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O ESTUDO DO MUNICÍPÍO: Conhecendo a Realidade em que se Vive.
Autora: Dulce Helena Gomes Vilar Garbelini1
Orientador: Me Aníbal Pagamunici2
Resumo:
O presente trabalho tem por objetivo mostrar a importância do
espaço local no ensino da geografia, no ensino médio da rede pública do estado do
Paraná. Este estudo poderá contribuir para formar a identidade (pessoal e social),
capacitando o aluno a reconhecer-se em um lugar, identificando as particularidades
do mesmo, levando-o a expressar-se com propriedade, promovendo a construção
da cidadania, pois entendemos que ser cidadão é ser capaz de opinar sobre temas
públicos, em decisões políticas e conhecer os seus direitos e deveres. As atividades
estão organizadas de forma a possibilitar uma leitura geral do espaço geográfico,
com análise e reflexão da paisagem em diferentes períodos, para o entendimento
geográfico do lugar do aluno. E assim resgatar em parte aos “olhos da geografia” o
processo de ocupação e uso do solo do espaço rural de Loanda, contextualizando-o
às lembranças da menina Dulce à prática da professora Dulce, autora desse estudo.
abordando aspectos históricos e físicos, buscando o entendimento da construção do
espaço geográfico.
Palavras-chave: Paisagem. Lugar. Memória. Transformação. Loanda.
1 Professora PDE (2010) - Colégio Estadual Paraná – Loanda – Pr.
2 Professor Me. na Universidade Estadual do Paraná – UNESPAR, Campus de Paranavaí-
FAFIPA.
1. Introdução:
De acordo com as Diretrizes Curriculares da Educação Básica, o
espaço paranaense deve ser objeto de estudo em todas as séries do ensino
fundamental e médio. O espaço local e o espaço regional são categorias
imprescindíveis no entendimento da organização do espaço geográfico e
leitura do mundo, portanto, o estudo da geografia compreende a
interpretação da produção desses espaços, bem como a leitura de mundo
para a construção da cidadania da sociedade. Este estudo foi desenvolvido
através do entendimento dos conceitos geográficos existentes na realidade
concreta das pessoas, com tempo e espaço claramente definidos.
Neste sentido, Callai e Zarth entendem que
Estudar o município é importante e necessário para o aluno, na medida em que ele está vivendo. Ali estão o espaço e o tempo delimitados, permitindo que se faça a análise de todos os aspectos da complexidade do lugar. [...] É uma escala de análise que permite que tenhamos próximos de nós todos aqueles elementos que expressam as condições sociais, econômicas, políticas do nosso mundo. É uma totalidade considerada no seu conjunto, de todos os elementos ali existentes, mas que, como tal, não pode perder de vista a dimensão de outras escalas de análise. (Callai e Zarth,1988, p.11 ).
Tendo como meta levar o aluno a conhecer sua realidade concreta,
vivida no cotidiano, oportunizando ao mesmo conhecer o mundo em que vive,
foi desenvolvido este estudo sobre o município, cuja pretensão é resgatar aos
“olhos da geografia”, o processo de ocupação e uso do solo do espaço rural
de Loanda, estado do Paraná, contextualizando as lembranças da professora,
autora da pesquisa. Abordando aspectos históricos e físicos do município de
Loanda, cidade onde é professora de geografia, procurando a conexão
geográfica entre as lembranças da “menina Dulce” e a interpretação
geográfica da professora Dulce. Ao ensinar geografia, observamos o interesse
dos alunos quando relatava fatos ocorridos na sua infância e juventude,
vividos no município de Loanda. Assim, passou a utilizar as suas lembranças
para ilustrar as aulas e produzir material didático, no qual relata fatos
geográficos da infância e juventude.
Com o título: ‘Um Olhar Geográfico nas lembranças da Menina Dulce”,
a pesquisa foi produzida para auxiliar o estudo sobre a região Noroeste do
Paraná com destaque o município de Loanda. Para a geografia, o estudo do
município que apresenta suas marcas culturais e regionais, possui conteúdo
didático significativo e pode dar dinamismo às aulas, despertando o interesse
dos alunos. É importante destacar que o regional e o local são recortes da
realidade global e devem ser considerados no estudo da geografia.
O estudo do local desperta o aluno para a observação, leitura e
interpretação da paisagem na qual se insere, bem como identificar seus
elementos, constatar suas semelhanças e diferenças e investigar os fatores
que constroem paisagens diferenciadas em tempos e espaços diversos.
Estabelecer a relação entre a organização espacial da paisagem do seu
município, com a sociedade que a transforma constantemente, conhecer a
realidade do meio onde vive e reconhecer-se como sujeito com história e
capaz de construir conhecimento contextualizado da sua realidade.
Reafirmando a importância do estudo do município em geografia,
orienta-se trabalhar o local e o global simultaneamente, pois a realidade social
hoje é marcada pelo processo de globalização, e neste encontra-se elementos
contraditórios e interdependentes, que são a reafirmação de culturas, de
espacialidades, de experiências locais. A geografia é uma ciência que estuda
o espaço, na sua manifestação global e nas singulares. Sendo assim, os
conteúdos geográficos precisam ser trabalhados pelos alunos nessa dupla
inserção: a global e a local.
Portanto, estudar o município é essencial para o aluno a partir das
séries iniciais. No entanto este estudo deve se estender às séries
subseqüentes, visto que é importante entender a dinâmica do
desenvolvimento do município como um todo.
2. Construindo Conceitos Geográficos
Na geografia, é importante participar do processo de construção dos
fundamentos conceituais e instrumentais, o que supera o senso comum e leva
a compreensão e representação da vida e do mundo, através do estudo da
realidade.
O uso de conceitos em sala de aula tem função precisa: estimular o
aluno a pensar cientificamente. Apropriando-se dos conceitos e relacionando-
os às teorias que os abrigam, o aluno poderá elevar o seu conhecimento da
sociedade a um patamar além do senso comum ou das aparências.
Ao construir conceitos, o aluno realmente aprende a entender o mapa,
o relevo, a região, nação, município, enfim, desenvolver modo de pensar
geográfico, aprendendo a lidar com signos e representações, formando
conceitos que instrumentalizem esse pensamento, permitindo ao mesmo
localizar-se, dando significado aos lugares e às suas experiências sociais e
culturais na diversidade em que elas se realizam.
Para leitura geográfica crítica, alguns conceitos são relevantes, como
os de lugar, paisagem, região, natureza e sociedade. Estes e outros conceitos
foram estudados no decorrer deste trabalho.
No tocante ao espaço e a paisagem, o que os difere é a vida que as
anima, ou seja o resultado da relação entre sociedade e natureza. Despertar o
olhar observador do aluno sobre a paisagem, partindo do seu município, é
buscar a compreensão do mundo e das sociedades que com ele interagem,
sendo dever da geografia conduzir esse aluno para uma leitura crítica do
mundo através de suas paisagens.
Neste sentido, segundo o mestre Milton Santos,
Paisagem e Espaço não são sinônimos. A paisagem é o conjunto de formas, que num dado momento, exprime as heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza. O Espaço são essas formas mais a vida que as anima (SANTOS, 2006, p.103).
Ainda com relação à paisagem, Santos afirma que:
A Paisagem é apenas a porção da configuração territorial que é possível abarcar com a visão. Assim, quando se fala em Paisagem, há também referência à configuração territorial [...] A Paisagem existe através de suas formas, criadas em momentos históricos diferentes, porém coexistindo no momento atual. No Espaço, as formas de que se compõe a paisagem preenchem as necessidades atuais da sociedade. Tais formas nasceram sob diferentes necessidades, emanaram de sociedades sucessivas, mas só as formas mais recentes correspondem a determinações da sociedade atual [...] O Espaço é a sociedade, e a paisagem também o é. No entanto, entre Espaço e Paisagem o acordo não é total, e a busca desse acordo é permanente; essa busca nunca chega ao fim. (SANTOS, 2006,p.103,104).
A paisagem é moldada segundo as características econômicas,
históricas, sociais, culturais e tecnológicas da sociedade que nela se insere.
Por outro lado, a sociedade também é influenciada pelos elementos da
paisagem na qual se insere, num processo de interatividade.
Quanto ao Espaço e ao território, Rafesttin afirma que
É essencial compreender bem que o espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, é o resultado de uma ação conduzida por um ator sintagmático (ator que realiza um programa) em qualquer nível. “Ao se apropriar de um espaço, concreta ou abstratamente (por exemplo, pela representação), o ator “territorializa” o espaço” (RAFESTTIN,1993, p.143).
É importante considerar que o território e o ordenamento territorial são
conceitos que permitem interpretar a sociedade a partir das relações entre
espaço e poder, apreendendo as dinâmicas sociais que perfazem as inúmeras
compartimentações espaciais no mundo urbano-contemporâneo.
De acordo com Gomes (2005, p.297), no quadro da análise marxista,
o espaço deve ser considerado como produto social, isto é, ele pode ser
explicado recorrendo aos aspectos fundamentais que organizam a sociedade.
Para o marxismo, estes aspectos precedem as relações de produção e as
forças produtivas que compõem o modo de produção.
Ainda, segundo Gomes apud revista Espace Tempos (2005, p.297)
para a geografia radical (Marx), o conceito de espaço social traduz a idéia de
dinâmica social inscrita em um espaço que é ao mesmo tempo reprodutor de
desigualdades e a condição de sua superação, reflexo esse de uma ordem e
um dos meios possíveis para transformar essa mesma ordem; enfim, o
espaço faz parte da dialética social que o funda.
O espaço recebe marcas a todo o momento a partir da produção de
um determinado grupo social, ou seja, à medida que a sociedade sofre
transformações, o espaço também é transformado.
No tocante ao conceito de lugar, a importância deste se dá para
compreendermos o processo de construção do espaço geográfico pela
sociedade. Desta forma, se tem uma melhor compreensão de como esta se
relaciona entre si e com o ambiente; como se organiza para prover sua
existência; como constrói sua história; enfim, estuda as marcas culturais
concretizadas nestas relações.
Assim, entendemos que o estudo do lugar e da região em que o aluno
vive deve permitir e dar condições para que o mesmo aprenda e se organize a
partir da realidade local e regional, tornando-o competente para construir
conceitos necessários, interpretar o presente e estar instrumentalizado ao
porvir de sua vida.
O estudo do “lugar” merece destaque, visto que está diretamente
relacionado com o presente trabalho e foi enfocado sob vários prismas, de
acordo com variadas concepções para uma melhor análise. É importante
colocar aqui o ecletismo do atual estudo em relação às várias abordagens
geográficas.
Embora a nossa base tenha sido o materialismo histórico, foi possível
conviver, sem extinguir os conflitos, com outras abordagens, respeitando as
diferenças e, utilizando-as quando necessário, para se analisar as novas
lógicas sociais, sem, contudo, abandonar o espírito crítico. Tudo isso se
constitui grande riqueza que permite à geografia inúmeros caminhos para
analisar o mundo real.
Referente ao conceito de lugar, Garcia Ballesteros, citado por Lemos,
afirma que
Os lugares que hoje a Geografia estuda devem ser considerados como um componente de nossa identidade de sujeitos, como centro de significados, como condição da própria existência, foco de veiculação emocional para os seres humanos, contexto para as nossas ações; o lugar como expressão da paisagem e da cultura, de experiências e significações diferenciadas. O lugar concentra significados, pensamentos e os sentimentos dos seus habitantes. A especificidade dos lugares traz, no seu bojo, o estudo das paisagens em função das experiências diferenciadas e dos significados, também diferenciados. Por esta linha de abordagem, da chamada geografia humanista, é possível interpretar os lugares com novas dimensões simbólicas e culturais, concebidos como uma paisagem vivenciada holística e sentida em todas as dimensões, inclusa a temporal. (BALLESTEROS, apud LEMOS, 1999).
Milton Santos (2006, p.156), citando E. Relph nos traz que “os lugares
são eles próprios a expressão atual de experiências e eventos passados e de
esperanças no futuro”.
Ainda, Milton Santos, se referindo à categoria Lugar, diz que
Não existe um espaço global, mas, apenas, espaços da globalização. (...) O Mundo, porém, é apenas um conjunto de possibilidades, cuja efetivação depende das oportunidades oferecidas pelos lugares. (...) Mas o território termina por ser a grande mediação entre o Mundo e a sociedade nacional e local, já que, em sua funcionalização, o ‘Mundo’ necessita da mediação dos lugares, segundo as virtualidades destes para usos específicos. Num dado momento, o ‘Mundo’ escolhe alguns lugares e rejeita outros e, nesse movimento, modifica o conjunto dos lugares, o espaço como um todo. É o lugar que oferece ao movimento do mundo a possibilidade de sua realização mais eficaz. Para se tornar espaço, o Mundo depende das virtualidades do Lugar" (Santos, 1996:271).
Segundo Tuan, geógrafo fenomenologista, citado por Gomes (2005), o
lugar encarna a experiência e as aspirações do povo. Da mesma maneira,
Bulttimer define o Lugar como sendo o espaço do cotidiano onde o corpo se
coloca em relação direta e harmônica com o mundo.
A geografia Humanista permite que a geografia passe a desenvolver
estudos sobre a percepção das pessoas em relação ao seu ambiente de
vivência, considerando também os saberes não científicos como fonte do
conhecimento.
Ao atribuir sentido ao “lugar” como categoria de estudo, Tuan (1982,
p. 146) revela que há uma relação afetiva deste com o indivíduo, marcada
pelas suas experiências pessoais ligadas a valores e ao modo como se
percebe o meio ambiente. O sentimento de afeição ou rejeição aos lugares
está ligado a esse modo de perceber preconizado pelo autor.
Utilizando-se do termo “Mundo Vivido”, Buttimer (1982, p.172) explica
que ele não é “um mero mundo de fatos e negócios [...] mas um mundo de
valores, de bem, um mundo prático”. Está ancorado num passado e
direcionado para um futuro, é um horizonte compartilhado, embora cada
indivíduo possa construí-lo de um modo singularmente pessoal.
Este panorama exige uma visão que se oponha às concepções
positivistas, conforme critica Mello (1991, p.96), ao defender uma corrente
humanística, que procura interpretar a multiplicidade dos acontecimentos do
mundo vivido, trabalhando, para tanto, com valores e sentimentos dos seres
humanos, o oposto das perspectivas positivistas, que não pretendem ou
tampouco conseguem explicar o mundo vivido, com suas leis e teorias
mecanicistas, acabadas e abstratas.
3. Ouvindo os pioneiros – a pesquisa nas fontes orais
Este trabalho foi desenvolvido utilizando fontes orais - depoimentos de
pioneiros que vivenciaram a história do Noroeste paranaense,
especificamente a história do município de Loanda.
Tais relatos nos permitem vivenciar experiências, que ao serem
narradas transformam-se em importantes fontes de informação,
proporcionando-nos a compreensão do processo de transformação territorial
pelo qual passou esta fração do território paranaense.
A história oral, método pouco explorado no campo da geografia, não é
um fim em si mesmo, mas um meio de conhecimento. O seu emprego só se
justifica no contexto de uma investigação científica num projeto de pesquisa,
onde existe um planejamento prévio. Cabe ao pesquisador, quando usa as
fontes orais, não priorizar somente estas, mas procurar redimensioná-las com
fontes escritas, visando uma investigação mais profunda, a fim de chegar a
uma real conclusão no processo investigativo.
Nestes termos, segundo Hall
... a História Oral está longe de ser uma história espontânea, não é a experiência vivida em estudo puro, e que os relatos produzidos pela História Oral devem estar sujeitos ao mesmo trabalho crítico de outras fontes que os historiadores costumam consultar (HALL,1991:p.157).
Ainda, sobre a História Oral, Tompson afirma que
...a história oral pode certamente ser um meio de transformar tanto conteúdo, como finalidade da história. Pode ser utilizada para alterar o enfoque da própria história e revelar novos campos de investigação (...) pode devolver às pessoas que fizeram e vivenciaram a história um lugar fundamental mediante suas próprias palavras”. (TOMPSON,1992, p.25).
O uso da História Oral nos trabalhos científicos enriquece a pesquisa
e também valoriza os personagens sociais que participam como sujeitos-
agentes de sua própria história.
Antônio Roberto Xavier, em seu artigo sobre a importância da História
Oral (artigo 16.904), escreve:
É através da experiência vivida no passado, dos erros, das ilusões e desilusões, das da cidadania ativa aos seus habitantes”.ideologias e utopias, dos sonhos e das realidades, das verdades e mentiras, das buscas e desistências, dos medos e das coragens, enfim, de tudo que se viveu, sentiu,ou pensou, que se pode corrigir, no presente, para se melhorar o futuro. Tudo isso só é possível se o historiador lançar mãos dos diversos tipos de fontes, pois nem tudo está escrito. Neste sentido,é que a memória privilegia aqueles que não tiveram vez e nem voz por falta de oportunidade ou por ofuscamento das diretrizes dominantes. O estudo da memória é fundamental, principalmente numa sociedade intensamente autoritária, violenta e discriminadora, como a brasileira que foi produzida por um Estado assistencialista, que sempre negou os direitos essenciais para o exercício da cidadania ativa aos seus habitantes.
Em relação à memória, Chauí (1995, p.125) diz que “a memória é uma
evocação do passado. É a capacidade humana para reter e guardar o tempo
que se foi, salvando-o da perda total. A lembrança conserva aquilo que se foi
e não retornará jamais”.
Partimos do princípio que um trabalho escrito é sempre um
testemunho de situações vividas no passado (Moraes, 1983). A linha mestra
para desenvolver esse trabalho foi, portanto, estudar fatos ocorridos,
presentes na memória da “menina Dulce” e a prática docente da professora
Dulce, para compreender o contexto regional recente do município de Loanda.
4. Olhar geográfico nas lembranças da menina Dulce
A falta de leis, e descumprimento das existentes, na regulamentação
da posse e uso da terra na década de 50 gerou muitos conflitos e mortes de
pessoas no noroeste do Paraná. O processo de modernização das
tecnologias aplicadas ao campo nos anos 70 fez do Paraná um pólo agrícola
e industrial de grande importância em nível nacional e mundial. Muito embora
o Paraná seja atualmente o quinto maior PIB do Brasil, ocupando posição de
destaque no cenário nacional (IBGE, 2010), apesar das transformações
ocorridas e da modernização, ainda persistem os conflitos e movimentos de
luta pela apropriação e uso do solo paranaense.
O processo histórico é construído pela sociedade, que lhe determina o
ritmo e a direção, sendo diferenciados conforme a escala dos aspectos locais,
regionais e globais que se articulam entre si. As conquistas sociais nesse
processo, em certos momentos, avançam, e, em outros, retrocedem. Essas
diferenças de ritmo resultam do jogo de interesses, de necessidades e
vontades de uma parcela dominante da sociedade. Todos nós fazemos
história. E essa é a visibilidade das mudanças ou permanências de elementos
que compõem a paisagem, cabendo à geografia reconhecê-las, interpretá-las
e assim, demonstrar as variáveis que interferiram direta ou indiretamente na
organização espacial da sociedade em que vivemos.
A região Noroeste, especificamente o município de Loanda, no seu
processo histórico, apresenta características próprias, a remodelação da
organização espacial e suas influências sociopolíticas, no espaço de Loanda,
foi determinada por políticas de posse e uso do espaço na perspectiva
neoliberal de acumulação capitalista, dando ao espaço geográfico valores sob
a sua ótica. Essas políticas se dão num processo de exclusão, pois nem todos
que dela participam, conseguem o que de direito lhes pertencem. Uns
ganham apenas para manter sua força de trabalho - os trabalhadores,
despossuídos dos meios de produção e que constituem a maioria da
população. Outros, a minoria recebe muito além do que necessitam para repor
sua força de trabalho, são os donos dos meios de produção. São
desdobramentos desse contexto que este estudo pretende demonstrar,
vividos nas décadas de 50 a 90, no município de Loanda.
5. O local onde se desenvolveu a pesquisa
A pesquisa estuda parte do Noroeste Paranaense, na microrregião de
Paranavaí, ou microrregião 01, e especificamente o município de Loanda,
subsidiado pelo município de São Pedro do Paraná, local aonde a Menina
Dulce veio morar com seus pais. O recorte temporal nos leva à década de
1950, ápice da colonização no Noroeste do Estado, e as décadas seguintes.
Investigamos o processo de ocupação e uso do espaço rural de
Loanda; as políticas paranaenses que regiam a apropriação da terra na
década de 1950, no Paraná; os aspectos históricos da cidade de Loanda; os
aspectos gerais dos efeitos que as novas tecnologias, nos anos 70,
provocaram no espaço rural do município e algumas políticas públicas
desenvolvidas em defesa da preservação do meio ambiente em Loanda.
A pesquisa utiliza a recordações da menina Dulce e observações
científicas da prática docente em geografia da professora Dulce.
6. A implementação da pesquisa: o passo a passo
Considerar os conhecimentos prévios do aluno, sejam eles empíricos
ou científicos, é fundamental para o sucesso do processo ensino-
aprendizagem. Integrar a vivência social à prática escolar, motiva a
aprendizagem, oportunizando a construção do conhecimento de forma
contextualizada.
Portanto, em vários momentos desta implementação, procuramos
contextualizar o conhecimento, os problemas e as atividades, visando a
conexão da aprendizagem à realidade do aluno e com isso instrumentalizá-lo
para viver criticamente no seu espaço e com isso contribuir para a formação
de uma sociedade justa.
O trabalho de implementação foi realizado durante um período de dois
meses, tendo como público alvo, alunos do segundo ano, ensino médio, do
curso integrado, profissionalizante em informática, do Colégio Estadual
Paraná, em Loanda, estado do Paraná, realizou-se a capacitação online, com
a participação de alguns professores da rede pública de ensino.
A implementação com o público alvo começou com apresentação de
teatro de fantoches, cuja encenação mostrou a evolução da paisagem do
espaço geográfico do município de Loanda e a história da família da autora no
noroeste paranaense.
O cenário da peça apresenta as paisagens, que vão se transformando
com o passar do tempo e com a ação antrópica. Primeiramente a vegetação
nativa, a paisagem intacta, a chegada dos pioneiros (década de 1950), depois
o desmatamento, a queimada, o ciclo do café, a pecuária e por último o
processo de industrialização, que se faz notar através das fábricas de metais
sanitários.
A atividade desenvolvida enfoca a dinâmica da paisagem, através do
cenário que apresenta diversos panoramas nos quais se pode identificar
diferentes temporalidades, espacialidades e culturas. Despertar o olhar
observador do aluno sobre a paisagem e suas mutações foi o ponto de partida
para desenvolver o trabalho proposto. Os alunos anotaram tudo o que podiam
identificar e em seguida, alguns questionamentos permitiram iniciar um
processo de observação e reflexão.
A expressão oral propicia a socialização do processo de leitura
geográfica das paisagens, que passa a ser construído coletivamente e a partir
dessa análise das paisagens, foi possível fazer a comparação das diferentes
épocas e ciclos econômicos.
A paisagem apresenta características do meio físico e biológico,
estruturadas de acordo com o contexto econômico, histórico, cultural e
tecnológico da sociedade que a constrói e a transforma constantemente. A
compreensão de mundo, passa pela leitura das marcas que a sociedade
imprime no seu meio geográfico, na organização dos espaços e na criação de
suas paisagens.
A atividade possibilitou trabalhar a localização, observação,
comparação, a leitura dos elementos que compõem as diferentes paisagens,
espaços e temporalidades. Foram utilizados textos para leitura, interpretação,
comparação e análise; observação e crítica de situações, acontecimentos,
fenômenos e processos, ocorridos no espaço de vivência do aluno;
constituição de conceitos, relacionando-os entre si, tendo em vista o
desenvolvimento de uma postura participativa da realidade do espaço em que
se insere.
Através do trabalho com esses textos, o aluno foi levado a analisar a
sua realidade, comparar e contextualizar situações e perceber a relação entre
o pessoal, local e global, no passado, presente e futuro, compreendendo que
o espaço geográfico é produto das relações da sociedade com o mesmo,
modelando-o de acordo com sua intervenção econômica, social, política e
cultural. Estará estimulado a se perceber como cidadão capacitado a
compreender e intervir não somente no ambiente em que vive, mas também
em escalas mais amplas.
O material didático foi estruturado da seguinte maneira: cada capítulo
apresenta um texto-base no qual a temática é desenvolvida de forma que se
possa seguir determinada sequência na exposição, no que diz respeito às
épocas e aos fatos ocorridos.
Estudando textos pré-selecionados, os alunos conseguiram analisar a
realidade, comparar e contextualizar situações e perceber a relação entre o
pessoal, local e global, no passado, presente e futuro, compreendendo que o
espaço geográfico é produto das relações da sociedade com o mesmo,
modelando-o de acordo com sua intervenção econômica, social, política e
cultural.
Iniciamos pela localização e caracterização da região Noroeste do
Paraná, onde o aluno teve a oportunidade de localizar e comparar as três sub-
regiões, no que se refere às características e ao processo de ocupação. A
seguir, foram apresentados dois textos, que relatam experiências pessoais, as
lembranças da menina Dulce.
O primeiro texto, intitulado: “Uma terra de leite e mel”, enfoca a
infância da menina Dulce na fazenda São João, no município de São Pedro
do Paraná. Através das suas memórias, a autora do trabalho, relata
experiências de criança, sua vivência com a família, na década de 1950,
procurando relacioná-las com a geografia.
O segundo texto, de memórias, adota o título: “As pedras do caminho”
e leva o aluno a conhecer como ocorreu o processo de ocupação das terras
no Noroeste paranaense, a violência em decorrência do litígio que
caracterizou essa fase da ocupação do território. Violência que atingiu os
primeiros colonizadores, e em especial a família da autora do trabalho.
Outros textos como: A violência vem de muito tempo atrás; Loanda:
localização e características do Município; Terra Boa Loanda Querida...A sua
História; Loanda: Primeiras formas de uso do solo e Loanda e Impactos
Ambientais. Estes textos tratam da problemática e dos objetivos da pesquisa.
A leitura dos mesmos passa por diferentes etapas, indo desde a
observação dos títulos, fontes e imagens que os compõem, passando por sua
compreensão e interpretação, até o debate crítico sobre o conteúdo. O
professor adota a postura de um mediador entre o aluno e o conteúdo,
levando-o a perceber, através da leitura, o caminho percorrido pelo autor para
explicitar sua opinião, relacionando-a com os contextos em que ambos se
inserem, autor e aluno.
Alguns questionamentos podem ser utilizados para ajudar na
preparação da leitura dos textos, como: Qual o título do texto? Sobre o que o
leitor imagina que ele irá tratar? O que o leitor já sabe sobre o assunto?
Após a leitura, o exercício de compreensão e análise deve ser feito
com toda a turma, direcionando para os principais pontos do texto e pode
consistir num debate, numa resenha crítica ou na produção de um novo texto,
utilizando linguagem própria do aluno.
Os mapas, gráficos e fotografias antigas que acompanham o trabalho
foram utilizados para realizar atividades, em duplas ou individuais, como meio
de avaliação de conteúdos conceituais, sobre as temáticas desenvolvidas,
através da leitura, interpretação e análise do referido material.
Ademais, é inegável o poder da imagem como recurso pedagógico.
Torna-se essencial o desenvolvimento de habilidades, observação,
decodificação e reflexão, que permitam ao aluno ler o mundo de forma mais
independente e crítica, pois para a geografia, essas aptidões tornam-se
especiais, visto que imagens correspondem a representações de paisagens, e
sua história pode ser um primeiro exercício para a compreensão do espaço
geográfico.
Foram, ainda, confeccionados mais de cem (100) slides, utilizou-se
recursos e equipamentos tecnológicos disponíveis na escola, como a “TV
Pendrive” e outros. Da internet, utilizamos site ( www.youtube.com), o Google
Earth (earth.google.com) e outros que disponibilizam imagens de satélites,
vários vídeos foram selecionados para ilustrar a prática deste trabalho, como:
Sou Paranaense ( Grupo Terra Vermelha); Mata Ciliar ( Projeto Planalto Vivo-
Passo Fundo); O Rio Paraná preocupa (Vídeo documentário -TV VIP); Vida e
Morte Severina (João Cabral de Melo Neto e Chico Buarque de Holanda);
Vídeo sobre a cidade de Loanda na década de 1950 (arquivo pessoal da
autora); Paraná Biodiversidade (vídeo Documentário- SEMA - IAP –
EMATER).
Foram realizados vários trabalhos em grupo, que após estudo e
análise, apresentaram à classe suas conclusões, mediante debate entre
possíveis opiniões diferentes.
Outra atividade desempenhada com sucesso pelos alunos envolveu
entrevistas com pioneiros, que ainda vivem na região, complementando,
assim, brilhantemente, a pesquisa desenvolvida pela professora.
7. Considerações finais
A prática pedagógica do material didático “Um Olhar Geográfico nas
Lembranças da Menina Dulce”, apresenta dados, mapas e textos,
proporcionando análises sistematizadas sobre a realidade geográfica do
município de Loanda. O mesmo facilitou o trabalho em sala de aula, guiando
os alunos na produção do conhecimento, partindo do empírico/singular, para o
desconhecido/geral.
Dessa forma, com base nos aspectos apresentados pelos alunos foi
possível criar um diálogo entre os conceitos do cotidiano e os conceitos
científicos, aprimorando a mediação no processo de conhecimento.
A partir da metodologia proposta, o grande desafio foi levá-los a
responder às indagações para a reflexão, discussão e socialização dos
conhecimentos, que foram elaborados de forma gradativa, de acordo com os
temas recomendados. Outra dificuldade constatada foi a interpretação de
gráficos, mapas, textos e o pouco conhecimento dos termos referentes à
ciência geográfica.
Verificou-se que alterar algo já estruturado não é fácil, pois os alunos
estão habituados a receber conceitos prontos. No entanto, concluímos que a
implementação da pesquisa deu motivação às aulas, levando os mesmos a
refletir e pensar criticamente, permitindo assim a construção do conhecimento.
Os alunos foram receptivos e ativos durante a prática pedagógica, concluindo-
se que estes desenvolveram satisfatoriamente conceitos essenciais à
geografia.
Todo o trabalho foi executado com a ajuda da equipe administrativa e
pedagógica da escola, que não mediram esforços para que tudo fosse
realizado com êxito.
Acredita-se que a prática pedagógica utilizada seja um início para o
processo de formação de uma consciência espacial nos nossos alunos.
Espera-se que no porvir de suas vidas, os alunos estejam aptos para
compreender de forma crítica, as diferentes espacialidades das práticas
sociais, formando cidadãos capazes de interferir na sociedade em que vivem.
Quanto ao GTR, os cursistas foram unânimes com referência à
importância do trabalho sobre o espaço local. No decorrer dos debates com
os cursistas, professores da rede estadual de ensino, constatamos mais uma
vez a importância do estudo da realidade espacial de vivência dos nossos
alunos.
Nos relatos dos cursistas, invariavelmente, foi salientado que o
espaço local é um cenário global e que embora haja uma desigual correlação
de forças entre o local e o global os fatos que ali acontecem concorrem para
demonstrar a proximidade entre esses dois espaços. Por fim, acreditamos
que o material didático e a prática pedagógica utilizados, sejam um início para
o processo de formação de uma consciência espacial a nível local em nossos
alunos e professores. Esperamos que no futuro os alunos estejam aptos para
compreender de forma crítica as diferentes espacialidades, formando
cidadãos capazes de interferir na sociedade em que vivem.
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