artigo de linguÍstica aplicada

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ENSINO DE GRAMTICA: OBSERVNCIA AOS PARMETROS CURRICULARES NACIONAIS? Izete de Souza LIMA1 Juliene Paiva de Arajo OSIAS2 RESUMO O ensino da Lngua Portuguesa no Ensino Mdio tem apresentado alguns aspectos que fogem do que os Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) defendem como coerente e funcional, no que diz respeito, muitas vezes, a uma natureza essencialmente metalingustica na abordagem e na forma da aplicabilidade da lngua, como tambm fragmentao pela qual ela vista, havendo, no mnimo, trs reas dentro do ensino da prpria lngua: Redao, Literatura e Gramtica. Assim, este artigo objetiva analisar se ocorre observncia s premissas apontadas pelos PCN no mbito do Ensino de Lngua Portuguesa, no tocante operacionalizao desse ensino. Para nossa anlise, realizamos uma leitura comparativa, confrontando os Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio (2000), o livro didtico PORTUGUS 1 Contexto, Interao e Sentido3, indicado pelo PNLD e o Novo ENEM (2009). O resultado um ensino hbrido ainda, permeado de metalinguagem e pincelado de epilinguagem, mostrando-nos que, aos poucos, a realidade do ensino poder chegar observncia dos PCN.Palavras-chave: Ensino de Lngua Portuguesa; Ensino Mdio; Parmetros Curriculares Nacionais.

INTRODUO Muitos estudos revelam o fracasso do ensino de Lngua Portuguesa, e uma das causas mais evidentes dessa realidade diz respeito metodologia utilizada nas aulas, que visa ao ensino da gramtica como um dos pilares mais fortes desse processo, segundo Mrcia Mendona (2006). Essa abordagem no permite que o aluno se desenvolva criticamente, uma vez que se limita a uma anlise puramente metalingustica e estrutural da lngua, deixando de lado a reflexo e seus usos. No entanto, propostas so desenvolvidas com o objetivo de sanar esse problema, a exemplo da Anlise Lingustica (AL), desenvolvida por Geraldi (1984). Temos na AL o ensino de lngua materna pautado na leitura e produo de textos, propondo uma anlise epilingustica, na qual a reflexo a base do ensino, sem deixar de lado a abordagem metalingustica dos elementos que compem a lngua. A proposta da AL no to recente, porm, a implantao da mesma d-se a passos lentos. Observando o contexto do ensino de Lngua portuguesa, os PCN sugerem um ensino reflexivo, tendo o texto como unidade mnima, o que nos permite identificar traos da proposta da AL.1

Tutora do curso de Letras oferecido pela UFPB Virtual; especialista em Lngua portuguesa PROLING (UFPB) mestranda em Lingustica pelo PROLING (UFPB). E-mail: [email protected]

Professora de Lngua Portuguesa no Iesp Faculdades e no Colgio Pio XI; mestre em Lingustica pelo PROLING (UFPB) e aluna do doutorado do PROLING. E-mail: [email protected]

ABAURRE, Maria Luiza M.; ABAURRE, Maria Bernadete M.; PONTARA, Marcela. Moderna: So Paulo, 2008.

Polticas so desenvolvidas com o objetivo de assegurar a implantao dessas propostas, como o PNLD (Plano Nacional do Livro Didtico), que tem como objetivo orientar a escolha dos livros didticos, grande companheiro de jornada dos professores. Nele, encontramos os objetivos das aulas de Portugus em sintonia com as propostas dos PCN, bem explcitos, e, logo depois, resenhas com sugestes de livros que contemplem esses objetivos so apresentadas. Alm das polticas adotadas para a implantao das propostas dos PCN, temos tambm a avaliao dessa implantao com aplicao de provas em nvel nacional, para averiguar o desenvolvimento dos alunos dentro dessa perspectiva. Logo, a presente pesquisa surgiu da leitura dos Parmetros Curriculares Nacionais (PCN) do Ensino Mdio, ano 2000, priorizando-se analisar se ocorre observncia s premissas apontadas pelos PCN no mbito do Ensino de Lngua Portuguesa, no tocante operacionalizao desse ensino.Delimitando a nossa pesquisa no nvel mdio e sabendo que os PCN norteiam o ensino em todo o pas, procuramos, neste trabalho, averiguar como as propostas do mesmo esto sendo introduzidas nas escolas e como estas esto sendo avaliadas. Assim, observando as propostas dos PCN de Lngua Portuguesa do Ensino Mdio, analisaremos as polticas adotadas pelo governo para a sua implantao nas salas de aulas, tendo como fonte um livro didtico proposto pelo PNLD 2012, e como o governo est avaliando essa implantao, atravs da anlise de questes do ENEM (Enxame Nacional do Ensino Mdio). Assim, procuramos identificar de que modo o livro didtico

intitulado PORTUGUS 1 Contexto, Interao e Sentido que faz parte do catlogo sugerido pelo PNLD 2012 para uso na rede pblica de ensino aborda o ensino de Lngua portuguesa, se de uma forma meramente metalingustica em todas as suas etapas de anlise, ou se apresenta alguma proposta tambm epilingustica; se ocorre uma tricotomizao da Lngua Portuguesa, ou seja, um desmembramento da lngua em trs reas independentes: Gramtica, Literatura e Redao, apontando, dessa forma, o grau de observncia deste livro didtico (que, oficialmente, faz parte do catlogo de obras adotadas pelo PNLD para uso na rede pblica) s propostas dos PCN para a Lngua Portuguesa; alm de verificar as coerncias ou incoerncias no ENEM (Exame Nacional do Ensino Mdio) no que diz respeito operacionalizao dessa abordagem Lngua Portuguesa, verificando se o citado exame faz ou no observncia s propostas dos PCN, comparando-o ao livro didtico em questo. O artigo est organizado da seguinte maneira: na fundamentao terica, tratamos das novas perspectivas do ensino de Lngua Portuguesa pautada na AL. Em seguida, na metodologia, descrevemos os procedimentos metodolgicos utilizados para a realizao da pesquisa. Na seo resultados, apresentamos os dados, suas respectivas anlises e comparaes entre elas. E, por fim, na ltima seo, apresentamos as concluses obtidas. FUNDAMENTAO TERICA Ensino Mdio e Lngua Materna Falando do ensino de lngua Materna no Ensino Mdio, Mendona (2006) mostra que o mesmo no passa de uma simples reviso do que j foi visto no Ensino Fundamental, com nfase no treinamento para o vestibular, com uma anlise que passa da palavra para a orao, da orao para o perodo, chegando raramente unidade maior, ou seja, ao texto. Assim, temos uma organizao acumulativa, ignorando o fluxo natural da aprendizagem que se d a partir da competncia discursiva para a competncia textual at a competncia gramatical, ou seja, uma aprendizagem que parte do macro para o micro, alm de ignorar o objetivo de

formar usurios da lngua, privilegiando a formao de analistas da lngua. Em contrapartida a essa realidade, vm se firmando, nas ltimas dcadas, as propostas de um novo modelo de ensino, a anlise lingustica (AL). A AL surgiu devido necessidade de uma nova abordagem em relao ao ensino de Lngua Portuguesa, que, em muitos casos, limita-se a uma abordagem metalingustica e estrutural da lngua, cunhado por Geraldi em 1984, no artigo Unidades bsicas do ensino de portugus, essa proposta veio contrapor ao ensino tradicional da gramtica. Segundo Geraldi (1997),O uso da expresso anlise lingstica no se deve ao mero gosto por novas terminologias. A anlise lingustica inclui tanto o trabalho sobre as questes tradicionais da gramtica quanto questes amplas a propsito do texto, entre as quais vale a pena citar: coeso e coerncia internas do texto; adequao do texto aos objetivos pretendidos; anlise dos recursos expressivos utilizados (metforas, metonmias, parfrases, citaes, discursos direto e indireto, etc.); organizao e incluso de informaes, etc. Essencialmente, a prtica de anlise lingustica no poder limitar-se higienizao do texto do aluno em seus aspectos gramaticais e ortogrficos, limitando-se a correes. Trata-se de trabalhar com o aluno o seu texto para que ele atinja seus objetivos junto aos leitores a que se destina. (GERALDI, 1997c: 74)

Assim, como podemos perceber, a AL no extingue as questes tradicionais da gramtica, no entanto, ultrapassa uma abordagem meramente metalingustica e estrutural da lngua, como vemos nas abordagens tradicionais, que usam o texto como pretexto para uma anlise superficial dos elementos estruturais da lngua em detrimento da reflexo. A AL visa a uma abordagem reflexiva, no permitindo que o ensino de gramtica seja visto como um fim em si mesmo, mas como recursos discursivos. Nessa perspectiva, o texto utilizado como o ponto de partida para a reflexo. A proposta da AL est configurada em uma abordagem epilingustica do ensino de Lngua Portuguesa, com o objetivo de refletir sobre os elementos e fenmenos lingusticos e sobre estratgias discursivas. Assim, assume uma perspectiva sociointeracionista de lngua, junto com a leitura e a produo textual, incorporando um dos trs eixos bsicos do ensino de lngua materna, como afirma Mendona (2006). Podemos encontrar na prtica de AL uma concepo de lngua situada na ao interlocutiva, sujeita s interferncias dos falantes; trabalhos com habilidades metalingusticas e epilingustica privilegiando o texto como unidade bsica; utilizao de uma metodologia reflexiva. Assim, a classificao e a identificao do lugar reflexo. De acordo com os PCN de Lngua portuguesa, o estudo da lngua materna na escola deve apontar para uma reflexo sobre o uso da lngua na vida e na sociedade, mostrando-se muito alm do que nos oferecido por uma organizao acumulativa de contedos que visa estruturao e metalinguagem em detrimento da reflexo e dos usos da lngua. Fazendo uma anlise das aulas de Lngua Portuguesa na atualidade, os prprios PCN mostram que as mesmas podem ser caracterizadas como aula de expresso em que os alunos no podem se expressar. Segundo os PCN, as atividades didticas devem centrar-se na atividade epilingustica.Se o objetivo principal do trabalho de anlise e reflexo sobre a lngua imprimir maior qualidade ao uso da linguagem, as situaes didticas devem, principalmente nos primeiros ciclos, centrar-se na atividade epilingustica, na reflexo sobre a lngua em situaes de produo e interpretao, como

caminho para tomar conscincia e aprimorar o controle sobre a prpria produo lingstica. (PCN, 1997, p. 31)

Assim, uma abordagem epilingustica visa a explicitar a estrutura e o funcionamento da lngua, como tambm perceber os efeitos de sentido que os elementos lingusticos podem produzir na interlocuo, levando em considerao os usos da lngua, sem deixar de lado tambm a descrio dos elementos gramaticais, pois os mesmo permitem ao falante escolher esse e no aquele elemento para alcanar uma maior expressividade. No entanto, os PCN no escondem a realidade do ensino de gramtica nas escolas e suas deficincias, que, segundo os mesmos, limita-se ao entendimento da nomenclatura gramatical como eixo principal, confundindo descrio e norma na anlise da frase deslocadas do uso, da funo e do texto. Assim, para sanar os problemas gerados por esta abordagem tradicionalista, este documento apresenta uma nova viso do ensino de lngua materna, na qual a comunicao entendida como um processo de construo de significados em que o sujeito interage socialmente, e a lngua compreendida como linguagem que constri e desconstri significados sociais. Segundo os PCN:Essa concepo destaca a natureza social e interativa da linguagem, em contraposio s concepes tradicionais, deslocadas do uso social. O trabalho do professor centra-se no objetivo de desenvolvimento e sistematizao da linguagem interiorizada pelo aluno, incentivando a verbalizao da mesma e o domnio de outras utilizadas em diferentes esferas sociais. Os contedos tradicionais de ensino de lngua, ou seja, nomenclatura gramatical e histria da literatura, so deslocados para um segundo plano. O estudo gramatical passa a ser uma estratgia para a compreenso/interpretao/produo de textos e a literatura integra-se rea de leitura. (PCN, 2000, p.18).

Com isso, os PCN, cujo objetivo nortear o ensino no Brasil, propem uma abordagem centrada no discurso, na reflexo e no uso, sem deixar de lado os contedos tradicionais, agora deslocados para um segundo plano, considerados importantes, mas no vistos como eixo principal. Os PCN buscam desenvolver as competncias e as habilidades do aluno de analisar os recursos expressivos da linguagem verbal, relacionando textos/contextos, mediante a natureza, funo, organizao, estrutura, de acordo com as condies de produo/recepo; confrontar opinies e pontos de vistas sobre as diferentes manifestaes da linguagem verbal; compreender e usar a lngua Portuguesa como lngua materna, geradora de significao e integradora da organizao do mundo e da prpria identidade. Como vemos, muito mais que identificar e classificar termos, o objetivo do ensino de lngua materna possibilitar o desenvolvimento de competncias e habilidades que formam um cidado critico, capaz de se expressar com objetividade e sabedoria, de acordo com o contexto exigido. Visando implantao desses objetivos em sala de aula, temos no livro didtico o apoio para a aplicabilidade dessas propostas. Com o objetivo de orientar a escolha de um material didtico que contemple as propostas contidas nos PCN, o PNLD (Programa Nacional do Livro Didtico) apresenta os livros que foram criteriosamente analisados para que os professores faam uma escolha qualificada do LDP. importante ressaltarmos que, em muitos casos, percebemos que os livros escolhidos pelo PNLD apresentam-se em processo de transio no que diz respeito s propostas de AL, que, de certa forma, permeia todo o texto dos PCN. possvel identificar uma abordagem

epilingustica, que leva em considerao a reflexo e os usos da lngua, como tambm uma abordagem totalmente metalingustica, que visa nomenclatura e estrutura da linguagem. Segundo Mendona (2006), natural aliar uma nova perspectiva a formas conhecidas de ensinar, atravessando um momento em que encontramos velhas e novas prticas no espao de aula de gramtica. Outro fato marcante em relao ao ensino de Lngua Portuguesa no Ensino Mdio a representao dos vestibulares solicitados por algumas universidades, ou seja, os parmetros observados dizem respeito aos contedos solicitados pelos vestibulares. No entanto, exames que verificam a aprendizagem dos alunos, como o caso do ENEM (Exame Nacional do Ensino Mdio), possuem uma abordagem que convergem para os objetivos dos parmetros. Com isso, encontramos, at certo ponto, uma contradio em relao ao ensino, que por vezes ainda est sendo pautado numa perspectiva tradicionalista. Mas, diante das novas perspectivas, ou seja, adeso de algumas universidades ao ENEM, o ensino de lngua no Ensino Mdio poder sofrer algumas alteraes, j que um dos objetivos do mesmo a entrada em uma instituio de nvel superior. METODOLOGIA Realizamos uma leitura comparativa, confrontando os Parmetros Curriculares Nacionais do Ensino Mdio (2000), o livro didtico PORTUGUS 1 Contexto, Interao e Sentido4, indicado pelo PNLD e o Novo ENEM (2009). A leitura dos PCN consistiu no nosso referencial terico, considerando-o a proposta coerentemente fundamentada para um ensino funcional de Lngua Portuguesa no Ensino Mdio. J a leitura do livro didtico citado ocorreu para que pudssemos observar se o PNLD aprovou um material (para uso na Rede Pblica de Ensino) que faa total observncia s propostas dos PCN. Finalmente, a leitura do ENEM, tomando como referncia a prova oficial de 2009, aquela que introduziu o Novo ENEM, analisando se o desfecho do provo oficial tem ou no coerncia com as premissas dos PCN e se d ou no continuidade ao livro didtico utilizado no momento anterior a ele supostamente, o material com o qual se preparar o aluno para o ENEM. DISCUSSO Iniciando a anlise do livro didtico, verificamos a disposio do contedo programtico exposto no sumrio e constatamos que o contedo encontra-se tricotomizado: uma seo para Literatura, outra para Gramtica e uma terceira para Produo de Texto. No nos parece muito coerente que assim seja, uma vez que os PCN para os Conhecimentos de Lngua Portuguesa apontam para outra via:A disciplina na LDB n 5.692/71 vinha dicotomizada em Lngua e Literatura (com nfase na Literatura Brasileira). A diviso repercutiu na organizao curricular: a separao entre gramtica, estudos literrios e redao. Os4

ABAURRE, Maria Luiza M.; ABAURRE, Maria Bernadete M.; PONTARA, Marcela. Moderna: So Paulo, 2008.

livros didticos, em geral, e mesmo os vestibulares, reproduziram o modelo de diviso. Muitas escolas mantm professores especialistas para cada tema e h at mesmo aulas especficas, como se leitura/literatura, estudos gramaticais e produo de texto no tivessem relao entre si. [...] O processo de ensino/aprendizagem de Lngua Portuguesa deve basear-se em propostas interativas lngua/linguagem, consideradas em um processo discursivo de construo do pensamento simblico, constitutivo de cada aluno em particular e da sociedade em geral. Essa concepo destaca a natureza social e interativa da linguagem, em contraposio s concepes tradicionais, deslocadas do uso social. O trabalho do professor centra-se no objetivo de desenvolvimento e sistematizao da linguagem interiorizada pelo aluno, incentivando a verbalizao da mesma e o domnio de outras utilizadas em diferentes esferas sociais. Os contedos tradicionais de ensino de lngua, ou seja, nomenclatura gramatical e histria da literatura, so deslocados para um segundo plano. (PCN ENSINO MDIO, 2000. p. 16;18)

Fica claro, ento, que esse formato apresentado pelo LD em questo (embora aprovado pelo PNLD) conteudista, alm de manter, continuar a tricotomizao Gramtica/Literatura/Produo de Texto, tratando as trs reas como se fossem independentes e fragmentadas. Tambm fica claro que esta no a linha que os PCN compreendem como sociointerativa, voltada para os usos sociais da lngua. Outro aspecto interessante observar que o contedo de cada rea no faz qualquer ponte, no tem qualquer ligao com as outras, ou seja, a Lngua Portuguesa que transmitida ao aluno algo mecnico, tendo como prioridade a nomenclatura gramatical. Quando verificamos o modo como o livro didtico aborda a Gramtica, mostrou-senos uma viso metalingustica, conceitual, na etapa da explanao do tema. Ou seja, o aluno apresentado ao assunto em questo, Formao de Palavras, por meio de regras e de conceitos, de modo que ele possa conhecer as regras puramente linha contrria dos PCN, como vimos numa citao anterior: Os contedos tradicionais de ensino de lngua, ou seja, nomenclatura gramatical e histria da literatura, so deslocados para um segundo plano. Conforme podemos constatar ao observar a imagem da pgina 332, por exemplo, o contedo Formao de Palavras tem uma abordagem tradicional, baseada na nomenclatura gramatical, e isso no foi deslocado para um segundo plano est, na verdade, em primeirssimo plano! Este mais um aspecto que nos leva a concluir a incoerncia de um livro aprovado pelo PNLD (o que significa que ele deveria atender a todas as exigncias desse programa) em concordncia com os PCN, que, no entanto, no faz observncia de pr-requisitos mnimos para que tenha havido essa aprovao. Toda essa anlise aponta para uma abordagem meramente metalingustica no ensino da Lngua Portuguesa a lngua pela lngua, isentando-se o aspecto social e discursivo. Esse panorama muda um pouco, entretanto, quando analisamos os exerccios posteriores parte explicativa do assunto Formao de Palavras. A abordagem para a realizao dos exerccios evidencia um trabalho epilingustico, embora haja toda uma base metalingustica. A epilinguagem evidente quando as autoras constroem sentidos e levam o aluno a refletir sobre o assunto estudado, fazendo-os atentarem para as relaes de sentido, para as funes do objeto de estudo e, o principal, para o uso da lngua.

satisfatrio constatar que h, ao menos, uma iniciativa de uma anlise lingustica nessa abordagem gramatical sobre formao das palavras. As abordagens so hbridas, mas a iniciativa j um comeo interessante. Isso fica evidente, por exemplo, no exerccio abaixo, recortado do livro analisado:

Aqui no h qualquer abordagem meramente metalingustica, destituda de contexto. Os conceitos so construdos, e aluno, ao realizar esta atividade, vai dimensionando conceitos, funes e aplicabilidades do contedo em questo. E, para que a isso se chegasse, foi feita uma explanao do tema de modo sistemtico, conteudista e permeado de nomenclaturas mas a anlise lingustica (AL) no se isola da abordagem metalingustica, pelo contrrio. As duas linhas podem e devem completar-se, contanto que o resultado seja um aluno capaz de ler, compreender e escrever a partir do que ele aprendeu, sem que se tenha decorado uma nomenclatura, trabalho que seria intil, sem aplicabilidade nenhuma. Neste aspecto, pelo que se viu, a obra em anlise faz observncia aos PCN no momento em que aplica os conhecimentos de modo a levar o aluno reflexo, aprendendo a fazer uso da lngua, dominando sua aplicabilidade. Com relao ao ENEM, podemos explorar aqui uma questo da prova realizada em 2010, na pgina 6, do caderno 7 (AZUL): S.O.S Portugus Por que pronunciamos muitas palavras de um jeito diferente da escrita? Pode-se refletir sobre esse aspecto da lngua com base em duas perspectivas. Na primeira delas, fala e escrita so dicotmicas, o que restringe o ensino da lngua ao cdigo. Da vem o entendimento de que a escrita mais complexa que a fala, e seu ensino restringe-se ao conhecimento das regras gramaticais, sem a preocupao com situaes de uso. Outra abordagem permite encarar as diferenas como um produto distinto de duas modalidades da lngua: a oral e a escrita. A questo que nem sempre nos damos conta disso. S.O.S Portugus. Nova Escola. So Paulo: Abril, Ano XXV, n 231, abr. 2010 (fragmento adaptado).

O assunto tratado no fragmento relativo lngua portuguesa e foi publicado em uma revista destinada a professores. Entre as caractersticas prprias desse tipo de: a) b) c) d) e) regional, pela presena de lxico de determinada regio do Brasil. literrio, pela conformidade com as normas da gramtica. tcnico, por meio de expresses prprias de textos coloquial, por meio do registro de informalidade. oral, por meio do uso de expresses tpicas da oralidade.

O que nos parece preocupante que o que se espera de um livro didtico aprovado pelo PNLD e em consonncia com os PCN que ele prepare o aluno para o ENEM (a etapa realizada para o ingresso universidade) e na linguagem do ENEM! O que vimos, no entanto, na seo conteudista do livro didtico voltado ao tema Formao de Palavras, definitivamente, no a linha pretendida pelos PCN, muito menos a linha explorada pelo ENEM.

CONSIDERAES FINAIS evidente que ainda persiste o ensino de Lngua Portuguesa tendo como prioridade a Gramtica, esta inserida numa linha que tricotomiza a lngua em Literatura, Gramtica e Produo de Texto. Tambm evidente que a abordagem a essa gramtica ocorre a partir da prioridade nomenclatura, definies e classificaes tudo de modo isolado e destitudo de sentido social. A incoerncia que observamos que as polticas pblicas para o ensino, mediante o PNLD (Programa Nacional do Livro Didtico), parecem no perceber que obras aprovadas por este mesmo programa permanecem no equvoco da tripartio da Lngua Portuguesa nas reas j citadas aspecto condenado pelos PCN de Lngua Portuguesa, que veem a lngua como um conjunto, e no peas fragmentadas, como tambm consideram a nomenclatura e a mera abordagem metalingustica aspectos a serem deixados em segundo plano. Um aspecto positivo, porm, que pudemos perceber foi a tentativa de se inovar na aplicabilidade das regras gramaticais, por meio de anlises lingusticas, levando o aluno no somente reflexo, como tambm ao uso consciente da lngua. No se trata de uma abordagem ltima e definitiva, mas louvvel que se esteja, ao menos, comeando um trabalho em gramtica baseado na AL. A base conteudista e metalingustica, mas j se comea a discutir os temas no momento da aplicabilidade, j se comeam a construir conceitos. O resultado um ensino hbrido ainda, permeado de metalinguagem e pincelado de epilinguagem, mas isso j um rumo. REFERNCIAS ABAURRE, Maria Luiza M.; ABAURRE, Maria Bernadete M.; PONTARA, Marcela. Moderna: So Paulo, 2008.

MENDONA, M. Anlise Lingustica no Ensino Mdio: um novo olhar, um outro objeto. In: Clcio Bunzen e Mrcia Mendona (orgs). Portugus no ensino mdio e formao do professor. So Paulo. Parbola Editorial, 2006. BRASIL, Ministrio da Educao e do Desporto. Secretaria de Educao Fundamental. Parmetros Curriculares Nacionais: Lngua Portuguesa. Ensino Mdio - Braslia, 2000. GERALDI, J. V. (1997). Concepes de linguagem e ensino de portugus. In: GERALDI, J. W. (org.). O texto na sala de aula. So Paulo: tica. BRASIL, Ministrio da Educao. Secretaria de Educao Bsica. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educao. Guia de Livros Didticos PNLD 2012. Lngua Portuguesa. Ensino Mdio. Braslia, 2011, p. 42-45.

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