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RESUMO
DO LIVRO
DOCUMENTOS DE IDENTIDADE
EBOOK
Uma Introdução às Teorias do Currículo
Tomaz Tadeu da SilvaBelo Horizonte : Autêntica. 1999
APRESENTAÇÃOO livro de Tomaz Tadeu da Silva apresenta umasíntese relevante das discussões sobre as teoriasdo currículo decorridas no século XX.O autor utiliza-se da classificação das teorias emtradicionais, críticas e pós-críticas, centrando-se,na maior parte da obra, na análise das teoriaspós-críticas.O estudo registra as preocupações das teoriascríticas e pós-críticas com as conexões entre saber,identidade e poder. Esta é uma obra que traz adiscussão de qual conhecimento da sociedade (erelações de poder) o currículo desenvolve pormeio da educação, no contexto dapós-modernidade.
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DOCUMENTOS DE IDENTIDADE: Uma Introdução às Teorias do Currículo
Publicado no final da década de 1990, o livro de Tomaz Tadeu da
Silva apresenta uma síntese relevante das discussões sobre as
teorias do currículo decorridas no século XX. Tomaz Tadeu da
Silva é reconhecido na América Latina como um dos maiores
estudiosos do currículo no Brasil com vasta contribuição para a
práxis educativa. Documentos de Identidade é um importante
trabalho para aqueles profissionais da educação que organizam
os currículos escolares, mormente, nessa década de reformas na
educação do Brasil, quando parâmetros curriculares foram
apresentados às escolas brasileiras.
A título de observação como reflexão para a leitura da presente
obra, os PCNs partem de um conjunto básico de valores
universais considerados indispensáveis à manutenção de
sociedades democráticas, como o cultivo à tolerância e o
respeito a diferenças. Em suma, os PCNs tendem a direcionar as
necessidades da escola à tarefa de transmitir valores que
balizam os comportamentos de indivíduos e grupos na medida
em que possibilitam a construção de identidades no contexto
da nova ordem mundial. Como o “currículo é sempre o resultado
de uma seleção” (p.15) e essa seleção é o resultado de um
processo que reflete os interesses particulares das classes e
grupos dominantes, faz-se necessária uma reflexão radical (no
sentido de ir até a raiz do problema), na implementação dos
parâmetros curriculares. Documentos de identidade: uma
introdução às teorias do currículo traz uma contribuição para
essa reflexão.
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Outro aspecto a ser ressaltado, que não deixa de ter relação com
o que foi tratado acima, é o fato de o livro trazer à luz o debate,
de final de século, sobre o caráter da modernidade desenvolvido
pelo capitalismo. Esta é, talvez, com o risco de ser por demais
concisa, a maior contribuição deste livro: a discussão de qual
conhecimento da sociedade (e relações de poder) o currículo
desenvolve por meio da educação, no contexto da
pós-modernidade. A explicação dessa sentença será dada no
decorrer do texto.
O autor traça uma genealogia do currículo enfocando,
principalmente, os estudos realizados nos EUA e na Inglaterra. A
perspectiva adotada tem a noção de discurso como premissa
para pensar as teorias do currículo. Isso significa uma posição
crítica em frente à idéia de teoria que, ao pretender “descobrir” o
real, na verdade, somente representa uma imagem; um reflexo
de uma realidade que, cronologicamente e ontologicamente, a
precede. Nessa perspectiva, ao descrever um determinado
objeto, a teoria está inventando-o. O pós-estruturalismo é a fonte
que origina essa linha de pensamento, que enfoca o discurso
produzindo seu próprio objeto: “[...] a existência do objeto é
inseparável da trama lingüística que supostamente o descreve”
(p.12). Portanto, um discurso sobre o currículo é a produção de
uma visão particular de currículo.
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Nesse sentido, para ser coerente com a própria perspectiva
adotada no livro, o autor apresenta sua visão sobre as diferentes
teorias do currículo, enfocando, na maior parte do trabalho, as
teorias críticas para chegar à apresentação das teorias
pós-críticas. Por meio de um diagrama, Silva utiliza-se da
classificação das teorias em tradicionais, críticas e pós-críticas,
relacionando também os respectivos conceitos que
caracterizam cada uma. O autor defende que o exame dos
diversos conceitos, empregados pelas teorias, organiza e
estrutura a forma de olhar a “realidade”, demonstrando aí uma
tendência à sistematização.
Como é mostrado pelo autor, é a questão do poder o centro da
reflexão das teorias críticas e pós-críticas do currículo. Dessa
forma, os questionamentos feitos ao currículo não se limitam a
perguntar “o quê?”, mas “por quê?” Pois, para Tomaz Tadeu, a
discussão sobre currículo vai além de uma seleção de
conhecimento, envolve sim, uma operação de poder. Assim, o
currículo é um documento de identidade. “As teorias críticas e
pós-críticas de currículo estão preocupadas com as conexões
entre saber, identidade e poder” (p.16).
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Priorizando uma análise genealógica, para identificar como o
currículo vem sendo definido em diferentes momentos, Silva
analisa os trabalhos dos norte-americanos, nos anos 1920, que
iniciaram os estudos sobre currículo, muito provavelmente
influenciados pela institucionalização da educação de massas.
Em 1918, Bobbitt escreve The curriculum, marco no
estabelecimento do currículo como campo especializado de
estudos. Sua proposta tem a escola funcionando eficientemente
como uma empresa econômica, nos princípios propostos por
Federick Taylor. Contemporâneo de Bobbitt e com diferente
perspectiva teórica, John Dewey, em livro escrito em 1902, está
mais preocupado com a construção da democracia que com o
funcionamento da economia. Mas foi com Ralph Tyler, em livro
publicado em 1949, quando o modelo industrial na educação de
Bobbitt é consolidado, dominando o campo do currículo nos
EUA, influenciando outros países, inclusive até hoje no Brasil. O
currículo, nessa perspectiva, é essencialmente uma questão
técnica, cujo paradigma está centrado na sua organização e
desenvolvimento.
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Com a preocupação, não é demais repetir, de traçar as
ramificações da construção teórica crítica do currículo, Silva
revisa referências importantes do pensamento educacional,
como Althusser, Bowles e Gintis, Bourdieu e Passeron que
deixaram seu legado e modificaram radicalmente a teoria
curricular pós-década de 1960. A partir da teoria marxista, tais
autores, com ênfases diversas, investigaram a estreita relação
entre a educação e a produção e disseminação da ideologia,
apontando a escola como um espaço de reprodução da
sociedade capitalista.
Na década de 1970, nos EUA, surge o movimento de
reconceptualização do currículo como expressão da insatisfação
constante de estudiosos do campo do currículo com os
parâmetros tecnocráticos estabelecidos pelos modelos de
Bobbitt e Tyler. Tal movimento partiu das concepções
fenomenológicas, hermenêuticas e autobiográficas. Inicia-se o
período da crítica neomarxista às teorias tradicionais do currículo
e de seu papel ideológico.
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No livro, são destacados dois estudiosos norte-americanos
reconhecidos no campo do currículo: Michael Apple e Henry
Giroux. Michael Apple começa seu trabalho a partir da discussão
dos elementos centrais da crítica marxista da sociedade,
destacando a conexão entre a organização da economia e do
currículo. Mas, para Apple, essa não é uma relação mecânica; o
campo cultural não é um simples reflexo da economia: ele tem a
sua própria dinâmica. Silva analisa especialmente o primeiro
trabalho de Apple (1979), Ideologia e currículo, que está em
consonância com o paradigma marxista, mas não deixa de
referenciar outros trabalhos posteriores a esse, nos quais Apple
aborda as relações de gênero e raça no processo de reprodução
social exercido pelo currículo, não deixando de manter em todas
as suas obras a preocupação com o poder.
Henry Giroux ajudou a desenvolver uma teorização crítica sobre
o currículo. Silva novamente se limita a analisar somente os
trabalhos da primeira fase do autor. Inspirado pela Escola de
Frankfurt, com sua ênfase na dinâmica cultural e na crítica na
razão iluminista e na racionalidade técnica, para Giroux, o
currículo é um local onde se produzem e se criam significados
sociais, estando em jogo uma política cultural.
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No livro também são destacados os primeiros trabalhos de
Paulo Freire, pois influenciou muitos autores mais diretamente
ligados aos estudos curriculares, apesar de não ter desenvolvido
uma teorização específica sobre o currículo. Freire é classificado
no livro como fenomenológico e precursor de uma perspectiva
pós-colonialista sobre currículo. Além da análise da perspectiva
freiriana, Silva coloca Saviani em oposição àquele autor numa
tentativa extremamente rápida de análise do pensamento de
Saviani.
Tomaz Tadeu destaca a separação feita por Saviani entre
educação e política, colocando-o como um dos únicos
pensadores críticos a esquecer a conexão entre conhecimento e
poder, cuja relação é central para os teóricos críticos do currículo
que têm, na seleção do conhecimento, uma operação de poder.
Na verdade, pode-se afirmar que a questão de fundo do livro é a
crítica às reivindicações educacionais progressistas, cuja tese
estava centrada na apropriação, pelas classes populares, do
currículo hegemônico como condição de igualdade. Silva
destaca que a “[...] obtenção da igualdade depende de uma
modificação substancial do currículo existente” (p.90). Esse é o
salto proposto pelas teorias pós-críticas do currículo.
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Na Inglaterra, a crítica ao currículo é feita a partir da referencia da
“antiga” Sociologia da Educação. No início da década de 1970, surge
a Nova Sociologia da Educação, cujo líder é Michael Young. Sua
proposta é delinear as bases de uma sociologia do currículo, com o
objetivo de destacar o “[...] caráter socialmente construído das formas
de consciência e de conhecimento, bem como suas estreitas
relações com estruturas sociais, institucionais e econômicas” (p.66).
Dessa forma, “[...] uma perspectiva curricular inspirada pelo
programa da NSE buscaria construir um currículo que refletisse as
tradições culturais e epistemológicas dos grupos subordinados e
não apenas dos grupos dominantes” (p.69). Silva dá uma especial
relevância ao trabalho de Basil Bernstein desenvolvido na Inglaterra,
na década de 1970. Sua preocupação é saber como o currículo está
estruturalmente organizado e ligado a princípios diferentes de
poder e controle.
No quadro das teorias pós-críticas, o multiculturalismo – origem nos
países dominantes do norte – é um movimento de reivindicação dos
grupos culturais dominados no interior daqueles países para terem
suas formas culturais reconhecidas e representadas na cultura
nacional. Silva afirma haver uma continuidade entre a perspectiva
multiculturalista e a tradição crítica do currículo. A tradição crítica
inicial chamou a atenção para as determinações de classe do
currículo. O multiculturalismo apresenta outro foco de origem da
desigualdade em matéria de educação e currículo, pautado nas
questões de gênero, raça e sexualidade. Tais questões podem ser
vistas também como uma solução para os “problemas” que a
presença de grupos raciais e étnicos coloca, no interior daqueles
países, para a cultura nacional dominante.
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Nas teorias pós-críticas, passa a ser importante não somente
identificar os conflitos de classe presentes no currículo, como
feito pelas teorias críticas, mas acima de tudo descrever e
explicar as complexas inter-relações das dinâmicas de
hierarquização social. As teorias críticas se concentraram,
inicialmente, em questões de acesso à educação e ao currículo
das crianças e jovens pertencentes a grupos étnicos e raciais
considerados minoritários. Somente em uma segunda fase, por
meio dos estudos culturais e pós-estruturalistas, o próprio
currículo passou a ser problematizado como sendo racialmente
enviesado. “A questão da raça e da etnia não é simplesmente
um ‘tema transversal’: ela é uma questão central de
conhecimento, poder e identidade” (p.102).
A teoria queer, analisada no livro, pode ser colocada como
exemplo de uma pedagogia que objetiva estimular o debate
sério sobre a questão da sexualidade, a ser tratada no currículo
como uma questão legítima de conhecimento e de identidade.
Outro exemplo do livro trata-se da teoria pós-colonialista. Seu
objetivo é analisar “[...] o complexo das relações entre as
diferentes nações que compõem a herança econômica, política
e cultural da conquista européia tal como se configura no
presente momento [...]” (p.125).
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Diferentemente das outras análises pós, a teoria pós-colonial
centra-se nas relações de poder entre nações. Uma perspectiva
pós-colonial exige um currículo multicultural que não separe
questões de conhecimento, cultura e estética de questões de
poder, política e interpretação. Ela reivindica um currículo
descolonizado.
A discussão empreendida por Silva sobre as teorias curriculares
está assentada no contexto da pós-modernidade que, por sua
vez, se encontra o movimento pós-estruturalista. O
pós-estruturalismo estende consideravelmente o alcance do
conceito de diferença a ponto de parecer que não existe nada
que não seja diferente. Não se pode falar propriamente de uma
teoria pós-estruturalista do currículo, mesmo porque o
pós-estruturalismo, tal como o pós-modernismo, rejeita
qualquer tipo de sistematização. Mas há certamente uma
atitude pós-estruturalista em muitas das perspectivas atuais
sobre currículo.
A atitude pós-estruturalista enfatiza a indeterminação e a
incerteza também em questões de conhecimento. O significado
não é preexistente: ele é cultural e socialmente produzido. O
importante então é examinar as relações de poder envolvidas na
sua produção. A questão não é saber se algo é verdadeiro, mas,
sim, saber por que esse algo se tornou verdadeiro.
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Para concluir, Silva volta-se para as teorias pós-críticas, não
deixando de destacar a grande contribuição das teorias críticas.
Estas não devem ser vistas simplesmente como uma superação,
mas mutuamente inclusivas para a compreensão dos processos
pelos quais, através de relações de poder e controle, nos
tornamos mulheres e homens. Nas teorias pós-críticas, o poder
não tem mais um único centro, está espalhado por toda a rede
social; o poder transforma-se, mas não desaparece.
Essa assertiva, certamente, traduz uma das mais úteis
conquistas dos estudos do currículo, mas precisa ser vista como
uma passagem de um estágio mais civilizado e menos
mecânico; um saber mais substantivo e não somente ligado a
um ritmo de variações, mas um campo de amplas
possibilidades de transformação do convívio social.
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SOBRE O AUTORTomaz Tadeu da Silva é doutor emeducação pela Universidade de Stanford,Estados Unidos.Atualmente é professor colaborador doPrograma de Pós-Graduação em Educaçãoda Universidade Federal do Rio Grande doSul.
CRÉDITOResenhado por Eliza Bartolozzi FerreiraUniversidade Federal de Minas Gerais
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É coordenador, juntamente com a Professora Sandra Corazza,de um grupo de estudo denominado DIF - Grupo de Currículode Porto Alegre.Autor de vários livros na área de Currículo. Entre os maisrecentes: Identidade e diferença. A perspectiva dos EstudosCulturais (Vozes); Pedagogia dos monstros; Documentos deIdentidade; O currículo como fetiche (Autêntica).
Eliza Bartolozzi Ferreira, Historiadora, mestre em Educação na áreade concentração de Estado e Políticas Públicas. Professora de EnsinoSuperior (Faesa-ES) com as disciplinas Política Educacional eSociologia do Currículo. Doutoranda em Educação pela UniversidadeFederal de Minas Gerais na linha de pesquisa em Políticas Públicas eEducação: formulação, implementação e avaliação, cuja orientadoraé a Professora-doutora Dalila Andrade Oliveira. Autora de váriosartigos publicados em periódicos e livros na área de PolíticaEducacional, entre eles: "A educação profissional no Brasil: umprojeto de inclusão precarizada (2001)" e "A política educacionalbrasileira no tempo da qualidade: uma estratégialiberal-conservadora (1999)".
Disponível em:http://www.edrev.info/reviews/revp11.htm
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