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CAPÍTULO 7

- FORMAS DE TRABALHO E SEU ENQUADRAMENTO

A evolução recente das formas de trabalho trouxe consigo uma série de modalidades de trabalho atípicas ou inovadoras, que se diferenciam da rela­ção salarial de dependência hierárquica, do Pós Segunda Guerra Mundial.

As mutações no emprego modificam as relações tradicionais patrão/ empregado. Por isso, dificilmente se consideram apenas empregados os indivíduos que se encontram com um contrato de trabalho típico, com uma relação legalmente tipificada de trabalho subordinado.

Perspectivam-se no horizonte múltiplas formas de emprego, ao ponto de, num futuro próximo, as formas que actualmente são consideradas atí­picas poderiam passar a assumir a designação de formas típicas, se a ten­dência continuar a ser no sentido de as favorecer.

7.1. Formas de Trabalho Atípicas e/ou Inovadoras

7.1.1. Trabalho independente

o trabalhador independente - por vezes, chamado "trabalhador por conta própria", "autónomo", ou em "auto-emprego" - é o indivíduo que

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exerce a sua actividade por conta própria sem auxílio de assalariados. Trata-se de um trabalhador que é simultaneamente um empresário.

o trabalho independente constitui uma realidade histórica antiquís­sima, sobretudo vinculada ao sector agrícola (e outras actividades primá­rias), à produção artesanal de bens, ao comércio, à prestação de serviços e às actividades artísticas.

Esta forma de trabalho sempre se manteve como modalidade de activi­dade económica relevante, embora secundária. Actualmente, o trabalho independente ou auto-emprego tende a ganhar novo vigor em virtude da competitividade das empresas e da necessidade de redução de custos, com a tendência para a terceirização da economia, e, em especial, com as polí­ticas públicas tendentes à desregulamentação de sectores, com a respectiva privatização e redução do peso do Estado na economia. Por outro lado, o Estado, em vez de atribuir subsídios às empresas para manutenção de pos­tos de trabalho, tem preferido incentivar com subsídios a criação do pró­prio emprego.

Tem-se expandido a criação de micro-empresas sedeadas no domicí­lio e têm emergido novos modelos de descentralização e articulação de actividades empresariais, como a subcontratação e o franchising, que no seu todo potenciam a independência dos agentes económicos nos nossos dias.

7.1.2. Trabalho temporário

o trabalho temporário inclui as modalidades de trabalho sazonal (ligado às práticas agrícolas) e de contratos de trabalho a termo certo. Estas formas de trabalho correspondem a respostas das empresas às garantias, consideradas excessivas, dos contratos normais subordinados e do traba­lho temporário realizado através de uma empresa ou agência de emprego. São, no seu todo, modalidades de actividade intermitente.

7.1.3. Situação de pré-reforma com exercício de actividade

Esta modalidade foi introduzida na última década em Portugal, no momento em que as organizações (empresas e Administração Pública) iniciaram processos de redução do efectivo (downsizing), promovendo a

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aposentação antecipada dos mais idosos e a pré-refonna de outros, com ou sem prestação de trabalho, com redução de vencimento.

o pré-reformado é um trabalhador com vínculo à sua empresa que lhe paga uma remuneração até à idade de aposentação definitiva, mas que pode legalmente exercer uma outra actividade remunerada. Trata-se de um ' dispositivo jurídico destinado a aliviar os custos com os recursos humanos, proporcionando fonnas lentas e diferidas no tempo de afastamento da vida activa.

-7.1.4. Trabalho a tempo parcial, por turnos e em jornada

contínua

Estas três formas atípicas de trabalho relacionam-se com diferentes formas de estruturação da actividade, de processo produtivo e de organiza­ção do trabalho. Quando estas modalidades são mutuamente interessantes acontecem situações potenciadoras de motivação e satisfação no trabalho, quando não são, a empresa pode impor estas modalidades, forçando o tra­balhador a aceitar tais incómodos como um mal menor.

7.1.5. Trabalho ao domicílio e tele-trabalho

o trabalho ao domicílio foi uma modalidade importantíssima na histó­ria dos processos de industrialização e subsiste hoje com um enquadra­mento jurídico específico em certo tipo de actividades marginais. Os traba­lhadores a domicílio são tradicionalmente mulheres c minorias étnicas.

O tele-trabalho é um modalidade emergente de trabalho ao domicílio que poderá introduzir algumas alterações em relação àquele, no que diz respeito às fonnas de controlo que a organização do trabalho pode ter, quando estruturada de uma forma leve e à distância, sobre os comporta­mentos produtivos do trabalhador, diminuindo a sua margem de autono­mia.

O tele-trabalho pode ser também um meio precarizado do emprego, caso não veja associados meios cautelares de promoção da segurança na relação de trabalho. Pode igualmente potenciar o isolamento dos indiví­duos e há que encontrar uma solução eficaz para que esta forma de traba­lho possa ser negociada e estudada nas suas diferentes dimensões.

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7.1.6. Trabalho a dias

Esta é uma forma mais precária de prestação de trabalho, correspon': dendo muitas vezes a actividades informais de prestação de serviço. Trata­se de uma modalidade de emprego minoritária. Pode vir a assumir um papel mais relevante junto de alguns segmentos da actividade produtiva, nomeadamente na agricultura e nos serviços pessoais e domésticos.

7.2. Novas Formas de Trabalho: Dificuldades e Condições Facilitadoras

Uma das dificuldades ao incremento destas novas formas de trabalho é a existência de um enquadramento legal e de uma cultura, particularmente por parte das organizações representativas dos trabalhadores, pensadas e voltadas para as modalidades tradicionais de trabalho e consequentemente desajustadas das necessidades actuais.

Além disso, o papel regulador/facilitador que o Estado deve exercer e que os parceiros sociais reclamam é, muitas vezes, obscurecido pelo carác­ter esterilizador e burocrático que inferioriza os interventores em vez de os valorizar. O Estado não deve regulamentar ao detalhe, mas antes definir as grandes linhas e deixar aos agentes espaço para a auto-regulação.

Um outro domínio onde se coloca um certo bloqueio ao avanço destas novas formas inovadoras de trabalho e de actividade é o económico-finan­ceiro. É muitas vezes uma análise insuficiente dos custos e beneficios da nova e velha solução o cerne da pouca inovação das empresas portuguesas.

Os trabalhadores, por seu turno, também tendem a avaliar esta questão em termos semelhantes ao empresário: apenas pelo lado dos rendimentos directos. Questões, tais como a realização pessoal, a sociabilidade, o stress profissional, a fadiga, a organização da vida quotidiana ou o reconhecimento público do trabalho, surgem em lugar secundário face ao salário e ao ganho.

Assim, quer pelo lado dos custos e das condições de crédito ao inves­timento, quer pelo lado dos rendimentos proporcionados, o factor econó­mico-financeiro desempenha um papel crítico na expansão destas formas inovadoras de trabalho.

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Outro ponto importante na adopção de fonnas de trabalho mais autó­nomas liga-se com as condições de risco e protecção social dos sujeitos envolvidos. Num estudo elaborado por João Freire, em 1995, punha-se em evidência a deficiente cobertura dos sistemas de segurança social pública, uma vez que cerca de 15% do total não estariam cobertos por eles, embora a realidade tenha eventualmente evoluído nos últimos tempos.134

É visível o peso das dificuldades económicas dos agentes para enfren­tar os custos individuais da protecção social. Por isso, não será de estra­nhar a fuga e os comportamentos desviantes, eximindo-se ou limitando o pagamento das suas contribuições, aproveitando em seu favor contradi­ções organizacionais dos sistemas.

A fonnação profissional, ou seja, a valorização de cada sujeito, assume um papel estratégico no desenvolvimento destas novas fonnas inovadoras de trabalho.

O sucesso e consistência de fonnas de trabalho atípico mais inovado­ras e, em particular, daquelas que se colocam em patamares mais elevados de autonomia e responsabilidade, dependem fortemente da qualificação profissional dos seus agentes. Assim, a baixa escolaridade e qualificação profissional pesam fortemente sobre os desempenhos dos trabalhadores e os resultados das actividades em que se encontram envolvidos.

Outro aspecto, considerado na literatura especializada acerca das fonnas de trabalho independente, tendo especialmente em conta o arquétipo da pro­fissão liberal, é o do associativismo destes agentes económicos. Segundo estudos feitos neste domínio, a taxa de sindicalização do sector aproxima-se da taxa de geral de adesão a uma associação profissional, sendo de cerca de 30%. Todavia, quando comparamos as profissões altamente qualificadas como os advogados, com os canalizadores a diferença é abissal. Há menor associativismo nas profissões socialmente menos consideradas.

7.3. Flexibilidade

Registam-se actualmente fenómenos contraditórios, resultantes da desarticulação entre a oferta e a procura do emprego. Esta desarticulação

134 João Freire - Variações sobre o tema Trabalho. Porto; Afrontamento, 1990.

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tem tido diversas consequências na qualidade de vida dos cidadãos, devido ao envelhecimento da população e forçou a emergência crescente do carácter precário do emprego e exteriorização da mão-de-obra e a maior exigência de qualificações e competências.

Para Priscilla Donavan. e Jacquelyn Wonder, a explicação encontra-se na flexibilidade, isto é, na capacidade de ceder sem partir. É esta qualidade que permite reagir à mudança. A flexibilidade é básica em toda a espécie. As construções que se mantém em pé são flexíveis I3s•

Num estudo da OCDE136 define-se o processo de fabricação ideal como aquele "organizado para manter a flexibilidade máxima associando ele­mentos de todas as categorias descritas: flexibilidade mecânica ou opera­cional (equipamentos), flexibilidade do trabalho (organização do trabalho e qualificações), flexibilidade da gestão (sistemas de informação para a gestão), flexibilidade económica (inovação tecnológica e qualificação do trabalho)" .

A flexibilidade liga-se ao desenvolvimento e implementação tecnoló­gica, bem como à junção de tecnologias da informação ao desempenho dos empregados nesse processo.

Há que ter em conta o processo de modernização a partir da incorpora­ção de novas tecnologias, a sua gestão e a maneira pela qual essa incorpo­ração é planeada. Destaca-se o impacto dessas mudanças sobre a eficiência e a produtividade.

As empresas de capital privado ou público, cada vez mais pressiona­das, designadamente pela necessidade de se manter e sobreviver estrate­gicamente nos mercados interno e externo, procuram adoptar um estilo de gestão que agilize a produção através da tecnologia da informação. Buscam progressivamente uma interacção da electrónica com a informá­tica e as telecomunicações, que promova - da maneira mais consciente possível - o envolvimento dos empregados com o novo processo de tra­balho.

135 Priscilla Donavan; Jacquelyn Wonder - Lei Secrets de la Flexibilité. Montréal: Les Edi­tions de I'Homme, 1993.

136 Graham Vickery; Duncan Campbell- Ressources Humaine: Teebnologies de fabrication avandes. Paris: OCDE, 1991.

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Há vários tipos de flexibilização. A flexibilidade de trabalho, tal como é utilizada pela OCDE, permite a divisão em duas componentes: flexibili­dade numérica que ajusta o número de trabalhadores e/ou horas de trabalho às necessidades da produção, que corresponderá à flexibilidade externa; e a flexibilidade funcional que junta os diferentes empregos e fomenta a poli­valência, permitindo que cada um desempenhe um leque mais variado de funções diferentes, o que corresponde à flexibilidade interna.

o Manpower Studies137 considera que há três tipos de flexibilidade: • Funcional- abrange os empregados que, com formação adequada, se

adaptam facilmente a novas actividades; -• Numérica - procura adaptar o número de trabalhadores ao ciclo pro­

dutivo, isto é, às necessidades; • Financeira - oferece sistemas de compensação, ligando o trabalho

efectivamente prestado ao salário.

Há quem vá mais longe e encontre seis tipos diferentes de flexibilidade de acordo com a figura abaixo l38 •

137 Alastair Evans; Jenny Bell. ln Chris Curson - Flexible Patterns ofWork. London: IPM, 1986. 138 Giovanni Gasparini - La Flexibilité en Italie. Paris: Syros/ Altematives, 1989.

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A flexibilização funcional dos trabalhadores nucleares destina-se a potenciar a iniciativa e o desenvolvimento de novas competências, bem como o alargamento/enriquecimento do posto de trabalho. Fomenta ainda a criação de equipas de competências mútuas e especialização flexível baseada em trabalhos manuais, assim como a reorganização das fronteiras internas dos perfis.

A tentativa de redução dos custos tem levado à flexibilidade funcional com diminuição dos trabalhadores para o mesmo número de funções; ao alargamento do posto de trabalho com intensificação laboral, ao aumento do controlo sobre o trabalhador e abrange os trabalhadores que com a for­mação adequada podem rapidamente adaptar-se a novas actividades.

A flexibilidade financeira permite fomentar a expansão do sistema de compensação variável e sua ligação à realização individual e de grupo, por oposição à compensação uniforme. O trabalho a tempo parcial e a terceiri­zação dos serviços constituem mecanismos que visam o alargamento desta modalidade de flexibilidade. A sua utilização faz-se umas vezes por estra­tégia, outras por oportunismo. Os recurso ao trabalhador temporário tem em vista resolver os picos de produção sazonal ou diário e reflecte-se em: empenham'ento; trabalho de equipa; qualidade de trabalho139•

A flexibilidade organizacional (numérica) permite adaptar o número de trabalhadores ao ciclo produtivo (horários flexíveis, horários de traba­lho atípicos, subcontratação).

A flexibilidade fiscal prende-se com o recurso a esquemas ousados de relação com a administração fiscal, nomeadamente os conhecidos benefi­cios sociais.

Com a flexibilidade tecnológica predomina a polivalência e a adapta­bilidade às instalações técnicas e às técnicas de produção das empresas. Há variação do volume da força de trabalho e dos horários de trabalho.

A flexibilidade contratual visa o aumento da facilidade de recruta­mento e, em especial, de despedimento ao livre arbítrio do empresário.

139 Paulo Manuel Duarte Nobre Lança - O Paradigma da Flexibilidade Laboral. Lisboa: ISCTE, Dissertação de Mestrado, 1999.

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A flexibilidade emerge sobretudo como uma filosotia do ser, estar e agir, como uma forma de actuar e interagir no quotidiano, uma abertura face às novas ideias e às novas tecnologias, na apreciação da variedade de opiniões e dos comportamentos das pessoas 140. Constituindo um novo para­digma organizacional, a flexibilidade dos sistemas organizacionais (ao nível laboral, técnico, social e produtivo) destaca-se como uma das solu­ções que permite às empresas adquirirem vantagens competitivas no actual espaço mundial, lançando mão da adaptação e da reacção rápida e cons­tante, através da inovação, às exigências da envolvente.

7.4. Contratação Colectiva e Concertação Social

Não levanta dúvidas para ninguém que a generalidade das convenções colectivas assenta na noção de "trabalho dependente típico" e a expressão disso é, que nos últimos 25 anos, a auto-regulação se tem ocupado apenas das cláusulas pecuniárias, com a necessária actualização salarial. As for­mas atípicas de trabalho são formas marginais, susceptíveis quando não de extermínio pelo menos de oportunidade para compensação pecuniária. Veja-se o caso do trabalho extraordinário, nocturno e por turnos.

Num estudo elaborado em 1998 pelo lESE para o Observatório do Emprego e Formação Profissional é feito o um levantamento das novas formas de trabalho que surgem com mais frequência actualmente, sendo nesse estudo referidas como tais as seguintes: contrato a termo certo; sub­contratação de empresas ou de mão-de-obra; recibos verdes; contratos de formação; trabalhadores contratados à peça; cedência de mão-de-obra para outros países; utilização de população estrangeira em situação precária; desvinculação, ou seja, troca por vínculo mais fraco; recurso a empresas de trabalho temporário.

As formas de organização flexível do tecido empresarial, baseadas em redes de empresas e alianças empresariais, conduzem ao desenvolvimento de pequenas e micro empresas e ao aparecimento de trabalhadores inde­pendentes que se comunicam através de subcontratação, empreitadas ou prestação de serviços. Por outro lado, verifica-se a diminuição de garantias dos trabalhadores no que respeita aos vínculos contratuais, traduzida no

140 OCDE - La FlexibiUté du Marché du TravaU. Paris, 1990.

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aumento dos contratos a prazo, no trabalho temporário e mesmo na ausên­cia de vínculos. Infelizmente, embora haja mercado para estas novas for­mas de trabalho, o que se tem verificado é que nem sempre são voluntárias, sendo muitas vezes o produto de pressões sobre um mercado onde há muita mão-de-obra disponível.

Neste sentido, as novas formas de trabalho agravam a segmentação do mer­cado de trabalho, levando a um acréscimo de desigualdades salariais e de outros tipos de condições de trabalho. Assim, levantam-se questões, tais como:

• A relação entre este novo tecido empresarial flexível e as vantagens que advirão para os trabalhadores, empregadores e para a economia em geral;

• A equidade dentro da mesma empresa entre trabalhadores; • A relação entre o desenvolvimento organizacional e o desenvolvi­

mento profissional e pessoal de quem trabalha.

7.5. O Homem e o Futuro do Trabalho

7.5.1. Atitudes sociais

o trabalho permanece o elemento estruturador por excelência da vida. Assim, as atitudes face ao trabalho estão condicionadas pela evolução do desemprego. Por outro lado, a forma como o emprego for gerido e como for o acesso de novas pessoas ao mundo do trabalho, nomeadamente, jovens, camponeses, imigrantes e mulheres, assim, será o ritmo da evolu­ção das atitudes. Além disso, a partilha do trabalho poderá constituir um meio solidário de lutar contra o desemprego, dependendo a evolução das atitudes da forma como vai operar tal partilha. Esta terá de ser acompa­nhada de ganhos de produtividade decorrentes da introdução de novas tec­nologias. As novas tecnologias poderão emergir como ameaçadoras se não forem acompanhadas de mudanças na organização do trabalho. A reorga­nização do trabalho implica novas formas de olhar para as qualificações, a compensação e a participação dos trabalhadores nos processos de trabalho.

Em todo este quadro acabado de descrever, temos de admitir que se deverá pensar que as novas atitudes perante o trabalho possam evoluir de um modo tal que, futuramente, ponham em causa os tradicionais modos e ritmos de vida e a própria gestão urbana, como por exemplo, deixar de

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haver necessidade de entrada de grandes massas de indivíduos nos centros urbanos entre as oito e as dez horas da manhã.

Os resultados gerais do inquérito do ISSP sobre as atitudes sociais perante o trabalho, realizado, em Portugal, em 1997, sobre uma amostra representativa da população do Continente de idade igualou superior a 18 anos, pelos serviços do INE, destacam a segurança/estabilidade do emprego como a dimensão do trabalho mais importante, seguida das dimensões sociais (utilidade, ajuda a terceiros) e as auto-referenciadas (realização, interesse intrínseco e pessoal na actividade ,desenvolvida), só depois surgindo a dimensão remuneração do trabalho. Neste inquérito, as novas tecnologias aparecem como capazes de reduzir o emprego existente, mas também de tomá-lo mais interessante.

Quanto às opções, elas vão no sentido do trabalho por conta própria, face ao trabalho por conta de outrem. Em geral, neste inquérito, os portu­gueses atribuem um papel muito destacado ao trabalho no seu quotidiano, designadamente para o acesso ao rendimento, ao estatuto social, a um maior nível de satisfação e realização pessoal e ao desenvolvimento de um sentimento de utilidade face à sociedade onde vivem.

7.5.2. Centralidade do trabalho

O trabalho desempenha um papel central nas vidas das pessoas, que dele retiram diversos tipos de recompensas: materiais, na medida em que recebem uma remuneração pela actividade desenvolvida; sociais pelo contacto com outras pessoas que o trabalho proporciona; prestígio, pelo estatuto social asso­ciado às funções desempenhadas; valorização pessoal, enquanto fonte de auto­estima, identidade e meio de realização pessoal pelo trabalho prestado. 141

Uma das formas de conhecer esses significados é analisar a centrali­dade do trabalho, ou seja, o lugar que o trabalho ocupa na vida das pessoas. A centralidade do trabalho prende-se com as crenças que os indivíduos possuem relativamente ao grau de importância que o trabalho desempenha nas suas vidas. A centralidade do trabalho é vista como um resultado da socialização, uma vez que os indivíduos aprendem a valorizar o trabalho a partir da sua religião, da sua cultura, dos seus familiares e dos seus amigos.

141 João Freire. Sociologia do Trabalho. Porto: Afrontamento, 1998.

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No inquérito do ISSP de 1997 esta questão foi colocada aos portugue­ses pedindo que manifestassem o seu grau de concordância (1 - discordo totalmente a 5 - concordo totalmente) relativamente à seguinte afirmação: "gostaria de ter um emprego remunerado mesmo que não precisasse de dinheiro". Ficou claro que 64% dos inquiridos declararam que gostariam de ter um emprego remunerado mesmo que não precisassem de dinheiro. Podemos inferir que, para uma larga parte da população portuguesa, o tra­balho ocupa um lugar central nas suas vidas.

7.5.3. O futuro

o futuro passará por novas relações entre o homem e o trabalho, resul­tantes das modificações que terão lugar no papel que desempenham as actividades de produção, de distribuição e de comunicação, devido à acção de um nova dinâmica social, ao deslizamento dos dados económicos (cus­tos dos factores produtivos) e à automatização dos sistemas de informação. Isto ocorrerá no sentido de uma dupla mutação do trabalho: do trabalho à peça ao trabalho em sistema e do trabalho em cadeia ao trabalho em rede.

Neste sentido, parece impor-se a passagem de um modelo de trabalho rígido e fechado como elemento central da estruturação de toda a vida económica e social e factor principal de integração social, para um modelo aberto que não vai assegurar a todos de uma forma rígida e constante o emprego, persistindo uma massa importante de desempregados.

A Europa substituirá o Estado Providência pelo Estado Social, em que a protecção social do Estado será restringida e, em alternativa, o acento será colocado no valor individual de cada um. Multiplicar-se-ão formas, ainda hoje qualificadas como atípicas, que passarão a constituir a moda (valor com maior número de frequências numa série) das futuras formas de trabalho

Em resumo, assistir-se-á: à revalorização do trabalho não remunerado; a maior diversidade e flexibilidade dos estatutos do trabalho; à diminuição da sua duração e à modificação na relação entre o tempo de trabalho e o tempo de não trabalho.

No que toca ao futuro, para Jacques Lesourne, existem três trajectórias de cenários que se apresentam como mais prováveis na Europa, partindo

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do princípio de que a mudança das atitudes profundas se faz lentamente: desemprego em todas as categorias; liberalismo americano; liberalismo temperado.

A) DESEMPREGO EM TODAS AS CATEGORIAS:

Preferência dos indivíduos por uma remuneração directa; persistência de uma política macroeconómica de cariz restritivo; manutenção da dife­rença custo trabalho/remuneração líquida; ténue transformação da duração do tempo de trabalho. Neste cenário, o desemprego clássico subsiste nos períodos de alta conjuntura e, nos períodos de recessão, o desemprego Keynesiano sustenta um acréscimo suplementar do desemprego clássico

B) LIBERALISMO AMERICANO:

Flexibilidade do mercado de trabalho e fraco desvio do custo de traba­lho - remuneração líquida. Corresponde a um desemprego flutuante com a conjuntura mais frágil e ligado a uma forte desigualdade na distribuição dos rendimentos

C) LIBERALISMO TEMPERADO:

Resulta da junção do cenário anterior a instrumentos de redistribuição que não tenham efeitos perversos sobre o emprego: o custo do trabalho dos menos qualificados é reduzido, enquanto que o seu nível de vida é mantido ou melhorado.

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