apostila de trauma-1

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V CURSO DE EMERGÊNCIAS DA LIGA ACADÊMICA DO TRAUMA Universidade Federal do Paraná Hospital do Trabalhador

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Page 1: Apostila de Trauma-1

V CURSO DE EMERGÊNCIAS

DA LIGA ACADÊMICA DO TRAUMA

Universidade Federal do Paraná

Hospital do Trabalhador

Page 2: Apostila de Trauma-1

LIGA ACADÊMICA DO TRAUMA UFPR/HT

Orientadores

Dr. Iwan Collaço

Dr. Rodrigo Furtado

Dr. Adonis Nasr

Coordenadores

Daniela Carneiro

Fernando Roberto Coelho

Thaís Midori Bagatin

2

Page 3: Apostila de Trauma-1

APOSTILA DO CURSO DE

EMERGÊNCIAS

DA LIGA ACADÊMICA DO TRAUMA

COLABORADORES:

Camila Fachin

Carla Paz

Christiane Kawasaki

Daniela Seidel

Danielle Tavares

Júlio Macedo

Marco A. Nisiide

Piratan Araújo Neto

Tatiana de Oliveira

REVISÃO:

Adriana Pires de Oliveira

Bruno Borralho Gobbato

Guilherme Emanuel Bruning

James Alberton

Rodrigo Gribosi

Rodrigo Piccione Colatusso

Comissão Organizadora do V Curso de Emergências da LiAT:

Bruno Borralho Gobbato

3

Page 4: Apostila de Trauma-1

Daniela Carneiro

Fernando Roberto Coelho

Thais Bagatin

Viviane Bressan

Willian Cecilio

Membros da Liga Acadêmica do Trauma

Nota: Esta apostila foi escrita pelos colaboradores acadêmicos do Curso de Medicina da UFPR acima citados, tratando-se de um instrumento de orientação ao estudo dos assuntos ministrados ao longo do Curso de Emergências da Liga Acadêmica do Trauma UFPR-HT.

11. INTRODUÇÃO....................................................................................................82. HISTÓRICO.........................................................................................................93. CINEMÁTICA DO TRAUMA.............................................................................10

3.1. COLISÃO AUTOMOBILÍSTICA.........................................................................................................103.1.1. Impacto Frontal...............................................................................................................................103.1.2. Impacto Lateral................................................................................................................................113.1.3. Impacto Traseiro..............................................................................................................................113.1.4. Capotamento....................................................................................................................................113.1.5. Ejeção de dentro do veículo............................................................................................................113.1.6. Lesão de órgãos...............................................................................................................................12

3.2. ATROPELAMENTO.............................................................................................................................133.3. COLISAO DE MOTOCICLETA E DE BICICLETA...........................................................................133.4. QUEDA..................................................................................................................................................133.5. EXPLOSÕES.........................................................................................................................................143.6. FERIMENTOS PENETRANTES..........................................................................................................14

4. ABORDAGEM INICIAL AO PACIENTE TRAUMATIZADO.............................154.1. MORTALIDADE POR TRAUMA........................................................................................................154.2. LOCAL DO ACIDENTE.......................................................................................................................154.3. EXAME PRIMÁRIO.............................................................................................................................15

4.3.1. A - Controle da coluna cervical .....................................................................................................164.3.2. A- Via aérea.....................................................................................................................................174.3.4. C – Circulação ...............................................................................................................................194.3.5. D - Avaliação neurológica...............................................................................................................204.3.6. E – Exposição..................................................................................................................................21

4.4. EXAME SECUNDÁRIO.......................................................................................................................214.4.1. História AMPLA............................................................................................................................214.4.2. Abordagem secundária....................................................................................................................22

5. ABORDAGEM DAS VIAS AÉREAS E.............................................................26APARELHO RESPIRATÓRIO..............................................................................266. CHOQUE HIPOVOLÊMICO..............................................................................30

6.1. INTRODUÇÃO....................................................................................................................................306.2. RECONHECIMENTO DO CHOQUE...............................................................................................306.3. ETIOLOGIA..........................................................................................................................................31

6.3.1. Choque Hemorrágico..................................................................................................................316.3.2. Choque não-hemorrágico...........................................................................................................31

6.4. CHOQUE HEMORRÁGICO..............................................................................................................326.4.1. Classificação................................................................................................................................32

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Page 5: Apostila de Trauma-1

6.5. ABORDAGEM INICIAL DO CHOQUE HEMORRÁGICO............................................................336.5.1. Reposição Líquida Inicial...........................................................................................................336.5.2. Avaliação da Resposta à Reposição Volêmica......................................................................34

6.6. REPOSIÇÃO DE SANGUE...............................................................................................................357.1. RESPIRAÇÃO ARTIFICIAL NO ADULTO........................................................................................367.2. RSPIRAÇÃO ARTIFICIAL EM CRIANÇAS E LACTENTES...........................................................367.3. COMPRESSÃO TORÁCICA NO ADULTO........................................................................................367.4. COMPRESSÃO TORÁCICA NA CRIANÇA......................................................................................377.5. COMPRESSÃO TORÁCICA EM LACTENTES.................................................................................37

8. TRAUMA CRÂNIENCEFÁLICO.......................................................................388.1. INTRODUÇÃO...................................................................................................................................388.2. ANATOMIA.........................................................................................................................................388.3. FISIOLOGIA.........................................................................................................................................398.4. CLASSIFICAÇÃO...............................................................................................................................39

8.4.1. Fraturas de Crânio.......................................................................................................................418.4.2. Hematomas Epidurais.................................................................................................................418.4.3. Hematomas Subdurais...............................................................................................................428.4.4. Contusões e Hematomas Intracerebrais.................................................................................438.4.5. Lesões Difusas.............................................................................................................................43

8.5. QUADRO CLÍNICO............................................................................................................................438.6. CONDUTA............................................................................................................................................448.7 MANEJO CLÍNICO................................................................................................................................458.8. MANEJO CIRÚRGICO.........................................................................................................................45

8.8.1. Lesões de couro cabeludo........................................................................................................458.8.2. Fraturas com afundamento de crânio e lesões intracranianas de massa..........................................46

9. FERIDAS E ANESTESIA EM PRONTO-SOCORRO........................................469.1. CLASSIFICAÇÃO DAS FERIDAS..............................................................................................46

9.1.1. Quanto à forma................................................................................................................................469.1.2. Quanto ao tecido comprometido.....................................................................................................479.1.3. Quanto ao grau de contaminação....................................................................................................47

9.2. TRATAMENTO DA FERIDA..............................................................................................................479.3. RETIRADA DOS PONTOS..................................................................................................................499.4. CURATIVO...........................................................................................................................................499.5. CASOS ESPECIAIS..............................................................................................................................499.6. MEDICAMENTOS................................................................................................................................49

10.ATENDIMENTO AO QUEIMADO....................................................................5110.1. INTRODUÇÃO....................................................................................................................................5110.2. MEDIDAS IMEDIATAS PARA SALVAR A VIDA DO DOENTE QUEIMADO...........................51

10.2.1. Via Aérea....................................................................................................................................5110.2.2. Interrupção do Processo de Queimadura.............................................................................5110.2.3. Acesso Venoso..........................................................................................................................52

10.3. AVALIAÇÃO DO DOENTE QUEIMADO........................................................................................5210.3.1. História........................................................................................................................................5210.3.2. Área de Superfície Corpórea...................................................................................................5210.3.3. Profundidade da Queimadura.................................................................................................53

Queimaduras de primeiro grau......................................................................................................................53Queimaduras de segundo grau ou de espessura parcial.................................................................................53Queimaduras de terceiro grau ou de espessura total.....................................................................................53

10.3.4. Estabilização do Doente Queimado.......................................................................................53A. Via Aérea.............................................................................................................................................53B. Respiração..........................................................................................................................................53C. Volume Sangüíneo Circulante.........................................................................................................5410.3.5. Exames Básicos para Doentes com Queimaduras Importantes.......................................54A. Sangue..........................................................................................................................................55B. Radiografias.................................................................................................................................55

10.4. CONDUTA...........................................................................................................................................5510.4.1. Queimaduras Circunferenciais em Extremidades – Manutenção da Circulação Periférica..........5510.4.2. Sondagem Nasogástrica..........................................................................................................5510.4.3. Narcóticos, Analgésicos e Sedativos.....................................................................................55

5

Page 6: Apostila de Trauma-1

10.4.4. Cuidados com a Ferida............................................................................................................5610.4.5. Antibióticos.................................................................................................................................5610.4.6. Cuidados com Queimaduras Especiais.................................................................................56A. Queimaduras Químicas....................................................................................................................56B. Queimaduras Elétricas......................................................................................................................56

10.5. CRITÉRIOS PARA TRANSFERÊNCIA............................................................................................5710.6. TRATAMENTO DE PEQUENAS QUEIMADURAS TÉRMICAS..................................................57

10.6.1. Conduta Inicial..........................................................................................................................5810.6.2. Antibióticos...............................................................................................................................5810.6.3. Orientações................................................................................................................................58

11. TRAUMA ORTOPÉDICO................................................................................5911.1. SEMIOLOGIA ORTOPÉDICA...........................................................................................................59

11.1.1. Anamnese...................................................................................................................................5911.1.2. Exame Físico..............................................................................................................................5911.1.3. Radiológico.................................................................................................................................59

11.2. FRATURAS.........................................................................................................................................6011.2.1. Quadro clínico............................................................................................................................6011.2.2. Imobilização..................................................................................................................................6111.2.3. Tratamento.....................................................................................................................................62

11.3. LUXAÇÕES.........................................................................................................................................6211.3.1. Quadro Clínico...........................................................................................................................6211.3.2. Tratamento.....................................................................................................................................63

12. TRAUMA NA GESTANTE..............................................................................6412.1. INTRODUÇÃO.............................................................................................................................6412.2. ALTERAÇÕES ANATÔMICAS E FISIOLÓGICAS DA GRAVIDEZ....................................64

12.2.1. Alterações uterinas....................................................................................................................6412.2.2. Alterações na parede uterina e líquido amniótico................................................................6512.2.3. Placenta......................................................................................................................................6512.2.4. Alterações sangüíneas.............................................................................................................6512.2.5. Alterações hemodinâmicas......................................................................................................6612.2.6. Alterações respiratórias............................................................................................................6612.2.7. Alterações endócrinas..............................................................................................................6612.2.8. Alterações gastrointestinais.....................................................................................................6612.2.9. Alterações urinárias..................................................................................................................6712.2.10. Alterações músculo-esqueléticas.........................................................................................6712.2.11. Alterações neurológicas.........................................................................................................67

12.3. MECANISMO DO TRAUMA......................................................................................................6712.3.1. Trauma fechado.........................................................................................................................6712.3.2. Trauma penetrante....................................................................................................................68

12.4. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO...........................................................................................6812.4.1. Exame primário e reanimação materna.................................................................................6812.4.2. Exame primário e reanimação fetal........................................................................................6912.4.3. Avaliação secundária................................................................................................................6912.4.4. Cuidados definitivos..................................................................................................................6912.4.5. Cesariana “post mortem”..........................................................................................................70

13. TRAUMA NA CRIANÇA.................................................................................7113.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS..............................................................................................................7113.2. ANATOMIA........................................................................................................................................71

13.3. ESTADO PSICOLÓGICO...............................................................................................................7113.4. SUPORTE AVANÇADO DE VIDA...............................................................................................7113.4.1. A – Vias Aéreas.........................................................................................................................7113.4.2. B – Respiração...............................................................................................................................7213.4.3. C – Circulação...............................................................................................................................7313.4.4. D – Avaliação Neurológica...........................................................................................................7313.4.5. E – Exposição................................................................................................................................74

14. ABUSO INFANTIL..........................................................................................7515. TRAUMA NO IDOSO......................................................................................77

15.1. ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS........................................................................................................7715.2. COMORBIDADES............................................................................................................................77

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Page 7: Apostila de Trauma-1

15.3. MECANISMOS MAIS FREQUENTES..............................................................................................7815.4. COMPLICAÇÕS, DURAÇÃO DO TRATAMENTO E PROGNÓSTICO...................................78

16. S.T.A.R.T........................................................................................................79

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Page 8: Apostila de Trauma-1

1. INTRODUÇÃO

A Liga Acadêmica do Trauma UFPR-Hospital do Trabalhador (LiAT) foi

fundada em maio de 1999, sob a orientação do Dr. Iwan Collaço, professor

Coordenador da Disciplina do Trauma e chefe do serviço de Cirurgia Geral do

Hospital do Trabalhador (HT). Acadêmicos do Curso de Medicina da UFPR e

Cirurgiões Gerais do HT iniciaram as atividades da Liga, com reuniões e palestras

sobre diversos tópicos em Trauma.

No segundo semestre do mesmo ano, foi realizado com grande sucesso o

“Curso de Atendimento Pré-Hospitalar em Trauma e Emergência”, somente para

os integrantes da LiAT, com simulado organizado e realizado em conjunto com o

SIATE-Curitiba.

Nos moldes deste curso realizado em 1999, os Orientadores,

Coordenadores e Membros da LiAT idealizaram o quarto “Curso de Emergências

da Liga Acadêmica do Trauma UFPR-HT” para este segundo semestre de 2003.

Aberta aos acadêmicos de Medicina em geral e aos demais profissionais e

acadêmicos interessados, o “Curso de Emergências” faz parte do cronograma

semestral da LiAT, sendo um meio importante de aprendizado e revisão de

conhecimentos sobre o atendimento ao politraumatizado no Hospital do

Trabalhador.

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Page 9: Apostila de Trauma-1

2. HISTÓRICO

Os Primeiros Socorros são cuidados imediatos prestados à pessoa, vítima

de acidente ou mal súbito, até que se possa obter assistência médica adequada.

Os protocolos do PHTLS (Pre-Hospital Trauma Life Support) e ATLS

(Advanced Trauma Life Support) foram criados para promover uma estrutura para

o manejo do paciente politraumatizado. Têm como intenção, possibilitar que

qualquer médico tenha conhecimento do manejo efetivo do paciente

politraumatizado.

Estes protocolos originaram-se nos Estados Unidos em 1976, quando um

cirurgião ortopedista, pilotando um monomotor, caiu com seu avião num campo

em Nebraska. Sua esposa morreu e três de seus filhos apresentavam ferimentos

graves. Ele, então, aterrorizado com o tratamento desordenado de seus filhos,

revolucionou os cuidados com o trauma através do mundo.

Vários médicos, equipes e grupos de enfermeiros de Nebraska,

começaram a criar um conjunto de protocolos para o manejo destes pacientes.

Estes protocolos foram então incorporados e modificados pelo Colégio Americano

de Cirurgiões, que publicou a primeira versão do ATLS em 1980. A publicação

original é revisada e atualizada constantemente.

O conhecimento dos protocolos de atendimento ao politraumatizado

torna-se essencial aos profissionais da área Médica, de Enfermagem, e

relacionados, uma vez que estes pacientes necessitam de cuidados especiais

desde o primeiro atendimento, para que possam se recuperar sem seqüelas, ou

com o mínimo possível de alterações na forma de viver.

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Page 10: Apostila de Trauma-1

3. CINEMÁTICA DO TRAUMA

Cerca de 90% das lesões sofridas por um paciente podem ser

identificadas quando se conhece a forma como o evento causador das lesões

ocorreu.

Deve-se dar atenção ao que pode tê-lo precedido, como uma convulsão,

uso de drogas / álcool, perda da consciência antes do impacto, etc. A história

sobre essa fase deve conter:

1- O tipo de evento traumático, por exemplo, colisão entre

veículos, quedas, ferimentos penetrantes, etc.

2- Estimativa da quantidade de transferência de energia que

ocorreu, por exemplo, velocidade do veículo no instante do

impacto, altura da queda, calibre da arma.

3- Tipo de colisão ou impacto do paciente com o objeto.

Os mecanismos de trauma podem ser classificados como contusões

(mais comuns), explosões e ferimentos penetrantes.

Dentro de cada tópico citado acima, veremos algumas considerações.

3.1. COLISÃO AUTOMOBILÍSTICA

Podem ser subdivididas em: 1)colisões entre a vítima e o veículo ou entre

a vítima e algum objeto fora do veículo, e 2)colisões entre os órgãos da vítima e a

estrutura externa do seu corpo (compressão dos órgãos).

3.1.1. Impacto Frontal

É a colisão contra um objeto que se encontra em frente ao veículo. Ocorre

redução súbita da velocidade, e o ocupante que não esteja devidamente contido

continua a se movimentar para frente. Caso se choque contra alguma parte da

cabine, sua velocidade irá ser reduzida; caso contrário ele poderá ser ejetado do

veículo.

Dentre as causas de lesão que podem ocorrer, as mais comuns são:

colisão da cabeça contra o pára-brisa, do tórax anterior contra o volante, dos

joelhos contra o painel inferior e dos pés contra o fundo do painel.

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Page 11: Apostila de Trauma-1

O paciente pode apresentar, então, feridas de partes moles em face e

tórax, compressão de caixa torácica com contusão pulmonar ou até mesmo

pneumotórax, fratura de arcos costais e esterno, contusão abdominal e

compressão de vísceras, fratura de fêmur, luxações, etc. É o tipo de impacto que

mais causa lesões e mortes em acidentes de trânsito.

3.1.2. Impacto Lateral

Este tipo de colisão só perde para impactos frontais em causa de morte e

lesões. Deve-se dar importância ao lado do veículo que recebeu a colisão e à

posição que o paciente ocupava, além do grau de deformidade do veículo. A

maioria das lesões ocorre por compressão de pelve e tronco, do lado acometido

(direito pulmão e fígado e esquerdo pulmão e baço).

3.1.3. Impacto Traseiro

Esse tipo de colisão geralmente ocorre quando um veículo está parado e

outro o atinge por trás. Os ocupantes são arremessados para frente e, pela

posição dos assentos, o tronco sofre aceleração para adiante. A cabeça dos

ocupantes não acompanha essa aceleração, pois o encosto da cabeça não está

devidamente posicionado. Com isso, o corpo acelera e a cabeça não acompanha,

ficando o pescoço em hiperextensão, por cima do suporte da cabeça. Tal

hiperextensão estira as estruturas de sustentação do pescoço, produzindo lesão

por mecanismo de chicote (whiplash).

Podem ocorrer: fraturas de lâminas, dos pedículos e dos processos

espinhosos das vértebras e fraturas em vários outros locais, devido ao contato

direto entre os ossos.

3.1.4. Capotamento

Nesse caso, o ocupante que não esteja contido pode chocar-se contra

qualquer parte da cabine. As lesões podem ser deduzidas a partir da observação

das áreas de impacto na pele do paciente. Admite-se que esse tipo de colisão

produza lesões mais graves por causa dos deslocamentos múltiplos que ocorrem

durante a capotagem.

3.1.5. Ejeção de dentro do veículo

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Page 12: Apostila de Trauma-1

Nesses casos, as lesões podem ser maiores devido ao impacto também

provocado contra o solo. A probabilidade de lesões nessa forma de acidente

aumenta em 300%. Deve-se estar atento às lesões ocultas.

3.1.6. Lesão de órgãos

A. Lesões por compressão

Sempre causadas quando a parte do anterior do tronco deixa de se

deslocar para frente e a parte posterior continua o deslocamento. As vísceras

ficam aprisionadas entre a parede tóraco-abdominal e a coluna vertebral. São

exemplos as contusões miocárdicas, pulmonares e de vísceras abdominais.

Uma característica peculiar nesse caso é o fato de ser comum a vítima

inspirar e fechar a glote. Desta maneira pela oclusão e compressão da caixa

torácica, será inevitável a ruptura de alvéolos e a formação de pneumotórax

simples ou hipertensivo.

Na cavidade abdominal, o mesmo mecanismo leva à ruptura de diafragma

e o deslocamento de seu conteúdo para a caixa torácica. A compressão do

conteúdo craniano pode sofrer efeito de ossos fraturados penetrando-o ou ser

devida à compressão das porções anteriores do parênquima contra a parede do

crânio pelas porções posteriores do próprio cérebro.

B. Lesões por desaceleração

Essas lesões ocorrem quando a parte responsável pela estabilização do

órgão, por exemplo, o pedículo renal ou a aorta descendente cessam seu

deslocamento anterior acompanhando o tronco, ao mesmo tempo em que a parte

móvel de seu corpo, por exemplo o rim, ou o coração com o arco aórtico,

continuam deslocando-se para a frente. As lesões nesses dois órgãos são as

mais comuns de ocorrer por ação das forças de cisalhamento.

C. Lesões por meios de contenção

É muito comum esse tipo de lesão pelo uso incorreto do cinto de

segurança. Por exemplo, quando este está colocado acima das cristas ilíacas

ântero-superiores, a anteriorização da parede posterior abdominal e da coluna

esmaga o pâncreas, o fígado, o baço e o duodeno contra o cinto de segurança. A

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Page 13: Apostila de Trauma-1

hiperflexão contra um cinto mal posicionado pode ocasionar fraturas por

compressão anterior da coluna lombar (fraturas de Chance).

3.2. ATROPELAMENTO

Entre as lesões sofridas por pedestres vítimas de atropelamento as

lesões mais comuns são: torácicas, cranioencefálicas e de extremidades

inferiores (nesta ordem).

O atropelamento segue três fases de impacto:

Impacto contra o pára-choque dianteiro, geralmente atingindo pernas e

pelve no adulto e lesões torácicas e abdominais nas crianças;

Impacto contra o capô e o pára-brisa, geralmente afetando tronco e

cabeça;

Impacto contra o solo, geralmente afetando cabeça, coluna e vísceras.

3.3. COLISAO DE MOTOCICLETA E DE BICICLETA

As lesões do condutor e eventuais passageiros devem-se por

aceleração/desaceleração, compressão e cisalhamento. A forma como sofrem as

lesões é diferente, pois tais vítimas não são protegidas pela estrutura dos

veículos, nem por dispositivos de segurança. Estão protegidas apenas pela roupa,

o capacete, as botas, sendo de fundamental importância a observação da

indumentária dessas vítimas.

A maior parte das lesões deve-se por: impacto frontal/ejeção, impacto

lateral/ejeção e derrapada lateral.

3.4. QUEDA

É a primeira causa de traumatismo não fatal e a segunda de importantes

lesões de medula e cérebro.

As lesões devidas às quedas ocorrem por desaceleração. A gravidade é

determinada pela cinemática da desaceleração vertical, combinada com a

propriedade coesiva do corpo e a consistência da superfície de impacto. A

gravidade aumenta à medida que se eleva a velocidade de desaceleração e

diminui a distância ao longo da qual o corpo é desacelerado.

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Page 14: Apostila de Trauma-1

3.5. EXPLOSÕES

São resultados da transformação química rápida de produtos sólidos,

semi-sólidos, líquidos e gasosos em produtos gasosos que ocupam volumes

maiores do que os ocupados antes da detonação. À medida que a onda avança, o

meio por onde ela passa sofre oscilação.

As lesões pelo mecanismo de explosão podem ser:

Primárias: pelo efeito direto da onda de pressão, sendo mais nocivas

aos órgãos que contém gás. Ocorrem lesões como, rotura de tímpano,

contusão pulmonar, pneumotórax, rotura de alvéolos podendo formar

embolia gasosa, hemorragia intra-ocular, descolamento de retina e

roturas intestinais.

Secundárias: Resultam por objetos arremessados.

Terciárias: Quando o indivíduo é arremessado contra objeto sólido ou

solo.

3.6. FERIMENTOS PENETRANTES

Nessa classificação estão os ferimentos por arma de fogo e os ferimentos

por arma branca. O trauma penetrante produz solução de continuidade entre o

meio externo e o meio interno do corpo. Produzem cavitação, que é o resultado

da permuta de energia entre o objeto em movimento e os tecidos. A identificação

dos orifícios de entrada e de saída (quando existir) são importantes para o

reconhecimento de estruturas anatômicas que possam ter sido lesadas nesse

trajeto.

4. ABORDAGEM INICIAL AO PACIENTE TRAUMATIZADO

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Page 15: Apostila de Trauma-1

4.1. MORTALIDADE POR TRAUMA

Os pacientes que morrem por Trauma podem ser divididos em 3 grupos:

1 (segundos a minutos) – morte imediata, lesões graves de encéfalo e

tronco cerebral, lesões graves em coluna cervical alta, lesões graves

em coração e grandes vasos

2 (minutos a horas) – morte precoce, hematomas epi/subdural,

hemopneumotórax, ruptura de baço ou fígado, fraturas de pelve,

hemorragias significativas

3 (dias a semanas) – sepsis e falência de múltiplos órgãos e sistemas

Para os pacientes do grupo 1, praticamente nada se pode fazer.

Entretanto, uma abordagem sistematizada, diagnosticando e tratando os

fenômenos que conduzem à morte, numa seqüência racional de prioridades,

promove a reanimação que garante a sobrevida de muitas vítimas do Grupo 2.

A melhoria imediata das condições de oxigenação e perfusão pode

favorecer a resistência das vítimas às infecções e deter o curso dos eventos

biológicos que culminam na falência de múltiplos de órgãos, baixando a

mortalidade das vítimas do grupo 3.

4.2. LOCAL DO ACIDENTE

O socorrista deve verificar a sua própria segurança, ou ainda, se existe a

possibilidade de um novo acidente. Se necessário providenciar sinalização do

local.

Deve se identificar e informar-se com a(s) vítima(s) ou com testemunha(s)

como ocorreu o mecanismo de trauma num acidente.

Colher informações e documentos relativos à hora do trauma, eventos

relacionados ao trauma e história do paciente.

Orientar alguém para chamar ajuda qualificada (SIATE 190).

4.3. EXAME PRIMÁRIO

No atendimento de pacientes politraumatizados, é de extrema importância

a avaliação correta e o estabelecimento de um plano de prioridade de tratamento.

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Page 16: Apostila de Trauma-1

Desta maneira, é feita uma avaliação rápida e eficiente das funções vitais da

vítima. A primeira etapa da abordagem é fator determinante no sucesso do seu

resgate e tratamento. A avaliação cuidadosa e detalhada de um traumatizado só

deve ser realizada após o término da avaliação inicial e da fase de reanimação,

quando necessária, estando a vítima estabilizada.

Pacientes são avaliados e prioridades de tratamentos são estabelecidas

com base em seus traumas, estabilidade de seus dados vitais e mecanismo do

trauma.

No paciente gravemente traumatizado, uma seqüência lógica de

prioridade de tratamento deve ser estabelecida com base no exame global do

paciente. As funções vitais devem ser avaliadas rápida e efetivamente. O

gerenciamento do paciente deve constituir de uma rápida avaliação primária,

reanimação de funções vitais, um exame secundário mais detalhado e,

finalmente, a aplicação do tratamento definitivo.

No exame primário, as condições ameaçadoras à vida são identificadas e

a reanimação é iniciada simultaneamente:

A (airway): via aérea com controle da coluna cervical

B (breathing): respiração e ventilação

C (circulation): circulação com controle de hemorragias

D (disability): estado neurológico

E (exposure/enviroment): exposição da vítima com controle da hipotermia.

O exame primário deve ser completado no máximo em dois minutos e só

pode ser interrompido por obstrução de vias aéreas e parada cardio-respiratória.

4.3.1. A - Controle da coluna cervical

Deve-se evitar lesões adicionais por movimento, compressão ou ruptura

do tronco cerebral ou medula espinhal em pacientes que possam ter lesões em

coluna cervical.

Devemos sempre suspeitar de lesões em coluna cervical em todas as

vítimas de trauma, especialmente naquelas com alterações no nível de

Clique no link pressionando a tecla CTRL para ver as imagens

16

Page 17: Apostila de Trauma-1

consciência, em traumatismos fechados acima da altura das clavículas, pacientes

expostos a "efeito chicote" em acidentes automobilísticos, dor no pescoço ou no

dorso, déficit sensitivo ou motor no dorso ou nos membros ou ferimento cervical

penetrante.

Até a chegada do atendimento especializado e com equipamentos

adequados para imobilização cervical deve-se estabelecer controle manual sobre

a cabeça de pescoço da vítima mantendo-os alinhados. A imobilização cervical

deve ser mantida até que se exclua definitivamente possibilidade de lesão

cervical.

Técnicas de imobilização cervical:

Imobilização em região frontal

Imobilização via mandíbula

Colar cervical

4.3.2. A- Via aérea

Pergunte “o que aconteceu?”

Se a vítima respondeu normalmente - via aérea permeável e

respiração espontânea - siga para o B

Se a vítima não responde normalmente - examine a via aérea

Via aérea obstruída? – desobstrua

Via aérea desobstruída? - avalie a respiração

Avaliar:

Resposta verbal

Ver, ouvir e sentir

Observar respiração ruidosa

Lembrar:

Agitação = Hipóxia

Obnubilação = Hipercarbia

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17

Page 18: Apostila de Trauma-1

Cianose = Hipóxia por oxigenação inadequada

Retração costal ou uso de musculatura acessória = Possível obstrução

Respiração ruidosa = Respiração obstruída

Roncos, borbulhos ou estridores = Oclusão parcial de faringe ou

laringe

Causas de obstrução de vias aéreas:

Queda da língua

Presença de corpo estranho em vias aéreas

Sangue, hematoma e edema de laringe

Relaxamento dos tecidos moles da faringe

Fraturas faciais, mandibulares ou traqueolaríngeas

Técnicas para desobstrução das vias aéreas:

Extensão do pescoço

Elevação do mento

Tração da mandíbula

Técnica dos dedos cruzados

Técnica do dedo em pinça

Técnica do dedo em gancho

Técnica da rotação em 90 (capítulo Técnicas de remoção)

Cânula de Guedel.

Obs.: Todas as manobras para estabelecer a permeabilidade das vias

aéreas devem ser feitas com proteção da coluna cervical.

4.3.3. B - Respiração

A boa respiração não se assegura apenas pela permeabilidade das vias

aéreas. Há necessidade de uma ventilação adequada, ou seja, a troca de gases é

imperativa para maximizar a transferência de oxigênio e eliminar o gás carbônico.

A boa ventilação envolve o funcionamento adequado dos pulmões, da parede

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18

Page 19: Apostila de Trauma-1

torácica e do diafragma. Cada um destes componentes deve ser rapidamente

avaliado.

Avaliação:

Ver movimentos torácicos de elevação e abaixamento

Ouvir e sentir o fluxo aéreo expiratório

Analisar a sua qualidade (superficial ou profunda; ritmo regular ou

irregular; tranqüila ou ruidosa).

Devemos identificar e tratar prontamente as lesões torácicas que

causam risco de vida no exame primário, que são:

Pneumotórax hipertensivo

Pneumotórax aberto

Tórax instável por múltiplas fraturas ósseas

Hemotórax maciço

Tamponamento cardíaco

Avaliar:

Respiração ausente? - inicie respiração artificial

Respiração presente? - analise qualidade e vai para o C.

4.3.4. C – Circulação

Choque: estado de colapso causado por insuficiência circulatória nos

tecidos e órgãos vitais. A perfusão insuficiente incapacita os órgãos vitais a

manter as suas funções fisiológicas vitais.

No trauma, todo paciente em choque é considerado como hipovolêmico

até que se prove o contrário.

Hemorragia é causa predominante de morte pós-trauma, sendo

amenizada por tratamento efetivo e rápido em ambiente pré-hospitalar. Avaliação

rápida e precisa do estado hemodinâmico do paciente traumatizado é essencial.

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Page 20: Apostila de Trauma-1

Avaliar:

Nível de consciência

Cor da pele

Temperatura da pele

Pressão arterial

Respiração

Sede intensa

Pulsos carotídeo ou femoral (bilateral, qualidade, freqüência e

regularidade) e pulsos periféricos

Avaliação das veias do pescoço

Presença de hemorragias externas

O sinal mais precoce de choque é a taquicardia. A ausência de pulsos

centrais não relacionada a fatores locais determina necessidade imediata de

reanimação para restaurar o déficit volêmico e/ou o débito cardíaco do paciente.

Grandes hemorragias devem ser identificadas e controladas, o

sangramento externo pode ser controlado exercendo-se pressão externa sobre o

ferimento, elevação do membro atingido, aplicação de compressas frias ou

compressão arterial proximal à lesão, ou através da imobilização das fraturas. A

utilização de torniquete, como regra geral, deve ser evitada.

Palpe o pulso carotídeo da vítima:

Se ausente - falta bomba cardíaca? – iniciar compressão torácica

externa (técnica capítulo específico)

Falta volume circulante? - dois acessos venosos curtos e de grosso

calibre

Grandes hemorragias? - contenção do sangramento

4.3.5. D - Avaliação neurológica Clique no link pressionando a tecla CTRL para ver as imagens

20

Page 21: Apostila de Trauma-1

A avaliação neurológica sucinta do paciente politraumatizado tem o intuito

de determinar rapidamente seu nível de consciência e a possibilidade de lesões

neurológicas.

A seqüência de avaliação a ser adotada é:

A - paciente alerta

V - responde a estímulo verbal

D - responde a estímulo doloroso

I - irresponsivo

Pupila - Tamanho, forma e fotorresponsibilidade

O rebaixamento do nível de consciência pode significar diminuição na

perfusão/oxigenação cerebral ou pode ser resultado direto de um trauma

encefálico. O nível de consciência do paciente pode estar alterado por intoxicação

alcoólica ou uso de drogas, no entanto este deve ser considerado um diagnóstico

de exclusão, devendo-se inicialmente pesquisar choque, hipóxia ou TCE.

4.3.6. E – Exposição

Despir completamente a vítima, e dar início à abordagem secundária.

O paciente deve ser coberto para prevenir hipotermia.

Atenção!

Repetir o A/B/C/D antes do início da abordagem secundária

Controlar a coluna cervical durante todo o tempo

4.4. EXAME SECUNDÁRIO

4.4.1. História AMPLA

A lergia

M edicações

P assado médico/ P renhez

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Page 22: Apostila de Trauma-1

L íquidos/alimentos ingeridos

A mbiente e eventos relacionados

4.4.2. Abordagem secundária

Só se inicia depois de completada a abordagem primária.

Examinar todos os segmentos do corpo.

Fazer inspeção avaliando:

cor da pele

simetria

alinhamento

deformidades

sangramentos

Fazer a palpação avaliando:

deformidades

crepitações

rigidez

flacidez

temperatura

sudorese

Fazer ausculta avaliando:

ápices e bases pulmonares

precórdio

Avaliar dados vitais:

pressão arterial

pulso

freqüência respiratória

A. Pressão arterial

Verificação:

estetoscópio e esfigmomanômetro

22

Page 23: Apostila de Trauma-1

pulsação das artérias

Valores normais (com equipamentos):

PAS: entre 100 e 140mmHg

PAD: entre 50 e 90mmHg

Valores mínimos (verificação apenas da pulsação):

Artéria femoral: 80mmHg

Artéria radial: 70mmHg

Artéria Carótida:60mmHg

B. Pulso

Verificação:

Adultos e crianças: artéria radial e carótida

Recém-nascidos: artéria braquial

Valores normais:

Adulto: 60 a 100bpm

Adolescentes: 120bpm

Crianças maiores: 140bpm

Crianças menores: 160bpm

C. Freqüência respiratória:

Verificação:

Observar os movimentos de tórax e do abdome

Ouvir e sentir a saída de ar pelas narinas

Valores normais:

Adulto: 12 a 20 mrpm

Adolescentes: 20 mrpm

Crianças maiores: 30 mrpm

Crianças menores: 40 mrpm

Sinais de apoio:

Pupilas

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Page 24: Apostila de Trauma-1

Cor e umidade da pele

Estado de consciência

Sensibilidade

Capacidade de movimento.

D. Escala de Coma de Glasgow

Identificação mais precisa do nível de resposta e consciência do paciente.

Será mais profundamente abordada no capítulo de TCE.

E. Exame segmentar:

Abordagem de cada órgão em busca de possíveis lesões.

1. Cabeça: Palpação de crânio, órbitas, ossos nasais, malares e

maxilares. Inspeção para cor e integridade da face, hemorragia,

liquorragia, hematoma retro-auricular, simetria da face, laceração dos

olhos, foto reatividade pupilar e corpos estranhos remanescentes na

boca.

2. Pescoço: Inspeção do alinhamento da traquéia, simetria do pescoço e

jugulares. Palpação da coluna cervical verificando alinhamento,

crepitações ou rigidez muscular.

3. Tórax: Palpação de clavícula e caixa torácica. Procura de assimetria

anatômica e funcional, respiração paradoxal, áreas de palidez,

eritema, hematoma ou ferimentos, ausculta pulmonar e cardíaca.

4. Abdome: Inspeção para sinais de contusão e mobilidade. Palpação

analisando sensibilidade e rigidez de parede.

5. Quadril: Afastamento e aproximação das asas ilíacas em relação da

linha média, analisando estabilidade, mobilidade anormal e produção

de dor.

24

Page 25: Apostila de Trauma-1

6. MMII: Procura de sangramentos, deformidades, flacidez, rigidez e

crepitação. Mobilidade articular ativa e passiva. Palpação dos pulsos

nos tornozelos e nos pés. Teste de sensibilidade e motricidade.

7. MMSS: Procura de sangramentos, deformidades, flacidez, rigidez e

crepitação. Mobilidade articular ativa e passiva. Palpação dos pulsos

radiais. Teste de simetria da força muscular das mãos e do

enchimento capilar.

8. Dorso (após realização da manobra de rotação de 90º): Inspeção do

alinhamento da coluna e simetria dos dimídios. Palpação da coluna

em busca de edema, hematoma e crepitação.

E. Refazer ABCD

Durante a abordagem secundária rever e intervir, repetidamente se

necessário, sobre as condições de permeabilidade das vias aéreas e ventilação,

estado hemodinâmico e nível de consciência da vítima. Além de iniciar uma busca

para obtenção da história do trauma com o paciente, ou se necessário familiares

e indivíduos que presenciaram o acidente.

5. ABORDAGEM DAS VIAS AÉREAS E

25

Page 26: Apostila de Trauma-1

APARELHO RESPIRATÓRIO

Após a devida estabilização da coluna cervical devemos iniciar nosso

exame primário propriamente dito. Na maioria dos casos o simples fato do

paciente responder a perguntas simples como seu nome nos dá a certeza de que

a via aérea está pérvea. Avaliação adicional pode ser realizada utilizando os

dedos cruzados para abertura da cavidade oral e a utilização de objetos rígidos

para avaliação e retirada de corpos estranhos.

Os sinais objetivos de comprometimento da ventilação são:

agitação (hipóxia)

torpor (hipercarbia)

cianose (leito ungueal / pele / boca)

tiragem

uso de musculatura acessória respiratória

presença de roncos, gorgolejos ou estridor

rouquidão (lesão funcional da laringe)

desvio de traquéia

assimetria (tórax instável / comprometimento de um hemitorax)

diminuição / ausência de murmúrio vesicular uni ou bilateral

hipertimpanismo / macicez a percussão dos espaços intercostais

taquipnéia

alteração da saturação verificada com oxímetro de pulso

Técnicas de manutenção das vias aéreas

Elevação do mento: evita o prolapso posterior da língua. Esta

manobra não deve causar hiperextensão da coluna cervical

Tração da mandíbula

Cânula orofaríngea ou de Guedel: só deve ser utilizada em

pacientes inconscientes por que pode induzir o reflexo do vômito.

Cânula nasofaringea

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Page 27: Apostila de Trauma-1

Quando estas manobras não são suficientes para a manutenção das

vias aéreas, podemos indicar uma via aérea definitiva. Por conceito, é a presença

de um tubo da traquéia, com balonete insuflado, conectado a um sistema de

ventilação e firmemente fixado.

Tipos de vias aéreas definitivas:

Entubação orotraqueal

Entubação nasotraqueal

Via aérea cirúrgica (cricotireoidostomia e traqueostomia)

As indicações de uma abordagem definitiva de via aérea são:

fraturas maxilo-faciais graves

risco de aspiração (sangramento, vômito)

convulsão persistente

risco de obstrução (hematoma cervical, lesão de traquéia ou laringe,

estridor, inalação de gazes ou calor)

necessidade de ventilação (apnéia, paralisia neuromuscular,

inconsciência)

movimentos respiratórios inadequados com taquipnéia, cianose,

hipóxia, hipercarbia

incapacidade de manter com máscara

Técnica de intubação rápida:

estar preparado para cirurgia de emergência

hiperventilar com oxigênio a 100%

comprimir cartilagem cricóide

succinilcolina 1~2mg/kg EV

intubar

insuflar balão e auscultar tórax

interromper compressão cartilagem cricóide

ventilar

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27

Page 28: Apostila de Trauma-1

Pneumotórax hipertensivo: mecanismo de válvula unidirecional,

podendo causar balanço de mediastino, com diminuição do retorno venoso e

compressão pulmão contralateral. Causado por complicação de pneumotórax

simples por Ferimento por Arma de Fogo (FAF) ou contusão pulmonar (após

cicatrizar), além de fratura de coluna torácica com grande desvio. O diagnóstico é

clínico: dor torácica, dispnéia importante, desconforto respiratório, taquicardia,

hipotensão, desvio de traquéia, murmúrio vesicular ausente, distensão de

Jugulares e tardiamente cianose. Diagnóstico diferencial: tamponamento

cardíaco. O tratamento deve ser imediato: agulha grossa em 2. espaço

intercostal (EIC), na linha hemiclavicular; drenagem fechada em 5. EIC, entre as

linhas axilares anterior e média assim que possível.

Pneumotórax aberto: lesão de cerca de 2/3 do diâmetro da traquéia: ar

tende a entrar pelo ferimento, resultando hipóxia e hipercarbia. Deve-se fazer um

curativo quadrangular estéril preso em 3 pontas, e drenagem fechada o mais

breve possível e sutura da ferida.

Tórax instável: múltiplas fraturas de costelas, causando movimento

paradoxal (isolado não causa hipóxia, mas a dor e a contusão pulmonar sim).

Tratamento com: Oxigênio úmido, reposição volêmica (evitar hiperhidratação),

reexpandir pulmão, analgesia, considerar ventilação mecânica.

Hemotórax maciço: drenagem de mais de 1500ml de sangue inicial.

Causado por ferimentos penetrantes que causam dilaceração de vasos sistêmicos

ou hilares, ou trauma contuso. Diagnóstico pela presença de macicez, murmúrio

vesicular ausente e choque. Tratamento por reposição volêmica (cristalóide e

sangue tipo específico ou autotransfusão) e descompressão. Realizar

toracotomia se drenar mais de 1500ml iniciais ou 200ml/h 2~4h, houver queda do

estado geral, necessitar de muitas bolsas de sangue, apresentar ferimento

penetrante anterior e medial à linha dos mamilos ou posterior e medial às

escápulas (lesão de grandes vasos e hilo).

28

Page 29: Apostila de Trauma-1

Tamponamento cardíaco (diagnóstico diferencial de pneumotórax

hipertensivo): pode ser causado por ferimento penetrante ou trauma contuso.

Diagnóstico pela presença da tríade de Beck (aumento da pressão venosa –

distensão de Jugulares, queda da PA e abafamento de bulhas cardíacas), além

de pulso paradoxal, diminuição em 10mmHg da PAS, sinal de Kussmaul

(aumento da pressão venosa na inspiração durante a respiração expontânea).

Pode ocorrer atividade elétrica sem pulso. Se não houver resposta do choque à

infusão, deve-se realizar pericardiocentese sub-xifóide, janela pericárdica ou

pericardiotomia.

6. CHOQUE HIPOVOLÊMICO

6.1. INTRODUÇÃO

29

Page 30: Apostila de Trauma-1

Choque é definido como uma anormalidade do sistema circulatório, que

resulta em perfusão orgânica e oxigenação tecidual inadequadas.

O passo inicial na abordagem do choque em um doente traumatizado é

reconhecer sua presença, o que é feito através da avaliação clínica da perfusão e

oxigenação. O passo seguinte é identificar a provável causa do choque, iniciando

simultaneamente o tratamento.

A hemorragia é a causa mais comum de choque no doente traumatizado.

Entretanto, o paciente também pode sofrer de choque cardiogênico, neurogênico

e mesmo, ocasionalmente, séptico.

6.2. RECONHECIMENTO DO CHOQUE

Para o reconhecimento do estado de choque é fundamental que, após a

avaliação das vias aéreas e da respiração, seja feita uma avaliação cuidadosa

das condições circulatórias incluindo a freqüência cardíaca e a perfusão cutânea.

A taquicardia e a vasoconstrição cutânea são os sinais mais precoces de perda

de volume sangüíneo, na maioria dos adultos. Por isso, todo doente traumatizado

que está frio e taquicárdico (>100 bpm no adulto) está em choque, até prova em

contrário. Confiar exclusivamente na pressão sistólica como indicador, resulta em

reconhecimento tardio do estado de choque, pois os mecanismos de

compensação podem evitar uma queda mensurável na pressão sistólica até uma

perda de 30% da volemia.

Pacientes idosos têm uma capacidade limitada de aumentar sua freqüência

cardíaca em resposta à perda sangüínea. Dessa forma, não há taquicardia como

indicador precoce de choque. Por outro lado, crianças apresentam grande

capacidade de compensação e assim, demonstram poucos sinais de hipovolemia

mesmo quando existem perdas volêmicas significativas. Atletas apresentam

mecanismos de compensação semelhante às crianças. O uso de bloqueadores

beta-adrenérgicos e de marca-passo também pode alterar significativamente a

resposta hemodinâmica do doente à hemorragia.

6.3. ETIOLOGIA

No doente traumatizado, o choque pode ser classificado, de acordo com

sua etiologia, em hemorrágico ou não-hemorrágico.

30

Page 31: Apostila de Trauma-1

6.3.1. Choque Hemorrágico

Como a hemorragia é a causa mais comum de choque após trauma e a

maioria dos estados de choque não-hemorrágico responde parcial ou

transitoriamente à reposição volêmica, todos os doentes que apresentarem sinais

de choque serão inicialmente tratados como se estivessem hipovolêmicos.

Porém, é muito importante avaliar a resposta do paciente ao tratamento para

identificar o pequeno número de pacientes nos quais a etiologia do choque não é

hemorrágica.

6.3.2. Choque não-hemorrágico

A. Choque cardiogênico

É causado por disfunção cardíaca que pode ocorrer por traumatismo

contuso do coração, por tamponamento cardíaco, por embolia gasosa, ou, mais

raramente, por infarto do miocárdio associado ao trauma. O diagnóstico de

tamponamento cardíaco é sugerido pela presença de taquicardia, bulhas

abafadas, veias do pescoço dilatadas e ingurgitadas com hipotensão que não

responde à reposição volêmica.

B. Pneumotórax hipertensivo

A presença de insuficiência respiratória aguda, de enfisema subcutâneo, de

ausência de murmúrio vesicular, de timpanismo à percussão e de desvio de

traquéia sugere fortemente o diagnóstico de pneumotórax hipertensivo e autoriza

a descompressão torácica sem esperar a confirmação radiológica.

C. Choque neurogênico

Resulta de lesão extensa do sistema nervoso central ou da medula,

provocando hipotensão por perda do tônus simpático. Lesões intracranianas

isoladas não causam choque. O quadro clássico de choque neurogênico é

hipotensão sem taquicardia e sem vasoconstrição cutânea.

D. Choque séptico

É infreqüente, mas deve ser considerado se a chegada do doente ao

serviço de emergência demorar algumas horas.

31

Page 32: Apostila de Trauma-1

6.4. CHOQUE HEMORRÁGICO

6.4.1. Classificação

A hemorragia é definida como uma perda aguda de volume sangüíneo e

pode ser dividida em quatro classes. A distinção entre as classes de choque

hemorrágico nem sempre é muito aparente em um determinado doente e a

reposição volêmica deve ser orientada mais pela resposta individual ao

tratamento inicial do que simplesmente pela classificação inicial.

Classe I Classe II Classe III Classe IV

Perda sangüínea (ml) até 750 750 – 1500 1500 – 2000 >2000

Perda sangüínea (%

vol. sangüíneo)1até 15% 15 – 30% 30 – 40% >40%

Freqüência de pulso <100 >100 >120 >140

Pressão arterial normal normal diminuída3 diminuída

Pressão de pulso

(mmHg)2

normal ou

aumentadadiminuída diminuída diminuída

Freqüência

respiratória14 – 20 20 – 30 30 – 40 >35

Diurese (ml/h) >30 20 – 30 5 – 15 desprezível

Estado mental/SNClevemente

ansioso

moderadame

nte ansioso

ansioso,

confuso

confuso,

letárgico

Reposição volêmica

(regra 3 para 1)cristalóide cristalóide

cristalóide e

sangue

cristalóide e

sangue

OBS.: 1 calculado para um homem de 70 kg

2 diferença entre as pressões sistólica e diastólica. A pressão

sistólica muda pouco no início do choque e o decréscimo da pressão de pulso

está primariamente relacionado à elevação do componente diastólico decorrente

do aumento das catecolaminas circulantes. Portanto, é mais importante avaliar a

pressão de pulso do que a sistólica.

3 A hemorragia classe III é o menor volume de perda sangüínea que

provoca sistematicamente queda da pressão sistólica.

6.5. ABORDAGEM INICIAL DO CHOQUE HEMORRÁGICO

32

Page 33: Apostila de Trauma-1

O diagnóstico e o tratamento devem ser realizados quase

simultaneamente, visando à interrupção do sangramento e à reposição da perda

volêmica.

O exame físico inicial constitui-se no ABCDE:

A. Vias aéreas

B. Respiração

C. Circulação e controle da hemorragia: As prioridades são o controle da

hemorragia externa, a obtenção de acesso venoso e a avaliação da

perfusão tecidual.

D. Exame neurológico: É importante saber que o paciente com choque

hipovolêmico pode ter alterações da função do SNC por perfusão

inadequada do cérebro. Então, antes de atribuir essas alterações a lesões

intracranianas é necessário o restabelecimento da perfusão e oxigenação

cerebrais.

E. Exposição e exame completo

F. descompressão gástrica: A dilatação gástrica pode ser causa de

hipotensão inexplicada ou de bradicardia por estímulo vagal.

G. colocação de sonda urinária: importante para a monitorização da perfusão

renal através do débito urinário.

6.5.1. Reposição Líquida Inicial

No paciente com choque, um acesso venoso adequado deve ser obtido

rapidamente. A melhor forma de ter acesso ao sistema vascular é através da

inserção de dois cateteres intravenosos periféricos (calibre mínimo 16),

preferencialmente cateteres curtos e calibrosos.

Os locais mais adequados para o acesso venoso periférico no adulto são

as veias do antebraço. Se isso não for possível, estarão indicados a dissecção

cirúrgica da veia safena ou o acesso venoso central (veia femoral, jugular ou

subclávia). Em crianças com menos de 6 anos de idade, antes de se proceder a

inserção de um cateter venoso central, deve-se tentar a colocação de uma agulha

intra-óssea.

Para a reposição volêmica inicial são utilizadas soluções eletrolíticas

isotônicas. A escolha inicial é a solução de Ringer lactato, a segunda escolha é a

solução salina fisiológica.

33

Page 34: Apostila de Trauma-1

O volume líquido inicial é administrado tão rapidamente quanto possível, na

dose de 1 a 2 litros no adulto e 20ml/kg em crianças. Como é difícil prever o

volume total de líquidos e sangue necessários para a reanimação, pode-se

determinar o volume aproximado através da chamada “regra 3 para 1”. Essa regra

constitui-se na reposição de 3 ml de solução cristalóide para cada ml de sangue

perdido. Exemplo: tendo em vista que a hemorragia classe III corresponde à

menor perda volêmica associada a queda da pressão sistólica, um doente de 70

kg que chega hipotenso perdeu aproximadamente 1470 ml de sangue (70kg x

7%* x 30% = 1470 ml). Usando a regra 3 para 1, este doente necessita de 4,4

litros de cristalóides para a reanimação (1470 ml x 3 = 4410ml).

(*OBS.: o volume sangüíneo de um adulto normal corresponde a

aproximadamente 7% de seu peso corpóreo.)

6.5.2. Avaliação da Resposta à Reposição Volêmica

A avaliação da resposta do paciente à reposição inicial é muito importante,

pois as decisões terapêuticas e diagnósticas ulteriores serão baseadas nessa

resposta. Para essa avaliação utilizam-se parâmetros como o débito urinário, o

nível de consciência e a perfusão periférica. O débito urinário é uma das formas

mais importantes de monitorar a reanimação e a resposta do doente. A reposição

adequada de volume deve restabelecer o débito urinário a aproximadamente 0,5

ml/kg/h no adulto, 1 ml/kg/h em doentes pediátricos e 2 ml/kg/h em crianças

abaixo de 1 ano de idade.

A resposta do paciente também pode ser avaliada através do equilíbrio

ácido-básico. Acidose metabólica grave reflete, habitualmente, uma reanimação

inadequada ou perdas sangüíneas continuadas.

Observando-se a resposta à reposição volêmica inicial, pode-se identificar

aqueles doentes cuja perda de sangue foi maior que a estimada e aqueles com

sangramento persistente que exigem um controle cirúrgico de hemorragia interna.

O padrão de resposta pode ser dividido em três categorias: resposta rápida,

resposta transitória e resposta mínima ou ausente à administração inicial de

fluido.

a) Resposta rápida: respondem rapidamente e permanecem

hemodinamicamente normais após o término da reposição volêmica inicial.

34

Page 35: Apostila de Trauma-1

Apresentam perda da volemia inferior a 20%. Não está indicada a

administração adicional de soro ou sangue.

b) Resposta transitória: respondem à reposição inicial rápida, mas mostram

deterioração da perfusão periférica quando a velocidade da infusão é

reduzida para níveis de manutenção, indicando sangramento persistente

ou reanimação inadequada. A perda sangüínea estimada é de 20 a 40% da

volemia. Estão indicados a administração contínua de líquidos e o início de

transfusão sangüínea, além da avaliação precoce de um cirurgião.

c) Resposta mínima ou ausente: A falta de resposta à administração

adequada de cristalóides e de sangue indica a necessidade de intervenção

cirúrgica imediata para controlar uma hemorragia exangüinante. Os

diagnósticos de choque não-hemorrágico devem ser sempre lembrados

nesse grupo de pacientes.

6.6. REPOSIÇÃO DE SANGUE

A transfusão sangüínea tem como objetivo principal restabelecer a

capacidade de transporte de oxigênio do volume intravascular. A reposição

volêmica, em si, pode ser obtida com cristalóides. Podem ser utilizados sangue

total ou concentrado de hemácias.

A alternativa preferível é a utilização de sangue com todas as provas

cruzadas. Quando isso não é possível, prefere-se sangue tipo específico

(compatibilidade nos sistemas ABO e Rh), já que este pode ser providenciado

mais rapidamente. Se sangue tipo específico não estiver disponível, está indicado

o uso de concentrados de hemácias tipo O (em mulheres em idade fértil, prefere-

se glóbulos Rh negativos).

Para evitar a hipotermia todos os líquidos endovenosos devem ser

aquecidos a 39o C.

7. REANIMAÇÃO CARDIO-PULMONAR

Consiste de medidas para restabelecer a vida e a consciência.

35

Page 36: Apostila de Trauma-1

São elas:

respiração artificial

compressão torácica externa

7.1. RESPIRAÇÃO ARTIFICIAL NO ADULTO

Técnica: obtida a abertura da via aérea, deve ser feito o pinçamento das

asas do nariz e posteriormente duas insuflações seguidas. Após esse

procedimento, passa-se a realizar movimentos de inspiração a cada 5 segundos,

enquanto o paciente não recuperar a respiração espontânea. Deve-se atingir a

freqüência de 12 a 20 mrpm.

Deve-se observar:

Elevação e abaixamento do tórax

Sentir na sua própria via aérea a resistência e a elasticidade dos

pulmões da vítima quando se expandem

Ouvir e sentir a exalação do ar na expiração

7.2. RSPIRAÇÃO ARTIFICIAL EM CRIANÇAS E LACTENTES

Técnica: fazer duas insuflações iniciais o suficiente para expandir os

pulmões. Usar respirações mais curtas das que são usadas para os adultos. A

freqüência é de 20 mrpm para lactantes e de 15 mrpm para criança maiores. Em

recém-natos e crianças pré-escolares pode ser feita a respiração boca a boca e

nariz.

7.3. COMPRESSÃO TORÁCICA NO ADULTO

Técnica: o paciente deve estar em posição supina sobre uma superfície

firme. A compressão deve ser realizada com a região hipotenar de uma das mãos

a aproximadamente dois dedos acima do processo xifóide, com os braços

estendidos projetando o peso do corpo sobre a mão através de movimentos de

flexão do quadril. A pressão deve ser suficiente para abaixar o esterno

comprimindo o coração de 3 a 5cm em movimentos rítmicos e suaves onde o

tempo de compressão deverá ser igual ao tempo de descompressão. Devem ser

realizadas 60 compressões por minuto.

As manobras devem ser feitas na proporção de 15 compressões para

cada 2 ventilações.

36

Page 37: Apostila de Trauma-1

7.4. COMPRESSÃO TORÁCICA NA CRIANÇA

Técnica: a massagem deverá ser realizada com apenas uma das mãos.

Comprimindo o esterno de 2 a 4 cm numa freqüência de 80 compressões por

minuto.

7.5. COMPRESSÃO TORÁCICA EM LACTENTES

Técnica: como o coração esta mais alto que no adulto a compressão

deve ser realizada no cruzamento entre a linha mamilar e o esterno da criança,

utilizando 2 a 3 polpas digitais de uma única mão abaixando o esterno de 1.5 a

2.5cm, numa freqüência de 100 compressões por minuto.

37

Page 38: Apostila de Trauma-1

8. TRAUMA CRÂNIENCEFÁLICO

8.1. INTRODUÇÃO

O traumatismo cranioencefálico (TCE) atinge, aproximadamente, 500.000

pessoas nos Estados Unidos anualmente e 10% destes morrem antes de chegar

ao hospital. De todos os TCE’s atendidos em hospitais, 80% geralmente são

classificados como leves, 10% como moderados e 10% como graves, podendo

levar a vários graus de invalidez.

8.2. ANATOMIA

O crânio, formado pela calota e pela base, é revestido por cinco camadas

(SCALP): a pele; o tecido conectivo; a gálea aponeurótica; o tecido areolar frouxo

(área de maior irrigação, onde se formam os hematomas subgaleais); e o

pericrânio. Sua base se divide em fossa anterior (onde estão alojados os lobos

frontais), média (onde estão alojados os lobos temporais) e posterior (onde estão

alojados o cerebelo e porção inferior do tronco cerebral). A cavidade intracraniana

também pode ser dividida em supra e infratentorial pela tenda do cerebelo. Ao

longo desta cursa o nervo oculomotor, que geralmente é comprimido nos casos

de hipertensão intracraniana ou herniação, levando ao desvio inferior e lateral do

olho, além da midríase (devido à compressão das fibras parassimpáticas que

repousam sobre este nervo).

Internamente ao crânio, revestindo o cérebro, estão as meninges (dura-

máter, aracnóide e pia-máter). A dura, camada mais externa, é uma membrana

resistente e fibrosa, formada por dois folhetos, que em algumas regiões se

separam para dar origem aos seios venosos. Externamente a esta camada, no

espaço denominado epidural, encontram-se as artérias meníngeas médias, que

podem ser lesadas em alguns TCEs produzindo hematomas epidurais. Entre a

dura e a segunda meninge, a aracnóide (uma membrana fina e transparente),

está o espaço subdural, local onde se encontram veias que drenam a superfície

do cérebro e, quando se rompem, podem originar hematomas subdurais. Entre a

aracnóide e a membrana mais interna, a pia-máter, encontra-se o espaço

subaracnóideo, onde circula o líquido cefalorraquidiano.

38

Page 39: Apostila de Trauma-1

O líquor é produzido a 30ml/min pelos plexos coróides, circula pelos

ventrículos e espaço subaracnóideo e é reabsorvido pelas granulações

aracnóideas no seio sagital superior.

O cérebro é dividido em dois hemisférios, direito e esquerdo, pela foice do

cérebro (uma reflexão da dura), sendo o esquerdo geralmente o dominante. Cada

hemisfério contém um lobo frontal (associado às emoções, funções motoras e

expressão da fala no lado dominante), um parietal (associado às funções

sensoriais e orientação espacial), um temporal (associado à memória e à fala no

lado dominante) e um occipital (associado à visão).

O tronco cerebral é formado pelo mesencéfalo, ponte e bulbo. O SARA

(sistema de ativador reticular ascendente), que se encontra no mesencéfalo e na

porção superior da ponte, é responsável pela manutenção do estado de alerta; os

centros cardio-respiratórios se encontram no bulbo. O cerebelo, por sua vez, é

responsável pela coordenação e associado ao equilíbrio.

8.3. FISIOLOGIA

A pressão intracraniana normal é de 10 mmHg, porém pode atingir até 40

mmHg em casos francos de hipertensão intracraniana. No início, ainda há

mecanismos compensatórios para tentar evitar as graves conseqüências que

podem ocorrer, e incluem a saída forçada de um volume igual de líquor e sangue

venoso para fora do crânio (Doutrina de Monro-Kellie), mas quando estes se

esgotam, a pressão aumenta abruptamente e a perfusão cerebral diminui.

A pressão de perfusão normal é de 80 mmHg e depende da pressão

arterial média e da pressão intracraniana (PPC= PAM –PIC). Dessa forma, nos

casos de hipertensão intracraniana, a pressão arterial tende a subir para manter

um fluxo sangüíneo adequado.

8.4. CLASSIFICAÇÃO

As lesões cranioencefálicas podem ser classificadas de acordo com (ver

tabela de Classificação do TCE a seguir):

o mecanismo

a gravidade

a morfologia.

39

Page 40: Apostila de Trauma-1

CLASSIFICAÇÃO DO TCE

MECANISMO

Fechado

Alta velocidade (colisão de veículos

automotores)

Baixa velocidade (quedas e agressões)

Penetrante Ferimentos por arma de fogo

Outras lesões penetrantes

GRAVIDADE

Leve ECG 14-15

Moderada ECG 9-13

Grave ECG 3-8

MORFOLOGIA

Fraturas de crânio

de calota

linear x estrelada

com ou sem

afundamento

exposta ou

fechada

basilares

com ou sem

perda de LCR

com ou sem

paralisia do VII

nervo

Lesões

Intracranianas

focais

epidural

subdural

intracerebral

difusas

concussão leve

concussão

clássica

lesão axonal

difusa

Clinicamente, a escala de coma de Glasgow é usada para quantificar

achados neurológicos encontrados em pacientes que sofreram TCE, e também

possibilita uma uniformização da descrição desses achados. Baseia-se na

descrição da abertura ocular, melhor resposta motora e na resposta verbal.

40

Page 41: Apostila de Trauma-1

ESCALA DE COMA DE GLASGOW

ABERTURA OCULAR

Espontâneo 4

Estímulo verbal 3

Estímulo doloroso 2

Sem resposta 1

RESPOSTA MOTORA

Obedece comandos 6

Localiza a dor 5

Flexão normal (retirada) 4

Flexão anormal (decorticação) 3

Extensão (descerebração) 2

Sem resposta (flacidez) 1

RESPOSTA VERBAL

Orientado 5

Confuso 4

Palavras inapropriadas 3

Sons incompreensíveis 2

Sem resposta 1

8.4.1. Fraturas de Crânio

Para que ocorra uma fratura de crânio, muita energia foi dispendida no

trauma e, por este motivo, elas nunca devem ser subestimadas. A possibilidade

de ocorrência de um hematoma intracraniano aumenta em 400 vezes nos

pacientes conscientes em fraturas lineares e em 20 vezes nos pacientes

comatosos (pois nestes o risco já é bem elevado). As fraturas de crânio podem

ser lineares ou estreladas, abertas ou fechadas. Via de regra, o tratamento

cirúrgico é indicado para fraturas com afundamento maior que a sua espessura.

Em alguns casos, pode-se observar certos sinais característicos que ocorrem

em determinadas fraturas, como nas de base de crânio: equimose periorbital

(olhos de guaxinim), equimose retroauricular (sinal de Battle), fístula liquórica

(rinorréia ou otorréia) e paralisia do VII nervo craniano.

8.4.2. Hematomas Epidurais

41

Page 42: Apostila de Trauma-1

Estes hematomas estão localizados entre a dura-máter e a calota e

ocorrem, geralmente, pela ruptura da artéria meníngea média, apresentando uma

forma biconvexa à tomografia (ver figura a seguir). São lesões infreqüentes, mas

quando ocorrem atingem principalmente a região temporal ou têmporo-parietal,

com excelentes resultados se tratados precocemente. O sinal clássico é o

intervalo lúcido, em que o paciente está consciente após o trauma e então seu

estado deteriora abruptamente.

8.4.3. Hematomas Subdurais

Estes hematomas estão localizados no espaço entre a dura-máter e a

aracnóide e ocorrem, geralmente, pela ruptura de veias que drenam a superfície

cerebral para os seios venosos. São mais freqüentes que os anteriores, porém de

pior prognóstico (pois comprometem maior área cerebral) e à tomografia

aparecem como uma imagem côncavo-convexa (ver figura a seguir). Apresentam

alta taxa de mortalidade, necessitando de tratamento precoce e agressivo.

42

Page 43: Apostila de Trauma-1

8.4.4. Contusões e Hematomas Intracerebrais

As contusões cerebrais são comuns, acometem principalmente os lobos

frontal e temporal, e geralmente acompanham os hematomas subdurais. A

diferenciação entre contusões e hematomas intracerebrais ainda não está clara,

mas as primeiras podem expandir e coalescer em horas ou dias para formar um

hematoma.

8.4.5. Lesões Difusas

Estas lesões decorrem de forças crescentes de aceleração-desaceleração

e não são visualizadas na tomografia.

Na concussão leve o paciente possui um certo grau de disfunção

neurológica porém sem perder a consciência. Esta lesão é totalmente reversível e

não leva a nenhuma seqüela grave.

Na concussão clássica o paciente perde a consciência, porém transitória e

reversivelmente (até 6 horas). Certas alterações neurológicas podem permanecer

após o trauma, levando à síndrome pós-concussão (problemas de memória,

tontura, náusea, anosmia e depressão).

Na lesão axonal difusa o paciente permanece em coma por um período

prolongado após o trauma, podendo apresentar posturas de decorticação ou até

descerebração. Quando sobrevivem, tornam-se gravemente incapazes,

geralmente com disfunção autonômica. À tomografia não há lesões de massa

visíveis.

8.5. QUADRO CLÍNICO

Os pacientes que sofrem traumas cranioencefálicos graves geralmente

apresentam cefaléia, vômitos em jato, amnésia dos eventos próximos ao trauma e

sonolência ou rebaixamento do nível de consciência. Nos casos em que há lesão

de massa no interior da calota, a pressão intracraniana pode aumentar, levando à

hipertensão intracraniana, e este aumento da pressão pode levar a herniações de

estruturas do encéfalo, como por exemplo do uncus. A clínica clássica da

43

Page 44: Apostila de Trauma-1

Síndrome de herniação da tenda do cerebelo inclui dilatação da pupila ipsilateral

(anisocoria e midríase) e hemiplegia contralateral.

Nos casos de trauma mais leves, o paciente pode apresentar qualquer um

destes sintomas (ou até se encontrar assintomático), e estes podem aparecer até

várias horas após o trauma.

8.6. CONDUTA

A conduta inicial ideal seria fazer uma avaliação neurológica (pupilas, reflexos

óculo-cefálico e óculo-vestibular) e realizar uma tomografia para todo paciente

com história de TCE. Porém , como isto não é possível nos nossos hospitais, os

pacientes com Glasgow de 15 ou 14, assintomáticos podem ser apenas mantidos

em observação no hospital por 12-24horas. Pacientes com Glasgow de 13 ou

menos devem realizar tomografia (desvios reais da linha média de 5mm ou mais

geralmente indicam necessidade de intervenção cirúrgica).

Pupilas e sua interpretação

Tamanho Resp. à Luz Interpretação

Dilatada unilateral Lenta ou ausente Compressão III par, por herniação tentorial

Dilatada bilateral Lenta ou ausente Perfusão cerebral inadequada, paralisia bilateral

III par

Dilatada uni/bilateral Reação Cruzada Lesão nervo óptico

Miose bilateral Difícil determinação Drogas/encefalopatia metab/lesões ponte

Miose unilateral Preservada Lesão do simpático

A radiografia de crânio está indicada apenas para traumas penetrantes ou

quando a tomografia não está disponível, e os seguintes sinais devem ser

pesquisados: fraturas lineares, posicionamento da glândula pineal na linha média,

níveis hidroaéreos nos seios, pneumoencéfalo, fraturas de face e corpos

estranhos.

Nos casos de TCE graves, a prioridade é o ABC: as vias aéreas devem

sempre se asseguradas (pacientes com Glasgow menor que 8 devem ser

intubados PRECOCEMENTE); e em casos de hipotensão todos os

44

Page 45: Apostila de Trauma-1

compartimentos devem ser pesquisados pois a lesão cerebral raramente produz

choque por si só em adultos.

8.7 MANEJO CLÍNICO

O tratamento clínico do TCE inclui:

o uso de substâncias intravenosas para manter a volemia do paciente

(porém não devem ser utilizadas substâncias hipotônicas ou que

contêm glicose);

Uso de analgésicos, de preferência não narcóticos;

hiperventilação para reduzir a pressão intracraniana, devido à

vasoconstrição (a pCO2 deve ser mantida a 30 mmHg, e por tempo

limitado para evitar isquemia);

Manitol, um diurético osmótico também utilizado para reduzir a

pressão intracraniana (1 g/Kg, de uma solução a 20%);

furosemida associado ao manitol (0,3-0,5 mg/Kg), entre outros;

Esteróides não mostram benefício no tratamento;

Barbitúricos, para redução de PIC refratária, com a ressalva de seu

uso em pacientes hipotensos.

Diazepam e Lorazepam, na presença de convulsões agudas. Cerca de

15% dos doentes com TCE grave e 5% de todos os doentes com TCE

fechado apresentarão convulsões pós trauma, principalmente se

apresentarem convulsões na 1° semana pós trauma, hematoma

intracraniano e fratura com afundamento de crânio.

8.8. MANEJO CIRÚRGICO

8.8.1. Lesões de couro cabeludo

São importantes a retirada dos cabelos e a limpeza adequada da ferida

antes de se proceder com seu tratamento, já que as causas mais comuns de

infecção de feridas de couro cabeludo são a limpeza e desbridamento

inadequados. As perdas sangüíneas podem ser abundantes, e deve-se atentar

para o doente chocado, onde a lesão do couro cabeludo raramente é a

responsável pelo choque. Sangramentos devem ser controlados por pressão

45

Page 46: Apostila de Trauma-1

direta sobre a área, ligadura e cauterização dos vasos. A inspeção deve ser

cuidadosa, na busca de fraturas, corpos estranhos e de líquor, que indica uma

ruptura de dura - máter. Coleções subgaleais devem ser examinadas para a

exclusão de fratura de crânio, tanto clinicamente quanto radiologicamente.

8.8.2. Fraturas com afundamento de crânio e lesões intracranianas de

massa

Fraturas com afundamento de crânio devem ser, via de regra, reduzidas se

seu afundamento for maior que a espessura da calota craniana local. Fraturas

menores muitas vezes exigem apenas sutura do couro cabeludo, quando a lesão

é presente. A tomografia é útil para excluir outras lesões, como contusões ou

hematomas intracranianos. As lesões de massa muitas vezes exigem trepanação

e tratamento adequado por um neurocirurgião.

9. FERIDAS E ANESTESIA EM PRONTO-SOCORRO

9.1. CLASSIFICAÇÃO DAS FERIDAS

9.1.1. Quanto à forma

As feridas podem ser classificadas em:

Escoriações (superficiais)

Incisas (instrumentos cortantes, bordos regulares)

Contusas (instrumento contundente, bordos irregulares)

Lacerantes (avulsão de partes moles)

Perfurantes (mais estreitas que profundas)

Transfixantes (orifício de entrada e saída)

Penetrantes (atingem cavidade natural do corpo)

Associações dos tipos anteriores (corto-contusa, pérfuro-contusa,

pérfuro-incisa, etc)

9.1.2. Quanto ao tecido comprometido

46

Page 47: Apostila de Trauma-1

simples (pele e tela celular subcutânea)

complexas (chegam a atingir músculo, tendões, nervos, vasos de

importância, cavidade, etc)

9.1.3. Quanto ao grau de contaminação

limpa (agentes limpos, menos de 6h, em local do corpo pouco

contaminado - face)

potencialmente contaminada (regiões que podem ser colonizadas por

muitas bactérias – mão e pé; ou produzidas por agente potencialmente

contaminado – faca de cozinha)

contaminada (regiões usualmente colonizadas por germes

patogênicos – boca e períneo; produzidas por agentes sujos ou que

tenham mais de 6h de evolução; toda ferida contusa deve ser

considerada contaminada, independente do agente e do tempo de

evolução)

infectada (já existe processo inflamatório ou drenagem de secreção

purulenta).

9.2. TRATAMENTO DA FERIDA

Os pacientes que chegam ao Pronto-Socorro e que receberão tratamento

de sua ferida devem ser colocados confortavelmente em uma maca, a fim de que

não venham sofrer danos adicionais devidos a quedas por lipotímias, comuns

nestes casos.

Deve-se fazer o preparo da área da ferida, retirando sujeiras grosseiras e

corpos estranhos não penetrantes. Observar perfusão distal ao ferimento,

sensibilidade e motricidade.

Realizar assepsia e antissepsia da região em torno da ferida (com

degermante e água) e tricotomia (desde que não seja sobrancelha). Somente

após esse preparo, anestesiar o local, sempre pela parte externa, e não dentro de

seus bordos. Para isso, deve-se utilizar seringa estéril, agulha adequada ao tecido

(dar preferência a agulhas de calibre menor em tecidos mais delicados), e

lidocaína sem vasoconstritor. A anestesia deve ser tópica, local, loco-regional,

bloqueio regional, bloqueio de plexo ou anestesia geral, dependendo da

necessidade.

47

Page 48: Apostila de Trauma-1

A anestesia tópica deve ser usada com critério, uma vez que há alta

concentração e absorção pelos tecidos.

A anestesia local se faz na pele em torno da ferida, por meio de um botão

inicial e posterior infiltração das bordas.

A anestesia loco-regional geralmente é utilizada em dedos, junto à cabeça

dos metacarpos ou metatarsos (nunca nas bases dos dedos).

A anestesia por bloqueio regional é realizada quando a ferida é extensa e

requer grande quantidade de anestésico. A anestesia é realizada sobre o nervo

correspondente à área da ferida.

Os bloqueios de plexo e anestesia geral são feitos em centro cirúrgico,

com monitoração do paciente.

Deve-se estar atento às complicações dos anestésicos locais: sonolência,

depressão cardio-respiratória e convulsão.

Uma vez anestesiado, o ferimento deve ser novamente lavado com

degermante e água, dando ênfase à limpeza interna, retirando corpos estranhos e

sujeira. Dar atenção ao mecanismo de injúria: se houve corte por vidro ou

contusão por madeira, por exemplo, não se contente em apenas não ver

resquícios destes materiais. Procure para que não fique nada dentro do ferimento

suturado.

Após a limpeza adequada do ferimento e dos tecidos em volta, retire todo

o material sujo, abra o material de sutura (campos, fios, gaze) e calce as luvas

estéreis. Coloque com cuidado os campos em torno da ferida, de forma a proteger

a maior área possível para que não haja contaminação do material estéril. Seque

a área que esteja com sangue ou molhada pela água e estude o ferimento, para

planejar a forma que melhor aproximará o tecido. Desbride os tecidos

desvascularizados ou muito lacerados. Explore a ferida para ter certeza de que

não foi mais profundo do que aparenta e que não houve lesão de estruturas

nobres. Dê especial atenção aos ângulos da ferida, para que não haja retração

nem deformidades. Se houve perda de substância, tente compensar com os

pontos, mas se não for possível realizar um bom trabalho, ou se ficar tenso,

chame o cirurgião para ajudá-lo.

A escolha do ponto dependerá da área acometida. Regiões de grande

tensão (articulações, dorso) são melhores suturadas com pontos do tipo Donati.

Já as demais áreas devem ser suturadas com pontos simples, com distância

48

Page 49: Apostila de Trauma-1

entre os pontos não superior à entrada e saída da agulha de um bordo ao outro.

Não deixe espaço morto. Lembre-se que o nó deve ficar fora da linha da ferida.

As feridas infectadas não devem ser suturadas.

9.3. RETIRADA DOS PONTOS

Dependendo do local:

face: 5 dia

locais de tensão e mobilidade: 10 12 dias

membros inferiores: 10 a 12 dias

outros locais: 7 dias

9.4. CURATIVO

Funcional e estético; não oclusivo. Evitado próximo a orifícios naturais.

9.5. CASOS ESPECIAIS

Feridas em tórax requerem avaliação de murmúrio vesicular e RX de

tórax, pois podem ter penetrado a cavidade pleural.

Feridas de abdômen também devem ser melhor avaliadas, pois podem

ser penetrantes e necessitarem de exploração cirúrgica.

Feridas contundentes próximas ou sobre ossos podem necessitar de

avaliação radiológica, pois pode se tratar de fratura exposta.

Feridas por mordida humana ou animal são altamente contaminadas, e

quando suturadas não devem ser hermeticamente fechadas. Encaminhar para a

Saúde pública para profilaxia anti-rábica.

Feridas por projetil de arma de fogo excepcionalmente são suturadas.

Não se deve retirar a unha mesmo quando esta está lesada, pois servira

como curativo biológico.

9.6. MEDICAMENTOS

Verificar quando o paciente recebeu pela última vez a vacina antitetânica.

Encaminhar para a Saúde pública se necessário.

Analgésicos e antiinflamatórios se necessário.

49

Page 50: Apostila de Trauma-1

Antibióticos se ferida contaminada ou infectada, a critério do cirurgião de

plantão.

10.ATENDIMENTO AO QUEIMADO

50

Page 51: Apostila de Trauma-1

10.1. INTRODUÇÃO

As queimaduras constituem causa importante de morbidade e

mortalidade. A observação dos princípios básicos de reanimação inicial no trauma

e a aplicação, em tempo apropriado, de medidas emergenciais simples

minimizam a morbidade e a mortalidade destas lesões.

10.2. MEDIDAS IMEDIATAS PARA SALVAR A VIDA DO DOENTE QUEIMADO

10.2.1. Via Aérea

Quando o doente é admitido no hospital após sofrer uma queimadura, o

médico deve estar alerta para a possibilidade de envolvimento de via aérea,

identificar os sinais de desconforto respiratório e iniciar as medidas de suporte. Os

indicadores clínicos de lesão por inalação incluem:

Queimaduras faciais

Chamuscamento dos cílios e das vibrissas nasais

Depósitos de carbono e alterações inflamatórias agudas na orofaringe

Escarro carbonado

História de confusão mental e/ou confinamento no local do incêndio

História de explosão com queimaduras da cabeça e do tronco

Níveis sangüíneos de carboxihemoglobina maiores que 10% se o

doente foi envolvido em um incêndio

A presença de qualquer um destes achados sugere lesão inalatória

aguda. Sempre que exista uma lesão por inalação, está indicada a transferência

para um centro de queimados. Se o tempo de transporte é prolongado, a

intubação deve sempre ser realizada antes do transporte, para proteger as vias

aéreas. A presença de estridor é indicação imediata para a intubação.

10.2.2. Interrupção do Processo de Queimadura

Toda roupa deve ser removida, pós químicos secos devem ser retirados da

ferida que deve ser enxaguada com água.

10.2.3. Acesso Venoso

51

Page 52: Apostila de Trauma-1

Qualquer doente com queimaduras que acometem mais de 20% da

superfície corpórea necessitam de reposição volêmica. Para tanto, deve-se

estabelecer imediatamente acesso venoso de grande calibre (abocat 14)

introduzido em veia periférica e iniciar a infusão com Ringer-lactato. Se a

extensão da queimadura não permitir a introdução do cateter através de pele

íntegra, não se deve titubear em colocá-lo através da pele queimada.

10.3. AVALIAÇÃO DO DOENTE QUEIMADO

10.3.1. História

Objetiva determinar lesões associadas, mecanismo do trauma, doenças

pré existentes, alergias, peso e imunizações.

10.3.2. Área de Superfície Corpórea

A fórmula mais usada para se calcular a extensão da lesão é a chamada

“regra dos nove”, que divide as diversas partes do corpo em múltiplos de nove,

como observado na figura seguinte

Outra regra utilizada no atendimento de urgência é a “regra da palma da

mão”, pois a palma da mão (metacarpo) do paciente, corresponde a cerca de 1%

do seu revestimento cutâneo.

10.3.3. Profundidade da Queimadura

52

Page 53: Apostila de Trauma-1

A profundidade da queimadura é importante para avaliar sua gravidade,

para planejar o tratamento da ferida e para prever os resultados funcionais e

cosméticos finais.

Queimaduras de primeiro

grau

Exemplo: queimaduras solares.

Eritema, dor e ausência de bolhas.

Não determinam risco de vida e, geralmente, não

necessitam de reposição endovenosa de fluidos.

Queimaduras de segundo

grau ou de espessura parcial

Aparência vermelha ou mosqueada, presença de

edema e bolhas.

Superfície pode ter aspecto “lacrimejante” ou úmida e é

hipersensível (dor intensa até mesmo a correntes de

ar).

Queimaduras de terceiro

grau ou de espessura total

Geralmente escuras e com aparência de couro.

A pele também pode se apresentar translúcida,

esbranquiçada ou mosqueada, com aspecto de cera.

A superfície pode ser vermelha e não mudar de cor à

compressão local.

A superfície é indolor e geralmente seca.

10.3.4. Estabilização do Doente Queimado

A. Via Aérea

Lesões térmicas de faringe podem produzir um edema acentuado de via

aérea superior e é importante que a permeabilidade da via aérea seja garantida

precocemente. As manifestações clínicas da lesão por inalação podem ser sutis e

freqüentemente não aparecem nas primeiras 24 horas.

B. Respiração

Sempre considere a possível ocorrência de exposição ao monóxido de

carbono (CO) em doentes queimados em ambientes fechados. O diagnóstico da

intoxicação por CO é feito primariamente pela história de exposição. Doentes com

níveis de CO inferiores a 20% não costumam apresentar sinais e sintomas. Níveis

mais elevados de CO podem resultar em:

cefaléia e náuseas (20 a 30%)

confusão (30 a 40%)

53

Page 54: Apostila de Trauma-1

coma (40 a 50%)

morte (maior que 60%)

Os doentes com suspeita de exposição ao CO devem receber desde o

início oxigênio em alto fluxo, através de uma máscara unidirecional, sem

recirculação. O tratamento inicial da lesão por inalação pode exigir a intubação

endotraqueal e a ventilação mecânica. Nestes pacientes torna-se obrigatório

medir os valores inicias de carboxihemoglobina e administrar oxigênio a 100%.

C. Volume Sangüíneo Circulante

A medida da PA costuma ser difícil, pode não ser confiável. A

monitorizarão horária do débito urinário é uma forma confiável de avaliação do

volume sangüíneo circulante, na ausência de diurese osmótica (como por

exemplo, glicosúria). Portanto, é obrigatório proceder a sondagem vesical. Uma

regra simples é infundir volume em velocidade suficiente para manter uma diurese

de:

Crianças de 30kg ou

menos

1,0 ml/kg/h

Adultos 30 a 50 ml/h

O doente queimado necessita de 2 a 4 ml de Ringer-lactato por kg de peso

corpóreo por porcentagem de superfície com queimaduras de segundo e terceiro

graus, nas primeiras 24 horas, para manter um volume sangüíneo circulante

adequado e produzir um débito urinário satisfatório. O volume de líquido estimado

é então oferecido da seguinte maneira: metade do volume total estimado é

administrado nas primeiras 8 horas após a queimadura e a outra metade nas 16

horas seguintes.

OBS: Lembrar que o esquema de reposição leva em conta o tempo decorrido

desde a LESÃO, e não no momento de início da reposição.

10.3.5. Exames Básicos para Doentes com Queimaduras Importantes

54

Page 55: Apostila de Trauma-1

A. Sangue

Hemograma

Tipagem e provas cruzadas

Carboxihemoglobina

Glicemia

Eletrólitos

Teste para gravidez (toda mulher em idade fértil)

Gasometria arterial

B. Radiografias

Raio-X de tórax

Outras radiografias podem ser indicadas para avaliar lesões

associadas

10.4. CONDUTA

10.4.1. Queimaduras Circunferenciais em Extremidades – Manutenção da

Circulação Periférica

Remover todas as jóias

Avaliar circulação distal: cianose, enchimento capilar, sinais

progressivos de comprometimento neurológico (parestesia)

A necessidade de escarotomia ou fasciotomia deve ser sempre

previamente discutida com um cirurgião.

10.4.2. Sondagem Nasogástrica

A sonda nasogástrica deve ser colocada e mantida em sucção se o doente

apresentar náusea, vômitos, distensão abdominal, ou se a queimadura envolver

mais de 20% da superfície corporal.

10.4.3. Narcóticos, Analgésicos e Sedativos

O grande queimado pode estar ansioso e agitado devido à hipoxemia ou à

hipovolemia mais do que à dor. Assim, ele responde melhor ao oxigênio ou à

administração de líquidos, do que ao uso de analgésicos, narcóticos ou sedativos

55

Page 56: Apostila de Trauma-1

que podem mascarar os sinais de hipoxemia ou hipovolemia. Devem ser

administrados sempre em baixas doses, EV.

10.4.4. Cuidados com a Ferida

A cobertura de queimaduras de segundo grau com um pano limpo impede

o contato com a corrente de ar e alivia a dor. Não se deve romper bolhas ou

aplicar antissépticos. A aplicação de compressas frias pode ocasionar hipotermia.

Não use água fria em doentes com queimaduras extensas.

10.4.5. Antibióticos

Antibióticos profiláticos não estão indicados na fase inicial logo após a

queimadura. Devem ser reservados para o tratamento das infecções.

10.4.6. Cuidados com Queimaduras Especiais

A. Queimaduras Químicas

Pode resultar da exposição a ácidos, álcalis, ou derivados do petróleo. As

queimaduras por álcalis são geralmente mais sérias do que as queimaduras por

ácidos pois os álcalis penetram mais profundamente.

Deve-se remover imediatamente o produto químico com grande quantidade

de água, usando uma ducha ou mangueira se disponíveis, por no mínimo, 20 a 30

minutos. Agentes neutralizantes não têm vantagem sobre a lavagem com água,

pois a reação com estes produtos, por si só, produz calor e causa maior lesão

tecidual.

B. Queimaduras Elétricas

Freqüentemente são mais graves do que aparentam à inspeção externa,

pois a pele pode mostrar-se aparentemente normal, e ao mesmo tempo haver

necrose muscular profunda. A rabdomiólise provoca liberação de mioglobina que

pode causar insuficiência renal aguda.

O atendimento imediato do doente com queimadura elétrica, além do

exame primário, inclui monitorização eletrocardiográfica e sondagem de demora

na bexiga.

56

Page 57: Apostila de Trauma-1

10.5. CRITÉRIOS PARA TRANSFERÊNCIA

Pelo fato do Pronto-Socorro do Hospital do Trabalhador não ser um Centro

de Queimados, esse item faz-se de suma importância para o conhecimento dos

que lá estagiam.

Queimaduras de espessura parcial e total comprometendo mais que

10% da superfície corpórea total (SCT) em doentes com menos de 10 e

mais de 50 anos.

Queimaduras de espessura parcial e total comprometendo mais que

20% da SCT nos outros grupos etários.

Queimaduras de espessura parcial e total envolvendo face, olhos,

ouvidos, mãos, pés, genitália, períneo, ou comprometendo a pele sobre

as principais articulações.

Queimaduras de espessura total mais de 5% da SCT, em qualquer

grupo etário.

Queimaduras elétricas mais graves, incluindo lesões por raios.

Queimaduras químicas importantes.

Lesões por inalação.

Queimaduras em doentes com doenças prévias que podem complicar

o atendimento, prolongar a recuperação ou elevar a mortalidade.

Qualquer doente queimado, no qual o trauma concomitante aumente o

risco de morbidade ou mortalidade, pode ser inicialmente tratado em um

centro de trauma, até que esteja estável, antes de ser transferido para um

centro de queimados.

Crianças com queimaduras atendidas em hospitais sem pessoal

qualificado ou sem equipamento para seu cuidado devem ser transferidas

para um centro de queimados dotado de recursos.

Queimaduras em doentes que irão necessitar de suporte especial,

tanto do posto de vista social como emocional, ou de reabilitação

prolongada, incluindo suspeita de negligência ou abuso de crianças.

10.6. TRATAMENTO DE PEQUENAS QUEIMADURAS TÉRMICAS

Como já dito, o Pronto-Socorro do Hospital do Trabalhador não é centro

especializado para o tratamento de queimados, sendo assim é mais habitual que

57

Page 58: Apostila de Trauma-1

o estagiário neste Pronto-Socorro atenda pequenas queimaduras térmicas, ou

seja, lesões menores que 10 a 15% da SCT em adulto e 6 a 8% da SCT em

crianças, não-complicadas, fora de áreas críticas.

10.6.1.Conduta Inicial

Tratamento pelo método oclusivo: protege as lesões contra as agressões,

traumas e contaminações.

Limpeza cirúrgica sumária das lesões e lavagem com soro fisiológico,

para retirada de detritos e corpos estranhos.

Preservação das vesículas e do epitélio solto.

Irrigação das lesões e áreas adjacentes com soro fisiológico.

Raspagem dos pêlos da pele vizinha, principalmente couro cabeludo.

Cobertura da área lesada e adjacências com gaze vaselinada.

Cobertura da gaze vaselinada com gaze seca (para absorção de

secreções).

Enfaixamento com atadura de crepe, se necessário.

Lesões de face e genitália deverão ficar expostas.

10.6.2.Antibióticos

O uso de analgésicos, prevenção do tétano e antibióticos contra bactérias

Gram positivo na fase inicial pode ser indicado.

10.6.3.Orientações

Curativos oclusivos a cada 48-72 horas com ressecção de tecidos

desvitalizados e cobertura da lesão com gaze vaselinada.

58

Page 59: Apostila de Trauma-1

11. TRAUMA ORTOPÉDICO

11.1. SEMIOLOGIA ORTOPÉDICA

11.1.1. Anamnese

Na anamnese, devem constar observações específicas a respeito do

mecanismo do trauma e do evento propriamente dito, levando em conta a hora e

o local do acidente. São de extrema importância as forças envolvidas na lesão

traumática (isto é, se houve hiperflexão, inversão, etc). Eventos ou forças

traumáticas incomuns, além de possíveis fontes de contaminação (no caso de

acidentes no campo, por exemplo) devem ser mencionados. É importante

também pesquisar história de doenças anteriores, uso de medicamentos, e abuso

de substâncias tóxicas.

11.1.2. Exame Físico

Um exame físico completo é indispensável. Nele devem ser incluídas a

avaliação do estado neurológico e do estado circulatório distalmente à lesão. O

exame das articulações também é importante, pois poderá revelar instabilidade

ligamentar.

Deve constar do seguinte:

Inspeção: em busca de deformidades, assimetrias, edema,

equimoses, perda ou solução de continuidade na pele, cor e perfusão;

Palpação: buscar pontos dolorosos, crepitação, tumorações,

derrames; avaliar temperatura, mobilidade;

Realizar testes musculares e manobras específicas peculiares a cada

região.

Palpar pulsos periféricos em busca de redução de amplitude ou

ausência de suprimento arterial;

Ausculta: pesquisando sopros indicativos de lesões vasculares.

11.1.3. Radiológico

Realizado sempre que há suspeita de fratura, luxações ou presença de

corpo estranho, ou há necessidade de descartar tais hipóteses diagnósticas.

59

Page 60: Apostila de Trauma-1

Os membros devem ser imobilizados antes do exame, que consiste em

radiografias antero-posterior (AP) e perfil, e abrange articulações acima e abaixo

da lesão. Os achados clínicos iniciais, o estado hemodinâmico do paciente e o

mecanismo do trauma são decisivos na indicação de radiografias, tendo em

mente que a radiografia deve ser realizada como parte do exame secundário,

após a estabilização hemodinâmica do doente. Em pacientes que estão

hemodinamicamente instáveis, sem que tenha sido identificada outra fonte de

sangramento, deve ser feita precocemente um radiografia de pelve em AP.

11.2. FRATURAS

11.2.1. Quadro clínico

Por definição, fratura é um lesão na qual o tecido ósseo é rompido. A

fratura de estresse é geralmente pequena e ocorre pela atuação contínua de

forças contra o osso.

As causas de fraturas mais comuns são:

quedas

choques contra objetos

explosões

outros (devemos lembrar da osteoporose, tumores ósseos e doenças

metabólicas que podem facilitar as fraturas).

O paciente apresenta um membro ou junta com:

deformidade ou descontinuidade

limitação de movimento

edema

dor intensa

palidez

falta de pulso

diminuição da temperatura

dor ao levantar peso

crepitações.

Deve-se lembrar que, além de provocar esses sintomas, uma fratura pode

apresentar sangramento intenso e levar um paciente a choque hipovolêmico. Uma

60

Page 61: Apostila de Trauma-1

fratura de fêmur, por exemplo, pode sangrar 1500 ml. A pelve pode sangrar até

3000 ml. Portanto, é importante observar o estado hemodinâmico do paciente e

fazer a reposição necessária (ver “Choque hemorrágico”).

As fraturas podem ser fechadas (quando não há ferida associada à

fratura), ou expostas (ferida associada à fratura), sendo a fratura exposta uma

emergência no trauma ortopédico.

O diagnóstico é clínico e radiológico. Deve-se examinar todos os

contornos ósseos no RX, pois fraturas pequenas podem passar despercebidas. E

sempre lembrar de fazer a correlação do raio X com a clínica. Esta, sempre sendo

soberana.

11.2.2. Imobilização

As lesões das extremidades devem ser imobilizadas antes que seja

realizado qualquer tipo de transporte. Lesões ou suspeitas de lesões em coluna

também devem ser imobilizadas sem demora, até que seja realizado tratamento

ou exame complementar que elimine a suspeita.

Antes de realizar qualquer tipo de imobilização, deve ser feito exame

neurovascular cuidadoso, o qual deve ser repetido regularmente até que seja

descartada a lesão ou seja realizado tratamento.

Existem vários tipos de dispositivos utilizados para imobilização. Exemplos

deles são: talas de papelão, tábua rígida e colar cervical, além de dispositivos de

tração.

Simplificadamente, podem ser utilizadas talas de papalão em qualquer

membro suspeito de lesão; em membros inferiores e pelve, comumente são

utilizados dispositivos de tração, a qual deve ser aplicada distalmente ao membro;

em suspeitas de lesões de coluna são utilizados tábua rígida e colar cervical.

Os dispositivos de imobilização são de uso temporário, até que seja

realizado o tratamento definitivo ou seja descartada a lesão. Lembrar sempre que

o paciente que permanece por muito tempo sobre a tábua rígida tem sérios ricos

de desenvolver úlceras de decúbito, devendo ser removido tão logo seja possível,

para uma superfície acolchoada (maca).

61

Page 62: Apostila de Trauma-1

11.2.3. Tratamento

O tratamento das fraturas varia muito de caso a caso, dependendo da

classificação das fraturas, do local, do paciente e até mesmo das condições do

próprio hospital. Também, existe muita controvérsia no tratamento de algumas

fraturas em relação a um serviço e outro.

De forma geral, o tratamento das fraturas é feito em duas etapas: redução

e fixação. A redução é quando se realinha o osso, a sua posição original, e ela

pode não ser necessária. A fixação o próprio nome já diz.

O tratamento das fraturas expostas é sempre cirúrgico, fazendo-se a

redução e a fixação, utilizando-se placas, parafusos, e outros aparelhos.

Já o tratamento das fraturas fechadas depende da situação. Se a fratura

fechada não tiver desvio, então opta-se pelo tratamento conservador (uso de

gesso). Se houver desvio (varo, valgo, ventral ou dorsal), mas for aceitável,

também opta-se pelo tratamento conservador. No entanto, se este desvio não for

aceitável, faz-se a redução incruenta e fixa-se cirurgicamente (fixador interno ou

fixador externo). Se não for possível a redução incruenta, então realiza-se a

redução cirúrgica.

11.3. LUXAÇÕES

11.3.1. Quadro Clínico

Como é definida, a luxação é um desalinhamento ou separação total das

superfícies articulares, de modo que a aposição entre elas é perdida. Uma

subluxação, por sua vez, é quando tais superfícies estão apenas parcialmente

deslocadas, conservando algum grau de contato das superfícies articulares. Tal

situação não pode ocorrer sem algum dano aos ligamentos protetores e à cápsula

articular.

O trauma é a causa mais comum de deslocamento ou luxação. As

articulações mais afetadas são a do ombro, cotovelo, quadril, tornozelo, e as

articulações interfalangeanas.

O paciente com luxação relata dor intensa na região da articulação. Há

impossibilidade de realizar os movimentos normais da articulação, ou, pelo

menos, resistência às tentativas de movimentação. Há perda da simetria.

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Page 63: Apostila de Trauma-1

Cada articulação possui características típicas, mas de uma maneira

geral, as características clínicas são suficientemente claras para um diagnóstico

óbvio.

O diagnóstico final depende de exames radiológicos, até para poder

descartar fraturas associadas.

11.3.2. Tratamento

O primeiro passo é, sem dúvida, descartar uma lesão vascular ou

nervosa, para depois proceder à redução da luxação ou subluxação por

manipulação incruenta.

Para tratar uma luxação, deve-se tratar a lesão ligamentar associada. Em

certas ocasiões, a cirurgia é a mais adequada. Porém, é mais seguro permitir a

cicatrização espontânea. Tem-se observado que a função normal é recuperada

mais rapidamente quando o movimento do membro afetado é estimulado desde o

início, ou no máximo alguns dias após o evento.

12. TRAUMA NA GESTANTE

63

Page 64: Apostila de Trauma-1

12.1. INTRODUÇÃO

Deve-se considerar a existência de gestação em todas as mulheres

traumatizadas que apresentem idade entre 10 e 50 anos. Todavia, as medidas

iniciais a serem adotadas no atendimento da gestante traumatizada são iguais

àquelas adotadas para a não gestante. Se for necessário o estudo radiológico da

paciente, este não é contra-indicado pela presença da gestação.

Ao iniciar o atendimento de uma gestante, deve-se lembrar que, na

verdade, dois pacientes estão sendo atendidos; sendo a alteração da homeostase

materna a principal causa de lesão do feto. Mesmo que o feto não apresente

lesões provocadas diretamente pelo trauma, as alterações da homeostase

materna (como hipóxia e hipotensão) causam vários danos ao concepto e, por

isso, deve-se priorizar a sobrevida materna.

12.2. ALTERAÇÕES ANATÔMICAS E FISIOLÓGICAS DA GRAVIDEZ

Estas modificações ocorrem naturalmente durante a gravidez, afetando

quase todo o organismo. Entretanto, se não forem bem conhecidas pelo médico,

podem ser confundidas com situações patológicas, levarem a interpretações

errôneas dos dados diagnósticos e exames laboratoriais, além de influenciar a

abordagem e condutas no processo de reanimação.

12.2.1. Alterações uterinas

Até a 12ª semana de gestação o útero é intrapélvico, estando bem

protegido pela parte óssea. Após, passa a ocupar a cavidade peritoneal, atingindo

a cicatriz umbilical em torno da 20ª semana. Entre a 34ª e 36ª semana, o útero

atinge sua altura máxima supra-umbilical, alcançando o rebordo costal. Nas duas

últimas semanas de gravidez, o feto desce lentamente para que seu segmento

cefálico se encaixe na pelve, fazendo com que o fundo uterino desça. Deve-se ter

a progressão da altura uterina em mente quando se deseja realizar lavado

peritoneal em gestantes para que não ocorra ruptura da parede uterina.

12.2.2. Alterações na parede uterina e líquido amniótico

No primeiro trimestre de gravidez, o útero se encontra protegido pelos

ossos da bacia e apresenta paredes com espessura aumentada. Quando deixa

64

Page 65: Apostila de Trauma-1

de ser protegido pela pelve, o feto é protegido por grande quantidade de líquido

amniótico e por sua mobilidade. Todavia, no terceiro trimestre as paredes uterinas

tornam-se mais adelgaçadas, sendo mais fácil a ruptura uterina. Isto, associado

com a redução na quantidade de líquido amniótico e a dificuldade que o feto

apresenta em se movimentar em uma área tão restrita, faz com que este se fique

mais susceptível ao trauma neste período.

12.2.3. Placenta

Apresenta pouca elasticidade, tornando comum o seu descolamento

prematuro. A placenta apresenta vasos muito dilatados durante a gestação e

estes são bastante sensíveis a estimulação por catecolaminas. Desta forma, há

aumento na resistência vascular uterina quando ocorre redução abrupta do

volume sangüíneo materno, comprometendo a oxigenação fetal.

12.2.4. Alterações sangüíneas

Há elevação progressiva do volume plasmático até a 34ª semana de

gestação. Também ocorre aumento do volume eritrocitário, mas este é

proporcionalmente menor que o aumento do volume plasmático, ocasionando a

anemia fisiológica da gravidez. Em virtude deste volume plasmático aumentado, a

gestante pode perder até 1500ml de sangue sem exibir os sintomas de

hipovolemia, mas levando a sofrimento fetal.

Ocorre um aumento do número de leucócitos, que pode chegar a valores

próximos de 25.000/mm³. O conhecimento deste dado é importante para que não

se confunda a leucocitose da gravidez com outras situações, como a leucocitose

causada por um quadro infeccioso.

Os fatores de coagulação estão levemente aumentados. Alguns referem

que isto leva a maiores chances embolização. Outros acreditam que, na prática,

não ocorra uma maior incidência de trombose e embolização e que, na existência

de sinais de coagulação intravascular disseminada, deve-se levar em conta a

possibilidade de embolização por líquido amniótico.

Observa-se, também, queda nos níveis de albumina sérica, diminuindo a

pressão coloidosmótica.

12.2.5. Alterações hemodinâmicas

65

Page 66: Apostila de Trauma-1

Durante a gravidez o débito cardíaco encontra-se aumentado em virtude do

maior volume plasmático e menor resistência vascular do útero e da placenta.

Entretanto, com a evolução da gestação e do útero gravídico, a posição adotada

pela mãe provoca grandes variações significativas no débito cardíaco, sendo

significativamente menor quando a gestante se encontra em posição supina.

A freqüência cardíaca encontra-se aumentada, atingindo seu máximo no

terceiro trimestre. Passa a apresentar cerca de 10 a 15 batimentos por minuto a

mais que na mulher não grávida.

Observa-se queda da pressão arterial, principalmente nos dois primeiros

trimestres de gestação, podendo a pressão sistólica sofrer uma queda de 5mmHg

e a pressão diastólica de 15mmHg. Ao final da gravidez, a pressão sofre nova

elevação, porém não atingindo os níveis pré-gravídicos.

A pressão venosa central não se apresenta alterada no início da gestação,

mas diminui com sua evolução, principalmente quando a paciente se encontra em

decúbito dorsal. A resposta à reposição volêmica é semelhante à mulher não

grávida.

12.2.6. Alterações respiratórias

O volume minuto e o volume corrente aumentam, levando a um estado de

hiperventilação pulmonar e hipocapnia. Há maior consumo de oxigênio, sendo de

vital importância oxigenação arterial adequada durante o atendimento da gestante

traumatizada.

12.2.7. Alterações endócrinas

A hipófise sofre um aumento, o que a torna dependente de um maior fluxo

sangüíneo. Desta forma, um choque hipovolêmico durante a gestação pode

determinar a necrose isquêmica da hipófise anterior.

12.2.8. Alterações gastrointestinais

Na gravidez, ocorre aumento do tempo de esvaziamento gástrico em

decorrência da hipomotilidade. Desta forma, durante o processo de reanimação

da paciente, deve-se sempre considerar que o estômago está cheio. Para evitar

aspiração do conteúdo gástrico, deve-se instalar uma sonda nasogástrica.

66

Page 67: Apostila de Trauma-1

12.2.9. Alterações urinárias

A filtração glomerular e o fluxo plasmático renal se encontram aumentados

na gravidez e os níveis de uréia e creatinina caem à metade. Há dilatação

fisiológica dos cálices, da pelve renal e dos ureteres.

12.2.10. Alterações músculo-esqueléticas

O alargamento da sínfise púbica é visível a partir do sétimo mês, assim

como o aumento dos espaços das articulações sacroilíacas. Isto deve ser

considerados ao interpretar as radiografias da bacia.

12.2.11. Alterações neurológicas

O traumatismo craniano pode ser simulado pela eclâmpsia, sendo este

caracterizado por convulsões, hipertensão, hiperreflexia, proteinúria e edema

periférico.

12.3. MECANISMO DO TRAUMA

Os mecanismos de trauma são semelhantes aos encontrados nos

politraumatizados em geral. Assim sendo, pode-se fazer a seguinte divisão:

12.3.1. Trauma fechado

O feto encontra-se protegido pelo corpo do útero e pelo líquido amniótico e

é atingido em traumas. Porém, ainda assim podem ocorrer traumatismos diretos

quando a parede abdominal é atingida ou sofre impacto importante por um objeto.

Os traumas indiretos ocorrem por desaceleração, por efeito de contragolpe ou por

compressão súbita, sendo normalmente acompanhado por descolamento

prematura de placenta.

Em casos de acidentes automobilísticos, o uso do cinto de segurança

diminui significativamente a gravidade do trauma e a mortalidade materna, porém

pode aumentar a freqüência de ruptura uterina e de morte fetal. Os cintos que

protegem apenas a bacia estão mais associados a ruptura uterina. Já os cintos de

três pontos diminuem o risco de lesão fetal.

12.3.2. Trauma penetrante

67

Page 68: Apostila de Trauma-1

No decorrer da gestação, o útero, em decorrência de seu maior tamanho,

acaba formando uma barreira protetora aos outros órgãos abdominais, o que

justifica a baixa incidência de lesões a outras vísceras associadas. Porém, torna-

se alvo fácil, podendo atingir o feto, o cordão e/ou a placenta. Ocorre morte fetal

em 40-70% dos casos.

12.4. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O ideal é que, inicialmente, seja feita a avaliação e reanimação primária da

mãe. A avaliação do feto é feita antes de se iniciar a avaliação secundária da

mãe.

12.4.1. Exame primário e reanimação materna

Deve-se realizar a avaliação inicial da gestante politraumatizada seguindo

os mesmos padrões adotados nas pacientes não grávidas, iniciando-se com o

ABCDE. Deve-se avaliar a permeabilidade das vias aéreas e as condições

respiratórias e corrigindo-as se necessário, mantendo boa oxigenação materna.

Como o útero comprime a veia cava inferior, diminuindo o retorno venoso,

a gestante apresenta piora do choque quando em posição supina. Desta forma,

após excluída a possibilidade de traumatismos em coluna, a gestante deve ser

transportada e avaliada em decúbito lateral esquerdo. Se isso não for possível,

deve-se colocar um coxim abaixo do quadril direito e o útero deve ser deslocado

manualmente para o lado esquerdo.

Como a gestante apresenta hipervolemia fisiológica, podem ocorrer

alterações da perfusão tecidual e sofrimento fetal antes que a gestante manifeste

sinais clínicos indicativos de hipovolemia. Assim sendo, deve-se considerar

reposição precoce de cristalóides e, se necessário, sangue. Deve-se evitar o uso

de medicamentos para aumentar a pressão arterial materna, uma vez que os

vasos placentários apresentam resposta exacerbada a catecolaminas endógenas,

provocando vasoconstrição acentuada e, conseqüentemente, sofrimento fetal.

12.4.2. Exame primário e reanimação fetal

Realiza-se avaliação abdominal para investigação de ruptura uterina, que é

sugerida pela presença de dor, rigidez, sinais de defesa ou descompressão

68

Page 69: Apostila de Trauma-1

brusca positiva. Também há suspeita deste tipo de lesão avaliando-se a posição

fetal, pela palpação de porções fetais que tenham se exteriorizado ao útero e

dificuldade de palpação de fundo uterino.

Descolamento prematuro de placenta é identificado por dor à palpação

abdominal, contrações ou tetania uterina e sangramento vaginal.

Em gestações acima da décima semana, deve-se realizar a avaliação dos

batimentos cardíacos fetais com auxílio do Doppler. Monitorização por

cardiotocografia é aconselhada após a 20ª a 24ª semanas de gestação.

12.4.3. Avaliação secundária

A avaliação segue o mesmo estabelecido para a traumatizada não-grávida.

No caso de lesão abdominal em que a lavagem peritoneal diagnóstica é indicada,

este deve ser realizado com a colocação de um cateter sob visão direta na região

supra-umbilical.

Ao avaliar o períneo, deve-se, também, realizar exame pélvico. Presença

de líquido amniótico sugere rompimento da bolsa. O toque vaginal oferece

informações sobre dilatação do colo, presença de apagamento e apresentação

fetal. Em gestações mais avançadas, presença de sangue em vagina é sugestiva

de descolamento prematuro de placenta.

12.4.4. Cuidados definitivos

Sempre que houver suspeita de envolvimento uterino, o obstetra deve ser

consultado. Em casos de ruptura uterina, é obrigatório que se faça a exploração

cirúrgica.

As indicações cirúrgicas não mudam em função da gravidez, e a

laparotomia precoce é indicada em caso de dúvida diagnóstica.

Quando ocorre descolamento placentário extenso ou embolia por líquido

amniótico, pode ocorrer a coagulação vascular disseminada. Neste caso, deve ser

realizada a evacuação uterina, associada a reposição de plaquetas e fatores de

coagulação.

Mães Rh-negativas podem ser isoimunizadas por fetos Rh-positivos pela

hemorragia feto-materna desencadeada pelo trauma. Desta forma, deve-se

iniciar, até 72horas após o trauma, terapia com imunoglobulina em todas as

gestantes Rh-negativo.

69

Page 70: Apostila de Trauma-1

12.4.5. Cesariana “post mortem”

São poucas as evidências na literatura a favor da cesariana “post-mortem”.

A cesariana “post mortem” é indicada em casos que há morte da mãe por

parada cardíaca que não seja de origem hipovolêmica, mas deve ser realizada

dentro de 4-5 minutos após a parada. Assim sendo, o sucesso é infreqüente.

70

Page 71: Apostila de Trauma-1

13. TRAUMA NA CRIANÇA

13.1. CONSIDERAÇÕES GERAIS

Trauma é a primeira causa de morte e invalidez na infância, sendo

comum lesões múltiplas. As prioridades na avaliação e conduta na criança

traumatizada são as mesmas do adulto.

13.2. ANATOMIA

As crianças têm calcificação incompleta com esqueleto mais flexível.

Freqüentemente há lesões de órgãos internos sem fraturas. Quando essas estão

presentes sugerem lesões orgânicas graves e múltiplas.

13.3. ESTADO PSICOLÓGICO

A criança, devido à sua instabilidade emocional, apresenta uma regressão

do seu comportamento psicológico quando o “stress”, a dor ou outras ameaças

passam a fazer parte de seu ambiente. A capacidade que a criança tem de

interagir com estranhos em situações difíceis é muito limitada. Dessa maneira, é

extremamente difícil obter uma história adequada do doente e fazer com que ele

colabore durante o exame físico, principalmente quando o manuseio desperta dor.

Deve-se compreender e acalmar a criança traumatizada, pois isto facilitará uma

melhor avaliação do trauma psíquico bem como do físico. O trauma pode afetar

não somente a sobrevivência, mas sua qualidade de vida futura. Deve se evitar

seqüelas físicas, psicológicas e sociais.

13.4. SUPORTE AVANÇADO DE VIDA

O atendimento inicial da criança politraumatizada obedece à seqüência

"ABCDE", segundo rotina do curso Suporte Avançado de Vida em Pediatria.

13.4.1. A – Vias Aéreas

As vias aéreas da criança são de diâmetro muito menor. Uma obstrução

modesta, por edema, rolhas mucosas, dentes ou corpo estranho reduzem a área

pela qual o ar deve passar e aumenta a resistência à entrada de ar, aumentando

71

Page 72: Apostila de Trauma-1

o trabalho respiratório. As vias aéreas devem ser limpas e aspiradas com

cuidado, eventualmente com pinças adequadas.

A coluna cervical é mais elástica e móvel do que a do adulto e as

vértebras, menos rígidas, são menos predispostas a fraturas, e mais predispostas

à lesão de medula espinhal sem alteração do esqueleto. Apesar disso, o risco de

fratura é grande, porque as crianças estão sujeitas a maiores forças aplicadas ao

pescoço durante o processo de aceleração-desaceleração. O risco aumenta,

porque a cabeça da criança é proporcionalmente maior do que a do adulto. Isto

também aumenta o risco da faringe posterior de colabar e obliterar-se, pois o

occipital, relativamente maior, ocasiona uma flexão passiva da coluna cervical.

Por isso a via aérea da criança pode ser protegida posicionando a face levemente

para cima e para frente, posição conhecida como “posição de cheirar”.

A cânula orofaríngea (Guedel) só deve ser utilizada se a criança estiver

inconsciente, para evitar vômitos. Deve se introduzida de forma delicada,

diretamente na orofaringe. O uso do abaixador de língua pode ser útil.

Intubação deve sempre ser precedida por ventilação com bolsa-máscara e

oxigenação. Lembrar que a máscara deve sempre ser adequada a idade do

paciente para que seja efetiva. Tamanho do tubo deve ser o do quinto dedo da

mão ou obtém-se o número somando a idade do paciente a 16 e dividindo por 4,

e não deve ter balonete. Em crianças vitimas de traumatismo, a cricotireoidotomia

pode ser necessária na presença de traumatismo facial grave ou em pacientes

com lesão estável de coluna cervical.

13.4.2. B – Respiração

A efetividade da ventilação e oxigenação deve ser continuamente avaliada,

observando-se expansibilidade simétrica e ausência de cianose.

A criança traumatizada deve receber oxigenação suplementar na maior

concentração possível por meio de máscara. Os volumes correntes variam entre 7

e 10 ml/kg. Se a respiração não for eficaz instituir ventilação assistida com bolsa-

máscara com reservatório para oferecer oxigênio a 100%. Essa assistência deve

eventualmente ser seguida por intubação endotraqueal. A ventilação da criança

pode estar comprometida por distensão gástrica, diminuindo a mobilidade do

diafragma e aumentando o risco de vômitos e aspiração. Uma sonda naso ou

orogástrica deve ser introduzida tão logo seja controlada a ventilação.

72

Page 73: Apostila de Trauma-1

13.4.3. C – Circulação

A manutenção da circulação em crianças vítimas de trauma requer:

controle de hemorragias externas, suporte da função cardiovascular e perfusão

sistêmica, restauração e manutenção de volume sangüíneo adequado. Perfusão

periférica e pulso normais indicam adequada volemia.

Acesso vascular deve ser providenciado rapidamente. Dois catéteres de

grosso calibre devem ser colocados preferencialmente em membros superiores.

Como opção tem-se a via intra-óssea em crianças menores de 6 anos, flebotomia

na safena ou a passagem percutânea de catéteres através de veia femoral,

subclávia ou jugular. A dissecção deve ser realizada de acordo com a experiência

da equipe no atendimento.

A administração de fluidos deve ser em bolus de 20ml/kg de solução

cristalóide (soro fisiológico ou Ringer lactato). Repetir uma ou duas vezes, se não

houver melhora da perfusão. Se o paciente permanece instável deve-se indicar

transfusão de concentrado de hemáceas 10ml/kg alternados com solução

fisiológica a temperatura do corpo; se necessário sangue total 20ml/kg.

Transfusão urgente também é necessária se a criança não responde à

administração de 50ml/kg de solução cristalóide isotônica, podendo ser indicada

intervenção cirúrgica. Se o choque persiste, apesar do controle de hemorragias

externas e da reposição de volume, e provável a existência de hemorragias

internas.

Se necessário a RCP segue os princípios do adulto com modificações nas

doses da medicação, atropina 0,02mg/kg; epinefrina 0,1mg/kg; lidocaína 1mg/kg,

bicarbonato 1mg/kg; succinilcolina 1mg/kg.

13.4.4. D – Avaliação Neurológica

Deve-se fazer um exame sumário das pupilas quanto ao tamanho, simetria

e resposta a luz. O nível de consciência é avaliado através da correlação com a

Escala de Coma de Glasgow adaptada para crianças. Índices iguais ou menores

que 8 estão relacionados com mortalidade de 40% e seqüelas neurológicas

graves.

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Page 74: Apostila de Trauma-1

ESCALA DE GLASGOW ADAPTADA PARA CRIANÇAS

VERBALIZAÇÃO ESCORE

Apropriada para idade, fixa e segue, sorriso social 5

Chora, mas é consolável 4

Persiste irritado 3

Letárgico 2

Sem resposta 1

MOTOR – movimento espontâneo 6

* Todos os demais itens seguem as mesmas pontuações do adulto

SINAIS VITAIS NORMAIS NA CRIANÇA

IDADE P.A. (mmHg) PULSO F.R.

neonato 70/40 120-140 30-60

3-12 meses 90/50 90-140 30-60

1-6 anos 95/60 80-110 20-35

6-12 anos 100/70 70-100 16-25

>12 anos 120/70 60-90 8-16

13.4.5. E – Exposição

A retirada da roupa é essencial para permitir um exame completo de

todos os segmentos corpóreos e facilitar a realização dos procedimentos.

A criança, principalmente o lactente, sofre rápida perda de calor por ter

uma maior superfície corpórea em relação ao peso, exigindo a monitorização da

temperatura. A queda da temperatura leva ao aumento do consumo do oxigênio e

vasoconstrição periférica. Temperatura ambiente adequada e utilização de calor

radiante ou cobertores aquecidos são importantes durante o atendimento.

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Page 75: Apostila de Trauma-1

14. ABUSO INFANTIL

Definem-se maus tratos como lesão física ou mental, abuso sexual,

tratamento negligente ou maus-tratos de uma criança menor de 18 anos pela

pessoa responsável pelo seu bem estar, sob circunstâncias que indicam que a

saúde e o bem estar da criança estão prejudicados ou ameaçados desse modo.

Crianças que morrem no primeiro ano de vida em decorrência de trauma

geralmente são vítimas de maus tratos. Deve-se suspeitar de abuso se:

o Há discrepância entre história contada pelo acompanhante e gravidade

das lesões;

o Existe um intervalo grande entre o momento da agressão e procura do

atendimento;

o A história demonstra traumas repetidos, tratados em diferentes serviços

de emergência.

o Os pais respondem evasivamente ou não obedecem a orientação

médica.

o A história do trauma muda ou difere quando relatada por diferentes pais

ou tutores.

Durante o exame físico deve se investigar mais intensamente quando:

o Hematomas subdurais múltiplos, especialmente sem fratura recente de

crânio;

o Hemorragia retiniana;

o Lesões periorais;

o Ruptura de vísceras sem antecedentes de trauma grave;

o Trauma genital ou na região perianal;

o Evidências de lesões traumáticas repetidas, representadas por

cicatrizes antigas ou por fraturas consolidadas ao Raio-X.

o Fratura de ossos longos em menores de 3 anos;

o Lesões bizarras, tais como mordeduras, queimaduras por cigarro ou

marcas de cordas;

o Queimaduras de segundo e terceiro grau nitidamente demarcadas e em

áreas não usuais.

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Page 76: Apostila de Trauma-1

O abuso sexual tem manifestações clínicas mais difíceis de reconhecer que

o abuso físico. A presença de traumatismo genital e anal ou doenças sexualmente

transmissíveis em crianças pré-púberes devem levantar forte suspeita. Infecções

do trato geniturinário recorrentes, vaginite inespecífica recorrente, verrugas

genitais ou gravidez precoce também podem advir de abuso sexual.

A conduta deve incluir contato imediato com assistente social, notificar o

Juizado de Menores se indicado, informar os pais da necessidade de notificar e o

desejo de ajudar, hospitalizar a criança se necessário e estabelecer

acompanhamento. Em caso de suspeita, sempre peça ajuda do médico pediatra

de plantão.

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Page 77: Apostila de Trauma-1

15. TRAUMA NO IDOSO

15.1. ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS

O idoso apresenta deterioração de diversos órgãos e sistemas,

diminuindo sua capacidade de compensação no período pós-traumático.

O sistema cardiovascular é talvez o mais afetado pelas alterações do

envelhecimento. Há risco aumentado de complicações cardíacas durante o

estresse do trauma e o período de recuperação.

O sistema respiratório conduz a uma perda crônica da reserva funcional.

A caixa torácica torna-se mais frágil predispondo a fraturas múltiplas de costelas

mesmo em traumas com transferência de energia aparentemente baixa.

O cérebro apresenta alterações estruturais e funcionais com o

envelhecimento. As mudanças no SNC podem conduzir a visão periférica

diminuída, audição prejudicada, estabilidade da marcha diminuída e uma maior

probabilidade de episódios de síncope, fatores esses que podem colocar as

pessoas idosas em maior risco para trauma.

A reserva renal também diminui com o envelhecimento devido à

progressiva perda glomerular. Como conseqüência há redução progressiva da

taxa de filtração glomerular.

O envelhecimento do sistema musculoesquelético aumenta a fragilidade

óssea e, por conseguinte aumenta a tendência a fraturas.

Conseqüências metabólicas e nutricionais do envelhecimento incluem

diminuição da reserva calórica com a diminuição da massa corporal; intolerância à

glicose relacionada à idade e com início na quarta década de vida; e menor

reserva nutricional.

15.2. COMORBIDADES

A prevalência de comorbidade ou condições médicas concomitantes em

todos os pacientes de trauma foi estimada estar entre 8% e 20%. Milzman et al

identificaram uma incidência crescente de comorbidade com o envelhecimento,

de 17% na quarta década, para 44% na sexta década, e 65% com mais de 75

anos. Além de aumentar a duração da hospitalização, a presença de comorbidade

também aumenta os custos.

77

Page 78: Apostila de Trauma-1

Medicamentos para doença crônica também podem afetar a resposta ao

trauma e a reanimação. O uso de -bloqueadores e bloqueadores dos canais de

cálcio, por exemplo, podem prejudicar o aumento da função cardíaca em resposta

ao trauma.

15.3. MECANISMOS MAIS FREQUENTES

Três tipos de traumas correspondem aos mais importantes entre os idosos:

quedas, queimaduras e acidentes envolvendo veículo, colisões e atropelamentos.

15.4. COMPLICAÇÕS, DURAÇÃO DO TRATAMENTO E PROGNÓSTICO

Constatou-se que o período de internamento é duas vezes maior para

idosos traumatizados do que mais jovens traumatizados. E também que os

pacientes idosos internados tiveram uma maior mortalidade durante o

internamento do que os mais jovens, indicando que os pacientes idosos são mais

suscetíveis a morrer devido a complicações da injúria inicial.

A taxa de mortalidade para indivíduos idosos traumatizados varia de 15 a

30%, sendo, portanto, bem superior aos 4 a 8% estimados para as populações

mais jovens.

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Page 79: Apostila de Trauma-1

16. S.T.A.R.T.

O conhecimento de uma forma de classificação das vítimas pelo

atendimento pré-hospitalar quando acontece um desastre: é o chamado método

S.T.A.R.T. (Simple Triage and Rapid Treatment).

Trata-se de um fluxograma criado nos EUA para classificar as vítimas, de

acordo com a sua gravidade, em quatro cores veja exemplo de ficha na página

seguinte):

Verde (lesão leve ou sem lesão, podem aguardar e são quarta

prioridade de remoção)

Amarelo (lesão grave sem risco de vida nas próximas 24h, podem

aguardar e são a segunda prioridade de remoção)

Vermelho (lesão grave com risco de vida nas próximas 2h, críticos

recuperáveis, devem ser transferidos imediatamente)

Preto (lesão muito grave com risco de vida nos próximos 5 a 15

minutos, críticos não-recuperáveis, terceira prioridade de remoção;

mortos, quinta prioridade de remoção)

As vítimas são triadas pelo serviço de atendimento pré-hospitalar

somente uma vez, e recebem um cartão, preso ao corpo, com dados importantes

para quem as irá atender na seqüência: hora e data do atendimento, nome,

endereço (se possível), dados vitais. Na parte inferior deste cartão há tarjetas que

são destacadas de acordo com a classificação da vítima. A porção destacada

contém um número de identificação, que deve ser guardado pelo socorrista e

depois entregue ao comando do resgate.

A importância deste tipo de identificação consiste em deixar de forma

clara que grau de lesão o paciente tem, e qual a sua prioridade de atendimento,

além de facilitar a visualização da resposta às manobras de reanimação pela

mensuração de dados vitais, desde o primeiro atendimento, pela equipe que irá

atender o paciente em nível hospitalar.

79

Modelo de ficha do S.T.A.R.T. para classificação da gravidade de vítimas em desastresFRENTE VERSO

Page 80: Apostila de Trauma-1

80

Ficha de Classificação de Vítimas pelo Sistema S.T.A.R.T.