dor pós-operatória- avaliação da qualidade da analgesia em cirurgia … · 2019. 6. 11. ·...
Post on 05-Mar-2021
6 Views
Preview:
TRANSCRIPT
DOR PÓS-‐OPERATÓRIA Avaliação da qualidade da analgesia em Cirurgia Ortopédica no Hospital da Prelada
Mestrado Integrado em Medicina – 2011/2012
Autora: Inês Manpô Sousa Machado Leite
Correio electrónico: leite.inesms@gmail.com
Orientador: Dr. José Manuel Soares Malheiro Romão
Co-‐ orientador: Dr. Edgar Ribeiro Lopes
2 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
ÍNDICE
GLOSSÁRIO DE ABREVIATURAS .................................................................................... 3
RESUMO .................................................................................................................................. 4
ABSTRACT .............................................................................................................................. 5
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................ 7
OBJETIVOS ........................................................................................................................... 10
MATERIAL E MÉTODOS .................................................................................................. 10
ANÁLISE ESTATÍSTICA ........................................................................................................... 11
RESULTADOS ...................................................................................................................... 13
INFERÊNCIA ESTATÍSTICA ..................................................................................................... 18
DISCUSSÃO ........................................................................................................................... 20
LIMITAÇÕES DO ESTUDO ........................................................................................................ 23
INVESTIGAÇÃO FUTURA ........................................................................................................ 24
CONCLUSÃO ........................................................................................................................ 25
AGRADECIMENTOS .......................................................................................................... 26
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 27
ANEXO I ................................................................................................................................. 30
ANEXO II ............................................................................................................................... 34
3 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
GLOSSÁRIO DE ABREVIATURAS
AG – Anestesia Geral
AO – Artroscopia do Ombro
BSA – Bloqueio subaracnoideu
Bloq. - Bloqueio
Correção Hallux-Valgus – Hallux
DP – Desvio padrão
EN – Escala numérica
PONV – Post-operative nausea and vomiting (Naúseas e Vómitos pós-operatório)
PRN – Pro re nata
PTA- Prótese total da anca
PTJ – Prótese total do joelho
PTO – Prótese total do ombro
SOS - Resgate
SIGLAS
DGS – Direção Geral de Saúde
HP – Hospital da Prelada
IASP – Associação Internacional dos Estudos da Dor
4 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
RESUMO
Introdução: O controlo da dor pós-operatória melhorou muito nas últimas décadas. No
entanto, vários estudos publicados demonstram que esse controlo nem sempre é adequado,
constituindo um importante fator de morbilidade e de aumento do tempo de internamento,
provocando grande desconforto ao doente e com impacto nos resultados obtidos.
Objetivos: O objetivo do presente estudo foi a avaliação da dor pós-operatória de doentes
submetidos a cirurgia ortopédica (cirurgia de Correção Hallux-Valgus, Prótese de Joelho,
Anca e Ombro, e Artroscopia de Ombro) em regime de internamento no Hospital da Prelada.
Métodos: A amostra do estudo é constituída por 229 doentes internados no Hospital da
Prelada, no período de 15 de Abril a 15 de Julho de 2011, com idade superior a 18 anos,
sujeitos às cirurgias mencionadas acima.
Foram retiradas informações demográficas através do processo dos doentes. De seguida
procedeu-se a uma avaliação e registo da intensidade da dor utilizando a Escala Numérica, a
Escala de Satisfação com a analgesia e a Qualidade Subjetiva do Sono (no recobro imediato,
alta do recobro e às 2, 6, 12, 24, 36 e 48 horas do pós-operatório)
Resultados: Os resultados obtidos indicaram que a incidência da dor não estava relacionada
com o tipo de procedimento (p-value > 0,05). Registaram-se relatos consideráveis de dor às
primeiras 12 horas pós-cirurgia para o procedimento Hallux e às 24 horas pós-cirúrgicas para
os procedimentos Prótese Total do Joelho e Anca. Constatou-se todavia que foram poucos os
doentes a necessitar de medicação SOS, sendo que o recurso à medicação em SOS foi mais
evidente entre as 2h e as 12h nos três procedimentos. No que diz respeito à qualidade de sono
dos doentes os registos foram maioritariamente positivos (boa e muito boa).
Conclusão: Conclui-se que no Hospital da Prelada o controlo da dor é feito corretamente,
minimizando o impacto que esta tem nos doentes. Os resultados deste estudo mostram que a
5 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
avaliação da intensidade da dor não se encontra diretamente relacionada com quaisquer das
outras variáveis presentes no estudo.
Palavras-chave: Dor; dor aguda pós-operatória; avaliação da dor; escala numérica; qualidade
subjetiva do sono.
Postoperative Pain:
Evaluating the quality of analgesia in orthopedic surgery at Hospital da Prelada
ABSTRACT
Introduction: Postoperative pain control has improved greatly in recent decades. However,
various studies show that this control is not always appropriate, presenting itself as an
important factor of morbidity and increased length of hospitalization, causing great
discomfort to the patient and impact on the end results.
Objectives: The aim of this study was to evaluate postoperative pain of patients undergoing
orthopedic surgery (Hallux-Valgus correction surgery, total knee, hip and shoulder
replacement and shoulder arthroscopy) as inpatient in Hospital da Prelada.
Methods: The study was performed at Hospital da Prelada, from April 15 to July 15 2011.
The population was 229 patients, with more than 18 years, subject to the operations
mentioned above.
Demographic information was taken from the hospital files. Then we proceeded to an
evaluation and record of pain intensity using the Numeric rating Scale, the Satisfaction Scale
and the Subjective Quality of Sleep (admittance at recovery room, discharging from recovery
room and at 2, 6, 12, 24, 36 and 48 hours after surgery).
6 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Results: The results show no clear correlation between pain and the procedure that the patient
underwent (p-value > 0.05). Patients stated that considerable pain was felt in the first 12 hours
after the Hallux procedure, and 24 hours after surgery there were pain reports for Total Knee
and Hip Prosthesis procedures. Furthermore, we noted that few patients required the PRN
medication. However, when needed, it was most frequent between 2 and 12 hours pos-
operative, in the three procedures mentioned above. Regarding the quality of sleep, data was
generally positive amongst patients (good and very good).
Conclusion: We can conclude that at Hospital da Prelada the treatment of pain has good
results, hence minimizing its impact on inpatients. Additionally, the results conducted in this
study show that the intensity of pain felt is not directly correlated with any of the other
variables analyzed in this study.
Keywords: pain; pain assessment; acute postoperative pain; numeric rating scale; subjective
quality of Sleep
*Artigo indexado à Revista do Clube de Anestesia Regional (CAR).
7 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
INTRODUÇÃO
A dor, mesmo sendo um fenómeno universal é singular, único e pessoal sendo que cada
indivíduo lhe atribui uma intensidade e significado próprio 1.
A IASP (International Association for the Study of Pain) define a dor como sendo “uma
experiência sensorial e emocional desagradável, associada a um dano tecidular real ou potencial,
ou descrita em termos da existência de um tal dano”, demonstrando que a dor apresenta um
componente subjetivo.
A Joint Comission on Acreeditation of Health Care Organizations e a National Pharmaceutical
Council Inc., em 2001, afirmou que todos os anos 25 milhões de pessoas sofrem de dor aguda
devido a cirurgia 2.
Em 2003, a Universidade de Chicago realizou um estudo a nível nacional sobre a experiência de
dor pós-operatória. Os resultados apresentados indicam que 80% dos doentes submetidos a
cirurgia tiveram dor pós-operatória, sendo que 86% deles experimentaram dor moderada, severa
ou extrema. Concluíram que os pacientes com dor pós-operatória continuam a ser sub-tratados 3.
No entanto, embora tenha vindo a existir uma melhoria no controlo da dor, existem vários
estudos publicados que demonstram alguma inadequação desse controlo. Este é assim, um
importante fator de morbilidade e de aumento do tempo de internamento, provocando grande
desconforto ao doente e impacto no resultado final do tratamento 4.
O alívio da dor após procedimentos cirúrgicos continua a ser um grande desafio. Ao alívio da dor
tem sido dada elevada importância pelos profissionais e pelas autoridades de saúde, sendo a
analgesia peri-operatória um dos principais focos de melhoria 5,6,7,8.
Atualmente, a utilização de técnicas anestésicas loco-regionais tem vindo a ganhar relevância
devido aos excelentes resultados conseguidos.
8 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Em vários países, foi recomendada a implementação de unidades funcionais para a melhoria do
controlo da dor pós-operatória. As unidades funcionais devem ser uma estrutura multidisciplinar,
que envolve anestesistas, cirurgiões, enfermeiros, fisioterapeutas e, eventualmente, outros
especialistas. Neste contexto organizacional, o anestesista deve desempenhar um papel
fundamental como coordenador da equipa responsável pelo tratamento da dor aguda, devido ao
seu conhecimento específico de tratamento da dor aguda e fisiopatologia. A implantação deste
tipo de organização pode melhorar o controlo da dor em departamentos cirúrgicos e parece ser
capaz de reduzir a frequência de eventos adversos, como náuseas e vómitos. Não existindo um
modelo/fórmula ideal de organização destes serviços especializados, deverá ser realizada uma
adaptação às necessidades e oportunidades locais. No que diz respeito a uma análise custo-
benefício, existem alguns dados positivos relativamente a estes serviços, quando usados em
combinação com protocolos de recuperação avançada. Contudo, as estratégias de integração dos
serviços especializados e técnicas de reabilitação multimodais e programas específicos devem
ser mais investigados numa escala maior 9,10,11,12.
A avaliação da dor tem como principais objetivos a identificação da existência de queixa e a
caracterização da experiência dolorosa, devendo para tal ser utilizado um instrumento específico.
No entanto, ainda se encontram algumas falhas dos profissionais na identificação da presença de
dor, ou mesmo negligência no seu tratamento, levando ao alívio inadequado. Assim, é
importante que as avaliações sejam feitas e registadas de modo sistemático, utilizando-se escalas
específicas para a caracterização e medição da dor 13.
Em junho de 2008 a Direção Geral de Saúde (DGS) emitiu uma Circular Normativa onde
equipara a dor a 5º sinal vital. Desde então, passou a ser considerada como boa prática e
obrigação clínica o registo e avaliação regular da intensidade da dor, em todos os serviços
prestadores de cuidados de saúde, tal como já acontece com os outros quatro sinais vitais
(temperatura corporal, pressão arterial, frequência respiratória e frequência cardíaca). Esta visão
9 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
da dor como o 5º sinal vital, a sua subjetividade, o direito e dever do controlo da dor e o
tratamento diferenciado da dor foram os princípios orientadores do Programa Nacional de
Controlo da Dor 14.
Os instrumentos utilizados, devem ser de compreensão simples para o doente e capazes de lidar
com as variações da dor 15.
Alguns desses instrumentos avaliam apenas a intensidade da dor. Contudo, há outros que
avaliam a dor de uma forma multidimensional, incluindo fatores sensoriais, afetivos e
emocionais 16.
10 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
OBJETIVOS
No estudo realizado o objetivo foi a caracterização demográfica dos doentes, avaliação da dor
pós-operatória de doentes submetidos a cirurgia ortopédica (Correção Hallux-Valgus (Hallux),
Prótese de Joelho (PTJ), Anca (PTA) e Ombro (PTO), e Artroscopia do Ombro (AO) e o grau de
satisfação dos doentes relativamente à analgesia.
MATERIAL E MÉTODOS
O presente estudo consistiu na observação de uma amostra de indivíduos adultos em período
pós-operatório.
A amostra foi composta por 229 doentes, com idade superior a 18 anos submetidos a cirurgias
ortopédicas mencionadas anteriormente, em regime de internamento no Hospital da Prelada (HP)
durante o período de 15 de Abril de 2011 a 15 Julho de 2011.
A avaliação e registo da intensidade da dor, foi efectuada pelo enfermeiro/a, no período pós-
operatório (no recobro imediato, alta do recobro e às 2, 6, 12, 24, 36 e 48 horas do pós-
operatório) em ambiente de enfermaria. Esta avaliação foi feita com o doente em repouso e em
movimento.
A dor foi caracterizada usando a escala numérica. As escalas numéricas consistem numa série de
números que variam de zero a 10, com as extremidades representando ausência e a pior dor
possível. Assim, o doente escolheu o número que melhor quantificava a intensidade da sua dor
14,17,18,19.
A escala utilizada para medir o grau de satisfação com a analgesia, foi a seguinte: 0 – sem
opinião; 1 – nada satisfeito; 2 – pouco satisfeito; 3 – satisfeito; 4 – muito satisfeito.
Em relação à avaliação subjetiva do sono na primeira noite, foi quantificada com os seguintes
11 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
valores: 0 – sem opinião; 1 – muito má; 2 – má; 3 – boa; 4 – muito boa. Tanto a escala do grau
de satisfação com a analgesia, como a escala de avaliação subjetiva do sono, foram criadas
específicamente para o presente estudo.
O protocolo referente ao estudo em consideração foi devidamente aprovado pelos Conselhos
Científico e Pedagógico do Mestrado Integrado em Medicina do Instituto de Ciências
Biomédicas Abel Salazar/Centro Hospitalar do Porto − Hospital Santo António, instituições
integradas na Universidade do Porto, Porto, Portugal.
Análise estatística
Efetuou-se uma análise estatística descritiva, utilizando distribuições de frequência, médias e
desvios-padrão para caracterizar a população participante.
A intensidade de dor foi agrupada da seguinte forma: 0 (sem dor), 1-3 (dor ligeira); 4-7 (dor
moderada); >7 (dor forte).
Foram utilizados métodos não paramétricos: coeficiente de correlação ρ de Spearman (rS) e teste
do χ2 de Pearson.
As variáveis referentes à dor foram recodificadas em duas categorias: 0 - “sem dor” e 1 - “com
dor”.
O coeficiente de correlação de Spearman, avalia a intensidade da relação entre duas variáveis,
sendo o resultado interpretado da seguinte forma 20:
• Varia entre -1 e 1.
• Perto de 0 (zero) significa que as variáveis não estão correlacionadas.
• Para valores perto de 1 ou de -1, existe uma forte correlação entre as duas variáveis.
• Valores negativos significam que, à medida que uma variável aumenta, a outra diminui.
12 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Relativamente ao χ2 de Pearson, quando as condições de aproximação da distribuição do teste à
distribuição χ2 não se verificaram, usaram-se os resultados do teste exato, que são consonantes
com a simulação de Monte Carlo. Foi utilizado o teste χ2 de Pearson com a correção da
continuidade, visto tratarem-se de tabelas de contingência 2x2. Nas situações em que tabelas do
tipo 2x2 não puderam ser aplicadas, usou-se o teste alternativo de Fisher.
Considerou-se um nível de significância (probabilidade de erro de tipo 1) de 0,05 em todas as
análises inferenciais.
Os dados obtidos foram codificados e armazenados numa base de dados do programa de análise
estatística IBM SPSS Statistics 20 (IBM Corporation).
13 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
RESULTADOS
Os dados relativos às características demográficas da população em estudo segundo os
procedimentos cirúrgicos Correção de Hallux-Valgus, Prótese total do joelho (PTJ) e Prótese
total da anca (PTA), encontram-se na Tabela I.
Tabela I - Caracterização demográfica da população em estudo
Procedimento
Hallux PTJ PTA
Género
Masculino 4 (7,0%) 18 (18,4%) 35 (47,3%)
Feminino 53 (93,0%) 80 (81,6%) 39 (52,7%)
Idade (anos)
Média (±DP) 55,2 (13,20) 68,5 (7,83) 68,6 (9,38)
Mínimo 21 48 46
Máximo 79 86 92
Total 57 98 74
14 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Na Tabela II, estão apresentados os dados relativos à existência ou não de co-morbilidades, a
técnica anestésica utilizada, a aplicação ou não de protocolo anestésico/analgésico e se foi feita
alguma profilaxia de Post-operative nausea and vomiting (PONV), nos procedimentos cirúrgicos
em estudo.
Tabela II - Existência de co-morbilidades, técnica anestésica utilizada, aplicação ou não de
protocolo anestésico/analgésico e se foi feita alguma profilaxia de PONV
15 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Relativamente à avaliação da dor em repouso e em movimento, são apresentados nas Tabela III e
IV, respetivamente, os registos obtidos, nos momentos considerados neste estudo. Os casos
desconhecidos, não foram incluídos nas tabelas.
Tabela III – Registo da intensidade da dor dos doentes em repouso
16 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Tabela IV – Registo da intensidade da dor dos doentes em movimento
17 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
A Tabela V apresenta o número de doentes que fizeram medicação de resgate para cada
procedimento cirúrgico.
Tabela V – Número de doentes com necessidade de medicação SOS
Foi ainda avaliado o grau de qualidade de sono na 1ª noite pós-cirurgia (Tabela VI).
Tabela VI – Qualidade subjetiva de sono
18 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Inferência Estatística
Na Tabela VII, está apresentada a dependência da incidência da dor com o tipo de procedimento
cirúrgico (Hallux, PTJ, PTA) efetuado. Para esta análise selecionaram-se os momentos, alta do
recobro, as 12 e 24 horas seguintes à cirurgia com o doentes em repouso e em movimento. Os
resultados da aplicação do teste, encontram-se na Tabela VII.
Tabela VII – Relação da incidência da dor com o tipo de procedimento cirúrgico
Variável p-value
EN (repouso) Alta Recobro 1,000
EN (repouso) 12h 0,541
EN (repouso) 24h 0,434
EN (movimento) Alta Recobro 0,604
EN (movimento) 12h 0,084
EN (movimento) 24h 0,086
Foram analisadas as relações entre a intensidade de dor mais elevada e outras variáveis,
nomeadamente o género e a existência de co-morbilidades.
Relativamente ao género, verificou-se que apenas nos indivíduos sujeitos a PTA, houve
correlação entre a maior intensidade de dor e o género, às 36h pós-cirurgia, tendo sido o género
feminino o que apresentou a intensidade de dor mais alta (p-value = 0,001 < 5%).
19 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Se tivermos em consideração a existência de co-morbilidades, estas também não influenciaram
significativamente a intensidade de dor mais elevada relatada. Apenas se verificou alguma
relação no procedimento Hallux e PTJ, nas 2 (p-value = 0,047 < 5%) e 12h (p-value = 0,040 <
5%) seguintes à cirurgia, respetivamente.
Finalmente, para os três procedimentos determinamos os coeficientes de correlação de Spearman
para medir a associação entre a intensidade de dor mais alta com o índice de satisfação às 48h
pós-cirurgia e a idade. O teste foi apenas aplicado para os valores no qual fizesse sentido o seu
cálculo.
Os valores obtidos relativos à associação da intensidade de dor mais alta com o índice de
satisfação às 48h pós-cirurgia e a idade foram muito baixos. Indica-nos uma associação quase
nula entre as variáveis. A maior associação verificada foi entre a Satisfação e a intensidade de
dor mais alta às 48h pós-cirurgia para o procedimento PTJ (rS = -0,383). O sinal menos indica
que quanto maior é a dor, menor é a satisfação.
20 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
DISCUSSÃO
Ao longo do estudo, temos vindo a referir que a dor a que estão sujeitos os doentes submetidos a
grandes cirurgias está, ainda, longe de ser controlada. No entanto, esta não foi, a conclusão a que
chegámos através do nosso estudo. Verificamos que a maioria dos doentes não apresentava dor
ou tinha dor ligeira. O número de doentes que referiram dor moderada ou forte foi bastante
baixo.
De acordo com alguns estudos, os enfermeiros responsáveis por registar o nível de dor dos
doentes poderão ter tendência para modificar o nível de dor referido pelo doente, sugestionados
pelo comportamento do mesmo 21.
Adicionalmente, é realçado que os enfermeiros só registam os níveis de dor, porque a isso são
obrigados, não os refletindo necessariamente na prática clínica 22.
Foi possível observar durante a execução do presente estudo certos comportamentos por parte
dos enfermeiros que podem ter influenciado na fiabilidade dos resultados. Entre eles destaca-se o
pouco tempo despendido na explicação do modo de funcionamento da escala de caracterização
da dor em uso (escala numérica), o que poderá diminuir a sua validade.
Uma questão importante que se coloca, é se existe realmente falta de conhecimento por parte dos
profissionais de saúde no que diz respeito ao controlo da dor ou, se este conhecimento existe é
mal ou simplesmente não é integrado na prática clínica 22. Esta falta ou má aplicação de
conhecimento pode dever-se muitas vezes ao facto dos enfermeiros adaptarem o seu
comportamento profissional à “cultura” da equipa em que estão inseridos 23,24. Este fato vem
realçar a importância da formação na área da dor não se focar apenas em aspetos cognitivos mas
também organizacionais 24.
21 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
No estudo, verificámos que na maioria dos doentes não foi feita profilaxia de PONV, o que pode
influenciar o resultado final da avaliação. Estudos observacionais têm confirmado que a dor mal
controlada associada a PONV pode atrasar a alta pós-cirurgia 25,26,27.
Analisando os resultados obtidos em relação à intensidade da dor do doente em repouso e em
movimento, verifica-se que estes não apresentam grandes discrepâncias, podendo concluir-se
que o controlo de dor realizado foi eficaz.
Apesar de na maioria dos momentos de avaliação a intensidade de dor relatada ter sido
predominantemente, sem dor ou dor ligeira, verificou-se que alguns doentes reportaram uma
intensidade moderada/forte de dor no período inicial pós-cirurgia. No estudo, mesmo
considerando que o controlo da dor foi adequado, no procedimento Hallux às primeiras 12 horas
do período pós-cirúrgico existiu uma percentagem considerável de doentes que relataram dor e
às 24 horas pós-cirúrgicas existiram relatos para os procedimentos PTJ e PTA. Para alguns
doentes, este período foi mais alargado, prolongando-se até 48 horas após a intervenção. Tal não
aconteceu nos doentes de Hallux, por ser uma patologia de ambulatório, com tempos de
internamento inferior a 24 horas.
Na literatura existente, e à semelhança dos resultados aqui obtidos, é indicado que os doentes
submetidos a cirurgias ortopédicas experienciam dor pós-operatória moderada a intensa
considerando as primeiras horas pós-cirúrgicas as mais severas diminuindo de intensidade ao
longo do internamento. Cirurgias ortopédicas, especialmente nos membros inferiores, estão
associadas com dor pós-operatória de intensidade moderada a intensa, elevando a morbilidade
dos pacientes 28,29.
Em relação à necessidade de medicação de resgate, verificamos pelos resultados presentes na
Tabela V que poucos foram os doentes a necessitar dela, sendo que o recurso à medicação em
SOS foi mais necessário entre as 2h e as 12h pós-cirurgia nos três procedimentos. Analisamos
22 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
também, pelos resultados relativos à intensidade da dor (repouso/movimento), que a intensidade
da dor não tem correlação com a administração medicação SOS. O recurso a medicação SOS,
por vezes, não corresponde necessariamente a um relato de dor mais elevado e vice-versa,
realçando uma vez mais o caráter subjetivo da dor e dificuldade existente na avaliação da
mesma.
No que diz respeito à qualidade de sono dos doentes os registos foram maioritariamente
positivos (boa e muito boa) nos três procedimentos.
Os estudos existentes afirmam que o tipo de cirurgia pode ser considerado como uma forma
independente de prever a dor pós-operatória. Da inferência estatística realizada, pudemos
constatar que a incidência da dor não estava relacionada com o tipo de procedimento, p-value >
0,05.
Ao longo do nosso trabalho, verificámos que a grande maioria dos doentes se mostrou satisfeita
com o grau de analgesia. No entanto, não deixa de ser paradoxal que os doentes se sintam
satisfeitos quando, ao mesmo tempo, continuam a relatar dor. No presente estudo, à semelhança
de outros estudos este fator pode demonstrar que não existe uma correspondência direta entre a
satisfação e a intensidade da dor. Pensa-se que esta contradição pode estar relacionada com as
características do doente, a sua relação com elementos da equipa médica responsável pelo seu
acompanhamento, a sua aceitação da inevitabilidade da dor ou mesmo a frequência com que
expressavam a sua dor 30,31. No entanto, hoje em dia, a satisfação em relação ao grau de
analgesia é utilizada como uma medida de qualidade institucional e não exclusivamente como
um indicador de qualidade do controlo da dor 32.
O grau de satisfação do doente deve ser interpretado de forma cuidadosa, e se for utilizado como
parâmetro de avaliação, deverá ser associado a outros indicadores de qualidade de controlo da
dor 22: recurso reduzido a medicação de resgate, mobilização e recuperação funcional precoce,
baixa incidência de efeitos colaterais relacionados com a terapia analgésica ou escassez dela,
23 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
contributo para regime de alta precoce e autosuficiência nos cuidados de higiene, e por fim
minimização de reinternamento por queixas de dor ou da incidência da cronificação da dor.
Embora tenham sido recolhidos dados relativamente as cirurgias do ombro realizadas, não foi
possível efetuar qualquer análise estatística, e obter conclusões, por escassez de amostra (n=17).
Limitações do estudo
Este estudo apresenta algumas limitações:
1. Aquela que se pode considerar como a mais importante será o tamanho da amostra;
Este tamanho da amostra impossibilitou efetuar correlações de algumas variáveis e
obter resultados com significado estatístico.
2. A equipa de avaliação/registo ser demasiado grande.
3. Falhas no registo de informação de vários itens do questionário que motivou a
consulta exaustiva de processos clínicos.
4. Registos coincidiam com períodos de repouso: doentes a dormir não seriam
incomodados
A utilização da escala numérica por si só já acarreta limitações tais como:
a necessidade de recorrer a pensamento abstrato, que pode ser complicado em doentes mais
idosos; a frustração que a utilização de números para quantificar a dor provoca nalguns doentes.
24 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
Investigação Futura
Numa análise futura é essencial que se aumente a amostra a analisar, para assim se poderem
validar os resultados obtidos e mesmo conseguir realizar novas correlações que não puderam
aqui ser observadas. Outra ação importante será a utilização de novos métodos de recolha de
dados para tentar obter uma taxa de respostas mais elevada e coerente. Será também interessante
a aplicação de outras escalas e formas de classificação da dor para observar a sua influência na
medida da intensidade da dor. Generalização a todos os procedimento cirúrgicos destes métodos
de avaliação e registo da dor pós-operatória.
Reflexão sobre os dados obtidos neste estudo, para a elaboração de estudos comparativos,
prospectivos, de preferência com ensaios clínicos randomizados para a avaliação e introdução de
novos modelos de eficaz terapia analgésica.
25 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
CONCLUSÃO
Através de uma análise atenta dos resultados obtidos neste estudo podemos constatar que, num
âmbito global, a intensidade da dor não se encontra diretamente relacionada com quaisquer das
outras variáveis presentes no estudo (procedimento, idade, co-morbilidades, e outros), exceto no
procedimento PTA. Ás 36 horas pós-cirurgia verificou-se correlação entre a intensidade de dor
mais alta e o género feminino (p-value = 0,001). A subjetividade da dor muitas das vezes
impossibilita os profissionais de saúde de efetuarem corretamente o seu trabalho objetivo de
avaliação e registo da intensidade da dor.
Não obstante, é de salientar que a avaliação do controlo da dor no HP nestas patologias
demonstrou resultados muito satisfatórios, comprovando que este estabelecimento têm
preocupação no tratamento da dor. Esse controlo deverá ainda tornar-se mais eficaz através da
introdução de melhorias organizacionais no serviço, nomeadamente a implementação de novos
protocolos anestésicos/analgésicos, monitorização periódica de resultados e reforçando a
inclusão das equipas de enfermagem neste tratamento.
Podemos concluir que um bom controlo da dor é bastante importante para o bem-estar dos
doentes e que independentemente da sua correta avaliação e registo, qualquer doente tem o
direito ao tratamento da mesma. A dor inadequadamente controlada pode conduzir a maus
resultados físicos e psicológicos tanto para doentes como para as suas famílias. Por vezes,
doentes que tendo vivido uma experiência de inadequado controlo da dor, podem ficar relutantes
a procurar cuidados médicos para outros problemas de saúde 33.
26 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
AGRADECIMENTOS
Ao Dr. José Manuel Soares Malheiro Romão (Centro Hospitalar do Porto – Hospital de Santo
António, Porto, Portugal), meu orientador de tese de mestrado, pela disponibilidade prestada,
pelo voto de confiança e pelo optimismo e entusiasmo constantes ao longo deste percurso.
Ao Dr. Edgar, meu co-orientador, pela cooperação, apoio constante, disponibilidade e sugestões
dadas desde o início deste projeto, por quem tenho grande apreço.
Ao Dr. Varejão Pinto, Diretor clínico do Hospital da Prelada, que tornou possível a execução
prática deste projeto.
A todo o corpo clínico e de enfermagem do Serviço de Anestesiologia e de Ortopedia do
Hospital da Prelada (Porto – Portugal) que muito contribuíram para a realização deste trabalho e
por toda a ajuda prestada.
Ao Dr. Germano A. Cardoso, co-autor do projeto de avaliação de dor desenhado no Hospital da
Prelada, estou muito grata pelo contributo prestado à elaboração deste trabalho.
Á Carla Santos, secretária do Serviço de Anestesiologia, pela inestimável ajuda na recolha e
organização de dados informatizados incluindo nos processos clínicos.
À Drª Luísa Maia, pela constante disponibilidade e apoio ao nível da análise estatística do
presente estudo.
Aos doentes, que se disponibilizaram a responder aos questionários, e sem os quais esta tese não
teria sido possível e não faria sentido.
27 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] Fleming M. Dor sem nome: pensar o sofrimento. 2003.
[2] The Joint Commission on Accreditation of Healthcare Organizations, The National
Pharmaceutical Council. "Pain: Current Understanding of Assessment, Management, and
Treatments. 2001.
[3] Apfelbaum, JL et al. Postoperative pain experience: results from a national survey suggest
postoperative pain continues to be undermanaged. Anesthesia analgesia. 2003;97: 534-540.
[4] Caseiro JM. A organização da analgesia do pós-operatório. Biblioteca da Dor. 2004.
[5] Ballantyne JC, Carr DB, deFerranti S, et al. The comparative effects of postoperative
analgesic therapies on pulmonary outcome: cumulative meta-analyses of randomized,
controlled trials. Anesth Analg 1998;86:598–612.
[6] Rodgers A, Walker N, Schug S, et al. Reduction of postoperative mortality and morbidity
with epidural or spinal anaesthesia: results from overview of randomised trials. BMJ
2000;321:1–12.
[7] Kehlet H, Holte K. Effect of postoperative analgesia on surgical outcome. Br J Anaesth
2001;87:62–72.
[8] Beattie WS, Badner NH, Choi P. Epidural analgesia reduces postoperative myocardial
infarction: a meta-analysis. Anesth Analg 2001;93:853–8.
[9] Kehlet H, Wilmore DW. Multimodal strategies to improve surgical outcome. Am J Surg
2002;183:630-4.
[10] White P F, Kehlet H, Neal MJ, Schricker T, Carr DB. The role of the anesthesiologist in
fast-track surgery:from multimodal analgesia to perioperative medical care. Anesth Analg
2007;104, 6:1380-96.
[11] Jaeschke R, Jankowski M, Brozek J, Antonelli M. How to develop guidelines for clinical
practice. Minerva Anestesiol 2009;75:504-8.
28 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
[12] Rawal N. Organization, function, and implementation of acute pain service. Anesthesiol
Clin North America 2005;23:211-25.
[13] Pimenta CAM et al. Controle da dor no pós-operatório. Rev. Esc. Enferm. USP. 2001;
35(2):180-183.
[14] Direção-Geral da Saúde. Programa Nacional de Controlo da Dor. 2008.
[15] Kazanowski MK, Laccetti MS. Dor Fundamentos Abordagem Clinica Tratamento. 2005.
[16] Sousa FAEF, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. Escala multidimensional de avaliação de
dor (EMADOR). Rev. latinoam. enferm. 2010;18(1):03-10.
[17] Practice guidelines for acute pain management in the perioperative setting: an updated
report by the American Society of Anesthesiologists Task Force on Acute Pain Management
Anesthesiology. 2012;116(2):248-73.
[18] Gagliese L, Weizblit N, Ellis W, Chan VW. The measurement of postoperative pain: a
comparison of intensity scales in younger and older surgical patients. Pain.
2005;117(3):412-20.
[19] DeLoach LJ, Higgins MS, Caplan AB, Stiff JL. The visual analog scale in the immediate
postoperative period: intrasubject variability and correlation with a numeric scale.
Anesthesia and analgesia. 1998;86(1):102-6.
[20] Pestana MA, Gageiro J N. Análise de dados para ciências sociais -A complementaridade
do SPSS. 2008;5
[21] Rømsing J, Sonnergaard J, Hertel S, Rasmussen M. Postoperative Pain in Children:
Comparison Between Ratings of Children and Nurses. Journal of Pain and Symptom
Management 1996;11(1):42-46.
[22] Anderson KO, Mendoza TR, Valeroo N, et al. Minority cancer patients and their providers:
Pain management attitudes and practice. Cancer 2000;88:1929-1938.
[23] Twycross, A. Children’s nurses’ post-operative pain management practices: An
observational study. International Journal of Nursing Studies 2006;44:869-881.
29 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
[24] Byrne A, Morton J, Salmon P. Defending against patients' pain. A qualitative analysis of
nurses' responses to children's postoperative pain. Journal of Psychosomatic Research
2001;50:69-76.
[25] Pavlin DJ, Chen C, Penazola DA, et al. Pain as a factor complicating recovery and
discharge after ambulatory surgery. Anesth Analg 2002;97(2):627–34.
[26] Strassels SA, Chen C, Carr DB. Postoperative analgesia: economics, resource use, and
patient satisfaction in an urban teaching hospital. Anesth Analg 2002;94:130–37.
[27] Mattila K, Toivonen J, Janhunen L, et al. Postdischarge symptoms after ambulatory
surgery: first-week incidence, intensity, and risk factors. Anesth Analg 2005;101:1643–50.
[28] Imbelloni LE. Bloqueio 3 em 1 para analgesia pós- operatória. Rev Bras Anestesiol,
1999;49:412.
[29] Tarkkila P, Tuominen M, Huhtala J et al. Comparison of intrathecal morphine and
continuous femoral 3-in-1 block for pain after major knee surgery under spinal anaesthesia.
Eur J Anaesth, 1998;15:6-9.
[30] Santos EM, Pimenta CAM. Contradições entre o relato de dor pós-operatório e a satisfação
do doente com analgesia. Revista Brasileira de Cancerologia. 2000:46(1):93-104.
[31] Dawson R, Spross JA, Jablonski ES, et al. Probing the paradox of patients’ satisfaction
with inadequate pain management. Journal of pain and symptom management. J Pain
Symptom Manage. 2002;23(3):211-20.
[32] Gordon DB, Dahl J, Miaskowski C, et al. American pain society recommendations for
improving the quality of acute and cancer pain management. Arch Intern Med. 2005;
165:1574-1580.
[33] Bair MJ, Kroenke K, Sutherland JM, et al. Effects of depression and pain severity on
satisfaction in medical outpatients: analysis of the Medical Outcomes Study. J Rehabil Res
Dev 2007;44(2):143-52.
30 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
ANEXO I
31 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
32 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
33 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
34 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
ANEXO II
35 Mestrado Integrado em Medicina
2011/2012
top related