Chegam a atingir at 25 metros de altura, mas, em geral, no sobrepassam 6 metros. Alm da dieta alimentar, aspectos culturais e paleoambientais podem ser reconstitudos a partir do melhor conhecimento da malacofauna de interesse arqueolgico (MELLO, 1999). Elemento constitutivo mais importante dos sambaquis da ilha de Santo Amaro, assim como em todo o litoral brasileiro, so as conchas de bivalves marinhos. s vezes predominam entre elas os berbiges (Anomalocardia); outras vezes, as ostras (Crassostrea). Podem revezar-se, num mesmo sambaqui, massas de berbiges e massas de ostras, mexilhes (mitildeos), amijoas (Phacoides); Em menor proporo, figuram tambm outros bivalves marinhos e gastrpodes marinhos ou terrestres. Entre os ltimos, destacam-se os caramujos de "lbios cr-de-rosa (Strophocheilidae, comumente chamados de Aru-domato). Sambaqui da Ilha dos Ratos, baa de Guaratuba, Estado do Paran, por exemplo, foi datado de 1560 anos, com erro possvel de 150 anos para mais ou

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para menos. Sambaqui do Macedo localizado em Alexandre, tambm no Paran, foi datado de 3 700 anos. O mais antigo sambaqui paranaense foi datado de 4.907 anos, com erro possvel de 65 anos.

1.4. OS MOLUSCOS E SUA UTILIZAO NAS RELIGIES

As conchas de moluscos tm sido usadas em rituais com valor religioso e simblico. O deus Vishnu, adorado pelo povo Hindu, possui em um de seus braos a concha de Xancus pyrum (Figura 1), considerada um elemento sagrado do deus. Vishnu considerado como o deus maior no hindusmo e na mitologia indiana, ele tido como o preservador do universo (disponvel acesso em em

http://www.amorcosmico.com.br/hinduismo/divindades/vishnu.asp, 02/05/2004).

A comunidade Hindu considera como sagrada uma concha, a qual pesada, branca e especialmente quando tem uma espira reversa, sendo muito rara. Os bivalves da famlia Pectinidae, no Peru (entre os Incas), na Inglaterra e Frana durante a Idade Mdia, na Grcia antiga (entre os Felcios e Srios) eram utilizados em rituais religiosos ou estticos e de inspirao para artistas. No Brasil as formas de conchas de moluscos so utilizadas para decorar chafarizes e igrejas, principalmente nas obras de Aleijadinho. Vrias civilizaes na frica, Polinsia, Nova Guin, sia, Malsia, Amrica do Sul (Maias) utilizaram os moluscos na fabricao de mscaras e magias em rituais religiosos. Muitas Igrejas Crists usam as valvas de Tridacna gigas, espcies com 2m de comprimento, 70 cm de largura e pesam 200 kg, para armazenar gua benta para o batismo.

provvel que a vieira tenha sido a maior fonte de inspirao para os artistas (BIFANO, 1998).

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Na pintura em leo sobre tela O Nascimento de Vnus de Sandro Botticelli (1480-1487), (BUFINICH, 2002), pode-se observar a deusa sobre a concha de um bivalve Pectinidae vieira.Da espuma do mar, fecundada pelo sangue de Urano (cu), nasceu uma jovem levada em primeiro lugar para ilha de Ctera, e em seguida para Chipre. Deusa encantadora, no tardou em percorrer a costa, e as flores nasciam sob os seus ps delicados. Chama-se Afrodite (Vnus) ou Cteria, do nome da ilha que aportou ou ainda Cipris, do nome da ilha em que honrada. Nas pinturas antigas, Vnus freqentemente representada deitada sobre uma simples concha (...) DIEGUES (1998, pg. 162).

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2. OBJETIVOS

2.1. GERAL:

Compreender as relaes entre o Saber Popular e o Conhecimento Cientfico, sobre os moluscos, no terreiro de Candombl de Recife e Olinda, PE;

2.2. OBJETIVOS ESPECFICOS:

Investigar o papel dos moluscos como importncia cultural, ornamental, alimentar, farmacolgico, como elemento sagrado e na simbologia dos terreiros de Candombl;

Analisar as concepes de natureza das crianas que participam da religiosidade do Candombl de Recife e Olinda, com o intuito de contribuir para uma alfabetizao ambiental de jovens e adultos dos terreiros de Candombl;

Desenvolver uma prtica pedaggica que valorizem e explore positivamente as diversidades religiosas e culturais nos terreiros de Candombl;

Favorecer o uso sustentvel e para a conservao da fauna de moluscos, os quais so utilizados pelos atores sociais do Candombl de Recife e Olinda, a partir de atividades de Educao Ambiental nos terreiros;

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3. PROCEDIMENTOS METODOLGICOS

O pesquisador parte fundamental na Pesquisa Qualitativa, assim como na sua imerso no cotidiano, a familiaridade com os acontecimentos dirios e a percepo das concepes que os sujeitos tm nas representaes, parciais e incompletas, mas construdas com relativa coerncia em relao sua viso e experincia. A concepo metodolgica deste trabalho se enquadra no Estudo de Campo e como estratgia para realizao da pesquisa optamos pelo Terreiro Oba Ogunt (Stio de Pai Ado) e o Terreiro Il Oloxum, respectivamente nas cidades de Recife e Olinda, considerando o sujeito e todos que fazem a comunidade afro descendente como espaos culturais e educativos. Neste estudo utilizou-se a Pesquisa Fenomenolgica e Etnogrfica como eixo norteador.A Fenomenologia entende que entre o ambiente e o sujeito h um lugar de encontro e compartilhamento (um hbitat), isto , um hbitat onde o mundo encontra o homem e a mulher (os habitantes), onde a mulher e o homem encontram o mundo: este locus o lugar da manifestao, o lugar do fenmeno: o aparecimento do ser (o hbito). Em outras palavras, parece que o fenmeno o que nos mediatiza para o mundo e que mediatiza o mundo para ns (PASSOS & SATO, 2005).

Partindo deste princpio levou-se em considerao o relato de vivncias e de experincias dos atores sociais dos terreiros de Candombl de Recife e Olinda, Estado de Pernambuco. A Pesquisa Fenomenolgica, como afirma SATO (2001), trabalha com os significados das experincias de vida sobre uma determinada concepo ou fenmeno, explorando a estrutura da conscincia humana. Os pesquisadores buscam a estrutura invarivel (ou essncia), com elementos externos e internos baseados na memria, imagens, significaes e vivncias (subjetividade). H uma ruptura da dicotomia sujeito-objeto e dos modelos exageradamente

cientificistas.

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Quanto a Pesquisa Etnogrfica, esta trabalha com a descrio e interpretao de uma cultura, de um grupo social ou de um sistema. Caracterizada por ser uma pesquisa tradicional da Antropologia Clssica, requer cuidadosa observao ou imerso no cotidiano da populao considerada, resgatando a sabedoria das comunidades e suas relaes culturais (SATO, op. cit.).

O Mtodo Etnogrfico uma modalidade de investigao naturalista, tendo como base a observao e a descrio. Pretende descrever, explicar e interpretar a cultura. Outro ponto importante o de seguir certas normas bsicas, como deixar de lado preconceitos e esteretipos e agir como participante. Questionar sobre o que parece comum o observar o tipo de relaes encontradas no meio ambiente. (MARCONI & LAKATOS, 2004).

Os procedimentos metodolgicos utilizados para coleta de dados foram:

Metodologia Qualitativa: utilizou-se a Pesquisa Fenomenolgica e Etnogrfica, atravs da Observao Participante e Entrevistas com Babalorixs e Yalorixs.

Por sua natureza interativa, a Entrevista permite tratar de temas complexos que dificilmente poderiam ser investigados adequadamente atravs de questionrios, explorando-os em profundidade. A entrevista pode ser a principal tcnica de coleta de dados ou pode ser parte integrante da observao participante. De um modo geral, as entrevistas qualitativas so muito pouco estruturadas, sem um fraseamento e uma ordem rigidamente estabelecidos para as perguntas, assemelhando-se muito a uma conversa. Tipicamente, o investigador est interessado em compreender o significado atribudo pelos sujeitos a eventos, situaes, processos ou personagens que fazem parte de sua vida cotidiana (ALVES-MAZZOTTI & GEWANDSZNAJDER, 1999).

Utilizou-se a entrevista no estruturada, onde o entrevistador introduz o tema da pesquisa, pedindo que o sujeito fale um pouco sobre ele, sendo eventualmente inserido alguns tpicos de interesse no fluxo da conversa. Este tipo de entrevista , segundo ALVES-MAZZOTTI &

GEWANDSZNAJDER (op. cit.), usado no incio da coleta de dados, quando o entrevistador tem pouca clareza sobre aspectos mais especficos a serem

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focalizados, e frequentemente complementado, no decorrer da pesquisa, por entrevistas semi-estruturada.

Pesquisa Documental: a pesquisa bibliogrfica foi realizada atravs do uso de Leis (Lei 10.639/2003); Documentos Histricos, livros, artigos, dissertaes, revistas cientficas e sites educativos.

Registro das espcies de moluscos utilizados nos terreiros de Candombl: vrios espcimes de moluscos, utilizados nos terreiros de Candombl, foram doados pelos Babalorixs e Yalorixs, para serem identificados no nvel de espcie;

Concepes e/ou Percepes de Natureza: foi feito duas oficinas pedaggicas com desenhos sobre a representao de Natureza das crianas que freqentam os terreiros de Candombl. A anlise das figuras e frases foi baseada de acordo com as categorias descritas em TAMAIO (2002).

Excurso a Mata do Passarinho: como atividade do Projeto de Educao Ambiental nos terreiros de Candombl, foi feito visitas e dinmicas de grupo na Reserva da Mata do Passarinho, com o intuito de sensibilizar os atores sociais do Candombl sobre as questes ambientais e os rituais religiosos Afro-Brasileiros.

Palestras Educativas: foram desenvolvidas palestras sobre a importncia da Mata do Passarinho, assim como foi discutido a necessidade de conservao da mata e de como se devem usar os recursos naturais de forma sustentvel. Foi desenvolvido palestras sobre plantas sagradas, utilizadas no Candombl, e suas propriedades farmacolgicas.

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4. CARACTERIZAO DA REA DE ESTUDO E POPULAO ALVO DA PESQUISA

Os navios negreiros transportaram atravs do Atlntico, durante mais de trezentos e cinqenta anos, no apenas o contingente de cativos destinados ao trabalho de minerao, dos canaviais, das plantaes de fumo localizadas no Novo Mundo, como tambm a sua personalidade a sua maneira de ser e de se comportar, as suas Crenas. As conveces religiosas dos escravos eram, entretanto colocadas a duras provas quando de sua chegada ao Novo Mundo, onde eram batizados obrigatoriamente para salvao de sua alma e deviam curvar-se s doutrinas religiosas de seus mestres. A extraordinria resistncia oposta pelas religies africanas s foras de alienao e de extermnio com que freqentemente se defrontavam haveria de surpreender a todos aqueles que tentavam justificar a cruel instituio do trafico de escravos com o argumento de que a suas atividades as dos negreiros constituam o meio mais seguro e mais desejvel de conduzir Igreja as almas dos negros, o que seria mais recomendvel do que os deixar na frica, onde se perderiam num paganismo degradante ou estariam ameaados pelo perigo da sujeio hertica s naes estrangeiras, para onde seriam, no mnimo, deploravelmente enviados (CUNHA-JUNIOR, 1992). As primeiras menes as Religies Africanas no Brasil so de 1680, por ocasio das pesquisas do Santo Ofcio da Inquisio, quando Sebastio Barreto denunciava o costume que tinham os negros, na Bahia, de matar animais, quando de luto, para lavar-se no sangue, dizendo que a alma, ento, deixava o corpo para subir ao cu. Por volta de 1780, em documentos relativos a esse mesmo Santo Ofcio, h menes sobre pretas da Costa da Mina que faziam bailes s escondidas, com uma preta mestra e com altar de dolos, adorando bodes vivos, untando seus corpos com diversos leos, sangue de galo e dando a comer bolo de milho depois de diversas bnos supersticiosas.

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No se sabe com preciso a data de todos esses acontecimentos, pois no inicio do Sculo XIX, a religio catlica era ainda a nica autorizada. As reunies de protestantes eram toleradas s para os estrangeiros; o islamismo, que provocara uma serie de revoltas de escravos entre 1808 e 1835, era formalmente proibido e perseguido com extremo rigor; os cultos aos deuses africanos eram ignorados e passavam por praticas supersticiosas. Tais cultos tinham um carter clandestino e as pessoas que neles tomavam parte eram perseguidas pelas autoridades. A populao de origem africana (ex-escravo) da ordem de 60% do total da populao brasileira, sendo constitudo de um longo contingente de negros mestios (CUNHA-JUNIOR, 1992). Embora a abolio da escravatura tenha ocorrido a mais de 100 anos, o Brasil no logrou romper completamente com as contradies escravocratas, dificultando a transio do ex-escravo para um cidado no sentido amplo e no apenas constitucional.

4.1. CULTURA E RELIGIO NOS TERREIROS DE CANDOMBL DE RECIFE E OLINDA, PERNAMBUCO

O presente trabalho foi desenvolvido em 3 terreiros de Candombl, sendo Yemanja Ogunt Stio de Pai Ado no Recife, Il Oloxum e Nosso Senhor do Bonfim em Olinda (Figura 5 e 6). Na segunda metade do Sculo XIX chega a Recife, vinda de Oy, a negra Ifatinuke, responsvel pela Fundao, em 1875, do primeiro terreiro de Xang em Pernambuco, o Terreiro Yemanja Ogunt, hoje mais conhecido como Stio de Pai Ado (AMARAL, 2005), est localizado na estrada velha, no bairro de gua Fria, Recife-PE. Foi graas a esta Casa que a Cultura da Nao Nag se manteve viva em Pernambuco, sendo este Terreiro um dos grandes marcos da resistncia negra no Estado, e terreiro fundado no Brasil. Os dois primeiros terreiros fundados no Brasil, esto localizados em Bahia. Consagrado a Yemanj, foi tombado pelo Governo do Estado, em 1986, como patrimnio histrico e cultural (FUNDARPE, 1994), sendo referncia

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nacional em estudos e pesquisas da religio afro-brasileira, contando com mais de 1.000 adeptos, entre Babalorixs, Yalorixs e Filhos de Santo. Hoje, alm de conservar as tradies religiosas, o Stio desenvolve um trabalho com jovens e crianas no Centro Cultural Afro Pai Ado, por meio do Afox Povo de Ogunt e do Maracatu Razes de Pai Ado. Com a misso de preservar, resgatar e demonstrar e sua resistncia nos dias atuais. No caso do terreiro Yemanja Ogunt, o pai do terreiro que lhe deu notoriedade foi Felipe Sabino da Costa, tambm conhecido como pai Ado, sacerdote possuidor de personalidade especial, exercendo funes inclusive de juiz, conselheiro e mdico. O terreiro o local de reunies, os elos necessrios ao culto dos orixs e onde a memria afro-brasileira aquecida atravs dos rituais que podem ser dirios ou cclicos (DIAS, 2005). As instalaes fsicas do terreiro em muito pouco se diferem dos mocambos espalhados pelos subrbios do Recife. Os prdios destinados aos cultos so construes de poca e materiais diversos como taipa, tijolos, coberta com telha canal e francesas demonstrando a construo simples e precria. Contando com mais de 70 filiais no Pas e uma em Portugal, o Terreiro Yemanja Ogunt um dos mais respeitados do Brasil. Personalidades como Seu Valfrido, Ogan de 89 anos, Dona Djanira, Yalorixa de 88 anos, e Tia Mezinha Yalorixa, tambm, filha de Pai Ado - sabedores de rituais e conhecedores das histrias esto vivos para cont-las. Foi do Terreiro de Pai Ado que saiu rumo ao Mar, no incio da Dcada de 30, a primeira panela em homenagem a Yemanj, incentivando outros terreiros a fazer este tipo de oferenda aos Orixs. S aps o toque pra Iemanj no Terreiro Yemanja Ogunt que os outros terreiros reverenciam a Senhora do Mar. O terreiro de Il Oloxum est localizado no bairro do Passarinho, OlindaPE, tendo como responsvel o Babalorix Senhor Genivaldo, mais conhecido como Pai Vadinho, sendo lder comunitrio e cultural de Olinda. Este terreiro raiz do Stio de Pai Ado (Yemanja Ogunt).

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O terreiro Nosso Senhor do Bomfim (Oxal), est localizado no bairro de guas Compridas na cidade de Olinda-PE. Sendo um marco de resistncia na religiosidade do Candombl, com sua lder religiosa, fundadora, Me Ldia que foi torturada na dcada de 30 por ser praticante da religio Afro-Brasileira.

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5. RESULTADOS E DISCUSSO5.1. AS PERCEPES DOS BABALORIXS E YALORIXS DO

CANDOMBL SOBRE OS MOLUSCOS

Existe um domnio da vida que pode ser entendida como vida por excelncia: a vida do cotidiano (senso comum) (BOCK et. al, 1995). no cotidiano que tudo flui, que as coisas acontecem, que nos sentimos vivos, que sentimos a realidade.

O Cotidiano e o Conhecimento Cientfico que temos da realidade aproxima-se e se afastam: aproximam-se porque a Cincia se refere ao real; afastam-se porque a Cincia abstrai a realidade para compreende-la melhor, ou seja, a Cincia afasta da realidade, transformando-a em objeto de investigao (BOCK et al., op. cit).

Com intuito de investigar na realidade a presena dos moluscos no cotidiano do Candombl, nesta pesquisa foram entrevistados 4 Babalorixs (homens) e 3 Yalorixs (mulheres), buscando compreender as suas concepes sobre a importncia e o uso destes animais nos terrerios de Candombl de Recife o Olinda (Ver em Anexo as transcries completas das entrevistas). Dos sete entrevistados, todos afirmam a importncia dos moluscos nos rituais dos terreiros de Candombl (ver Quadro I), principalmente os 4 mais sagrados moluscos, Cauri, Ibi, Aru e o Ikoto. importante evidenciar que todos os moluscos utilizados nos rituais religiosos do Candombl, devem passar pelo Amassi, ou seja, deve ser lavados com extratos de folhas de vegetais sagrados ao seu Orix.

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Quadro I Os Orixs, o uso e a importncia dos moluscos nos terreiros de Candombl.

Molusco (nome popular e cientfico) EXU (Bar): dono das Cauri ou bzio encruzilhadas; abridor dos Cypraea sp. caminhos; representa a fora vital que movimenta o Universo; mensageiro dos orixs; Orix da Ibi (Psiloicus sp. ou sensualidade. Megabulinus sp. ou Achatina fulica) OGUM: dono do trabalho Cauri ou bzio em metal e da agricultura; Cypraea sp. domnio das tecnologias;

Orix

Uso e Importncia do molusco na Religio do Candombl Uso no assentamento; a Esttua de Exu decorada com este molusco (por exemplo, os olhos, dentes, nariz so representados pelos cauris); usado para tirar a fria de Exu; no assentamento; No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Ogum; Decorao do Capacete, do Peitoral (escudo) e no Ax (roupa); Usado no Contregum (pulseira feita com palha da costa e cauris); No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Yans; Decorao do Ad e do Ax; Assentamentos e no tratamento de problemas de loucura e de doenas graves; No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Xang; Decorao do Ax e da Coroa; No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Oxum; Decorao do Ad e do Ax; do Abeb (espelho todo decorado com cauris);

YANS: dona dos raios, Cauri ou bzio ventos, tempestades e das Cypraea sp. guas. Ibi (Psiloicus sp. ou Megabulinus sp. ou Achatina fulica) XANG: orix do trovo, Cauri ou bzio Cypraea sp. do fogo e da justia. OXUM: dono da gua Cauri ou bzio doce; do ouro, riqueza, do Cypraea sp.; amor e da vida; dono da maternidade (da concepo at a primeira infncia); Bzio chapu Strombus goliath Schreter, 1805;

Decorao dos altares;

Bzio - Strombus gallus Linnaeus, 1758 Bzio - Cassis tuberosa (Linnaeus, 1758)

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

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OXUM

Bzio - Charonia variegata (Lamarck, 1816) Bzio - Chicoreus spectrum (Reeve, 1846)

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

Bzio - Vasum cassiforme (Kiener, 1841) YEMAJ: dona dos mars; Cauri ou bzio da maternidade e da (Cypraea sp.); fertilidade;

Decorao dos altares;

No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Yemaj; decorao de altares; Ad e do Ax;

Bzio chapu Strombus goliath Schreter, 1805; Bzio - Strombus gallus Linnaeus, 1758 Bzio - Cassis tuberosa (Linnaeus, 1758) Bzio - Charonia variegata (Lamarck, 1816) Bzio - Chicoreus spectrum (Reeve, 1846) Bzio - Vasum cassiforme (Kiener, 1841) NAN: av de todos os Cauri ou bzio Orixs; orix das (Cypraea sp.); profundezas;

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

Decorao dos altares;

No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Nana; decorao do Ad e do Ax; Opaxor (tipo de cajado); Oferece no Or (cabea) das pessoas que esto com problemas de loucura e no tratamento de doenas em geral;

Pomacea lineata (Spix, 1827)

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Ibi (Psiloicus sp. ou Megabulinus sp. ou Achatina fulica) OBALUAI (Xapon): Cauri ou bzio mdico dos pobres (Cypraea sp.); (protetor de doenas epidmicas); tem o dom da vida e da morte; OSSANHA: dono das Cauri ou bzio folhas; protetor das (Cypraea sp.); doenas internas, pernas e ossos; OB: Orix ioruba Cauri ou bzio semelhante Oya. Orix (Cypraea sp.); do rio Ob, foi a terceira das esposas de Xang, e tambm mulher de Ogum. Segundo uma lenda de If, Ob era muito enrgica e forte, mais que alguns orixs masculinos, vencendo na luta, Oxal, Xang e Orunmil. OXOSSI: protetor dos Cauri ou bzio (Cypraea sp.); animais e das caas; NAN OXAL: pai de todos os Cauri ou bzio orixs; da vida, da paz e da (Cypraea sp.); viso; Pomacea lineata (Spix, 1827)

Assentamento e no tratamento de problemas de loucura e de doenas graves; No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Obaluai; Na decorao do Ax com palha da costa e cauris; Opaxor (tipo de cajado); No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Ossabha;

No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Oba; decorao do Ad e do Ax;

No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Oxossi; decorao da coroa e do Ax; No assentamento; Na mo de jogo de filhos de Oxal;

Usado no tratamento de problemas de loucura e doenas em geral; Assentamentos e no tratamento de problemas de loucura e de doenas graves;

Ibi (Psiloicus sp. ou Megabulinus sp. ou Achatina fulica)

A partir dos relatos das experincias do Babalorixs e Ys, podemos evidenciar os seguintes aspectos sobre a utilizao do moluscos na religio Afro-Brasileira, Candombl:

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5.1.1. O Cauri (Buzios, Buzo) Cypraea sp. (Mollusca, Gastropoda, Prosobranchia, Mesogastropoda, Cypraeidae) (Figura 7)

Na religio afro-brasileira do Candombl, o Cauri o molusco mais sagrado, representando fora, poder e sabedoria. A concha usada para If (Orix da adivinhao), para a palavra do Oxal e para todo o tipo de iniciao (Obor) at a finalizao (Axx); So usados nos Assentamentos. Elas vo dentro de uma cabaa, com terra, que representa a criao do mundo. colocada entre a porta da entrada das casas ou acima da porta da casa (comunicao pessoal do Babalorix Toinho de Oxum) (em Anexo as transcries das entrevistas com os Babalorixs e Yalorixs). Nos assentamentos e Altares (pedras Ib) tem sido utilizado vrias espcies de gastrpodes marinhos (Altar de Yemanj) e de gua doce, tais como as conhas de Pomacea sp. (ll ou aru) e tambm conchas marinhas (Altar de Oxum) (Figura 8). Vale salientar que o gnero Cypraea sp. (Cauri) utilizado em todos os tipos de assentamentos de todos os Orixs. So tambm utilizados no Jogo de Bzios (Sistema de Orculo), considerado o corao da religio (comunicao pessoal da Yalorix Me Lau de Oxal);

o meio de comunicao com os Orixs, principalmente Exu no para todo mundo, a importncia muito grande, no um trofu (...) o Buzio (cauri) uma coisa muito sagrada determinada por Exu (comunicao pessoal do Babalorix Pai Toinho de Oxum); Vrios Buzios pequenos dentro de uma bolsa eram colocados nos ps de Xang (comunicao pessoal da Yalorix Tia Maezinha);

O Cauri tem sido utilizado na fabricao do Anel de Formatura o qual indentifica o iniciado no candombl, com mais de 7 anos de feito, ou seja, j tem

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recebido Deka (significa que este j um Babalorix ou Yalorix, podendo abrir seu prprio terrero e iniciar seus filhos); Est presente no estandarte do Maracatu, uma vez que este surge dos terreiros de Candombl os Buzios esto l representando esse ritual, essa religio, e forte os Buzios no Estandarte do Maracatu (Babalorix Manoel Nascimento Costa) (Figura 9). Os estandartes do Maracat e Afox, so bordados ornamentados com moluscos (Cypraea sp.), quanto mais Cypraea maior o Status de nobresa;

Os dologuns (bzios, cauri) que geralmente so colocados no estandarte do Maracatu e Afox, demonstrando riqueza, pois antigamente os pagamentos eram feitos com bzios, tanto em Pernambuco com em Bahia demonstra poder, riqueza e nobreza. Quanto maior o nmero de bzios no estandarte maior o poder de nobreza (Comunicao Pessoal de Rivaldo Pessoa, Og presidente do Afox Ogun Toperin).

. Ele faz parte do Ib, pode ser chamando de Cuia Astral do filho de santo. onde ele tem sintonia e energia com o Orix; Usado com finalidade de fortificao, de cincia de viso, de sade e pra acalmar a casa destino da casa; Est presente nas Amarraoes das Guias (tipo de colar); nos Adins (missangas ou contas, ou colar) o qual usado no pescoo e nos Moces pulseiras de braos, feito de buzios e palha da costa (Buriti). A espcie Cypraea zebra usada nos colares, adornos e adereos dos filhos de Orixal (mesmo que Oxal) (Figura 10); A Cypraea utilizada nos Ad coroa utilizada para a sada (apresentao) do iniciado no Candombl ao pblico (Figura 10); J serviu de dinheiro na frica, trocava por milho, trigo, e trocava para fazer roupas (vstimes);

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5.1.2. O Ibi (Igbin, Aru-do-Mato, Ibi Africano ou Caracol Gigante Africano)

Essa espcie de caracol do mato vegetariano simbolisa a fecundidade, principalmente nas oferendas para Oxal, mas pode tambm ser usado para Yemanj (afirmao feita por todos os entrevistados); Chamado de Boi de Oxal, Boi Manso de Sangue Branco nas oferendas do Fanti-Ashanti, nao de Candombl praticado no Maranho. Requer um grande ritual com muita cerimnia e resguardos. As pessosas tiram de 7 a 21 dias sem sexo, sem bebida e sem fumo e passam pelo menos 7 dias na casa do Orix, da o poder desse molusco, afirma o Babalorix Manoel Nascimento Costa;

Tambm conhecido como Ibin de Orixal, antigamente utilizavase buzios vivos dentro de uma bacia nos ps de Oxal, Yemanj e Oxum (comunicao pessoal de Yalorixla Tia Maezinha);

usado para tirar a fria de Exu , nos assentamentos, no sacrficio de NN, nos problemas de loucura e de doenas graves:

Eu conheo um Eb que foi feito pra uma pessoa que estava na porta da morte, eu no daria nada que aquela pessoa sobrevivesse, e a pessoa me pediu ajuda, eu disse: - Olha, eu vou colaborar mais no sei, mais pra ajudar a acalmar, pois a pessoa estava na porta da morte, pra que parta, em paz e a pessoa levantou-se at hoje. Mas a, pessoa que fez, fez com tanta f e usou tantas palavras sagradas que eu no duvidei, mas, j fez no intuito que a pessoa descansasse , que no agonizasse tanto pra morrer em paz. E a pessoa levantou do dia pra noite, e mim deixou com mais confiana, eu no usei o ritual daquela pessoa mais guardei bem; depois eu mim formei porque foi feito aquele trabalho e ele mim disse que s tinha dois caminhos ou partia em paz ou se levantava de uma vez. O que ocorreu! (...) : gente eu no posso acreditar que um molusco daquele, pode levantar a vida de uma pessoa, porque o mdico dele tinha desenganado, tinha dito a me da pessoa, olhe a senhora prepare a roupa, deixe o documento dele tranqilo que ele j t realmente no leito de morte, tudo que a gente t fazendo j no pra salvar a vida, a gente t dando uma morte digna pra ele porque j esta emtubado, muito difcil pra senhora como me escuta essa palavra, mas amanh se ele entrar em bito a gente comunica, e no adianta a senhora insiste

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na porta do Hospital (comunicao pessoal do Babalorix Pai Toinho de Oxum); Pessoas que tinha sido considerado desenganado pelos mdicos e usou o servio com Ibin, a pessoa levantou e ficou curada ... tenho um filho de Santo que o mdico dizia que ele estava condenado com arritmia no corao. Tinha 3 cateterismo e se fez pra ele o servio e ele at hoje j faz 10 anos dele feito e nunca mais ele teve nada no corao. Inclusive um filho de Yans. Graas a deus, Yans e Oxal, que botou a mo em cima e ele est curado (comunicao pessoal da Yalorix Me Lau de Oxal).

O Ibi verdadeiro (Aru-do-Mato do gnero Psiloicus sp. ou Megabulinus sp.) tem sido utilizado como animal sagrado no Candombl. No entanto este molusco est ameado de extino devido a caa predatria e a destruio dos ecossistemas.

O Ibin mesmo, esta difcil aqui, eu acho que aqui no tem no, s na Mata ..... bicho da mata mas eu nunca mais vi no, no tempo do meu pai tinha cada um grande, enorme tinha vez, que ele chegava a ficar todo abertinho mesmo bonitinho ele dentro da garapa, fica ali dentro e ali se abri todinho pra beber aquele Assadake (gua, mel e fub) (comunicao pessoa da Yalorix Tia Mezinha).

No final da dcada de 80, o caracol gigante Africano (Achatina fulica) foi introduzido no Brasil visando o cultivo e a comercializao como escargot (TELLES et al., 1997), sendo atualmente registrado em quase todo o territrio brasileiro (ABLIO, 2004). Esse caracol tem sido comercializado como o Ibi sagrado, como substituio da espcie nativa do Brasil.O Ibi Africano (Achatina sp.) pode ser utilizado, em ultimo caso, mas o Ibi verdadeiro (Psiloicus sp. ou Megabulinus sp) que deve ser utilizado nos rituais sagrados (comunicao pessoal dos Babalorixs Manoel Nascimento da Costa e Pai Vadinho).

O manuseio do Achatina acabou por fazer com que esse animal se alastrasse nos ambientes naturais. Sua alta fecundidade, por ser um animal hermafrodita, pode produzir at 500 ovos por ano, e seu hbito alimentar amplo,

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herbvoro generalista, fez com que a populao desses animais crescesse exponencialmente e se alastrasse rapidamente, sendo hoje em dia considerados pragas, atacando lavouras, hortas e at mesmo jardins em reas urbanas (PAIVA, 1999). Este gastrpode representa uma sria ameaa sade pblica, pois hospedeiro intermedirio do nematdeo Angiostrongylus cantonensis, causador de um tipo de Meningite Eosinoflica (Angiostrongilase Meningoenceflica) (TELLES et al., 1997). Em condies experimentais, A. fulica pode ser um potencial hospedeiro do nematdeo Angiostrongylus costaricensis causador da Angiostrongilase

Abdominal (CARVALHO et al., 2003), que no Brasil pode ser transmitida por outras espcies de moluscos terrestres, principalmente os da Famlia

Veronicellidae (SOUSA & LIMA, 1990). Portanto uma campanha de esclarecimento da populao, assim como um trabalho de Educao Ambiental nos terreiros de Candombl, que utilizam esse molusco nos seus rituais se faz necessrio e urgente.

5.1.3. O Aru ou Uru Pomacea lineata (Spix, 1827) (Mollusca, Gastropoda, Prosobranchia, Mesogastropoda, Ampullariidae) (Figura 12). Chamado de Bicho da lama, um dos Ebs (a oferenda) mais fortes de Nana. Oferece no Or (cabea) das pessoas que esto com problemas de loucura, nas doenas incurveis mas bem doentes mesmo (comunicao pessoal do Babalorix Manoel Nascimento Costa);

O aru passado no corpo e o despacho em Mangue, em rvores, enrolado em uma esteira (comunicao pessoal do Babalorix Pai Toinho de Oxum);

Na falta do Ibin, tem sido utilizado o aru para oferecer a Oxal, pega o molusco, cozinha com Arroz e bota em cima de Orixal (...) o aru tem pessoas

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que comem, mas o Ibin nunca vi ningum comendo no, s para Orixal (comunicao pessoal da Yalorix Tia Maezinha); O aru tem sido usado na cura de doenas, tal como nas descries abaixo:

Ento a gente fez o Ebodin (que feito com o Aru e Maru palha do Dend bem nova - que corta e cozinha, fura ele todinho e coloca todo enfeitadinho nos ps de Oxal). Graas a Deus ele se levantou e hoje est vendendo sade, todo ano ele faz as obrigaes dele e cumpre o compromisso dele com Yans que ele de Yans com Oxal. Tudo tem que ter a f. Sem f, no consegue nada. Seja qual for a religio (comunicao pessoal da Yalorix Me Lau de Oxal). Misticamente eu ainda no vi o uso do Aru como remdio, ou alguma coisa que possa ser passado no corpo, mas vi um trabalho feito por ele, tirar duas pessoas da UTI atravs da cerimnia feita com esse Aru. Foi uma cerimnia feita para Oxal.. (Comunicao Pessoal do Ya e Pesquisador das Religies Afro, Alexandre Lomi Lodo).

A carne e os ovos do gastrpode Pomacea lineata, conhecido na regio Nordeste do Brasil como ll, Aru ou Uru, tem sido utilizado no tratamento da Asma, Tuberculose e Disenteria (ABLIO, 1994).

O finado Z de Me tinha umas crises de Asma que os mdicos no conseguia curar e em uma dessas crises ele estava no terreiro de Me Ldia que nessa poca era no Alto do Pascoal e fizeram um Eb com Aru, eu ainda mim lembro o ch que ele tomou o sumo da hortel mida com mel de abelha, depois ofereceram o Aru, na cabea dele fazendo esse Eb Icu, no sei se ele teve depois, mais passou muito tempo sem ter esse problema (Comunicao pessoal do Babalorix Manoel Nascimento Costa).

Os

moluscos

do

gnero

Pomacea,

so

considerados

magnficos

fornecedores de minerais ao organismo (devido ao seu alto teor em clcio e

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fsforo), dada a alta percentagem em substncias inorgnicas e diversidade das mesmas (MESQUITA, 1982). Tanto pela qualidade quanto pela quantidade de seus protdeos o molusco um timo alimento reparador. VASCONCELOS (1956, 1959) referiu que o interesse econmico da famlia prende-se principalmente alimentao humana, devido seu elevado valor energtico, no que se refere ao teor protico comparativamente com o de outros animais; possui 16 aminocidos dos quais 50% so essenciais ao Homem, ou seja, no so sintetizados pelo organismo, alm da presena de glicdios (glicognio), vitaminas A (ou pr-vitaminas A); B1; B2; D; e substncias inorgnicas, tais como, ferro (acentuada), traos de alumnio e presena provvel de zinco. Em estudos Qumico-Bromatolgicos de moluscos do gnero Pomacea, chegou-se concluso de que o mesmo possui propriedades teraputicas, sendo com tal fim utilizado em xarope que curaria a tuberculose (MESQUITA, 1982). Outra ao medicamentosa atribuda ao molusco, a cura da asma pelos ovos dos mesmos. Em regies do Norte e Nordeste do Brasil, onde conhecido por "aru" ou "lol", o povo emprega os ovos do molusco, em beberagens contra "as doenas do peito" (ABLIO, 1994). No Par e Cear usado o "lambedor de ampulria" para tosse. Na Argentina, em certas regies, o povo usa-os contra a desinteira. Na fala do cotidiano dos Babalorixss e Yalorixs, percebe-se muito do conhecimento cientfico. Portanto, estes dois tipos de conhecimento no se contrapem.

5.1.4. O IKOTO (principalmente Achatina sp.?)

Entre o povo Yoruba na Nigria, vrias espcies de moluscos tm sido utilizadas na fabricao de Mscaras religiosas, chamadas de Egungun.

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Ikoto uma palavra Yoruba que significa pequeno molusco terrestre, sendo este considerado sagrado e utilizado na fabricao de mscaras (Figura 13). Pela semelhana e conversa com os Babs e os Ys acreditamos que o Ikoto pode ser o molusco africano Achatina sp. Para o povo Yoruba, as partes moles e o lquido produzido pelo Ikoto tm qualidades medicinais. Quando o lquido do molusco aplicado sobre a cabea de uma pessoa que tem dificuldades, seu destino acalmado e/ou aliviado.

Ikoto usado a casca (concha) dele pra fazer um p, um p de Orosum, que risca o Odum, serve pra guardar o cabelo do Ya....(o molusco) aquele redondinho, compridinho, chamado Ikoto, usado tambm pra banho, pra filho de Oxal, pra tirar fria do peso de Ogum, de uma cabea de Exu, que t muito perturbada; em banho, como sinal grfico, em Patu, pr uma pessoa que muito nervosa .... esse aqui o p do molusco Ikoto (mostrando o Patu com o p), eu s vezes sou muito impaciente e uso um pouco pra tranqilidade....Ento aqui tem encantamento, ento isso significa que pra eu ter controle, pra eu no alterar, no exaltar.... eu no sou exaltado mas s vezes eu fico preocupado quando eu vejo uma pessoa agitada eu digo calma, gente calma (comunicao pessoal de Pai Toinho de Oxum).

O Ikoto (tambm chamado de Okoto) est associado a imagem de Ex Ijel e com ligao com o orix Oxal, exatamente por este ser uma espcie de caracol cuja base aberta num s p (SANTOS, 1991). Um nico ponto de apoio, abre-se a cada evoluo, mais e mais at converte-se numa circunferncia aberta para o infinito.

5.2. A EXPLORAO DA FAUNA DE MOLUSCOS E A EXTINO DE ESPCIES NO ESTADO DE PERNAMBUCO

Atravs de entrevistas, relatos, pesquisas bibliogrfica, fotografias e coletas do material in loco podemos constatar que os moluscos so utilizados pelos atores sociais do Candombl com diferentes propsitos.

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Aliado a isso, os moluscos marinhos, gastrpodes principalmente, so importantes comercialmente devido a sua utilizao como alimento, na fabricao de objetos e adornos e de medicamentos base de clcio. importante enfatizar que os terreiros de Candombl no so responsveis pelo estado crtico de extino destas espcies de moluscos. A caa predatria para fins diversos e os impactos ambientais sobre os ecossistemas onde estes moluscos ocorrem so os principais responsveis por isso. Devido ao uso e coleta desses animais de forma indiscriminada, s no estado de Pernambuco existe atualmente 6 espcies de gastrpodes ameaados de extino (Quadro II), sendo todas estas utilizadas nos terreiros de Candombl, com fins variados. Quadro II Moluscos Gastrpodes marinhos ameaados de Extino no estado de Pernambuco (de acordo com TENRIO et. al., 2002).

Espcie de Gastrpode Strombus gallus Linnaeus, 1758

Importncia Utilizados na alimentao humana; Ornamentao em geral; Usado nos altares de Yemanj e Oxum no Candombl; Alimentao humana; Ornamentao (abajures entre outras); Usado nos altares de Yemanj e Oxum no Candombl; Alimentao humana; Ornamentao (abajures entre outras); Usado nos altares de Yemanj e Oxum no Candombl; Alimentao humana; Ornamentao em geral; Usado nos altares de Yemanj e Oxum no Candombl;

Strombus goliath Schreter, 1805

Cassis tuberosa (Linnaeus, 1758)

Charonia variegata (Lamarck, 1816)

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Chicoreus spectrum (Reeve, 1846)

Ornamentao; Usado nos altares de Yemanj e Oxum no Candombl; Alimentao humana; Ornamentao; Usado nas decoraes dos altares de Yemanj e Oxum no Candombl;

Vasum cassiforme (Kiener, 1841)

5.3. OS MITOS E A SIMBOLOGIA SOBRE OS MOLUSCOS NOS TERREIROS DE CANDOMBL

Dentro da Religio Candombl, o simbolismo est presente no seu cotidiano. As estrias e mitos sobre os moluscos so comuns na literatura, desde o polvo gigante, destruidor dos navios nas civilizaes antigas (DIGUES, 1998) at a famosa histria africana de que caracol foi castigado para carregar sua casa nas costas por toda a sua vida, por ter chegado atrasado na assemblia dos animais nas savanas do rei Elefante (SANTOS, 1982).Os bzios (Cypraea) so feitos mariscos, eles tem vida, mas no so comestveis, eles s morrem, me parece depois que eles saem da gua, ele tem pouco tempo de vida (comunicao pessoal do Babalorix Manoel Nascimento Costa); Exu dizia que os Bzios saiam do mar como formigas e que ele invadiu tanto, que o tanto de formiga no mundo era o que tinha de Bzio. Em todo lugar sairia muito. Exu as vezes gostava, mas se irritava porque saiam muitos..... Ele, o molusco, o principio do mundo porque o molusco caminhou, ele fez a caminhao, que ele veio caminhado fazendo uma estrada pra o incio do mundo (comunicao pessoal do Babalorix Pai Toinho de Oxum).

Analisando a concepo popular do Babalorix Pai Toinho de Oxum com o conhecimento cientfico, os moluscos representam o segundo maior filo, em

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termos de diversidade de espcies do reino animal (BRUSCA & BRUSCA, 2002), ficando atrs apenas dos insetos. E mais interessante ainda, a partir dos estudos sobre a radiao adaptativa dos moluscos, ao longo da evoluo do filo, como relatado por RUPPERT & BARNES (1996), fica mais evidente ainda a idia de que o Saber Popular no se distancia do Conhecimento Cientfico.(....) Considerando a larga variedade de habitats que os Gastrpodos invadiram, eles constituem certamente a classe de moluscos de maior sucesso. As espcies marinhas (....) invadiram a gua doce e os caramujos e vrios outros grupos conquistaram a terra (....). (RUPPERT & BARNES, 1996, p. 371).

No simbolismo do Candombl, a Columela (eixo central das conchas dos Gastrpodes) (Figura 14) pode representar o incio e fim da vida para Exu, ou seja, a Triangologia do princpio/fim em si para Exu.

A importncia dos moluscos no Candombl, principalmente o Ibi ou o Ikoto, vem desde a Cosmogonia dos Nags, que remota a histria da criao do Universo, que quando o Imol Exu em sua forma de Exu Okoto, ele vem atravs de uma simbologia muito especfica que a simbologia do molusco Ibi que aquele Circulozinho (columela) que comea em um ponto nico e expande para o Universo. Essa uma das simbologias principais do Exu Okoto, alis, talvez a principal que vem atravs da mensagem que realmente Exu o ponto de incio do Universo e para aonde o Universo se expande...... Dentro de um contexto simblico o Ibi ele tem uma tendncia, quando voc quebra a casquinha (concha) voc vai ver dentro da casquinha a simbologia do dinamismo de Exu que basicamente os Triagolozinhos (columela) que forma a casquinha deles por descendncia e descendncia (Comunicao Pessoal do Ya e Pesquisador das Religies Afro, Alexandre Lomi Lodo).

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5.4. OS MOLUSCOS NO JOGO DE BZIOS: RELIGIO, CONHECIMENTO E PSEUDO-CINCIA?

O vocbulo Bzios vem do latim, Baccinum. O jogo de Bzios uma prtica utilizada como forma de adivinhao. jogado apenas por Babalorix ou Yalorix que se utilizam 4, 16 ou 32 bzios (Cauri Cypraea sp. - pequenas conchas peroladas, de forma ovalada, sendo que num dos lados apresenta uma fenda serrilhada, o lado fechado e noutro, uma aparncia abaulada, denominado lado aberto) (RIOS, 1994). Embora as conchas de Cypraea sp. seja encontrada em quase todas as praias do Brasil (THOM et al., 2004) essa prtica s pode se realizar com as conchas que chegam diretamente da frica.

O Babalorix Manoel Nascimento Costa afirma que j ouviu falar dos Buzios nacional, mas os Buzos utilizados no jogo de Bzios so Africanos.

Para o Babalorix ou a Yalorix existem duas formas de leitura de queda de bzios: o Buzo Macho (quando o lado da concha fica evidente a Columela do molusco eixo central de sustentao da cocha, a qual representa o falo) e o Buzo Fmea (quando o lado da concha que fica evidente a abertura da concha semelhana com a Vagina). Cada Orix tem uma queda de bzios prpria, que dependendo da forma e localizao com que ficam dispostos estabelecem uma configurao,

influenciando na interpretao do jogo.

Os Cauris so utilizados para dar o recado, por exemplo, quatro Bzios fechados, quem est falando Yans (comunicao pessoal da Yalorix Tia Mezinha).

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A palavra bzios deriva de Dilogun (lngua Yorub Nag), que por sua vez, deriva da palavra Merindilogun, que significa dezesseis.

O jogo de bzios uma coisa sria e importante dentro da religio porque tem os seus Oduns..... os Oduns so sinais numricos, por exemplo, so 16 bzios, se caem, 8 abertos e 8 fechado, sinal de Oxal no jogo de bzios........ muita gente se curou atravs do jogo de bzios, porque o bzio diz se voc tem doena, se ela de mdico ou no, ou voc no tem doena de mdico e com o jogo, com as ervas, com as rezas, voc vai ficar bom... S o jogo de bzios pode dizer qual o Orix, que lhe trouxe ao mundo (comunicao pessoal do Babalorix Manoel Nascimento Costa).

O nmero 16 est diretamente ligado ao jogo de bzios e explica o nmero de Orixs (16) dentro da religio do Candombl, cada qual respondendo a uma cada no jogo, atravs de um mediador. Este intermedirio (mediador), denominado Exu Leb (Mojub) quem acompanha If (considerado o Orix da adivinhao) nas consultas e responde a todas as combinaes do jogo (1). Entretanto, Exu quem serve de intermedirio para as respostas dadas pelos Orixs.(2) O adivinho coloca os bzios dentro das duas mos reunidas em conchas e os sacode, para ento lan-los. A forma na qual se deitam os bzios, se abertos ou fechados tambm so decisivo no resultado da leitura. So as conchas lanadas sobre uma peneira de palhas, esteira, sobre um circulo de colares dos orixs. H diversos tipos de leitura divinatria atravs de jogo, sem precisar utilizar o gastrpode Cauri, entre elas temos:

Jogo de Mariscos: conchas de moluscos bivalves, conhecido como Conchinhas que pertencem a Yemanj pode d o mesmo recado que os Bzios como afirma a Yalorix Me Lau de Oxal;

_________________________ (1) Fonte: http//orbita.starmedia.com/ileasesando/origem.htm acesso em 06 de janeiro de 2005; (2) Fontes: http://www.gomorra.hpg.ig.com.br/menu.htm e http://www.cacp.org.br/Buzios.htm acesso em 14 de janeiro de 2005.

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Alobaa, leitura de Cebolas na nao Angola: Pode se jogar com cebola e at com inhame (comunicao pessoal da Yalorix Me Lau de Oxal);

Obi, leitura atravs do jogo de Sementes: Pode botar um jogo com caroo de feijo... mas tem que ser preparado, pra ter mais fora pra as coisas sair tudo certinho (comunicao pessoal da Yalorix Tia Mezinha);

Coquinhos furados da semente de frutas de Dend, leitura entre o povo Jje, nao Africana da regio do Daom.

Na realidade pelo jogo de bzios em frica no se jogava os bzios e sim usava Ikins (sementes do dendezeiros mas s os que tem quatro olhos), que tambm o Opele If. Ento a importncia desse fundamento transporta para o Brasil em forma de 16 bzios....Tudo dentro do Candombl guiado pelo jogo, onde o Orix vem, fala, determina e d todo o seguimento aos procedimentos religiosos que se pode d aquele Candombl (Comunicao Pessoal do Ya e Pesquisador das Religies Afro, Alexandre Lomi Lodo).

Quando entrevistados sobre o uso do Jogo de Bzios pelo Computador, os Babalorixs e Yalorixs, afirmam:

As pessoas esto criando um novo sistema de orculo, mas com certeza, com os ETs, porque voc sai da essncia da realidade da religio para criar um sistema que no tem nada a ver com a religio (...) a mquina no entende a lngua Yorub (comunicao pessoal do Babalorix Manoel Nascimento Costa); Eu acho uma fantasia, uma coisa vaga, assim ningum precisava ter iniciao. Ento eu no critico o computador, uma revoluo, mas no pra jogar bzio (comunicao pessoal do Babalorix Pai Toinho de Oxum);

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5.5.

CONCEPES

SOBRE

NATUREZA

DAS

CRIANAS

QUE

FREQUENTAM OS TERREIROS DE CANDOMBL

Nas atividades com as crianas nos terreiros de Candombl a que mais se destacou foi oficina pedaggica com os desenhos, os quais expressaram vrias formas de rvores harmnicas, com a presena do sol, flores e pssaros demonstrando laos afetivos e/ou religiosos com a Me-Natureza, de uma maneira geral, em sua maioria constatou-se uma Concepo Romntica e Naturalista sobre a Natureza. Para a psicologia, os desenhos das crianas uma rica forma de estudar o desenvolvimento emocional, intelectual e a capacidade de percepo e de interpretao. Toda representao da criana reflete sobre si mesma, pois, permite que a criana represente o seu corpo, a sua movimentao no espao