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UNIVERSIDADE DE COIMBRA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
Modelação Mecânica e Simulação Numérica do Processo de Estampagem Multi-Etapas
– Aplicação ao processo de estampagem de chapas soldadas –
António José Caetano Baptista
COIMBRA 2006
UNIVERSIDADE DE COIMBRA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA
Modelação Mecânica e Simulação Numérica do Processo de Estampagem Multi-Etapas
– Aplicação ao processo de estampagem de chapas soldadas –
António José Caetano Baptista
Dissertação para Doutoramento em Engenharia Mecânica na especialidade de Tecnologia da Produção
Trabalho realizado sob a orientação do Professor Doutor Luís Filipe Martins Menezes e da Professora Doutora Dulce Maria Esteves Rodrigues
COIMBRA 2006
Aos meus Pais e Avós
Agradecimentos
As palavras com que vou compor as frases destas páginas não conseguirão jamais exprimir a admiração, estima e profundo sentimento de gratidão que guardo para com as pessoas que estão, directa ou indirectamente, aqui citadas. Contudo, elas almejam traduzir que este trabalho está muito longe de poder ser considerado como pessoal. Pois, na verdade, ele representa a contribuição generosa de todos os que, quer de forma científica, quer pessoal, me auxiliaram a levar esta missão a bom termo.
Ao Professor Doutor Luís Filipe Menezes,
por ter comigo partilhado as elevadíssimas competências, não só científicas, que possui; por desde muito cedo ter acreditado no meu potencial científico; pela disponibilidade; pela amizade; e pelo
encorajamento e apoio generosos que me concedeu, especialmente nos momentos mais conturbados deste trabalho. Que aqui encontre a expressão sincera da minha estima, admiração e gratidão.
À Professora Doutora Dulce Maria Rodrigues,
pelos valiosos conhecimentos que me transmitiu no decorrer deste trabalho; pela constante disponibilidade e apoio; pelo precioso contributo que me concedeu na transformação de muitas e
diversificadas ideias em palavras; e também pela constante boa disposição, paciência, encorajamento e grande amizade demonstrados. O meu muito Obrigado.
Ao Professor Doutor José Valdemar Fernandes.
O espírito de trabalho e de entreajuda que existem no Grupo de Tecnologia correspondem, em muito, à personificação das suas extraordinárias qualidades, quer científicas, quer humanas. O seu contributo neste trabalho e percurso foi espelhado pelo apoio na resolução de problemas de carácter institucional;
pelos enriquecedores ensinamentos científicos que me concedeu; pela amizade e pelo constante encorajamento demonstrados; e, também, pelas saudáveis discussões de segunda-feira.
Ao Professor Doutor Altino Loureiro,
pela importante contribuição científica que concedeu a este trabalho, tanto na obtenção, como na análise dos resultados relacionados com as ligações soldadas estudadas; pelo apoio no esclarecimento
das mais diversas dúvidas de engenharia; pela disponibilidade, pela amizade e encorajamento demonstrados.
À Professora Doutora Marta Oliveira. É impossível quantificar o contributo científico e humano que generosamente conferiu a este trabalho e
a este percurso. Desde que comecei a minha actividade de investigação no Grupo de Tecnologia, o seu apoio, encorajamento, paciência, boa disposição e sincera amizade, foram sempre presentes. Por tudo,
Marta, a minha sentida e profunda gratidão.
Ao Professor Doutor José Luís Alves. De entre os autênticos “irmãos de armas” que me acompanharam durante esta missão, foi um dos que
esteve sempre, sem nunca se negar, na linha da frente. O sucesso deste trabalho em muito deve à sua generosa contribuição, quer em termos das discussões científicas que mantivemos, quer nos
ensinamentos humanos que me transmitiu. Por tudo, a minha sincera estima, amizade e gratidão.
Ao Engenheiro Bruno Chaparro e ao Professor Doutor Jorge Antunes. A sua contribuição neste trabalho foi muito importante, nomeadamente por terem elaborado e
construído as ferramentas de estampagem usadas neste trabalho, bem como pela sua colaboração na realização dos ensaios experimentais. Também pelos esclarecimentos científicos prestados, pelo apoio,
companheirismo, amizade e boa disposição sempre demonstrados.
Ao Professor Doutor Manuel Vieira, pelo apoio e disponibilidade prestados durante a realização dos ensaios experimentais levados a cabo
nas instalações da Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto.
Aos meus colegas do Grupo de Tecnologia, Rui, Pedro, Nataliya e Padmanabhan,
pelo encorajamento permanente, amizade, e boa disposição sempre demonstrados.
Aos docentes do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra, pelo apoio, pelo interesse e pela disponibilidade. E, de um modo muito particular, aos que reconheceram
o meu potencial de crescimento científico e que demonstraram o seu encorajamento, boa disposição e sincera amizade.
Aos funcionários do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade de Coimbra,
pelo apoio e pronta disponibilidade demonstrados, pelo bom ambiente e pela amizade.
Aos meus colegas bolseiros do CEMUC e dos restantes laboratórios do DEM-UC, pelo interesse, pela amizade, pelo companheirismo e, especialmente,
pelo bom encorajamento que jamais esquecerei.
À minha Família e Amigos e, de um modo especial, ao meu irmão João, pelo apoio incondicional, pela paciência, pelo constante encorajamento, e por perdoarem a minha
ausência, provocada pelo empenho no trabalho de investigação sem definição de dias ou de horários.
À Fundação para a Ciência e a Tecnologia, pelo apoio institucional disponibilizado e por ter financiado este trabalho através da bolsa de Bolsa de
Doutoramento SFRH/BD/8560/2002.
A todos e a cada um, mas em especial a ti, a ti que me ajudastes a superar, dia após dia, os ventos cruzados desta travessia que agora termina,
o meu sincero Muito Obrigado no tempo e para sempre.
“És melhor do que tu. Não digas nada: sê!” Fernando Pessoa, 1931.
MODELAÇÃO MECÂNICA E SIMULAÇÃO NUMÉRICA DO PROCESSO DE ESTAMPAGEM MULTI-ETAPAS
– Aplicação ao processo de estampagem de chapas soldadas –
RESUMO
Os objectivos principais deste trabalho enquadram-se no alargamento do campo de aplicação dos programas da família DD3, nomeadamente, pelo desenvolvimento de uma ferramenta numérica – DD3TRIM – que permite a simulação do processo de fabrico multi-etapas de componentes estampados que envolvam operações de corte. O programa desenvolvido possibilita o corte de malhas de elementos finitos sólidos. A superfície de corte é definida implicitamente ou, parametricamente, através da representação geométrica NURBS. O ajuste dos elementos à superfície de corte pode ser efectuado de acordo com três estratégias, sendo uma aproximada e duas exactas. É ainda dado ênfase ao problema da transferência de variáveis – remapeamento – entre duas malhas de elementos finitos com diferentes discretizações e/ou topologias, através da implementação no programa DD3TRIM de vários métodos de remapeamento. Este estudo realça a abordagem inovadora introduzida através do método de Remapeamento Incremental Volúmico. No estudo da simulação numérica do processo de estampagem de chapas soldadas, a contribuição principal consiste em avaliar o impacto de se considerar a presença do domínio material da soldadura na malha de elementos finitos durante a simulação. Para tal, é quantificada de modo sistemático, recorrendo à simulação numérica, a influência da soldadura, isto é, das suas propriedades mecânicas, largura e orientação, no comportamento mecânico de chapas soldadas em testes mecânicos elementares capazes de reproduzir, de forma individual, trajectórias típicas de estampagem. As conclusões retiradas dos testes elementares são confrontadas e reforçadas através do estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado multi-etapas dedicado à previsão do retorno elástico. Esse ensaio permitiu ainda confirmar a eficiência e fiabilidade das ferramentas numéricas desenvolvidas.
PALAVRAS-CHAVE
Estampagem Multi-Etapas; Corte de Malhas; Remapeamento de Variáveis; Estampagem de Chapas Soldadas; Simulação Numérica; Retorno Elástico; Elementos Finitos Sólidos.
MECHANICAL MODELLING AND NUMERICAL SIMULATION OF THE MULTI-STEP SHEET METAL FORMING PROCESS
– Application to the forming process of tailor welded blanks –
ABSTRACT
The main objective of this study is to enlarge the field of application of the DD3 family of finite element numerical simulation programs. The numerical simulation of multi-step manufacturing of formed parts, including trimming operations, was achieved by the development of a new numerical tool, DD3TRIM. The DD3TRIM code can perform trimming operations on solid finite element meshes. The trimming surface is defined implicitly or, parametrically, by means of a NURBS geometrical representation. The adjustment of the finite element mesh to the trimming surface can be performed either by approximation or by two precise strategies. Special emphasis is given to the problem of variable transfer - remapping - between two finite element meshes with different discretizations and/or topologies. This resulted in the implementation of several remapping methods in the DD3TRIM code. An innovative remapping strategy, the Incremental Remapping Method, is proposed in this work. In the numerical study of tailor-welded blanks (TWBs), the influence of the presence of the weld in the finite element mesh on the results of numerical simulation forming of TWBs is systematically quantified. Standard mechanical tests, which can individually reproduce typical sheet metal forming deformation paths, are simulated to evaluate the influence of the mechanical properties, width and orientation of the weld on the mechanical behaviour of TWBs. The conclusions of these mechanical tests are compared and asserted with a numerical and experimental study of a multi-step springback benchmark test. The benchmark study attested to the efficiency and reliability of the numerical tools that were developed.
KEYWORDS
Multi-Step Sheet Metal Forming; Trimming; Remapping; Tailor-Welded Blanks; Numerical Simulation; Springback; Solid Finite Element Meshes.
xi
ÍNDICE
Capítulo 1 Introdução 3
1.1 Preâmbulo 3
1.2 Enquadramento 9
1.2.1 Simulação numérica do processo de estampagem multi-etapas 12
1.2.2 Estampagem de chapas soldadas 17
1.3 Objectivos do trabalho 31
1.4 Guia de leitura 32
1.4.1 Estrutura 32
1.5 Notações e convenções 34
Capítulo 2 Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos 37
2.1 Enquadramento 37
2.2 Descrição do algoritmo de corte 40
2.3 Algoritmo de corte – Fase de pré-processamento 42
2.4 Algoritmo de corte – Fase de correcção 44
2.4.1 Avaliação do volume a eliminar nos elementos cortados 44
2.4.2 Corte por plano 46
2.4.3 Corte por superfície NURBS 49
2.4.3.1 Superfícies paramétricas NURBS: Definição 49
2.4.3.2 Projecção de um ponto numa superfície NURBS 53
2.4.3.3 Intersecção de uma recta com uma superfície NURBS 54
2.4.3.4 Aplicação do tratamento 55
2.5 Algoritmo de corte – Fase de pós-processamento 58
2.6 Algoritmo de divisão de malhas 60
2.7 Testes numéricos de eficiência 62
2.7.1 Ensaio de tracção uniaxial 65
Índice
xii
2.7.2 Ensaio de flexão 68
2.8 Conclusões e comentários 74
Capítulo 3 Remapeamento de variáveis 77
3.1 Enquadramento 77
3.2 Algoritmos de localização de pontos em malhas 84
3.2.1 Método da inversão paramétrica das funções de forma 85
3.2.2 Método das coordenadas volúmicas 87
3.2.3 Método geométrico baseado no produto interno de vectores 88
3.3 Método de remapeamento por interpolação/extrapolação simples 90
3.4 Método de remapeamento através de mínimos quadrados móveis 92
3.5 Método de remapeamento incremental volúmico 96
3.6 Tratamento das variáveis dependentes 101
3.7 Reequilíbrio do corpo deformável após o remapeamento 102
3.8 Testes numéricos de eficiência 104
3.8.1 Avaliação do desempenho dos métodos de localização de pontos 105
3.8.2 Avaliação do desempenho dos métodos de remapeamento 107
3.8.2.1 Remapeamento sucessivo de uma malha circular rodada 108
3.8.2.2 Remapeamento entre malhas regular e irregular 117
3.8.2.3 Remapeamento entre malhas refinada e desrefinada 122
3.9 Conclusões e comentários 126
Capítulo 4 Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas 131
4.1 Enquadramento 131
4.2 Caracterização do procedimento numérico 137
4.3 Ensaio de tracção uniaxial 140
4.3.1 Análise da resistência global da soldadura 142
4.3.2 Análise da ductilidade da soldadura 146
4.4 Ensaio de corte 149
4.4.1 Análise da resistência global da soldadura 150
4.5 Ensaio de flexão em quatro pontos 153
4.5.1 Análise da resistência global da soldadura 154
4.5.2 Análise da variação do retorno elástico 157
4.6 Ensaio Jovignot circular 158
4.7 Conclusões e comentários 162
Índice
xiii
Capítulo 5 Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico 165
5.1 Enquadramento 165
5.2 Descrição do ensaio Demeri 168
5.3 Caracterização do procedimento experimental utilizado 169
5.4 Estudo do ensaio Demeri com chapas monolíticas 172
5.4.1 Simulações numéricas e discussão dos resultados 172
5.4.1.1 Chapa em aço macio DC06 173
5.4.1.2 Chapa em aço DP600 185
5.5 Estudo do ensaio Demeri com tailor-welded blanks 189
5.5.1 Obtenção das soldaduras 189
5.5.2 Caracterização metalográfica e mecânica das soldaduras 191
5.5.2.1 Análise das micrografias 191
5.5.2.2 Análise dos resultados das medições de dureza Vickers 192
5.5.2.3 Determinação das propriedades mecânicas 195
5.5.3 Simulações numéricas e discussão dos resultados 197
5.5.3.1 Tailor-welded blank composta por aço DC06 199
5.5.3.2 Tailor-welded blank composta por aço DP600 201
5.5.3.3 Tailor-welded blank composta por aço DC06 e DP600 203
5.6 Conclusões e comentários 205
Capítulo 6 Considerações finais 207
6.1 Conclusões 207
6.2 Perspectivas de trabalho futuro 212
Anexo A Nomenclatura 215
A.1 Notações algébricas 215
A.2 Operadores e funções 215
A.3 Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos 216
A.4 Remapeamento de variáveis 217
A.5 Modelos de comportamento e propriedades dos materiais 218
A.6 Siglas e abreviaturas 218
Anexo B Cálculo de derivadas de superfícies NURBS 221
B.1 Derivadas parciais de primeira e segunda ordem 221
Índice
xiv
Anexo C Ficheiros de entrada do programa DD3TRIM 223
C.1 Ficheiro ‘trim.dat’ 223
C.2 Ficheiro ‘nurb_name.igs’ 225
Anexo D Propriedades mecânicas dos materiais 227
D.1 Aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas – Tracção 227
D.2 Aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas – Flexão 227
Referências bibliográficas 229
PARTE I
Introdução
3
CAPÍTULO UM
Introdução
Neste capítulo faz-se o enquadramento global do trabalho, dando especial ênfase aos desafios industriais e tecnológicos actuais. Descrevem-se os objectivos estabelecidos para os trabalhos desenvolvidos no âmbito desta tese. Apresenta-se a estrutura e um breve resumo do conteúdo da dissertação de modo a facilitar a sua leitura e consulta.
1.1 Preâmbulo
A indústria transformadora, assim como a generalidade das actividades económicas, tem
enfrentado nos últimos anos pressões fortíssimas fruto, em muitos dos casos, da
consolidação do que é hoje habitual designar-se por “Mercado Global”. Estas pressões
fazem-se sentir de diversos modos, mas pode dizer-se que algumas das mais importantes
estão intimamente relacionadas, ou com flutuações do custo das matérias-primas e da
mão-de-obra ou, sobretudo, com a elevada volatilidade do custo da energia, em particular da
que é extraída a partir dos combustíveis fósseis. Para além destes factores, são também de
realçar a aplicação crescente de políticas ambientais restritivas, nomeadamente as baseadas
nas orientações extraídas do Protocolo de Quioto, o reforço da legislação relacionada com
normas de segurança, a saturação de mercados e, mais recentemente, o aparecimento de uma
nova geração de consumidores, bem informada e muito exigente.
De entre as diversas actividades industriais, a indústria automóvel continua a ocupar uma
posição de primeira linha à escala mundial, representando uma área económica de grande
importância e impacto. De facto, os números compilados no livro “Time for a Model Change.
Re-engineering the Global Automotive Industry” [Maxton e Wormald 2004] são elucidativos do
Parte I. Introdução
4
valor desta indústria. A informação recolhida pelos autores, à data da publicação do livro,
indica que anualmente a indústria automóvel é responsável por 11% do PIB1 e por um posto
de trabalho em cada nove, no conjunto dos países desenvolvidos; pelo consumo de 15% e
25% da produção mundial de aço e vidro, respectivamente; e pela utilização de cerca 40% da
produção mundial de petróleo como combustível usado na frota automóvel.
Apesar do elevado poderio económico e recursos deste sector industrial, em particular
dos maiores construtores mundiais, nas três últimas décadas tem-se assistido a uma
degradação constante do valor de determinadas marcas nos mercados financeiros
[Marchionne 2006]. Esta tendência é visível tanto nos construtores de menor dimensão, como
em alguns dos chamados “gigantes da indústria”, como são exemplos a General Motors
Corporation, a Ford Motor Company ou a Volkswagen AG. Actualmente, pode afirmar-se
que as dificuldades económicas são transversais a um elevado número de construtores,
exceptuando-se alguns casos em que a tendência é no sentido do aumento das vendas e da
criação de valor, como são exemplo a Toyota Motor Corporation, a Honda Motor
Corporation, a BMW AG e a Porsche AG. Apesar da maioria dos consumidores não ter a
percepção da difícil realidade que os construtores automóveis enfrentam, em alguns casos,
os efeitos dessa realidade já se fizeram (e continuarão a fazer-se) sentir da pior forma. Com
efeito, basta recordar as tomadas de decisão no sentido da redução do número de
trabalhadores, do encerramento de linhas de produção e, no pior cenário, das próprias
empresas, como sucedeu em 2005 com o construtor britânico MG-Rover.
A origem das dificuldades do sector automóvel é diversa e, em muitos casos, com
contornos bastante complexos tanto na elaboração do correcto diagnóstico, como na busca da
melhor solução para os problemas. No topo da lista de dificuldades encontra-se a estagnação
do crescimento por via do aumento sustentado das vendas, uma vez que os principais
mercados (Estados Unidos, Europa e Japão) estão próximos da saturação [Maxton e
Wormald 2004, Ellinghorst 2006]. Este facto, aliado à estratégia mais ou menos generalizada
de aquisições, fusões e alianças levada a cabo nos últimos anos pelos construtores conduziu,
conjuntamente com outros factores, à criação de uma elevada sobrecapacidade de produção.
Com efeito, números relativos ao ano 2000 mostram que a capacidade de produção instalada
a nível mundial era de 79.2 milhões de unidades, sendo que, no mesmo ano, as vendas não
superaram os 58.8 milhões de unidades [Bates et al. 2006]. Outro aspecto que tem
condicionado fortemente os construtores automóveis prende-se com a criação de cada vez
mais directivas que visam reduzir, de forma significativa, o consumo de combustível, a
1 A título de curiosidade, refira-se que os dados do Banco Mundial indicam que o valor do PIB (Produto Interno Bruto) mundial em 2005 foi de 44 384 871 milhões de dólares ($US). Actualmente, estima-se que o conjunto dos países desenvolvidos represente cerca de 54% do PIB mundial.
Capítulo 1. Introdução
5
emissão de gases contaminantes e o número de vítimas dos acidentes rodoviários. No caso
concreto do espaço da União Europa, observa-se que o automóvel é um dos produtos mais
regulamentados, existindo 48 directivas principais para o sector [Jeanneau e Pichant 2004].
Atendendo ao impacto do automóvel na contaminação do meio ambiente, um dos
vectores principais da legislação automóvel produzida pela Comissão Europeia tem-se
centrado na redução da emissão de CO2. Com este objectivo, foi acordado em 1998 com a
Associação Europeia de Construtores Automóveis (ACEA2), que a média de CO2 emitido
pelos carros matriculados a partir de 2008 no espaço europeu deverá ser inferior a 140 g/km
[Jeanneau e Pichant 2004]. Este valor representa uma redução de 25% face aos 186 g/km
estabelecidos para 1995. Porém, atendendo à procura crescente por carros de maiores
dimensões (e peso), como são exemplo os SUV3, ao aumento generalizado das dimensões dos
modelos em cada segmento4, aos reforços estruturais introduzidos para melhorar a
segurança passiva, ao aumento do número de equipamentos relacionados com a segurança
activa (como os sistemas ABS5 ou ESP6) e o incremento dos equipamentos de conforto, as
metas estabelecidas parecem, à data presente, difíceis de alcançar7. Em paralelo com estes
factores assiste-se actualmente à emergência de regiões (como a Ásia ou o Leste Europeu)
onde o crescimento económico é elevado e o custo de produção (sobretudo devido ao custo
da mão-de-obra) é substancialmente inferior ao existente nos países industrializados com
forte tradição no sector automóvel, como a Alemanha ou os Estados Unidos da América
(EUA). Esta situação coloca dificuldades não só aos construtores, que enfrentam a feroz
concorrência dos adversários que foram criados, ou que entretanto se instalaram, nessas
regiões de custos de produção inferiores, mas também aos próprios governos dos países que
se deparam com a possibilidade de perderem fábricas, com o correspondente prejuízo para a
sua economia interna, e de terem que suportar/solucionar, em termos sociais, o
despedimento de centenas ou milhares de trabalhadores.
2 ACEA – European Automobile Manufacturers Association 3 SUV – Sport Utility Vehicle. Designação anglo-saxónica atribuída a veículos todo-o-terreno de lazer. 4 A título de exemplo, refira-se que em 1974 uma das versões da primeira geração do Volkswagen Golf media 3.705 m e pesava 750 kg, enquanto que a versão actual correspondente (2004) mede 4.204 m e pesa 1160 kg [Wohlecker et al. 2006]. 5 ABS – Anti-Blocking System. Designação anglo-saxónica do sistema que evita o bloqueio das rodas durante a travagem. 6 ESP – Electronic Stability Control. Designação anglo-saxónica do sistema que permite controlar a deriva de trajectória do veículo provocada pela perda de aderência lateral. 7 Recentemente foram apresentados dados do T&E – European Federation for Transport and Environment que davam conta que apenas 3 das 20 marcas de automóveis que compõem a ACEA apresentam evoluções consistentes na redução da emissão de CO2 dos seus veículos, de modo a conseguirem cumprir a meta dos 140 g/km em 2008 [T&E 2006]. O estudo mostra também que 7 marcas reduziram as suas emisões menos de 50% face ao necessário para cumprir o objectivo dos 140 g/km.
Parte I. Introdução
6
A resolução prática do conjunto destes problemas/dificuldades não é, naturalmente,
simples de encontrar e implica a tomada de decisões articuladas em diferentes planos
(económico, financeiro, tecnológico, de marketing, etc.). Estas decisões podem, inclusive, nos
casos mais delicados, implicar a alteração do modelo de desenvolvimento global seguido
pelas empresas [Maxton e Wormald 2004].
No que respeita às dificuldades económicas e financeiras, nos últimos anos assistiu-se à
elaboração de sucessivos planos de reestruturação por parte, sobretudo, dos maiores
construtores, como a General Motors (GM), Ford, Volkswagen ou DaimlerChrysler. Nos
casos citados, as orientações base seguidas têm tido como denominador comum a redução de
custos. Em particular, adequando, agilizando e optimizando a produção de acordo com o
número e variedade de unidades capazes de serem absorvidas pelo mercado, evitando-se
assim os custos elevadíssimos provenientes da sobrecapacidade instalada (quer seja em
termos de stock de produção ou na manutenção de unidades industriais subaproveitadas).
Muitos construtores recorrem também à partilha de componentes ou, sobretudo, de
plataformas e grupos propulsores para um ou vários segmentos de mercado, o que permite
reduções consideráveis nos custos de desenvolvimento e de fabrico [Wells 2001].
Algumas das soluções tomadas pelos construtores, apesar de aparentemente
incontornáveis, têm sido de difícil aplicação pois implicam, entre outras, a cessação de
produção dos modelos com reduzida procura (cujo retorno de investimento ainda não foi,
eventualmente, conseguido); o encerramento de linhas de montagem; o fecho de complexos
industriais; e, de forma transversal, a redução do número de trabalhadores. No caso dos
gigantes norte-americanos, GM e Ford, os números veiculados pela imprensa impressionam
tanto em termos dos prejuízos anuais8, como nas medidas que se pretendem ver
implementadas para estancar as perdas, nomeadamente, a dispensa de dezenas de milhares
de trabalhadores e o encerramento de quase uma dezena de fábricas à escala mundial, em
cada um dos casos. Outra das estratégias mais usadas para conter os custos de produção, e
assim manter as margens de operação, consiste em deslocalizar a produção, com a qual as
linhas de montagem, ou mesmo complexos industriais completos, são transferidos para
regiões onde os custos de produção são mais reduzidos e/ou que traduzam mais vantagens
em termos de localização estratégica. De facto, a produção de automóveis, mais
concretamente os de gamas inferiores, é hoje tida como economicamente pouco viável se
estiver localizada em países onde o custo de produção seja elevado. No caso dos modelos de
gama alta, para além do custo de produção ser mais facilmente absorvido, devido às
margens de lucro serem superiores, algumas marcas utilizam argumentos de marketing como
8 A título de exemplo, em 2005 os prejuízos da GM ascenderam a 10.6 mil milhões de dólares ($US).
Capítulo 1. Introdução
7
a designação de origem, por exemplo “Made in Germany” ou “Made in Italy”, para
valorizarem os seus produtos.
No campo das dificuldades impostas pela legislação, a vertente da inovação tecnológica
tem tido um papel de enorme relevo, tentando conciliar, com sucesso, aspectos que são à
primeira vista antagónicos, como a redução das emissões de gases poluentes e do consumo
de combustível, o incremento dos níveis de segurança (passiva e activa) e a redução, ou pelo
menos contenção do aumento, do peso dos veículos. Para além destes aspectos ditos
regulamentados, a cada lançamento de um novo modelo os consumidores aguardam com
grande expectativa que o número de equipamentos de conforto e de entretenimento
oferecidos seja alargado; que o espaço e requinte dos habitáculos seja incrementado; que o
desempenho dinâmico seja melhorado; que os níveis de qualidade/fiabilidade sejam
melhorados; e, finalmente, que o preço de venda final seja mantido ou apenas
marginalmente aumentado.
Não se pode afirmar que os desenvolvimentos tecnológicos conseguidos nos últimos anos
se tenham centrado mais numa ou noutra área do automóvel, pois todas elas evoluíram de
forma muito acentuada. Aliás, essa tem sido uma característica notável e intrínseca desta
indústria, apesar de um automóvel moderno incorporar um número elevadíssimo de
componentes e sistemas complexos, em que para a sua concepção e produção é exigido o
domínio de áreas científicas tão distintas como a combustão, a mecânica estrutural, a
electrónica, a aerodinâmica, as tecnologias de fabrico, a logística, a robótica, entre muitas
outras [Stensson et al. 1999]. Contudo, é reconhecido que a redução da emissão dos gases
poluentes e dos consumos foram conseguidos, sobretudo, à custa da melhoria da eficiência
dos propulsores, nomeadamente pelo desenvolvimento de eficientes sistemas de injecção de
combustível (gasolina ou diesel), pela introdução de catalizadores e filtros de partículas (no
caso dos motores de combustão de Ciclo Diesel) e, também, pelos ganhos conseguidos na
redução da resistência aerodinâmica. O incremento dos níveis de segurança dos veículos,
visível pelos resultados arbitrados de forma independente pelo consórcio Euro NCAP9
(Figura 1.1), tem sido alcançado muito por via da aplicação massiva de novos materiais, mais
resistentes, nos elementos que formam a estrutura base10 dos automóveis. De entre esses
materiais, são de realçar os que pertencem às novas gerações de aços de alta e muito alta
9 Euro NCAP – European New Car Assessment Programme. Consórcio independente da indústria automóvel, formado pelos governos de 5 países europeus, pela Comissão Europeia, por clubes automóveis e associações de automobilistas europeus. 10 Na terminologia anglo-saxónica esta estrutura é geralmente designada por Body-in-White e compreende apenas o chassis e a carroçaria incluindo as portas.
Parte I. Introdução
8
resistência11, que são caracterizados por possuírem tensões limite de elasticidade muito
elevadas e excelente capacidade para absorver energia.
Para além do incremento dos níveis de segurança passiva (e também activa, pelo aumento
muito considerável da rigidez das estruturas), estes novos materiais permitiram igualmente
conter o incremento de peso dos automóveis, apesar do aumento generalizado das
dimensões dos automóveis dentro de cada segmento. De facto, os elevados níveis de
resistência destes materiais permitem aos projectistas reduzir as espessuras dos componentes
(a grande maioria obtidos por estampagem), conseguindo-se, mesmo assim, um aumento
significativo dos níveis de segurança dos novos veículos.
Figura 1.1 – Ensaio de colisão frontal assimétrica de um automóvel, a uma velocidade de 64 Km/h, contra uma barreira deformável. Modelo ilustrado12 – Renault Laguna II de 200113.
Nas últimas décadas tem-se assistido a uma forte redução dos custos e do tempo de
desenvolvimento dos automóveis, relacionada com a utilização crescente de ferramentas
numéricas de auxílio ao desenho e ao projecto propriamente dito. Com efeito, desde que
foram introduzidas de forma generalizada na indústria ferramentas numéricas de CAD14
11 Na terminologia anglo-saxónica estes aços são geralmente designados por High Strength Steels e Ultra High Strength Steels. 12 Imagem reproduzida com a autorização do consórcio Euro NCAP. 13 Primeiro automóvel a conseguir obter a classificação máxima de “cinco estrelas” nos testes de colisão arbitrados pelo Euro NCAP. 14 CAD – Computer Aided Design. Na língua portuguesa é usada frequentemente a tradução “Desenho Assistido por Computador”.
Capítulo 1. Introdução
9
(nas décadas de 60 e 70) e, de forma mais significativa, de CAE15 (nas décadas de 80 e 90), os
ganhos conseguidos em termos da redução do tempo de desenvolvimento e dos custos
associados a um novo modelo foram extraordinários. Se com as metodologias ditas
“tradicionais” de desenvolvimento, um automóvel demorava antes da década de 90, em
média, entre 5 a 10 anos a ser projectado, com a introdução massiva das ferramentas
numéricas, sobretudo com aquelas baseadas na teoria dos elementos finitos (FEM16), o tempo
de projecto foi substancialmente reduzido. A título de exemplo, refira-se que bastaram 4
anos para introduzir o SUV Mercedes-Benz Classe M W163 (1998) no mercado, sendo que
passados apenas 2 anos do arranque do projecto já haviam sido construídos os primeiros
protótipos para testes [Haasen 1999]. Actualmente é comum um projecto automóvel
completo (incluindo o projecto das ferramentas necessárias à sua produção) demorar em
média 3 anos a ser concluído. Em alguns casos este tempo pode ser até inferior a 2 anos,
como está previsto para o substituto do actual Fiat Stilo (2001), cujo desenvolvimento foi
totalmente subcontratado à empresa austríaca Magna Steyr com um prazo de execução de 20
meses [AMS 2005]. Esta redução do tempo de desenvolvimento de um novo produto
possibilitou, de forma menos arriscada em termos de investimento, a proliferação de novos
modelos e, inclusive, de novos segmentos, que em muitos casos constituem o que hoje se
designa por “nichos de mercado”. Com efeito, durante as duas últimas décadas assistiu-se,
particularmente no mercado europeu, ao aumento muito considerável das gamas de
produtos de cada fabricante, de modo a melhor cativar e satisfazer os consumidores com
novas propostas, mais personalizadas, nomeadamente as mais voltadas para as actividades
de lazer. Com este conceito, e de modo a sobreviver em mercados que tendem para a
saturação, o principal objectivo deixou, em parte, de ser “vender milhões de unidades por
modelo, em gamas estreitas”, para se centrar em “vender centenas de milhares de unidades
por modelo, em gamas muito diversificadas”. Tendo em conta esta nova abordagem do
mercado, o papel desempenhado pelas ferramentas de CAD e CAE tem sido fundamental
com vista à redução de custos associados ao projecto de automóveis, nomeadamente no
desenvolvimento das ferramentas necessárias à produção dos componentes estampados.
1.2 Enquadramento
Os componentes obtidos através da conformação plástica de chapas têm uma importância
muito elevada tanto no projecto, como na produção de um automóvel. A comprová-lo está o
15 CAE – Computer Aided Engineering. Na língua portuguesa é usada frequentemente a tradução “Engenharia Assistida por Computador”. 16 FEM – Finite Element Method – Método dos Elementos Finitos.
Parte I. Introdução
10
facto de, em termos médios, serem necessários entre 250 a 350 painéis estampados para
construir o chassis e a carroçaria de um automóvel [Wells 2001]. Desse número, cerca de 50
painéis são de grande dimensão e, em média, comportam o uso de cinco ferramentas no seu
fabrico, sendo o custo estimado para cada uma destas ferramentas de 230 000 € [Col 2002].
Para além da aplicação automóvel, o processo tecnológico de estampagem de chapas
constitui um dos principais processos de fabrico em diversas indústrias, como a aeroespacial,
a de electrodomésticos, a de embalagens, a de elementos domésticos e de decoração, entre
outras.
De um modo sucinto, o processo tecnológico de estampagem consiste em conferir por
deformação plástica, a uma chapa plana, uma determinada forma final que traduza a peça
ou componente que se pretenda produzir. Normalmente é utilizado um conjunto de três
ferramentas – punção, matriz e cerra-chapas – que permitem a execução da operação (ver
Figura 1.2). O processo pode ser descrito, na maioria dos casos, do seguinte modo.
Inicialmente, a chapa ou esboço é posicionada entre uma matriz e um cerra-chapas, ao que se
segue o aperto da chapa pela imposição de uma força no cerra-chapas no sentido da matriz.
Após essa fase, o punção é deslocado no sentido da matriz, sendo transferida
simultaneamente a geometria específica do punção e da matriz para a chapa. Durante a
operação o cerra-chapas tem a função dupla de prevenir o enrugamento da chapa e controlar
o fluxo de material (chapa) para a cavidade da matriz.
Figura 1.2 – Representação esquemática da disposição das ferramentas usadas no processo de estampagem.
As principais vantagens deste processo tecnológico, que o tornam industrialmente
atraente e muito competitivo são, entre outras: a elevada cadência de produção, podendo ser
atingidos valores na ordem de 20 a 30 mil peças/hora em peças de pequena dimensão, e 500
peças/hora em componentes de grandes dimensões; ser um processo de conformação na
forma final na maioria dos casos, isto é, não são necessárias fases posteriores de fabrico; e
Matriz
Cerra-chapas
Chapa ou esboço
Punção
Capítulo 1. Introdução
11
induzir baixos custos nas peças, uma vez que é geralmente aplicado na produção de grandes
séries. No lado dos problemas/dificuldades associadas ao processo, podem ser referidos: o
elevado tempo e capital despendidos no desenvolvimento das ferramentas; a sensibilidade
do processo aos defeitos superficiais, podendo estes ser tolerados consoante a exigência do
projecto; a elevada sensibilidade à recuperação elástica (ou retorno elástico) do material após
a remoção das ferramentas, a qual pode originar empenos ou variações dimensionais
acentuadas; e o desperdício de material não aproveitado na zona das abas.
Uma vez que os custos associados à estampagem de componentes metálicos representam
uma percentagem considerável no custo total de projecto e produção de um automóvel, esta
área tem sido alvo de um elevado esforço de desenvolvimento durante os últimos anos. Com
efeito, conseguiu reduzir-se de forma significativa o dispendioso e longo processo de
desenvolvimento de ferramentas para estampagem, recorrendo-se de modo intensivo aos
programas de simulação baseados no método dos elementos finitos. Se em 1990 a análise
completa por simulação numérica de um dado componente automóvel (produção de malha,
preparação da simulação, cálculo e visualização de resultados) demorava cerca de 50 dias,
em 1994 esse tempo viu-se reduzido para 15 dias. Em 2002 era já possível desenvolver todo o
estudo numérico em menos de uma semana, incluindo a simulação da etapa de retorno
elástico e a geração da geometria das ferramentas [El Khaldi et al. 2002].
Os progressos conseguidos na última década na optimização dos programas de simulação
do processo de estampagem foram apreciáveis, nomeadamente com o aumento da
fiabilidade dos resultados. Num trabalho sobre o estado da arte da aplicação da simulação
numérica do processo de estampagem na indústria automóvel, Haepp e Rohleder 2005
sintetizam os aspectos/variáveis que são actualmente passíveis de serem previstos com um
nível de rigor “elevado”, “médio” ou “insuficiente”. De entre dos aspectos que podem ser
previstos com elevado rigor, os autores referem a redução de espessura e ruptura da chapa; o
aparecimento de rugas; a distribuição da deformação; e a forma como se processa o fluxo de
material. Com um nível de rigor médio, encontram-se aspectos como a definição do
deslocamento/contorno das abas do componente no final da conformação17; a optimização da
geometria inicial do esboço a conformar; a distribuição das tensões; a quantificação do
retorno elástico; e das forças envolvidas na embutidura. A previsão de defeitos superficiais e
o aparecimento de rugas em situações em que a chapa está sujeita a forças de contacto, são
ainda considerados difíceis de obter.
Paralelamente, a simulação completa do processo de fabrico de componentes de
automóveis tem vindo a permitir o estudo detalhado do comportamento dos conformados
17 Na terminologia anglo-saxónica utiliza-se a designação de Draw-in.
Parte I. Introdução
12
em serviço, depois de montados na carroçaria. Com efeito, no passado, a simulação numérica
da conformação de componentes e a análise global da estrutura do automóvel,
nomeadamente ao nível dos ensaios de colisão18, eram tidas como duas áreas independentes
de engenharia. Contudo, é sabido que durante a fase de conformação certos materiais
encruam de forma significativa e que algumas zonas dos componentes sofrem uma redução
de espessura considerável. Assim sendo, podem existir diferenças relevantes nos resultados
obtidos da simulação numérica do ensaio de colisão de um componente, caso sejam, ou não,
incluídos os resultados da simulação da fase de fabrico (por exemplo, do nível de tensões e
deformações, espessura, etc.). No trabalho de Simunovic et al. 2001 é realizado um estudo
para avaliar a influência da inclusão dos resultados numéricos, relativos ao histórico da
deformação do material proveniente do fabrico do componente, na simulação do ensaio de
crashtest19 desse mesmo componente. Embora salvaguardem as incertezas associadas ao
efeito da geometria do componente e do mapeamento da informação entre malhas de
elementos finitos (que podem ter discretizações muito diferentes), os autores salientam que,
em geral, a inclusão do historial da conformação do material na simulação do crashtest pode
ter uma influência moderada na previsão do comportamento de um componente durante o
ensaio. No caso de materiais muito sensíveis ao encruamento é recomendado que se incluam
sempre os resultados numéricos da fase de conformação em etapas posteriores de projecto.
No caso concreto da utilização de novos materiais, como as novas gerações de aços de
elevada resistência e multi-fase, El Khaldi et al. 2002 referem que se deve incluir a informação
sobre o histórico da conformação do material nas simulações de etapas posteriores, uma vez
que a melhoria dos resultados das simulações numéricas de ensaios de impacto/colisão pode
ser considerável.
1.2.1 Simulação numérica do processo de estampagem multi-etapas
Apesar dos melhoramentos importantes que urgem ser introduzidos nos códigos de
simulação do processo de estampagem (etapas de conformação e sobretudo a de retorno
elástico), os desafios nesta área científica continuam a passar por se conseguir simular, com
rigor, a totalidade do processo produtivo de componentes em chapa. De facto, para além da
etapa de estampagem propriamente dita, os programas numéricos devem estar preparados
para, de forma integrada, simular todas as etapas subsequentes incluindo, claro está, as
etapas intermédias onde normalmente são efectuadas operações de corte, de dobragem,
quinagem, entre outras. Na Figura 1.3 mostra-se a evolução típica da simulação multi-etapas
18 Na terminologia anglo-saxónica é frequentemente utilizado o termo crashworthiness para designar a avaliação do desempenho de um componente ou estrutura ao impacto ou colisão. 19 Termo anglo-saxónico que designa um ensaio de impacto ou colisão.
Capítulo 1. Introdução
13
de um painel automóvel em ambiente industrial, desde a fase de pré-processamento
(Figura 1.3.a, Figura 1.3.b e Figura 1.3.c), passando pelo posicionamento da chapa nas
ferramentas (Figura 1.3.d) e aperto do cerra-chapas (Figura 1.3.e), pela etapa de conformação
propriamente dita (Figura 1.3.f), até à fase final de conformação da flange da chapa
(Figura 1.3.h e Figura 1.3.i). Na análise da figura, realça-se o facto de entre cada operação de
conformação dever ser simulada a etapa de retorno elástico, nomeadamente entre as etapas
de conformação e de corte (Figura 1.3.f e Figura 1.3.g), de corte e quinagem da flange
(Figura 1.3.g e Figura 1.3.h) de quinagem e de dobragem (Figura 1.3.h e Figura 1.3.i) e,
finalmente, após a etapa de dobragem (Figura 1.3.i).
Figura 1.3 – Sequência das etapas envolvidas na simulação de um painel automóvel: a) Geometria CAD do painel; b) Geração das malhas das ferramentas e da chapa; c) Modelo final das ferramentas e chapa; d) Efeito da gravidade; e) Etapa de aperto do cerra-chapas; f) Etapa de conformação; g) Etapa
de corte; h) Etapa de quinagem; i) Etapa de dobragem.
d) e) f)
g) h) i)
a) b) c)
Parte I. Introdução
14
O processo de estampagem multi-etapas de chapas, para além de solucionar o fabrico de
peças de elevada complexidade geométrica, é muitas vezes aplicado de modo a evitar a
estricção prematura ou o aparecimento de rugas em peças cuja relação de embutidura seja
muito elevada. De facto, podem ser encontradas na literatura referências a trabalhos cujo
objectivo consiste em conformar peças de elevada relação de embutidura, através de várias
operações de estampagem consecutivas [Min et al. 1995, Esche et al. 1996, Kim et al. 2001,
Tisza et al. 2005]. Um modo relativamente simples de aumentar a relação de embutidura em
conformados axissimétricos consiste em dividir a operação de conformação em duas etapas
consecutivas com sentidos inversos para o deslocamento do punção [Thuillier et al. 2002].
No âmbito da concepção de produtos com geometrias complexas, através da simulação
numérica de sequências de operações de conformação, salienta-se o trabalho de El
Mouatassim et al. 1994. Estes autores utilizaram um programa comercial, do tipo
dinâmico-explícito (PAM-STAMP™) para projectar uma caixa de farol. Também com o
objectivo de testar a validade e o desempenho de programas de simulação, Wisselink e
Huétink 2004 utilizaram dois programas, um comercial (ABAQUS/Standard™) e um
académico (DiekA), para estudar a concepção de um suporte metálico que comporta as
operações de dobragem, estampagem, quinagem e de corte para a abertura de orifícios. No
trabalho de Zimniak 2000 utiliza-se o programa de elementos finitos MARC para optimizar a
geometria de um produto fabricado através de quatro operações de estampagem.
Nas publicações sobre simulação de operações multi-etapas de estampagem é
recorrentemente citado o cuidado de que se reveste o tratamento das operações intermédias,
como por exemplo, as operações de corte e as fases de reequilíbrio (retorno elástico). Estes
dois assuntos foram estudados por Kawka et al. 1998 através da simulação da produção de
uma jante de automóvel utilizando um programa académico com um algoritmo do tipo
estático-explícito (ITAS3D). Nesse estudo são evidenciadas as dificuldades que podem
ocorrer na simulação do retorno elástico com um programa estático-explícito, devido à
tendência que este tipo de algoritmos apresentam de fazer divergir o processo iterativo da
solução de equilíbrio. São também realçadas as diferenças de comportamento entre os
elementos finitos sólidos e cascas, tendo sido observado uma sobrestimação bastante
acentuada da previsão do retorno elástico com os elementos do tipo casca.
Atendendo à complexidade inerente à simulação de operações multi-etapas do processo
de produção de componentes estampados, pode dizer-se que a simulação total deste
processo em ambiente académico está confinada a um número muito restrito de grupos de
investigação. Com efeito, nos últimos anos tem-se assistido a uma redução acentuada do
número de programas de simulação dedicados a este processo tecnológico. Se a redução do
número de programas comerciais pode ser justificada pelas pressões relacionadas com a
Capítulo 1. Introdução
15
globalização económica (aquisições e fusões empresariais), no que se refere aos programas
desenvolvidos em ambiente académico, a justificação para a diminuição do seu número
deverá estar relacionada com o aumento da complexidade do processo e do número das
operações a simular. Assim, é necessário assegurar a formação/manutenção de equipas de
investigação com um número razoável de elementos, o que nem sempre é possível. Talvez
devido a esta escassez de grupos de trabalho académicos que trabalham na simulação de
operações multi-etapas da fabricação de componentes em chapa, não existem muitas
referências bibliográficas sobre esta temática.
- Algoritmos e estratégias numéricas
A simulação numérica do processo de estampagem de chapas metálicas é um problema
complexo pois inclui não-linearidades associadas ao modelo material e às condições de
contacto com atrito. Deste modo, os algoritmos e estratégias numéricas utilizados para a sua
resolução devem ser bastante robustos. Os primeiros trabalhos sobre a simulação numérica
bidimensional do processo de estampagem foram realizados no final da década de 60 com
base no método das diferenças finitas. No entanto, só no final da década seguinte, com o
desenvolvimento e generalização do método dos elementos finitos, é que se assistiu à
expansão da simulação numérica dos processos de conformação de chapa [Alves 2003]. No
que respeita às simulações numéricas de casos tridimensionais, as suas primeiras aplicações
remontam ao início da década 80.
A simulação do processo de estampagem de chapas baseada no método dos elementos
finitos aborda um campo alargado de metodologias numéricas, nomeadamente, a
discretização espacial do corpo deformável (tipo de elemento finito); a formulação mecânica
das equações de movimento; o esquema de integração temporal; o tratamento do contacto
com atrito; a resolução de sistemas de equações, etc. Na discretização espacial são usados
elementos do tipo sólido (tridimensionais) ou, mais comummente, do tipo casca ou
membrana (bidimensionais). Atendendo a que num processo típico de estampagem a
ferramenta pode deslocar-se a uma velocidade de 1 m/s, o processo de deformação pode
decorrer num período de tempo de um décimo de segundo, pelo que, o processo de
estampagem tanto pode ser identificado como um processo quasi-estático, como dinâmico.
Na formulação quasi-estática desprezam-se os termos de inércia. Por oposição, a formulação
diz-se dinâmica se for considerado o trabalho das forças de inércia. A estas duas formulações
são geralmente associadas a integração temporal implícita ou explícita das equações
características do problema. A integração temporal diz-se implícita ou explícita, se for
realizada na configuração final ou inicial, respectivamente, associada a um dado incremento
de tempo do processo. A combinação das formulações quasi-estática e dinâmica com as
Parte I. Introdução
16
integrações implícita ou explícita pode ser realizada sem restrições. Porém, nos últimos anos
têm sobressaído os programas dinâmicos-explícitos, nomeadamente os códigos
PAM-STAMP 2G™, LS-DYNA™, ABAQUS/Explicit™ e os programas estáticos-implícitos, dos
quais os códigos comerciais ABAQUS/Standard™ e AUTOFORM™, e os programas
académicos DiekA e DD3IMP, representam alguns exemplos.
A génese do programa DD3IMP20 remonta ao final dos anos 80 com o trabalho que então
se iniciou, no Grupo de Tecnologia do Departamento de Engenharia Mecânica da
Universidade de Coimbra, na área da modelação e simulação numérica de processos de
conformação por deformação plástica, em parceria com outros grupos de investigação
estrangeiros. Ao longo de quase duas décadas o programa tem sido continuadamente
desenvolvido, destacando-se o trabalho de Menezes 1995 que permitiu disponibilizar a
primeira versão completamente funcional do programa em 1993. Mais tarde, o programa foi
substancialmente melhorado, nomeadamente com as contribuições de Menezes e Teodosiu
2000, Alves 2003 e Oliveira 2005, em termos da optimização e desenvolvimento das
estratégias numéricas aplicadas, na inclusão de novas leis de comportamento dos materiais e
no aperfeiçoamento da complexa descrição do contacto com atrito entre as ferramentas e a
chapa.
O programa DD3IMP baseia-se numa formulação do tipo langrangeana reactualizada, de
modo a melhor lidar com as condições de fronteira evolutivas impostas pelo contacto com
atrito. Para lidar com as condições de contacto unilateral e com a lei de atrito de Coulomb
recorre-se ao método do langrangeano aumentado. O algoritmo implícito do programa é do
tipo Newton-Rapson e recorre a um único ciclo iterativo para resolver as não-linearidades
resultantes do comportamento elastoplástico do material e do contacto com atrito. Uma vez
que o método iterativo de Newton-Raphson necessita de uma solução inicial, esta é obtida
com um algoritmo explícito, sendo posteriormente corrigida através de um processo
iterativo que é repetido até que a norma das forças não equilibradas seja inferior a um limite
prescrito. Na modelação das ferramentas, estas são consideradas como rígidas e descritas
através de superfícies paramétricas do tipo Bézier. A biblioteca de elementos finitos do
programa contém três tipos de elementos finitos sólidos – hexaedros, pentaedros e
tetraedros – combinados com diferentes algoritmos de integração espacial [Menezes 1995,
Alves 2003]. Assim, com os elementos finitos sólidos é possível o tratamento do contacto
simultâneo nas duas faces, representativas do domínio plano da chapa, sem ser necessário
recorrer a artifícios numéricos. Também a evolução dos gradientes de tensão ao longo da
espessura e o aparecimento da estricção são facilmente previstos.
20 DD3IMP – Contracção de Deep-Drawing 3D IMPlict finite element code.
Capítulo 1. Introdução
17
Para além do programa DD3IMP, foram desenvolvidos outros programas que actuam de
forma integrada ou como seus periféricos. Desses programas, que constituem juntamente
com o DD3IMP a família DD3, destacam-se o código DD3OSS21 [Alves 2003, Oliveira et al.
2003] que permite simular a fase de recuperação elástica num só incremento, o código
DD3MAT22 [Alves 2003, Alves et al. 2004, Chaparro et al. 2006a] desenvolvido com o objectivo
de determinar e/ou optimizar os parâmetros dos diferentes modelos constitutivos
implementados no programa DD3IMP, e o programa DD3LT23 [Menezes et al. 2004] que
constitui uma versão simplificada do programa DD3IMP com vista ao ensino dos métodos
de projecto e produção virtual de componentes estampados.
1.2.2 Estampagem de chapas soldadas
Na produção automóvel dita convencional a montagem da carroçaria processa-se através da
união de vários componentes que foram previamente estampados. A ligação entre
componentes é feita ou utilizando a soldadura por pontos ou, cada vez mais, a soldadura
laser24. Se for pretendido produzir um determinado componente composto (ou reforçado)
por chapas de características diferentes, de modo a suportar solicitações distintas de forma
optimizada, é necessário primeiro conformar individualmente cada um dos componentes e,
só depois, uni-los através de um processo de soldadura (Figura 1.4.a). Alternativamente, a
produção dos painéis compostos pode ser feita a partir de esboços constituídos por chapas
de diferentes espessuras, materiais ou revestimentos, que são soldadas antes da operação de
conformação (Figura 1.4.b). A este tipo de esboços é atribuído a designação anglo-saxónica
de Tailor Welded Blanks25 (TWBs), Tailored Blanks ou, no caso particular de chapas unidas
recorrendo à soldadura laser, Laser Welded Blanks. Com este tipo de metodologia consegue-se
a redução imediata do peso do componente, relativamente à solução de empregar apenas um
só material e uma só espessura, uma vez que só se emprega a massa (e implicitamente as
propriedades mecânicas) estritamente necessária em cada zona do painel a estampar. Na
Figura 1.5 mostra-se um exemplo de um painel lateral de um SUV produzido com uma TWB
composta com chapas de diferentes espessuras.
De um modo genérico, as TWBs podem ser classificadas de acordo com a geometria da
linha de união (cordão de soldadura) das chapas, assim como pelo posicionamento das
21 DD3OSS – Contracção de Deep Drawing 3D One Step Springback. 22 DD3MAT – Contracção de Deep Drawing 3D MATerials parameters identification. 23 DD3LT – Contracção de Deep Drawing 3D Learning and Teaching. 24 LASER – Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation. 25 Doravante será usado, por inexistência de tradução adequada na língua portuguesa, o termo Tailor Welded Blanks (TWBs).
Parte I. Introdução
18
chapas que as compõem. As geometrias de união mais comuns são as de cordões rectilíneos
(Figura 1.6.a e Figura 1.6.b). As geometrias de união não-rectilíneas (Figura 1.6.c) são menos
usadas e, tipicamente, são processadas através da soldadura laser Nd:YAG26, na qual o feixe
de luz é transportado por fibra óptica. Um tipo de TWBs mais específico, designado por
patchwork, é usado quando se pretende produzir componentes estampados que necessitem
de reforços localizados, sobrepondo-se a chapa de reforço na chapa base a conformar
(Figura 1.6.d). A união das chapas, neste caso, é feita com a utilização de adesivos ou através
do processo de soldadura por resistência por pontos [Petitjean et al. 2001].
Figura 1.4 – Comparação esquemática do processo de fabrico de componentes compostos por chapas com características diferentes: a) Método de fabrico convencional; b) Método de fabrico aplicando
tailor-welded blanks.
Os benefícios que advêm da utilização generalizada dos TWBs na indústria automóvel
devem ser divididos em duas classes: os benefícios associados ao desempenho e os benefícios
associados aos custos. No que respeita ao desempenho geral do automóvel, a aplicação de
TWBs pode conduzir a uma melhoria global de vários factores, que se interligam nos
diversos requisitos ou características que são actualmente exigidos num projecto automóvel.
De forma resumida, as principais melhorias de desempenho são:
26 Equipamento laser com cristal sólido sintético de Neodymium: Yttrium-Aluminum-Garnet.
Soldadura Estampagem
b)
Estampagem
Estampagem
Soldadura
a)
Capítulo 1. Introdução
19
A redução do peso (redução no consumo de combustível e nas emissões de gases
poluentes);
O aumento de resistência e rigidez global das estruturas dos automóveis
(incremento na segurança passiva e activa); e
A melhor precisão dimensional e integridade estrutural nas montagens/uniões
(menores níveis de vibração e ruído, melhor resistência à corrosão).
Figura 1.5 – Exemplo de um painel lateral produzido a partir de tailor-welded blanks. Modelo ilustrado27 – Jeep Grand Cherokee WJ (1998).
A possibilidade de se poder seleccionar com precisão as propriedades mecânicas (tipo de
material) e quantidade de material (espessura) a aplicar em cada zona do componente, em
função das necessidades das solicitações locais (mecânicas ou químicas), permite a redução
de massa, ao mesmo tempo que se mantêm, ou melhoram, as características mecânicas do
componente. Outros dois aspectos a ter em conta são a vantagem acrescida no campo da
segurança, uma vez que as áreas de menor solicitação irão constituir zonas preferenciais de
deformação (absorção de energia) e o facto de se poder prescindir, nalguns casos, de reforços
adicionais nos componentes, com o correspondente ganho em custo e massa [Mesquita et al.
1999, Gaied et al. 2006]. No que diz respeito aos benefícios de custos, entre outros, devem ser
evidenciados:
27 Imagem reproduzida com a autorização do consórcio Auto/Steel Partnership.
Parte I. Introdução
20
A redução no número de peças (redução dos custos associados à produção de
ferramentas, de montagem, ao desperdício de material e de logística);
Redução do número das etapas de produção e economia de custos na união de
componentes (esta economia é tanto maior, quanto mais elevado for o número de
chapas diferentes a unir para obter a TWB); e
O uso selectivo e preciso, em termos de massa e resistência mecânica, do material
empregue em cada parte do painel permite a utilização materiais com custos
mais elevados, sem comprometer o preço final do componente.
Figura 1.6 – Tipos de geometrias de união de chapas mais comuns para produzir tailor-welded blanks: a) União com cordão rectilíneo simples b) Uniões com cordões rectilíneos segmentados; c) Uniões com
cordões não-rectilíneos; d) TWB com chapas sobrepostas – Patchwork.
No estudo conduzido por Trogolo e Dieffenbach 1998 é feita uma análise comparativa, de
custos e de massa, da produção do painel interior de uma porta de um automóvel
recorrendo a TWBs ou pelo processo convencional. Da análise concluiu-se que o painel
produzido com TWBs é 17.8 % mais barato ($US 12.14 face a $US 14.77) e 9.6% mais leve
(4.7 kg face a 5.2kg).
A conformação de TWBs pode ser realizada, de um modo geral, sem alterações
significativas relativamente ao processo de conformação de chapas monolíticas [Ullrich e
Groche 2002]. Contudo, a existência de uma união soldada acrescenta dificuldades, por
exemplo, ao nível do desgaste das ferramentas de estampagem devido à sobre-espessura da
soldadura, à diferença de espessura dos materiais, ou mesmo por via da movimentação do
cordão durante a conformação. A movimentação do cordão de soldadura, devido à diferença
de resistência entre as chapas que compõem a TWB, deve ser tida em consideração aquando
do projecto de ferramentas, de modo a prever-se a posição final do cordão no componente.
Muito embora o conceito de produção de TWBs tenha surgido há mais de 30 anos,
existem dificuldades de vários tipos que têm impedido a sua difusão mais generalizada na
indústria automóvel. De entre as dificuldades tecnológicas, são usualmente apontadas:
a) b) c) d)
Capítulo 1. Introdução
21
A menor conformabilidade28 do esboço, devido à redução de ductilidade na Zona
Afectada pelo Calor (ZAC) da soldadura, relativamente às chapas monolíticas;
A dificuldade em soldar ligas de alumínio, devido aos problemas associados à
fissuração a quente, porosidade e reflectividade, e aços de elevada resistência que
tendem a criar ZAC de menor resistência face ao material de base;
A necessidade em garantir uma elevada precisão no alinhamento dos flancos a
unir, quando as chapas são unidas recorrendo à soldadura laser, especialmente
com os laser de CO2; e
O acabamento superficial sofrível dos painéis devido à presença do cordão de
soldadura.
Para além das dificuldades tecnológicas enumeradas, o crescimento da aplicação de TWBs
nas estruturas automóveis tem sido de alguma forma retraído pelos elevados custos de
investimento que este tipo de conceito acarreta, nomeadamente ao nível do custo dos
equipamentos de corte/soldadura laser para obter os esboços. Para além disso, por vezes é
difícil estimar, com rigor, a totalidade dos benefícios indirectos que resultam da aplicação de
TWBs [Baron 1997]. Por exemplo, podem ser citados a optimização funcional dos produtos, a
redução do desperdício de material e o valor acrescido para o consumidor em termos de
desempenho global do automóvel. Em termos absolutos é sabido, à partida, que o processo
envolve investimentos avultados, o que o torna, portanto, praticamente inviável para
produções em pequena escala. Com o objectivo de solucionar a contrariedade dos
investimentos avultados necessários à produção de TWBs, a industria automóvel Norte
Americana organizou-se de modo a que estes esboços se tornem um vulgar componente,
fabricado por fornecedores externos que adquirem o material às empresas siderúrgicas e
processam as TWBs [Belforte 2002]. Já na Europa o fornecimento das TWBs é correntemente
assegurado por empresas subsidiárias de grandes grupos siderúrgicos, como por exemplo a
ThyssenKrupp Tailored Blanks GmbH relativamente à ThyssenKrupp AG.
A primeira tentativa de produzir um painel conformado a partir de TWBs foi realizada em
1967 pela Honda [Mesquita et al. 1999, Rooks 2001], tendo sido na altura registada a patente
do conceito de produção [Mesquita et al. 1999]. A aplicação em causa consistia na
conformação de um TWB com cinco chapas e envolvendo três materiais diferentes, para
28 Na terminologia anglo-saxónica é normalmente usada a palavra formability. Na língua portuguesa são por vezes utilizados os sinónimos “enformabilidade” ou “formabilidade”.
Parte I. Introdução
22
obter um painel lateral de um automóvel. O processo de soldadura usado foi o TIG29. Além
da elevada complexidade inerente à produção de um painel composto por cinco chapas, a
dificuldade principal encontrada, que acabaria por levar ao fracasso do projecto, consistiu na
elevada distorção do TWB imposta pelo processo de soldadura TIG, durante a união das
chapas. Mais tarde, em virtude das preocupações e movimentos pró-ambientalistas
subsequentes aos dois choques petrolíferos (1973 e 1979), o conceito de produção de painéis
TWB foi de novo abordado pelos construtores. De facto, durante esse período, urgia
conseguirem-se rápidos desenvolvimentos de novos processos tecnológicos e materiais que
possibilitassem o fabrico de componentes mais leves e, assim, promover a redução do peso,
do consumo, e da emissão de poluentes dos automóveis. Uma das primeiras aplicações de
TWBs na indústria automóvel europeia foi levada a cabo pelo fabricante sueco Volvo em
1979, tendo para tal recorrido ao processo de soldadura por resistência por roletes30 para
produzir TWBs a empregar no fabrico de suportes do motor e pilares da estrutura [Mesquita
et al. 1999].
Um avanço muito importante para o aumento da aplicação de TWBs viria a ocorrer em
1985, quando pela primeira vez foi usada a soldadura laser pela Thyssen para produzir um
painel TWB da plataforma do Audi 80 (1986) [Pallett e Lark 2001]. Esta aplicação teve como
primeiro objectivo superar as limitações de largura dos rolos de chapa galvanizada a quente,
ao invés de explorar as potencialidades da associação de chapas de diferentes
propriedades/espessuras na TWB. Deste modo, foi possível para a Audi, então dirigida pelo
carismático e visionário Ferdinand Piech31, tornar-se na primeira marca automóvel a nível
mundial a produzir um veículo com a totalidade da carroçaria produzida em aço
galvanizado, com importantes vantagens ao nível da protecção contra a corrosão da
estrutura e também de marketing, pois permitiu estender o número de anos de garantia
anticorrosão de 10 para 12 anos. Apesar da especificidade desta aplicação, ela actuou como
catalizador na evolução que se seguiu, no final da década de oitenta e nas décadas seguintes,
no processamento de TWBs para a indústria automóvel [Pallett e Lark 2001]. Com efeito, o
número e a diversidade das aplicações de TWBs por automóvel, bem como o número de
construtores que começaram a empregar este tipo de esboços, aumentou significativamente.
A produção mundial de esboços do tipo TWB passou de 120 milhões em 2001 para 250
milhões em 2005 [AISI 2006], confirmando as expectativas e previsões apontadas no início da
década [Rooks 2001]. A utilização de TWBs evoluiu de uma situação quase “embrionária” no
29 TIG – Tungsten Inert Gas. 30 Na terminologia anglo-saxónica é usado o termo Mash Seam Weld. 31 A título de curiosidade, é interessante referir que Ferdinand Piech esteve ligado, enquanto presidente da Audi AG, a vários projectos arrojados e inovadores como a tracção total Quattro® e à aplicação de motores de Ciclo Diesel de injecção directa em carros ligeiros (TDI®).
Capítulo 1. Introdução
23
final da década de 80 e princípio da década de 90, em que existiam poucas dezenas de
aplicações, para um ponto em que a inclusão deste tipo de esboços começa a ser generalizado
a toda a indústria. Por exemplo, a terceira geração do VW Golf (1991) empregava TWBs
quase exclusivamente para a produção das longarinas longitudinais, enquanto que na
geração seguinte (1997) a utilização de TWBs foi estendida a mais de vinte componentes
[Rooks 2001]. Podem ser citados outros exemplos de automóveis (em produção) que incluem
mais de duas dezenas de TWBs no fabrico da sua estrutura, como o Renault Laguna II (2001)
ou o Mercedes-Benz Classe C W203 (2000) [Rooks 2001].
Actualmente, as vantagens/benefícios da aplicação de TWBs são exploradas na maioria
dos componentes que constituem o chassis e carroçaria de um automóvel (Figura 1.7). Em
particular, os TWBs são mais usados na produção dos painéis interiores das portas e dos
painéis laterais (que já incluem os reforços dos pilares da carroçaria), representando estes
componentes mais de 60% do total de aplicações de TWBs [Mei e Skilliter 2006].
Figura 1.7 – Exemplos de aplicações de tailor-welded blanks na indústria automóvel32.
32 Imagem reproduzida com a autorização da Arcelor Auto.
Travessa do pára-choques
Torre da suspensão
Tampa da mala
Pilar A
Pilar B
Longarina lateral
Cava da roda
Longarina frontal
Longarina traseira
Painel lateral
Piso da Plataforma Porta
anterior
Porta posterior
Parte I. Introdução
24
A utilização deste tipo de esboços tem tido, nas duas últimas décadas, um papel muito
importante, associado à utilização das novas famílias de aços de alta e muito alta resistência,
para incrementar os níveis de resistência das estruturas dos automóveis e, ao mesmo tempo,
reduzir ou, pelo menos, minimizar o aumento do peso destas. Os grandes grupos
siderúrgicos ligados à produção de aço tiveram (e continuam a ter) um papel proactivo
muito importante no desenvolvimento do conceito e aplicabilidade das TWBs. Com efeito, o
aumento da utilização de ligas de alumínio e magnésio na construção das carroçarias, bem
como o lançamento de automóveis (ou protótipos) com estruturas integralmente produzidas
em ligas de alumínio, originou uma reacção conjunta das empresas produtoras de aço de
modo a travar a perda de importância do aço face a estes materiais de menor densidade [The
Engineer 2004]. O consórcio ULSAB33 granjeou grande visibilidade e interesse, pelos
resultados conseguidos na utilização massiva de aços de elevada resistência e TWBs na
estrutura base dos automóveis. Os resultados obtidos no primeiro programa ULSAB
demonstraram que a estrutura base de um automóvel (não contabilizando as portas),
desenvolvida através desta abordagem inovadora, pode ser 25% mais leve que a estrutura
equivalente produzida com aços e esboços ditos tradicionais [ULSAB 1998]. Além da redução
do peso, obtiveram-se também ganhos significativos em termos da resistência à flexão e à
torção da estrutura, sem que, no entanto, o custo final fosse afectado.
Muitas das soluções tecnológicas que resultaram dos programas ULSAB já estão
concretizadas em alguns modelos actualmente em produção, em particular no caso dos SUV
Porsche Cayenne e VW Touareg (os quais partilham a mesma plataforma), bem como na
generalidade da gama de modelos Porsche (Figura 1.8) [Mei e Skilliter 2006]. Este facto é
facilmente entendido pelo envolvimento directo da Porsche Engineering Services, Inc. em
vários programas ULSAB.
Recentemente, a Arcelor Auto34 em parceria com a Gestamp e Magna Steyr apresentaram
um estudo, designado por Arcelor Body Concept (ABC), onde é explorada a aplicação de aços
de alta resistência e TRIP35, bem como chapas do tipo sandwich36, na construção da estrutura
33 ULSAB – Ultra Light Steel Auto Body. Consórcio, criado em 1994, constituído por 35 empresas siderúrgicas produtoras de aço, de 18 países. Desde então, foram realizados vários programas com vista à utilização de componentes fabricados apenas em aço: na estrutura base do automóvel (sem portas); em suspensões; em portas; e no veículo como um todo. Para executar a gestão do projecto de engenharia e produção dos protótipos foi contratada a Porsche Engineering Services, Inc. Para mais informação/documentação ver o sítio da Internet http://www.ulsab.org. 34 Empresa integrante do Grupo Arcelor dedicada maioritariamente às relações comerciais e de engenharia com os fabricantes automóveis. 35 TRIP – TRansformation Induced Plasticity. 36 Chapas constituídas por camadas de materiais diferentes. Tipicamente, utiliza-se uma camada de um material polimérico entre duas chapas finas de aço, com o fim de, por exemplo, reduzir o peso e absorver o ruído e as vibrações.
Capítulo 1. Introdução
25
base de um automóvel [AMS Directory 2006]. A estrutura inclui cerca de 30% de TWBs. A
redução de peso conseguida é de 21% e o custo de produção aumenta em 9%,
comparativamente a estruturas idênticas que utilizem processos convencionais de produção.
O nível de segurança passiva é mantido, estando prevista a obtenção da classificação máxima
(“cinco estrelas”) nos ensaios de segurança arbitrados pelo Euro NCAP.
Figura 1.8 – Exemplo da aplicação de tailor-welded blanks, de aços de alta e muito alta resistência, e de ligas de alumínio, na estrutura de um automóvel desportivo. Modelo ilustrado37 – Porsche 911 (997)
GT3 de 2006.
Apesar do aumento acentuado da percentagem de aços de elevada resistência e do
número de componentes TWB empregues nos automóveis, não é fácil citar muitos exemplos
de automóveis da geração actual cujo peso seja inferior à geração precedente. Com efeito, a
prioridade de construir estruturas cada vez mais resistentes de modo a melhor proteger os
ocupantes, o aumento generalizado das dimensões dos veículos e do número de
equipamentos de segurança, têm absorvido quase a totalidade da redução de peso permitida
pela introdução de TWBs e de novos materiais. Um exemplo paradigmático desta
37 Salvaguarda dos direitos de reprodução da imagem: "Copyright Porsche AG. Image used with permission from Porsche AG".
Parte I. Introdução
26
constatação corresponde à evolução do peso da estrutura base das duas gerações do Volvo
S40. A estrutura do modelo lançado em 1996 pesava 266 kg, enquanto que na actual geração
(2004) o valor subiu para 311 kg, mesmo incluindo mais de 50% dos componentes
produzidos em aço de elevada resistência [The Engineer 2004].
Pode dizer-se que o aumento da utilização de aços de elevada resistência tem permitido,
na maioria dos casos, incrementar os níveis de segurança sem comprometer, em demasia,
tanto o aumento de peso total do automóvel, como o seu preço final. Contudo, tendo em
conta a já considerável taxa de penetração destes aços e o seu custo elevado, as metas muito
exigentes incluídas na legislação antipoluição, e a elevada competitividade do mercado, a
solução para o problema da redução/contenção do peso por via exclusiva da utilização de
novos aços afigura-se, ao momento, como uma solução limitada. Com efeito, começa a reunir
algum consenso na esfera da indústria automóvel que a melhor forma de cumprir todos os
requisitos anteriormente mencionados, mantendo ou reduzindo os custos de produção,
passa pela aplicação conjugada de materiais de diferentes famílias e, evidentemente, não só
ao nível da estrutura base (ver exemplo da Figura 1.8).
O facto de, em termos médios, uma redução de 100 kg no peso de um automóvel permitir
reduzir o consumo de combustível entre 0.2 a 0.3 l/100 km e 5 a 8 g de CO2/km [Jeanneau e
Pichant 2004] tornou muito atractivo, especialmente nas últimas três décadas, o emprego de
materiais de baixa densidade, nomeadamente das ligas de alumínio. Assim, para além do
aumento da taxa de penetração das ligas de alumínio, por exemplo, na fabricação de
motores, de caixas de velocidades, de suspensões e de alguns componentes da carroçaria,
surgiram igualmente alguns automóveis com estruturas integralmente produzidas em ligas
de alumínio. Duas das marcas de automóveis que mais têm investido na utilização deste
material, para a construção integral das carroçarias de alguns dos seus modelos, são a Audi
e, mais recentemente, a Jaguar. Em 1994 a apresentação do modelo de luxo Audi A8 causou
surpresa no público em geral e deu esperança aos que viam (vêem) muito potencial na
utilização em exclusivo de ligas de alumínio na construção total de carroçarias, sem ser
apenas na produção de automóveis desportivos38. Com o modelo A8, a Audi introduziu o
conceito de produção denominado por Audi Space Frame®. Este conceito pode ser
comparado à construção de um chassis tubular mas, neste caso, utilizando perfis (fechados)
extrudidos que são unidos através de peças obtidas por fundição. As principais vantagens
deste tipo de construção consistem não só na elevada rigidez estrutural que proporciona,
mas também na contenção dos custos de produção. De facto, em volumes de produção
38 Como exemplo, podem ser referidos os modelos Honda NSX (1991), Lamborghini Gallardo (2003), Ford GT (2004), Ferrari F430 (2005), Aston Martin V8 Vantage (2005), Jaguar XK (2006) e Audi R8 (2006).
Capítulo 1. Introdução
27
reduzidos é economicamente mais interessante utilizar perfis extrudidos do que
componentes estampados, pois os custos elevados associados ao fabrico das ferramentas de
estampagem são mais difíceis de amortizar [Carle e Blount 1999]. No caso da Jaguar, em vez
de uma construção do tipo tubular, é utilizada uma estrutura do tipo monobloco com a
combinação de componentes extrudidos, fundidos e, sobretudo, estampados. A ligação dos
componentes é feita maioritariamente através de adesivos do tipo epoxy. Este tipo de solução,
bem como o uso alargado de ligas de alumínio, é actualmente usado em todos os modelos da
Aston Martin e nos modelos Jaguar XJ (2003) e XK (2006)39.
Alguns dos estudos realizados na década de 90 indicavam que a substituição total do aço
por ligas de alumínio, na construção das carroçarias, poderia permitir reduções de peso até
40% [Jambor e Beyer 1997, Carle e Blount 1999]. Para além da baixa densidade, as ligas de
alumínio possuem boa resistência específica e elevada resistência à corrosão. Contudo, no
topo das dificuldades de aplicação destas ligas surgem, entre outras, o custo elevado face aos
aços, as dificuldades que persistem na sua união através da soldadura por fusão, a
capacidade de alongamento limitada de certas ligas e o reduzido módulo de elasticidade face
ao dos aços, que condiciona a rigidez dos elementos estruturais e provoca elevadas
recuperações elásticas durante a produção dos componentes estampados. A somar a estas
dificuldades, podem ser ainda citados o aumento muito significativo dos requisitos em
termos de segurança passiva, os avanços conseguidos na redução de peso através dos aços
de alta resistência e o elevado custo de reparabilidade das carroçarias. Deste modo, apesar
dos esforços desenvolvidos ao nível de marketing e da introdução de veículos mais acessíveis
(em termos absolutos), a utilização das ligas de alumínio não mostrou ser competitiva fora
dos segmentos dos automóveis de luxo ou dos desportivos de elevado desempenho. Um
exemplo que reforça esta observação consiste no fracasso comercial do modelo Audi A2
(2000), que competia no segmento dos monovolumes premium de pequenas dimensões e cuja
produção terminou em 2005.
Actualmente, apesar da elevada expectativa criada à volta do lançamento de novos
automóveis do “Segmento E” (executivo), nomeadamente dos sucessores do Jaguar S-Type e
Audi A6, não é crível que as suas carroçarias venham a ser produzidas integralmente com
ligas de alumínio. Contudo, têm surgido alguns indícios que o número de veículos de luxo
produzidos recorrendo à utilização alargada de alumínio venha a aumentar no futuro,
nomeadamente no segmento dos SUV de grandes dimensões, visto que a relação entre os
39 As marcas Aston Martin e Jaguar fazem parte do Premier Automotive Group (PAG) da Ford Motor Company, que inclui ainda a Land Rover e a Volvo Cars.
Parte I. Introdução
28
custos de produção (mais elevados) e a redução do peso permitida pode ser favorável, para
além dos ganhos em termos de imagem40.
Nos últimos anos têm merecido algum destaque as soluções híbridas, em que parte da
estrutura do automóvel é construída em ligas de alumínio e a restante em aço. Dois dos
exemplos mais significativos desta abordagem são o BMW Série 5 E60 (2003) e a segunda
geração do Audi TT (2006). Um objectivo comum nestes dois modelos reside em utilizar a
redução de massa, permitida pelas ligas de alumínio, para equilibrar a distribuição de
massas entre os dois eixos, com vantagens evidentes no aspecto dinâmico e da segurança
activa. No caso do BMW Série 5, toda a parte frontal é construída recorrendo a ligas de
alumínio e a redução de peso é de 75 kg, relativamente à geração anterior. No Audi TT, para
além do objectivo da optimização da distribuição de massas, pretendeu-se apenas manter o
peso total do veículo face ao modelo anterior. Ainda assim, a percentagem do peso dos
componentes em liga de alumínio ascende a cerca de 70% do peso total da estrutura, sendo
que os componentes em aço estão localizados na parte posterior e nas portas. Apesar dos
bons resultados permitidos, nomeadamente no compromisso entre os custos de produção e a
contenção/redução do peso, o projecto e construção de estruturas híbridas compostas por
elementos em ligas de alumínio e aços deve revestir-se de especial cuidado na análise das
ligações entre os componentes de materiais diferentes, pela dificuldade que este tipo de
ligações encerra.
Apesar do esforço de desenvolvimento colocado no estudo de tailor-welded blanks
compostos por ligas de alumínio, a sua aplicação continua a ser pontual. Com efeito,
prevalecem dificuldades em unir ligas de alumínio através de processos de soldadura por
fusão, nomeadamente devido à elevada reflectividade do material, à tendência para a
fissuração a quente, à criação de porosidade e à redução de resistência mecânica na ZAC
[Zhao et al. 1999a]. Além disso, a própria conformação das ligas de alumínio é mais
problemática do que para a maioria dos aços, nomeadamente pela reduzida ductilidade do
cordão e pela presença de defeitos na soldadura [Bayley e Pilkey 2005].
A primeira aplicação em série de um componente TWB composto por ligas alumínio foi
alcançada em 2003 pela Lamborghini, tendo a Corus Aluminium Rolled Products (CARP)
fornecido os esboços [Schedel 2004]. O componente consiste numa parte da cava da roda do
Lamborghini Gallardo (2003) e é produzido a partir de ligas das séries 5xxx e 6xxx. Esta
aplicação resultou de vários anos de desenvolvimento conjunto entre a CARP e a Audi, de
onde foram realizados grandes progressos no que respeita ao aumento da qualidade das
40 Por exemplo, é esperado que o futuro Range Rover seja construído utilizando as técnicas de produção desenvolvidas pela Jaguar na construção de carroçarias em ligas de alumínio, de modo a reduzir o peso, face ao modelo actual, em 15%.
Capítulo 1. Introdução
29
soldaduras. Ainda assim, as pequenas séries de TWBs produzidos pela CARP são obtidas em
ambiente quase laboratorial.
Tendo em conta as dificuldades que continuam a existir na produção de TWBs em ligas
de alumínio através de soldadura por fusão, o processo de soldadura por fricção linear
(FSW41), desenvolvido no início da década de 90 pelo TWI42, é tido como muito promissor.
De facto, a soldadura por fricção linear de chapas possibilita, para além de solucionar muitos
dos problemas anteriormente referidos no caso da soldadura por fusão, a redução da
distorção, a soldadura de diferentes ligas de alumínio [Merklein et al. 2005], a união de ligas
que eram consideradas de não soldáveis [Peel et al. 2003] e a eliminação de gases tóxicos. O
processo de soldadura por fricção linear também é visto como uma solução interessante na
união de materiais de famílias diferentes, como por exemplo, de ligas de alumínio soldadas
com ligas de magnésio, de ligas de alumínio soldadas com aços, etc.
O conceito de produção e da aplicação de TWBs não se restringe apenas ao processo de
conformação plástica de estampagem, nem às combinações de materiais anteriormente
referidas. Nos últimos anos tem-se assistido ao desenvolvimento de novas tecnologias de
produção, as quais podem beneficiar com a utilização de chapas com diferentes
características [Urban et al. 2006]. A hidroformagem43 de esboços ou de tubos TWB
corresponde a um desses novos processos tecnológicos, que possibilita a produção de
componentes com geometrias muito complexas e optimizadas em termos de
massa/resistência mecânica. Nos trabalhos desenvolvidos por Kopp et al. 2005 e Hirt e Meyer
2006 é abordado o processo de estampagem de chapas de diferentes espessuras mas que, ao
contrário do que acontece com uma TWB convencional, não possuem união soldada. Este
tipo de chapas são designadas na literatura por tailor rolled blanks (TRB) e, tipicamente,
correspondem a chapas do mesmo material em que a diferença de espessura é obtida
durante a laminagem das chapas, recorrendo a rolos que se movimentam na direcção
transversal à direcção de laminagem. As principais vantagens destas chapas residem na
transição suave de espessura e a ausência da zona heterogénea da soldadura em termos de
propriedades mecânicas face ao material de base. Embora o custo acrescido durante o
processamento da chapa não seja muito elevado, com este processo o esboço é sempre
constituído por um único material, o que acaba por limitar as opções de optimização do
41 FSW – Friction Stir Welding – Processo de soldadura no estado sólido em que a união dos materiais é conseguida através da deformação plástica imposta pelo avanço de uma ferramenta em rotação que promove a mistura dos materiais. 42 TWI – The Welding Institute. 43 Na terminologia anglo-saxónica é usado o termo hydroforming. Processo de conformação plástica no qual a deformação é imposta ao material através da injecção de um fluído sob pressão numa cavidade fechada (matriz).
Parte I. Introdução
30
componente final. No que respeita à combinação de materiais de diferentes famílias,
merecem destaque os trabalhos de Kreimeyer et al. 2005 e Kreimeyer e Vollertsen 2006. No
primeiro caso são estudadas as uniões de chapas de ligas de alumínio com chapas de titânio
com vista a aplicações aeronáuticas, enquanto que no segundo caso são testados vários tipos
de processos de soldadura para unir chapas de ligas de alumínio com chapas de aço
revestidas com zinco.
Tendo em conta as dificuldades actuais de conciliar a necessidade de aumentar a
resistência das estruturas base dos automóveis e, paralelamente, reduzir/manter o seu peso e
o seu custo, espera-se que o conceito de produção através de TWBs continue a aumentar a
sua importância. Com efeito, as TWBs ao permitirem a utilização conjunta de aços de
elevada resistência e de aços mais baratos, podem induzir reduções de custos e de peso até
cerca de 20% [Ogando 2006]. Assim, atendendo à adequabilidade crescente das TWBs como
meio de solucionar os problemas anteriormente referidos, as previsões actuais indicam que o
nível de produção mundial de TWBs atinja as 300 milhões de unidades dentro de poucos
anos [Ogando 2006].
O conceito de produção de componentes com TWBs tem fomentado estudos em
diferentes campos científicos e/ou tecnológicos. De entre esses campos devem ser destacados
os desenvolvimentos conseguidos nos processos tecnológicos de união de chapas [Baron
1997, Zhao et al. 1999a, Min e Kang 2000, Verrier et al. 2000, Rooks 2000, Koçak et al. 2001,
Kochan 2001], na avaliação da qualidade das soldaduras [Shakeri et al. 2001, Shakeri et al.
2002, O'Connor et al. 2002, Bayley e Pilkey 2005], na caracterização das propriedades
mecânicas das soldaduras [Davies et al. 1999, Auger et al. 2000, Davies et al. 2000, Ghoo et al.
2001a, Dry et al. 2002, Anand et al. 2006], na avaliação da conformabilidade das TWBs
[Kusuda et al. 1997, Jain 2000, Davies et al. 2001, Ghoo et al. 2001b, He et al. 2003, Bhaskar et al.
2004] e no estudo do processo de conformação de TWBs propriamente dito [Ahmetoglu et al.
1995, Siegert et al. 1998, Kinsey et al. 2000, Lee et al. 2000, Chang et al. 2002, Kinsey e Cao 2003,
Reis et al. 2004].
A simulação numérica do processo de estampagem tem permitido estudar e solucionar,
de modo expedito e com custos reduzidos, muitos dos problemas ou dificuldades associados
à produção de componentes com TWBs, podendo ser mencionados, entre outros, os
trabalhos de [Saunders e Wagoner 1996, Blümel et al. 1999, Meinders et al. 2000, Zimniak e
Piela 2000, Zhao et al. 2001, Jiang et al. 2004]. Em particular, os programas de simulação
possibilitam prever as zonas onde pode ocorrer a ruptura do material [Buste et al. 2000, Lee et
al. 2000, Dry et al. 2002, Cheng et al. 2006] e o movimento do cordão durante a estampagem
[Kim et al. 2000, Choi et al. 2000, Kinsey et al. 2000, Heo et al. 2001, Ku et al. 2005].
Capítulo 1. Introdução
31
Nos estudos numéricos que abordam a conformação de TWBs, a temática da modelação
do cordão de soldadura continua a suscitar controvérsia. Com efeito, apesar dos diversos
estudos levados a cabo nesta matéria [Saunders e Wagoner 1996, Meinders et al. 2000, Dry et
al. 2001, Ghoo et al. 2001a, Raymond et al. 2004], não é ainda claro se a inclusão das
propriedades mecânicas da soldadura na modelação do problema afecta de modo
significativo os resultados da simulação, independentemente do tipo de componente.
1.3 Objectivos do trabalho
Os objectivos principais do trabalho que se apresenta enquadram-se na necessidade de
desenvolvimento e expansão do campo de aplicação dos programas da família DD3, tendo
em conta os desafios anteriormente descritos sobre os programas de simulação numérica do
processo de estampagem. Mais concretamente, pretendeu-se dotar a família de programas
DD3 de novas ferramentas numéricas necessárias à simulação de sequências multi-etapas de
fabrico de componentes, que envolvam etapas intermédias de corte e a alteração da
discretização da malha de elementos finitos. A operação de corte de malhas de elementos
finitos foi introduzida com a criação de um novo programa numérico, DD3TRIM (contracção
de Deep Drawing 3D TRIMming), capaz de ler a informação e resultados gerados pelos
programa DD3IMP/DD3OSS, eliminar parte da malha de elementos finitos, tratar os
elementos afectados pelo corte e, finalmente, gerar um ficheiro que permita a continuação da
simulação das etapas subsequentes de fabrico.
Para além do desenvolvimento e teste de várias estratégias geométricas que permitem
cortar a malha de elementos finitos através de geometrias complexas definidas por
superfícies paramétricas NURBS44 ou por equações implícitas, foi também dada especial
atenção ao problema da transferência de variáveis – remapeamento – entre duas malhas de
elementos finitos com diferentes discretizações e/ou topologias. Para tal, estabeleceu-se como
objectivo o desenvolvimento e implementação no programa DD3TRIM de vários métodos de
remapeamento, com abordagens inovadoras ao problema da transferência de variáveis.
No que se refere ao estudo dos problemas ou questões que assistem à simulação numérica
do processo de estampagem de tailor-welded blanks, a contribuição deste trabalho consistiu
em avaliar a influência de se considerar a presença do domínio da soldadura na simulação
da conformação de chapas soldadas. Ao invés de estudar uma ou várias aplicações reais de
tailor-welded blanks e retirar elações sobre esses casos, o estudo consistiu em quantificar, de
forma sistemática, a influência da soldadura recorrendo à simulação numérica de testes
mecânicos elementares capazes de reproduzir, de forma individual, trajectórias típicas de
44 NURBS - Non Uniform Rational B-Spline.
Parte I. Introdução
32
estampagem. Este estudo teve em linha de conta as propriedades mecânicas, largura e
orientação do cordão de soldadura.
Por fim, as conclusões retiradas dos testes elementares foram confrontadas com um
estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado multi-etapas dedicado à
previsão do retorno elástico, onde a eficiência e fiabilidade do programa DD3TRIM foram
também avaliadas.
1.4 Guia de leitura
De modo a melhor enquadrar o leitor e a facilitar a leitura e consulta desta dissertação, nesta
secção apresenta-se a estrutura do texto, bem como um breve resumo dos assuntos
abordados em cada capítulo.
1.4.1 Estrutura
Este texto está dividido em três partes distintas. Na primeira parte – Introdução – faz-se o
enquadramento global do trabalho face aos desafios industriais e sintetizam-se os assuntos
abordados nos domínios da engenharia mecânica, tecnologias de conformação e da mecânica
computacional.
Capítulo 1, Introdução – Faz-se o enquadramento global do trabalho, dando especial ênfase
aos desafios industriais e tecnológicos actuais. Descrevem-se os objectivos
estabelecidos para os trabalhos desenvolvidos no âmbito desta tese. Apresentam-se a
estrutura e breve resumo do conteúdo da dissertação de modo a facilitar a sua leitura e
consulta.
Na segunda parte – Ferramentas numéricas – descrevem-se os algoritmos que foram
desenvolvidos e implementados no programa DD3TRIM, com vista ao tratamento
geométrico e ajuste de variáveis levados a cabo na operação de corte de malhas de elementos
finitos sólidos. Compreende os Capítulos 2 e 3.
Capítulo 2, Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos – Apresenta-se o problema do corte
de malhas de elementos finitos e descrevem-se as estratégias implementadas no
programa DD3TRIM, desenvolvido para cortar malhas de elementos finitos
constituídas por elementos finitos hexaédricos de oito nós. Detalham-se os formalismos
matemáticos necessários à definição da geometria de corte. São apresentadas três
Capítulo 1. Introdução
33
estratégias diferentes para a correcção da malha de elementos finitos. As estratégias
implementadas são avaliadas através da simulação de ensaios mecânicos elementares.
Capítulo 3, Remapeamento de variáveis – É introduzido o problema da transferência de
variáveis – remapeamento – entre duas malhas de elementos finitos com diferentes
discretização e/ou topologia. Descrevem-se, em detalhe, três métodos de
remapeamento, dois dos quais representam abordagens inovadoras ao problema. É
dado destaque ao problema da localização de pontos em malhas de elementos finitos.
No final do capítulo mostra-se a avaliação de desempenho dos diferentes métodos e
estratégias implementados, utilizando vários testes numéricos de eficiência e alguns
casos de estudo.
Na terceira parte – Estudos numéricos e experimentais – é avaliado o impacto da modelação
do domínio material da soldadura no comportamento mecânico de chapas soldadas. A
eficácia e fiabilidade do programa DD3TRIM são avaliadas com o estudo numérico de um
ensaio padronizado multi-etapas dedicado à previsão do retorno elástico. São apresentados
resultados experimentais obtidos com esse ensaio, relativos à conformação de chapas
monolíticas e de tailor-welded blanks.
Capítulo 4, Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas
soldadas – Avalia-se o impacto de se considerar a presença do domínio material da
soldadura na simulação numérica da conformação de tailor-welded blanks. São
considerados vários níveis de heterogeneidade entre o material da soldadura e o
material de base, associados a três larguras e orientações de cordão. O comportamento
em deformação do cordão é avaliado recorrendo a quatro testes mecânicos
elementares: tracção uniaxial; corte; flexão em quatro pontos; e ensaio Jovignot.
Capítulo 5, Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno
elástico – Os algoritmos e as estratégias numéricas implementados no programa
DD3TRIM são testados na simulação numérica de um ensaio padronizado multi-etapas
dedicado à previsão do retorno elástico. Apresentam-se resultados numéricos e
experimentais do ensaio utilizando-se esboços monolíticos e tailor-welded blanks. São
reforçadas algumas conclusões sobre a influência da modelação do cordão na previsão
do comportamento mecânico de tailor-welded blanks.
Parte I. Introdução
34
Capítulo 6, Considerações finais – Descrevem-se as principais conclusões do trabalho,
apresentando-se igualmente algumas perspectivas de desenvolvimento futuro.
Nos anexos complementam-se algumas secções desta dissertação, nomeadamente, com a
formulação matemática não incluída no texto principal, mas cuja importância justifica a
presença em anexo.
Anexo A, Nomenclatura – Descreve-se a notação, a nomenclatura, as siglas e as abreviaturas
mais utilizadas no presente trabalho.
Anexo B, Cálculo de derivadas de superfícies NURBS – São desenvolvidas as expressões que
permitem calcular as derivadas parciais, de primeira e de segunda ordem, num ponto
de uma superfície NURBS.
Anexo C, Ficheiros de entrada do programa DD3TRIM – Exemplificam-se os ficheiros de
entrada necessários ao funcionamento do programa DD3TRIM.
Anexo D, Propriedades mecânicas dos materiais – Apresentam-se as tabelas que contêm os
parâmetros constitutivos que caracterizam os critérios de plasticidade e as leis de
encruamento para a descrição do comportamento mecânico de alguns dos materiais
referidos no texto principal.
1.5 Notações e convenções
Neste trabalho, sempre que são usados termos não constantes no léxico da língua portuguesa
ou que correspondam a uma tradução não consensual, o texto aparece formatado a itálico.
Por uma questão de uniformização com a informação extraída dos programas de simulação é
usado como separador decimal o ponto (.) em vez da vírgula (,), que é o separador decimal
utilizado na língua portuguesa. A menos que seja referido algo em contrário, admite-se que
as unidades das grandezas estão de acordo com o Sistema Internacional (SI). No que diz
respeito ao caso particular dos esquemas e desenhos geométricos, a priori todos os valores de
comprimento têm a dimensão de milímetros [mm].
PARTE II
Ferramentas numéricas
37
CAPÍTULO DOIS
Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
Neste capítulo descreve-se o problema do corte de malhas de elementos finitos e apresentam-se as estratégias implementadas no programa DD3TRIM, desenvolvido para cortar e dividir malhas de elementos finitos constituídas por elementos hexaédricos de oito nós. Apresentam-se os formalismos matemáticos necessários à definição da geometria de corte, que pode ser de dois tipos: superfície plana ou superfície paramétrica do tipo NURBS. São discutidas três estratégias diferentes para a correcção da malha de elementos finitos. No final do capítulo, as estratégias implementadas são avaliadas através da simulação de ensaios mecânicos elementares.
2.1 Enquadramento
Na obtenção de um componente metálico por estampagem, para além da conformação
plástica do material, existem geralmente outras operações adicionais, como são exemplos a
dobragem e o corte. Assim, visto que é cada vez mais imperioso conseguir simular por
completo os processos de produção tecnológica de componentes em chapa, é necessário fazer
evoluir os programas de simulação numérica de modo a englobar todas as etapas da
fabricação.
Neste capítulo o tema da simulação de operações multi-etapas é abordado pela descrição
de um novo programa, DD3TRIM, desenvolvido para cortar ou dividir malhas de elementos
finitos hexaédricos de oito nós (ver Figura 2.1). Na literatura não se encontram muitos
trabalhos que tratem directamente a temática do corte de malhas de elementos finitos. Tal
facto pode estar relacionado com a diminuição acentuada do número de programas
Parte II. Ferramentas numéricas
38
numéricos desenvolvidos em ambiente académico, capazes de simular todas as operações
relacionadas com o processo de estampagem de chapas metálicas.
Quando se executam modificações na topologia ou morfologia de uma malha de
elementos finitos, um dos objectivos subjacentes consiste em minimizar, tanto quanto
possível, a distorção imposta por essas modificações, isto é, devem minimizar-se as
alterações bruscas tanto na forma como na dimensão dos elementos. Para além da distorção,
existem outros aspectos que devem ser tomados em consideração, nomeadamente, a
minimização do número de elementos novos introduzidos pela correcção e a garantia da
robustez das soluções numéricas adoptadas.
Figura 2.1 – Representação da operação de corte de uma malha de elementos finitos hexaédricos de oito nós através de uma superfície de corte genérica.
O modo mais expedito de executar uma operação de corte, independentemente do tipo de
elemento finito ou da geometria de corte, consiste simplesmente em eliminar, da malha de
elementos finitos, os elementos que se localizem para além do domínio que se pretende
conservar. Com a aplicação desta metodologia resultam normalmente malhas irregulares
junto da nova fronteira. Kawka et al. 1998 aplicaram este tipo de procedimento para executar
as operações de corte durante a simulação numérica da estampagem multi-etapas de uma
jante automóvel. O método foi aplicado tanto em malhas constituídas por elementos do tipo
casca, como por elementos do tipo sólido (hexaedros). De modo a melhorar a definição da
geometria da nova fronteira da malha, em alguns destes métodos aplicam-se um ou vários
estágios de refinamento local, aos elementos próximos da linha/superfície de corte, antes de
se proceder à operação de corte propriamente dita. Embora esta estratégia melhore o ajuste
da malha final à linha/superfície de corte, o aumento do número de elementos que acarreta
penaliza o tempo de cálculo exigido para as etapas de simulação subsequentes, além de não
descrever com exactidão a geometria de corte pretendida.
Zona a guardar
Zona a eliminar
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
39
No trabalho desenvolvido por Coelho et al. 2000, sobre intersecção e corte de malhas
constituídas por elementos do tipo casca triangulares e quadrangulares, a operação de corte é
executada de modo a ajustar de forma precisa os elementos da malha à linha de corte. A
particularidade da técnica de ajustamento utilizada prende-se com o facto de serem usados
elementos triangulares para ajustar a malha de base, constituída por elementos
quadrangulares, à linha de corte. No caso particular do corte de malhas constituídas apenas
por elementos triangulares do tipo casca, Avetisyan et al. 2005 desenvolveram um algoritmo
que ajusta os nós dos elementos afectados pela operação à linha de corte, e posteriormente é
aplicada uma estratégia de homogeneização do tamanho/forma dos elementos que
constituem o novo bordo livre da malha.
No que diz respeito ao corte de malhas constituídas por elementos do tipo sólido,
Dhondt 1998 apresentou uma metodologia de corte para elementos hexaédricos de vinte nós.
Nesse trabalho, os algoritmos desenvolvidos foram aplicados na simulação da propagação
de fendas em estruturas. Posteriormente, o mesmo autor adaptou o algoritmo de corte de
modo a ser usado como gerador automático de malhas [Dhondt 2001]. A estratégia por ele
adoptada, para ajustar de forma precisa os elementos à superfície de corte, consiste em
decompor caso a caso, com ou sem ajustamento prévio de alguns nós da malha, os elementos
que são atravessados pela superfície. A decomposição é feita de acordo com a topologia de
corte de cada elemento, isto é, em função do posicionamento das arestas que são
atravessadas pela superfície de corte, do número de nós presentes na zona a
eliminar/guardar, etc. Apesar do método englobar estratégias para atenuar a forte distorção
introduzida pela decomposição dos elementos, tanto a elevada disparidade de forma e
tamanho entre os elementos que formam a nova fronteira, como o elevado número de novos
elementos introduzidos, constituem aspectos negativos do método.
As metodologias atrás apresentadas evidenciam a existência de dois campos disciplinares
que podem estar relacionados com o problema do corte de malhas de elementos finitos: A
geração automática de malha (como é expresso no trabalho de Dhondt 2001) e a remalhagem
ou regeneração de malha. No trabalho de Kwak et al. 2002a estes dois campos disciplinares
são abordados de forma conjunta para malhas compostas por elementos finitos hexaédricos.
No que respeita à geração automática de malha, nesse trabalho mostra-se um método de
ajustar os nós dos elementos de bordo ao volume pretendido, baseado na projecção de
determinados nós. O processo de selecção dos nós que são projectados obedece a
determinados constrangimentos da distribuição dos elementos que irão preencher o volume
a ser discretizado. Em trabalhos sobre remalhagem de malhas compostas por elementos
bidimensionais, como são exemplo os de Zhu e Gotoh 1999, Peterson et al. 2000 e Srikanth e
Zabaras 2001, podem ser encontradas metodologias específicas para solucionar o ajuste dos
Parte II. Ferramentas numéricas
40
elementos, que constituem a fronteira da malha, às superfícies físicas envolventes. De forma
mais concreta, o estudo desenvolvido por Hu et al. 2002, em que se aplica a remalhagem
durante a simulação numérica de escoamentos, o ajustamento dos nós dos elementos de
bordo livre é efectuado segundo uma técnica denominada de “arrastamento de nós”.
Segundo esta técnica, os nós são movidos na direcção das arestas dos elementos atravessados
pela superfície de bordo livre que, no caso em questão, corresponde a uma superfície
cilíndrica.
O método desenvolvido neste trabalho para corrigir a nova fronteira da malha definida pela
superfície de corte tem por ideia base o ajustamento das posições dos nós pertencentes
apenas aos elementos cortados, relativamente à superfície de corte. Deste modo, evita-se
alterar a forma dos elementos não afectados pelo corte e, consequentemente, do erro que
seria necessariamente imposto pelo processo de ajustamento de variáveis.
No tratamento é assumido que a superfície de corte deve ter dimensões muito superiores
à dimensão média dos elementos e não pode ter um desvio elevado relativamente à direcção
ortogonal do plano da malha. Com esta última premissa tentam-se reproduzir as condições
de operação reais do corte de uma chapa metálica, quer seja por ferramenta de corte (punção
de corte) ou recorrendo à tecnologia laser.
Assim sendo, podem ser destacadas as seguintes vantagens deste tipo de algoritmo
relativamente aos acima descritos:
Maior simplicidade algorítmica e de implementação;
A transição entre a dimensão e geometria dos elementos não afectados face aos
corrigidos é menor (menor distorção);
Não é absolutamente necessário adicionar elementos na correcção da malha; e o
Algoritmo é facilmente adaptável a outros tipos de elementos finitos e
orientações de corte.
2.2 Descrição do algoritmo de corte
No programa DD3TRIM foram implementados dois modos distintos de definir a superfície
de corte. Uma representação geométrica elementar, através de um plano, e outra recorrendo
a superfícies paramétricas do tipo NURBS1, capazes de definir formas de elevada
complexidade geométrica. A operação de corte através de uma superfície plana é um meio
expedito para efectuar uma elevada percentagem de operações de cortes simples. No que se
1 NURBS – Non Uniform Rational B-Spline.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
41
refere à escolha de uma forma de representação geométrica mais flexível e genérica para
definir a superfície de corte, duas opções de base foram equacionadas: a representação
implícita ou a representação paramétrica. As superfícies implícitas são definidas como o
conjunto de pontos ( ), ,x y z que satisfazem a igualdade ( ), , 0f x y z = . As superfícies
paramétricas representam o mapeamento de um espaço matemático num outro de ordem
superior, ou seja, considerando o espaços reais 2 e 3 , corresponde a passar de um
domínio D contido em 2 para 3 , tal que: ( ) ( ) ( ) ( ) T, , , , , ,u v x u v y u v z u v= ⎡ ⎤⎣ ⎦S , onde u e
v são as coordenadas paramétricas. As representações paramétricas de superfícies (e curvas)
mais utilizadas são as de Bézier, B-Splines e NURBS. Estas três representações estão
relacionadas matematicamente de forma hierárquica, uma vez que as superfícies NURBS
constituem uma generalização das superfícies B-Splines e estas são uma generalização das
superfícies de Bézier. Devido à vantagem inegável em termos de generalização, bem como
das excelentes propriedades matemáticas que lhe são inerentes (garantia de continuidade no
domínio de representação, elevada flexibilidade, etc.), as superfícies NURBS constituíram-se,
em cerca de três décadas, na representação paramétrica mais popular em todos os campos de
aplicação da modelação geométrica. Tal facto pode ainda encontrar justificação na
incorporação imediata deste tipo de superfícies em formatos estandardizados de
transferência de geometria, devendo ser destacados os formatos STEP2 e IGES3 [Dimas e
Briassoulis 1999 e Wang et. al. 2004].
O algoritmo do programa DD3TRIM divide-se em três fases: uma de pré-processamento,
uma de correcção e uma de pós-processamento. Na primeira fase, procede-se à aquisição e
tratamento prévio de toda a informação requerida para executar a operação de corte. Em
particular, faz-se a leitura da malha de elementos finitos, da caracterização da superfície de
corte e do tipo de correcção a aplicar. Durante esta fase são ainda atribuídos estatutos de
posição, relativamente à superfície de corte, a todos os nós e a todos os elementos finitos da
malha. Para a fase de correcção implementaram-se três tipos de tratamento para
corrigir/alterar os elementos finitos que são intersectados pela superfície de corte. O primeiro
consiste em eliminar da malha todos os elementos que não pertencem ao domínio final
pretendido. Os segundo e terceiro tipos de correcção baseiam-se no primeiro, mas
incorporam estratégias para ajustar os elementos finitos cortados, à superfície de corte. Por
último, na fase de pós-processamento, a malha corrigida é sujeita a uma operação de
optimização local dos elementos de bordo que sofreram distorção acentuada durante a fase
2 STEP – STandard for the Exchange of Product data. 3 IGES – Initial Graphics Exchange Specification.
Parte II. Ferramentas numéricas
42
de correcção, devido ao reposicionamento dos nós na superfície de corte. Nesta fase são
ainda actualizadas as tabelas finais de nós e conectividade dos elementos.
2.3 Algoritmo de corte – Fase de pré-processamento
A fase de pré-processamento começa pela leitura de ficheiros de dados externos ao programa
DD3TRIM, nomeadamente: a malha de elementos finitos (coordenadas dos nós e
conectividade dos elementos); o ficheiro ‘trim.dat’ (Anexo C) que contém os parâmetros
necessários para definir as fases de tratamento (tipo de correcção, tipo de superfície de corte,
etc.) e, adicionalmente, consoante o tipo de superfície de corte usada, um ficheiro IGES para
definir uma superfície de corte paramétrica NURBS (Anexo C).
Para optimizar os algoritmos de tratamento, em particular a indexação e procura de
entidades na malha (nós, elementos, arestas ou faces), o programa DD3TRIM gera
informação adicional sobre o elemento finito, que é guardada sob a forma de tabelas de
conectividade: para os nós (os elementos que partilham um nó); para arestas (os nós que
pertencem a uma aresta); e para faces (os nós que pertencem a uma face). A Figura 2.2 ilustra
a informação adicional sobre o elemento finito hexaédrico de oito nós.
Figura 2.2 – Representação dos nós ( iN ), arestas ( iA ) e faces ( iF ) do elemento hexaédrico de oito nós.
Para identificar o posicionamento de cada nó e elemento da malha relativamente à
superfície de corte, durante as diferentes fases da operação de tratamento, são criadas duas
tabelas de estatutos. No caso dos nós, a tabela N-STATUS armazena para cada nó, um de três
estados possíveis: GUARDAR, ELIMINAR ou SOBRE A SUPERFÍCIE. Para o caso dos
elementos é criada a tabela E-STATUS que, para cada elemento, contém um dos estatutos:
A TRATAR, GUARDAR ou ELIMINAR.
O algoritmo seguido para determinar os estatutos dos nós é baseado no cálculo do
produto interno de vectores, devendo ser garantido (pelo utilizador do programa DD3TRIM)
1N
3N 4N
2N
5N
7N 8N
6Ν1F
6F2F
3F
5F
4F
10A
11A 12A
1A 2A
3A 4A
5A
6Α
7A
8Α
9A
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
43
que a normal à superfície de corte esteja orientada no sentido da região da malha a ser
eliminada. Para melhor descrever o algoritmo, toma-se como exemplo o corte de uma malha
através de uma superfície paramétrica genérica ( ),u vS (ver Figura 2.3). Considere-se a
determinação do estatuto dos nós 1N , que vai ser eliminado, e 2N , que permanecerá na
malha a ser cortada por ( ),u vS .
Figura 2.3 – Representação esquemática 2D para a determinação da posição relativa dos nós e elementos da malha face à superfície de corte.
O procedimento geral inicia-se com a projecção do nó genérico iN em ( ),u vS obtendo-se
um ponto iP e, subsequentemente, calculando-se o vector in normal à superfície nesse
ponto. Um segundo vector iv é determinado, que une os pontos iP e iN no sentido do nó.
Uma vez que a normal à superfície (n ) aponta no sentido da região da malha a eliminar, a
posição relativa do nó face à superfície e, consequentemente, o seu estatuto, podem ser
obtidos pelo produto interno entre os vectores in e iv . Assim, se o produto interno é
negativo o nó recebe o estatuto GUARDAR; caso contrário, se o produto interno é positivo o nó
recebe o estatuto ELIMINAR. Uma terceira condição é testada através do cálculo da distância
do nó à superfície, de modo a avaliar se o nó está contido na superfície (a menos de uma
tolerância). Neste caso o estatuto alocado para o nó é SOBRE A SUPERFÍCIE.
Depois de se terem determinado os estatutos dos nós da malha de elementos finitos, a
tabela E-STATUS é preenchida contabilizando-se o número de nós de cada elemento em
avaliação que têm estatuto ELIMINAR. Assim, se todos os nós do elemento têm estatuto
ELIMINAR, o elemento recebe estatuto ELIMINAR, caso contrário, se nenhum dos nós tem
esse estatuto, o estatuto atribuído ao elemento é GUARDAR. Finalmente, para os casos em que
o elemento possui, simultaneamente, nós com estatuto ELIMINAR, GUARDAR ou
SOBRE A SUPERFÍCIE, atribui-se o estatuto A TRATAR (Figura 2.4).
( ),u vS
1N
n
2N 1 1=n v
2n
2v
2P
1P
Região a eliminarRegião a guardar
Parte II. Ferramentas numéricas
44
Figura 2.4 – Representação gráfica dos estatutos dos elementos: a) Malha a ser cortada por superfície NURBS; b) Estatutos dos elementos da malha.
2.4 Algoritmo de corte – Fase de correcção
Na fase de correcção, após ter sido preenchida a tabela de estatutos para os elementos, cada
elemento com estatuto A TRATAR é alvo de nova de triagem, de modo a determinar se o
estatuto final desse elemento é GUARDAR ou ELIMINAR. A avaliação final do estatuto é feita
com base na percentagem de volume do elemento que se encontra na região da malha a
eliminar. Assim, se o valor da percentagem de volume a eliminar for superior a 50% do
volume do elemento, este recebe o estatuto ELIMINAR, no caso contrário recebe o estatuto
GUARDAR.
2.4.1 Avaliação do volume a eliminar nos elementos cortados
O método utilizado para determinar a porção de volume do elemento cortado, que se
encontra na região da malha a ser eliminada ( eV ), tem por base a decomposição do elemento
hexaédrico de oito nós em seis tetraedros (Figura 2.5.a). A porção de volume eV , do
elemento a eliminar, é determinada avaliando individualmente os tetraedros resultantes
desta decomposição.
Em cada tetraedro, o volume situado na região a eliminar ( etetV ) é determinado através da
avaliação das porções do tetraedro que estão, ou do lado da malha a eliminar ou a guardar,
recorrendo à informação contida na tabela dos estatutos dos nós. Se todos os nós do
tetraedro possuem o mesmo estatuto, ELIMINAR (ou GUARDAR), o volume a eliminar (ou
guardar) corresponde ao volume total do tetraedro:
( ),u vS
n
GUARDARELIMINARA TRATAR
a) b)
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
45
( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )
1 4 1 4 1 4
2 4 2 4 2 4
3 4 3 4 3 4
16tet
x x y y z zV x x y y z z
x x y y z z
− − −= − − −
− − −. (2.1)
Figura 2.5 – Decomposição de poliedros em tetraedros: a) Hexaedro; b) Pentaedro.
Para os casos em que o tetraedro é atravessado pela superfície de corte, a determinação do
volume situado na região a eliminar é feita consoante a combinação dos estatutos dos nós e
calculando os pontos de intersecção das arestas com o plano de corte (ver Figura 2.6).
Tomando como exemplo a avaliação do estatuto ELIMINAR dos nós, tem-se: no caso de
existir um nó com estatuto a ELIMINAR e os restantes possuírem estatuto a GUARDAR,
obtém-se um tetraedro pertencente à zona a eliminar da malha (Figura 2.6.a);
alternativamente, nos casos em que se tem um número igual de nós com estatuto a
ELIMINAR e GUARDAR, o volume a eliminar corresponde a um pentaedro (Figura 2.6.b), cujo
cálculo do volume é obtido decompondo-se o pentaedro em tetraedros (Figura 2.5.b).
Com esta metodologia, o valor obtido para o volume situado na região a eliminar é exacto
para os casos de corte por plano e aproximado para os casos de corte por superfície
paramétrica. No entanto, a avaliação aproximada do volume no caso do corte por superfície
paramétrica é suficientemente adequada, visto não comprometer de forma evidente a
distorção dos elementos tratados.
1
3 4
2
5
7 8
6
Conectividade Tetraedro 1 1 2 3 6Tetraedro 2 1 3 6 7Tetraedro 3 1 5 6 7Tetraedro 4 2 3 4 6Tetraedro 5 3 4 6 7Tetraedro 6 4 6 7 8
a)
1
3
2
4
6
5
Conectividade Tetraedro 1 1 2 3 5Tetraedro 2 1 3 5 6Tetraedro 3 1 4 5 6
b)
Parte II. Ferramentas numéricas
46
Figura 2.6 – Decomposição do tetraedro de acordo com os estatutos dos nós, para avaliar a porção de volume a eliminar (sombreado a cinza): a) Caso de um nó a ELIMINAR (circulo a branco) e três a
GUARDAR (circulo a negro); b) Caso de dois nós a ELIMINAR e dois a GUARDAR.
As restantes combinações dos estatutos dos nós no tetraedro resumem-se aos casos
inversos aos anteriormente descritos e correspondem à avaliação dos estatutos GUARDAR dos
nós, pelo que o cálculo do volume a eliminar é feito de forma complementar ao que foi antes
descrito.
2.4.2 Corte por plano
Depois de realizada a avaliação final dos estatutos dos elementos (Figura 2.7.b), procede-se à
correcção ou não, da posição espacial dos nós pertencentes aos elementos atravessados pelo
plano de corte π (Figura 2.7.a). Foram implementados e testados três tipos de métodos de
correcção para executar o corte da malha. O primeiro tipo, denominado no decorrer do texto
como “método de correcção tipo I”, consiste em eliminar elementos de forma selectiva, mas
mantendo a forma dos elementos que permanecem na malha final. Nos outros tipos de
correcção, tipo II e tipo III, parte-se da malha obtida pelo método de correcção tipo I e
ajustam-se os elementos atravessados pelo plano de corte, através do reposicionamento de
determinados nós. A diferença entre os dois métodos prende-se com a forma utilizada para
obter a posição final dos nós no plano de corte: por projecção, no caso do método de
correcção tipo II; ou ao longo de uma direcção de aresta dos elementos, no caso do método
de correcção tipo III. Em qualquer um dos métodos, os nós a mover correspondem aos que
têm estatuto (ELIMINAR ou GUARDAR) contrário ao do elemento a que pertencem. Assim, se
um nó possui estatuto a ELIMINAR e pertence a um elemento com estatuto GUARDAR, esse nó
irá ser alvo de correcção, ou vice-versa.
a) b)
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
47
Figura 2.7 – Representação esquemática dos diferentes tipos de correcção desenvolvidos para cortar a malha de elementos finitos hexaédricos.
π
n
a) Malha inicial e plano de corte. b) Elementos a eliminar da malha (em cinza).
A
c) Malha final obtida pelo método de correcção tipo I.
d) Malha antes do ajustamento das posições dos nós, para os métodos de correcção tipo II e III.
A
A
e) Ajuste das posições dos nós pelo método de correcção tipo II.
f) Ajuste das posições dos nós pelo método de correcção tipo III.
g) Malha final obtida pelo método de correcção tipo II.
h) Malha final obtida pelo método de correcção tipo III.
Parte II. Ferramentas numéricas
48
- Correcção tipo I
O primeiro tipo de tratamento implementado para realizar a operação de corte, consiste
apenas em eliminar da malha todos os elementos (e nós) que possuem estatuto ELIMINAR,
obtendo-se, desta forma, uma malha mais ou menos irregular junto da zona de corte
consoante a orientação do plano face à malha (ver Figura 2.7.c).
- Correcção tipo II
No método de correcção tipo II, os nós que alteram a sua posição espacial são projectados
sobre uma linha que resulta da intersecção do plano de corte com a face (superior ou
inferior) do elemento que os contém. Para melhor descrever o método toma-se como
exemplo o caso simples representado na Figura 2.8 para obtenção das novas coordenadas do
nó 6N . Admitindo que o nó 6N seria um dos nós a mover, o tratamento inicia-se pelo
cálculo da recta de intersecção r , definida pela intersecção dos planos de corte π e da face
do elemento, composta pelos nós 5N , 6N , 8N (ver Figura 2.8.a). Depois de definida a recta
r , a posição final do nó, novoP , é determinada pela projecção ortogonal do nó 6N sobre a
recta r (Figura 2.8.b):
6projnovo r=P N . (2.2)
A opção de dividir o cálculo em dois passos, ao invés de projectar directamente o nó na
superfície de corte, prende-se com a necessidade de assegurar a espessura do elemento
cortado. Nas Figura 2.7.d, Figura 2.7.e e Figura 2.7.g mostra-se a evolução de uma malha
tratada com o método de correcção tipo II, imediatamente antes, durante, e no final da
correcção, respectivamente.
- Correcção tipo III
No método de correcção tipo III, a posição final dos nós que são alvo de correcção
corresponde ao ponto de intersecção da aresta cortada com o plano de corte, escolhendo-se
previamente uma orientação global de correcção. Deste modo, garante-se que a zona de
bordo corrigida mantém a orientação prévia das arestas do elemento, o que pode ser
importante nos casos em que é necessária a definição precisa do domínio material, como por
exemplo na criação de malhas com diferentes materiais. O método é mostrado graficamente
nas Figura 2.7.d e Figura 2.7.f e o aspecto da malha final na Figura 2.7.h.
Para além da aplicação como opção de tratamento, o método de correcção tipo III é
sempre utilizado em qualquer operação de corte efectuada com o método de correcção tipo
II, para corrigir os nós de bordo livre da malha. Nestes casos, os nós são arrastados na
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
49
direcção das arestas cortadas que constituem a fronteira da malha, de modo a ser garantida a
continuidade geométrica desta e, implicitamente, do domínio material.
a) Intersecção do plano de corte com uma face
do elemento. b) Projecção ortogonal do nó 6N sobre a linha
de intersecção r .
Figura 2.8 – Representação esquemática do reposicionamento dos nós a mover no método de correcção tipo II.
2.4.3 Corte por superfície NURBS
2.4.3.1 Superfícies paramétricas NURBS: Definição
Para definir matematicamente uma superfície NURBS é necessário introduzir previamente a
noção de curva NURBS. No espaço tridimensional Euclidiano ( ), ,i j k , uma forma geral de
representar parametricamente uma curva ( )uC consiste em escrever:
( ) ( ) ( ) ( )u x u i y u j z u k= + +C . (2.3)
Uma curva NURBS, por sua vez, pode ser definida como um conjunto de funções
polinomiais racionais (resultantes do quociente de duas funções polinomiais) capaz de
descrever um campo de vectores orientado [Piegl 1991, Piegl e Tiller 1997, Stadler et al. 2003]:
( )( )
( )
,0
,0
n
i p i ii
n
i p ii
N u wu
N u w
=
=
=∑
∑
PC . (2.4)
Por vezes utiliza-se uma definição equivalente, reescrevendo a equação (2.4) na forma:
r n 5N
6N
7N8N
novoP
1N
2N
3N
4N
π
r 8N
5N6N
7N
1N
2N
4N3N
Parte II. Ferramentas numéricas
50
( ) ( )
( )
( )
,0
,,
,0
,
.
n
i p ii
i p ii p n
k p kk
u R u
N u wR
N u w
=
=
=
=
∑
∑
C P
(2.5)
Nestas equações, ( ),i pR u são denominadas funções racionais base da curva; iP são os
( )1n + vectores de posição ou pontos de controlo, que constituem os vértices do polígono de
controlo da curva; iw são os coeficientes de ponderação, ou pesos, associados a cada ponto
de controlo; e ( ),i pN u constituem as funções de base B-spline normalizadas de grau p
(ordem 1p + ).
As funções ( ),i pN u (note-se que o índice p a seguir à virgula referencia apenas o grau da
função) podem ser calculadas de forma recursiva através do algoritmo Cox-deBoor
[Cox 1972, deBoor 1972]:
( )
( ) ( ) ( )
1,
1, , 1 1, 1
1 1
10 restantes casos
i ii p
i pii p i p i p
i p i i p i
u u uN u
u uu uN u N u N uu u u u
+
+ +− + −
+ + + +
≤ ≤⎧= ⎨⎩
−−= +
− −
(2.6)
em que 0 ,..., mu u=U é designado por vector de nós da curva e consiste numa sequência
não-decrescente de números reais iu , denominados por nós4, que delimitam os troços que
compõem a totalidade da curva. Normalmente utilizam-se os valores 0 e 1 para definir o
intervalo de variação de U . Nos casos em que o numerador e o denominador são
simultaneamente nulos, admite-se que o valor da função de base é igual a zero. As funções
( ),i pN u possuem importantes propriedades matemáticas que, por sua vez, são repercutidas
nas funções racionais ( ),i pR u (consultar [deBoor 1978, Piegl e Tiller 1987, Piegl e Tiller 1997]
para obter informação adicional). De entre essas propriedades é de realçar a localidade, que
se traduz na limitação do impacto da variação de um dado nó iu sobre a totalidade da curva,
uma vez que as funções ( ),i pN u são nulas para os valores de u fora do intervalo 1,i i pu u + +⎡ ⎤⎣ ⎦
(ver Figura 2.9.a). O grau da curva p , o número de nós ( )1m + e o número de pontos de
controlo ( )1n + relacionam-se através de:
1m n p= + + . (2.7)
O vector U é designado uniforme se os nós iu da curva estiverem igualmente espaçados,
isto é, se existir um número real positivo h tal que ( )1i iu u h+ − = com ( )1p i m p≤ ≤ − − . No
4 Na terminologia anglo-saxónica o termo usado é knots.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
51
caso presente, e uma vez que é uma característica intrínseca das curvas NURBS, consideram-
se apenas vectores de nós do tipo não-uniforme.
Para garantir que um determinado ponto de controlo iP pertence à curva, basta repetir o
valor do nó iu correspondente ( )1r p= + vezes, denominando-se este nó “de multiplicidade
r ”. Nestes casos o vector U diz-se não-periódico. Na maior parte das aplicações é habitual
fazer com que os pontos extremos do polígono de controlo pertençam à curva NURBS, o que
se traduz também, na tangência dos troços extremos do polígono de controlo face à curva,
nos nós da extremidade (ver Figura 2.9.b).
4,2N
1 0,2N
1,2N 2,2N 3,2N
0 1
2u 7u
1P
0u1u 5u
6u3u 4u
2P3P
4P
5P
a) b)
Figura 2.9 – Caracterização geométrica de uma curva NURBS: a) Evolução das funções de base B-spline quadráticas; b) Curva NURBS quadrática com 5 pontos de controlo e três troços.
Por via da sua superior complexidade e generalidade, nomeadamente por incluírem um
coeficiente de ponderação para cada ponto de controlo ( iw ) e por a distribuição dos nós ( iu )
da curva ser não-uniforme, as curvas NURBS possuem grandes vantagens, em termos da
liberdade e flexibilidade de representação de formas muito complexas, quando comparadas
com as curvas B-spline ou de Bézier [Liang et al. 2002]. Em termos matemáticos, as curvas
B-spline e de Bézier constituem casos particulares das curvas NURBS. Deste modo, para
passar de uma curva NURBS para uma curva racional B-spline, basta fazer iw w= , para
1,...,i n= , o que resulta na degeneração das funções ( ),i pR u nas funções de base ( ),i pN u
[Dimas e Briassoulis 1999]. Uma curva racional B-spline resume-se a uma curva racional de
Bézier, se no vector U não existirem nós interiores 1 1,...,p m pu u+ − −⎡ ⎤⎣ ⎦ , ou seja, a curva possui
apenas um troço e dois valores distintos de iu [Dimas e Briassoulis 1999].
Na extrapolação da definição de curva NURBS para uma superfície NURBS, toda a
formulação de base anteriormente descrita é mantida, mas consideram-se agora duas
direcções parametrizadas, u e v , às quais são associados os graus, p e q , respectivamente,
para definir as funções de base B-spline.
Parte II. Ferramentas numéricas
52
Uma superfície NURBS pode ser definida como sendo a generalização na forma racional,
do produto tensorial de uma superfície racional B-spline [Piegl 1991]:
( ) ( )
( ) ( ) ( )
( ) ( )
, ,0 0
, , ,,
, , ,0 0
, ,
,
n m
i j i ji j
i p j q i ji j n m
k p l q k lk l
u v R u v
N u N v wR u v
N u N v w
= =
= =
=
=
∑ ∑
∑ ∑
S P
, (2.8)
onde ,i jP são os ( ) ( )1 1n m+ × + pontos de controlo que formam a rede bidireccional de
controlo; ,i jw correspondem aos coeficientes de ponderação associados a cada ponto de
controlo; ( ),i pN u e ( ),j qN v são as funções de base B-spline para as direcções u e v ,
respectivamente. Para cada uma das direcções paramétricas é definido um vector de nós
0 ,...,umu u=U para a direcção u e 0 ,...,
vmv v=V para a direcção v . A relação entre o
grau das funções de base B-spline, o número de nós e o número de pontos de controlo, é a
mesma que foi anteriormente descrita na formulação de curva NURBS, considerando-se
individualmente cada uma das direcções paramétricas. A título de exemplo, tem-se para a
direcção u , 1um n p= + + .
Figura 2.10 – Exemplo de uma superfície e rede bidimensional de controlo NURBS.
Uma vez que a utilização das superfícies NURBS neste trabalho compreende operações
matemáticas, como a projecção de um ponto sobre uma superfície ou a intersecção de uma
linha com uma superfície, é necessário definir as derivadas parciais ( ),u u vS , ( ),v u vS ,
( ),uu u vS , ( ),vv u vS e ( ),uv u vS num ponto genérico ( ),u v da superfície. A formulação
apresentada é baseada em [Tsai et. al. 2002, Tsai et. al. 2003 e Wang et. al. 2004].
A determinação das expressões das derivadas parciais para as diferentes direcções
resume-se, em grande parte, ao cálculo das derivadas das funções racionais de base ( ),i pR u .
Estes cálculos são apresentados no Anexo B.
0,2P
0,0Puv
0,1P
1,2P
1,1P1,0P
2,0P2,1P
2,2P 3,2P3,1P
3,0P
( ),u vS
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
53
2.4.3.2 Projecção de um ponto numa superfície NURBS
A formulação matemática seguida neste trabalho para projectar um ponto numa superfície
tem por base o método utilizado por Stadler et al. 2003. Considere-se um ponto genérico P
no espaço Euclidiano, que vai ser projectado ortogonalmente na superfície ( ),u vS , de modo
a obter-se o ponto 'P (ver Figura 2.11).
Figura 2.11 – Projecção de um ponto numa superfície NURBS.
O método para obter a posição do ponto 'P começa pela determinação do vector
distância ( ),u vr , que liga o ponto P a um ponto arbitrário ( ),u vS da superfície,
( ) ( ), ,u v u v= −r S P . (2.9)
A posição do ponto 'P é então obtida estabelecendo-se duas condições de
ortogonalidade, através dos produtos internos ( ) ( ), ,uu v u v⋅r S e ( ) ( ), ,vu v u v⋅r S , tal que:
( ) ( ) ( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )
, , , 0, , , 0
uu v
v
f u v u v u vg u v u v u v
= ⋅ =⎧⎪⊥ ∧ ⊥ ⇒ ⎨ = ⋅ =⎪⎩
S rS r S r
S r. (2.10)
Assim, o problema de encontrar o ponto de projecção 'P reduz-se à determinação das
soluções do sistema de equações não lineares no par de variáveis ( ),u v , o que pode ser feito
recorrendo, por exemplo, ao método iterativo de Newton-Raphson
( )1( 1) ( ) ( ) ( )i i i i−+ ⎡ ⎤= − ⎣ ⎦X X J F X , (2.11)
em que para a iteração i se tem
( )( )( )
( ) ( )( ) ( )
( )( ),
i ii i
ii
f uvg
⎡ ⎤ ⎡ ⎤⎢ ⎥= = ⎢ ⎥⎢ ⎥ ⎣ ⎦⎣ ⎦
XF X X
X (2.12)
e ( )iJ corresponde à matriz Jacobiana de ( )F X calculada em ( )iX :
P
S
uSvS
'Pv
u
Parte II. Ferramentas numéricas
54
( )( )2
( )2
ii
u uu u v uvi
u v uv v vv
f fu vg gu v
∂ ∂⎡ ⎤⎡ ⎤⎢ ⎥ + ⋅ ⋅ + ⋅∂ ∂ ⎢ ⎥= =⎢ ⎥
∂ ∂ ⎢ ⎥⋅ + ⋅ + ⋅⎢ ⎥ ⎣ ⎦⎢ ⎥∂ ∂⎣ ⎦
S r S S S r SJ
S S r S S r S. (2.13)
A velocidade de convergência do método iterativo, ou mesmo a obtenção de uma solução,
são directamente afectadas pela solução inicial (0)X . Assim, para ultrapassar esta limitação, o
vector (0)X utilizado corresponde a um ponto da superfície ( ),u vS tão próximo quanto
possível do ponto P a ser projectado. A selecção da solução inicial ( ),u vS é feita tendo por
base uma listagem de pares de coordenadas curvilíneas ( ),u v ditos adequados, tanto em
termos da dimensão da superfície, como pelo tamanho médio dos elementos da malha de
elementos finitos.
2.4.3.3 Intersecção de uma recta com uma superfície NURBS
Para determinar o ponto de intersecção iP de uma recta com uma superfície paramétrica
NURBS (ver Figura 2.12) é necessário, tal como para a projecção de um ponto numa
superfície NURBS, recorrer a um processo iterativo.
Figura 2.12 – Intersecção de uma recta com uma superfície NURBS.
Para formular o problema, considere-se a recta r definida paramétricamente pelo ponto
genérico ( ), ,x y za a aA e pelo vector ( ), ,x y zv v vv . O ponto de intersecção ( )i , ,x y zP entre a
recta r e a superfície ( ),u vS pode ser obtido directamente pela resolução do seguinte
sistema linear de equações:
( )( )( )
,
,
,
x x x
y y y
z z z
S u v a kv
S u v a kv
S u v a kv
⎧ = +⎪
= +⎨⎪ = +⎩
(2.14)
O sistema de equações anterior pode ser reescrito da seguinte forma:
r iP
( ),u vSv u
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
55
( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )
, , , 0
, , 0,
, , , 0
x x x
y y y
z z z
f u v k S u v a kv
g u v k a kvS u v
h u v k S u v a kv
= − + =⎧⎪⎪ = − + =⎨⎪
= − + =⎪⎩
. (2.15)
A resolução deste sistema é realizada com o método iterativo de Newton-Raphson, sendo
a matriz Jacobiana associada dada por:
( ) ( )( ) ( )( ) ( )
, ,
, ,
, ,
x x
y y
z z
u v x
u v y
u v z
f f fu v k S u v S u v vg g g S u v S u v vu v k
S u v S u v vh h hu v k
∂ ∂ ∂⎡ ⎤⎢ ⎥∂ ∂ ∂ ⎡ ⎤−⎢ ⎥ ⎢ ⎥∂ ∂ ∂⎢ ⎥= = −⎢ ⎥⎢ ⎥∂ ∂ ∂ ⎢ ⎥⎢ ⎥ −⎢ ⎥∂ ∂ ∂ ⎣ ⎦⎢ ⎥⎢ ⎥∂ ∂ ∂⎣ ⎦
J . (2.16)
A determinação do ponto de intersecção de uma recta com uma superfície paramétrica
NURBS pode revelar-se problemática do ponto de vista da velocidade de convergência do
método iterativo, usado para resolver o sistema de equações não lineares associado [Qin et al.
1997]. Porém, no caso concreto deste estudo, e depois de se terem definido as arestas que são
intersectadas pela superfície de corte, é relativamente fácil identificar uma boa solução inicial
para o método iterativo de resolução do sistema de equações.
2.4.3.4 Aplicação do tratamento
No caso em que a definição da superfície de corte é obtida através de uma superfície
paramétrica NURBS adoptam-se, de uma forma geral, as mesmas estratégias para o
tratamento da malha que foram antes descritas para o corte por plano. Assim, apenas no
método de correcção tipo II foram adoptadas ligeiras alterações no cálculo das novas
posições dos nós que são reposicionados, tendo em conta a natureza matemática específica
das superfícies NURBS.
- Correcção tipo I
No que respeita ao método de correcção tipo I, não há quaisquer diferenças face ao
tratamento para a superfície plana, visto não serem alteradas as posições iniciais dos nós que
pertencem aos elementos atravessados pela superfície. Nas Figura 2.13.a e Figura 2.13.b
mostra-se um exemplo de uma malha antes e depois de ser cortada por uma superfície
NURBS através do método de correcção tipo I, respectivamente.
Parte II. Ferramentas numéricas
56
Figura 2.13 – Representação dos diferentes tipos de correcção aplicados ao corte por superfície NURBS.
- Correcção tipo II
De modo a simplificar o processo de obtenção das novas posições dos nós que são movidos
da sua posição inicial, no caso do corte por superfície NURBS não se calcula a intersecção da
face (que contém o nó a mover) com a superfície, seguida da projecção do nó na curva
resultante. Em alternativa, para um resultado final muito similar, em primeiro lugar
projecta-se o nó a mover na superfície de corte, corrigindo-se depois a sua posição de modo a
assegurar a continuidade geométrica da espessura do elemento. Tomando como exemplo o
caso do reposicionamento do nó 6N da Figura 2.14.a, começa-se por obter o ponto 1P que
resulta da projecção ortogonal do nó 6N em ( ),u vS :
( )1 6,proj u v= SP N . (2.17)
Depois de encontrado o ponto 1P realizam-se duas operações para reposicionar o nó na
face do elemento. A primeira consiste em projectar o ponto 1P na face superior do elemento
(Figura 2.14.b), obtendo-se assim o ponto 2P .
( ),u vS
n
a) Malha inicial e superfície ( ),u vS de corte. b) Malha final obtida pelo método de correcção tipo I.
c) Malha final obtida pelo método de correcção tipo II.
d) Malha final obtida pelo método de correcção tipo III.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
57
Figura 2.14 – Representação esquemática do método de correcção tipo II para o corte por superfície NURBS.
A segunda operação (ver Figura 2.14.c) consiste em obter a posição final do nó, que
corresponde ao ponto de intersecção da superfície ( ),u vS com a recta definida pelo nó 6N e
o ponto 2P , através da resolução de:
( ) ( )( ) ( )( ) ( )
6 2 6
6 2 6
6 2 6
, N P N
, N P N
, N P N
x x x
y y y
z z z
x
y
z
S u v k
S u v k k
S u v k
⎧ = + −⎪⎪ = + − ∈⎨⎪
= + −⎪⎩
. (2.18)
A malha resultante da aplicação do método de correcção tipo II para o corte por superfície
NURBS está exemplificada na Figura 2.13.c.
( ),u vS
6N
1P
1N
2N
5N
4N
3N
7N
8N
a) Projecção do nó 6N em ( ),u vS obtendo-se o ponto 1P .
2P
1P 6N 5N
2N 1N
3P 2P
6N 5N
7N 8N
b) Projecção do ponto 1P na face superior do elemento, obtendo-se o ponto 2P (vista 2D).
c) Intersecção da recta 6 2N P com ( ),u vS , obtendo-se o ponto 3P (vista 2D).
Parte II. Ferramentas numéricas
58
- Correcção tipo III
O método de correcção tipo III é aplicado de modo semelhante ao descrito para o corte por
superfície plana. Assim, o reposicionamento dos nós a mover é feito ao longo de uma aresta
cortada do elemento e de acordo com uma direcção pré-definida. De acordo com o exemplo
da Figura 2.13.a, a malha obtida pelo método de correcção tipo III é mostrada na
Figura 2.13.d. Na Tabela 2.1 apresenta-se o algoritmo geral de corte implementado no
programa DD3TRIM.
2.5 Algoritmo de corte – Fase de pós-processamento
Na fase de pós-processamento as tabelas que contêm as coordenadas dos nós e a
conectividade dos elementos são actualizadas de forma sequencial, seleccionando-se todos os
nós e elementos que possuam estatuto GUARDAR.
Durante a fase de correcção, dependendo da orientação relativa dos elementos face à
superfície de corte, podem ser gerados elementos com forma pentaédrica (Figura 2.15.a).
Estes elementos são alvo de uma optimização local do posicionamento de determinados nós,
por forma a minimizar a distorção da malha nessas zonas. A opção de apenas optimizar
localmente o elemento é fundamentada, na mesma linha de raciocínio que foi anteriormente
apresentada para o método de correcção dos elementos cortados, no facto do objectivo
primordial consistir em preservar tanto quanto possível os elementos interiores da malha
(não afectados pelo corte).
Foram implementadas três métodos distintos de tratamento: redistribuição dos nós da
face exterior do elemento (Figura 2.15.b); degeneração do elemento finito hexaédrico de oito
nós num elemento com seis nós, mantendo porém a conectividade original de um elemento
de oito nós (Figura 2.15.c); e, por último, divisão do elemento em cinco novos elementos
(Figura 2.15.d).
A construção sequencial das tabelas de nós e, de forma implícita a numeração aleatória
dos nós, pode ter um grande impacto na largura da banda de não-zeros da matriz rigidez
global e consequentemente na eficiência da resolução dos sistemas de equações lineares
durante a simulação numérica [Alves e Menezes 2001]. Assim, a numeração dos nós da
malha de elementos finitos actualizada é alvo de uma optimização posterior com o intuito de
diminuir a largura máxima da banda de não-zeros da matriz rigidez. O processo de
optimização tem como critério a minimização do valor máximo das diferenças entre os
números máximo e mínimo dos nós de cada elemento, para todos os elementos da malha
[Alves 2003].
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
59
Tabela 2.1 – Algoritmo geral de corte de malhas de elementos finitos hexaédricos do programa DD3TRIM.
INÍCIO
- Fase de Pré-Processamento -
o Aquisição da malha, da superfície de corte e do tipo de correcção a usar
o Preenchimento das tabelas de conectividade dos nós, arestas e faces
o Preenchimento das tabelas de estatutos para todos os nós e elementos:
N-STATUS = GUARDAR; ELIMINAR; SOBRE A SUPERFÍCIE
E-STATUS = GUARDAR; ELIMINAR; A TRATAR
- Fase de Correcção -
REPETIR para todos os elementos com estatuto A TRATAR
o Calcular a percentagem do volume do elemento que está na zona a eliminar
SE Percentagem do volume > 50 % ENTÃO E-STATUS = ELIMINAR
SE Percentagem do volume ≤ 50 % ENTÃO E-STATUS = GUARDAR
o Aplicar método de correcção (para o caso de corte por plano):
CASO 1 Suprimir da malha todos os nós e elementos com estatuto ELIMINAR
CASO 2 Aplicar CASO 1 e projectar nós na linha que resulta da intersecção do plano de corte com a face que contém o nó a mover
CASO 3 Aplicar CASO 1 e mover nós para a intersecção da aresta cortada (que contém o nó a mover) com o plano de corte
FIM REPETIR
- Fase de Pós-Processamento -
o Actualizar sequencialmente as tabelas de nós e de elementos
o Corrigir os elementos de forma pentaédrica:
CASO 1 Redistribuir os nós da face exterior
CASO 2 Degenerar o elemento
CASO 3 Dividir o elemento em cinco
o Gerar a malha final
FIM
Parte II. Ferramentas numéricas
60
Figura 2.15 – Optimização local dos elementos de forma pentaédrica.
2.6 Algoritmo de divisão de malhas
O algoritmo de divisão de malhas permite efectuar um corte localizado numa malha de
domínio fechado, através da divisão dos elementos atravessados pela superfície de corte. O
desenvolvimento deste algoritmo teve como principal objectivo permitir realizar testes
relacionados com a previsão de retorno elástico como, por exemplo, o ensaio padronizado de
abertura de anéis extraídos a partir de conformados axissimétricos.
A metodologia seguida para efectuar a divisão dos elementos tem por base a aplicação
dos algoritmos de corte anteriormente descritos, adicionando-lhes as devidas restrições e
especificidades. Sob este ponto de vista, o algoritmo de divisão de malhas (Tabela 2.2) pode
ser considerado como complementar ao algoritmo geral de corte apresentado.
Para esta operação é apenas considerado o caso da divisão de malhas por superfície plana
e mantém-se toda a estrutura e opções de correcção relativas ao algoritmo de corte. No que
respeita aos dados de entrada, para além da caracterização do plano de divisão, é necessário
definir um vector que localize a zona da malha onde vai ter lugar a divisão. Para isso,
recorre-se à aquisição de dois pontos, um interior ( intP ) e outro exterior ( extP ), ao domínio
fechado da malha (ver Figura 2.16.a).
6
21
3
5
4
78
Conectividade: [1 2 3 4 5 6 7 8]
a) Elemento original. b) Elemento depois de aplicada a distribuição de nós.
1
2
4
3
5 6
Conectividade: [1 1 2 3 4 4 5 6]
c) Elemento degenerado em pentaedro. d) Elemento dividido em cinco.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
61
Tabela 2.2 – Algoritmo geral da divisão de malhas do programa DD3TRIM.
A estratégia implementada no algoritmo de divisão de malhas é conseguida à custa de
duas operações de corte consecutivas, cada uma correspondente a um dos lados do plano
(lado 1 e lado 2, Figura 2.16.a e Figura 2.16.b, respectivamente). No entanto, só são
eliminados os elementos atravessados pelo plano de divisão, que são entretanto substituídos
pelos elementos resultantes de cada uma das correcções. Assim sendo, o método resume-se a
duas etapas. Na primeira, respeitando a orientação predefinida do plano (vector normal 1n
na Figura 2.16.a) corrigem-se os elementos afectados pela divisão sendo adicionados novos
elementos às tabelas de conectividade finais.
INÍCIO
- Fase de Pré-Processamento -
o Aquisição da malha, da superfície de divisão e do tipo de correcção a usar
o Preenchimento das tabelas de conectividade dos nós, arestas e faces
- Fase de Correcção - LADO 1
o Alocação de estatutos para nós e elementos:
N-STATUS = GUARDAR; ELIMINAR; SOBRE A SUPERFÍCIE
E-STATUS = GUARDAR; ELIMINAR; A TRATAR
CHAMAR CORTE (apenas para correcção dos elementos)
o Criar novos nós e elementos para substituir os elementos divididos
- Fase de Correcção - LADO 2
o Inverter a orientação do plano de divisão
o Recuperar a malha original e preencher novamente as tabelas de estatutos para nós e elementos
CHAMAR CORTE (apenas para correcção dos elementos)
o Criar novos nós e elementos para substituir os elementos divididos
- Fase de Pós-Processamento -
o Corrigir e actualizar as tabelas finais de nós e de elementos
o Gerar a malha final
FIM
Parte II. Ferramentas numéricas
62
Figura 2.16 – Representação esquemática das fases de tratamento do algoritmo de divisão de malhas.
Depois de corrigido um dos lados da malha recupera-se a malha original, inverte-se a
orientação do plano (vector normal 2n na Figura 2.16.b) e repete-se o mesmo procedimento
de correcção explicado para o lado 1. No final do tratamento, os elementos atravessados pelo
plano de divisão (estatuto A TRATAR) são eliminados da malha original, sendo substituídos
pelos novos elementos entretanto criados.
2.7 Testes numéricos de eficiência
Uma vez que os métodos de correcção implementados podem alterar, de modo mais ou
menos significativo, a geometria dos elementos atravessados pela superfície de corte,
importa avaliar o desempenho das malhas cortadas durante a simulação numérica de um
processo mecânico onde ocorram grandes deformações. Para esse efeito, foram simulados
dois ensaios mecânicos simples, tracção uniaxial e flexão, utilizando malhas de elementos
finitos recortadas a partir de uma malha inicial e aplicando os diversos métodos de correcção
desenvolvidos. As simulações numéricas foram realizadas utilizando o programa DD3IMP.
As malhas de teste têm dimensão 100 mm × 20 mm × 1 mm e são extraídas através de
quatro operações de corte, a partir de uma malha regular com tamanho de elemento no
plano de 2 mm. Foram considerados três ângulos (15°, 30°, 45°) para definir a orientação das
malhas de teste relativamente a uma direcção predefinida (ver Figura 2.17).
π π
1n intP
Zona de divisão extP
2n
a) Lado 1 a) Lado 2
π
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
63
Figura 2.17 – Orientação da extracção das malhas de teste a partir de uma malha regular.
Na execução das operações de corte foram utilizados os métodos de correcção tipo II
(malhas denominadas “Caso II”) e tipo III (malhas denominadas “Caso III”). O método de
correcção tipo I não foi utilizado, visto não permitir reproduzir com precisão a fronteira de
corte. Na optimização local dos elementos de forma pentaédrica, foram utilizadas as opções
de degeneração (acrescenta-se o sufixo “D” à designação da malha, por exemplo,
“Caso II D”) e de distribuição dos nós da face exterior (neste caso não é adicionado nenhum
sufixo à designação da malha). A estratégia de dividir os elementos de forma pentaédrica em
cinco elementos interiores foi apenas testada para a orientação de 45° (malha denominada
“Caso 0”). A representação bidimensional de todas as malhas testadas é mostrada na
Figura 2.18.
No caso da malha cortada com orientação de 45°, devido à particularidade desta
orientação, apenas é considerado o método de correcção tipo II, pois a malha obtida pela
aplicação do método de correcção tipo III é muito semelhante.
As características numéricas das malhas estão compiladas na Tabela 2.3, onde NE
denomina o número de elementos, NN o número de nós da malha e NC o número de
camadas de elementos na direcção da espessura. O comportamento do material foi modelado
através da lei de encruamento de Swift e do critério de plasticidade de Hill’48 [Hill 1948]. A
descrição detalhada da caracterização do material encontra-se compilada na Tabela D.1 do
Anexo D.
De modo a aferir o desempenho dos elementos de bordo criados com os diferentes
métodos de correcção, os resultados obtidos com as malhas de teste foram comparados com
os resultados da malha de referência (tamanho de elemento regular e a mesma orientação da
malha de base, ver Figura 2.18.a.
Ângulo de orientação
Malha de base
Parte II. Ferramentas numéricas
64
Figura 2.18 – Distribuição planar dos elementos finitos nas diferentes malhas recortadas para simular os testes elementares.
Tabela 2.3 – Características numéricas das malhas de elementos finitos utilizadas nas simulações dos ensaios mecânicos.
Orientação 0° 15° 30° 45°
Malha NC NE NN NE NN NE NN NE NN
1 500 1122 Regular
2 1000 1683
1 500 1148 500 1164 532 1234 Caso II
2 1000 1722 1000 1746 1064 1851
1 500 1086 500 1048 532 1066 Caso II D
2 1000 1629 1000 1572 1064 1599
1 501 1152 500 1164 Caso III
2 1002 1728 1000 1746
1 501 1088 500 1048 Caso III D
2 1002 1632 1000 1572
Caso 0 1 868 1906
a) Malha de referência com tamanho de elemento regular (2 mm).
b) Malha com orientação de 15° – Caso II. c) Malha com orientação de 15° – Caso III.
d) Malha com orientação de 30° – Caso II. e) Malha com orientação de 30° – Caso III.
f) Malha com orientação de 45° – Caso II. f) Malha com orientação de 45° – Caso 0.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
65
2.7.1 Ensaio de tracção uniaxial
No caso do ensaio de tracção uniaxial consideraram-se apenas malhas com uma camada de
elementos na direcção da espessura. O alongamento total imposto ao provete é de 12 mm
(ver Figura 2.19). A variável escolhida para avaliar o desempenho de cada um dos métodos
de correcção consistiu apenas na deformação plástica equivalente para o deslocamento final
considerado, visto que não se observaram diferenças significativas na evolução da força de
tracção para os diferentes tipos de método de correcção.
Figura 2.19 – Representação esquemática do ensaio de tracção simples.
A distribuição da deformação plástica equivalente para as malhas cortadas com
orientação de 15° (Figura 2.20), permite constatar ligeiras diferenças na zona central da
malha em relação à distribuição obtida para a malha de referência (elementos regulares). Esta
alteração na distribuição dos gradientes de deformação é particularmente visível para as
malhas caso II (Figura 2.20.b), caso II D (Figura 2.20.c) e caso III D (Figura 2.20.e). No que se
refere à opção de degenerar os elementos de forma pentaédrica, observa-se uma
concentração de gradientes mais extensa junto dos nós da extremidade para os casos em que
se aplica a degeneração destes elementos (Figura 2.20.c e Figura 2.20.e), do que para os casos
em que se procede à distribuição dos nós da face exterior (Figura 2.20.b e Figura 2.20.d). Em
termos globais, para esta orientação de corte, o método de correcção tipo II combinado com a
distribuição dos nós das faces exteriores dos elementos de forma pentaédrica é o que menos
afecta a distribuição dos gradientes de deformação relativamente à malha regular
(Figura 2.20.a).
Para as malhas com orientação de 30° (Figura 2.21) a distribuição da deformação plástica
equivalente é homogénea no centro da malha em todos os casos estudados, mas ocorrem
diferenças acentuadas na distribuição dos gradientes de deformação nos elementos do bordo
livre que foram alvo de correcção. Assim, observa-se uma concentração da deformação junto
dos nós do meio da face exterior, que compõem os elementos de forma pentaédrica, nas
100
20 6 6
10
x
y
z Ferramenta
Provete
Parte II. Ferramentas numéricas
66
malhas caso II (Figura 2.21.a) e caso III (Figura 2.21.c). Nas malhas caso II D (Figura 2.21.b) e
III D (Figura 2.21.d) assiste-se também a uma concentração da deformação e em maior
extensão que nas situações anteriores, junto dos nós exteriores dos elementos de forma
pentaédrica degenerados.
No que se refere à diferença de valores de deformação face à malha de referência
(Figura 2.20.a), observam-se ligeiras variações, tanto positivas como negativas, ao longo dos
elementos de bordo. Assim, com base na extensão dos gradientes de deformação registados
nos elementos tratados relativamente à malha de referência, é possível concluir, para esta
orientação de corte, que os métodos de correcção tipo II e III sem aplicar a degeneração dos
elementos de forma pentaédrica conduzem a melhores resultados.
a) Malha de referência (não cortada).
b) Caso II.
c) Caso II D.
d) Caso III.
e) Caso III D.
Figura 2.20 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente das malhas cortadas com orientação de 15° face à malha de referência, para o ensaio de tracção simples.
pε
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
67
Por último, para as malhas de orientação 45° (Figura 2.22), constata-se que a distribuição
da deformação plástica é muito semelhante à evidenciada no teste efectuado com a malha de
referência (Figura 2.20.a), tanto para o caso em que se degeneram os elementos de forma
pentaédrica (Figura 2.22.c), como no caso em que apenas se aplica a distribuição dos nós da
face exterior (Figura 2.22.b).
a) Caso II.
b) Caso II D.
c) Caso III.
d) Caso III D.
Figura 2.21 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente entre as malhas cortadas com orientação de 30° no final do ensaio de tracção simples.
No teste efectuado para avaliar a solução de dividir cada um dos elementos de forma
pentaédrica em cinco (malha caso 0, Figura 2.22.a) observa-se, mesmo neste caso particular
de simetria, o aparecimento de distribuições irregulares e descontínuas entre os elementos
corrigidos e os elementos interiores não afectados pelo corte. A justificação para este facto
pode ser imputada tanto à disparidade de tamanho dos elementos tratados e não tratados
como, também, à distorção de alguns dos cinco novos elementos introduzidos, mesmo não
contendo faces colineares. Assim sendo, e tendo em linha de conta o custo computacional
superior exigido pela introdução de novos elementos na malha final, conclui-se que a
solução de dividir os elementos com forma pentaédrica não traduz vantagens evidentes
quando comparado com as soluções de degeneração ou distribuição de nós.
pε
Parte II. Ferramentas numéricas
68
a) Caso 0.
b) Caso II.
c) Caso II D.
Figura 2.22 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente entre as malhas cortadas com orientação de 45°, no final do ensaio de tracção simples.
2.7.2 Ensaio de flexão
No ensaio de flexão, provetes com as mesmas dimensões dos utilizados no caso do ensaio de
tracção simples foram solicitados do seguinte modo (ver Figura 2.23): uma das extremidades
é encastrada (restringindo-se todos os deslocamentos e rotações dos nós de bordo livre) e na
outra extremidade é imposto um deslocamento no sentido negativo do eixo Oz de 50 mm
(nós da face superior do bordo livre). As malhas de elementos finitos usadas possuem
exactamente a mesma distribuição planar de elementos finitos que as malhas apresentadas
na Figura 2.18 e duas camadas de elementos na direcção da espessura (ver Tabela 2.3). Uma
vez que a opção de dividir os elementos de forma pentaédrica comporta um esforço de
cálculo acrescido, o qual mostrou ser infrutífero tendo em conta os resultados do ensaio de
tracção (Figura 2.22.a), este tipo de estratégia de optimização local não foi utilizado no ensaio
de flexão.
Para analisar a influência das alterações efectuadas ao longo da fronteira de corte nos
resultados da simulação, na Figura 2.24 mostra-se a evolução da força de flexão em função
do deslocamento, para cada uma das malhas testadas. Em termos absolutos não são
perceptíveis diferenças relevantes na evolução da força entre malhas cortadas com a mesma
orientação, pelo que se agruparam as curvas no gráfico em função da orientação de extracção
das amostras. Este resultado pode ser justificado, tanto pelo facto de a zona de influência dos
pε
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
69
elementos cortados e corrigidos ser pequena, quando comparada com o número total de
elementos que constituem o provete, como por se estar a avaliar um parâmetro macroscópico
de análise, como é a força de flexão.
Figura 2.23 – Representação esquemática do ensaio de flexão.
Observa-se que existe uma relação directa entre o ângulo de rotação da malha cortada e o
valor da força de flexão. Assim, à medida que o ângulo de rotação aumenta a força máxima
prevista decresce. Este resultado pode encontrar justificação no seguinte facto: se forem
consideradas linhas de nós paralelas ao eixo Ox ou Oy da malha (ver Figura 2.23 e
Figura 2.18), observa-se que a distância entre estas linhas diminui à medida que o ângulo de
rotação da malha aumenta até 45°, ou seja, ocorre uma redução efectiva do tamanho médio
dos elementos relativamente à direcção de solicitação. Isto conduz à diminuição da força
calculada na simulação, ainda que os elementos conservem, na generalidade, o seu tamanho
original e o número total de nós e de elementos não varie significativamente com o ângulo
de corte. O conhecimento deste facto pode ser de grande utilidade, nas aplicações em que o
programa DD3TRIM seja usado para gerar malhas com geometria complexa e em que a
aplicação requeira uma orientação predefinida.
A segunda variável estudada para comparar o desempenho das malhas produzidas com
cada um dos métodos de correcção, consistiu na medição do ângulo de retorno elástico (α )
do provete. Este ângulo é calculado medindo a diferença angular da extremidade não
deformada do provete entre dois instantes: quando o deslocamento total é atingido e após
anular a imposição do deslocamento (ver Figura 2.25). À semelhança do que já tinha sido
observado para a variável força de flexão, os valores dos ângulos de retorno elástico sofrem
pouca variação com a alteração do método de correcção, para uma dada orientação do corte.
100
20
50
x
z
y d
Parte II. Ferramentas numéricas
70
Ainda assim, observa-se que a opção de degenerar os elementos de formas pentaédricas faz
baixar ligeiramente o ângulo de retorno elástico, embora a variação máxima não ultrapasse
três décimas de grau. Este facto pode ser justificado pela rigidez adicional introduzida no
bordo da malha por via dos elementos degenerados que possuem menos graus de liberdade.
0
10
20
30
40
50
0 10 20 30 40 50Deslocamento z [mm]
Forç
a [N
]
Referência Série de orientação 15°Série de orientação 30° Série de orientação 45°
Figura 2.24 – Evolução da curva de força em função do deslocamento para o ensaio de flexão, para as diferentes malhas testadas.
No que respeita ao efeito de rotação da malha, observa-se que o ângulo de retorno elástico
aumenta com o ângulo de rotação da malha. Tal facto pode ser justificado novamente pela
redução efectiva do tamanho médio dos elementos face à direcção de solicitação.
Para avaliar com mais pormenor as diferenças entre os métodos de correcção usados para
tratar os elementos afectados pelo corte, comparam-se as figuras de isovalores de
deformação plástica equivalente para cada orientação de malha, na situação de deslocamento
máximo (Figura 2.26, Figura 2.27, Figura 2.28). Fazendo uma análise global para as três
orientações (15°, 30° e 45°) observa-se que a distribuição da deformação plástica equivalente
é bastante dependente da orientação da malha visto que, em nenhum dos casos é possível
reproduzir correctamente a distribuição da deformação da malha de referência
(Figura 2.26.b). Além disso, os valores de deformação plástica equivalente junto ao bordo
encastrado das malhas cortadas são inferiores aos da malha de referência.
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
71
Figura 2.25 – Comparação dos valores do ângulo de retorno elástico obtido para cada uma das malhas testadas no ensaio de flexão.
Comparando os resultados das malhas cortadas com orientação de 15° (Figura 2.26) são
visíveis ligeiras diferenças, quer entre os tipos de correcção de base (tipo II ou III) utilizados,
quer entre as opções de degenerar, ou não, os elementos de forma pentaédrica. Observa-se
ainda que o método de correcção tipo III (Figura 2.26.e) leva ao aparecimento de maior
concentração de deformação junto dos nós que pertencem às faces colineares dos elementos
de forma pentaédrica. A aplicação da degeneração aos elementos de forma pentaédrica
conduz a uma redução efectiva dos gradientes de deformação (Figura 2.26.d e Figura 2.26.f).
No entanto, não é possível generalizar e afirmar que a sua aplicação traduz melhores
resultados na previsão dos gradientes que se desenvolvem ao longo da direcção longitudinal
do provete, relativamente à opção de apenas distribuir os nós do elemento.
Para o caso da orientação de corte de 30° (Figura 2.27), é mais uma vez constatável que o
método de correcção tipo III conduz a piores resultados globais em termos da previsão dos
gradientes de deformação face aqueles obtidos com a malha regular (Figura 2.26.b). Quanto à
opção de tratamento dos elementos de forma pentaédrica (Figura 2.27.b e Figura 2.27.d),
observa-se novamente que a degeneração elimina o aparecimento de gradientes muito
elevados junto destes elementos, se bem que, na malha tratada com o método de correcção
tipo II o resultado obtido sem degeneração (Figura 2.27.a) pareça ser globalmente melhor.
12.012.7 12.6 12.7 12.5
13.9 13.6 13.7 13.714.3 14.1
8
10
12
14
16
18
0º Refe
rência
15º C
aso II
15º C
aso II
D
15º C
aso II
I
15º C
aso II
I D
30º C
aso II
30º C
aso II
D
30º C
aso II
I
30º C
aso II
I D
45º C
aso II
45º C
aso II
D
Âng
ulo
de re
torn
o el
ásti
co [º
]α
Antes do retorno elástico
Depois do retorno elástico
α
Parte II. Ferramentas numéricas
72
a) Malha de referência (vista global). b) Malha de referência.
c) Malha caso II. d) Malha caso II D.
e) Malha caso III. f) Malha caso III D.
Figura 2.26 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente das malhas cortadas com orientação de 15° e a malha de referência, no final do ensaio de flexão.
Por último, nas malhas de orientação 45° (Figura 2.28), que representam um caso especial
de simetria, constata-se apenas uma ligeira concentração de deformação nos elementos de
forma pentaédrica (caso II, Figura 2.28.a). No entanto, a opção de não degenerar este tipo de
elementos parece conduzir a um resultado global melhor, em termos da distribuição da
deformação plástica equivalente.
pε
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
73
a) Malha caso II. b) Malha caso II D.
c) Malha caso III. d) Malha caso III D.
Figura 2.27 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente entre as malhas cortadas com orientação de 30°, no final do ensaio de flexão.
a) Malha caso II. b) Malha caso II D.
Figura 2.28 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente entre as malhas cortadas com orientação de 45°, no final do ensaio de flexão.
pε
pε
Parte II. Ferramentas numéricas
74
2.8 Conclusões e comentários
Os algoritmos desenvolvidos com vista ao corte/divisão de malhas constituídas por
elementos finitos sólidos de oito nós, provaram ser bastante eficazes e robustos, tanto nos
testes elementares utilizados para validar as opções algorítmicas tomadas na implementação
das metodologias geométricas, como num número já apreciável de casos reais de aplicação
[Baptista et al. 2005a, Oliveira et al. 2006, Alves et al. 2005, Alves et al. 2006a, Padmanabhan et
al. 2006].
Em termos globais, considerando-se os resultados obtidos nos dois testes elementares
estudados, pode concluir-se que o impacto da distorção imposta aos elementos que
constituem a nova fronteira da malha depois de cortada é reduzido e restringe-se à zona de
correcção. Em particular, no que diz respeito à relação entre a distorção dos elementos e a
sua resposta face à solicitação, observou-se que os resultados globais (distribuição de
variáveis como a evolução da força de carregamento ou a variação do ângulo de retorno
elástico, no caso do ensaio de flexão) não são grandemente afectados pelos diferentes tipos
de correcção. Por outro lado, constatou-se que a opção de subdivisão local de elementos
(ainda que neste estudo só tenha sido aplicada aos elementos de forma pentaédrica) não
conduz a melhores resultados, podendo contribuir, no entanto, para um aumento
significativo do número de elementos e consequentemente do tempo de cálculo.
No que respeita à eleição da melhor solução de correcção, observou-se que o método de
correcção tipo II é o que conduz a resultados globalmente melhores, independentemente do
tipo de solicitação a que é sujeita a malha (nos testes realizados). Em particular, pode ser
referido que a opção de apenas distribuir os nós da face externa dos elementos de forma
pentaédrica é, regra geral, suficiente para atenuar a sua distorção pela presença das faces
colineares, embora a solução de degeneração também permita melhorar o desempenho
destes elementos, dependendo do tipo de solicitação e da orientação de corte da malha.
Para além da função específica de corte/divisão de malhas de elementos finitos entre
estados intermédios de uma sequência de estampagem multi-etapas, o programa DD3TRIM
pode ser também usado com grandes vantagens, nomeadamente no que respeita ao tempo
de pré-processamento, como gerador de malha. De facto, existem diversos casos, como por
exemplo em malhas de contornos muito complexos e/ou com orifícios, em que pode ser
muito mais expedito partir de uma malha base regular e remover o excesso de volume
através do corte, do que gerar a malha de modo convencional (gerar primeiro a superfície e
depois criar a malha num programa comum de pré-processamento). Esta metodologia foi
utilizada com sucesso, como será mostrado mais à frente no texto, na geração de malhas que
incluem domínios de soldaduras em que a orientação do cordão não é ortogonal com as
direcções características (transversal e longitudinal) do provete. Mais recentemente, o
Capítulo 2. Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
75
programa DD3TRIM, integrado com o programa DD3IMP, permitiu o desenvolvimento de
uma metodologia de optimização da dimensão e forma iniciais do esboço de uma taça
rectangular [Padmanabhan et al. 2006]. Neste caso o programa DD3TRIM é utilizado para
gerar, a cada iteração de optimização, a malha inicial que é utilizada na simulação da
conformação do componente.
Parte II. Ferramentas numéricas
76
77
CAPÍTULO TRÊS
Remapeamento de variáveis
Neste capítulo é abordado o problema da transferência de variáveis – remapeamento – entre duas malhas de elementos finitos com diferentes discretização e/ou topologia. São apresentados em detalhe três métodos de remapeamento distintos, dois dos quais representam novas abordagens ao problema. É dado também destaque ao problema da localização de pontos em malhas de elementos finitos. No final do capítulo mostra-se a avaliação de desempenho dos diferentes métodos e estratégias implementados, utilizando vários testes numéricos de eficiência e alguns casos de estudo onde foi utilizado o programa DD3TRIM.
3.1 Enquadramento
Um dos objectivos transversais sempre que se recorre a métodos numéricos, para resolver
problemas de engenharia ou de outras áreas científicas, consiste em estabelecer uma relação
optimizada entre a precisão que se impõe à previsão da solução e o tempo de cálculo
consumido para a obter. Particularizando para o método dos elementos finitos, uma das
abordagens utilizadas para obter uma melhor relação precisão/tempo de cálculo para a
simulação numérica, consiste em criar uma discretização optimizada do modelo real. A
discretização óptima será aquela que possui a menor distribuição de nós/elementos, capaz de
traduzir a quantidade e a qualidade da informação desejada, nos pontos onde é requerida.
De modo a obter relações optimizadas entre a precisão e o tempo de cálculo, ou mesmo
como forma de permitir a exequibilidade de uma dada simulação, é habitual modificar a
distribuição e/ou o número dos nós/elementos da malha de elementos finitos em um ou em
Parte II. Ferramentas numéricas
78
vários instantes intermédios do cálculo. Esta operação intermédia é geralmente designada
por remalhagem ou regeneração de malha. A remalhagem pode ainda ser classificada por
refinamento ou desrefinamento, consoante o número de nós/elementos é, respectivamente,
aumentado ou diminuído, de modo localizado ou em todo o domínio da malha. Os
fundamentos teóricos que conduzem à necessidade da operação de remalhagem estão, em
muitos casos, longe de se resumirem apenas à minimização do tempo de cálculo e
incremento absoluto da precisão dos resultados. De facto, a remalhagem é comummente
utilizada na resolução de problemas de distorção/deformação excessiva de elementos, que
ocorrem na simulação de alguns processos tecnológicos, como por exemplo, do forjamento
de materiais [Martins et al. 1994, Alves et al. 2003, Chung et al. 2003], do corte por arranque de
apara [Ee et al. 2005, Bäker et al. 2002] e, no âmbito concreto deste trabalho, na simulação do
processo de estampagem de chapas [Moreau et al. 2005].
A operação de remalhagem aparece, também, muitas vezes associada à formulação de
base de determinados métodos numéricos, sendo de realçar a formulação acoplada do
Lagrangeano Euleriano Arbitrário1 que foi originalmente desenvolvida para simular
problemas de mecânica de fluidos e mais tarde generalizada para resolver problemas mistos
do tipo fluido/sólido e de mecânica dos sólidos [Martinet e Chabrand 2000, Askes e Sluys
2000, Kuhl et al. 2004].
Uma vez que durante o processo de remalhagem existem nós/elementos que são
eliminados, adicionados, ou vêem alterada a sua posição espacial, é necessário transferir as
variáveis da simulação, da malha de origem para a malha de destino (resultante da
remalhagem) de modo a preservar a evolução das variáveis histórico-dependentes e, deste
modo, dar continuidade à simulação. Esta operação de transferência de variáveis entre duas
malhas, que podem diferir tanto em termos de discretização como de topologia (desde que a
malha de destino esteja contida na malha de origem), designa-se normalmente por
remapeamento. O prefixo ‘re‘ realça o facto do domínio da malha ser novamente preenchido
(mapeado) com base em variáveis recalculadas, por oposição ao mapeamento inicial da
malha não deformada.
No método dos elementos finitos há que distinguir a natureza (vectorial ou escalar) das
variáveis e o tipo da informação que é calculada quer nos nós, quer nos pontos de integração
de Gauss que se encontram no interior dos elementos. As variáveis calculadas nas posições
dos nós são designadas por variáveis nodais, como são exemplo as forças e os
deslocamentos. As variáveis avaliadas nos pontos de integração de Gauss são chamadas de
1 Na terminologia anglo-saxónica o termo usado é Arbitrary Lagrangian Eulerian (ALE).
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
79
variáveis de estado. Neste grupo, estão incluídas variáveis ou grupos de variáveis, como o
estado de tensão e deformação do material.
De forma sintética, o problema do remapeamento de variáveis entre duas malhas pode ser
descrito como a aproximação de um campo de quantidades, numa distribuição de pontos
(malha de destino), a partir de quantidades iniciais localizadas noutra distribuição de pontos
(malha de origem) [Rashid 2002]. Ou seja, pretende-se extrapolar, ou interpolar, consoante os
casos, os valores das variáveis presentes na malha de origem para a malha de destino.
Dada a sua importância e vasto campo de aplicação, existem muitas referências na
literatura a métodos numéricos dedicados à operação de remapeamento. De modo a
sintetizar uma classificação baseada na relevância e precisão da operação, Jiao e Heath 2004
dividem os métodos de remapeamento de variáveis em quatro grandes grupos, que são
apresentados a seguir.
- Métodos de interpolação/extrapolação
Os métodos de interpolação/extrapolação representam provavelmente a forma mais popular
de transferir variáveis entre duas malhas de elementos finitos. O remapeamento é feito
através de uma função que interpola/extrapola, em uma ou várias etapas, os valores das
variáveis que estão nos pontos da malha de origem, para os pontos da malha de destino. Este
tipo de métodos pode ser dividido em duas classes, consoante a origem da função de
transferência. Os que usam a função de mapeamento original do método numérico usado na
simulação, como são exemplo as funções de forma dos elementos finitos [Hinton e Campbell
1974, Lim et al. 1992, Perić et al. 1996, Perić et al. 1999, Zhao et al. 1999b], e os que recorrem a
funções de transferência de ordem superior à das funções de mapeamento originais.
Considerando a natureza matemática deste tipo de métodos (interpolar e/ou extrapolar
conjuntos de valores discretos), também podem ser incluídos nesta categoria métodos
baseados na aplicação do método dos mínimos quadrados [Pedersen 1998, Rashid 2002,
Ehlers et al. 2002, Kim 2003, Alves et al. 2003, Erhart et al. 2006] e o método do Superconvergent
Patch Recovery (SPR) [Khoei e Lewis 1999, Hu e Randolph 1998, Wiberg e Li 1999]
desenvolvido por Zienkiewicz e Zhu [Zienkiewicz e Zhu 1992, Zienkiewicz e Zhu 1995].
- Métodos de aproximação ponderada em função de áreas/volumes
Do ponto de vista físico ou material é relativamente intuitivo considerar que a contribuição
dos valores, por exemplo das variáveis nos pontos de Gauss da malha de origem, para o
remapeamento da malha de destino, possa ser contabilizada em função da área ou volume
ocupada por cada domínio dos pontos de Gauss de origem no domínio do ponto de Gauss
da malha de destino. Assim sendo, a função de transferência de remapeamento nos métodos
Parte II. Ferramentas numéricas
80
de aproximação ponderada em função de áreas/volumes, corresponde à avaliação as áreas
ou dos volumes de intersecção entre o elemento de destino e os elementos da malha de
origem. Estas áreas ou volumes de intersecção actuam como factor de ponderação no cálculo
do valor médio das variáveis. A aplicação deste tipo de método aparece documentada, por
exemplo, nos trabalhos de [Kwak et al. 2002b e Margolin e Shashkov 2003].
- Métodos baseados no uso de elementos mortar
Os elementos do tipo mortar2 foram inicialmente criados com o objectivo de servirem de
ligação, ou união, entre sub-domínios independentes num dado modelo. Na prática estes
elementos constituem uma forma de interpolar informação entre interfaces de sub-domínios
distintos, projectando-se essa informação de um lado, designado não-mortar, para o outro
lado, designado mortar [Jiao e Heath 2004]. Os sub-domínios podem apresentar diferenças,
não só ao nível da transição entre malhas [Arbogast et al. 2000], mas também ao nível da
formulação mecânica [Maman e Farhat 1993, Farhat et al. 1998] ou do tipo de elementos
finitos utilizados [Belgacem e Maday 1997, McGee e Seshaiyer 2004, Barosan et al. 2005].
Na sua essência matemática, o método baseia-se na minimização ponderada de um
resíduo, em que as funções de ponderação correspondem normalmente às funções de forma
do lado mortar [Jiao e Heath 2004]. Do ponto de vista estrito do problema do remapeamento
existem poucas referências da aplicação de métodos de remapeamento baseados no uso de
elementos mortar, destacando-se o trabalho desenvolvido por [Farhat et al. 1998].
- Métodos específicos
Atendendo à multidisciplinaridade, multiplicidade e especificidade das áreas em que os
métodos de remapeamento são usados, é facilmente constatável que a aplicação directa dos
métodos anteriormente categorizados pode não ser adequada em muitos casos. Deste modo,
algumas metodologias específicas foram desenvolvidas para remapear malhas,
nomeadamente: a alocação directa do valor da variável do ponto da malha de origem mais
próximo do ponto a remapear na malha de destino [Luce et al. 2001]; o uso de diferentes
técnicas de remapeamento consoante a natureza e o tipo das variáveis a transferir [Chung e
Kim 2003]; adaptações dos métodos de interpolação/extrapolação ou dos métodos de
aproximação ponderada em função de áreas/volumes aplicando constrangimentos [Ortiz e
Quigley 1991]; e metodologias dedicadas a tipos específicos de formulações ou problemas
[Maman e Farhat 1993, Dukowicz e Baumgardner 2000, Bochev e Shashkov 2005].
2 O termo mortar é empregado com o significado linguístico anglo-saxónico de “unir” ou “juntar”.
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
81
Devido aos ajustes e aproximações dos valores das variáveis para a malha de destino, a
operação de remapeamento pode ser responsável pela introdução de erros significativos no
decorrer da simulação numérica e, consequentemente, conduzir à deterioração global da
qualidade da solução obtida no final do cálculo. Deste modo, o remapeamento de variáveis
constitui uma etapa bastante sensível no cômputo geral da simulação, cuja importância é
naturalmente reforçada pela frequência com que o remapeamento é realizado e que, em
última instância, pode anular ou mesmo fazer regredir a melhoria de resultados conseguida
à custa do aperfeiçoamento das estratégias e dos métodos numéricos usados para simular o
processo em estudo.
Para de alguma forma controlar e minimizar os erros (incontornáveis devido à natureza
discreta da aproximação) introduzidos pela operação de remapeamento, vários autores
[Ortiz e Quigley 1991, Perić et al. 1996, Rashid 2002, Jiao e Heath 2004] apontaram grupos de
características desejáveis de incorporar nos métodos de remapeamento. No trabalho de
fundo sobre remapeamento de variáveis apresentado por Rashid 2002, são resumidas as
seguintes características:
- Auto-consistência
Nos casos em que as malhas de origem e de destino são iguais, a função de transferência de
remapeamento deve reduzir-se ao operador identidade, ou seja, o erro resultante da
operação deve ser nulo. No que respeita aos modelos de remapeamento mais utilizados,
constata-se que os métodos baseados na interpolação/extrapolação através do uso das
funções de forma dos elementos não podem garantir, a priori, a condição de auto-consistência
[Rashid 2002]. Pelo contrário, nos métodos de aproximação ponderada em função de
áreas/volumes, esta condição é automaticamente verificada.
- Localidade
É desejável que os valores recalculados para as variáveis de estado nos pontos de Gauss
dependam unicamente dos valores dos pontos de integração da malha de origem localizados
dentro de uma pequena região de influência, centrada no ponto de integração da malha de
destino a ser remapeado. Além disso, os pontos de integração da malha de origem
encerrados dentro dessa região de influência devem estar topologicamente ligados, isto é,
devem pertencer ao mesmo domínio material ou parte do domínio físico (por exemplo, um
dos lados de uma fenda) e assim actuarem como barreiras à transferência da informação.
Parte II. Ferramentas numéricas
82
- Preservação de descontinuidades
Esta propriedade decorre da característica de localidade do método de remapeamento. As
interfaces de natureza material ou geométrica devem ser tidas em consideração, de modo a
que sejam preservadas as descontinuidades na distribuição dos valores das variáveis da
malha original, resultantes da sua presença.
- Inexistência de amaciamento excessivo
Em certa medida, devido à natureza discreta e aproximada da operação de remapeamento,
pode afirmar-se que o problema do amaciamento dos campos de variáveis (degradação dos
gradientes mais acentuados na distribuição dos valores) é transversal a todos os tipos de
métodos. Contudo, é essencial que a quantidade de amaciamento introduzida pelo método
de remapeamento seja minimizada de modo a preservar, com rigor, os gradientes que
existiam na malha de origem. O efeito de amaciamento está directamente relacionado com o
cumprimento das três características atrás descritas.
- Inexistência de extremos locais artificiais
O surgimento de extremos locais artificiais em determinados locais da malha de destino
pode revestir-se de ainda maior gravidade, quando comparado com o problema do
amaciamento excessivo na distribuição das variáveis. Com efeito, a concentração de valores
artificiais nos pontos de Gauss pode, em muitos casos, conduzir a estados de
tensão-deformação irrealistas face à situação existente na malha de origem. Por exemplo,
uma vez atribuídos valores incongruentes às variáveis de tensão remapeadas, o critério de
plasticidade do material pode ser violado se existirem pontos/regiões que estavam em
regime plástico e que passam a estar em regime elástico ou vice-versa, o que pode ter graves
repercussões na qualidade final dos resultados.
- Capacidade de incorporar constrangimentos
Para além das características anteriormente citadas, o modelo de remapeamento deve ser
suficientemente flexível de modo a poder incluir vários tipos de constrangimentos ou
condições de compatibilidade. Assim, dependendo das particularidades do problema a
simular, o modelo deve incorporar verificações, nomeadamente: à consistência das equações
constitutivas do material (como por exemplo, o critério de plasticidade e a lei de conservação
de volume); às equações de equilíbrio ou movimento [Ortiz e Quigley 1991]; à
compatibilidade do estado de tensão interno com o campo de deslocamentos [Perić et al.
1996]; e à compatibilidade com as condições de fronteira [Perić et al. 1996].
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
83
Apesar das características enumeradas poderem conduzir à melhoria global da qualidade
da operação de transferência, a sua aplicação em simultâneo não é simples e pode tornar-se
computacionalmente onerosa. No entanto, existem alguns trabalhos na literatura que
abordam a operação de remapeamento de modo suficientemente abrangente e aprofundado
de modo a desenvolver métodos mais precisos e fiáveis, sem contudo comprometer
significativamente o tempo de cálculo. Desses trabalhos são de destacar os estudos levados a
cabo por Rashid 2002 e Jiao e Heath 2004.
No método proposto por Rashid 2002, a função de transferência baseia-se em forçar a
igualdade dos campos de variáveis das malhas de origem e de destino dentro de um dado
domínio volúmico. Esta estratégia conduz à aplicação do método de minimização dos
mínimos quadrados, com a particularidade de se atribuir a cada ponto de integração de
Gauss uma região tributária, na qual as variáveis de estado são constantes.
No trabalho apresentado por Jiao e Heath 2004 é utilizada uma metodologia inovadora no
modo de organizar e estruturar a informação (posicionamento e relacionamento dos
elementos e nós) entre as duas malhas envolvidas na operação. O método usado é
denominado por refinamento comum3 e consiste em subdividir e intersectar mutuamente os
elementos da malha de origem e de destino, obtendo-se desta forma uma terceira malha que
serve de malha auxiliar no processo de transferência de variáveis. As principais vantagens
do método consistem em tornar o processo de localização e relacionamento de pontos entre
as duas malhas muito eficiente e permitir a integração precisa, ou mesmo exacta, das funções
de transferência que dependem das funções de forma dos elementos das malhas. Assim
sendo, o método consiste em minimizar um funcional num domínio, no qual são
consideradas as funções de forma dos elementos da terceira malha (resultante das duas
originais). Se as funções de forma forem lineares, e uma vez que a minimização do funcional
envolve funções quadráticas, a integração é exacta se for aplicada uma regra de quadratura
de grau pelo menos superior a dois. Assim sendo, o método resulta auto-conservativo a
menos dos erros residuais do cálculo. Nos casos em que as funções de forma sejam
constantes, o método reduz-se a um método de aproximação ponderada em função de áreas.
Apesar das muitas vantagens do método do refinamento comum, a estratégia base constitui
uma etapa bastante complexa, visto que é necessário possuir um algoritmo de
refinamento/intersecção de malhas simultaneamente expedito e muito robusto. Em
particular, imaginando a aplicação do método a malhas formadas por elementos finitos
hexaédricos, facilmente se conclui que a complexidade dos algoritmos envolvidos e o tempo
3 Na terminologia anglo-saxónica o termo usado é Common Refinement.
Parte II. Ferramentas numéricas
84
de cálculo exigido para intersectar simultaneamente as duas malhas podem colocar sérios
entraves à aplicação do método.
No desenvolvimento de métodos de remapeamento deve-se ter também em consideração
as relações existentes entre os diferentes tipos de variáveis do problema, de modo a não
remapear variáveis que sejam dependentes de outras, como por exemplo, a variável tensão
equivalente relativamente ao tensor das tensões de Cauchy. De facto, tal procedimento para
além de redundante e, desde logo, penalizador em termos de custos computacionais, pode
conduzir a situações em que a consistência das equações constitutivas do material possa ser
posta em causa [Lee e Bathe 1994, Perić et al. 1996].
No estudo que se apresenta neste capítulo, além da descrição dos métodos de
remapeamento desenvolvidos e/ou implementados, é dado especial destaque à comparação
e avaliação das diferentes estratégias adoptadas, levando em linha de conta não só as
características anteriormente referidas, mas também as especificidades do processo de
simulação de estampagem de chapas e do elemento finito hexaédrico de oito nós.
Neste texto descrevem-se em primeiro lugar os algoritmos de localização de pontos em
malhas de elementos finitos, sendo de seguida descritos os métodos de remapeamento de
variáveis.
3.2 Algoritmos de localização de pontos em malhas
Uma operação que pode ser considerada transversal nos métodos de remapeamento diz
respeito à identificação do elemento que encerra um dado ponto espacial, quer represente
um nó ou um ponto de integração de Gauss. Apesar da operação de localização de pontos
poder parecer à primeira vista simples e/ou secundária, o somatório de tempo de
computação consumido por esta tarefa pode revelar-se bastante significativo no tempo total
da operação de remapeamento, uma vez que tal operação pode ser exaustivamente repetida.
Outra fase não menos importante no processo de busca de elementos consiste no modo
como são pré-seleccionados os elementos mais prováveis de conterem o ponto em análise,
uma vez que, uma estratégia baseada na busca exaustiva a todos os elementos da malha seria
muito onerosa e ineficiente do ponto de vista computacional. Existem várias estratégias para
pré-seleccionar os elementos candidatos à busca. Por exemplo, no trabalho apresentado por
Ehlers et tal. 2002 é usado um método de procura do tipo quadtree (classe de estruturas
hierárquicas de dados baseadas no princípio da decomposição recursiva do espaço, ver
[Samet e Webber 1988, Fiala e Haralick 1987] para mais informação). No trabalho que aqui se
apresenta é aplicada uma estratégia mais específica, pois recorre-se à tabela da conectividade
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
85
inversa dos elementos da malha, para identificar os elementos que são partilhados por um
determinado nó (ver Figura 3.1). Assim sendo, basta encontrar o nó da malha ( PN ) que se
encontra mais próximo do ponto em análise ( P ), para se obter de imediato a lista de
elementos candidatos. De modo a acelerar a busca do nó mais próximo do ponto em análise
é utilizado um método do tipo caixa delimitadora paralela aos eixos coordenados, com o qual é
feita uma triagem prévia dos pontos em teste, baseada na comparação das coordenadas dos
pontos [Okstad 1994].
pN
P
Figura 3.1 – Representação esquemática bidimensional do método de selecção dos elementos mais prováveis de encerrarem um dado ponto P .
Na literatura, quer se considerem malhas de elementos finitos bidimensionais ou
tridimensionais, são recorrentemente mencionados três tipos de estratégias para avaliar se
um elemento encerra um dado ponto: a inversão paramétrica das funções de forma dos
elementos [Martins et al. 1994, Lee e Bathe 1994, Okstad 1994, Ehlers et al. 2002, Alves et al.
2003]; a aplicação de coordenadas de área/volume [Alves et al. 2003]; e o uso de métodos
geométricos [Zhao et al. 1999b, Chung e Kim 2003].
Cada uma destas estratégias é a seguir descrita e avaliada de modo a poder estabelecer-se
uma comparação directa em termos de eficiência numérica e, desta forma, encontrar a
melhor solução para aplicar às malhas constituídas por elementos hexaédricos de oito nós.
3.2.1 Método da inversão paramétrica das funções de forma
Na teoria dos elementos finitos a forma mais comum de interpolar as coordenadas espaciais
e deslocamentos, no interior de cada elemento, consiste em utilizar funções de interpolação
ou de forma, definidas no referencial canónico ( ), ,ξ η ζ do elemento (Figura 3.2).
Parte II. Ferramentas numéricas
86
Figura 3.2 – Representação esquemática da passagem do referencial canónico ( ), ,ξ η ζ para o referencial cartesiano global ( ), ,x y z e vice-versa.
Se as funções de forma usadas para interpolar as coordenadas espaciais são iguais, em
cada nó, às usadas para interpolar os deslocamentos no interior do elemento, a interpolação
diz-se isoparamétrica [Zienkiewicz e Cheung 1990]. Para a variável vector de posição x , a
equação de interpolação assume a forma
( )1
, ,nen
e ei i
iN ξ η ζ
=
=∑x x (3.1)
onde nen é o número de nós do elemento finito e , eiN é a função de forma do elemento e
associada ao nó i e ( ), ,ξ η ζ são as coordenadas canónicas do elemento, cujo intervalo de
variação é [-1; 1] para as três direcções. Para o elemento finito isoparamétrico de oito nós, as
funções de forma podem ser expressas do seguinte modo:
( )( )( )8
1
1 1 1 18i i i i
iN ξ ξ ηη ζ ζ
=
= + + +∑ . (3.2)
Para se obter a posição espacial de um ponto (ou deslocamento) no interior de um
qualquer elemento da malha, basta substituir as coordenadas canónicas e as coordenadas
espaciais dos oito nós do elemento, nas equações (3.1) e (3.2). No entanto, existem muitas
situações em que o objectivo consiste em fazer o contrário, isto é, fornecer as coordenadas
espaciais para obter as coordenadas canónicas correspondentes, o que pode ser conseguido
através da inversão paramétrica das funções de forma.
12
3 4
5 6
7 8
( ), ,x y z=x
( ), ,ξ η ζ=ξ
1
η
2
ζ
ξ 3 4
5 6
7 8
z
y x
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
87
Embora não esteja comprovado que as funções de forma possam ser sempre invertíveis
(tendo em conta a distorção do elemento), não se encontraram condições objectivas que
impeçam a aplicação da inversão isoparamétrica das funções de forma [Knabner et. al. 2002].
Aplicando a inversão isoparamétrica, as coordenadas canónicas ( ), ,ξ η ζ podem ser
determinadas estabelecendo-se um sistema de equações não lineares do tipo
( )
( )
( )
( ) ( )
( ) ( )
( ) ( )
8 8
11 1
8 8
21 1
8 8
31 1
, , , , , , 0
, , , , , , 0
, , , , , , 0
i i i ii i
i i i ii i
i i i ii i
x N x f x N x
y N y f y N y
z N z f z N z
ξ η ζ ξ η ζ ξ η ζ
ξ η ζ ξ η ζ ξ η ζ
ξ η ζ ξ η ζ ξ η ζ
= =
= =
= =
⎧ ⎧= = − =⎪ ⎪⎪ ⎪⎪ ⎪
= ⇒ = − =⎨ ⎨⎪ ⎪⎪ ⎪
= = − =⎪ ⎪⎩ ⎩
∑ ∑
∑ ∑
∑ ∑
(3.3)
que pode ser resolvido recorrendo, por exemplo, a um método iterativo do tipo
Newton-Raphson. No caso concreto do problema de localização de pontos, para avaliar se o
ponto em análise está dentro de um elemento, basta verificar se os valores das três
coordenadas canónicas estão simultaneamente compreendidos no intervalo [-1; 1].
3.2.2 Método das coordenadas volúmicas
A formulação das coordenadas volúmicas aplicada ao problema de localização de pontos em
malhas de elementos finitos pode trazer vantagens acrescidas relativamente aos métodos
baseados na inversão paramétrica das funções de forma, uma vez que são evitados processos
iterativos para resolução de sistemas de equações [Martins et tal. 1994].
Na definição das coordenadas volúmicas, considera-se a decomposição do tetraedro E de
vértices 1P , 2P , 3P , 4P em quatro sub-tetraedros com um ponto em comum, P , localizado
no interior de E (Figura 3.3).
Figura 3.3 - Decomposição de um tetraedro em quatro para definição das coordenadas volúmicas.
1P
2P
3P
4P
P
Conectividade
Sub-tetraedro 1 P 1P 2P 3P
Sub-tetraedro 2 P 1P 2P 4P
Sub-tetraedro 3 P 1P 3P 4P
Sub-tetraedro 4 P 2P 3P 4P
Parte II. Ferramentas numéricas
88
As quatro coordenadas volúmicas ( )1 2 3 4, , ,ξ ξ ξ ξ do ponto P são calculadas dividindo o
volume de cada sub-tetraedro ( iV ) pelo volume do tetraedro ( EV ):
, 1, 4ii
E
V iV
ξ = = . (3.4)
Na transformação linear apenas três das coordenadas volúmicas são independentes, já
que a quarta coordenada pode ser obtida directamente através da soma das coordenadas
volúmicas
1 2 3 4 1ξ ξ ξ ξ+ + + = . (3.5)
Neste trabalho, a aplicação da formulação das coordenadas volúmicas na localização de
pontos em malhas começa pela decomposição do elemento hexaédrico em seis tetraedros,
avaliando-se de seguida se o ponto em análise está, ou não, dentro de um dos tetraedros.
Para isso, são calculadas as coordenadas volúmicas do ponto e avalia-se se a equação (3.5) é
cumprida a menos de uma tolerância. Se tal acontecer, o ponto em análise está dentro do
tetraedro e, por conseguinte, dentro do elemento em teste.
3.2.3 Método geométrico baseado no produto interno de vectores
Uma forma de avaliar se um ponto está dentro de um dado polígono convexo passa por
recorrer à formulação base da geometria analítica. No caso concreto, o método seguido
baseia-se no cálculo de produtos internos de vectores normais e na análise do seu sinal
[Poveda et. al. 2004].
O algoritmo inicia-se com a decomposição do elemento hexaédrico em seis tetraedros e
pelo cálculo do centróide C (eq. (3.6)) de cada tetraedro, entrando com as coordenadas dos
vértices (Figura 3.4.a)
( )y zx
4 44
n nn1 1n 1
P PPC , , , ,
4 4 4n nx y z = ==
⎛ ⎞⎜ ⎟⎜ ⎟=⎜ ⎟⎜ ⎟⎝ ⎠
∑ ∑∑. (3.6)
Depois, para cada tetraedro, determinam-se os pontos de projecção do centróide e do ponto
em análise P em cada uma das faces do tetraedro; pontos C' e 'P para o caso da face
2P , 3P , 4P no exemplo da Figura 3.4.b. Com os pontos de projecção C' e 'P encontrados,
são determinados o vector n ( 'C C ) orientado no sentido do centróide do tetraedro e o
vector v ( 'P P ) orientado no sentido do ponto em análise. Finalmente, calcula-se o produto
interno de n e v e analisa-se o seu sinal. Considerando o mesmo procedimento em todas as
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
89
faces do tetraedro, três situações podem ocorrer: se todos os produtos internos forem
positivos, o ponto ( P ) está dentro do tetraedro; se pelo menos um dos valores é negativo, o
ponto está fora tetraedro; se um dos produtos internos é nulo, o ponto ( P ) pode estar
contido numa das faces do tetraedro, sendo necessário proceder a uma segunda fase de
triagem.
Figura 3.4 - Representação esquemática do processo de localização de pontos por via geométrica: a) Centróide e ponto em análise dentro do tetraedro; b) Projecção do centróide e do ponto
em análise numa das faces do tetraedro (vista 2D).
O procedimento para avaliar se o ponto está contido na face do tetraedro, no caso de um
dos produtos internos ser nulo, é análogo ao anterior, mas com menos uma dimensão
espacial (Figura 3.5).
Figura 3.5 - Localização de um ponto dentro de um polígono triangular.
Assim, depois de calculado o centróide da face do tetraedro ( tC ) através de
( )y zx
3 33
n nn1 1n 1
t
P PPC x,y,z , ,
3 3 3n n= ==
⎛ ⎞⎜ ⎟⎜ ⎟=⎜ ⎟⎜ ⎟⎝ ⎠
∑ ∑∑, (3.7)
P
1n2n
3n
tC
1v2v
3v
4P
2P 3P
1P
2P
3P
4P
C
P
4P
2 3,P P
C
P 'P
'C n
v
a) b)
1P
Parte II. Ferramentas numéricas
90
determinam-se os pontos de projecção de tC e P nas arestas da face, de modo a obterem-se
os vectores in e iv , respectivamente.
Mais uma vez, a análise é feita observando o sinal do produto interno entre os vectores in
e iv . Se o produto interno for não negativo em todas as arestas, o ponto encontra-se dentro
da face e admite-se que estará dentro deste elemento hexaédrico (fim da procura). Se para
pelo menos uma das arestas, o produto interno for negativo, o ponto está fora da face do
tetraedro e, logo, do elemento hexaédrico.
3.3 Método de remapeamento por interpolação/extrapolação simples
Neste trabalho usa-se a designação método de remapeamento por interpolação/extrapolação
simples quando a transferência das variáveis é apenas baseada nas funções de forma
utilizadas para interpolar as coordenadas espaciais e campos de deslocamentos no interior
dos elementos finitos (equações (3.1) e (3.2)). O termo “extrapolação” é empregue, visto que,
no decorrer do processo de transferência de variáveis, existe a necessidade de inverter as
funções de forma para passar a informação dos pontos de Gauss para os nós dos elementos,
ou seja, em certa medida, para se proceder à operação inversa da interpolação comum obtida
através das funções de forma. No caso da transferência das variáveis de estado e nodais, o
método é composto por três etapas. A primeira etapa consiste em extrapolar os valores das
variáveis de estado dos pontos de Gauss para os nós da malha de origem, através da
inversão das funções de forma dos elementos da malha de origem (Figura 3.6.a e
Figura 3.6.b). Deste modo, considerando-se a transferência de uma variável de estado escalar
α , a operação de transferência para o nó genérico i , é expressa por
( )1
1
, ,Ong
On
O e Oi ig i ig
igNα ξ η ζ α
−
=
⎡ ⎤= ⎣ ⎦∑ , (3.8)
em que Oigα corresponde à variável de estado α do ponto de Gauss ig da malha de origem
(O ), Ongn é o número de pontos de Gauss do elemento finito Oe da malha de origem e
Oeig iN é
a função de forma do nó i calculada no ponto de Gauss ig do elemento Oe . Uma vez que o
cálculo de Oiα é repetido para cada elemento da malha que contenha o nó i , o valor final de
Oiα é dado pela média aritmética das contribuições de todos os elementos vizinhos ao nó.
Na segunda etapa, as variáveis nodais e de estado são transferidas por interpolação dos
nós da malha de origem, para os nós da malha de destino, recorrendo-se às funções de forma
do elemento de origem que contém o nó de destino em análise (Figura 3.6.c). A expressão
para esta etapa é dada por
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
91
( )1
, ,One O
nD e Oj i j i
iNα ξ η ζ α
=
= ∑ , (3.9)
onde Djα corresponde à variável genérica α (nodal ou de estado) calculada no nó j da
malha de destino (D ) e Oei jN é a função de forma do elemento de origem Oe associada ao nó
i da malha de origem, calculada no ponto correspondente ao nó j .
Figura 3.6 - Representação bidimensional indicativa do sentido da transferência de variáveis entre as diferentes entidades, no método de extrapolação/interpolação simples: a) Sobreposição das malhas de
origem e de destino; b) Extrapolação das variáveis dos pontos de Gauss para os nós da malha de origem; c) Interpolação das variáveis de estado e nodais dos nós da malha de origem para os nós da malha de destino; d) Interpolação das variáveis de estado dos nós para os pontos de Gauss da malha
de destino.
Na última etapa as variáveis de estado passam dos nós para os pontos de Gauss da malha
de destino, aplicando as funções de forma dos elementos de destino (Figura 3.6.d)
( )1
, ,Dne D
nD e Dig j ig j
jNα ξ η ζ α
=
= ∑ , (3.10)
d)
Ponto de Gauss Nó
a) b)
Malha de origem Malha de destino
c)
Parte II. Ferramentas numéricas
92
em que Digα corresponde à variável de estado α do ponto de Gauss ig da malha de destino,
Dnen é o número de nós do elemento De e
Dej igN é a função de forma associada ao nó j do
elemento De , calculada no ponto de Gauss ig .
O método de remapeamento por interpolação/extrapolação simples constitui uma forma
natural e rápida de transferir informação entre malhas, uma vez que se baseia directamente
nas funções de forma dos elementos finitos. No entanto, ao incluir uma fase de extrapolação
(por recurso à inversão das funções de forma) seguida da ponderação por média aritmética
simples dos valores a colocar em cada nó da malha de origem, o método pode conduzir ao
aparecimento, ora de valores extremos, ora de amaciamento excessivo.
3.4 Método de remapeamento através de mínimos quadrados móveis
Uma vez que a etapa correspondente à transferência das variáveis de estado dos pontos de
Gauss para os nós da malha de origem pode acarretar um nível de erro considerável, quando
efectuada através da inversão das funções de forma, procurou-se desenvolver outros
métodos de remapeamento na expectativa de minimizar e controlar o erro introduzido pela
operação de transferência.
Nos estudos realizados sobre o desenvolvimento dos métodos de simulação numérica
sem malha podem ser encontradas referências a vários métodos de aproximar campos de
variáveis de forma localizada [Belytschko et al. 1996, Atluri e Zhu 1998, Atluri e Zhu 2000].
Um dos métodos mais utilizados consiste na interpolação por mínimos quadrados móveis4.
Este método foi adaptado neste trabalho para transferir a informação dos pontos de Gauss
para os nós da malha de origem. Deste modo, não são consideradas as funções de forma dos
elementos da malha de origem. Além disso, ao possuir parâmetros de ajuste, o método
permite controlar o erro introduzido pela operação de remapeamento. A formulação e
nomenclatura seguidas têm por base os trabalhos de Tabbara et al. 1994 e Belytschko et al.
1996.
Considere-se a determinação do valor de uma variável de estado genérica α no nó i da
malha de origem. Em primeiro lugar define-se o domínio local de influência iΩ (ver
Figura 3.7.a) centrado no nó i , para determinar os pontos de Gauss da malha de origem ( ig )
a serem considerados na interpolação.
4 Na terminologia anglo-saxónica o termo usado é Moving Least Squares.
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
93
Figura 3.7 - Representação esquemática bidimensional do método de remapeamento através de mínimos quadrados móveis: a) Domínio local de influência iΩ ; b) Coeficiente de ponderação ic .
Uma vez que o elemento finito utilizado neste trabalho é do tipo sólido, o domínio iΩ é
definido através de uma esfera de raio iR . Para interpolar a distribuição dos valores de igα , e
assim poder estimar o valor da variável α em função das coordenadas globais de um ponto
genérico x dentro de iΩ , estabelece-se
( ) ( ) ( ) iα = ∀ ∈Ωx P x a x x , (3.11)
em que ( )P x são monómios ou outras funções de x e ( )a x correspondem aos coeficientes
associados a ( )P x . Neste estudo optou-se por utilizar uma base trilinear para a interpolação.
Assim sendo, o vector ( )P x assume a forma
[ ]= 1 x y z xy yz xz xyzP (3.12)
e ( )a x ,
[ ]T1 2 3 4 5 6 7 8= a a a a a a a aa . (3.13)
Os coeficientes ( )a x são determinados através da minimização das diferenças quadráticas
pesadas para a variável α a interpolar
( ) ( ) ( ) ( )2N
ig ig igig
I w α⎡ ⎤= −⎣ ⎦∑x x P x a x (3.14)
1 0.8c =
y
z x
a)
1 0c =
b)
1 1c =
1 0.4c =iΩ
iRi
ig
Parte II. Ferramentas numéricas
94
onde N corresponde ao número de pontos de Gauss encerrados em iΩ e ( )w x define a
função de ponderação associada à posição de cada ponto de Gauss ig .
A minimização de ( )I x conduz à obtenção da equação
( ) ( ) ( )1−=a x A x b x (3.15)
na qual,
( ) ( ) ( ) ( )T
1
N
ig ig igigw
=
= ∑A x x P x P x (3.16)
e
( ) ( ) ( )T
1
N
ig ig igigw α
=
=∑b x x P x . (3.17)
A aproximação só é bem definida se a matriz A (eq. (3.16)) for não-singular, ou seja,
quando N é igual ao número de coeficientes de ( )a x . Contudo, esta condição não é
suficiente se, por exemplo, uma ou mais funções de ponderação são nulas em determinados
pontos de iΩ ou quando existem pontos de Gauss ig colineares. Assim, a solução prática
para a inversão da matriz A passa por aumentar o domínio iΩ e, deste modo, garantir um
mínimo de pontos de Gauss ig que permitam a minimização de ( )I x . É de referir que este
procedimento iterativo acarreta naturalmente custos computacionais acrescidos. Além disso,
em algumas situações, o aumento exagerado de iΩ pode levar a que sejam considerados
pontos Gauss ig demasiado afastados do nó i , podendo não serem suficientemente
representativos da variável material a calcular nesse nó.
A função de ponderação ( )w x é geralmente uma função positiva que decresce de forma
monótona à medida que a distância aumenta relativamente ao ponto i . Na literatura podem
ser encontrados vários tipos de funções de ponderação. Num trabalho sobre o estado da arte
dos métodos de simulação numérica sem malha, Belytschko et al. 1996 destacam as funções
exponenciais, as splines cúbicas e as splines de quarta ordem. Exemplos genéricos destes três
tipos de funções de ponderação são apresentados nas equações (3.18), (3.19), (3.20):
Função exponencial: ( )( )21ce para 1
0 para 1
d dw dd
⎧⎪ ≤= ⎨>⎪⎩
. (3.18)
Spline cúbica: ( )2 3
1 2 3 para 10 para 1c c d c d d
w dd
⎧ + + ≤= ⎨
>⎩. (3.19)
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
95
Spline de quarta ordem: ( )2 3 4
1 2 3 4 para 10 para 1c c d c d c d d
w dd
⎧ + + + ≤= ⎨
>⎩. (3.20)
Nestas equações, d define o quociente ( ) ( ) max/ig i d−x x , em que maxd pode ser definido
pelo raio do domínio iΩ ou pelo valor máximo de ( ) ( )ig i−x x e 1c , 2c , 3c e 4c definem as
constantes de ajuste da função.
No trabalho de Belytschko et al. 1996 é também salientado o facto das funções
exponenciais (como por exemplo a da equação (3.18)) apenas possuírem continuidade de
ordem 1C− em termos formais, visto que o valor da função não é exactamente igual a zero
para 1d = . No entanto, admitindo que apenas os pontos interiores a iΩ são avaliados, a
continuidade das funções exponenciais pode ser considerada de ordem 1C ou superior. No
caso das funções spline cúbicas ou de quarta ordem, estas são construídas de tal modo que
possuam pelo menos continuidade 2C .
Apesar das funções spline poderem descrever com elevada flexibilidade a evolução do
decréscimo da influência dos pontos com o aumento da distância ao centro de iΩ , ao
comportarem várias constantes de ajuste tornam-se difíceis de optimizar, tendo em conta que
a variação das constantes afecta de forma significativa os resultados da interpolação
[Atluri e Zhu 1998].
No caso concreto da aplicação do método de remapeamento através de mínimos
quadrados móveis a malhas usadas na simulação da estampagem, há um aspecto importante
que condiciona a escolha da função de ponderação. Com efeito, devido às características
geométricas das malhas, em que a dimensão da espessura é muito menor do que as
dimensões do plano da malha, não podem ser aplicadas funções de ponderação baseadas
apenas na distância pois, se assim fosse, a contribuição dos pontos localizados na direcção da
espessura seria sobreavaliada face aos pontos do plano. Assim, optou-se pela função de
ponderação
( )( ) ( ) ( )
( ) ( )( )22
2-c1e para 1,
max0 para 1
d ig ic dw d dig id
⎧ −⎪ ≤= =⎨−>⎪⎩
x x
x x. (3.21)
Esta função é composta por uma função base do tipo exponencial, multiplicada por um
coeficiente ( 1c ) que compensa a proximidade dos pontos localizados ao longo da direcção de
espessura.
O coeficiente 1c é definido em função da posição relativa, em termos das camadas, do nó
para onde é transferida a informação e do ponto de Gauss que contribui para a aproximação.
Assim sendo, consideram-se como contribuições não-nulas aquelas em que o ponto de Gauss
Parte II. Ferramentas numéricas
96
ig dista até três camadas de pontos de Gauss do nó i (ver Figura 3.7.b). O coeficiente 1c é
determinado de forma empírica, apresentando-se como valores indicativos os seguintes:
1
1
1
1
1 pontos em camadas adjacentes0.8 pontos separados por uma camada0.4 pontos separados por duas camadas0 restantes casos
cccc
=⎧⎪ =⎪⎨ =⎪⎪ =⎩
. (3.22)
O coeficiente 2c controla directamente a forma da função de ponderação base e é obtido
empiricamente, sendo função da malha de elementos finitos. A título de exemplo, nos casos
de remapeamento estudados, os valores optimizados de 2c situaram-se entre 3.0 e 5.0.
As etapas seguintes da operação de remapeamento são iguais às tomadas no método de
interpolação/extrapolação simples. Deste modo, a transferência das variáveis (de estado e
nodais) dos nós da malha de origem para os nós da malha de destino é feita recorrendo à
equação (3.9), enquanto que na passagem das variáveis de estado dos nós para os pontos de
Gauss da malha de destino é usada a equação (3.10).
3.5 Método de remapeamento incremental volúmico
Os métodos de remapeamento baseados na aproximação ponderada em função de
áreas/volumes, ao cumprirem de forma inerente várias características desejáveis para a
função de transferência (auto-consistência, localidade, inexistência de extremos locais
artificiais), tornam-se particularmente interessantes de implementar nos programas de
elementos finitos. Considerando o caso concreto da transferência das variáveis de estado,
com este tipo de métodos, o remapeamento é realizado num só passo entre os pontos de
Gauss de origem e de destino. Deste modo, o erro de remapeamento pode ser minimizado,
não só pela redução do número de etapas associadas à transferência de variáveis de estado
face a outros métodos (como por exemplo os de interpolação/extrapolação simples), mas
sobretudo por ser evitada a fase de extrapolação das variáveis dos pontos de Gauss para os
nós da malha de origem.
Tendo em conta as vantagens anteriormente descritas, foi desenvolvido um método de
remapeamento baseado na aproximação ponderada das variáveis em função de volumes
designado por Remapeamento Incremental Volúmico. A ideia base do método consiste em
considerar que a cada ponto de integração de Gauss está associada uma região tributária, na
qual as variáveis de estado são constantes [Rashid 2002]. Em particular, como o elemento
finito usado ao longo deste trabalho foi o elemento sólido de oito nós associado a um método
de integração reduzida selectiva, define-se como - volume de Gauss - o espaço
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
97
correspondente a uma oitava parte do elemento finito de oito nós, ao qual está associada a
região tributária de cada ponto de Gauss (ver Figura 3.8.a e Figura 3.8.b). Assim, a
transferência das variáveis de estado entre os domínios das malhas é efectuada calculando os
valores a colocar em cada ponto de Gauss da malha de destino, através de uma média
ponderada que é função do volume de intersecção dos volumes de Gauss de origem e
destino. Por outras palavras, a ponderação faz-se através da determinação da percentagem
do volume de Gauss de cada elemento de origem que está contido no volume de Gauss do
elemento de destino correspondente ao ponto de integração de Gauss em avaliação.
Figura 3.8 - Divisão sequencial do elemento hexaédrico durante o método de remapeamento incremental volúmico: a) Elemento original; b) Divisão em volumes de Gauss; c) Divisão de cada
volume de Gauss de destino; d) Parte elementar do volume de Gauss de destino.
Os métodos de remapeamento baseados na aproximação ponderada das variáveis em
função de volumes apresentam como principal inconveniente o cálculo de volumes de
intersecção entre duas malhas [Grandy 1999 e Rashid 2002] (ver Figura 3.9.a). Na literatura
podem ser encontradas várias estratégias matemáticas de abordar o problema complexo da
intersecção de domínios geométricos, como por exemplo nos trabalhos de Meyer et. al. 1993 e
Venkatasubramanian 1995. A forma mais intuitiva de abordar o problema consiste em
determinar geometricamente os domínios de intersecção. Tal abordagem pode ser
encontrada, por exemplo, no trabalho desenvolvido por Grandy 1999 sobre remapeamento
de variáveis em malhas sólidas. Nesse trabalho, o volume de intersecção entre elementos de
origem e de destino é calculado subdividindo, em primeiro lugar, os elementos poliédricos
em tetraedros, ao que se segue a determinação dos volumes de intersecção entre tetraedros
de forma sistematizada, fazendo-se uso de um complexo algoritmo de intersecções. As
principais desvantagens deste tipo de solução recaem na elevada complexidade algorítmica
exigida, que se traduz na difícil implementação e em custos computacionais elevados, e na
elevada sensibilidade do algoritmo às singularidades geométricas e à precisão
c) b)a) d)
Ponto de Gauss Volume de Gauss Parte elementar
Parte II. Ferramentas numéricas
98
computacional requerida. Assim, a fiabilidade e a precisão do cálculo do volume de
intersecção determinado por este processo, nem sempre podem ser asseguradas.
Figura 3.9 - Representação esquemática bidimensional das etapas do método de Remapeamento Incremental Volúmico: a) Malhas de remapeamento; b) Intersecção dos volumes de Gauss; c) Divisão e
intersecção do volume de Gauss de destino com os de origem.
Tendo em consideração as dificuldades algorítmicas e/ou os problemas de fiabilidade
numérica do cálculo geométrico de volumes de intersecção, vários autores procuraram
soluções alternativas com o objectivo não de calcular com a máxima precisão os volumes de
intersecção, mas sim obter boas estimativas para o seus valores [Rashid 2002]. A corroborar
esta abordagem do problema, existe o facto dos métodos de remapeamento baseados na
aproximação ponderada em função dos volumes consistirem, em si mesmos, numa
estimação ponderada de magnitudes de variáveis em regiões. No trabalho desenvolvido por
Rashid 2002 é apresentado um modo aproximado de calcular os volumes de intersecção
baseado num método de minimização, que aproxima o volume ocupado pelo elemento da
malha de destino no volume tributário dos elementos da malha de origem. O método não
envolve qualquer tipo de procedimento geométrico de intersecção e o autor evidencia que o
objectivo principal do seu desenvolvimento residiu na redução do tempo de computação,
ainda que conseguido à custa de uma menor precisão no cálculo dos volumes de intersecção.
No presente trabalho, a avaliação dos volumes de intersecção também é feita de forma
aproximada, mas recorre-se a um método do tipo discreto, através da divisão dos volumes a
avaliar em blocos regulares. Este e outros tipos de metodologias discretas para estimar o
volume de formas irregulares fazem parte do trabalho apresentado por Houlding 1999.
Apesar do método de avaliação de volumes através da divisão em blocos regulares possuir
algumas desvantagens, nomeadamente por depender da irregularidade e tamanho do
a) b) c)
Ponto de Gauss de origem
Ponto de Gauss de destino
Malha dedestino
Malha de origem
Volume de Gauss de destino
Volume de Gauss de origem
Parte elementar do volume de Gauss
Centróide da parte elementar
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
99
volume a estimar (o que pode conduzir ao aumento do número de blocos e tempo de
computação, para um mesmo nível de precisão da avaliação), no caso presente do
remapeamento de elementos hexaédricos este tipo de metodologia revelou-se muito eficaz.
No método de Remapeamento Incremental Volúmico, depois de se terem divido todos os
elementos da malha de origem em volumes de Gauss, com a correspondente alocação de
variáveis de estado associadas a cada ponto de Gauss, o procedimento de transferência de
variáveis de estado inicia-se com um ciclo sobre todos os elementos da malha de destino a
remapear. Cada elemento de destino a remapear é divido em volumes de Gauss, que irão ser
intersectados com os volumes de Gauss de origem (ver Figura 3.9.b). Em seguida, cada
volume de Gauss do elemento de destino é divido num número predefinido de partes
elementares (blocos regulares) de acordo com as Figura 3.8.c e Figura 3.9.c. Após a partição
do volume de Gauss do elemento de destino em análise, efectua-se um ciclo sobre todas as
partes elementares, de modo a determinar qual o volume de Gauss da malha de origem que
contém o centróide de cada uma das partes elementares (Figura 3.8.d e Figura 3.9.c).
Assume-se que cada centróide representa todo o estado material e volume da parte
elementar. Em simultâneo com o ciclo sobre as partes elementares, um somatório actualiza a
contribuição total, em termos de volume partilhado, de cada volume de Gauss de origem
para o volume de Gauss de destino. Este facto reveste-se de grande importância, visto que,
deste modo, são aproveitadas as vantagens da aplicação de um método discreto para estimar
os volumes de intersecção, sem tornar o algoritmo concreto de remapeamento demasiado
oneroso do ponto de vista computacional.
Em termos matemáticos, a expressão que traduz a aplicação do método de remapeamento
incremental volúmico é
V
1
ngnD O
igig
α α=
= Φ∑ , (3.23)
onde Dα corresponde à variável de estado genérica α a calcular num ponto de Gauss da
malha de destino, ngn representa o número de pontos de Gauss da malha de origem, Oigα
corresponde à variável de estado genérica α associada ao ponto de Gauss ig da malha de
origem e VΦ consiste na função de ponderação volúmica, dada por
3
1V
nlig D
jjig O
tot
V
V=Φ =∑
(3.24)
onde ig DjV é o volume ocupado pela parte elementar j do volume de Gauss da malha de
destino no volume de Gauss ig da malha de origem, ig O
totV corresponde à totalidade do
Parte II. Ferramentas numéricas
100
volume de Gauss ig da malha de origem e nl define o número de divisões lineares (aresta)
do volume de Gauss da malha de destino. Na Tabela 3.1 mostra-se o algoritmo geral do
método de Remapeamento Incremental Volúmico.
Como a pesquisa do volume de Gauss de origem que contém o centróide de uma parte
elementar pode representar um elevado esforço computacional quando executada
repetidamente, antes de se iniciar o remapeamento de um dado volume de Gauss faz-se uma
pré-selecção de volumes de Gauss de origem. A pré-selecção consiste em identificar os
volumes de Gauss de origem suficientes para englobarem todo o espaço ocupado pelo
volume de Gauss de destino a ser remapeado evitando-se, deste modo, buscas redundantes
que tornariam o algoritmo muito ineficiente.
A elaboração da lista de busca (Figura 3.10.a) começa pela obtenção dos volumes de
Gauss de origem que encerram os vértices do volume de Gauss de destino (Figura 3.10.b).
Em seguida são guardados todos os volumes de Gauss que partilham os vértices dos
volumes de Gauss anteriormente encontrados (Figura 3.10.c), completando-se assim a lista
de busca.
Figura 3.10 – Representação bidimensional da etapa de pré-selecção dos volumes de Gauss de origem: a) Intersecção dos volumes de Gauss de origem e destino; b) Localização dos vértices do volume de
Gauss de destino; c) Identificação final dos volumes de Gauss de origem pré-seleccionados.
No que respeita ao remapeamento das variáveis nodais, estas são transferidas mais uma
vez recorrendo às funções de forma dos elementos de origem (equações (3.9) e (3.10)), como
foi antes descrito para os métodos de remapeamento por interpolação/extrapolação e por
mínimos quadrados móveis.
a) b) c)
Volume de Gauss de destino
Volume de Gaussde origem
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
101
Tabela 3.1 – Algoritmo geral do método de Remapeamento Incremental Volúmico.
3.6 Tratamento das variáveis dependentes
A transferência da totalidade das variáveis pertencentes ao modelo constitutivo material ou
do processo em estudo é, na maioria dos casos, inadequada sob o ponto de vista
computacional e, mais importante que isso, pode ser também incorrecta tendo em conta a
qualidade final da operação de remapeamento. Com efeito, considerando o caso do
remapeamento das variáveis de estado de um modelo constitutivo, apenas as variáveis
INÍCIO
o Aquisição da malha de destino (apenas a componente geométrica) e da malha de origem, carregada com a informação das variáveis a transferir
o Divisão dos elementos da malha de origem em volumes de Gauss com a correspondente alocação das variáveis de estado
REPETIR para todos os elementos a remapear na malha de destino
o Dividir o elemento de destino em oito volumes de Gauss
REPETIR para todos os volumes de Gauss do elemento de destino
o Dividir cada volume de Gauss de origem em 3nl partes elementares
REPETIR para todas as partes elementares
o Identificar qual o volume de Gauss de origem que encerra o centróide da parte elementar em avaliação
o Contabilizar incrementalmente a porção de cada volume de Gauss de origem que está contido no volume de Gauss de destino em avaliação
FIM REPETIR
o Calcular os novos valores das variáveis de estado do volume de Gauss (ponto de Gauss) de destino, de acordo com a ponderação dos volumes de intersecção do volume de Gauss de destino com os de origem
FIM REPETIR
o Transferir as variáveis nodais utilizando as funções de forma dos elementos da malha de origem
FIM REPETIR
o Gerar o ficheiro da malha de destino remapeada
FIM
Parte II. Ferramentas numéricas
102
independentes devem ser transferidas dos pontos de Gauss da malha de origem para a
malha de destino. As variáveis dependentes, por seu lado, devem ser recalculadas com base
nas variáveis independentes entretanto remapeadas. Deste modo, o erro de transferência das
variáveis, intrínseco à operação de remapeamento, é minimizado e, sobretudo, elimina-se a
possibilidade de certas variáveis adquirirem valores incoerentes e/ou inadmissíveis, que
coloquem em causa a consistência das equações constitutivas [Lee e Bathe 1994, Perić et al.
1996, Camacho e Ortiz 1997, Hu e Randolph 1998].
Tendo em conta os modelos constitutivos correntemente utilizados na simulação
numérica do processo de estampagem, uma das variáveis dependentes a que se deve dar
especial atenção consiste na tensão de escoamento σ , que descreve a evolução da tensão
limite de elasticidade inicial em tracção uniaxial 0σ . Assim, o valor de σ é recalculado em
cada ponto de Gauss através de, por exemplo
( )0
npKσ ε ε= + , (3.25)
para a lei de encruamento isotrópico de Swift ou através de
( ) ( )0 0 1 exp psat YCσ σ σ σ ε⎡ ⎤= + − − −⎣ ⎦ , (3.26)
no caso da lei de encruamento isotrópico de Voce. Nestas equações, pε representa a
deformação plástica equivalente e os parâmetros K , 0ε , n , satσ e YC são constantes
materiais determinadas experimentalmente.
Outro aspecto muito importante relacionado com a transferência de variáveis
dependentes diz respeito ao cumprimento do critério de plasticidade adoptado para definir a
superfície de plasticidade. Caso a tensão equivalente seja remapeada de forma directa pela
função de transferência podem ser induzidos erros substanciais nos resultados obtidos nas
etapas subsequentes à operação de remapeamento. Em particular, pode conduzir a estados
de tensão que não satisfaçam o critério de plasticidade adoptado [Perić et al. 1996]. Para
evitar este tipo de situações, o remapeamento da tensão equivalente deve ser feito
recorrendo às componentes do tensor das tensões e impondo que o critério de plasticidade
seja cumprido.
3.7 Reequilíbrio do corpo deformável após o remapeamento
Um dos aspectos que também deve ser tido em conta quando se executam operações de
remalhagem e consequentemente de remapeamento, diz respeito ao impacto do método de
remapeamento no equilíbrio do corpo deformável após a operação de transferência de
variáveis. Este aspecto pode ser particularmente sensível quando são utilizadas formulações
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
103
implícitas nos programas de simulação [Feng e Perić 2000]. Apesar de ser a priori desejável
que o equilíbrio do corpo deformável seja mantido após o remapeamento, ele não deve ser
conseguido a qualquer custo, nomeadamente, pelo aumento do erro de transferência
forçando-se o equilíbrio do corpo deformável no desenvolvimento da formulação [Jiao e
Heath 2004].
Neste trabalho, o tratamento do equilíbrio do corpo deformável é feito a posteriori dentro
do programa DD3OSS (reequilibrando-se as forças exteriores aplicadas nos nós da nova
malha). Constatou-se que o corpo deformável é reequilibrado ao fim de poucas iterações e
que as correcções em termos dos valores de deslocamento dos nós são muito reduzidas,
nomeadamente no método do Remapeamento Incremental Volúmico. Este resultado é
coerente com o facto de o equilíbrio do corpo deformável ser pouco afectado se o erro de
remapeamento for minimizado.
Na Tabela 3.2 é apresentado o fluxograma genérico da simulação numérica do processo
de estampagem multi-etapas utilizando a família de programas DD3. O processo de
simulação começa pela obtenção da malha inicial, que pode ser gerada, para malhas simples,
através de programas comerciais de geração de malha (nomeadamente, com o programa
GID5) ou, no caso de geometrias complexas, recorrendo ao programa DD3TRIM
[Baptista et al. 2006, Padmanabhan et al. 2006].
Depois de se ter simulado o processo de conformação plástica e, eventualmente, de
retorno elástico, através dos programas DD3IMP e DD3OSS, respectivamente, seguem-se as
operações intermédias de alteração da topologia da malha e/ou para a mudança de
ferramentas, de modo a iniciar uma nova etapa da simulação. Nestas etapas intermédias
pode ser também realizada a etapa virtual de remalhagem, por exemplo, para adequar a
distribuição dos elementos entre as malhas corrente (malha obtida na etapa de conformação
anterior) e nova (para iniciar a etapa seguinte de conformação).
Após se terem executado as etapas intermédias de corte/remalhagem através do
programa DD3TRIM, segue-se a operação de remapeamento, executada igualmente com o
programa DD3TRIM, para transferir as variáveis (de estado e/ou nodais) da malha corrente
para a malha nova. A malha nova depois de remapeada é reequilibrada, no caso de o corpo
deformável não estar sujeito a constrangimentos de ferramentas, usando-se para o efeito o
programa DD3OSS.
5 Programa para modelação de geometrias, geração de malhas, pós-processamento e visualização de resultados, etc. Ver o sítio http://www.gidhome.com da Internet para mais informação.
Parte II. Ferramentas numéricas
104
Tabela 3.2 – Fluxograma genérico da simulação numérica do processo de estampagem multi-etapas através da família de programas DD3.
3.8 Testes numéricos de eficiência
O desenvolvimento ou implementação de qualquer método numérico pressupõe, muitas
vezes, a aplicação de constrangimentos que podem de certa forma limitar a abrangência e
eficiência das estratégias e algoritmos desenvolvidos, quando aplicados na simulação de
outros processos tecnológicos. Com efeito, se um determinado método é adequado e revela
eficiência, por exemplo, na simulação numérica da conformação plástica de um componente
Corte/Remalhagem DD3TRIM
Malha Nova (Geometria)
Remapeamento DD3TRIM
Reequilíbrio DD3OSS
Conformação/ Retorno Elástico
DD3IMP
Malha inicial
Malha corrente
Mud
ança
de
Ferr
amen
tas
Malha Final Final da
Simulação
Nova etapa
DD3TRIM In
form
ação
par
a o
rem
apea
men
to
DD3OSS
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
105
obtido por forjamento, não quer dizer que esse mesmo método ou estratégia numérica seja
suficientemente eficaz para lidar com algumas das características particulares da simulação
numérica do processo de estampagem de chapas, ou vice-versa. Assim sendo, os métodos de
localização de pontos e de remapeamento anteriormente explanados foram alvo de vários
testes numéricos de modo a aquilatar das suas reais vantagens/desvantagens e, em última
análise, a poder determinar qual das soluções estudadas representa o melhor. Na avaliação
do desempenho dos métodos foram realizados testes elementares e testes ditos concretos.
Estes últimos consistiram na análise de casos de estudo sobre estampagem multi-etapas.
Em todos os testes numéricos que envolveram a recolha de informação relativa ao tempo
de computação foi utilizada, como configuração informática, uma arquitectura com
processador Intel® Pentium® IV a 3.0 GHz e 1.5 Gb DDR-Ram a 400 MHz, associado a um
sistema operativo Microsoft® Windows® 2000. O programa DD3TRIM foi criado usando o
compilador Compaq® Visual Fortran V6.1.
3.8.1 Avaliação do desempenho dos métodos de localização de pontos
Uma vez que os métodos de localização de pontos estudados dependem directamente de
tolerâncias geométricas previamente definidas, a combinação destas tolerâncias com as
características das malhas, nomeadamente a forma dos elementos finitos, pode condicionar a
eficiência da localização. Em particular, no método de localização de pontos através da
inversão paramétrica das funções de forma, o recurso a um método iterativo para resolução
de equações do tipo Newton-Raphson pode induzir diferenças importantes no tempo de
cálculo, quando a operação de localização é realizada em malhas com diferentes níveis de
distorção dos elementos. Atendendo a estes condicionamentos, nos testes realizados foram
consideradas malhas com diferentes distribuições e níveis de distorção dos elementos,
nomeadamente: duas malhas quadradas de 100 mm × 100 mm × 1 mm, uma com distribuição
regular dos elementos (Figura 3.11.a) e outra com distribuição irregular dos elementos
(Figura 3.11.c); e uma malha circular com diâmetro de 200 mm (Figura 3.11.b). Em todos os
casos foi apenas considerada uma camada de elementos na direcção da espessura. As
restantes características das malhas relevantes para a análise encontram-se compiladas na
Tabela 3.3.
Para não influenciar a medição do tempo de cálculo através da selecção de elementos com
forma ou nível de distorção pré-determinados, os testes de localização consistiram em gerar
previamente e de forma aleatória uma lista de 200 pontos encerrados no interior do volume
das malhas e, em seguida, identificar para cada malha qual o elemento que contém cada um
desses pontos utilizando os métodos implementados. Os somatórios dos tempos de
localização de todos os pontos, para cada método e em função da malha, encontram-se
Parte II. Ferramentas numéricas
106
dispostos na Tabela 3.4, em que “Var 1” representa a variação relativa percentual do tempo
de localização em função do método das coordenadas volúmicas e “Var 2” a variação
relativa percentual do tempo em função da malha regular. A tolerância geral usada em todos
os métodos foi de 1×10-10.
a) b) c)
Figura 3.11 – Malhas utilizadas para avaliar o desempenho dos métodos de localização de pontos em malhas: a) Malha quadrada regular; b) Malha circular; c) Malha quadrada irregular.
Da análise dos tempos de localização obtidos, observa-se que o método baseado na
formulação das coordenadas volúmicas é substancialmente mais eficiente do que qualquer
um dos outros dois métodos estudados (inversão paramétrica e geométrico). Com efeito,
tomando como parâmetro de análise a variação do tempo de cálculo em função do método
das coordenadas volúmicas (“Var 1” da Tabela 3.4), constata-se, no caso da malha regular,
que o método da inversão paramétrica exige um tempo de cálculo 306% superior
relativamente ao método das coordenadas volúmicas. Por sua vez, o método geométrico é
ainda mais lento, com um acréscimo de 399%, face à mesma referência.
Tabela 3.3 – Características numéricas das malhas utilizadas nos testes de eficiência dos métodos de localização de pontos em malhas.
Malha Malha regular Malha circular Malha irregular
Número de nós 20402 16419 20518 Número de elementos 10000 10752 10074
Tamanho médio dos elementos [mm] 1 2.50 1.02
Ângulo médio dos elementos (no plano) [°] 90 90 98.12
Para as malhas circular e quadrada irregular a comparação dos tempos de cálculo é ainda
mais favorável para o método das coordenadas volúmicas, no entanto, observa-se que o
método de localização geométrica passa a ser menos penalizado face ao da inversão
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
107
paramétrica. Tal facto pode ser justificado pelo afastamento da forma dos elementos
relativamente à forma cúbica, isto é, pelo aumento do nível de distorção média dos
elementos, o que se traduz na diminuição da velocidade de convergência do método
iterativo de Newton-Raphson utilizado no método da inversão paramétrica. Esta mesma
conclusão é reforçada pela análise da variação relativa do tempo de cálculo em função da
malha regular (“Var 2” da Tabela 3.4), com os métodos geométrico e das coordenadas
volúmicas a mostrarem-se pouco sensíveis à forma e distorção dos elementos, enquanto que
no caso do método da inversão paramétrica se assiste a aumentos no tempo de cálculo na
ordem dos 77% e 48% para as malhas circular e quadrada irregular, respectivamente.
Tabela 3.4 – Tempos totais exigidos para a localização aleatória de 200 pontos através de cada um dos métodos de localização, para cada malha e as respectivas variações de comparação.
Malha regular Malha circular Malha irregular Método Tempo
[s] Var 1 [%]
Var 2 [%]
Tempo [s]
Var 1 [%]
Var 2 [%]
Tempo [s]
Var 1 [%]
Var 2 [%]
Inversão Paramétrica 10.02 +306 - 17.70 +604 +77 14.84 +551 +48
Coordenadas Volúmicas 2.47 - - 2.52 - +2 2.81 - +14
Geométrico 12.33 +399 - 13.33 +430 +8 12.50 +448 +1
Em termos globais, os testes efectuados para comparar a eficiência dos métodos
estudados para a localização de pontos em malhas revelaram, de forma inequívoca, que o
método das coordenadas volúmicas é o método mais rápido para executar este tipo de
operação. Tal facto pode ser de grande importância visto que, na esmagadora maioria dos
métodos de remapeamento, a tarefa de localização de pontos é exaustivamente repetida, pelo
que a redução do tempo de cálculo pode ser significativa. O método geométrico revelou-se
marginalmente mais eficiente relativamente ao método da inversão paramétrica, mas muito
lento quando comparado com o método das coordenadas volúmicas. No entanto, o método
geométrico pode ser útil no reposicionamento ou avaliação do remapeamento de pontos da
malha de destino que se encontrem fora do domínio da malha de origem, uma vez que se
baseia na análise do posicionamento do ponto de busca relativamente a porções de faces do
hexaedro.
3.8.2 Avaliação do desempenho dos métodos de remapeamento
Em operações correntes de remapeamento não é possível saber a priori qual o nível de erro
intrínseco à operação de transferência de variáveis. Tal facto deve-se à natureza discreta da
Parte II. Ferramentas numéricas
108
operação de remapeamento, que envolve a transferência de quantidades entre conjuntos de
pontos com diferentes distribuições espaciais. Assim, de modo a ser possível ter uma base de
comparação fiável para testar o desempenho dos três métodos de remapeamento estudados,
a avaliação do erro é inferida através de operações de remapeamento em que a malha final
de avaliação coincide geometricamente com a malha original. Deste modo, na generalidade
dos casos, a seguir à operação de remapeamento propriamente dita, entre a malha original e
a de destino, executa-se a operação de transferência inversa, entre as duas malhas, o que
possibilita a comparação dos valores nos mesmos pontos espaciais (nós e/ou pontos de
Gauss).
Nos testes numéricos que se apresentam a seguir mostram-se resultados comparativos
dos métodos estudados, em três formas de avaliação distintas. A primeira consiste na
transferência consecutiva de variáveis entre malhas circulares rodadas de N incrementos
angulares iguais no intervalo 0 ,90⎡ ⎤⎣ ⎦ . O segundo teste corresponde a uma operação
simples de remapeamento entre uma malha circular regular e outra irregular, seguida da
operação inversa para avaliação do erro cometido. Finalmente, o terceiro teste consiste na
avaliação da operação de remapeamento (subsequente a uma operação de remalhagem)
levada a cabo no decorrer da simulação do Benchmark 3 – Channel Draw/Cylindrical Cup – da
conferência Numisheet’05 [Baptista et al. 2005b].
A avaliação do erro de remapeamento associado a cada um dos métodos estudados é
apenas realizada para as variáveis de estado, uma vez que o tratamento das variáveis nodais
é feito em qualquer um dos métodos por interpolação, recorrendo-se às funções de forma
dos elementos da malha de origem. Esta decisão é corroborada pelo facto do erro cometido
durante esta operação ser reduzido, atendendo às boas propriedades de interpolação directa
das funções de forma dos elementos finitos [Erhart et al. 2006].
3.8.2.1 Remapeamento sucessivo de uma malha circular rodada
O teste de remapeamento que se apresenta é baseado numa das metodologias de avaliação
de estratégias de remapeamento desenvolvidas por Rashid 2002. De entre as características
interessantes do teste, são de realçar o elevado grau de dificuldade que impõe aos métodos
de remapeamento e o facto de permitir, de forma natural, a comparação directa dos valores
originais das variáveis com os valores finais recalculados durante a operação de
remapeamento, pois a disposição espacial da última malha do teste corresponde à mesma
disposição da malha inicial. O teste começa pelo mapeamento de uma malha circular, com
distribuição simétrica de elementos, com uma variável teórica ( )T x através da função
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
109
( ) ( ) ( )2 2
2220 1 cos 2 ,x y
T r r ra
θ+
= − =x , (3.27)
em que r e θ correspondem às coordenadas cilíndricas e a é o raio da malha.
Neste trabalho considerou-se uma malha circular com 200 mm de diâmetro ( 100a = mm)
contendo uma distribuição de elementos finitos tendencialmente regular e duas camadas de
elementos na direcção da espessura (Tabela 3.5).
Tabela 3.5 – Características das malhas circulares usadas no teste de remapeamento sucessivo de duas malhas circulares rodadas.
Malha Malha circular Malha circular irregular
Número de nós 4179 5571 Número de elementos 2688 3484
Tamanho médio dos elementos [mm] 5.0 4.25
Foram estudados dois tipos de mapeamento. No primeiro, não foi considerado qualquer
gradiente na distribuição da variável ( )T x ao longo da direcção da espessura, cuja
distribuição de isovalores é igual à representada na Figura 3.12.a. No segundo mapeamento,
foi considerado um gradiente na direcção da espessura (quatro pontos de Gauss), que evolui
na direcção negativa do eixo Oz, com a sequência: ( )T x ; ( )0.1 T× x ; ( )0.1 T− × x ; ( )T− x .
Neste caso, as distribuições de isovalores para as faces superior e inferior da malha são
mostradas nas figuras Figura 3.12.a e Figura 3.12.b, respectivamente.
Figura 3.12 – Vistas bidimensionais da distribuição de isovalores da função ( )T x : a) Vista do plano superior da malha; b) Vista do plano inferior da malha. (Caso de uma distribuição não uniforme em
espessura).
a) b)
( )T x
Parte II. Ferramentas numéricas
110
Após se ter obtido a malha inicial mapeada, a geometria dessa malha é utilizada para
gerar as malhas intermédias rodadas que correspondem aos N incrementos angulares entre
0 ,90⎡ ⎤⎣ ⎦ . Durante o teste, cada operação de remapeamento associada a cada incremento de
rotação corresponde à transferência de variáveis da malha mapeada, ou remapeada no
incremento de rotação anterior, para a malha do incremento de rotação corrente. Este
procedimento é repetido sucessivamente até se chegar ao incremento de rotação N do teste,
no qual é aferido o erro total de remapeamento. Uma vez que a malha inicial é simétrica
relativamente aos planos Oxz e Oyz, no último incremento de rotação (N ) obtém-se uma
malha com a mesma distribuição de elementos da malha inicial (não-rodada) relativamente a
esses planos de simetria, podendo-se assim comparar os valores iniciais e finais das variáveis
de estado, nas mesmas posições dos pontos de Gauss, ao fim das N operações de
remapeamento.
A título de exemplo, na Figura 3.13 mostram-se as malhas correspondentes ao teste de
remapeamento para três incrementos de rotação ( 3N = ) para, respectivamente, três
operações de remapeamento sucessivas ( iR ).
Figura 3.13 – Representação esquemática do remapeamento sucessivo de uma malha circular rodada para o teste de três incrementos de rotação ( 3)N = : a) Malha original; b) Malha rodada 30°;
c) Malha rodada de 60°; d) Malha final rodada de 90°.
c)
3R
2R
d)
a) b)
1R
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
111
No método de remapeamento incremental volúmico (“Método III” no texto e figuras que
se seguem), o valor adoptado para o parâmetro nl (ver equação (3.24)), na generalidade das
operações de remapeamento efectuadas, foi de 5.
Antes de executar os testes com o método de remapeamento através de mínimos
quadrados móveis (que será referido no texto e figuras como “Método II”) foi necessário
obter valores optimizados para as constantes 1c e 2c , que controlam a forma da função de
ponderação do método (equação (3.21)). Esses valores foram obtidos de modo empírico
avaliando o erro cometido no remapeamento da malha de origem, com base na informação
dessa mesma malha, ou seja, verificando até que ponto a função de transferência do método
se afasta do operador identidade, no caso das malhas de origem e destino serem iguais. Os
valores optimizados dos coeficientes foram 2 4.0c = e 1c a variar da seguinte forma:
1
1
1
1
1 pontos em camadas adjacentes0.75 pontos separados por uma camada0.5 pontos separados por duas camadas0 restantes casos
cccc
=⎧⎪ =⎪⎨ =⎪⎪ =⎩
.
Finalmente, o método de remapeamento por interpolação/extrapolação simples será
doravante referido no texto por “Método I”.
Em todos os gráficos construídos, para a visualização da evolução do erro de
remapeamento, foi considerada a medida RMS6 do erro nos nós normalizada relativamente à
gama de valores da função ( )T x da malha inicial:
( ) ( )( )( )( ) ( )( )
2
1Erro RMSmax min
nnn D O
i ii
O Onn
T T
n T T=
−=
⎡ ⎤−⎣ ⎦
∑ x x
x x, (3.28)
onde nnn define o número de nós da malha. Neste trabalho considera-se como “erro
máximo” o maior valor de erro absoluto medido na malha, normalizado relativamente à
gama de valores função ( )T x do mapeamento inicial.
Nas Figura 3.14 mostra-se a evolução do erro de remapeamento em função do número de
incrementos de rotação da malha até 9N = , para o caso de mapeamento da malha original
sem gradiente na direcção da espessura.
Da análise dos valores do erro RMS (Figura 3.14.a), observa-se que o método III conduz ao
menor nível de erro, sendo que o valor máximo atingido (para um número de incrementos
de rotação, 9N = ) é cerca de três vezes menor do que o erro máximo obtido pelo método II.
6 RMS – Root Mean-Squared.
Parte II. Ferramentas numéricas
112
O nível de erro associado às operações de remapeamento do método I é ligeiramente
superior ao obtido com o método III, sendo no entanto bastante inferior ao obtido no
método II. A evolução do erro não é sempre monótona e crescente, como a priori poderia ser
esperado, com o aumento do número de operações de remapeamento. Tal facto deve-se à
combinação de determinados incrementos angulares de rotação com a distribuição dos
elementos das malhas, que conduz a uma sobreposição mais perfeita (menos intersecções
entre elementos das duas malhas) entre as malhas de origem (incremento de rotação
anterior) e de destino (incremento de rotação corrente). Este efeito de atenuação do erro é
particularmente visível para o teste com 8N = e revela diferentes níveis de sensibilidade
dos métodos face ao nível de sobreposição das malhas. De facto, no método I (no caso de
8N = ) o nível de redução do erro é mais pronunciado que nos outros dois métodos
estudados, o que mostra uma superior sensibilidade do método relativamente ao número e
complexidade das intersecções entre malhas.
0.000
0.005
0.010
0.015
0.020
0.025
0.030
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9Número de incrementos de rotação
Erro
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
a) b)
Figura 3.14 – Evolução do erro de remapeamento em função do número de incrementos de rotação/etapas de remapeamento e para cada um dos métodos estudados, no caso do carregamento sem gradiente na direcção da espessura: a) Erro RMS normalizado; b) Erro máximo normalizado.
No gráfico do erro máximo (Figura 3.14.b) observa-se que as tendências do desempenho
dos três métodos evidenciadas no gráfico do erro RMS são mantidas, mas há a realçar a
existência de um forte acréscimo do erro no caso do teste efectuado com o método I para sete
incrementos de rotação, em que o erro é superior a 12% (cerca de seis vezes maior do que o
obtido com o método III). Este facto pode ser justificado pela ligeira irregularidade da linha
de contorno da malha circular que, ao ser definida por meio de pontos discretos (nós), não
pode descrever de forma exacta uma circunferência. Assim, aquando da sobreposição das
malhas de dois incrementos de rotação consecutivos, existem nós da malha de destino que
02468
101214
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9Número de incrementos de rotação
Erro
máx
imo
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
Erro
máx
imo
[%]
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
113
estão fora do domínio da malha de origem, levando a que, durante a operação de
interpolação das variáveis dos nós da malha origem para os nós da malha de destino, se
estejam a utilizar as funções de forma fora do domínio canónico do elemento. Deste modo, o
erro associado a esta operação pode condicionar de forma significativa o erro total de
remapeamento obtido para os elementos de bordo, em situações semelhantes. Nos testes
seguintes ( 8N = e 9N = ), os valores de erro máximo obtidos com o método I voltam a estar
compreendidos entre os valores registados para os outros métodos.
Nas Figura 3.15.a e Figura 3.15.b mostra-se a evolução do erro RMS e do erro máximo,
respectivamente, para o caso em que o mapeamento considera a inversão do gradiente de
variáveis na direcção da espessura. Da análise da Figura 3.15.a constata-se um aumento
significativo do erro de remapeamento originado pelo método II relativamente à evolução
registada no caso do mapeamento sem gradiente em espessura (Figura 3.14.a). Estes
resultados revelam, de certo modo, possíveis limitações do método em situações de
simulações com fortes gradientes na direcção da espessura. O método I de remapeamento
conduz globalmente a bons resultados, em termos do erro RMS, à medida que o número de
incrementos de rotação aumenta (inclusive com uma ligeira diminuição do erro com a
variação de N ), no entanto, para 9N = observa-se um acréscimo muito forte do erro. Este
resultado pode ser mais uma vez justificado pelas instabilidades numéricas provocadas pela
interpolação de valores fora do domínio da malha de origem, associada a uma distribuição
de valores não constante ao longo da espessura.
0.00
0.03
0.06
0.09
0.12
0.15
0.18
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9Número de incrementos de rotação
Erro
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
a) b)
Figura 3.15 – Evolução do erro de remapeamento em função do número de incrementos de
rotação/etapas de remapeamento e para cada um dos métodos estudados, no caso do carregamento com gradiente na direcção da espessura: a) Erro RMS normalizado; b) Erro máximo normalizado.
115.7
219.7
0
4
8
12
16
20
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9Número de incrementos de rotação
Erro
máx
imo
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
Número de incrementos de rotação
Método I Método II Método III
Erro
máx
imo
[%]
Parte II. Ferramentas numéricas
114
O gráfico do erro máximo em função de N (Figura 3.15.b) permite reforçar a análise
anterior, pois mostra claramente a existência de valores bastante elevados de erro na malha,
tanto para o método I, como para o método II. Para 9N = são atingidos valores extremos de
erro. Para os métodos I e II existem pontos na malha remapeada com erros de 219.7% e
115.7%, respectivamente. Em termos globais o método III conduz a níveis de erro baixos,
sendo a progressão do erro muito estável à medida que se aumenta o número de operações
sucessivas de remapeamento. Como este método não depende de funções de interpolação,
mas sim, da avaliação da contribuição dos volumes de Gauss da malha de origem para cada
ponto de Gauss a ser remapeado, não existe a possibilidade de ocorrerem valores extremos
(irrealistas) cada vez que um ponto da malha de destino está fora do domínio da malha de
origem. De facto, mesmo que um ponto da malha de destino esteja fora do domínio da malha
de origem é sempre atribuída a contribuição, para o remapeamento do ponto, do volume de
Gauss de origem mais próximo, o que evita as instabilidades numéricas e pode melhorar de
forma significativa a qualidade do remapeamento destes pontos críticos.
Na Figura 3.16 estão compiladas as distribuições bidimensionais de isovalores, na face
superior das malhas, para a variável ( )T x e erro relativo ao fim de 9 incrementos de rotação,
para cada um dos métodos de remapeamento estudados. Em termos globais as figuras
ilustram bem as diferenças de erro constatadas nos gráficos da Figura 3.15, porquanto se
observa que o método III conduz a níveis bastante menores de erro relativamente aos outros
dois métodos estudados. Analisando as distribuições de valores de ( )T x e do erro relativo
método a método, para o Método I (ver Figura 3.16.a, Figura 3.16.b, Figura 3.16.c), pode
concluir-se que em termos médios o erro junto das zonas onde se mapearam os gradientes
iniciais não é particularmente elevado, ainda que possam ser referidos acréscimos e
decréscimos de cerca de 0.02 para ( )T x junto das zonas de gradientes positivos e negativos,
respectivamente. Este facto revela que o método de remapeamento por
interpolação/extrapolação simples leva a que, neste caso, os gradientes originais existentes
sejam reforçados. Os valores mais elevados de erro são registados no centro da malha, onde
se misturam elementos de grande e pequena dimensão (Figura 3.12), que tornam mais
exigente a operação de remapeamento e, de forma mais evidente, junto do bordo livre da
malha. Neste último caso o erro relativo atinge valores muito elevados, originados como foi
atrás referido, pela interpolação (extrapolação) de valores para pontos fora do domínio da
malha de origem. Para além dos valores elevados é visível que a distribuição final, tanto para
os valores remapeados da variável ( )T x (Figura 3.16.b), como para os da função de erro
(Figura 3.16.c), não é perfeitamente simétrica como seria desejável, facto que pode encontrar
justificação na instabilidade numérica provocada pela interpolação de valores para fora do
domínio da malha de origem.
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
115
a) Malha inicial mapeada pela função ( )T x .
b) Distribuição para o método I. c) Erro para o método I.
d) Distribuição para o método II. e) Erro para o método II.
f) Distribuição para o método III. g) Erro para o método III.
Figura 3.16 – Distribuições bidimensionais de isovalores da variável ( )T x e do erro relativo nas faces superiores das malhas, ao fim de 9 incrementos de rotação/etapas de remapeamento, no caso do
carregamento com gradiente na direcção da espessura.
Erro relativo( )T x
-0.746
5.456
-0.866
2.873
0.045
-0.045
Parte II. Ferramentas numéricas
116
A análise das figuras de isovalores obtidas para o método II (Figura 3.16.d, Figura 3.16.e)
permite reforçar a conclusão de que este método conduz, neste caso, a piores resultados
relativamente a qualquer um dos outros métodos estudados, nomeadamente, ao método I.
De facto, assiste-se a uma degradação generalizada dos gradientes originais através de um
efeito muito pronunciado de amaciamento, como se mostra na distribuição do erro
(Figura 3.16.e). À semelhança do que foi observado na localização do erro máximo na
distribuição final obtida pelo método I, também no método II de remapeamento, o erro
máximo é atingido na periferia da malha devido ao remapeamento de pontos que se
encontram fora do domínio da malha de origem. É igualmente visível, mais uma vez, que a
distribuição final de valores para a variável ( )T x e para o erro não são simétricas.
Os resultados obtidos através do método III (Figura 3.16.f, Figura 3.16.g) evidenciam um
ligeiro efeito de amaciamento, no entanto, e em termos absolutos, o método de
Remapeamento Incremental Volúmico revelou ser muito robusto e eficaz para efectuar
operações de remapeamento exigentes, como no caso presente, uma vez que os níveis de erro
obtidos podem ser considerados baixos quando comparados com aqueles obtidos com os
outros métodos estudados. É também de salientar que o método mantém a simetria, tanto da
distribuição de valores da variável ( )T x como da distribuição final do erro, mostrando-se
insensível a situações críticas em que é necessário remapear pontos fora do domínio da
malha original.
A análise do erro realizada no final das N operações sucessivas de remapeamento
permite estimar o erro acumulado total, porém, não fornece nenhum tipo de indicação de
como evolui o erro parcial acumulado em função dos estados intermédios do teste. Como a
avaliação do erro tem de ser realizada em malhas com a mesma rotação, para que os pontos
de avaliação sejam coincidentes, a referência de comparação não pode ser a malha inicial
mapeada. Assim, na avaliação do erro parcial acumulado, tomou-se para referência de
comparação a malha do estado intermédio remapeada com a informação da malha inicial
mapeada, utilizando o mesmo método de remapeamento utilizado para os remapeamentos
sucessivos. Por exemplo, considerando a análise do erro parcial acumulado no estado
intermédio dois, do caso de três operações sucessivas de remapeamento (Figura 3.13), a
avaliação é feita comparando o erro acumulado ao fim de dois remapeamentos sucessivos,
1R seguido de 2R (Figura 3.13.d), com apenas uma operação de remapeamento, da malha
original mapeada (Figura 3.13.a) para esse estado intermédio (Figura 3.13.d).
Nas Figura 3.17.a e Figura 3.17.b mostram-se as evoluções do erro parcial RMS e do erro
parcial máximo, respectivamente, respeitantes ao erro parcial acumulado nos incrementos
intermédios (de dois a oito) do teste de remapeamento sucessivo com 9N = .
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
117
0.00
0.03
0.06
0.09
0.12
1 2 3 4 5 6 7 8Número de incrementos intermédios
Erro
par
cial
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
a) b)
Figura 3.17 – Evolução do erro de remapeamento parcial em função do número de incrementos intermédios de rotação no caso do remapeamento sucessivo com 9N = e para cada um dos métodos
estudados, no caso do mapeamento com gradiente na direcção da espessura: a) Erro parcial RMS normalizado; b) Erro parcial máximo normalizado.
No gráfico da evolução do erro parcial RMS (Figura 3.17.a) observam-se comportamentos
bem distintos para cada um dos métodos utilizados. Com efeito, a evolução do erro parcial
obtido pelo método III é quase linear e com um declive muito pequeno, enquanto que no
método II, embora a tendência seja relativamente linear, o declive é muito superior. Já para o
método I de remapeamento a evolução tem um comportamento do tipo exponencial, que
está relacionado como foi antes referido, com o facto do erro aumentar de forma muito
significativa quando alguns pontos da malha de destino são exteriores à malha de origem.
Em termos absolutos, e como seria de esperar, o erro obtido pelo método III é muito inferior
ao registado para o método I, que por sua vez, conduz um nível de erro inferior ao obtido
para o método II.
Na evolução do erro parcial máximo (Figura 3.17.b), as tendências de crescimento deste
com o número de incrementos de rotação da malha são, de certa forma, idênticas às descritas
para o erro parcial RMS. No entanto, as curvas de crescimento do erro máximo para aos
métodos I e II são mais próximas até ao sexto incremento intermédio, altura em que devido
ao crescimento mais acentuado da curva de erro para o método I, o erro máximo registado
para este método é superior ao obtido para o método II.
3.8.2.2 Remapeamento entre malhas regular e irregular
De modo a melhor aquilatar a influência da irregularidade dos elementos da malha no
comportamento dos métodos de remapeamento estudados, executou-se a operação de
0
20
40
60
80
100
120
1 2 3 4 5 6 7 8Número de incrementos intermédios
Erro
par
cial
máx
imo
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
Erro
par
cial
máx
imo
[%]
Parte II. Ferramentas numéricas
118
remapeamento entre a malha original, usada no teste de remapeamento sucessivo de malhas
rodadas, e uma malha constituída por elementos de forma irregular (Figura 3.18.b) com o
mesmo diâmetro (Tabela 3.5) e, em seguida, a operação de remapeamento inversa para a
malha regular (Figura 3.18.a).
Figura 3.18 – Representação esquemática bidimensional do ciclo de remapeamento entre malhas de elementos finitos com distribuições planares diferentes: a) regular; b) irregular.
Foi considerada a malha inicial com gradiente na direcção da espessura e mantiveram-se
os parâmetros de caracterização dos métodos II e III, utilizados nos testes do remapeamento
sucessivo de malhas rodadas. Outro objectivo subjacente a este teste consistiu em comparar o
esforço de computação exigido por cada um dos métodos, quer de forma absoluta, quer
relativa, tendo em conta o nível de erro obtido.
Na Figura 3.19 mostra-se o erro RMS e o tempo de processamento para cada um dos
métodos no final das duas operações de remapeamento. A figura contém ainda a variação do
erro em função do aumento do número de divisões lineares de cada um dos volumes de
Gauss de destino (nl ) para o método III de remapeamento. Analisando em primeiro lugar o
nível de erro, observa-se que o método III conduz a um menor erro RMS face aos outros
métodos estudados independentemente do valor considerado para o parâmetro nl . No
entanto, o erro decresce de forma exponencial com o aumento de nl até valores deste
parâmetro próximos de 5, altura em que o erro tende a estabilizar. Assim, assiste-se a um
decréscimo do erro de cerca 60% na passagem de 1nl = para 5nl = . Tomando como
referência o erro registado para o método III com 5nl = , observa-se que o erro RMS
resultante da aplicação deste método de remapeamento é cerca de 71% e 64% menor que o
verificado para os métodos I e II, respectivamente.
1º Remapeamento
2º Remapeamento
a) b)
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
119
0.000
0.002
0.004
0.006
0.008
0.010
0.012
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10Variação do parâmetro nl (método III)
Erro
RM
S [%
]
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
1800
Tem
po d
e C
PU [s
]
Erro RMS - Método I Erro RMS - Método IIErro RMS - Método III Tempo de CPU - Método ITempo de CPU - Método II Tempo de CPU - Método III
Figura 3.19 – Evolução do erro RMS de remapeamento e do tempo de CPU para os três métodos estudados e, no caso do método III, em função do número de divisões lineares do volume de Gauss de
destino (nl ), para o teste de remapeamento entre malhas regular e irregular.
No que se refere à contabilização do tempo de computação para cada método, observa-se
que o método I de remapeamento é muito mais célere que qualquer um dos outros dois
métodos, necessitando apenas de 16.87s para cumprir as duas operações de remapeamento,
face aos 223s do método II e 73.8s do método III (para 1nl = ). Para o caso particular do
método III, como seria de esperar, o aumento do parâmetro nl conduz a um acréscimo
exponencial no tempo de computação exigido. No entanto, tendo em linha de conta o menor
nível de erro registado por este método relativamente aos restantes e o facto do aumento do
parâmetro nl não traduzir de forma evidente reduções significativas do erro para valores
superiores a 4, pode concluir-se, para este caso, que o método III revela um bom nível de
compromisso entre a precisão e o tempo de computação quando o parâmetro nl é igual a 5.
Nesse caso, o esforço de computação para efectuar um remapeamento com o método III é
sensivelmente o mesmo que o exigido pelo método II, mas conduz a um nível de erro que é
cerca de 64% inferior.
No que diz respeito ao erro máximo (Figura 3.20), constata-se que as diferenças entre os
três métodos são inferiores às observadas para o erro RMS. No entanto, considerando mais
uma vez como referência o método III para 5nl = , o erro máximo obtido para os métodos I e
II é cerca de 40% e 31% superior, respectivamente. A variação do erro com o aumento do
Parte II. Ferramentas numéricas
120
parâmetro nl , para valores superiores a 2, deixa de ser muito significativa, havendo apenas
a registar uma oscilação (ligeiro decréscimo) para 7nl = e 10nl = .
Figura 3.20 – Evolução do erro máximo de remapeamento para os três métodos estudados e em função do número de divisões lineares do volume de Gauss de destino (nl ) no caso do método III,
para o remapeamento entre malhas regular e irregular.
Na Figura 3.21 estão compiladas as distribuições bidimensionais de isovalores da variável
( )T x e erro RMS, para cada um dos métodos de remapeamento estudados (com 5nl = para
o método III). Para melhor comparar os resultados obtidos após remapeamento, mostra-se
também a distribuição original da malha regular (Figura 3.21.a). Os resultados obtidos com o
método I denotam um reforço dos gradientes remapeados face aos iniciais (ver Figura 3.21.a,
Figura 3.21.b e Figura 3.21.c). Além disso, a distribuição do erro (Figura 3.21.c) é irregular e
não é perfeitamente simétrica, o que é justificável pela heterogeneidade geométrica dos
elementos que constituem a malha irregular. No entanto, o método consegue restringir o
aparecimento do erro às zonas onde efectivamente estão mapeados os valores iniciais.
No caso do método II (Figura 3.21.d e Figura 3.21.e) é visível um amaciamento dos
gradientes face aos valores iniciais da variável ( )T x . Tal como foi referido no caso do
método I, a distribuição do erro é irregular, embora o método II introduza um efeito ainda
mais negativo ao provocar o aparecimento de valores fictícios em zonas onde a variável
( )T x deveria ser nula.
0.000
0.500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
4.000
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10Variação do parâmetro nl (método III)
Erro
máx
imo
RM
S [%
]
Método I Método II Método III
Erro
máx
imo
[%]
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
121
a) Malha inicial mapeada pela função ( )T x .
b) Distribuição para o método I. c) Erro para o método I.
d) Distribuição para o método II. e) Erro para o método II.
f) Distribuição para o método III. g) Erro para o método III.
Figura 3.21 – Distribuições bidimensionais de isovalores da variável ( )T x e do erro relativo nas faces superiores das malhas para os três métodos estudados (com 5nl = no método III), no teste de
remapeamento entre malhas regular e irregular.
Erro relativo( )T x
Parte II. Ferramentas numéricas
122
Este efeito é caracterizado pelo aparecimento de quatro zonas de erro junto das
extremidades da malha (Figura 3.21.e): duas em que existe uma sobrestimação dos valores
(direcção do eixo Ox); e outras duas em que os valores finais de ( )T x são subavaliados
(direcção do eixo Oy). Em qualquer dos casos, esta flutuação de valores não é
suficientemente elevada para que seja notoriamente visível na distribuição final
(Figura 3.21.d).
Por último, os resultados obtidos para o método III (Figura 3.21.f e Figura 3.21.g) reforçam
a conclusão sobre a elevada eficácia deste método. Com efeito, observa-se que os gradientes
finais na distribuição da variável ( )T x são mantidos sem que haja grande degradação dos
valores iniciais. Este facto é corroborado tanto pelo número reduzido de pontos onde o erro é
visível, como pela sua baixa amplitude (Figura 3.21.g).
3.8.2.3 Remapeamento entre malhas refinada e desrefinada
O último teste de eficiência que se apresenta consiste na avaliação do erro introduzido pela
operação de remapeamento levada a cabo durante o processo de simulação de um caso de
estudo da conferência NUMISHEET (International Conference and Workshop on Numerical
Simulation of 3-D Sheet Forming Processes) realizada em Detroit, Michigan, em 2005. O
objectivo do caso de estudo consiste em avaliar a capacidade dos programas de simulação
numérica de preverem correctamente os campos de deformação e tensão instalados no
conformado durante e no fim de um processo multi-etapas de conformação. A elevada
exigência do teste, associada à necessidade da modelação das mudanças de trajectórias
induzidas e ao domínio das soluções numéricas necessárias para simular todas as etapas,
ficou bem patente no facto de apenas um grupo de investigação ter apresentado resultados7.
O ensaio, designado por Benchmark 3 – Channel Draw/Cylindrical Cup, compreende duas
etapas [Stoughton et al. 2005, Green 2005]. A primeira etapa consiste na estampagem de um
perfil rectangular, utilizando-se freios8 a 75% de penetração, de modo a obter-se o esboço
pré-deformado (Figura 3.22.a). Na segunda etapa uma das paredes do perfil rectangular é
cortada e subsequentemente sujeita ao ensaio Marciniak (Figura 3.22.d) [Stoughton et al.
2005]. Uma vez que o principal intuito do estudo que agora se apresenta consistiu em testar,
com um caso real, o desempenho das estratégias de remapeamento desenvolvidas e
implementadas no programa DD3TRIM, não é aqui feita uma caracterização detalhada da
simulação completa do benchmark, no entanto, essa informação pode ser encontrada nos
trabalhos de Baptista et al. 2005b e Oliveira et al. 2006.
7 Os resultados relativos aos benchmarks estão compilados em Buranathiti e Cao 2005. 8 Na literatura é usado por vezes o termo equivalente “juntas de retenção”.
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
123
Na simulação do benchmark, as fases de conformação plástica da chapa e de retorno
elástico foram executadas com os programas DD3IMP e DD3OSS, respectivamente. As
etapas intermédias para alteração da topologia e discretização da malha de elementos finitos
foram executadas com o programa DD3TRIM. Essas etapas intermédias compreendem
operações de: corte, rotação, translação, remalhagem e remapeamento da malha de
elementos finitos.
Figura 3.22 – Etapas da simulação numérica multi-etapas do caso de estudo Benchmark 3 – Channel Draw/Cylindrical Cup da conferência NUMISHEET’05: a) Perfil rectangular depois da etapa de
estampagem seguida de retorno elástico; b) Malha obtida através do corte da parede vertical do perfil; c) Malha depois da remalhagem/remapeamento; d) Conformado final obtido através do ensaio
mecânico Marciniak.
No benchmark os freios (que controlam a entrada de material para a cavidade da matriz)
desempenham um papel muito importante, pois impõem vários ciclos de flexão-deflexão à
chapa, em particular, à porção desta que na segunda etapa vai ser utilizada para efectuar o
teste Marciniak. Assim sendo, na simulação do processo foi considerada a presença real dos
freios e não apenas um modelo físico que os substituísse, de modo a preservar o mais
possível o histórico de evolução da deformação [Alves et al. 2005, Alves et al. 2006a]. No
entanto, e uma vez que o raio dos freios é pequeno (4 mm), foi necessário utilizar um
tamanho de elemento reduzido na direcção longitudinal da chapa (perpendicular à direcção
dos freios). Outro aspecto que condicionou a discretização inicial da malha de elementos
finitos consistiu no elevado nível de precisão pretendido para a previsão do retorno elástico.
Como a previsão deste fenómeno é muito dependente da precisão com que se obtém os
gradientes dos campos de tensões ao longo da direcção da espessura, utilizaram-se três
a) d)
b) c)
RemalhagemRemapeamento
x y
z
Parte II. Ferramentas numéricas
124
camadas de elementos em espessura. Além disso, houve a preocupação de fazer com que a
forma dos elementos no plano Oxz fosse próxima da quadrangular, pois é aquela que
possibilita uma melhor precisão na previsão do retorno elástico [Oliveira et al. 2002,
Alves 2003]. A conjugação de todos estes aspectos com o facto do esboço a conformar ser
relativamente grande (1066.8 mm × 254 mm) e a necessidade de conter o número total de
elementos e o tempo de cálculo em níveis aceitáveis, levou a que a distribuição de elementos
no plano da malha fosse fortemente assimétrica relativamente às direcções longitudinal e
transversal. Ou seja, conduziu a uma elevada densidade de elementos na direcção
longitudinal e reduzido na direcção transversal (como está esquematicamente representado
na Figura 3.22.b). O facto da direcção predominante da solicitação ser a longitudinal leva a
que o nível de deformação na direcção transversal seja reduzido e, por conseguinte, a
redução do número de elementos nessa direcção não influencia significativamente os
resultados finais [Oliveira et al. 2006].
Devido à forte assimetria da distribuição planar dos elementos da malha utilizada
durante a primeira etapa e ao facto do teste Marciniak ser constituído por ferramentas
axissimétricas, foi necessário proceder a uma operação de remalhagem intermédia de modo
a uniformizar a distribuição planar dos elementos na malha, para tornar exequível o
benchmark (Figura 3.22.b e Figura 3.22.c). A metodologia utilizada na operação de
remalhagem consistiu em agrupar/dividir elementos segundo direcções predefinidas. Assim,
na direcção longitudinal da malha foram agrupados elementos (desrefinados) enquanto que
na direcção transversal os elementos foram divididos (refinados). Na Figura 3.23
mostram-se, de forma esquemática, as operações de remalhagem/remapeamento
propriamente ditas, com a indicação do número de divisões para cada uma das direcções
antes e depois da remalhagem, e a segunda operação de remapeamento, para avaliar o nível
de erro das variáveis ao fim de duas etapas de remapeamento.
Figura 3.23 – Representação esquemática da etapa intermédia de remalhagem e remapeamento e da metodologia seguida para estudar o desempenho dos métodos de remapeamento estudados.
RemalhagemRemapeamento
359
4
45
64
2º Remapeamento (avaliação)
x y
z
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
125
Depois de terem sido analisados os resultados obtidos nos testes efectuados com a
distribuição da variável teórica ( )T x , em que o método II de remapeamento se mostrou em
termos globais o menos eficaz, e tendo em conta as dificuldades inerentes ao ajuste dos
parâmetros para esse método, no estudo levado a cabo na etapa intermédia de
remapeamento do benchmark optou-se por se utilizar apenas os métodos I e III.
Uma vez que a diferença das distribuições entre as malhas de origem (sem remalhagem) e
de destino (com remalhagem) é muito severa, devido à elevada disparidade do tamanho dos
elementos, nas operações de remapeamento levadas a cabo com o método III, fez-se variar o
parâmetro nl de ajuste do método relativamente ao tamanho dos elementos.
Na Figura 3.24 mostram-se os gráficos de frequência de erro em função do número de nós
abrangidos por um intervalo de 10 MPa.
a) Método I de remapeamento. b) Método III de remapeamento com 5nl = .
c) Método III de remapeamento com 10nl = . d) Método III de remapeamento com 15nl = .
Figura 3.24 – Gráficos de frequência do erro absoluto e indicação do valor médio do erro ( x ) para a
variável xxσ , para os métodos I e III, sendo o erro do método III apresentado em função do parâmetro nl (5, 10, 15).
0
1000
2000
3000
4000
10 30 50 70 90 110 130 150 170Erro absoluto [MPa]
Núm
ero
de n
ós
17.5x =
0
1000
2000
3000
4000
10 30 50 70 90 110 130 150 170Erro absoluto [MPa]
Núm
ero
de n
ós
12.4x =
0
1000
2000
3000
4000
10 30 50 70 90 110 130 150 170Erro absoluto [MPa]
Núm
ero
de n
ós
54.7x =
0
1000
2000
3000
4000
10 30 50 70 90 110 130 150 170Erro absoluto [MPa]
Núm
ero
de n
ós29.8x =
Parte II. Ferramentas numéricas
126
Estes resultados foram obtidos para os dois métodos no final das duas operações de
remapeamento, comparando-se os valores iniciais e finais da variável de estado xxσ , na
malha de origem. No caso do método III são apresentados resultados para 5nl = , 10nl = e
15nl = . A comparação das frequências de erro para o método I (Figura 3.24.a) e método III
com 5nl = (Figura 3.24.b), permite constatar que a dispersão dos valores do erro é mais
elevada no método I, registando-se um erro médio de 54.7 MPa face aos 29.8 MPa obtidos
com o método III, ou seja, uma redução de 45.5% do erro. Nas Figura 3.24.c e Figura 3.24.d,
mostram-se os gráficos de frequência do erro obtidos para os remapeamentos efectuados
com 10nl = e 15nl = , respectivamente. Da análise desses gráficos, constata-se que,
efectivamente, o aumento do parâmetro nl conduz a melhores resultados, pois a definição
dos volumes de intersecção entre os volumes de Gauss de destino com os de origem é
melhor aferida. Em termos quantitativos, ocorre uma redução de 68% do erro médio obtido
para o método III com 10nl = face ao método I. Para o caso de 15nl = a redução de erro
obtida é de 77.3% face ao método I, e a distribuição do erro fica circunscrita a valores
inferiores a 50 MPa. Observa-se também que 50% dos nós têm valores de erro inferior a
10 MPa e 95% dos nós têm erro inferior a 30 MPa.
3.9 Conclusões e comentários
Após se ter explanado os diferentes métodos de remapeamento de variáveis desenvolvidos
e/ou implementados no programa DD3TRIM, bem como os algoritmos mais comummente
utilizados para a localização de pontos em malhas, procurou-se avaliar, as diferenças de
desempenho desses métodos através de alguns testes numéricos adequados à temática da
simulação numérica do processo de estampagem.
No que se refere ao estudo e avaliação dos métodos de localização de pontos em malhas,
pode afirmar-se que o método das coordenadas volúmicas é muito mais eficiente a executar
esta operação, quando comparado com os métodos geométrico e da inversão paramétrica
das funções de forma dos elementos finitos. Além disso, constatou-se que as diferenças, em
termos de esforço de computação, podem ser bastantes elevadas, pelo que se recomenda o
uso do método das coordenadas volúmicas (ou um do mesmo tipo) em detrimento dos
outros métodos estudados.
O método de Remapeamento Incremental Volúmico aqui desenvolvido provou ser um
método robusto e muito eficaz para, efectivamente, minimizar o erro associado à
transferência de variáveis de estado entre duas malhas de elementos finitos. Com efeito, em
todos os testes efectuados para avaliar a qualidade do desempenho deste método foi possível
observar, de forma sistemática, que o erro de remapeamento foi sempre inferior ao obtido
Capítulo 3. Remapeamento de variáveis
127
com os outros dois métodos implementados. Esta diferença do erro de remapeamento médio
foi, regra geral, sempre superior a 50% face ao melhor dos outros métodos e, em alguns
casos, como por exemplo no remapeamento entre malhas regular e irregular, registaram-se
diferenças superiores a 200% com 5nl = . O parâmetro de ajuste (nl ) mostrou ser uma forte
mais valia do método, pois permite melhorar consideravelmente a qualidade do
remapeamento na presença de duas malhas com distribuições de elementos muito
heterogéneas (como foi possível observar no exemplo retirado da conferência NUMISHEET
2005). Além disso, verificou-se que o método de Remapeamento Incremental Volúmico, ao
contrário dos outros métodos estudados, não é afectado pela ocorrência de situações críticas,
em que determinados pontos da malha de destino possam estar, ainda que ligeiramente, fora
da malha de origem.
A avaliação da relação entre o erro de remapeamento e o esforço de computação mostrou
que, apesar da evolução exponencial do tempo de computação do Remapeamento
Incremental Volúmico com o parâmetro nl , o método consegue estabelecer um
compromisso bastante razoável para esta relação, nomeadamente no confronto directo com o
método de remapeamento através de mínimos quadrados móveis com 5nl = . O método de
remapeamento por interpolação/extrapolação simples é o mais célere dos três métodos
estudados, constatando-se também que os resultados obtidos por este método são, em
termos globais, melhores do que os obtidos com o método de remapeamento através de
mínimos quadrados móveis. Este último método, além de ter alcançado resultados sofríveis,
revelou-se de aplicação delicada, pois depende de vários parâmetros que são função das
características das malhas e que podem ser difíceis de optimizar.
Parte II. Ferramentas numéricas
128
PARTE III
Estudos numéricos e experimentais
131
CAPÍTULO QUATRO
Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
Neste capítulo avalia-se a influência da presença do domínio material da soldadura na simulação numérica da conformação de chapas soldadas. São considerados vários níveis de heterogeneidade entre o material da soldadura e o material de base, associados a três larguras e orientações do cordão. O comportamento do cordão durante a deformação é avaliado recorrendo a quatro testes mecânicos elementares: tracção uniaxial; corte; flexão em quatro pontos; e ensaio Jovignot.
4.1 Enquadramento
No processo de união por soldadura de componentes metálicos é desejável que as
propriedades mecânicas da soldadura sejam, ou muito semelhantes às do material de base,
ou que constituam uma transição suave no caso da união de materiais de base diferentes. No
entanto, dependendo de diversos factores intrínsecos aos processos de soldadura e às
características químicas/metalúrgicas dos materiais a unir, é difícil garantir que o processo de
soldadura não introduza diferenças1 nas propriedades mecânicas, por vezes substanciais, da
zona de união face aos materiais de base. Assim sendo, as normas de construção soldada
especificam, por motivos de segurança, que a resistência mecânica das soldaduras deva ser
superior à dos materiais dos componentes a unir. É bem conhecida a tendência de certos
materiais, quando soldados por determinados processos, originarem zonas da soldadura
1 Na terminologia anglo-saxónica é normalmente utilizada a palavra mismatch.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
132
com resistência mecânica global inferior (amaciamento) ou superior (endurecimento) à do
material de base. Por exemplo, existe amaciamento após soldadura no caso de alguns aços de
alta resistência [Mohandas et al. 1999, Ono et al. 2002] e ligas de alumínio [Vollertsen et al.
1996, Zhao et al. 1999a, Friedman et al. 2000]. Já os aços de baixa liga tendem a formar
estruturas duras, mormente quando soldados por processos com elevada densidade de
energia, como a soldadura laser [Vollertsen et al. 1996, Kusuda et al. 1997].
A influência do processo de soldadura nas propriedades mecânicas de chapas soldadas e,
consequentemente, na sua aptidão à deformação, tem sido um dos principais alvos de estudo
relacionados com a aplicação industrial de tailor-welded blanks (TWBs). Assim, é possível
encontrar um número razoável de trabalhos de investigação onde são estudadas as
propriedades mecânicas de soldaduras, por exemplo, de TWBs de ligas de alumínio [Davies
et al. 1999, Davies et al. 2000, Friedman et al. 2000] ou de aço [Min e Kang 2000, Ghoo et al.
2001a, Abdullah et al. 2001, Dry et al. 2002]. As metodologias mais comuns para caracterizar
as propriedades mecânicas da soldadura consistem em executar medições de dureza [Reis et
al. 2004, Saunders e Wagoner 1996] e em efectuar ensaios de tracção uniaxial em provetes
que contenham maioritariamente a soldadura [Davies et al. 1999, Ghoo et al. 2001a, Rodrigues
et al. 1999]. No trabalho apresentado por Rodrigues 2001, os resultados provenientes dos
ensaios de tracção são posteriormente tratados recorrendo-se à simulação numérica para
individualizar o comportamento mecânico da soldadura.
No caso da avaliação das propriedades ser feita recorrendo ao ensaio de tracção uniaxial,
alguns autores recorrem a provetes que contêm apenas material da soldadura [Ghoo et al.
2001a, Davies et al. 2002]. Apesar desta técnica permitir isolar o domínio físico da soldadura
da influência dos materiais de base adjacentes durante o ensaio de tracção, ela comporta
igualmente várias dificuldades ou inconvenientes. As principais dificuldades prendem-se
com a elevada exigência técnica e a precisão requerida, tanto para obter os provetes de
reduzidas dimensões (que são normalmente extraídos através do corte por electroerosão por
fio, de modo a não afectar localmente as propriedades), como para proceder à montagem e
execução do próprio ensaio de tracção. Além disso, Davies et al. 2002 referem que a própria
geometria do provete pode influenciar a aferição das propriedades mecânicas. De modo a
contornar as dificuldades inerentes ao uso de provetes de reduzidas dimensões, alguns
autores optaram por utilizar provetes de tracção normalizados, de dimensões correntes,
isolando depois as propriedades do cordão de soldadura com recurso a modelos baseados
em leis de misturas [Saunders e Wagoner 1996, Abdullah et al. 2001, Zhao et al. 2001, Ghoo et
al. 2001a, Dry et al. 2002]. Esta abordagem inicia-se com a realização de ensaios de tracção em
provetes, com a mesma geometria e dimensões, de material de base e de TWBs, sendo o
cordão orientado na direcção longitudinal do provete. Como os materiais da soldadura e de
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
133
base estão sujeitos ao mesmo deslocamento, a força requerida para provocar um dado valor
de deformação no provete é partilhada pelo cordão de soldadura e pelos materiais de base. A
força suportada por cada um dos materiais é directamente proporcional às áreas da secção
transversal de cada um dos domínios. Então, a força imposta ao cordão de soldadura é igual
à força total medida durante o ensaio de tracção, subtraída da soma das forças exercidas nos
materiais de base adjacentes. A aplicação deste método pressupõe, geralmente, que os
materiais têm comportamento isotrópico [Saunders e Wagoner 1996, Ghoo et al. 2001a].
Apesar do método poder conduzir a relativamente boas avaliações das propriedades
mecânicas da soldadura, Abdullah et al. 2001 referem que a determinação da área da secção
transversal do provete correspondente ao domínio da soldadura deve revestir-se de especial
atenção, uma vez que esta variável assume um papel fundamental na precisão com que são
estimadas as propriedades mecânicas da soldadura. Para melhorar a precisão da
determinação da área da secção transversal da soldadura, os mesmos autores recomendam
que a medição seja feita recorrendo a imagens metalográficas (micrografias) da secção
transversal do provete.
A avaliação das propriedades mecânicas da soldadura em tracção recorrendo a ensaios de
dureza, além de ser uma forma expedita, pode também revelar-se razoavelmente eficaz,
mesmo tendo em conta o carácter aproximativo e empírico que encerra. Nos trabalhos de
Akselsen et al. 1989 e Kucharski e Mróz 2001 propõem-se equações empíricas que permitem
determinar a resistência mecânica da soldadura a partir de medições de dureza. A
caracterização de cordões de soldadura de TWBs através destas equações foi realizada por
Reis et al. 2004 e Dry et al. 2002. No estudo levado a cabo por Dry et al. 2002 foram utilizadas
todas as metodologias anteriormente referidas, sendo depois testadas as caracterizações
mecânicas obtidas para a soldadura através da simulação numérica do ensaio de tracção de
provetes de TWBs. Os resultados mostraram que a modelação numérica do cordão de
soldadura com base na caracterização mecânica através da regra das misturas e por medições
de dureza conduz a resultados próximos da curva experimental do ensaio de tracção. Em
contraponto, a caracterização de propriedades através do ensaio de tracção de provetes
contendo apenas a região da soldadura conduziu a um afastamento significativo entre os
resultados numéricos e experimentais.
De modo a melhor caracterizar e distinguir as propriedades mecânicas em termos de
dureza ao longo das diferentes zonas da soldadura, alguns autores utilizam o ensaio de
nanoindentação, como por exemplo Friedman et al. 2000 e Maier et al. 2004. Este tipo de
técnica, que permite traçar a curva carga-descarga2 durante o ensaio, possibilita estimar a
2 Na terminologia anglo-saxónica é utilizada a designação Depth Sensing Indentation.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
134
curva tensão-deformação em tracção recorrendo à análise inversa [Dao et al. 2001, Antunes et
al. 2006]. Podem ainda ser referidos outros métodos de caracterização mecânica da
soldadura, mas que são menos utilizados. Por exemplo, Auger et al. 2000 conduziram um
estudo em que a avaliação das propriedades mecânicas foi realizada através de um ensaio
em que a trajectória de solicitação corresponde a um estado plano de compressão. Para além
desse método, os mesmos autores utilizaram técnicas de difracção de neutrões para medir as
tensões residuais instaladas na soldadura.
Atendendo à dificuldade de caracterização da soldadura, na última década gerou-se
alguma controvérsia sobre a necessidade de incluir o domínio e as propriedades mecânicas
da soldadura aquando da simulação numérica de conformação de TWBs. Com efeito, duas
abordagens distintas podem ser seguidas, consoante se modele, ou não, o domínio material
da soldadura (metal fundido mais zona afectada pelo calor) na malha de elementos finitos.
Apesar dos diversos estudos levados a cabo nesta matéria, não é ainda perfeitamente claro se
a omissão das propriedades mecânicas do cordão de soldadura na modelação do problema
influencia ou não, de forma significativa, os resultados da simulação. Alguns autores
consideram que o cordão de soldadura deve ser modelado de modo a obterem-se resultados
numéricos mais rigorosos [Zimniak e Piela 2000, Meinders et al. 2000, Dry et al. 2001,
Ghoo et al. 2001a, Chang et al. 2002, Kampus e Balic 2003]. Um segundo grupo de autores
considera que a melhoria dos resultados é insuficiente e/ou insignificante face às demais
simplificações do modelo mecânico e numérico, ao necessário esforço adicional de
pré-processamento e de cálculo e, ainda, à imprescindível caracterização mecânica do cordão
de soldadura e à sua inclusão na malha de elementos finitos [Saunders e Wagoner 1996,
Zhao et al. 2001]. Sendo certo que os autores de cada um dos grupos fundamentam a sua
posição com argumentos válidos, não se deve porém ignorar que muitas das conclusões
obtidas focalizam, por vezes, situações particulares referentes ao estudo de ensaios
específicos [Saunders e Wagoner 1996, Meinders et al. 2000, Zhao et al. 2001];
constrangimentos ou simplificações numéricas inerentes aos programas de simulação
utilizados (tipo de formulação, tipo de elemento finito, etc.); ou ainda, análises com um
enfoque voltado para a minimização do tempo necessário para a obtenção do resultado
numérico (tempo de pré-processamento mais o tempo de execução da simulação). Assim, no
que se pode designar como uma posição intermédia, alguns autores referem que a não
inclusão do domínio da soldadura no modelo da simulação consiste na abordagem mais
eficiente quando a minimização do tempo de cálculo é um dos factores determinantes na
análise. Contudo, estes autores salientam também que este tipo de análise compromete uma
correcta avaliação do comportamento mecânico da TWB junto da soldadura [Buste et al.
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
135
1999]. Esta última conclusão é também realçada por Lee et al. 2000, no caso concreto da
previsão da ruptura, quando esta se inicia na soldadura.
Num trabalho desenvolvido por Raymond et al. 2004 para avaliar o impacto dos
diferentes tipos de modelação do cordão de soldadura na simulação numérica de TWBs,
concluiu-se que o método de caracterização mecânica/numérica da soldadura, bem como a
forma como o cordão é modelado geometricamente, pode efectivamente ter influência nos
resultados obtidos. Contudo, é igualmente realçado que, nos casos onde o cordão de
soldadura está muito afastado das zonas de conformação onde os níveis de deformação são
mais significativos, devido à baixa ductilidade geralmente demonstrada pelas soldaduras, a
modelação rigorosa da soldadura na simulação numérica pode não traduzir grandes
vantagens no que se refere ao aumento da precisão de resultados assim conseguido.
Além da previsão da ruptura no cordão de soldadura, existem outras situações em que é
essencial modelar com precisão a soldadura, nomeadamente, nos casos em que a largura do
cordão seja grande relativamente à espessura das chapas a unir e em que haja uma elevada
dissemelhança de propriedades mecânicas da soldadura e do material de base [Rodrigues et
al. 2004]. Um exemplo concreto de um processo de união, relativamente recente, que pode
originar este tipo de situações consiste na soldadura por fricção linear3 [Merklein et al. 2005].
Por oposição às situações em que se deve modelar com precisão a geometria e
propriedades mecânicas do cordão de soldadura, há casos em que o estudo pode não
requerer uma modelação rigorosa. Um desses casos corresponde à avaliação do movimento
do cordão de soldadura. No trabalho realizado por Saunders e Wagoner 1996 evidencia-se,
de forma clara, que o movimento do cordão é maioritariamente influenciado pela diferença
de propriedades mecânicas e/ou de espessura entre os materiais de base, além das forças de
retenção impostas no cerra-chapas. Meinders et al. 2000 reforçam esta conclusão
acrescentando que para além da relação de resistência mecânica entre os materiais de base,
também a própria localização do cordão no esboço (por exemplo, em zonas sujeitas a maior
deformação) pode condicionar o seu movimento. Nesse mesmo trabalho é igualmente
referido que o tipo de soldadura ou largura do cordão não condicionam o seu
posicionamento final.
No caso de uma tailor-welded blank constituída por chapas de espessuras diferentes, além
da dificuldade de caracterizar mecanicamente a soldadura, pode existir também o problema
da descrição da geometria do cordão. Nos programas de elementos finitos que utilizam
elementos sólidos (como é o caso do programa DD3IMP) esta questão é facilmente resolvida,
bastando para tal diferenciar a espessura dos elementos nos domínios dos materiais de base
3 Na terminologia anglo-saxónica o termo usado é Friction Stir Welding.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
136
e na zona do cordão de soldadura, mantendo as faces de um dos lados da malha alinhadas.
Porém, quando se utilizam elementos finitos do tipo casca a maior dificuldade advém do
facto dos planos médios das chapas de diferentes espessuras não serem complanares, como é
por defeito admitido na formulação dos elementos finitos do tipo casca [Zhao et al. 2001].
Para contornar este problema de falta de rigor de modelação, Raymond et al. 2004 utilizaram
malhas compostas por elementos do tipo casca (quatro nós por elemento) para discretizar os
materiais adjacentes e elementos do tipo sólido (oito nós por elemento) na zona do cordão de
soldadura. Nos casos em que o domínio do cordão de soldadura não é modelado é comum
encontrarem-se soluções para ligar os materiais adjacentes baseadas em ligações rígidas,
definidas através de condições de fronteira na zona de união dos domínios [Buste et al. 1999,
Meinders et al. 2000].
Atendendo às dúvidas que ainda persistem na literatura sobre a necessidade de modelar
com precisão o cordão de soldadura na simulação numérica de TWBs, na análise que a seguir
se apresenta, procura acrescentar-se aos estudos que foram anteriormente realizados uma
nova perspectiva, no sentido de se poder isolar e quantificar de forma sistemática, a
influência de representar, ou não, o domínio correspondente ao cordão de soldadura. Com
efeito, a abordagem seguida procura, sobretudo, desvincular-se de estudos anteriores
baseados maioritariamente na confrontação directa de resultados experimentais e numéricos,
para processos de soldadura ou materiais específicos. Assim, e de um modo análogo ao
procedimento utilizado por Rodrigues 2001, para estudar o comportamento de ligações
soldadas de aços de alta resistência em tracção, recorre-se às potencialidades da simulação
numérica para testar, de modo sistemático, o efeito de modelar o cordão de soldadura num
leque suficientemente abrangente, tanto em termos das propriedades mecânicas da
soldadura face às do material de base, como nas larguras de cordão consideradas.
À semelhança da estratégia seguida noutros estudos [Saunders e Wagoner 1996, Zhao
et al. 2001, Chan et al. 2003, Raymond et al. 2004], o comportamento do cordão é avaliado
numericamente em vários testes mecânicos elementares capazes de isolar trajectórias de
deformação simples. Em concreto, foram considerados quatro ensaios: tracção uniaxial,
corte, flexão em quatro pontos e expansão biaxial. No estudo considerou-se um material de
base, cujas propriedades mecânicas foram arbitradas (exactamente para desvincular o estudo
de materiais concretos), e considerou-se apenas a ligação de chapas com a mesma espessura.
Ou seja, procurou-se, acima de tudo, avaliar a influência da presença de um domínio
representativo de uma soldadura na simulação, relativamente à situação da deformação de
chapas constituídas apenas pelo material de base (monolíticas).
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
137
4.2 Caracterização do procedimento numérico
A análise microscópica de uma soldadura por fusão (que consiste no tipo de soldadura mais
utilizado para produzir TWBs) permite distinguir três zonas fundamentais, cada uma
contendo características mecânicas e metalúrgicas diferentes: Zona Fundida (ZF), Zona
Afectada pelo Calor (ZAC) e Material de Base (MB). Tanto a ZF como a ZAC resultam
directamente do processo de soldadura e dos fenómenos a ele associados. A caracterização
rigorosa das propriedades mecânicas e da constituição microestrutural destas zonas pode ser
considerada uma tarefa bastante difícil, pois as suas características variam em função da
história térmica suportada [Rodrigues 2001]. Deste modo, atendendo às dificuldades de
atribuir/arbitrar diferentes propriedades mecânicas a duas zonas da soldadura que, na
prática, podem estar confinadas a uma estreita faixa de material, optou-se por considerar
apenas um único domínio na modelação do cordão de soldadura. Ou seja, admite-se como
condição de simplificação que o domínio do cordão de soldadura, a incluir nas malhas de
elementos finitos, representa as propriedades mecânicas médias correspondentes às ZF e
ZAC. Esta simplificação assenta também na necessidade de não tornar o estudo numérico
demasiado complexo, pois o retorno do esforço exigido por tal abordagem seria
previsivelmente reduzido.
Em termos industriais, por razões de fiabilidade e de melhor adaptabilidade à produção
em série, os painéis de TWBs são normalmente produzidos utilizando a soldadura de
resistência por roletes ou, cada vez mais, através das eficientes soldaduras laser de CO2 e de
Nd:YAG. Com efeito, os processos de soldadura laser possibilitam, em termos gerais, maior
produtividade (devido às elevadas velocidades de soldadura), cordões de soldadura mais
estreitos, menores dimensões da ZAC e menores deformações térmicas [Jie et al. 2004].
Assim, neste estudo admite-se que as soldaduras que se pretende avaliar tenham sido
obtidas por soldadura laser. Três larguras de cordão foram arbitradas, 0.5, 1 e 2 mm, que
correspondem, de forma genérica, ao leque de larguras típicas obtidas quando se soldam a
laser chapas com espessuras próximas de 1 mm.
Na análise admite-se que o material de base arbitrado (ver Tabela 4.1) e os materiais
considerados no domínio da soldadura possuem comportamento do tipo elastoplástico e
isotrópico. A lei de encruamento considerada na definição do comportamento dos materiais
é a lei de Swift
( )0
npKσ ε ε= + , (4.1)
em que σ representa a tensão de escoamento, pε representa a deformação plástica
equivalente. Os parâmetros n (coeficiente de encruamento), K e 0ε são constantes dos
materiais.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
138
Tabela 4.1 – Propriedades mecânicas arbitradas para o material de base.
E - Módulo de Young [GPa] 210.0 ν - Coeficiente de Poisson 0.30
0 0MB nKσ ε= - Tensão limite de elasticidade [MPa] 200.0 MB nul Knσ = - Tensão à carga máxima [MPa] 317.0
K [MPa] 399.1
0ε 0.001 Parâmetros da lei de Swift
n 0.10
A variação da heterogeneidade de propriedades mecânicas entre o domínio do cordão de
soldadura e o material de base foi conseguida fazendo variar a tensão limite de elasticidade
( 0 0nKσ ε= ) e o coeficiente de encruamento (n ) do domínio material correspondente à
soldadura. Para determinar o valor de K correspondente a cada par 0σ , n , foi fixado um
valor de 0ε = 0.001 em todos os casos.
Assim, variando a tensão limite de elasticidade da soldadura relativamente à tensão limite
de elasticidade do material de base ( 0MBσ ), escolheram-se seis níveis de heterogeneidade:
0MBσ ± 10%; 0
MBσ ± 30%; e 0MBσ ± 50%. Para cada valor de 0σ , da soldadura, foram ainda
escolhidos três valores para n : 0.05; 0.1; e 0.15.
Nos casos em que o nível de heterogeneidade é de 0MBσ ± 10% ou 0
MBσ ± 30%, foram
testadas todas as combinações possíveis para n . Para os casos de 0MBσ ± 50% foram apenas
consideradas duas combinações 0MBσ − 50%; n = 0.05 e 0
MBσ + 50%; n = 0.15, com as quais
se pretendeu estabelecer os limites mínimo e máximo, respectivamente, do nível de
heterogeneidade entre a soldadura e o material de base.
De modo a quantificar o valor da heterogeneidade entre as propriedades mecânicas da
soldadura e as do material de base, definiu-se o índice ulM , que relaciona, para um ensaio de
tracção, os valores da tensão à carga máxima ( nu Knσ = ) do material da soldadura e do
material de base:
Soldadurau
ul MBu
M σσ
= . (4.2)
São adoptadas três designações4 para comparar a resistência do material da soldadura
relativamente ao material de base: Undermatch, se 1ulM < ; Evenmatch, se 1ulM = ; e
Overmatch, se 1ulM > .
4 Visto não existirem termos equivalentes na língua portuguesa para definir as designações, doravante serão sempre usados os vocábulos da terminologia anglo-saxónica.
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
139
Na Tabela 4.2 encontram-se compilados os valores de ulM para cada uma das
combinações de 0σ e n da soldadura.
Tabela 4.2 – Compilação dos valores do nível de heterogeneidade da soldadura ( ulM ) em função da tensão limite de elasticidade ( 0σ ) e do coeficiente de encruamento (n ).
[MPa] ulM
0σ n = 0.05 n = 0.10 n = 0.15
100 0.38 - - 140 0.54 0.70 0.94
180 0.69 0.90 1.20
220 0.84 1.10 1.47
260 1.00 1.30 1.74
300 - - 2.01
Na Figura 4.1 são apresentadas as curvas tensão-deformação real calculadas através da
equação de Swift (4.1) para as diferentes combinações 0σ , n , bem como a curva
correspondente ao material de base.
Nos casos mais severos de undermatch (Figura 4.1.a), todas as curvas do material da
soldadura estão abaixo da curva que representa o material de base. Apenas para o caso da
combinação 0MBσ − 30%; n = 0.15, ou seja, ulM = 0.94, a curva do material da soldadura se
aproxima da do material de base. Nos casos em que ulM = 0.38 e ulM = 0.54, a tensão
máxima atingida pelas curvas é inferior à tensão limite de elasticidade do material de base.
Para as combinações em que 0 0MBσ σ> − 10% (Figura 4.1.b), o valor mais elevado
considerado para o coeficiente de encruamento (0.15), é suficiente para que a curva relativa
ao material de soldadura passe de uma situação de completo undermatch face à curva do
material de base ( ulM = 0.69 e ulM = 0.90), para um estado em que a soldadura passa a estar
em overmatch ( ulM = 1.20).
Para os casos relativos às variações em torno de 0MBσ + 10% (Figura 4.1.c), passa-se a ter
apenas uma curva para o material da soldadura em situação de undermatch ( ulM = 0.84) e
duas em situação de overmatch ( ulM = 1.10 e ulM = 1.47), relativamente ao material de base.
Finalmente, para o caso das combinações em torno de 0MBσ + 30% e para
0MBσ + 50%; n = 0.15, todas as curvas tensão-deformação da soldadura estão em situação de
overmatch com a excepção da curva para 0MBσ + 30%; n = 0.05, que se encontra numa
situação próxima de evenmatch.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
140
0
100
200
300
400
0.00 0.10 0.20 0.30 0.40 0.50 0.60Deformação
Tens
ão [M
Pa]
Mul = 0.38 Mul = 0.54Mul = 0.70 Mul = 0.94MB
0
100
200
300
400
500
0.00 0.10 0.20 0.30 0.40 0.50 0.60Deformação
Tens
ão [M
Pa]
Mul = 0.69 Mul = 0.90
Mul = 1.20 MB
a) Combinações a partir de 0MBσ − 30% variando
n e para 0MBσ − 50%; n = 0.05.
b) Combinações a partir de 0MBσ − 10%
variando n .
0100200300400500600
0.00 0.10 0.20 0.30 0.40 0.50 0.60Deformação
Tens
ão [M
Pa]
Mul = 0.84 Mul = 1.10
Mul =1.47 MB
0100200300400500600700800
0.00 0.10 0.20 0.30 0.40 0.50 0.60Deformação
Tens
ão [M
Pa]
Mul = 1.0 Mul = 1.30
Mul =1.74 Mul = 2.01
MB
c) Combinações a partir de 0MBσ + 10%
variando n . d) Combinações a partir de 0
MBσ + 30% variando n e para 0
MBσ + 50%; n = 0.15.
Figura 4.1 – Curvas tensão-deformação real para o material da soldadura correspondente às combinações 0σ , n e ao material de base.
4.3 Ensaio de tracção uniaxial
Na simulação numérica do ensaio de tracção uniaxial considerou-se um provete, de
dimensões 30 mm × 5 mm × 1 mm, encastrado numa das extremidades, sendo traccionado na
extremidade oposta até ser atingido o valor máximo da curva força axial-deslocamento d ,
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
141
como se mostra na Figura 4.2. Nesta figura são ainda esquematizadas as orientações
(relativamente à direcção de solicitação) admitidas para o cordão de soldadura.
Figura 4.2 – Representação esquemática bidimensional do ensaio de tracção uniaxial e do posicionamento e orientações admitidas para a soldadura.
Na Figura 4.3 representam-se as malhas utilizadas na simulação do ensaio de tracção para
as três orientações de cordão consideradas: transversal (Figura 4.3.a); longitudinal
(Figura 4.3.b); e a 45° com a direcção de solicitação (Figura 4.3.c).
a) Posicionamento transversal do cordão de soldadura.
b) Posicionamento longitudinal do cordão de soldadura.
c) Posicionamento do cordão de soldadura a 45°.
Figura 4.3 – Representação da distribuição planar dos elementos finitos nas malhas usadas na simulação do ensaio de tracção e de corte.
Na construção das malhas foram considerados, no plano, elementos com forma
quadrangular (0.5 mm de lado) no domínio apenas referente ao material de base e elementos
de forma rectangular (0.25 mm × 0.5 mm) para discretizar o domínio e imediações da
soldadura. A extensão deste domínio de malha refinada na direcção perpendicular ao cordão
da soldadura é igual ao dobro da maior largura (2 mm) considerada para o cordão, de modo
5 30
d
x
y
z 2.
5 15
e = 1 mm
45°
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
142
a melhor acomodar e prever os gradientes de deformação/tensão que surgem na interface
entre a soldadura e o material de base.
A malha de elementos finitos relativa à orientação do cordão de 45° foi obtida através da
rotação de 45° de uma malha com discretização idêntica à malha de orientação transversal
(Figura 4.3.a), mas de grandes dimensões, seguida de quatro operações de corte executadas
recorrendo ao programa DD3TRIM para obter um provete de dimensões 30 mm × 5 mm.
Deste modo, obtém-se uma malha com uma discretização de elementos adequada na zona
do cordão de soldadura e com um tamanho de elemento globalmente homogéneo na zona do
material de base. Na Tabela 4.3 encontram-se compiladas as características das malhas
utilizadas para as três direcções consideradas.
Tabela 4.3 – Características das malhas usadas nas simulações dos ensaios de tracção uniaxial e corte.
Orientação Transversal 45º Longitudinal
Número de nós 1518 1506 2318 Número de elementos 680 742 1080
Número de camadas em espessura 1 1 1
4.3.1 Análise da resistência global da soldadura
De modo a comparar as diferenças de comportamento mecânico entre as diversas
configurações de TWBs e a chapa constituída apenas por material de base (provete
homogéneo), os resultados que a seguir se apresentam foram agrupados em função do índice
de heterogeneidade ulM , para as três larguras de cordão consideradas. Na Figura 4.4
mostra-se a variação de resistência global (representada pela força exercida no provete no
ponto de carga máxima) da TWB ( HetF ) relativamente ao caso monolítico ( HomF ), através da
relação /Het HomF F , no caso da orientação transversal do cordão. A análise do gráfico revela
uma acentuada diminuição da resistência das TWBs relativamente ao MB para os casos de
undermatch, facto que é ainda mais agravado com o aumento da largura do cordão, situação
em que a deformação ocorre preferencialmente na zona do cordão. No caso mais severo de
undermatch, a diminuição de resistência da TWB pode atingir valores da ordem dos 60%
relativamente ao provete homogéneo, que corresponde à situação de evenmatch ( ulM = 1).
Além disso, a diminuição do coeficiente de encruamento de 0.1 para 0.05, nos casos de
0MBσ − 10% (passagem de ulM de 0.90 para 0.69) e 0
MBσ − 30% (passagem de ulM de 0.70
para 0.54), provoca uma queda de resistência em torno dos 15%, por exemplo, no caso do
cordão com 1 mm de largura. Na região do gráfico correspondente à situação de undermatch,
é ainda de realçar a não-linearidade da redução da resistência da TWB com a largura do
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
143
cordão. Esta não-linearidade pode justificar-se através de um fenómeno que na literatura é
designado por “constrangimento à deformação”. Quando uma soldadura em undermatch é
solicitada à tracção na direcção perpendicular ao seu eixo, a deformação plástica tende a
localizar-se na zona mais macia, isto é, na soldadura, enquanto que os materiais adjacentes
permanecem em regime elástico. Assim, a incompatibilidade de deformação entre a
soldadura e os materiais adjacentes, sentida sobretudo na interface, provoca uma resistência
adicional (constrangimento) à deformação do material da soldadura na direcção transversal
à solicitação. O fenómeno do constrangimento à deformação é acompanhado por um forte
aumento da componente hidrostática da tensão no interior do material mais macio
[Dexter 1997, Rodrigues et al. 2004]. No trabalho de Rodrigues 2001, mostra-se que o
fenómeno do constrangimento à deformação é menos significativo quando a largura do
cordão aumenta face à espessura do provete.
Figura 4.4 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ), para as três larguras do cordão de soldadura, no caso da orientação transversal do cordão relativamente à direcção de solicitação em
tracção uniaxial.
Para melhor ilustrar este fenómeno, na Figura 4.5 mostram-se as figuras de isovalores da
componente hidrostática da tensão ( Hσ ) para as três larguras de cordão testadas, no caso de
soldaduras com um nível de heterogeneidade ulM = 0.7, traccionados até um deslocamento
de 0.3 mm. Na Figura 4.5.a, relativa à largura ao cordão de 0.5 mm de largura, observam-se,
como seria de esperar, valores mais elevados da componente hidrostática da tensão junto do
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
144
cordão. À medida que a largura do cordão aumenta (1 mm, Figura 4.5.b e 2 mm, Figura 4.5.c)
constata-se uma redução de Hσ , justificando o decréscimo acentuado da resistência global
da TWB para estas larguras, registado no gráfico da Figura 4.4.
a) Largura de cordão 0.5 mm.
b) Largura de cordão 1 mm.
c) Largura de cordão 2 mm.
Figura 4.5 – Comparação dos isovalores da componente hidrostática do tensor das tensões ( Hσ ) para os provetes com soldaduras em undermatch ( ulM = 0.7) e orientadas transversalmente com a direcção
de solicitação de tracção, para um deslocamento de 0.3 mm.
Nos casos da soldadura em overmatch (Figura 4.4) observa-se que, independentemente da
largura do cordão, a soldadura não condiciona a resistência global das TWBs pois, devido à
sua superior resistência mecânica, esta deforma-se menos do que o material de base.
No caso do cordão orientado a 45° (Figura 4.6) observa-se que o andamento das curvas de
resistência em função do índice ulM é semelhante ao anteriormente descrito para o caso do
posicionamento transversal do cordão, nomeadamente no nível de diminuição de resistência
verificado. No entanto, constata-se que neste caso a influência da largura do cordão no
decréscimo de resistência tem uma importância reduzida face à heterogeneidade de
resistência da soldadura em undermatch
Hσ [MPa]
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
145
Este comportamento pode ser explicado pelo facto das incompatibilidades de deformação
que originam o constrangimento poderem ser resolvidas, para esta orientação do cordão, por
um escorregamento intenso ao longo do cordão de soldadura. Assim, este escorregamento
provoca a diminuição da componente hidrostática da tensão junto do cordão (Figura 4.7),
relativamente ao nível de tensão observado no caso da orientação transversal do cordão
(Figura 4.5.a).
Figura 4.6 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ), para as três larguras do cordão de
soldadura, no caso da orientação do cordão a 45° relativamente à direcção de solicitação, em tracção uniaxial.
Figura 4.7 – Isovalores da componente hidrostática do tensor das tensões ( Hσ ) para o provete com soldadura em undermatch ( ulM = 0.7), largura de cordão de 0.5 mm, e orientação do cordão a 45º com
a direcção de solicitação de tracção, para um deslocamento de 0.3 mm.
Hσ [MPa] max 317MPaHσ =
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
146
Quando a orientação do cordão é paralela à solicitação (Figura 4.8), a variação das
propriedades mecânicas no cordão tem uma influência relativamente pouco acentuada, e
praticamente proporcional, na resistência global da TWB face ao provete homogéneo. Com
efeito, a resistência da TWB decresce à medida que a largura do cordão aumenta, nos casos
da soldadura em situação de undermatch, e vice-versa, para a situação de overmatch.
Para o caso mais severo de undermatch ( ulM = 0.38) e largura de cordão de 2 mm, a perda
de resistência é de 24%. Nas situações de overmatch, o ganho máximo de resistência para
ulM = 2.01 e largura de 2 mm é de 36%. A menor variação da resistência para as situações de
undermatch, relativamente às situações de overmatch, pode ser justificada pelo efeito de
constrangimento induzido pelo material de base sobre a soldadura em undermatch.
Figura 4.8 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ), para as três larguras do cordão de
soldadura, no caso da orientação longitudinal do cordão relativamente à direcção de solicitação.
4.3.2 Análise da ductilidade da soldadura
Na Figura 4.9 mostra-se a evolução da ductilidade relativa do provete TWB, aqui traduzida
pela razão entre o deslocamento à carga máxima (Figura 4.2) do provete TWB (heterogéneo)
e do provete homogéneo ( /het homD D ), em função de ulM , para as três larguras do cordão, no
caso do posicionamento transversal do cordão relativamente à direcção de solicitação. Da
análise do gráfico constata-se a forte redução da ductilidade para a maioria das situações de
undermatch, o que é explicado pela plastificação intensa do domínio do cordão de soldadura.
0.4
0.6
0.8
1
1.2
1.4
1.6
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
147
Com efeito, mesmo para o nível de heterogeneidade mais ligeiro ( ulM = 0.94) e cordão mais
estreito (0.5 mm), são observadas reduções de ductilidade, do provete TWB face ao
homogéneo, de 31%. Para este valor de ulM constata-se, também, que o aumento da largura
do cordão tem uma influência considerável na ductilidade, face ao provete homogéneo, pois
registam-se reduções de /het homD D de 46% e 58% para as largura de 1 mm e 2 mm,
respectivamente. Para níveis de undermatch mais acentuados, por exemplo para ulM = 0.70,
observam-se reduções de ductilidade superiores a 70%, sendo a influência da largura do
cordão menos importante, uma vez que se registaram valores de ductilidade semelhantes
para os cordões com 1 mm e 2 mm de largura. Na situação mais severa de undermatch
considerada ( ulM = 0.38), o deslocamento na carga máxima das TWBs é muito reduzido,
representando apenas cerca de 4% face ao provete homogéneo, independentemente da
largura do cordão considerada.
Figura 4.9 – Evolução da razão entre os deslocamentos à carga máxima da TWB e do provete homogéneo ( /het homD D ), em função do índice ulM , para as três larguras do cordão de soldadura,
no caso da orientação transversal do cordão relativamente à direcção de solicitação.
Para as situações de overmatch observa-se uma ligeira redução da ductilidade relativa das
TWBs, mas muito inferior à registada nas situações de undermatch. A redução máxima
observada é de 14%, para ulM = 2.01 e largura do cordão de 2 mm. A redução de ductilidade
nas situações de overmatch é justificada pelo facto do cordão de soldadura praticamente não
se deformar, o que provoca um constrangimento à deformação no material de base adjacente
e proporciona que a carga máxima ocorra para valores mais baixos de deslocamento.
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Dhe
t / D
hom
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch
Overmatch
ulM
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
148
No caso da orientação do cordão a 45° (Figura 4.10), observa-se que a evolução da
ductilidade em função de ulM , para as três larguras do cordão, tem um comportamento
muito semelhante ao verificado para a orientação transversal do cordão. Contudo, a perda de
ductilidade da TWB é ligeiramente menos acentuada para as situações de undermatch e
ligeiramente agravada para as situações de overmatch, relativamente à orientação transversal.
Nas situações de undermatch, a ductilidade da TWB é influenciada pelo facto do domínio do
cordão estar orientado paralelamente aos planos onde a deformação de corte é máxima (45°
com a direcção de solicitação) o que induz valores elevados de deformação plástica na
soldadura sem criar grandes constrangimentos, independentemente da largura do cordão. Já
nas situações de overmatch, devido à superior resistência mecânica da soldadura, este
domínio não se deforma, o que conduz a uma redução da ductilidade global da TWB.
Figura 4.10 – Evolução da razão entre os deslocamentos à carga máxima da TWB e do provete homogéneo ( /het homD D ), em função do índice ulM , para as três larguras do cordão de soldadura,
no caso da orientação do cordão de 45° relativamente à direcção de solicitação.
Por último, na situação em que o cordão de soldadura é paralelo à direcção de solicitação
(Figura 4.11), observa-se que a ductilidade relativa da TWB é pouco afectada pelas
propriedades mecânicas da soldadura, quando a largura do cordão é de 0.5 mm. Para as
larguras de 1 mm e 2 mm, observam-se reduções máximas de ductilidade de cerca de 20%
para as situações de undermatch e um ganho em torno de 30% para as situações de overmatch.
Constata-se, ainda, nos casos de ulM igual a 0.70, 0.90, 1.10 e 1.30, que correspondem às
situações em que o valor do coeficiente de encruamento do material da soldadura é igual ao
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Dhe
t / D
hom
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch
Overmatch
ulM
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
149
do material de base ( 0.10n = ), o valor da ductilidade relativa da TWB não é afectada, pois
os materiais apresentam o mesmo valor de deformação à carga máxima.
Figura 4.11 – Evolução da razão entre os deslocamentos à carga máxima da TWB e do provete homogéneo ( /het homD D ), em função do índice ulM , para as três larguras do cordão de soldadura,
no caso da orientação longitudinal do cordão relativamente à direcção de solicitação.
4.4 Ensaio de corte
No caso do ensaio de corte, as simulações foram realizadas considerando que o provete está
encastrado ao longo do seu comprimento num dos lados da espessura, sendo aplicado um
deslocamento axial d de 0.5 mm no lado oposto (ver Figura 4.12).
Figura 4.12 – Representação esquemática bidimensional do ensaio de corte, do posicionamento e das orientações dos cordões.
0.4
0.6
0.8
1
1.2
1.4
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Dhe
t / D
hom
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
chUndermatch Overmatch
ulM
30
dx
y
z
5
2.5
15
e = 1 mm 45°
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
150
O valor do deslocamento máximo imposto foi escolhido de tal modo que a deformação
plástica equivalente máxima dos provetes fosse inferior a 100%. As malhas utilizadas para
simular o ensaio de corte foram as mesmas do ensaio de tracção uniaxial atrás descrito
(Figura 4.3 e Tabela 4.3).
4.4.1 Análise da resistência global da soldadura
Na Figura 4.13 mostra-se a evolução da força normalizada ( /het homF F ) em função do índice
ulM , para um deslocamento de 0.5 mm, e três larguras do cordão de soldadura, no caso da
orientação transversal do cordão. A variação de /het homF F é pouco significativa (não
ultrapassando os 5%), quer o cordão de soldadura se encontre em situação de undermatch,
quer em situação de overmatch. No caso da orientação do cordão a 45° (Figura 4.14), os
resultados são muito semelhantes aos do caso do posicionamento transversal do cordão,
ainda que a força normalizada tenha uma evolução ligeiramente mais acentuada com ulM .
Figura 4.13 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ) e da largura do cordão de soldadura,
para a orientação transversal do cordão, no ensaio de corte.
Atendendo a que o ensaio considerado consiste numa solicitação de corte puro, os planos
principais de tensão e deformação estão orientados, no plano, a 45° com a carga exterior
aplicada. Deste modo, as TWBs orientadas a 45° estão sujeitas a uma tensão principal de
tracção na direcção longitudinal da soldadura, o que induz em undermatch uma redução de
força, à carga máxima, superior à que ocorre no caso da orientação transversal. Nas situações
de overmatch, o cordão de soldadura devido à sua resistência superior não se deforma. Nesta
0.8
0.9
1
1.1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
151
situação, o aumento da força aplicada, face aos casos dos cordões orientados
transversalmente, deve-se ao maior volume de material resistente nos provetes com cordão a
45°.
Figura 4.14 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ) e da largura do cordão de soldadura,
para a orientação de 45°, no ensaio de corte.
Os resultados referentes ao caso em que o cordão de soldadura está posicionado
longitudinalmente no provete (Figura 4.15) mostram que a evolução da relação /het homF F é
mais significativa nas situações de undermatch. Com efeito, observa-se que a força atingida
nas TWBs diminui de forma acentuada em undermatch, quando ulM decresce até 0.54. A
partir deste valor de heterogeneidade a diminuição de /het homF F tende a estabilizar,
registando-se uma diminuição máxima da força de 45% para o caso de ulM = 0.38 e largura
de cordão de 2 mm.
Para as situações de overmatch o incremento da força é pouco acentuado, observando-se
um aumento máximo de 6% para a situação de ulM = 2.01 e largura de cordão de 2 mm.
De modo a ilustrar o comportamento do cordão de soldadura nesta orientação, na
Figura 4.16 mostram-se as figuras de isovalores de deformação plástica equivalente nas
situações de undermatch ( ulM = 0.7), evenmatch e overmatch ( ulM = 1.3), para a largura de
cordão de 1 mm.
0.8
0.9
1
1.1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
152
Figura 4.15 – Evolução da força máxima normalizada ( /het homF F ) em função do parâmetro de
heterogeneidade local relativo à tensão na carga máxima ( ulM ) e da largura do cordão de soldadura, para a orientação longitudinal do cordão, no ensaio de corte.
a) Situação de undermatch com ulM = 0.7.
b) Situação de evenmatch ( ulM = 1).
c) Situação de overmatch ulM = 1.3.
Figura 4.16 – Comparação dos isovalores de deformação plástica equivalente ( pε ) para os provetes com cordões de soldadura de 1 mm de largura, orientados longitudinalmente com a direcção de
solicitação de corte, para um deslocamento de 0.5 mm.
pε
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Fhet
/ Fh
om
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
chUndermatch Overmatch
ulM
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
153
Na situação da soldadura em evenmatch (Figura 4.16.b) observa-se que a distribuição da
deformação é homogénea e que o nível máximo atingido na zona central do provete é
pequeno ( pε ≈ 5%). Quando se passa para uma situação de undermatch o cordão suporta
quase a totalidade da deformação (Figura 4.16.a), por oposição ao nível de deformação no
material de base que é muito reduzido. Observa-se, ainda, que a deformação do cordão de
soldadura não influencia a deformação no material de base junto da interface entre os
materiais. Na situação de overmatch (Figura 4.16.c) o cordão de soldadura praticamente não
se deforma relativamente ao material de base e a influência da diferença de comportamento
entre os materiais é reduzida na sua interface.
4.5 Ensaio de flexão em quatro pontos
De modo a sujeitar o cordão de soldadura a uma solicitação de flexão pura, optou-se por
simular o ensaio de flexão em quatro pontos (Figura 4.17). À semelhança do estudo dos
ensaios de tracção uniaxial e de corte, três posicionamentos do cordão foram considerados:
transversal, longitudinal e a 45°. O deslocamento total ( d ) aplicado nos rolos de avanço foi
de 4 mm e o coeficiente de atrito chapa/rolos considerado foi de 0.1.
Figura 4.17 – Representação esquemática do ensaio de flexão em quatro pontos, do posicionamento e orientação dos cordões de soldadura na TWB.
As malhas de elementos finitos utilizadas nas simulações estão ilustradas na Figura 4.18.
Atendendo à simetria do ensaio e dos domínios materiais, apenas um quarto do modelo foi
utilizado na simulação nos casos do posicionamento transversal (Figura 4.18.a) e
longitudinal (Figura 4.18.b) do cordão. No caso da orientação a 45° do cordão, como não há
simetria, considerou-se a totalidade do modelo (Figura 4.18.c). À semelhança das malhas
d
x
y
z
60
30
xzy
d Ø10
5 1510
1
30
15
45°
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
154
usadas nos ensaios de tracção e de corte, também no caso do ensaio de flexão foi considerada
uma zona de transição entre o domínio material correspondente ao material de base e o do
cordão de soldadura. Este domínio de transição equivale a metade da largura da maior
considerada para o cordão de soldadura (na direcção perpendicular) e possui o mesmo nível
de refinamento deste. As características numéricas das malhas encontram-se compiladas na
Tabela 4.4.
a) Posicionamento transversal do cordão. b) Posicionamento longitudinal do cordão.
c) Posicionamento do cordão a 45°.
Figura 4.18 – Representação das distribuições planares de elementos das malhas usadas no ensaio de flexão em quatro pontos.
Tabela 4.4 – Características das malhas usadas nas simulações do ensaio de flexão em quatro pontos.
Orientação Transversal (1/4) 45º (4/4) Longitudinal (1/4)
Número de nós 6045 13503 7137 Número de elementos 3840 8620 4560
Número de camadas em espessura 2 2 2
4.5.1 Análise da resistência global da soldadura
Na Figura 4.19 mostram-se os resultados referentes à evolução da força de flexão em função
do deslocamento imposto aos rolos, para o posicionamento transversal do cordão, nos casos
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
155
em undermatch de ulM = 0.38 e ulM = 0.54. Os restantes casos de heterogeneidade da
soldadura foram omitidos do gráfico uma vez que não se registaram variações significativas
na força de flexão da TWB relativamente ao provete homogéneo. A análise das curvas
mostra que a força para um deslocamento de 4 mm é apenas ligeiramente dependente da
largura do cordão de soldadura em ambos os casos de ulM testados. Para o deslocamento
máximo dos rolos, a força máxima atingida, com ulM = 0.54 e ulM = 0.38, é respectivamente
inferior em cerca de 12% e 33%, ao valor registado para o provete monolítico (situação de
evenmatch).
Figura 4.19 – Evolução da força de flexão em função do deslocamento dos rolos para as situações de
ulM = 0.38 e ulM = 0.54, para as três larguras de cordão consideradas, no caso do posicionamento transversal do cordão.
No caso do posicionamento do cordão a 45° (Figura 4.20) apresenta-se apenas a situação
da TWB para o caso de ulM = 0.38. Para os outros valores de ulM não foram registadas
variações importantes na força de flexão. Ainda assim, mesmo para a situação mais severa de
undermatch, a importância da presença do domínio (e as suas propriedades mecânicas) da
soldadura é muito reduzida, independentemente da largura do cordão.
Para a orientação longitudinal do cordão (Figura 4.21) representam-se apenas os casos
extremos de ulM (0.38 e 2.01), associados a uma largura de cordão de 2 mm, pois não se
observam alterações significativas da força de flexão das TWBs para os restantes níveis de
ulM e larguras de cordão.
0
200
400
600
800
1000
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5 4.0Deslocamento z [mm]
Forç
a de
flex
ão [N
]
Cordão 0.5mm - Mul = 0.38 Cordão 0.5mm - Mul = 0.54Cordão 1 mm - Mul = 0.38 Cordão 1 mm - Mul = 0.54Cordão 2 mm - Mul = 0.38 Cordão 2 mm - Mul = 0.54Monolítico
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
156
Figura 4.20 – Evolução da força de flexão em função do deslocamento dos rolos para a situação de
ulM = 0.38, para as três larguras de cordão consideradas, no caso do posicionamento do cordão a 45°.
Figura 4.21 – Evolução da força de flexão em função do deslocamento dos rolos para as situações de
ulM = 0.38 e ulM = 2.01, para a largura de 2 mm, no caso do posicionamento longitudinal do cordão.
0
200
400
600
800
1000
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5 4.0Deslocamento z [mm]
Forç
a de
flex
ão [N
]
Cordão 2 mm - Mul = 0.38 Cordão 2 mm - Mul = 2.01
Monolítico
0
200
400
600
800
1000
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5 4.0Deslocamento z [mm]
Forç
a de
flex
ão [N
]
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm
Cordão 2 mm Monolítico
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
157
As variações máximas registadas para a força no final do avanço dos rolos, foram de
+4.6% para ulM = 2.01 e de -2.6% para ulM = 0.38. A reduzida influência da presença do
cordão de soldadura na força de flexão das TWBs, tanto neste caso como para a orientação de
45°, encontra justificação, por um lado, no facto do domínio do cordão ser muito menor do
que o domínio do material de base e, por outro, devido à orientação de solicitação ser menos
exigente para o cordão de soldadura, pois cada secção (em rotação) é composta
maioritariamente por material de base.
4.5.2 Análise da variação do retorno elástico
A segunda variável analisada no ensaio de flexão em quatro pontos foi o retorno elástico. Na
análise que se apresenta, o retorno elástico é quantificado através da medição do ângulo
correspondente à variação da configuração da chapa, antes e depois da descarga (remoção
das ferramentas). Na Figura 4.22 mostra-se a evolução do ângulo de retorno elástico (α ) em
função do índice ulM , para as três larguras da soldadura, no caso da orientação transversal
do cordão.
Figura 4.22 – Evolução do ângulo de retorno elástico (α ) em função do índice ulM , para as três larguras do cordão, no caso da orientação transversal do cordão, no ensaio de flexão em quatro
pontos.
Analisando a figura, constata-se que para valores de ulM superiores a 0.69 não se
observam variações significativas do ângulo de retorno elástico. No entanto, para os casos de
ulM = 0.54 e ulM = 0.38 registam-se diminuições em torno de 15% (0.75°) e 35% (1.7°),
respectivamente. Observa-se ainda que o ângulo de retorno elástico é praticamente
Depois do retorno elástico
Antes do retorno elástico
α
2.5
3.0
3.5
4.0
4.5
5.0
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Âng
ulo
de re
torn
o el
ásti
co [°
]
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
ch
Undermatch Overmatch
ulM
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
158
independente da largura do cordão para o intervalo [0.38, 0.69] de variação de ulM . Nas
situações de overmatch do cordão as variações do ângulo de retorno elástico podem ser
consideradas desprezáveis.
Para as orientações longitudinal e a 45° do cordão, à semelhança do que foi observado
para a variável força de flexão, não foram registadas variações significativas do ângulo de
retorno elástico, independentemente do nível de heterogeneidade e largura de cordão
considerados. As variações máximas observadas foram inferiores a 0.5°, pelo que não são
aqui representados os gráficos de evolução do ângulo de retorno elástico para esses casos.
4.6 Ensaio Jovignot circular
O último teste realizado para avaliar a influência da modelação do cordão de soldadura no
comportamento mecânico das TWBs consistiu no ensaio Jovignot circular5, o qual permite
sujeitar o material a deformar a uma trajectória de deformação biaxial simétrica na região
próxima do pólo da calote esférica, no caso de um material monolítico. O ensaio Jovignot
consiste em provocar a deformação de uma chapa circular, fixa numa matriz circular, através
da injecção de óleo sob a face inferior da chapa [Fernandes 1984], tal como está
esquematizado na (Figura 4.23.a). Uma das principais vantagens deste ensaio, que o leva a
ser muito usado na obtenção de Curvas Limite de Embutidura (CLE6), reside em não existir
contacto ferramenta-chapa [Barata da Rocha e Ferreira Duarte 1993].
Figura 4.23 – Representação esquemática bidimensional do ensaio Jovignot circular: a) Descrição das ferramentas e dimensões consideradas; b) Condição de fronteira utilizada para o bordo limite da
chapa nas simulações numéricas.
5 Na literatura este ensaio é também designado por Bulge Test. 6 Na terminologia anglo-saxónica são normalmente usados os termos Forming Limit Diagram (FLD) ou Forming Limit Curve (FLC).
0.8
x
z
y Matriz
Cerra-Chapas Ø 150
Ø 200
ChapaP
R13
a)
b) H
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
159
Na metade esquerda da Figura 4.23.a mostra-se o posicionamento das ferramentas e da
chapa no início do ensaio, na metade à direita é representado um instante intermédio da
conformação. Na modelação do ensaio considerou-se o bordo limite da chapa encastrado
(Figura 4.23.b). Durante a simulação do ensaio a pressão ( P ) sobre os nós da malha é
aumentada, até ser atingida uma deformação plástica equivalente de 25% na região do pólo
da calote, sendo nessa altura registados a altura atingida pelo pólo da calote (H ) e o valor de
pressão correspondente. As simulações foram realizadas utilizando-se uma versão do
programa DD3IMP especialmente adaptada para a simulação do ensaio Jovignot [Alves et al.
2006a]. Atendendo às simetrias geométrica e material foi apenas simulado um quarto do
modelo do ensaio. A malha utilizada nas simulações (Figura 4.24) contém as mesmas
características de refinamento na região da soldadura anteriormente referidas para os outros
ensaios mecânicos testados. A malha é constituída por 1601 elementos e 3344 nós, tendo sido
considerada apenas uma camada de elementos na direcção da espessura.
Figura 4.24 – Distribuição planar dos elementos da malha de elementos finitos usada na simulação do ensaio Jovignot circular.
Na Figura 4.25 mostra-se a evolução da relação ( /het homH H ) entre a altura máxima
atingida pela TWB ( hetH ) e pela chapa homogénea ( homH ), para uma deformação plástica
equivalente de 25% na região do pólo da calote. Mais uma vez, os resultados foram tratados
em função de ulM , para as três larguras do cordão consideras. Para as situações em que o
cordão se encontra em undermatch face ao material de base, observa-se que o índice ulM tem
um efeito muito pronunciado na altura máxima atingida pelas TWBs. De facto, registaram-se
diminuições de /het homH H em torno de 20% mesmo para situações em que a diferença de
resistência entre a soldadura e o material de base é reduzida ( ulM ≈ 0.90), para os casos das
larguras de cordão de 1 mm e 2 mm. Ainda para estas larguras de cordão, a diminuição da
altura máxima atingida pelas TWBs corresponde a cerca de 65% e 85% da altura obtida no
0.25
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
160
caso da chapa homogénea para as situações de ulM ≈ 0.70 e ulM = 0.38, respectivamente. No
que respeita à influência da largura do cordão, é bem patente a diferença de comportamento
entre os cordões de 0.5 mm de largura, em que se obtêm os maiores valores de /het homH H , e
os de larguras 1 mm e 2 mm, para os quais as curvas de evolução de /het homH H são muito
próximas. A diferença máxima observada para /het homH H entre a curva correspondente à
largura de 0.5 mm e as curvas de 1 mm e 2 mm é de cerca de 25% para ulM ≈ 0.70. Nos casos
das TWBs em que ulM > 1, a variação da relação /het homH H é quase desprezável, visto que é
a resistência do material de base que condiciona a altura máxima atingida pelas TWBs.
Figura 4.25 – Evolução da relação da altura máxima atingida no ensaio Jovignot /het homH H , para uma deformação plástica equivalente de 25% na região do topo da calote, entre a TWB e o caso
homogéneo, em função do índice ulM , para as três larguras do cordão estudadas.
Na Figura 4.26 mostram-se as figuras de isovalores de deformação plástica equivalente,
obtidas quando o valor máximo desta variável no topo da calote é de 25%, para o caso
monolítico e para os casos das TWB com ulM = 0.7 e ulM = 1.3, associados às larguras de
0.5 mm e 2 mm do cordão. No caso da situação de undermatch, as figuras de isovalores
(Figura 4.26.a e Figura 4.26.b) evidenciam que a concentração de deformação plástica ocorre
no cordão, já que o material de base se deforma muito menos que o material da soldadura.
Em termos absolutos, constata-se que a altura máxima atingida pelo topo da calote esférica,
nestes casos, é bastante inferior à verificada no caso da chapa monolítica (Figura 4.26.c).
0
0.2
0.4
0.6
0.8
1
1.2
0.2 0.4 0.6 0.8 1 1.2 1.4 1.6 1.8 2 2.2Mul
Ahe
t / A
hom
Cordão 0.5 mm Cordão 1 mm Cordão 2 mm
Even
mat
chUndermatch
Overmatch
ulM
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
161
a) Largura de cordão 0.5 mm, ulM = 0.7, H = 16.32 mm.
b) Largura de cordão 2 mm, ulM = 0.7, H = 10.37 mm.
c) Caso monolítico, H = 32.71 mm.
d) Largura de cordão 0.5 mm, ulM = 1.3, H = 32.56 mm.
e) Largura de cordão 2 mm, ulM = 1.3, H = 32.54 mm.
Figura 4.26 – Comparação dos isovalores da deformação plástica equivalente ( pε ), quando o valor máximo da deformação plástica equivalente no topo da calote é de 25%, no caso da chapa monolítica e nos casos das TWB com ulM = 0.7 e ulM = 1.3, associados às larguras de 0.5 mm e 2 mm do cordão,
para o ensaio Jovignot.
pε
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
162
No caso da chapa monolítica foi registada uma altura máxima de 32.71 mm, enquanto que
para ulM = 0.7, se mediram 16.32 mm e 10.37 mm para as larguras de cordão de 0.5 mm e
2 mm, respectivamente. Nas situações de ulM = 1.3 (Figura 4.26.d para o cordão de 0.5 mm e
Figura 4.26.e para o cordão de 2 mm), observou-se que a largura do cordão tem pouca
influência na altura máxima atingida pelo calote. Para a largura de cordão de 0.5 mm
(32.56 mm de altura) é praticamente imperceptível a alteração do gradiente de deformação
entre o material de base e a soldadura. No caso da largura de 2 mm (32.54 mm de altura)
observa-se que a diferença entre as deformações na soldadura e no material de base, na
região do topo da calote, é mais pronunciada do que no caso anterior, originando o
aparecimento de uma zona de transição.
4.7 Conclusões e comentários
Os resultados obtidos para cada um dos ensaios mecânicos simples escolhidos para avaliar a
influência da modelação do cordão de soldadura na previsão do comportamento mecânico
de chapas soldadas, permitiram estabelecer, de forma quantitativa e sistemática, relações
entre o nível de heterogeneidade e a largura do cordão, com o nível de resistência global e
capacidade de deformação das TWBs.
No caso da solicitação em tracção uniaxial, a modelação do domínio do cordão de
soldadura pode ser determinante, tanto no nível de resistência como na capacidade de
deformação obtida para a TWB, nas situações em que o cordão tem orientações transversal
ou a 45° com a direcção de solicitação e a resistência mecânica do cordão é inferior à do
material de base. Além disso, para a orientação transversal do cordão, mesmo quando a
diminuição da resistência do material da soldadura é pouco acentuada (por exemplo, para
ulM = 0.9), a redução da ductilidade da TWB pode ser elevada (48% no caso de ulM = 0.9 e
cordão de 1 mm), ainda que a diminuição de resistência seja pequena (3% no caso de
ulM = 0.9 e cordão de 1 mm). Nos casos em que o cordão se encontra em overmatch, o efeito
da presença do cordão não é significativo, quer na resistência mecânica, quer na capacidade
de deformação.
Para a solicitação em trajectórias de corte, as simulações evidenciaram que a influência do
nível de heterogeneidade e da largura do cordão só é relevante nas situações em que o
cordão é paralelo à direcção de solicitação, atingindo-se neste caso reduções de resistência
até cerca de 40% para as situações mais severas de undermatch.
No caso do ensaio de flexão em quatro pontos constatou-se que, de um modo geral, a
modelação do domínio e das propriedades mecânicas da soldadura tem pouca influência,
tanto na resistência mecânica como no ângulo de retorno elástico medido nas TWBs. No que
Capítulo 4. Influência da modelação do cordão na previsão do comportamento mecânico de chapas soldadas
163
respeita à resistência mecânica, só se observaram variações relevantes nos casos em que o
cordão tem uma disposição perpendicular à maior dimensão do provete, e nas situações
mais severas de undermatch. Na situação mais desfavorável, a redução máxima da força de
flexão foi de 33% no final do ensaio. As maiores variações em termos de ângulo de retorno
elástico também ocorrem para as situações extremas de undermatch, tendo sido registadas
diferenças máximas de 1.7°.
No ensaio Jovignot, nas situações de undermatch observaram-se variações significativas da
altura atingida pela calote nos casos em que o índice de heterogeneidade ulM é inferior a
0.70, tendo sido registadas reduções de altura de cerca 68% para este valor de ulM associado
a uma largura do cordão de 2 mm. Nas situações de overmatch, as variações de
conformabilidade observadas são desprezáveis, uma vez que a deformação no cordão de
soldadura é muito inferior ao do material de base.
De acordo com os resultados obtidos pode afirmar-se que, nas situações da soldadura em
overmatch relativamente ao material de base, a presença do domínio da soldadura não parece
afectar de forma significativa os resultados obtidos pela simulação numérica, podendo ser
dispensável a inclusão da soldadura no modelo da simulação. Para as situações em que o
cordão de soldadura esteja em situação de undermatch, os resultados mostram que em
determinadas situações (seja pelo tipo de solicitação e/ou pela orientação do cordão na TWB)
a redução de resistência (e/ou conformabilidade global) pode ser muito significativa, sendo
nestes casos fortemente recomendável que se modele o domínio geométrico e material do
cordão de soldadura.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
164
165
CAPÍTULO CINCO
Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
Neste capítulo os algoritmos e as estratégias numéricas implementadas no programa DD3TRIM são testados na simulação numérica de um ensaio padronizado multi-etapas dedicado à previsão do retorno elástico. São apresentados resultados experimentais do ensaio realizado tanto com esboços monolíticos como com tailor-welded blanks. São reforçadas algumas conclusões sobre a influência da modelação numérica do cordão no comportamento mecânico de tailor-welded blanks.
5.1 Enquadramento
Os componentes mecânicos produzidos pelo processo de estampagem de chapas podem
apresentar diversos defeitos, consoante os parâmetros tecnológicos de operação e/ou as
características dos materiais. Dentro destes, são recorrentemente mencionados a excessiva
redução localizada da espessura da chapa, as rugas, o aparecimento de uma textura na
superfície da chapa designada por “casca de laranja”, os defeitos originados pela
recuperação elástica do material, etc.
A recuperação elástica do material, fenómeno vulgarmente designado por retorno
elástico1, é hoje em dia, devido à aplicação crescente de materiais com elevadas relações
tensão limite de elasticidade/módulo de elasticidade, uma das maiores causas de defeitos
geométricos e de imperfeições dimensionais nos componentes fabricados em chapa. Durante
1 Na terminologia anglo-saxónica é correntemente usado o termo springback.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
166
uma operação de estampagem a chapa tende a acumular uma grande quantidade de energia
de deformação elástica, pelo que, quando no final da conformação são retiradas as
ferramentas, o corpo deformado recupera elasticamente o que conduz a que o componente
final tenha uma geometria diferente do conformado antes de serem retiradas as ferramentas.
Diversos estudos confirmam que o retorno elástico depende, sobretudo, da quantidade de
energia de deformação elástica que é armazenada no material durante a fase de
conformação. Esta energia é dependente, por um lado, das propriedades mecânicas do
material da chapa e, por outro, das forças que são desenvolvidas na interface
ferramentas/chapa [Narasimhan e Lovell 1999]. A previsão rigorosa do retorno elástico é
uma tarefa bastante complexa. Esta complexidade advém do facto das relações que existem
entre o retorno elástico e os factores que o influenciam serem fortemente não lineares
[Viswanathan et al. 2003].
Os parâmetros que influenciam a previsão numérica do retorno elástico de um
componente podem ser divididos em dois tipos: físicos e numéricos. Nos parâmetros físicos
incluem-se a sensibilidade do retorno elástico às propriedades mecânicas dos materiais e aos
parâmetros tecnológicos do processo de conformação. No que respeita às propriedades
mecânicas dos materiais, é bem conhecido da literatura que o modelo constitutivo, usado
para caracterizar o material no decorrer da simulação, pode ter repercussões importantes na
previsão do retorno elástico. Em particular, o uso de leis de encruamento complexas que
incluam a evolução cinemática da superfície de plasticidade [Li et al. 2002, Zhao e Lee 2002,
Papeleux e Ponthot 2002, Oliveira et al. 2006], a introdução de modelos que considerem a
anisotropia elástica e plástica [Geng e Wagoner 2002, Li et al. 2002], a previsão da evolução
do módulo de elasticidade [Li et al. 2002, Yang et al. 2004, Alves et al. 2006b] e, de modo mais
específico, do efeito de Bauschinger [Gau e Kinzel 2001a, Gau e Kinzel 2001b, Geng e
Wagoner 2002, Yoshida e Uemori 2003], podem melhorar a previsão do retorno elástico. Em
termos da influência induzida pelos parâmetros tecnológicos do processo no retorno elástico,
são recorrentemente citadas variáveis como a espessura da chapa, o coeficiente de atrito
(condições de lubrificação), a força de aperto do cerra-chapas, a geometria das ferramentas e
a sequência de remoção das ferramentas [Gunnarsson e Schedin 2001, Carden et al. 2002, Li et
al. 2002, Papeleux e Ponthot 2002, Viswanathan et al. 2003, Palaniswamy et al. 2004].
De entre os parâmetros relacionados com a simulação numérica do problema e que
influenciam a previsão do retorno elástico, os autores apontam comummente a formulação
temporal utilizada [Lee e Yang 1998, Narasimhan e Lovell 1999], o número de pontos de
integração de Gauss na direcção da espessura [Li et al. 2002, Zhao e Lee 2002], a forma e o
tamanho dos elementos finitos [Lee e Yang 1998, Oliveira et al. 2002, Alves 2003], e a
estratégia numérica de remoção das ferramentas [Kawka et al. 1998, Li et al. 2002, Meinders et
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
167
al. 2005]. Assim, como o fenómeno de retorno elástico pode ser fortemente afectado por
vários parâmetros numéricos, a sua simulação torna-se mais sensível às tolerâncias
numéricas do que a simulação do próprio processo de conformação [Lee e Yang 1998].
Com o aumento da utilização de chapas de aço de elevada resistência e de ligas de
alumínio em componentes automóveis, o problema da previsão do retorno elástico foi
substancialmente agravado, uma vez que a amplitude da recuperação elástica é directamente
proporcional à razão entre a tensão máxima atingida durante a conformação e o módulo de
elasticidade do material [Geng e Wagoner 2002].
Apesar do elevado esforço dispendido e dos avanços conseguidos, principalmente na
última década, no desenvolvimento e aperfeiçoamento dos programas de cálculo para
simular a etapa de retorno elástico, pode afirmar-se que, infelizmente, ainda não é possível
obter previsões muito rigorosas deste fenómeno através do método dos elementos finitos
[Roll e Rohleder 2002, Xia et al. 2004, Meinders et al. 2005, Alves et al. 2006b]. Deste modo, a
principal preocupação em termos industriais aquando da previsão do retorno elástico de um
componente, em particular no caso de componentes complexos, corresponde à previsão dos
sentidos das variações dimensionais e geométricas, relegando para segundo plano (por força
das insuficiências da simulação) a magnitude dessas variações [Hance 2000]. Sob o ponto de
vista da concepção do produto, tendo em conta a contenção de custos e atendendo às
dificuldades de prever de forma muito rigorosa o retorno elástico, pode ser preferível
acomodar as variações geométricas de componentes, em vez de as corrigir durante a fase do
projecto/construção das ferramentas segundo procedimentos experimentais de
tentativa-e-erro que são sempre muito onerosos.
Nos últimos anos tem aumentado o interesse em desenvolver ensaios experimentais com
vista a proporcionar métodos padronizados simples para avaliar a influência de parâmetros
na previsão do retorno elástico. A ideia base, comum a quase todos os ensaios, consiste em
reproduzir as trajectórias de deformação mais frequentes do processo de conformação de
chapas e que mais propiciam o fenómeno do retorno elástico, nomeadamente a sequência de
tracção - dobragem - desdobragem - tracção. De entre outras, algumas das metodologias
mais usadas na avaliação do retorno elástico baseiam-se em ensaios de flexão simples
[Oliveira et al. 2002, Esat et al. 2002, Inamdar et al. 2002, Tekiner 2004, Meinders et al. 2005],
flexão com carga axial de retenção2 [Zhao e Lee 2001, Li et al. 2002, Liu et al. 2002, Hino et al.
2003, Viswanathan et al. 2003], quinagem [Livatyali et al. 2002, Buranathiti e Cao 2004], e
conformação de perfis simples [Pourboghrat e Chu 1995, Santos et al. 2002, Santos et al. 2004,
Green 2005, Oliveira et al. 2006]. Uma das dificuldades encontradas em alguns destes ensaios
2 Na terminologia anglo-saxónica é usada a designação de draw-bending.
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
168
de avaliação de retorno elástico consiste em determinar a variável característica do ensaio
(ângulo de abertura, raio de curvatura de um perfil, abertura linear, etc.) sem que o processo
de medição influencie o resultado. Com vista a ultrapassar este problema, Demeri et al. 2000
apresentaram um trabalho onde se descreve um ensaio padronizado3 que consiste na
medição da abertura de anéis extraídos de um conformado axissimétrico. O ensaio possui
várias características que o tornam bastante atractivo como método de aferição do rigor da
previsão do retorno elástico fornecida pelos programas de simulação. Essas características
encontram-se enumeradas nos trabalhos de Demeri et al. 2000 e Xia et al. 2004, sendo de
destacar a simplicidade e elevada repetibilidade do procedimento, a reprodução no ensaio
de trajectórias de deformação típicas do processo de estampagem, e o facto do nível de
retorno elástico ser relativamente elevado, de fácil medição, e pouco sensível a erros de
medida. Além disso, o esforço computacional pode ser considerado relativamente pequeno.
Uma variante deste ensaio, em termos de dimensões e geometria do conformado
axissimétrico, bem como da altura dos anéis, pode ser encontrada nos trabalhos Rohleder
2001 e Haeppa e Rohleder 2005.
No trabalho que se apresenta neste capítulo o ensaio Demeri foi usado para validar e
testar as ferramentas numéricas implementadas no programa DD3TRIM. Concretamente, a
escolha deste ensaio permitiu testar as operações de corte e divisão de malhas de elementos
finitos, bem como a fiabilidade dos métodos de remapeamento desenvolvidos. Por último, o
ensaio serviu também para complementar e comprovar as conclusões retiradas, no capítulo
anterior, sobre a influência da modelação do cordão de soldadura no comportamento
mecânico de chapas soldadas.
5.2 Descrição do ensaio Demeri
O ensaio proposto por Demeri et al. 2000 é do tipo multi-etapas e começa pela estampagem
de uma taça axissimétrica (Figura 5.1.a), que é posteriormente cortada paralelamente à sua
base de modo a extrair-se um anel (Figura 5.1.b e Figura 5.1.c). O anel assim obtido é cortado
na direcção radial, podendo observar-se na Figura 5.1.d a sua abertura devido ao retorno
elástico. A quantificação da distância de abertura do anel ( d ) constitui a variável principal
na aferição do retorno elástico, permitindo, também estimar de forma indirecta o nível de
tensões residuais instaladas nas paredes da taça [Demeri et al. 2000]. No ensaio proposto
3 Na terminologia anglo-saxónica o ensaio aparece referenciado com várias designações, no entanto, a mais comum é Split-Ring Test. Uma vez que não existe consenso sobre qual a tradução portuguesa mais adequada para a designação do ensaio, neste trabalho o teste é referido apenas como “Ensaio Demeri”.
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
169
pelos autores os cortes são executados recorrendo à tecnologia laser, sendo porém referido
que este processo de corte pode afectar ligeiramente (com decréscimo) o valor da abertura do
anel.
Figura 5.1 – Etapas do ensaio Demeri: a) Taça axissimétrica; b) Extracção de um anel da taça; c) Anel extraído da taça; d) Anel depois de aberto.
5.3 Caracterização do procedimento experimental utilizado
As ferramentas usadas na execução dos ensaios experimentais foram construídas seguindo
as especificações geométricas apresentadas por Demeri et al. 2000 (Figura 5.2) e adaptadas de
modo a poderem operar acopladas a uma máquina de tracção convencional [Chaparro et al.
2006b].
Nos ensaios foram usados dois tipos de aços de grande aplicação em componentes
automóveis: um aço macio de referência DC06 4 e um aço do tipo dual phase de referência
DP600 5. As chapas a ensaiar, com espessura de 1 mm, foram cortadas de modo a obterem-se
esboços circulares com diâmetro de 200 mm. As ferramentas foram montadas em máquinas
de tracção convencionais (Figura 5.3.a). Foram utilizadas duas máquinas de tracção com
100 kN e 200 kN de capacidade máxima, para embutir os esboços (monolíticos e TWBs)
constituídos por aço macio (DC06) ou aço de alta resistência (DP600), respectivamente. A
força de aperto do cerra-chapas foi aplicada, de modo distribuído, através de 10 molas
helicoidais calibradas (ver Figura 5.3.a e Figura 5.3.b). A força total aplicada no cerra-chapas
para os esboços (monolíticos e TWBs) constituídos por aço DC06 e DP600 foi de 16 kN e de
28 kN, respectivamente. Ao contrário da metodologia seguida por Demeri et al. 2000, em que
não é usado lubrificante, neste trabalho optou-se por aplicar nos esboços uma película de
óleo com densidade de superfície de 1.4 g/m2. O lubrificante usado consistiu num óleo de
referência Quaker® N6130 [Wouters et al. 2002]. O percurso do punção é de 60 mm, tendo
sido utilizada uma velocidade de avanço constante, de 100 mm/s.
4 Material fornecido pela empresa Sollac®, cuja designação actual é Arcelor Atlantique et Lorraine. 5 Material fornecido pela empresa SSAB®
a) b) c) d)
d
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
170
Figura 5.2 – Representação esquemática em corte das ferramentas usadas no ensaio Demeri estudado (dimensões em mm).
a) b)
Figura 5.3 – Conjunto das ferramentas do ensaio Demeri montado na máquina de tracção: a) Em operação; b) Após embutidura.
Uma das principais dificuldades relativas ao procedimento experimental, quando se
executa a embutidura de conformados axissimétricos, consiste em garantir que o eixo de
simetria das ferramentas e do esboço sejam coincidentes. Deste modo, a fase de preparação
que antecede a operação de estampagem propriamente dita deve revestir-se de especial
atenção [Duchêne e Habraken 2005]. Para garantir que os eixos do esboço e do punção
x z y
1
Ø 100
R12R12
Punção
Cerra-Chapas
Matriz
Ø 110
Ø 200
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
171
estejam perfeitamente alinhados durante a embutidura, optou-se por fixar a chapa ao punção
por intermédio de um parafuso de centragem (Figura 5.3.b). A carga de aperto no parafuso
de centragem é controlada através de uma mola helicoidal na qual é aplicada uma força
inicial de 310 kgf (Figura 5.3.b). Depois da operação de embutidura foram extraídos anéis
com 10 mm de largura a meia altura da taça (Figura 5.4), de modo a obter anéis cuja
distribuição de tensões fosse a mais homogénea possível, permitindo que a recuperação
elástica ocorra maioritariamente no plano perpendicular ao eixo de simetria.
Figura 5.4 – Representação esquemática da localização da extracção e altura do anel (dimensões em mm).
Todos os cortes foram executados recorrendo ao processo de corte por electroerosão por
fio (Figura 5.5.a e Figura 5.5.b) de modo a afectar o menos possível o nível de tensões
instaladas na taça após a embutidura nas zonas dos cortes. O corte para a abertura do anel
foi efectuado segundo a direcção de laminagem da chapa.
Figura 5.5 – Etapas intermédia e final do ensaio Demeri: a) Taça antes das operações de corte; b) Anel e restantes partes da taça depois dos cortes.
a) b)
10 25
25
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
172
5.4 Estudo do ensaio Demeri com chapas monolíticas
Na simulação numérica do ensaio Demeri foi utilizada a lei de encruamento de Swift
conjuntamente com o critério de plasticidade de Hill’48 [Hill 1948] para modelar o
comportamento mecânico dos materiais (Tabela 5.1).
No que respeita à modelação do atrito chapa/ferramentas foram usados dois modos de
definir o coeficiente de atrito. Por zonas de contacto, no caso do aço DC06, e uniforme em
todas as superfícies de contacto, no caso do aço DP600. Assim, nas simulações executadas
com o aço DC06 foram definidos três valores distintos para o coeficiente de atrito: 0.228 para
a zona do cerra-chapas; 0.25 para a zona da matriz; e 0.30 para o contacto com o punção
[Wouters et al. 2002]. No caso das simulações executadas com o aço DP600 o coeficiente de
atrito usado foi 0.15.
Tabela 5.1 – Parâmetros constitutivos associados à lei de encruamento e ao critério de plasticidade de Hill’48 para os materiais utilizados [LPMTM 2001, SSAB Direct 2003]
Material Aço macio – DC06 Aço dual phase – DP600
E - Módulo de Young [GPa] 210 ν - Coeficiente de Poisson 0.30
0σ - Tensão limite de elasticidade [MPa] 123.6 359.38
K [MPa] 529.5 1098.34
0ε 0.00438 0.00145
Parâmetros para a lei de Swift
( )0nKσ ε ε= + n 0.268 0.171
F 0.2635 L 1.5 F 0.5127 L 1.5
G 0.2832 M 1.5 G 0.4975 M 1.5 Parâmetros para o critério de plasticidade
de Hill’48 H 0.7167 N 1.2795 H 0.5025 N 1.273
5.4.1 Simulações numéricas e discussão dos resultados
Na maioria dos casos estudados as simulações numéricas foram executadas recorrendo à
família de programas DD3 (DD3IMP, DD3OSS, DD3TRIM) para simular as etapas de
conformação, retorno elástico e corte da taça para obtenção do anel. Foi também utilizado o
programa comercial PAM-STAMP 2G™ V.2004 para executar algumas simulações e
confrontar os resultados obtidos com os programas DD3. O programa PAM-STAMP 2G™
recorre a uma formulação dinâmica associada a uma integração temporal explícita das
equações constitutivas e de equilíbrio durante a fase de conformação [PAM-STAMP 2G
2004]. As simulações das etapas de retorno elástico foram executadas utilizando a opção de
integração temporal implícita. Nos resultados que a seguir se apresentam detalha-se, para o
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
173
material DC06, a influência do tamanho médio dos elementos da malha de elementos finitos
na abertura do anel.
5.4.1.1 Chapa em aço macio DC06
A primeira etapa do estudo numérico centrou-se na análise da sensibilidade dos resultados
ao tamanho médio do elemento considerado na elaboração das malhas de elementos finitos.
As simulações foram realizadas com o programa DD3IMP e consideraram-se cinco malhas
distintas, quatro delas com duas camadas de elementos na direcção da espessura (referências
M1, M2, M3, M4 na Figura 5.6), e uma, derivada da malha M1, com três camadas de
elementos em espessura (referência M5 na Figura 5.6). O elemento finito utilizado foi o
hexaedro de oito nós com funções de forma trilineares, associado a um método de integração
reduzida selectiva [Menezes 1995, Alves 2003]. A construção das malhas foi feita de modo a
criar domínios homogéneos, em termos do tamanho médio da diagonal dos elementos no
plano da malha (TMDp), que entram em contacto com as zonas curvas das ferramentas.
Assim, enquanto no centro das malhas o tamanho dos elementos é maior e mais irregular,
por ser uma zona em que a solicitação é menor e o contacto é plano, no restante domínio o
tamanho médio dos elementos é bastante menor e, sobretudo, mais regular. Nesta zona
regular as malhas foram construídas fazendo variar o número de divisões na direcção radial
(NR) e circunferencial (NC), como se mostra na Figura 5.6.
Figura 5.6 – Distribuição planar dos elementos nas malhas usadas nas simulações do ensaio Demeri com o material DC06.
M1/M5 M2
M4 M3
NC
NR
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
174
As características numéricas das malhas de elementos finitos utilizadas (para um quarto
do domínio) encontram-se compiladas na Tabela 5.2, em que NN e NE correspondem ao
número de nós e de elementos da malha, respectivamente.
Tabela 5.2 – Características das malhas iniciais usadas nas simulações para o material DC06.
Malha inicial NC NR NN NE TMDp [mm] Nº. Camadas
Malha M1 48 35 5820 3744 3.17 2 Malha M2 48 40 6555 4224 3.02 2
Malha M3 72 30 7521 4864 2.85 2
Malha M4 48 20 3615 2304 4.28 2
Malha M5 48 35 7760 5616 3.17 3
Na Figura 5.7 mostra-se o gráfico da força do punção em função do seu deslocamento,
para as malhas M1, M2, M3 e M4, no caso do aço DC06. O resultado obtido
experimentalmente é também mostrado. À excepção da curva de força para a malha de
referência M4, que possui os elementos de maior tamanho médio, os resultados obtidos para
as restantes malhas são muito próximos, sendo a diferença entre a força máxima prevista e a
medida experimentalmente inferior a 5%.
Figura 5.7 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento obtida nas simulações realizadas com as malhas M1, M2, M3, M4 e no ensaio experimental, para o caso de chapas
monolíticas de aço DC06.
0
20
40
60
80
100
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
Malha M1 Malha M2
Malha M3 Malha M4
Experimental DC06
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
175
No caso da curva com referência M4 observa-se uma oscilação acentuada na evolução da
força, que é originada pela discretização insuficiente do domínio da malha. Com efeito, o
tamanho excessivo dos elementos não permite descrever de forma suave os raios de
curvatura das ferramentas (matriz e punção). No caso da malha M5 (omitida do gráfico), o
facto desta possuir a mesma distribuição de elementos no plano que a malha M1, conduz a
que a diferença de resultados entre estas duas malhas seja desprezável, confirmando que o
número de camadas de elementos na direcção da espessura tem uma relevância reduzida na
previsão da curva de força do punção [Alves 2003].
A malha de elementos finitos usada na simulação realizada com o programa
PAM-STAMP consiste na versão bidimensional da malha com referência M2, tendo sido
utilizado o modelo completo da malha (12865 nós e 8448 elementos quadrangulares do tipo
casca). A curva de velocidade usada nas simulações foi do tipo “rampa”, tendo sido fixado
um valor máximo de 5 m/s para o avanço do punção.
Na Figura 5.8 compara-se a evolução da força do punção em função do seu deslocamento
para as simulações realizadas com a malha M2 constituída por elementos sólidos (programa
DD3IMP) e com elementos do tipo casca (programa PAM-STAMP).
Figura 5.8 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento para as malhas, M2 no caso da simulação realizada com o programa DD3IMP, e a malha M2 bidimensional no caso da simulação
realizada com o programa PAM-STAMP, para o caso de chapas monolíticas de aço DC06.
Na curva de força obtida com o programa PAM-STAMP observa-se a presença de uma
oscilação acentuada. Este tipo de comportamento é referido na literatura como sendo
0
20
40
60
80
100
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
DD3IMP PAM-STAMP Experimental DC06
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
176
intrínseco aos programas de simulação com formulação dinâmica. Em termos médios,
ignorando a oscilação, a evolução das duas curvas de força é muito semelhante e próxima da
curva experimental, nomeadamente no valor previsto para a força máxima de embutidura.
Nas Figura 5.9 e Figura 5.10 mostram-se as distribuições dos isovalores da tensão
circunferencial ( θσ ) na taça, para cada uma das malhas usadas no teste de sensibilidade ao
tamanho e distribuição dos elementos finitos, representando-se do lado esquerdo a parte
exterior e no lado direito a parte interior da taça. De um modo geral, o nível de tensão é mais
elevado (em valor absoluto) na metade inferior da parede do conformado. Tal facto é
originado pela constrição do material na entrada para a matriz, que promove o aumento da
tensão circunferencial à medida que o deslocamento do punção aumenta. A esta contribuição
soma-se a tensão na direcção radial que tem origem na sequência de dobragem-desdobragem
seguida de tracção aquando da passagem do fluxo de material pela zona curva da matriz.
Em termos globais, as tensões são mais uniformes na face da malha correspondente à
parte interior da taça (figuras do lado direito), em particular a meia altura da taça (zona de
extracção do anel), onde as tensões são maioritariamente de compressão. Apenas no caso da
malha de maior tamanho médio de elemento (M4, Figura 5.9.h), a distribuição de tensões é
mais irregular e com valores de tensão mais elevados relativamente às outras malhas. A
distribuição e amplitude dos valores de θσ na face exterior da taça (figuras do lado
esquerdo), que está sujeita à tracção, são mais dependentes do tamanho médio dos
elementos do que as observadas para a face interior. Observam-se diferenças, por vezes
substanciais, nos níveis de tensão das malhas M3 (Figura 5.9.e) e M4 (Figura 5.9.g) face às
malhas M1 (Figura 5.9.a), M2 (Figura 5.9.c) e M5 (Figura 5.10.a). Em particular, comparando
por exemplo a malha M2 e M4, existem pontos (na zona onde é extraído o anel a abrir) em
que a diferença de tensão ascende a mais de 100 MPa.
A comprovar esta disparidade de valores nas distribuições de tensão entre as faces
exterior e interior das malhas em análise, estão as diferenças nos gradientes ao longo da
espessura, como se pode observar nas imagens ampliadas do lado direito da Figura 5.9 e
da Figura 5.10. Os gradientes são visivelmente mais acentuados nos casos das malhas M1
(Figura 5.9.b), M2 (Figura 5.9.d) e, principalmente no caso da malha M5 (Figura 5.10.b), que
possuí três camadas de elementos na direcção da espessura. No caso das malhas M3
(Figura 5.9.f) e M4 (Figura 5.9.h), os gradientes de tensão são inferiores, nomeadamente pelos
valores de tensão na face exterior da taça serem reduzidos face aos verificados nas malhas
mais refinadas.
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
177
a) Malha M1 – lado exterior. b) Malha M1 – lado interior.
c) Malha M2 – lado exterior. d) Malha M2 – lado interior.
e) Malha M3 – lado exterior. f) Malha M3 – lado interior.
g) Malha M4 – lado exterior. h) Malha M4 – lado interior.
Figura 5.9 – Figuras de isovalores para a tensão circunferencial ( θσ ) no final da fase de retorno elástico da taça, para as simulações realizadas com as malhas M1, M2, M3 e M4, no caso do aço DC06.
θσ [MPa]
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
178
a) Malha M5 – lado exterior. b) Malha M5 – lado interior.
Figura 5.10 – Figuras de isovalores para a tensão circunferencial ( θσ ) no final da fase de retorno elástico da taça, para a simulação realizadas com a malha M5, no caso do aço DC06.
Na Figura 5.11 mostra-se a distribuição dos isovalores da deformação plástica equivalente
( pε ) após retorno elástico, obtidas com os programas DD3IMP (Figura 5.11.a) e
PAM-STAMP (Figura 5.11.b) para a malha de referência M2 tridimensional e bidimensional,
respectivamente. As duas distribuições são muito semelhantes, registando-se apenas, que a
transição entre o topo e a parede da taça é descrita de forma mais suavizada no caso da
simulação efectuada com o programa DD3IMP. No que respeita ao valor máximo previsto
para pε , a diferença entre os valores obtidos para os dois programas é de cerca de 3%, sendo
o maior valor obtido no caso da simulação realizada com o programa DD3IMP.
a) b)
Figura 5.11 – Figuras de isovalores da deformação plástica equivalente pε no final da fase de retorno elástico da taça para o aço DC06: a) Distribuição obtida com a malha M2 pelo programa DD3IMP;
b) Distribuição obtida com a malha M2 bidimensional pelo programa PAM-STAMP.
As etapas de corte (e de remapeamento) das malhas foram executadas através do
programa DD3TRIM, tendo sido aplicado o tipo de correcção II (descrito no capítulo 2) para
efectuar o ajuste dos nós dos elementos da malha durante a operação de corte. Na operação
pε
Max = 0.569 Max = 0.536
pε
θσ [MPa]
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
179
de remapeamento foi utilizado o método do Remapeamento Incremental Volúmico (descrito
no capítulo 3) com 5nl = .
Atendendo à elevada diferença de valores entre a abertura do anel medida
experimentalmente (35.3 mm, Figura 5.12.a) e a prevista pela simulação numérica obtida com
os programas DD3IMP/DD3OSS, foi desenvolvido um subprograma no DD3TRIM para
refinar a malha do anel antes de se proceder à simulação do retorno elástico. O refinamento
foi efectuado apenas no plano da malha e consistiu em dividir cada elemento da malha em
quatro, sendo criados novos nós a meio das arestas dos elementos que são divididos. Foram
aplicados dois estágios de refinamento em cada anel, resultando assim na criação de malhas
com quatro e dezasseis vezes mais elementos que as originais. Em termos de remapeamento
de variáveis foi usado o método do Remapeamento Incremental Volúmico. Esta estratégia de
refinamento da malha entre a fase de conformação e a simulação do retorno elástico é
sugerida no trabalho apresentado por [Oliveira et al. 2002]. Com este tipo de estratégia
podem ser obtidos rácios entre o tamanho do elemento no plano da malha e o tamanho do
elemento na direcção da espessura que melhoram consideravelmente o rigor das previsões
do retorno elástico.
a) b)
Figura 5.12 – Perfis dos anéis após a recuperação elástica para aço DC06: a) Resultado experimental; b) Resultado numérico obtido com o programa DD3OSS para a malha MA2 com dois estágios de
refinamento.
As características numéricas das malhas dos anéis, que incluem o prefixo “MA”, bem
como os valores medidos para as aberturas dos anéis (numéricos e experimental),
encontram-se compilados na Tabela 5.3. Na tabela apresentam-se também, o valor efectivo
35.46 35.3
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
180
do TMDp no final da conformação da taça e o rácio entre o valor de TMDp da malha e a
dimensão inicial do elemento em espessura (TMDp/Te).
Tabela 5.3 – Características das malhas dos anéis para as simulações realizadas com os programas DD3IMP/DD3OSS, no caso monolítico com aço DC06.
Malha do Anel Refinamento NN NE TMDp [mm] TMDp/Te Abertura [mm]
Não aplicado 1329 680 3.31 6.62 15.84 1 estágio 4695 2720 1.66 3.31 28.94 Malha MA1
2 estágios 17547 10880 0.83 1.66 33.02 Não aplicado 1455 768 3.02 6.04 16.68
1 estágio 5211 3072 1.51 3.02 30.80 Malha MA2
2 estágios 19365 12288 0.75 1.51 35.46 Não aplicado 1740 864 3.93 7.85 20.54
1 estágio 6069 3456 1.96 3.93 30.40 Malha MA3
2 estágios 22503 13824 0.98 1.96 31.18 Não aplicado 867 372 5.29 10.56 11.76
1 estágio 2847 1488 2.64 5.29 19.76 Malha MA4
2 estágios 5952 5952 1.32 2.64 22.74 Não aplicado 1780 1026 3.35 10.06 16.94
1 estágio 6292 4104 1.68 5.03 30.12 Malha MA5
2 estágios 23524 16416 0.84 2.52 33.60 Malha MA2b
(PAM-STAMP) Não aplicado 757 567 3.02 - 35.9
Valor experimental 35.3
Nas Figura 5.13.a e Figura 5.13.b mostram-se os valores de abertura do anel para cada
uma das malhas utilizadas nas simulações com o programa DD3OSS, em função dos
parâmetros TMDp e TMDp/Te, respectivamente. A análise dos resultados faz evidenciar
uma grande proximidade dos resultados de abertura do anel em função do TMDp (Figura
5.13.a) no caso das malhas MA1, MA2 e MA5. Este resultado está directamente relacionado
com o parâmetro TMDp, que é muito semelhante nestas malhas, e é consequência da
distribuição uniforme de elementos nas direcções radial e circunferencial (ver Tabela 5.2).
Outra conclusão muito relevante prende-se com o efeito da operação de refinamento da
malha na previsão da abertura do anel. De facto, observa-se que nas malhas mencionadas o
valor da previsão da abertura quase que duplica com um estágio de refinamento (redução
para metade do TMDp), sendo que o aumento da abertura com o refinamento tende a
estabilizar com o segundo estágio de refinamento (cerca de 15% de aumento médio entre o
estágio um e dois, Tabela 5.3). No caso da malha MA3, apesar de o valor da previsão sem
refinamento ser melhor do que, por exemplo, o valor obtido para a malha MA2
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
181
(Figura 5.12.b), com a aplicação dos estágios de refinamento os ganhos na abertura dos anéis
são mais baixos, o que conduz a que o valor da previsão com dois estágios de refinamento
seja pior no caso da malha MA3, que no caso da malha MA2. Com a malha mais grosseira,
MA4, os resultados obtidos para o retorno elástico afastam-se bastante do valor medido
experimentalmente, mesmo com a aplicação de dois estágios de refinamento.
Figura 5.13 – Evolução da abertura do anel para cada uma das malhas usadas nas simulações com o programa DD3OSS no caso do aço DC06: a) Abertura em função do parâmetro TMDp; b) Abertura do
anel em função do parâmetro TMDp/Te.
Estes resultados permitem inferir duas conclusões parciais. A primeira é relativa ao facto
da distribuição dos elementos na malha (número de divisões nas direcções radial e
circunferencial do domínio) ser fundamental para se obterem bons resultados e, em
particular, da dimensão dos elementos dever ser equilibrada nas duas direcções principais
da malha. De facto, o aumento do refinamento da malha na direcção circunferencial (malhas
M3/MA3 face às malhas M1/MA1), de modo a melhor simular a trajectória de compressão na
direcção circunferencial imposta ao material aquando da sua entrada na matriz, apesar de
importante, só por si não garante os melhores resultados na fase de retorno elástico do anel.
Por outro lado, observa-se que o refinamento na direcção radial (malhas M1/MA1 e M2/MA2
relativamente às malhas M4/MA4) tem uma importância relativamente elevada, pois permite
uma correcta descrição das solicitações de dobragem/desdobragem e de tracção que ocorrem
quando o material passa na zona de curvatura e na parede vertical da matriz,
respectivamente. A segunda conclusão está relacionada com a estratégia de refinamento da
malha antes de se simular a etapa de retorno elástico. A boa previsão do retorno elástico que
0
10
20
30
40
50
0 1 2 3 4 5 6TMDp [mm]
Abe
rtur
a do
ane
l [m
m]
Malha MA1 Malha MA2Malha MA3 Malha MA4
Malha MA5
0
10
20
30
40
50
0 2 4 6 8 10 12TMDp/Te
Abe
rtur
a do
ane
l [m
m]
Malha MA1 Malha MA2Malha MA3 Malha MA4Malha MA5
a) b)
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
182
se obtém com a aplicação desta estratégia é muito dependente de uma correcta discretização
da malha inicial e, por conseguinte, de um bom nível de previsão do estado de tensão
instalado no material durante a etapa de conformação. Se a malha inicial for constituída por
elementos de grandes dimensões (como é o caso das malhas M4/MA4), a estratégia de
refinamento não pode, evidentemente, garantir que se obtenham boas previsões para a
recuperação elástica.
O gráfico da evolução da abertura do anel com o rácio TMDp/Te (Figura 5.13.b) evidencia
que o aumento do número de camadas de elementos na direcção da espessura (diminuição
do tamanho do elemento e aumento do número de pontos de Gauss em espessura) não tem
uma influência decisiva na melhoria da previsão da abertura do anel. Aliás, com este
resultado fica patente que o aumento do número de camadas, neste caso, tem uma influência
menor do que a dimensão dos elementos no plano, visto que a diferença máxima obtida para
a previsão da abertura do anel, ao fim de dois estágios de refinamento, é inferior a 2% entre
as malhas MA1 e MA5 e superior a 7% entre MA1 e MA2.
O mecanismo que desencadeia a abertura do anel está directamente relacionado com a
distribuição de tensões instaladas ao longo da espessura da chapa (tensões de compressão na
face interior e de tracção na face exterior do anel), tensões estas que, por sua vez, originam os
momentos flectores que provocam a abertura do anel durante a recuperação elástica. Na
Figura 5.14 mostra-se a evolução da tensão circunferencial ( θσ ) nos estados, antes do retorno
elástico do anel (medido na taça, Figura 5.14.d), e após o retorno elástico
(Figura 5.14.e), ao longo da direcção da espessura, para uma secção do anel perpendicular à
linha de abertura (Figura 5.14.e). Na Figura 5.14.a comparam-se os valores de θσ , medidos
antes da extracção do anel, nos pontos de Gauss, para cada uma das malhas. A análise
preliminar do gráfico mostra que a distribuição dos valores de θσ não é simétrica
relativamente ao eixo paralelo à direcção da espessura, onde foram medidos os valores. Este
facto é uma consequência directa do percurso que cada um dos pontos de Gauss efectua na
zona de curvatura da matriz. Na Figura 5.14.a observa-se que a distribuição de θσ é similar
no caso das malhas MA1, MA2 e MA3, nomeadamente, nos três pontos de Gauss mais
próximos da face exterior. No caso da malha MA4, os valores de tensão correspondentes aos
dois pontos de Gauss mais exteriores são inferiores aos registados para as malhas MA1, MA2
e MA3. Já no caso da malha MA5, os valores de tensão para os três pontos de Gauss mais
exteriores são maiores tendo como base de comparação as três malhas referidas. A
comparação directa entre as distribuições de θσ ao longo da espessura, antes e após o corte e
abertura do anel (Figura 5.14.a e Figura 5.14.b), permite relacionar a evolução do estado de
tensão nos pontos de Gauss analisados em cada malha, com a respectiva abertura obtida
para o anel.
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
183
Figura 5.14 – Comparação da tensão na direcção circunferencial ( θσ ) nos pontos de Gauss entre os estados antes e após o retorno elástico do anel, para as malhas MA1, MA2, MA3, MA4, MA5, nas
simulações realizadas com o programa DD3OSS, para o aço DC06: a) Tensão medida na taça, após a conformação; b) Tensão medida no anel não refinado, após retorno elástico; c) Tensão medida no anel
com dois estágios de refinamento, após retorno elástico; d) Local da medição na taça; e) Local de medição no anel após retorno elástico.
Os resultados evidenciam a recuperação elástica do material em termos da redução do
nível de tensão instalado nos pontos de Gauss. Contudo, essa recuperação não é
proporcional em todas as malhas estudadas e, além disso, parece depender igualmente do
posicionamento dos pontos de Gauss em espessura. Assim, observa-se que no caso do ponto
de Gauss mais exterior, o estado de tensão final é muito semelhante para todas as malhas
estudadas, ao contrário do que acontece no penúltimo ponto de Gauss das malhas de duas
camadas, para o qual se constata uma maior redução de θσ para as malhas MA1, MA2 e
θσ [MPa]
Malha MA1 Malha MA2
Malha MA3 Malha MA4
Malha MA5
θσ [MPa]
-0.5
-0.3
-0.1
0.1
0.3
0.5
-600 -400 -200 0 200 400
Dir
ecçã
o da
esp
essu
ra [m
m]
-0.5
-0.3
-0.1
0.1
0.3
0.5
-600 -400 -200 0 200 400
Dir
ecçã
o da
esp
essu
ra [m
m]
-0.5
-0.3
-0.1
0.1
0.3
0.5
-600 -400 -200 0 200 400
Dir
ecçã
o da
esp
essu
ra [m
m]
θσ [MPa]
a) b)
c)
d) e)
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
184
MA3. No ponto de Gauss seguinte (já na camada de elementos interior) a recuperação ocorre
de forma proporcional de acordo com os níveis de tensão instalados antes do retorno
elástico. Estas variações relativas de tensão justificam, em termos globais, os valores obtidos
para a abertura dos anéis (ver Tabela 5.3) das malhas MA1 (abertura menor do que para
MA2) e MA4 (abertura menor do que para MA1). No ponto de Gauss mais interior
mantém-se a relativa proporcionalidade na redução de tensão em todas as malhas, à
excepção das malhas MA3 e MA4. Tendo em conta as variações de θσ para os pontos de
Gauss da malha MA3, justifica-se que a abertura do anel na malha MA3 seja superior à da
malha MA2. Na malha MA5 (de três camadas de elementos e seis pontos de Gauss em
espessura) o nível de recuperação de tensão também é dos mais elevados, contudo o valor da
abertura do anel é próximo do exibido pela malha MA2 e inferior ao da malha MA3.
A comparação dos valores de tensão nos pontos de Gauss analisados, antes e após o corte
e abertura do anel com dois estágios de refinamento (Figura 5.14.a e Figura 5.14.c), mostra
que a redução do nível de tensão nos dois pontos de Gauss mais exteriores (nas malhas de
duas camadas) é o que mais condiciona o valor final da previsão das aberturas dos anéis.
Com efeito, existe uma relação directa entre a abertura do anel com dois estágios de
refinamento (maior para MA2, seguido de MA1, MA3, e MA4) e os valores de tensão finais
nestes pontos de Gauss (ver Tabela 5.3). Nos pontos de Gauss mais interiores a variação da
tensão ocorre mantendo-se a mesma ordem relativa das malhas MA1, MA2 e MA3, em
termos dos valores de tensão que existia antes do retorno elástico. A recuperação de tensão
da malha MA5 é elevada mas, ainda assim, não se observa a inversão total e
reposicionamento do gradiente de tensão que ocorre nas malhas de apenas duas camadas.
Em termos absolutos o valor da previsão da abertura do anel obtida com a malha MA5 é a
segunda melhor, atrás da previsão da malha MA2.
Tendo em conta a rigidez do elemento finito de oito nós com funções de forma
isoparamétricas lineares [Wang e Wagoner 2005], a estratégia de refinamento usada para
diminuir o tamanho médio do elemento no plano conduz, efectivamente, a uma melhoria
significativa dos resultados da previsão da abertura do anel e minimiza o efeito do deficiente
comportamento deste elemento finito à flexão. Outra vantagem inerente à aplicação do
refinamento nos anéis, e não da malha inicial na sua totalidade, consiste na economia de
tempo de cálculo, visto que, o uso de malhas muito refinadas no início levaria a um aumento
muito considerável no tempo de simulação da etapa de conformação. Com efeito, o tempo de
simulação da etapa de retorno elástico com o programa DD3OSS é muito menor do que
aquele que é necessário para simular a etapa de conformação com o programa DD3IMP, para
malhas com o mesmo número de elementos e de nós.
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
185
5.4.1.2 Chapa em aço DP600
Nas simulações da etapa de conformação realizadas com o aço dual phase DP600 foram
usadas malhas com refinamento localizado na zona de onde é extraído posteriormente o
anel. Esta opção foi tomada tendo em conta a diferente resposta, em termos de rigidez, do
elemento finito de oito de nós com o material DP600. Com efeito, para se obterem previsões
adequadas do retorno elástico do anel para este material foi necessário usar elementos de
menor dimensão do que aqueles usados nas malhas utilizadas nas simulações do aço DC06.
As simulações foram realizadas, mais uma vez, utilizando os programas DD3IMP/DD3OSS e
PAM-STAMP 2G™. No caso da simulação com o programa DD3IMP/DD3OSS foi usada a
malha de referência RL1 (Figura 5.15.a), construída tendo por base as conclusões retiradas do
estudo de sensibilidade anteriormente descrito para o material DC06, nomeadamente em
termos da disposição dos elementos nas direcções circunferencial e radial e ao número de
camadas. A malha utilizada no caso da simulação com o programa PAM-STAMP (RL2,
Figura 5.15.b) é baseada na malha RL1, mas com menos elementos e de dimensão
ligeiramente maior. Tal como para o material DC06, também no caso do aço DP600 foi
simulado o modelo completo com velocidade do punção de 5 m/s. As características
numéricas das malhas RL1 e RL2 encontram-se compiladas na Tabela 5.4, na qual o valor de
TMDp referido corresponde à zona refinada das malhas.
Figura 5.15 – Distribuição planar dos elementos das malhas usadas nas simulações do ensaio Demeri com o material DP600: a) Malha usada na simulação com o programa DD3IMP/DD3OSS (RL1);
b) Malha usada na simulação com o programa PAM-STAMP (RL2).
a) b)
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
186
Tabela 5.4 – Características das malhas iniciais usadas nas simulações para o material DP600.
Malha inicial NN NE TMDp [mm] TMDp/Te Nº. Camadas
Malha RL1 14103 9192 1.26 2.52 2 Malha RL2 (2D) 13041 12896 1.65 - -
Na Figura 5.16 mostra-se o gráfico de evolução da força exercida pelo punção em função
do seu deslocamento para as malhas RL1 (DD3IMP) e RL2 (PAM-STAMP), bem como a
curva experimental obtida. À semelhança do que já foi antes descrito na análise da curva de
força para o material DC06 (Figura 5.8), a curva de força obtida com o programa
PAM-STAMP é caracterizada pela oscilação típica dos programas de formulação dinâmica.
Em termos comparativos, as curvas obtidas com os dois programas têm uma evolução muito
idêntica, e próxima da curva experimental, até cerca de 30 mm de deslocamento do punção.
A partir desse valor ambas as curvas numéricas passam a sobrestimar, ainda que
ligeiramente, os valores experimentais. Este facto pode indiciar que o valor utilizado para o
coeficiente de atrito é ligeiramente superior ao valor real. O valor da força máxima prevista
pelo programa DD3IMP é apenas 5% superior ao experimental, o que pode ser considerado
um erro de previsão reduzido atendendo à margem de erro intrínseca às formulações e
métodos numéricos utilizados nos códigos de simulação.
Figura 5.16 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento para as malhas, RL1 no caso da simulação realizada com o programa DD3IMP, e a malha RL2 (bidimensional) no caso da
simulação realizada com o programa PAM-STAMP, para o caso de chapas monolíticas de aço DP600.
Na Figura 5.17 mostram-se as distribuições de isovalores de deformação plástica
equivalente na taça após retorno elástico, obtidas com os programas DD3IMP (Figura 5.17.a)
0
40
80
120
160
200
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
DD3IMP PAM-STAMP 2G Experimental DP600PAM-STAMP
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
187
e PAM-STAMP (Figura 5.17.b). Tal como foi antes referido na análise da distribuição da
deformação plástica equivalente ( pε ) para o caso do aço DC06 (Figura 5.11), também no caso
das simulações executadas com o material DP600 a distribuição dos isovalores no topo da
taça é mais irregular no caso da simulação executada com o programa PAM-STAMP,
apresentando valores mais elevados de pε do que aqueles previstos pelo programa
DD3IMP. Na parede e na zona das abas da taça os resultados obtidos pelos dois programas
são próximos, se bem que seja observável uma ligeira irregularidade na distribuição de
isovalores obtida com o programa DD3IMP. Este resultado está relacionado com o facto da
malha de elementos finitos ter uma distribuição não uniforme de elementos na direcção
radial e com a presença de elementos de menor dimensão circunferencial no caso da malha
RL1 relativamente à malha RL2, ou seja, mais “alongados” na direcção radial. A diferença
obtida para os valores máximos de pε registados em cada uma das distribuições é de 9.6%,
sendo mais elevados no caso da simulação realizada com o programa DD3IMP.
a) b)
Figura 5.17 – Figuras de isovalores da deformação plástica equivalente pε no final da fase de retorno elástico da taça para o material DP600: a) Distribuição obtida pelo programa DD3IMP/DD3OSS;
b) Distribuição obtida pelo programa PAM-STAMP 2G.
Na previsão da variável principal do ensaio Demeri, a abertura do anel, foram utilizados
os mesmos parâmetros numéricos e metodologias usadas na obtenção dos anéis (programa
DD3TRIM) e nas simulações do retorno elástico (programa DD3OSS) com o material DC06.
Os resultados obtidos para a previsão da abertura do anel encontram-se compilados na
Tabela 5.5, sendo que a malha do anel usada com o programa DD3OSS (ARL1) representa
metade do modelo e a malha do anel usada com o programa PAM-STAMP representa o
modelo completo. O resultado obtido com o programa DD3OSS para a abertura do anel sem
refinamento prévio é cerca de 30% inferior ao valor médio medido nos ensaios experimentais
(Figura 5.18.a). Aplicando um estágio de refinamento obteve-se uma previsão de abertura de
70.4 mm (Figura 5.18.b), 12.9% abaixo do valor experimental (79.4 mm). Com o programa
Max = 0.523 Max = 0.477
pε pε
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
188
PAM-STAMP o valor obtido para a abertura do anel foi de 91 mm, ou seja, 14.6% acima do
valor experimental. Este resultado é concordante com os resultados obtidos por outros
autores que também usaram programas baseados numa formulação dinâmica e numa
integração explícita/implícita associada à utilização de elementos do tipo casca [Rohleder
2001]. A sobrestimação do valor do retorno elástico, nestes casos, pode ter origem nas
simplificações efectuadas ao nível do elemento finito (manipulações para calcular os esforços
de flexão) ou no facto da integração explícita usada na fase de conformação, não garantir em
cada incremento o equilíbrio do corpo deformável.
Tabela 5.5 – Características das malhas e valores das aberturas dos anéis nas simulações realizadas com o programa DD3OSS e PAM-STAMP, para o material DP600.
Malha do Anel Refinamento NN NE TMDp [mm] TMDp/Te Abertura [mm]
Não aplicado 7224 4352 1.255 2.510 56.0 Malha ARL1
1 estágio 27501 17408 0.628 1.255 70.4
Malha ARL2 (2D) Não aplicado 3525 3244 1.643 - 91
Valor experimental 79.4
a) b)
Figura 5.18 – Perfis dos anéis após a recuperação elástica para aço DP600: a) Resultado experimental; b) Resultado numérico obtido com o programa DD3OSS para a malha ARL1 com um estágio de
refinamento.
No caso da simulação realizada com os programas DD3IMP/DD3OSS, o melhor valor
obtido para a previsão da abertura do anel representa um esforço de cálculo próximo do
limite computacional da plataforma informática utilizada, por esse motivo não foi possível
aplicar um segundo estágio de refinamento no anel, tal como havia sido feito no caso do
material DC06. Contudo, a análise destes resultados, com e sem refinamento do anel, mostra
70.4
79.4
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
189
que a melhoria da previsão da abertura é baixa (25.7%) relativamente à melhoria observada
(84.7%) para o caso da malha MA2 do anel de material DC06, ao fim de um estágio de
refinamento. Esta constatação indicia que a estratégia de refinamento do anel, antes da fase
de retorno elástico, em malhas já por si fortemente refinadas desde as primeiras etapas de
conformação, permite melhorar a previsão do valor do retorno elástico, mas apenas de modo
moderado.
5.5 Estudo do ensaio Demeri com tailor-welded blanks
De modo a complementar o estudo numérico efectuado no Capítulo 4, sobre a influência da
modelação do cordão de soldadura no comportamento mecânico de tailor-welded blanks
(TWBs), o ensaio Demeri foi utilizado para testar experimentalmente as diferenças de
conformabilidade entre chapas monolíticas e de TWBs. Os materiais utilizados para obter as
TWBs a estampar consistiram nos aços macio DC06 e DP600 anteriormente descritos
(Tabela 5.1).
5.5.1 Obtenção das soldaduras
As soldaduras foram obtidas através do processo de soldadura por laser de díodos, tendo
sido executadas nas instalações do Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ). A escolha do
processo de soldadura por laser de díodos foi fundamentada através de duas características
técnicas do processo. A primeira diz respeito à superior eficiência energética do laser de
díodos, na ordem dos 30% [Li 2000, Bachmann 2003], relativamente a outros lasers, como por
exemplo, os de CO2 (10 a 15%) ou os Nd:YAG (1 a 5%) [Li 2000]. A segunda razão prende-se
com a menor exigência deste processo de soldadura relativamente à preparação de junta,
pois apresenta um foco rectangular da ordem de alguns mm2 [Leal 2004], enquanto que em
lasers como os de CO2 ou Nd:YAG os focos são circulares e possuem tamanhos tipicamente
na ordem de décimos de milímetro. Este facto é consonante com a menor densidade de
potência permitida com os lasers de díodos (entre 104 e 105 W/cm2) [Bachmann 2003], o que
por um lado faz diminuir a velocidade máxima de soldadura permitida mas, por outro,
melhora a qualidade global e aspecto final da soldadura [Li 2000]. Tipicamente, os processos
de soldadura por laser de CO2 ou Nd:YAG apresentam densidades de potência entre 105 e
107 W/cm2 [Leal 2004], sendo por esse motivo melhor adequados para a execução de
soldaduras a velocidades mais elevadas, mas necessitando de uma preparação de junta mais
precisa.
Uma vez que o processo de soldadura por laser de díodos é menos sensível à precisão de
corte das chapas a unir, as operações de corte foram executadas com uma guilhotina. O
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
190
equipamento utilizado para executar as soldaduras consistiu numa máquina de soldadura
Rofin® DL030S de 3 kW de potência, acoplada a um robot Kuka®. As soldaduras foram
executadas sem material de adição. Consideraram-se três configurações de TWBs: uma que
inclui duas chapas de aço DC06 (Figura 5.19.a); outra que inclui duas chapas de aço DP600
(Figura 5.19.b); e uma em que são soldadas chapas de aço DC06 e DP600 (Figura 5.19.c). As
chapas foram orientadas com a direcção de laminagem paralela à direcção do cordão nos
casos das TWBs compostas pelo mesmo material e com uma orientação paralela ou
perpendicular no caso das TWBs compostas por materiais diferentes. A composição química
nominal dos aços utilizados encontra-se na Tabela 5.6. Foram produzidos pelo menos três
exemplares de TWB para cada uma das configurações. A protecção do banho de fusão foi
feita utilizando uma atmosfera inerte de Árgon. Os parâmetros de soldadura utilizados estão
compilados na Tabela 5.7.
Figura 5.19 – Representação esquemática da combinação de materiais e das orientações da direcção da soldadura relativamente à direcção de laminagem (DL) usadas para obter as tailor-welded blanks:
a) TWB composta apenas por aço macio (DC06); b) TWB composta apenas por aço dual phase (DP600) c) TWB composta por aço DC06 e aço DP600.
Tabela 5.6 – Composição química dos aços utilizados [SSAB Direct 2003, Arcelor 2006].
Composição química (em peso %)
Material C Mn P S Si Al Ti
DC06 < 0.01 < 0.25 < 0.02 < 0.02 < 0.03 - < 0.15 DP600 0.11 0.90 0.015 0.006 0.40 0.04 -
Tabela 5.7 – Parâmetros de soldadura utilizados na obtenção das tailor-welded blanks.
Velocidade de soldadura [mm/s] 18
Dimensão do foco (rectangular) [mm × mm] 0.8 × 1.2 Caudal do gás de protecção (Árgon) [lt/min] 8
Distância focal [mm] 44
DC DPDC DP DP DC
a) b) c)
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
191
5.5.2 Caracterização metalográfica e mecânica das soldaduras
A caracterização metalográfica permitiu identificar, recorrendo à microscopia óptica, as
diferentes zonas que se formam nas uniões soldadas devido ao ciclo térmico induzido pela
operação de soldadura laser. Esta análise permitiu ainda avaliar a presença de defeitos ou
irregularidades geométricas nas soldaduras. A segunda parte da caracterização consistiu na
quantificação da evolução da dureza Vickers ao longo de uma linha perpendicular à
soldadura, a meio da espessura da TWBs. A evolução desta propriedade ilustra a
heterogeneidade de propriedades mecânicas introduzida com o processo de soldadura. Para
além disso, permite estimar as propriedades mecânicas da soldadura, como a tensão limite
de elasticidade, a resistência à tracção e o coeficiente de encruamento, através, por exemplo,
de uma metodologia descrita num trabalho de Akselsen et al. 1989.
5.5.2.1 Análise das micrografias
Com vista a obter uma caracterização mecânica completa das soldaduras foi realizada uma
análise micrográfica, de modo a identificar as diferentes zonas das soldaduras, e ensaios de
dureza para aferir as propriedades mecânicas locais em cada uma dessas zonas. Os
resultados da análise micrográfica e das medições de dureza permitiram, em conjunto,
definir e quantificar a extensão das zonas da soldadura a incluir na modelação numérica do
cordão de soldadura.
Para realizar a análise metalográfica foram extraídas amostras das TWBs. Depois de
encapsuladas em resina, as amostras foram polidas e atacadas quimicamente utilizando uma
solução de Nital 2%. Recorrendo à microscopia óptica foi possível distinguir claramente, em
cada soldadura, as regiões correspondentes à Zona Fundida (ZF), à Zona Afectada pelo
Calor (ZAC) e ao Material de Base (MB). Na Figura 5.20.a mostra-se a micrografia
correspondente à soldadura TWB composta por aço macio DC06, na qual é possível observar
um crescimento de grão acentuado na ZAC relativamente ao MB e à ZF. Já na micrografia
correspondente à TWB composta por aço DP600 (Figura 5.20.c), constata-se que a zona de
grão mais grosseiro corresponde à ZF. Ambas as soldaduras compostas por materiais iguais
não apresentam defeitos, quer microscópicos quer macroscópicos, não se observando
variações de secção na transição entre o material de base e as diferentes zonas da soldadura.
A micrografia referente à soldadura da TWB de materiais diferentes (aços DC06 e DP600)
é apresentada na figura Figura 5.20.b, onde é possível identificar claramente duas porções
distintas na ZF, correspondentes ao aço DC06 e ao aço DP600. Com efeito, não é perceptível
uma mistura acentuada dos dois materiais na soldadura. Contudo, tal como se pode
observar na Figura 5.20.e, a transição entre as duas regiões da ZF é contínua e não apresenta
defeitos. É ainda possível observar nesta soldadura que a estrutura de grão nos lados da
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
192
soldadura correspondentes ao aço DC06 (Figura 5.20.d) e DP600 (Figura 5.20.f) é semelhante
à estrutura de grão das diferentes regiões das soldaduras das TWBs compostas por materiais
iguais (Figura 5.20.a e Figura 5.20.c). Na Figura 5.20.f, pode ainda observar-se o gradiente
microestrutural na ZAC do aço DP600, onde se pode distinguir uma zona de grão grosseiro e
uma zona de grão refinado na transição para o MB.
A análise da geometria do cordão da TWB composta por materiais diferentes permite
identificar uma variação de secção na ZAC correspondente ao aço DC06 (Figura 5.20.d). Esta
descontinuidade geométrica pode ter um efeito negativo na conformabilidade das TWBs.
a) Soldadura da TWB constituída por DC06.
b) Soldadura da TWB constituída por DC06 e DP600.
c) Soldadura da TWB constituída por DP600.
d) Região junto do material de base DC06 na TWB constituída
por DC06 e DP600.
e) Região central da soldadura na TWB constituída por DC06 e
DP600.
f) Região junto do material de base DP600 na TWB
constituída por DC06 e DP600.
Figura 5.20 – Microestruturas das soldaduras.
5.5.2.2 Análise dos resultados das medições de dureza Vickers
As medições de dureza foram executadas com o objectivo de avaliar a heterogeneidade de
propriedades mecânicas entre as soldaduras e os materiais de base, bem como de
caracterizar mecanicamente as propriedades das soldaduras. A carga utilizada para efectuar
as indentações foi de 5 kgf (referência HV5 nos gráficos de dureza). Os valores de dureza,
medidos a meio da espessura da soldadura segundo uma linha perpendicular ao seu eixo,
são apresentados nos gráficos das Figura 5.21, Figura 5.22 e Figura 5.23 em função da
distância ao primeiro ponto de medição, situado no MB. Nestes gráficos, são identificadas as
ZF ZAC MB ZF(DP600)
ZF(DC06)
ZF
ZAC
ZF
(DP600)
ZF(DC06)
ZF ZAC
MB
MBZAC ZF
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
193
diferentes zonas das soldaduras, cuja localização e extensão foram determinadas com base
na análise micrográfica apresentada previamente.
Na Figura 5.21 mostram-se os resultados de dureza referentes à soldadura da TWB
composta apenas por aço macio DC06. Nesta figura, é apenas possível notar um aumento de
dureza na parte que corresponde predominantemente à ZF, não se observando variações de
dureza entre o MB e a ZAC. Deste modo, na modelação numérica deste cordão de soldadura,
optou-se por se representar apenas o domínio da ZF.
Figura 5.21 – Evolução da dureza medida na espessura de uma TWB composta por chapas de aço DC06, ao longo da direcção transversal do cordão da soldadura.
Para as TWBs compostas por aço DP600 (Figura 5.22), a evolução da dureza é bastante
diferente daquela observada no caso da TWB de aço macio. De facto, nesta soldadura
observa-se um amaciamento acentuado na ZAC e um aumento significativo de dureza na
ZF. De acordo com estes resultados, na modelação numérica do cordão de soldadura, foram
consideradas ambas as zonas da soldadura.
A evolução da dureza no caso da soldadura relativa à TWB composta por materiais
diferentes é mostrada no gráfico da Figura 5.23. As variações observadas são coerentes com
as registadas nos casos das TWBs compostas por aços DC06 e DP600. Os valores de dureza
medidos na ZF confirmam a existência de duas regiões com propriedades diferentes,
registando-se, na zona de transição, um forte acréscimo da dureza relativamente aos
materiais de base DP600 (43%) e DC06 (162%). De acordo com a distribuição de durezas
apresentada no gráfico, na simulação numérica optou-se por modelar o cordão de soldadura
50
70
90
110
130
150
170
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22Distância [mm]
Dur
eza
HV
5 [M
Pa]
ZFZAC ZAC MB
Dur
eza
HV
5
MB
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
194
de forma assimétrica, fazendo corresponder propriedades mecânicas superiores apenas ao
lado da ZF contígua ao material de base DP600.
Figura 5.22 – Evolução da dureza medida na espessura de uma TWB composta por chapas de aço DP600, ao longo da direcção transversal do cordão da soldadura.
Figura 5.23 – Evolução da dureza medida na espessura da TWB composta por aço DC06 e DP600, ao longo da direcção transversal do cordão da soldadura.
0
60
120
180
240
300
360
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24Distância [mm]
Dur
eza
HV
5 [M
Pa]
ZFZAC ZAC MB (DP600)MB (DC06)
Dur
eza
HV
5
ZFZAC MBZAC
Dur
eza
HV
5
100
140
180
220
260
300
340
0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22Distância [mm]
MB
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
195
Tendo em conta a distribuição de dureza e a extensão das diferentes zonas das
soldaduras, determinadas após a análise metalográfica, a modelação numérica dos cordões
de soldadura e a determinação das suas propriedades mecânicas foram realizadas de acordo
com as dimensões e os valores de dureza indicados no esquema da Figura 5.24.
Figura 5.24 – Representação esquemática da amplitude de dureza e extensão dos domínios das soldaduras: a) TWB composta por aço DC06; b) TWB composta por aço DP600; c) TWB composta por
aço DC06 e DP600.
5.5.2.3 Determinação das propriedades mecânicas
A avaliação das características mecânicas em tracção das diferentes zonas das soldaduras foi
obtida através das relações empíricas desenvolvidas por Akselsen et al. 1989 para aços
estruturais, nomeadamente, aços de alta resistência em que a ZAC é constituída por grãos de
elevada dimensão. Segundo estes autores, as propriedades mecânicas nesta zona da
soldadura são deduzidas a partir de ensaios de tracção e medições de dureza Vickers em
provetes obtidos por simulação térmica, para diferentes condições de arrefecimento da
soldadura. A tensão limite de elasticidade ( 0σ ) é dada em função da dureza Vickers e do
coeficiente de encruamento (n ) através da expressão:
( )0 3.1HV 0.1 80nσ = − [kg/mm2]. (5.1)
Por sua vez, o coeficiente de encruamento é dado por
( )0.17
8|50.065n t= ∆ , (5.2)
a) b) c)
360
300
240
180
120
HV5
225
260
200
2 2 2
ZF MBZACZAC127145
ZF
2.5
MB MB
127
322
ZF
1.5
MB (DP)MB (DC)
225
127
225
200
MB
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
196
em que 8|5t∆ representa o intervalo de tempo (em segundos) necessário para o arrefecimento
desde uma temperatura de 800 até 500 °C. O valor de 8|5t∆ pode ser determinado através da
equação desenvolvida por Ashby e Easterling 1982, para chapas finas:
( )2
8|5 2
/4 c
q vdt
πλρ θ∆ = . (5.3)
Na equação, q representa a potência do arco eléctrico, v a velocidade de soldadura, d a
espessura da chapa, λ a condutividade térmica, cρ a capacidade térmica volúmica do
material e 2θ é dado, para chapas finas, por
( ) ( )
1
22 2
0 0
1 1773 1073T T
θ−
⎛ ⎞= −⎜ ⎟⎜ ⎟− −⎝ ⎠
, (5.4)
sendo 0T a temperatura inicial ou de pré-aquecimento da chapa. As constantes
anteriormente mencionadas, bem como outros parâmetros necessários aos cálculos,
encontram-se compiladas na Tabela 5.8.
Tabela 5.8 – Parâmetros usados na avaliação das propriedades mecânicas das soldaduras. q – Potência [W] 3000
v – Velocidade de soldadura [mm/s] 18
d – Espessura da chapa [mm] 1
λ – Condutividade térmica6 [J s-1 m-1 K-1] 41
cρ – Capacidade térmica volúmica [J m-3 K-1] 4.5×106
0T – Temperatura inicial da chapa [K] 293.15
Depois de substituídos os valores das constantes físicas e dos parâmetros usados no
processo de soldadura nas equações (5.4), (5.3) e (5.2), obtêm-se 8|5t∆ =32.33 s e n = 0.117.
Uma vez que 8|5t∆ não depende das características intrínsecas a cada tipo de aço ao carbono
(como por exemplo a dureza do aço), o valor de n resulta constante para qualquer tipo de
aço ao carbono que seja considerado. Contudo, atendendo à diferença elevada das outras
propriedades mecânicas, este aspecto não terá, como mais à frente se observará, uma
influência muito importante nas conclusões finais obtidas para este estudo.
A tensão à carga máxima é dada por [Akselsen et al. 1989]:
( ) 12.53.5HV 1 921
n
u nn
σ ⎛ ⎞= − −⎜ ⎟−⎝ ⎠ [kg/mm2]. (5.5)
6 Valor tabelado, retirado de Ashby e Easterling 1982 para “aços ao carbono”.
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
197
Depois de se substituírem os valores da dureza para cada uma das soldaduras (de acordo
com o esquema da Figura 5.24) e o valor anteriormente determinado para o coeficiente de
encruamento n nas equações (5.1) e (5.5), obtiveram-se os valores aproximados das tensões
0σ e uσ para as diferentes zonas das soldaduras.
A caracterização completa das propriedades mecânicas das zonas das soldaduras, para
cada uma das configurações de TWBs estudadas, encontra-se compilada na Tabela 5.9.
Tabela 5.9 – Caracterização das propriedades mecânicas das zonas das soldaduras para as diferentes TWBs estudadas.
TWB DC06 DP600 DC06-DP600
Zona da Soldadura ZF ZAC ZF ZF
E - Módulo de Young [GPa] 210 210 210 210
ν - Coeficiente de Poisson 0.30 0.30 0.30 0.30
Dureza Vickers [HV5] 145 200 260 322
0σ [MPa] 251.2 503.7 654.8 810.9
( )nuK Knσ = [MPa] 472.0 795.1 1033.7 1280.1
0ε 0.0046 0.0202 0.0202 0.0205
Parâmetros para a lei de
Swift
n 0.117 0.117 0.117 0.117 F G H L M N Parâmetros para o critério de
plasticidade de Hill’48 0.5 0.5 0.5 1.5 1.5 1.5
5.5.3 Simulações numéricas e discussão dos resultados
No caso dos esboços de TWBs, o ensaio Demeri foi apenas simulado utilizando os
programas da família DD3. Para a simulação numérica das TWBs constituídas por materiais
iguais, foram utilizados os mesmos parâmetros numéricos e do processo (coeficiente de
atrito, força de aperto do cerra-chapas, tipo de integração, etc.) anteriormente referidos para
o caso das simulações de esboços monolíticos do aço DC06 e DP600. Foi apenas considerado
um quarto do modelo no caso das TWBs constituídas apenas por material DC06
(Figura 5.25.a) ou DP600 (Figura 5.25.b), em que as malhas incluem uma zona de forte
refinamento de modo a contemplar os domínios das soldaduras e as correspondentes
propriedades mecânicas (Tabela 5.9). À semelhança do estudo apresentado no Capítulo 4,
considerou-se um tamanho de elemento na zona da soldadura de 0.25 mm na direcção
perpendicular ao cordão, de modo a melhor acomodar os gradientes de tensão/deformação
que surgem entre o material de base e as diferentes zonas da soldadura.
Nas TWBs constituídas por aço DC06 e DP600, uma vez que os coeficientes de atrito
chapa/ferramenta para os dois materiais são diferentes, foi considerado nas simulações um
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
198
valor intermédio de 0.17. O valor da força de aperto do cerra-chapas foi de 28 kN. A
descrição do comportamento mecânico do material foi feita, tal como nos casos das TWB
compostos apenas por aço DC06 ou DP600, através da lei de encruamento de Swift e pelo
critério de Hill’48, sendo admitido que o material da soldadura tem um comportamento
isotrópico (Tabela 5.9). Na malha de elementos finitos utilizada no caso da TWB de materiais
distintos (que corresponde a metade do modelo, Figura 5.25.c), além da zona refinada do
cordão, considerou-se a presença do furo que possibilita a centragem do esboço com as
ferramentas. O furo foi executado recorrendo ao programa DD3TRIM, que desta forma
facilita a fase de pré-processamento da simulação. A opção de incluir o furo permite
melhorar o rigor da simulação, pois neste caso os níveis de conformabilidade dos materiais
das duas metades da TWB são marcadamente diferentes. As características numéricas das
malhas encontram-se compiladas na Tabela 5.10, em que parâmetro TMDp diz respeito à
zona não refinada da soldadura e no caso da TWB composta por DP600 é medido na zona
onde é extraído o anel.
Figura 5.25 – Distribuição planar dos elementos das malhas usadas nas simulações do ensaio Demeri com TWBs: a) TWB composta por aço DC06; b) TWB composta por aço DP600; TWB composta por
DC06 e DP600.
a) b)
c)
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
199
Tabela 5.10 – Características das malhas iniciais usadas nas simulações de TWBs.
Malha NN NE TMDp [mm] Nº. Camadas
Malha DC06 8538 5510 2.98 2 Malha DP600 9519 6152 2.47 2
Malha DC06-DP600 11163 7216 3.69 2
5.5.3.1 Tailor-welded blank composta por aço DC06
Na Figura 5.26 mostra-se a evolução da força do punção em função do seu deslocamento
para as simulações realizadas considerando-se, ou não, a presença do domínio da soldadura,
bem como as curvas experimentais obtidas no caso monolítico e TWB, para o esboço
composto apenas por aço DC06. A curva numérica referente à chapa não soldada foi obtida
com a mesma malha usada no caso da TWB (Figura 5.25.a).
Figura 5.26 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento obtida nas simulações realizadas para chapas monolíticas ou TWB e nos ensaios experimentais, para o caso de chapas
compostas por aço DC06.
No que respeita aos resultados numéricos, observa-se que as curvas estão quase
perfeitamente sobrepostas, o que evidencia que a alteração das propriedades mecânicas, face
ao material de base, tem uma influência muito reduzida nesta variável de análise. A
comparação das curvas experimentais mostra a mesma tendência, visto que a diferença nos
valores de força entre a curva correspondente à conformação da TWB e da chapa monolítica
0
20
40
60
80
100
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
Numérico monolítico Experimental monolíticoNumérico TWB Experimental TWB
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
200
são muito reduzidas. Em termos da comparação dos resultados numéricos com os
experimentais, tal como já havia sido visto no caso monolítico (Figura 5.8), o erro de previsão
da força é reduzido.
No que respeita à abertura dos anéis, no caso da TWB obteve-se uma abertura média de
33.5 mm, face à abertura média de 35.3 mm do caso monolítico. As previsões obtidas nas
simulações foram de 35.38 mm e 36.04 mm para os casos em que é considerado, ou não, as
propriedades mecânicas da soldadura, respectivamente. Esta proximidade entre os
resultados numéricos está de acordo com as diferenças, também reduzidas, observadas na
análise da curva de força do punção. É igualmente de salientar que a tendência da previsão
da abertura do anel que contém as propriedades do cordão (inferior ao caso em que só se
considera material de base), é coerente com o facto de nos ensaios experimentais o anel
extraído da TWB ter uma abertura inferior à do anel monolítico.
Na Figura 5.27.a apresenta-se a imagem da TWB composta por aço DC06 no final da
conformação. Nos ensaios efectuados com estas TWB não foram observadas rupturas e a
repetibilidade dos resultados foi muito boa.
Figura 5.27 – Ilustrações da taça (vistas de topo) a partir de uma TWB composta por aço DC06: a) Taça obtida experimentalmente; b) Figura de isovalores da deformação plástica equivalente no final da
simulação numérica da conformação da taça.
A distribuição dos isovalores da deformação plástica equivalente pε obtida no final da
simulação numérica de conformação da taça (Figura 5.27.b) evidencia, mais uma vez, que os
pε
a) b)
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
201
pontos onde a deformação plástica é mais elevada ocorrem junto da zona curva mais
próxima da aba.
5.5.3.2 Tailor-welded blank composta por aço DP600
Na Figura 5.28 mostra-se a evolução da força do punção em função do seu deslocamento
para as simulações realizadas considerando, ou não, a presença das propriedades mecânicas
da soldadura na malha de elementos finitos, bem como as curvas experimentais obtidas para
o caso monolítico e TWB, referentes ao material DP600. À semelhança do procedimento
usado no caso do material DC06, ambas as simulações foram realizadas com a mesma malha
(Figura 5.25.b). A comparação das curvas numéricas mostra que não há diferenças
significativas entre a curva obtida para a TWB, considerando-se as propriedades mecânicas
da soldadura (ZAC e ZF) na malha (Figura 5.24.b), daquela correspondente à simulação do
caso monolítico. Esta mesma conclusão pode ser retirada das curvas experimentais
correspondentes ao caso monolítico e TWB.
Figura 5.28 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento obtida nas simulações realizadas para chapas monolíticas ou TWB e nos ensaios experimentais, para o caso de chapas
compostas por aço DP600.
As diferenças entre os valores experimentais das aberturas dos anéis nos casos monolítico
e TWB são reduzidas, tendo-se medido 79.4 mm e 80.7 mm de abertura, respectivamente.
0
40
80
120
160
200
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
Numérico monolítico Experimental monolíticoNumérico TWB Experimental TWB
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
202
Apesar da diferença entre os valores dos dois casos ser muito reduzida a repetibilidade dos
resultados foi muito boa. Os resultados numéricos obtidos com o programa DD3OSS foram
de 57.4 mm e 55.76 mm para o caso monolítico e TWB, respectivamente, para um estágio de
refinamento dos anéis. A diferença destes resultados relativamente aos obtidos no caso
monolítico, em que não se considera a presença do domínio de refinamento relativo à
soldadura, prende-se com a diferença de refinamento das malhas utilizadas nas duas
situações. De facto, uma vez que as malhas utilizadas nas simulações com o aço DP600
(monolítico ou TWB) têm uma dimensão que conduz à utilização da capacidade máxima do
equipamento informático disponível, a necessidade de refinar a zona da soldadura levou a
que, em termos médios, os anéis tenham um tamanho médio de elemento mais elevado
quando comparado com o da malha correspondente ao caso monolítico sem refinamento do
domínio da soldadura (ver Tabela 5.4 e Tabela 5.10).
Na Figura 5.29.a apresenta-se a imagem obtida nos ensaios experimentais da TWB
composta por aço DP600 no final da conformação. Tal como foi acima referido para o caso
das TWBs constituídas por aço DC06, também nos ensaios conduzidos com TWBs
constituídas por aço DP600 não houve qualquer registo de rupturas.
Figura 5.29 – Ilustrações da taça (vistas de topo) a partir de uma TWB composta por aço DP600: a) Taça obtida experimentalmente; b) Figura de isovalores da deformação plástica equivalente no final
da simulação numérica da conformação da taça.
pε
a) b)
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
203
Na Figura 5.29.b mostra-se a distribuição dos isovalores da deformação plástica
equivalente pε no final da simulação numérica de conformação. A deformação máxima é
registada junto do cordão de soldadura. Este facto é concordante com a diminuição de
dureza (e consequentemente de resistência) observada na ZAC (Figura 5.24). No que respeita
ao contorno da aba, constata-se que este é melhor previsto neste caso (aço DP600) do que na
simulação realizada com a TWB composta por aço DC06 (Figura 5.27.a e Figura 5.27.b).
5.5.3.3 Tailor-welded blank composta por aço DC06 e DP600
Ao contrário do que ocorreu nos ensaios experimentais efectuados com esboços monolíticos
e de TWB compostas pelo mesmo material de base, em que não houve registo de nenhuma
ruptura durante a conformação da taça, no caso da TWB composta por materiais de base
diferentes não foi possível conformar a taça devido à ruptura da TWB. Foram testadas
algumas alterações aos parâmetros do processo, de acordo com o número de esboços
disponíveis, de modo a tentar evitar a ruptura. Nomeadamente, eliminou-se a centragem da
chapa recorrendo ao conjunto mola-parafuso, aumentou-se a quantidade de óleo aplicada ao
esboço e diminuiu-se a força de aperto do cerra-chapas de modo a favorecer a entrada de
material na matriz. Contudo, em qualquer das situações, as alterações no deslocamento
máximo obtido foram diminutas. Na Figura 5.30 mostram-se as curvas numérica e
experimental de evolução da força do punção em função do seu deslocamento, na
configuração em que a força de aperto do cerra-chapas foi de 16 kN. A lubrificação aplicada
no esboço corresponde a 1.4 g/m2 e é aplicado o parafuso de centragem. A correlação entre os
resultados numéricos e experimentais é boa, não se apresentando na curva numérica valores
acima de 20 mm de deslocamento uma vez que o programa DD3IMP não possui modelos de
dano.
A Figura 5.31.a mostra uma das TWBs imediatamente após a ruptura, no caso concreto de
uma configuração de ensaio sem centragem por parafuso, com lubrificação de 1.4 g/m2 e
força de aperto de aperto de 16 kN. Na imagem é notório o constrangimento da deformação
da TWB imposto pela diferença de resistência entre os dois materiais. Ou seja, o material
DC06 tende a deformar-se mais do que o DP600 e proporciona o movimento do cordão de
soldadura no centro da taça no sentido do material mais resistente (parte direita da TWB).
Um efeito contrário é observado na zonas das abas, pois a força de aperto aplicada pelo
cerra-chapas é igual em ambas as partes da TWB, o que conduz a uma maior retenção do
material DC06 face ao DP600 e, consequentemente, ao movimento do cordão da soldadura
no sentido do material menos resistente (parte esquerda da TWB). A deformação na zona
central da TWB, mais concretamente na zona do furo, conduziu à ovalização do furo devido
à maior deformação do material DC06, face ao material DP600. Por último, é de assinalar o
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
204
aparecimento de algumas rugas nas abas. Este fenómeno é justificado tanto pelo valor
relativamente baixo da força de aperto do cerra-chapas, como pelo facto do valor da força de
aperto ser constante para ambos os materiais, o que não permite controlar, de forma
individual, a entrada de cada uma das metades da chapa da TWB na matriz.
Figura 5.30 – Evolução da força do punção em função do seu deslocamento obtida na simulação realizada para a TWB composta por DC06 e DP600 e no ensaio experimental.
Na Figura 5.31.b apresenta-se a distribuição de isovalores da deformação plástica
equivalente obtida para um deslocamento do punção de 15 mm. No que respeita ao
comportamento da TWB durante a conformação e à movimentação do cordão, a simulação
reproduz as tendências anteriormente descritas para a movimentação dos materiais da TWB.
O fenómeno do aparecimento de rugas não é visível, visto que a simulação deste defeito só é
possível utilizando malhas muito refinadas na zona da aba. A ruptura também não é visível,
pois não foi utilizado nenhum modelo de dano. Contudo, a distribuição de isovalores
permite mostrar a principal razão que promove a ruptura prematura das TWBs. De facto,
para este valor de deslocamento, os valores mais elevados de deformação já se concentram
predominantemente na zona circundante ao furo, do lado correspondente ao aço DC06 (ver
Figura 5.31.c), ou seja, na zona onde se observou a ruptura dos TWBs experimentais. O facto
de todas as rupturas terem ocorrido na zona de transição entre o material de base do aço
DC06 e o cordão de soldadura, pode também ser relacionado com o bordo queimado
(entalhe geométrico, provocado pelo processo de soldadura, com menor espessura do que o
material de base) que está presente nessa zona em todas as TWBs compostas por DC06 e
DP600 (ver Figura 5.20.d).
0
40
80
120
160
200
0 10 20 30 40 50 60Deslocamento do punção [mm]
Forç
a do
pun
ção
[kN
]
Numérico TWB DC-DP Experimental TWB DC-DP
Capítulo 5. Estudo numérico e experimental de um ensaio padronizado de avaliação do retorno elástico
205
Figura 5.31 – Ilustrações da taça (vistas de topo) a partir de uma TWB composta por DC06 e DP600: a) Taça imediatamente após a ruptura; b) Figura de isovalores da deformação plástica equivalente para
um deslocamento de 15 mm de avanço do punção; c) Ampliação da zona do furo da figura de isovalores de deformação plástica equivalente.
5.6 Conclusões e comentários
O programa DD3TRIM deu provas da eficiência e fiabilidade dos algoritmos e estratégias
numéricas nele implementados. Com efeito, foram realizadas centenas de operações de corte
de modo a reproduzir a etapa intermédia de extracção do anel da taça sem qualquer falha do
programa.
O ensaio Demeri constitui uma forma simples, com elevada repetibilidade e relativamente
pouco onerosa de avaliar o fenómeno de retorno elástico. De facto, a medida característica do
ensaio (abertura do anel) é uma variável simples de medir e com um baixo erro de medição
associado.
Apesar das dificuldades evidenciadas na previsão do retorno elástico do anel com os
programas da família DD3, a estratégia de refinar o anel imediatamente antes da simulação
do retorno elástico conduziu a bons resultados no caso do aço macio (DC06) e bastante
satisfatórios no caso do aço dual phase (DP600). A análise do estado de tensão na direcção da
espessura do anel indica que a insuficiência na previsão dos resultados possa estar
directamente relacionada com a elevada rigidez do elemento sólido de oito nós. No caso dos
pε
b)a)
c)
DC DP DC DP
Parte III. Estudos numéricos e experimentais
206
resultados obtidos com o programa explícito PAM-STAMP 2G™, a previsão da abertura do
anel no caso do aço DC06 é muito similar ao melhor valor obtido com os programas DD3. Já
no caso do aço DP600, os resultados da abertura do anel sobrestimam ligeiramente o valor
médio obtido nos ensaios experimentais. Este facto poderá resultar da integração explícita
usada na fase de conformação não garantir, em cada incremento, o equilíbrio do corpo
deformável juntamente com as ferramentas. A previsão do valor da força necessária à
embutidura da taça é bastante boa para ambos os materiais embutidos e para os dois
programas de simulação utilizados.
No que respeita à análise da influência da soldadura, tanto os resultados numéricos, como
os resultados experimentais, evidenciaram o reduzido impacto do nível de heterogeneidade
local das propriedades mecânicas do cordão relativamente ao material de base, na
conformação das taças e valores de abertura dos anéis, nos casos em que só se usaram TWBs
constituídas pelo mesmo material (aço DC06 ou DP600). No caso das TWBs constituídas
pelos dois aços (metade da TWB em aço DC06 e a outra metade em aço DP600), não foi
possível embutir as taças até ao deslocamento especificado. Com efeito, a análise cuidada dos
resultados obtidos através de simulação numérica confirmou que o furo de centragem,
necessário no posicionamento inicial da chapa de modo a garantir a correcta
reprodutibilidade dos ensaios, induz uma concentração de deformação/tensão demasiado
elevada no lado correspondente ao aço DC06, o que provoca a ruptura prematura do
conformado.
207
CAPÍTULO SEIS
Considerações finais
São apresentadas as principais conclusões resultantes dos assuntos abordados e explanados ao longo da dissertação. Indicam-se algumas perspectivas de trabalho futuro.
6.1 Conclusões
O objectivo principal deste trabalho, enquadrado na expansão do campo de aplicação da
família de programas DD3, consistiu em desenvolver uma ferramenta numérica que permite
simular sequências multi-etapas de fabrico de componentes complexos, que envolvam
operações intermédias de corte ou alteração da discretização do domínio da malha de
elementos finitos ao longo da simulação. Paralelamente, foram estudadas algumas das
dúvidas que existem na compreensão do comportamento mecânico de tailor-welded blanks na
simulação numérica do processo de estampagem. Neste âmbito, a principal contribuição do
trabalho consistiu em avaliar a influência da modelação do domínio da soldadura nos
resultados da simulação da conformação de chapas soldadas.
O programa numérico DD3TRIM foi desenvolvido com o objectivo principal de cortar e
dividir malhas constituídas por elementos finitos sólidos. Para além de efectuar a operação
de corte através de superfícies (NURBS ou planas) e da operação de remapeamento em
operações intermédias de estampagem multi-etapas, o programa pode ser utilizado, com
grandes vantagens em termos da diminuição do tempo de pré-processamento de uma
simulação e do controlo da forma e tamanho dos elementos, na geração de malhas de
elementos finitos que possuam geometrias complexas [Baptista et al. 2006, Padmanabhan et
Capítulo 6. Considerações finais
208
al. 2006]. O programa DD3TRIM inclui algumas estratégias simples de refinamento e de
remalhagem, as quais permitem ajustar/optimizar a discretização do corpo deformável no
decorrer da simulação, em função, por exemplo, da necessidade de melhorar o tratamento do
contacto com atrito ou de aumentar a precisão dos resultados. De modo a lidar com algumas
operações inerentes ao processo de produção virtual multi-etapas de componentes
estampados, foram também implementadas as funções de translação e rotação do corpo
deformável, bem como a função de “espelho”, com a qual é permitido desdobrar domínios
simétricos. O programa DD3TRIM (v1.7) é constituído por 1 módulo principal para cortar e
remapear malhas de elementos finitos, e 2 subprogramas para efectuar operações de
refinamento/remalhagem e de “espelho”. No total, o programa é formado por 196
subrotinas, 15 zonas comuns e cerca de 25800 linhas de programação em linguagem Fortran
90/95.
Apesar de muitos dos algoritmos desenvolvidos terem sido optimizados para executar
operações em malhas planas de elementos finitos sólidos, a adaptação dos algoritmos para
lidar com elementos do tipo casca ou membrana é tida como bastante simples.
- Algoritmos de corte
Os algoritmos desenvolvidos com vista ao corte e divisão provaram ser bastante eficazes e
robustos, tanto nos testes elementares estudados, como na sua aplicação a um número
considerável de casos reais de aplicação [Baptista et al. 2005a, Oliveira et al. 2006, Alves et al.
2006a, Padmanabhan et al. 2006]. A abordagem efectuada para o tratamento da operação de
corte compreendeu a descrição da metodologia seguida no ajuste dos elementos à superfície
de corte e a avaliação da influência do tratamento aplicado à malha de elementos finitos nos
resultados da simulação numérica (Capítulo 2). Em termos globais, considerando os
resultados obtidos nos dois testes elementares estudados, concluiu-se que:
O impacto da distorção imposta aos elementos que constituem a nova fronteira
da malha, depois de operado o corte, é reduzido e resume-se à zona de correcção;
O método de correcção tipo II é o que conduz a resultados globalmente melhores
quando associado à opção de distribuir os nós da face externa dos elementos de
forma pentaédrica.
- Algoritmos de busca de pontos e de remapeamento de variáveis
No que se refere ao estudo e avaliação dos métodos de localização de pontos em malhas de
elementos finitos, observou-se que o método das coordenadas volúmicas é muito mais
Capítulo 6. Considerações finais
209
eficiente que os métodos geométrico e da inversão paramétrica das funções de forma dos
elementos finitos. Recomenda-se, assim, a aplicação do método das coordenadas volúmicas
em detrimento dos outros métodos estudados.
O estudo conduzido para identificar a solução de remapeamento mais adequada ao elevado
nível de precisão de resultados reconhecido aos programas de simulação de conformação
que recorrem a formulações do tipo quasi-estático e integração implícita, mostrou que o
método de Remapeamento Incremental Volúmico, desenvolvido no decorrer deste trabalho,
é o mais eficaz relativamente aos outros dois métodos estudados (Capítulo 3). Nos testes
efectuados para avaliar o desempenho dos métodos, foi possível concluir que:
O nível do erro associado ao método de remapeamento incremental volúmico foi
sempre inferior ao medido com cada um dos outros métodos implementados.
Esta diferença do erro de remapeamento foi, em termos médios, sempre superior
a 50% face ao melhor dos outros métodos e houve casos em que a diferença
registada ascendeu a 200% (com o parâmetro 5nl = );
O parâmetro de ajuste nl provou ser uma forte mais valia do método de
remapeamento incremental volúmico, pois permite melhorar consideravelmente
a qualidade do remapeamento na presença de duas malhas com distribuições de
elementos muito dissimilares;
Os métodos de remapeamento por interpolação/extrapolação simples e através
de mínimos quadrados móveis são influenciados pela ocorrência de situações em
que determinados pontos da malha de destino estão fora da malha de origem, ao
contrário do que se observou para o método de remapeamento incremental
volúmico;
O esforço de computação exigido no caso do método de remapeamento
incremental volúmico não é elevado, tendo em conta o reduzido erro de
remapeamento associado;
O método de remapeamento por interpolação/extrapolação simples é o mais
célere dos três métodos estudados constatando-se, também, que os resultados
obtidos por este método foram, em termos globais, melhores que os obtidos com
o método de remapeamento através de mínimos quadrados móveis.
- Influência da modelação da soldadura na simulação da conformação de TWBs
Os resultados numéricos obtidos para cada um dos ensaios mecânicos simples utilizados
para avaliar a influência da modelação do cordão de soldadura nos resultados da simulação
Capítulo 6. Considerações finais
210
do comportamento mecânico de chapas soldadas permitiram estabelecer, de forma
quantitativa e sistemática, relações entre o nível de heterogeneidade e largura do cordão
com, por exemplo, o nível de resistência global das TWBs (Capítulo 4). As principais
conclusões obtidas, para cada tipo de solicitação, encontram-se detalhadas a seguir.
(i) No caso da solicitação em tracção uniaxial observou-se que a modelação do cordão de
soldadura pode ser determinante, tanto no nível de resistência, como na capacidade de
deformação obtida para a TWB, nas situações em que o cordão tem orientações transversal
ou a 45° relativamente à direcção de solicitação, e em que a resistência mecânica do cordão é
inferior à do material de base. Nos casos em que o cordão se encontra em overmatch não se
registaram variações significativas, quer da resistência mecânica, quer da capacidade de
deformação. O conhecimento deste tipo de conclusões e relações pode ser de grande
importância, visto que uma das principais condicionantes na estampagem de TWBs reside,
exactamente, na limitada conformabilidade da soldadura.
(ii) Para a solicitação correspondente à trajectória de corte, as simulações evidenciaram que a
influência do nível de heterogeneidade e da largura do cordão só é relevante nas situações
em que o cordão é paralelo à direcção de solicitação, atingindo-se reduções de resistência até
cerca de 40% para as situações mais severas de undermatch.
(iii) No caso do ensaio de flexão em quatro pontos constatou-se que, de uma forma geral, a
modelação do domínio físico e das propriedades mecânicas da soldadura têm pouco
impacto, tanto resistência da TWB como na variação do ângulo de retorno elástico. No que
respeita à resistência mecânica, só se observaram variações relevantes nos casos em que o
cordão tem uma disposição perpendicular à maior dimensão do provete, e nas situações
mais severas de undermatch.
(iv) O ensaio Jovignot foi escolhido de modo a solicitar as TWBs em trajectórias de
deformação predominantemente de expansão biaxial na região do topo da calote. Nas
situações de undermatch observaram-se variações nos resultados que podem ser
significativas, nos casos em que o índice de heterogeneidade ulM é inferior a 0.70, tendo sido
registadas reduções de conformabilidade das TWBs de cerca 68% para este valor de ulM
associado a uma largura do cordão de 2 mm. Nas situações de overmatch as variações de
conformabilidade observadas são desprezáveis, uma vez que o nível de deformação no
cordão de soldadura é muito inferior ao do material de base.
Capítulo 6. Considerações finais
211
Em termos gerais, pode afirmar-se que nas situações de overmatch a presença do domínio
geométrico e, correspondentemente, das propriedades mecânicas da soldadura, não afectam
de forma significativa os resultados obtidos pela simulação numérica, tendo em conta que
não se usaram critérios de dano/ruptura. Nas situações em que o cordão de soldadura esteja
em situação de undermatch relativamente ao material de base, os resultados indiciam que em
determinadas situações, seja pelo tipo de solicitação e/ou pela orientação do cordão na TWB,
a redução de resistência e/ou da capacidade de deformação podem ser muito significativas,
sendo nestes casos fortemente recomendável a modelação do domínio geométrico e material
do cordão de soldadura na malha de elementos finitos.
Os ensaios experimentais realizados com base no ensaio Demeri comprovaram que este teste
permite, de um modo simples e com elevada repetibilidade, avaliar o fenómeno de retorno
elástico em função de vários parâmetros (Capítulo 5). De facto, a medida característica do
ensaio (abertura do anel) é uma variável simples de medir e com um baixo erro de medição
associado. A previsão da etapa de retorno elástico com a família de programas DD3
evidenciou as dificuldades do elemento finito hexaédrico de oito nós, devidas à sua excessiva
rigidez. Contudo, a estratégia utilizada de refinar o anel, imediatamente antes da simulação
do retorno elástico, conduziu a bons resultados no caso do aço macio (DC06) e bastante
satisfatórios no caso do aço dual phase (DP600). No caso dos resultados obtidos com o
programa dinâmico-explícito PAM-STAMP 2G™, a previsão da abertura do anel no caso do
aço DC06 é muito semelhante ao melhor valor obtido com os programas DD3. Já no caso do
aço DP600, os valores numéricos sobrestimam ligeiramente o valor médio das aberturas dos
anéis, correspondentes aos ensaios experimentais. A previsão do valor da força necessária à
embutidura da taça é boa para ambos os materiais embutidos (monolíticos e TWBs) e para os
dois programas de simulação.
Na análise da influência da presença do cordão de soldadura no comportamento
mecânico das TWBs, tanto os resultados numéricos, como os resultados experimentais,
evidenciaram o reduzido impacto do nível de heterogeneidade local das propriedades
mecânicas do cordão relativamente ao material de base, nos casos em que só se usaram
TWBs constituídas pelo mesmo material (aço DC06 ou DP600). Este resultado é consonante
com as conclusões retiradas do estudo numérico de avaliação da influência da modelação do
cordão de soldadura no comportamento mecânico de chapas soldadas (Capítulo 4). De facto,
apesar do cordão das TWBs estar sujeito, no decorrer do ensaio Demeri, sobretudo a
solicitações de compressão, flexão e tracção, na generalidade dos casos experimentais
estudados o cordão de soldadura está em situação de overmatch relativamente aos materiais
de base, o que condiciona pouco a conformação da taça. No caso das TWBs compostas por
Capítulo 6. Considerações finais
212
materiais diferentes (aços DC06 e DP600), não foi possível embutir as taças até ao
deslocamento especificado. Com a análise dos resultados obtidos através da simulação
numérica da estampagem da TWB, confirmou-se que o furo de centragem, necessário no
posicionamento inicial da chapa de modo a garantir a correcta reprodutibilidade dos ensaios,
induz uma concentração de deformação demasiado elevada no lado correspondente ao aço
DC06, o que origina a ruptura prematura do conformado.
6.2 Perspectivas de trabalho futuro
As simulações numéricas do ensaio Demeri colocaram mais uma vez em evidência que o
elemento finito hexaédrico de oito nós pode apresentar um comportamento numérico
sofrível em problemas que comportem a simulação do retorno elástico de modo não
constrangida. Com efeito, é de há muito conhecido dos autores que trabalham na área da
mecânica computacional, com o método dos elementos finitos, que o elemento finito
hexaédrico de oito nós denota um mau comportamento quando sujeito a solicitações de
flexão. A elevada rigidez do elemento, ainda que no caso presente tenha sido bastante
atenuada através de estratégias de refinamento, deverá justificar este comportamento, que
limita o rigor dos resultados em materiais/ensaios que exibam elevado retorno elástico.
Assim, um dos desenvolvimentos prementes dos programas DD3IMP/DD3OSS consiste em
estudar outros tipos de elementos finitos que melhorem os resultados relativos à simulação
do retorno elástico. Um caminho possível será a introdução de elementos finitos do tipo
casca combinados com a presença de elementos sólidos. Ainda na temática da discretização
do domínio através de elementos finitos, atendendo a que muitos dos processos multi-etapas
de conformação de componentes em chapa incluem, por exemplo, operações de quinagem
e/ou de dobragem, será conveniente dotar a biblioteca de elementos finitos dos programas
DD3 de uma formulação que admita o tratamento do contacto elemento/elemento, e não
apenas ferramenta/elemento.
Outra questão que neste momento começa a traduzir dificuldades crescentes na
utilização dos programas DD3IMP/DD3OSS, consiste no aumento generalizado da dimensão
dos problemas estudados, nomeadamente na análise de ensaios padronizados propostos em
cada conferência NUMISHEET ou mesmo no estudo, em ambiente industrial, de
componentes automóveis de média dimensão. De facto, apesar do desenvolvimento de
algumas estratégias numéricas que permitem executar operações simples de remalhagem,
incluídas no programa DD3TRIM, começa a ser bastante delicado realizarem-se simulações
utilizando apenas um processador de cálculo em problemas que envolvam malhas com uma
ou duas dezenas de milhar de elementos finitos. Assim, a paralelização dos programas
Capítulo 6. Considerações finais
213
DD3IMP e DD3OSS possibilitaria o acesso ao estudo de problemas de grandes dimensões
como, por exemplo, a conformação de um painel automóvel à escala natural e, também, a
redução do tempo de cálculo em termos absolutos. Tendo em conta a elevada eficácia do
método de Remapeamento Incremental Volúmico, o desenvolvimento de uma metodologia
geral de refinamento adaptativo poderá traduzir-se em ganhos relevantes no aumento do
rigor dos resultados sem, no entanto, comprometer o tempo de cálculo exigido. A
paralelização dos programas possibilitaria, ainda, tomar partido da política de clusters
informáticos partilhados ao nível das instituições académicas.
Nas últimas décadas assistiu-se à proliferação dos programas de CAD baseados na
modelação de sólidos e de superfícies. Em particular, na representação geométrica de
superfícies, tornou-se corrente a utilização de NURBS em todos os programas comerciais de
CAD. Assim, de modo a melhorar a interoperabilidade entre os programas de CAD e os
programas de simulação da família DD3, será importante implementar a definição das
ferramentas de estampagem (tidas como rígidas) através de superfícies NURBS. Para isso, o
estudo efectuado no decorrer deste trabalho, aquando da definição da superfície de corte,
poderá ser tomado como ponto de partida, pois já inclui o tratamento de algumas operações
elementares com superfícies NURBS.
Na temática da modelação das ferramentas, com a utilização crescente de aços de alta
resistência, que em determinadas operações de estampagem podem deformar elasticamente
as ferramentas, e com a conformação de materiais (como o magnésio) com as ferramentas
aquecidas, a simplificação de considerar as ferramentas rígidas deixa de ser adequada.
Assim sendo, para alargar o estudo da conformação do processo de estampagem a este tipo
de problemas, que começam a ser correntes na indústria, a modelação das ferramentas como
um corpo deformável consistirá num desafio aliciante em termos de evolução dos programas
DD3.
Finalmente, no que respeita ao estudo da simulação numérica de tailor-welded blanks, após
se ter clarificado a necessidade de modelar, ou não, o domínio da soldadura na simulação
numérica, será interessante estudar outros casos onde sejam aplicadas TWBs: com
combinações de materiais de família diferentes; com espessuras distintas; com diferentes
configurações de junta; e com a aplicação de forças de aperto do cerra-chapas diferentes nas
chapas que compõem o esboço. Tudo indica que, no futuro, o aumento da aplicação de TWBs
na construção de estruturas automóveis centrar-se-á, cada vez mais, na produção de
componentes que incluam TWBs com geometrias de cordão do tipo não-linear. Deste modo,
a optimização funcional da TWB será melhor conseguida, de modo a melhorar as
características do painel (peso/resistência). Contudo, este tipo de solução exige uma
avaliação precisa da movimentação do cordão de soldadura durante o processo de
Capítulo 6. Considerações finais
214
estampagem, de modo a prevenir que o cordão não esteja sujeito a deformações excessivas.
Assim, será muito interessante desenvolver o trabalho conduzido por Padmanabhan et al.
2006, de optimização da forma inicial do esboço utilizando o corte de malhas de elementos
finitos através de superfícies NURBS, com vista a prever, com rigor, o posicionamento do
cordão de soldadura no final da conformação de uma TWB.
215
ANEXO A
Nomenclatura
A.1 Notações algébricas 0 - Tensor nulo
,..., ;a z ,..., ;A Z ,...,α ω
- Escalares em
,..., ;a z ,..., ;A Z ,...,α ω
- Tensores em 3
′a - Parte desviadora do tensor a a - Tensor a definido no referencial objectivo a - Norma do tensor a
1−a - Tensor resultante da inversão do tensor a Ta - Tensor resultante da transposição do tensor a
ab - Produto dos vectores a e b ⋅a b - Produto interno dos vectores a e b 'P P - Vector que une o ponto P ao ponto 'P ( )det a - Determinante do tensor a
J - Matriz Jacobiana ⊥ - Símbolo de ortogonalidade entre vectores
A.2 Operadores e funções
( )max - Função máximo ( )min - Função mínimo ( )proj - Função projecção ( )cos - Função co-seno ( )exp - Função exponencial
Anexos
216
A.3 Corte de malhas de elementos finitos hexaédricos
iN - Nó i do elemento
iA - Aresta i do elemento iF - Face i do elemento
N-STATUS - Tabela de estatutos de nós E-STATUS - Tabela de estatutos de elementos n - Vector perpendicular à superfície eV - Volume do elemento cortado que está na zona a eliminar da malha etetV - Volume do tetraedro que está na zona a eliminar da malha tetV - Volume total do tetraedro r - Recta P - Ponto ( )uC - Curva paramétrica NURBS
u e v - Coordenadas paramétricas de uma curva ou de uma superfície
NURBS p e q - Graus das funções de base B-Spline
( ),i pN u - Funções de base B-spline normalizadas de grau p ( ),i pR u - Funções racionais base da curva NURBS de grau p
iP - Vectores de posição ou pontos de controlo da curva NURBS iw - Coeficientes de ponderação, ou pesos, associados a cada ponto de
controlo iP da curva NURBS U e V - Vectores de nós de curvas ou de superfície NURBS iu e iv - Nós de curvas ou de superfície NURBS ( ),u vS - Curva paramétrica NURBS ( ), ,i jR u v - Funções racionais base da superfície NURBS
,i jP - Vectores de posição ou pontos de controlo da superfície NURBS ,i jw - Coeficientes de ponderação associados a cada ponto de controlo
,i jP da superfície NURBS
( ),u u vS ou uS - Derivada parcial de primeira ordem na direcção u da superfície
NURBS
( ),v u vS ou vS - Derivada parcial de primeira ordem na direcção v da superfície
NURBS
( ),uu u vS ou uuS - Derivada parcial de segunda ordem na direcção u da superfície
NURBS
( ),vv u vS ou vvS - Derivada parcial de segunda ordem na direcção v da superfície
NURBS
( ),uv u vS ou uvS - Derivada parcial mista nas direcções u e v da superfície NURBS
( ),u vr - Vector distância
Anexo A – Nomenclatura
217
A.4 Remapeamento de variáveis ξ , η e ζ - Coordenadas canónicas do elemento finito x - Vector de posição
nen - Número de nós do elemento finito e eiN - Função de forma do elemento e associada ao nó i
1 2 3 4, , ,ξ ξ ξ ξ - Coordenadas volúmicas iV - Volume de um sub-tetraedro EV - Volume do tetraedro E
C - Centróide do tetraedro tC - Centróide de uma das faces do tetraedro O - Relativo à malha de origem D - Relativo à malha de destino ig - Ponto de Gauss do elemento
Ongn - Número de pontos de Gauss do elemento finito Oe da malha de origem
Dnen - Número de nós do elemento De α - Variável de estado escalar
Oeig iN - Função de forma associada ao ponto de Gauss ig do elemento Oe ,
calculada no ponto correspondente nó i Oiα - Variável de estado escalar no nó i da malha de origem Djα - Variável genérica no nó j da malha de destino Oei jN - Função de forma do elemento de origem Oe associada ao nó i da malha
de origem, calculada no ponto correspondente ao nó j Digα - Variável de estado α do ponto de Gauss ig da malha de destino Oigα - Variável de estado α do ponto de Gauss ig da malha de origem Dej igN - Função de forma associada ao nó j do elemento De , calculada no ponto
de Gauss ig iΩ - Domínio esférico de influência iR - Raio do domínio iΩ ( )P x - Monómios ou outras funções de x ( )a x - Coeficientes associados a ( )P x ( )w x - Função de ponderação associada à posição de cada ponto de Gauss ngn - Número de pontos de Gauss da malha de origem
VΦ - Função de ponderação volúmica ig D
jV - Volume ocupado pela parte elementar j do volume de Gauss da malha de destino no volume de Gauss ig da malha de origem
ig OtotV - Totalidade do volume de Gauss ig da malha de origem
nl - Número de divisões lineares (aresta) do volume de Gauss da malha de destino
nnn - Número de nós da malha x - Média aritmética do erro da distribuição
Anexos
218
A.5 Modelos de comportamento e propriedades dos materiais E - Módulo de elasticidade ou módulo de Young K , 0ε e n - Parâmetros constitutivos da lei de Swift pε - Deformação plástica equivalente F , G , H , L , M e N
- Parâmetros de anisotropia do critério de Hill’48
σ - Tensão equivalente ν - Coeficiente de Poisson σ - Tensão limite de elasticidade em tracção uniaxial
0σ - Tensão limite de elasticidade inicial em tracção uniaxial satσ , YC e 0σ
- Parâmetros constitutivos da lei de Voce
uσ - Tensão à carga máxima 0MBσ - Tensão limite de elasticidade do material de base ulM - Nível de heterogeneidade da soldadura
A.6 Siglas e abreviaturas CAD - Computer Aided Design CAE - Computer Aided Engineering DD3 - Família de programas DD3IMP - Contracção de Deep Drawing 3D IMPlicit code DD3OSS - Contracção de Deep Drawing 3D One Step Springback DD3MAT - Contracção de Deep Drawing 3D MATerials parameters identification DD3LT - Contracção de Deep Drawing 3D Learning and Teaching DD3TRIM - Contracção de Deep Drawing 3D TRIMming SUV - Sport Utility Vehicle GM - General Motors Euro NCAP - European New Car Assessment Programme FEM - Finite Element Method TWB - Tailor Welded Blank LASER - Light Amplification by Stimulated Emission of Radiation Nd:YAG - Neodymium: Yttrium-Aluminum-Garnet TIG - Tungsten Inert Gas ULSAB - Ultra Light Steel Auto Body TRIP - TRansformation Induced Plasticity NURBS - Non Uniform Rational B-Spline STEP - STandard for the Exchange of Product data IGES - Initial Graphics Exchange Specification
Anexo A – Nomenclatura
219
RMS - Root Mean-Squared FSW - Friction Stir Welding NE - Número de elementos da malha NN - Número de nós da malha NC - Número de camadas de elementos na direcção da espessura TMDp - Tamanho médio da diagonal dos elementos no plano da malha Te - Dimensão inicial do elemento em espessura HV - Unidade de dureza Vickers ZAC - Zona Afectada pelo Calor ZF - Zona Fundida MB - Material de Base DP600 - Aço do tipo dual phase DC06 - Aço macio de embutidura
Anexos
220
221
ANEXO B
Cálculo de derivadas de superfícies NURBS
B.1 Derivadas parciais de primeira e segunda ordem
Neste anexo são desenvolvidas as expressões que permitem calcular as derivadas parciais de
primeira e de segunda ordem num ponto ( ),u v de uma superfície NURBS ( ),u vS
(Figura b.1).
Figura b.1 – Representação esquemática das primeiras derivadas de uma superfície NURBS num ponto.
Para a direcção paramétrica u , a primeira e segunda derivadas parciais são dadas por:
( ) ( ) ( ),,
0 0
,,,
n mi j
u i ji j
R u vu vu v
u u= =
∂⎛ ⎞∂= = ⎜ ⎟
∂ ∂⎝ ⎠∑ ∑
SS P , (b.1)
( ) ( ) ( )22,
,2 20 0
,,,
n mi j
uu i ji j
R u vu vu v
u u= =
⎛ ⎞∂∂= = ⎜ ⎟⎜ ⎟∂ ∂⎝ ⎠
∑ ∑S
S P . (b.2)
Dado que as fórmulas das derivadas ( ),v u vS e ( ),vv u vS , são em tudo análogas às
fórmulas para a direcção u , a sua apresentação é omitida. A derivada mista ( ),uv u vS é dada
por
( ) ( ) ( )22,
,0 0
,,,
n mi j
uv i ji j
R u vu vu v
v u v u= =
⎛ ⎞∂∂= = ⎜ ⎟⎜ ⎟∂ ∂ ∂ ∂⎝ ⎠
∑ ∑S
S P . (b.3)
( ),u vS
uSvS P
v
u
Anexos
222
Para obter expressões mais compactas, assume-se na sua descrição que ( ),A u v representa
o numerador e ( ),B u v o denominador das funções ( ),i pR u :
( ) ( ) ( ), , ,, i p j q i jA u v N u N v w= (b.4)
( ) ( ) ( ), , ,0 0
,n m
k p l q k lk l
B u v N u N v w= =
= ∑ ∑ . (b.5)
Depois de aplicadas as regras de derivação das funções racionais e feitas as devidas
simplificações, obtêm-se:
( ) ( ) ( )( )
( ) ( )( )2
, , , ,,
, ,u u
u
R u v A u v B u v A u vR u v
u B u v B u v∂
= = −∂
, (b.6)
( ) ( ) ( )
( )( ) ( ) ( ) ( )
( )( ) ( )
( )
2
2 2
2
3
, , 2 , ,, ,,
, ,
2 , ,,
uu u uuuuu
u
A u v B u v B u v A u vR u v A u vR u v
u B u v B u v
A u v B u vB u v
+⎡ ⎤∂ ⎣ ⎦= = −∂
+
, (b.7)
( ) ( ) ( )( )
( ) ( ) ( ) ( )( )
( ) ( ) ( ) ( ) ( ) ( )( )
2
2
3
, , , ,, ,,
, ,
2 , , , , , ,,
v u v uuvuv
v u uv
B u v A u v A u v B u vR u v A u vR u v
v u B u v B u v
A u v B u v B u v A u v B u v B u vB u v
+⎡ ⎤∂ ⎣ ⎦= = −∂ ∂
−⎡ ⎤⎣ ⎦+
, (b.8)
onde,
( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )
(1), , ,(2), , ,(1) (1), , ,
,,,
u i p j q i j
uu i p j q i j
uv i p j q i j
A u v N u N v wA u v N u N v wA u v N u N v w
===
e
( ) ( ) ( )
( ) ( ) ( )
( ) ( ) ( )
(1), , ,
0 0
(2), , ,
0 0
(1) (1), , ,
0 0
,
,
,
n m
u k p l q k lk ln m
uu k p l q k lk ln m
uv k p l q k lk l
B u v N u N v w
B u v N u N v w
B u v N u N v w
= =
= =
= =
=
=
=
∑ ∑
∑ ∑
∑ ∑
. (b.9)
Nas equações, ( )( ),ki pN u define a derivada de ordem k das funções de base B-spline
( ),i pN u . As funções ( )( ),ki pN u podem ser calculadas de forma recursiva, utilizando-se para
tal a seguinte expressão
( ) ( ) ( )( 1) ( 1), 1 1, 1( )
,1 1
k ki p i pk
i pi p i i p i
N u N uN u p
u u u u
− −− + −
+ + + +
⎡ ⎤= −⎢ ⎥
− −⎢ ⎥⎣ ⎦. (b.10)
223
ANEXO C
Ficheiros de entrada do programa DD3TRIM
Neste anexo apresentam-se exemplos dos ficheiros de entrada do programa DD3TRIM. O
ficheiro ‘trim.dat’ é indissociável do executável DD3TRIM, propriamente dito,
caracterizando: o subprograma a usar (corte, divisão, ou remapeamento), a opção de corte
pretendida (por plano ou superfície paramétrica NURBS), o tipo de tratamento a aplicar na
correcção da componente geométrica e da parte relativa ao remapeamento das variáveis, etc.
O ficheiro ‘nurb_name.igs’ é opcional, sendo apenas requerido quando se procede ao
corte de malhas através de uma superfície do tipo NURBS.
C.1 Ficheiro ‘trim.dat’ ********** < DD3TRIM V17.c > File 'trim.dat' 28.12.2005 ********** ********** Generic file to input Trimming parameters ********** ===================+======================================================= SUBPROGRAM TO USE: | 1 Info: - -------------------+-----------------------------------------------------05 REMAPPING --> 0 | Remap of a given mesh by an UFO file - TRIMMING --> 1 | Cuts parts from a given mesh - SPLITTING --> 2 | Splits rings or other closed meshes - ===================+======================================================= DATA SOURCE: | 1 10 -------------------+------------------------------------------------------- | Info: - DD3IMP FILE --> 1 | From data file of type *.UFO - GID FILE --> 2 | From mesh file of type *.MSH - ===================+=====================================================15 TRIMMING TYPE: | 1 Info: For Trimming and Splitting - -------------------|------------------------------------------------------- By plan --> 1 | - | - Equation: | on1/off0 A B C D 20 Ax+By+Cz+D=0 | 1 7.7 7.7 7.7 7.7 - | - Tree points: | on1/off0 Info: Points mustn't be collinear - | 0 - | x y z 25 Point 1: | 11.0 7.0 0.5 - Point 2: | 21.0 10.0 0.5 - Point 3: | 8.0 3.0 0.6 - -------------------+-------------------------------------------------------
Anexos
224
(continuação) -------------------+------------------------------------------------------- By generic surface | Info: File *.igs must be present 30 --> 2 | NURBS normal oriented towards the - | eliminating zone -===================+======================================================= TRIMMED ZONE | - -------------------| 35 Trimming: | x y z - Point of the zone | 46.0 27.0 7.0 - -------------------+-------------------------------------------------------Splitting (rings): | - | 40 | x y z - Inside Point: | 0.0 0.0 0.0 - Outside Point: | 0.0 0.0 0.0 - ===================+======================================================= CORRECTION TYPE: | 2 Info: For Trimming and Splitting 45 -------------------+------------------------------------------------------- Type I --> 1 | Element elimination - Type II --> 2 | Element elimination + projection - Type III --> 3 | Element elimination + edje direction - | 50 For Type III: | If v(0,0,0) OPTION OFF - Oriented Vector v | - | x y z - | 0.0 0.0 0.0 - ===================+=====================================================55 DEGENERATE ELEMENTS| on1/off0 - | 0 Info: Degenerates pentahedric forms - ===================+======================================================= PROCEDD REMMAPING | on1/off0 - | 1 Info: For Trimming and Splitting 60 -------------------+------------------------------------------------------- | - REMMAPING TYPE: | 3 Info: - -------------------+------------------------------------------------------- Type I --> 1 | Base Method: Extrapolation->Interpolation 65 -------------------+------------------------------------------------------- Type II --> 2 | Minimize Functional: Moving Least Squares - -------------------+------------------------------------------------------- Type III --> 3 |NLdiv 5 Discrete Calculation: Intersecting Volumes - ===================+=====================================================70 PROCEED ROTATION | on1/off0 - (ONLY UFOS) | 0 Info: New coordinate system axis - | x y z - Vector OX New: | 0.0 0.0 0.0 - Vector OY New: | 0.0 0.0 0.0 75 Vector OZ New: | 0.0 0.0 0.0 - ===================+======================================================= PROCEED TRANSLATION| on1/off0 - (ONLY UFOS) | 0 Info: Translation vector - | x y z 80 Vector Direction: | 0.0 0.0 0.0 - ===================+======================================================= ---------------------------------------------------------------------------
Anexo C – Ficheiros de entrada do programa DD3TRIM
225
C.2 Ficheiro ‘nurb_name.igs’
Translator GID - IGES S0000001 1H,,1H;,3HGID,33H C:/CEMUC/FA/60s.igs,,,26,,,,,,0,,0,,0,,1, G0000001 0,,5HCIMNE,9,,; G0000002 128 1 1 D0000001 128 9 NURBSURF 1D0000002 128,7,1,3,1,0,0,1,0,0,0,0,0,0,0.2696129,0.50025292,0.69102833, 1P0000001 0.81038681,1,1,1,1,0,0,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1,1, 1P0000002 -2.804053,-5.16892,0,-3.0315653,-4.0968669,0,-3.0830998, 1P0000003 -2.6158131,0,-2.450814,-0.24658376,0,-1.5993302,1.3546726,0, 1P0000004 -1.2423752,3.0707054,0,-1.1892867,3.9613801,0,-1.250001, 1P0000005 4.729729,0,-2.804053,-5.16892,10,-3.0315653,-4.0968669,10, 1P0000006 -3.0830998,-2.6158131,10,-2.450814,-0.24658376,10,-1.5993302, 1P0000007 1.3546726,10,-1.2423752,3.0707054,10,-1.1892867,3.9613801,10, 1P0000008 -1.250001,4.729729,10,0,1,0,1; 1P0000009 S0000001G0000002D0000002P0000009 T0000001
Anexos
226
227
ANEXO D
Propriedades mecânicas dos materiais
Neste anexo apresentam-se as tabelas que contêm os parâmetros constitutivos que
caracterizam os critérios de plasticidade e as leis de encruamento para a descrição do
comportamento mecânico de alguns dos materiais referidos no texto principal.
D.1 Aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas – Tracção
Tabela D.1 – Parâmetros constitutivos associados ao critério de plasticidade de Hill’48 e à lei de encruamento de Swift, para o aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas no Capítulo 2. E - Módulo de Young [GPa] 221.37 ν - Coeficiente de Poisson 0.30
Lei de encruamento de Swift
0σ - Tensão limite de elasticidade [MPa] 151.696 K - Constante do material [MPa] 544.27 n - Coeficiente de encruamento 0.2701
Critério de plasticidade de Hill’48 F G H M N L
0.5 0.5 0.5 1.5 1.5 1.5
D.2 Aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas – Flexão
Tabela D.2 – Parâmetros constitutivos associados ao critério de plasticidade de Hill’48 e à lei de encruamento de Swift, para o aço usado nos testes de sensibilidade ao corte de malhas no Capítulo 2. E - Módulo de Young [GPa] 210 ν - Coeficiente de Poisson 0.30
Lei de encruamento de Swift
0σ - Tensão limite de elasticidade [MPa] 365.3 K - Constante do material [MPa] 673 n - Coeficiente de encruamento 0.131
Critério de plasticidade de Hill’48 F G H M N L
0.43322 0.54945 0.45055 1.54279 1.54279 1.54279
Anexos
228
229
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