comportamento tribológico do sistema zircónia/ti6al4v utilizado
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Comportamento tribológico do sistema Zircónia/Ti6Al4V
utilizado em implantes dentários
Vanessa Ribeiro Moreira
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Mestrado em Bioengenharia e Nanossistemas
Orientadores: Prof. Doutora Ana Paula Valagão Amadeu do Serro
Prof. Doutor Rogério Anacleto Cordeiro Colaço
Júri
Presidente: Prof. Doutor Luís Joaquim Pina da Fonseca
Orientador: Prof. Doutora Ana Paula Valagão Amadeu do Serro
Vogal: Prof. Doutor Célio Gabriel Figueiredo Pina
Vogal: Prof. Dr. José Alexandre Brito Antunes dos Reis
dezembro de 2014
ii
iii
Agradecimentos
O agradecimento que deixo nesta secção não é, seguramente, o devido a todas as pessoas
que me ajudaram a cumprir os meus objectivos e a realizar mais esta etapa da minha formação
académica. Desta forma, deixo apenas algumas palavras de reconhecida gratidão.
Começo por agradecer à minha orientadora, a Doutora Ana Paula Serro, pela oportunidade de
trabalhar neste projeto, por todos os ensinamentos e conhecimentos transmitidos e, acima de
tudo, pela disponibilidade e atenção que sempre teve ao longo deste percurso.
Agradeço de igual forma ao Doutro Rogério Colaço, coorientador do presente projeto, pelo
incentivo e motivação prestados ao longo do trabalho, bem como os seus ensinamentos.
Ao Dr. José Reis pela ajuda demonstrada e cedências dos materiais para a realização do
presente trabalho. À Doutora Amélia Almeida que gentilmente ofereceu uma peça de liga de
titânio fundamental para o desenvolvimento do trabalho. Agradeço, ainda, à empresa
CERAMED que gentilmente revestiu amostras de titânio para que pudessem ser usadas no
decorrer deste trabalho.
Gostaria também de agradecer ao Doutor Célio Pina pelo tempo despendido, por tantas
viagens e pela cedência de aparelhos para corroborar os resultados obtidos.
Às minhas “colegas de casa” Inês e Joana, pela amizade, companhia e afeto. Muito Obrigada.
Aos meus colegas de Mestrado, Andreia, Ana (Xanoca) e Rui, pelo apoio, carinho, partilha de
conhecimentos e amizade.
Quero agradecer aos meus “meninos do laboratório”, que os apelo desta forma carinhosa pela
partilha de novos conhecimentos, técnicas, espirito crítico e incentivo demonstrado de cada vez
que algo corria menos bem. A todos devo o meu sincero obrigado: Diana, Bruno, José, Patrizia,
Pedro, Raquel, Andreia P., Andreia C., Ana e Marina.
Tenho ainda que agradecer à minha família de coração, os meus Amigos, pelo apoio,
compreensão e companheirismo demonstrado ao longo destes anos para que mais uma etapa
da minha vida fosse alcançada. Nem sempre foi uma tarefa fácil, mas todos os obstáculos da
vida ajudam-nos a crescer e a ter vontade de alcançar o inalcançável.
O agradecimento especial vai para os meus pais e família que me possibilitaram esta
oportunidade. Por todo o carinho, apoio e dedicação que, constantemente, me oferecem.
iv
v
Resumo
O principal problema associado aos implantes dentários é o desgaste na interface
pilar/implante, que condiciona a sua estabilidade e consequentemente a durabilidade dos
mesmos.
Este trabalho teve como objetivo ajudar a compreender o comportamento tribológico de
um dos pares de materiais mais usados em implantes dentários, o sistema ZrO2/Ti6Al4V.
Após caracterização dos materiais quanto à topografia, molhabilidade e morfologia,
determinou-se o coeficiente de atrito (µ) num nanotribómetro, a seco e em condições
lubrificadas. Além de água e da solução eletrolítica que simula a saliva, utilizaram-se soluções
das principais biomacromoléculas presentes na saliva (albumina, mucina e lisozima) e também
saliva humana. Para uma geometria ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana) constatou-se que embora o
µ obtido em condições lubrificadas seja bastante similar para os vários lubrificantes, é mais
baixo na presença da solução aquosa de albumina e mais ainda com saliva. Inesperadamente,
µ obtido a seco revelou-se significativamente inferior ao obtido em condições lubrificadas, pelo
que se decidiu investigar o comportamento da geometria inversa: Ti6Al4V(esfera)/ZrO2(superfície
plana). Neste caso, µ a seco é ligeiramente superior ao obtido em condições lubrificadas, onde
não se observaram diferenças significativas para este parâmetro. Ensaios de tribocorrosão
demonstraram que as diferenças de µ entre as duas geometrias se devem a diferenças ao
nível do filme de passivação.
Investigou-se ainda o efeito de revestir com TiN a superfície plana de Ti6Al4V.
Verificou-se que µ diminuiu em todos os casos, sendo este efeito mais significativo em
condições lubrificadas. Esta abordagem afigura-se promissora para melhorar o desempenho de
implantes dentários.
Palavras-chave: biomacromoléculas, zircónia, Ti6Al4V, coeficiente de atrito, tribocorrosão,
TiN.
vi
vii
Abstract
The main problem associated with dental implants is the wear on the interface
abutment/implant, which determines its stability and consequently the durability of there.
This study aimed to help us to understand the tribological behavior of a pair of materials
commonly used in dental implants, the ZrO2/Ti6Al4V system.
After characterization of materials as the topography, morphology and wettability, it was
determined the friction coefficient (μ) in a nanotribometer, dry and lubricated conditions. In
addition to water and the electrolyte solution simulating saliva, we used solutions of the main
biomacromolecules present in saliva (albumin, mucin and lysozyme) and also human saliva. For
ZrO2(sphere)/Ti6Al4V(flat surface) geometry we found that although the μ obtained in lubricated
conditions is very similar for the various lubricants is lower in the presence of aqueous albumin
solution and further with saliva. Unexpectedly, the μ obtained for dry was significantly lower than
in lubricated conditions, it was therefore decided to investigate the behavior of the inverse
geometry: Ti6Al4V(sphere)/ZrO2(flat surface). In this case, μ for dry is slightly higher than in lubricated
conditions where no significant differences were observed for this parameter. Trials have shown
that tribocorrosion differences for μ between the two geometries are due to differences in the
level of passivation film.
We also investigated the effect of TiN coating in flat surface of Ti6Al4V. It was found
that μ decreased in all cases, this being more significant effect on lubrication conditions. This
approach seems promising to improve performance of dental implants.
Key-words: biomacromolecules, zirconia, Ti6Al4V, friction coefficient, tribocorrosion, TiN.
viii
ix
Índice Agradecimentos ........................................................................................................................... iii
Resumo .......................................................................................................................................... v
Abstract ........................................................................................................................................ vii
Índice ............................................................................................................................................. ix
1. Introdução Teórica ................................................................................................................ 1
1.1. Anatomofisiologia da Boca ............................................................................................ 1
1.1.1. Dentes ....................................................................................................................... 1
1.1.2. Saliva.......................................................................................................................... 3
1.1.3. Mastigação ................................................................................................................ 7
1.1.4. Desgaste e Perda Dentária ........................................................................................ 9
1.2. Implantes Dentários ........................................................................................................ 10
1.3. Biotribologia .................................................................................................................... 14
1.4. Tribocorrosão .................................................................................................................. 18
2. Parte Experimental .............................................................................................................. 19
2.1. Materiais ......................................................................................................................... 19
2.1.1. Materiais de implante ............................................................................................. 19
2.1.2. Soluções ...................................................................................................................... 20
2.2. Métodos .......................................................................................................................... 21
2.2.1. Coeficiente de atrito.................................................................................................... 21
2.2.2. Caracterização das Superfícies .................................................................................... 25
2.2.2.1. Topografia ........................................................................................................... 25
2.2.2.2. Molhabilidade ..................................................................................................... 27
2.2.2.3. Morfologia ........................................................................................................... 29
2.2.3. Tribocorrosão .......................................................................................................... 31
3. Resultados e Discussão ....................................................................................................... 33
3.1. Caracterização das superfícies dos materiais de partida ................................................ 33
3.2. Ensaios tribológicos ......................................................................................................... 38
3.2.1. Coeficientes de atrito .................................................................................................. 38
3.2.1.1. Sistema ZrO2 (esfera) /Ti6Al4V (superfície plana) – geometria 1 ....................... 38
3.2.1.2. Sistema Ti6Al4V (esfera) / ZrO2 (superfície plana) – geometria 2 ....................... 45
3.2.1.3. Sistema ZrO2 (esfera) / TiN (superfície plana) – geometria 1.............................. 47
3.2.2. Tribocorrosão .............................................................................................................. 49
4. Conclusões........................................................................................................................... 51
x
5. Futuros Trabalhos................................................................................................................ 53
Bibliografia .................................................................................................................................. 55
xi
Lista de Figuras
Figura 1: Constituição do dente 4. _________________________________________________________ 1
Figura 2: Disposição dos dentes na mandíbula humana – adaptado de 5. _________________________ 2
Figura 3: Localização glandular na cavidade bucal 9. __________________________________________ 3
Figura 4: Representação dos músculos envolvidos na mastigação 21
. _____________________________ 7
Figura 5: Implante dentário – adaptado de 29
. ______________________________________________ 11
Figura 6: Contacto elástico entre esfera e plano 42
. __________________________________________ 15
Figura 7: Curva de Stribeck 42
. ___________________________________________________________ 17
Figura 8: Representação dos regimes de lubrificação relativos à curva de Stribeck: (a) Lubrificação
hidrodinâmica; (b) Lubrificação elastohidrodinâmica; (c) Lubrificação limite – adaptada de 42
. _______ 17
Figura 9: Esquema representativo do cantilever usado no nanotribómetro – adaptado de 52
. ________ 22
Figura 10: Pares tribológicos usados nos ensaios de atrito. (i) Esfera (contra-corpo) de zircónia e amostra
(corpo) de titânio; (ii) Esfera (contra-corpo) de titânio e amostra (corpo) de zircónia; (iii) Esfera (contra-
corpo) de zircónia e amostra (corpo) de nitreto de titânio. ____________________________________ 24
Figura 11: Diagrama da formação de imagem em AFM – adaptado de 58
. ________________________ 25
Figura 12: Tipos de Contacto usados em AFM – adaptado de 59
. _______________________________ 26
Figura 13: Ângulo de contacto entre um líquido e uma superfície sólida 55
. _______________________ 27
Figura 14: Representação esquemática do goniómetro 60
. ____________________________________ 28
Figura 15: Esquema representativo de um microscópio eletrónico de varrimento (SEM) – adaptado de 62
.
___________________________________________________________________________________ 29
Figura 16: Representação esquemática da montagem para realização de ensaios de tribocorrosão. __ 31
Figura 17: Representação esquemática da zona da conexão do implante. II) Anel da conexão superior; I)
Parede vertical da conexão._____________________________________________________________ 33
Figura 18: Imagens topográficas de AFM do implante de titânio (10x10µm2). I) Parede da conexão do
implante; II) Anel da conexão superior.____________________________________________________ 34
Figura 19: Imagens topográficas de AFM 10x10µm2 das amostras de Ti6Al4V (I) e de ZrO2 (II). _______ 34
Figura 20: Imagem topográfica de AFM da amostra de TiN (10x10µm2). _________________________ 35
Figura 21: Imagem de SEM do Ti6Al4V e ZrO2,respetivamente. ________________________________ 35
Figura 22: Ângulos de contacto médios obtidos utilizando o método da gota sessile com água nos
materiais Ti6Al4V, TiN e ZrO2. ___________________________________________________________ 36
Figura 23: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nantribológicos
realizados com o par ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana). _________________________________________ 38
Figura 24: Imagens de SEM do Ti6Al4V na pista de desgaste provocado por ensaio nanotribológicos
contra contra-corpo de ZrO2 a seco. ______________________________________________________ 41
Figura 25: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos em meio lubrificado com água
contra contra-corpo (esfera) de ZrO2, em meio lubrificado com água. ___________________________ 42
Figura 26: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de ZrO2 em
meio lubrificado com eletrólito da saliva. __________________________________________________ 43
Figura 27: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de ZrO2 em
meio lubrificado com saliva humana. _____________________________________________________ 44
Figura 28: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nanotribológicos
realizados com o par Ti6Al4V/ZrO2 para as geometrias esfera/plano (Geometria 1) e plano/esfera
(Geometria 2). _______________________________________________________________________ 45
Figura 29: Imagens de SEM da ZrO2 após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de Ti6Al4V em
meio lubrificado com eletrólito da saliva. __________________________________________________ 46
Figura 30: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nanotribológicos. _ 48
xii
Figura 31: Evolução do OCP para o par tribológico ZrO2/Ti6Al4V nas duas geometrias estudadas
(esfera/superfície plana e o inverso) (a) estabilização, b) ensaio de desgaste, c) materiais em contacto
sem movimento, d) materiais sem contacto. _______________________________________________ 50
Figura 32: Esquemas representativos dos ensaios de tribocorrosão na geometria 1 (a) e geometria 2 (b).
___________________________________________________________________________________ 50
xiii
Lista de Tabelas
Tabela 1: Principais componentes orgânicos da saliva 9,10
. _____________________________________ 5
Tabela 2: Mecanismos que levam à fratura dos biomateriais – adaptado de Ratner, B. et al. (2004) 17
. 13
Tabela 3: Concentração dos compostos iónicos usados na preparação da solução de eletrólito de saliva 17
. _________________________________________________________________________________ 20
Tabela 4: Estudos tribológicos no sistema Al2O3(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana). _______________________ 40
xiv
xv
Lista de Abreviaturas
ADSA-P – Axisymmetric Drop Shape Analysis – Profile
AFM – Atomic Force Microscopy
Al2O3 – Aluminium oxide
BSA – Bovine Serum Albumin
cpTi – commercially pure Titanium
DLC – Diamond Like Carbon
EDS – Energy Dispersive Spectroscopy
HV – Hardness Vickers
IgA – Immunoglobulin A
MS – Mass Spectroscopy
OCP – Open Circuit Potential
PSZ – Partially Stabilized Zirconia
PVD – Physical Vapor Deposition
Ra – Roughness average
SEM – Scanning Electron Microscopy
SiC – Silicon Carbide
Si3N4 – Silicon Nitride
TiCN – Titanium CarboNitride
TiN – Titanium Nitride
TiNbN – Titanium Niobium Nitride
TZP – Tetragonal Zirconia Polycrystal
UHMWPE – Ultra-High-Molecular-Weight Polyethylene
WC-Co – Tungsten Carbide-Cobalt
Y2O3 – Yttria
xvi
1
1. Introdução Teórica
1.1. Anatomofisiologia da Boca
A boca é a cavidade onde se inicia o processo digestivo, apresentando no seu interior
os elementos essenciais para a mastigação e insalivação dos alimentos, nomeadamente os
dentes, a língua e as glândulas salivares.
1.1.1. Dentes
Os dentes encontram-se implantados nos maxilares e são constituídos por dentina,
esmalte, polpa e cemento 1,2
(Figura 1). O esmalte e a dentina são tecidos mineralizados duros,
sendo ambos compostos, na sua maioria, por uma matriz mineral de hidroxiapatite. A dentina
apresenta uma matriz orgânica essencialmente constituída de fibras colagénicas e é um tecido
celular. O esmalte cobre a superfície externa dos dentes, tendo uma matriz orgânica
constituída por fibras proteicas insolúveis não colagénicas, sendo acelular e representa apenas
1% da massa do esmalte, o que lhe confere uma dureza bastante superior à dentina 3.
Figura 1: Constituição do dente 4.
Os dentes podem dividir-se em duas partes: a coroa que corresponde à parte externa
do dente e a raiz que corresponde à parte interna. A forma da coroa determina a sua função no
processo da mastigação. O ligamento periodontal une a raiz do dente ao osso alveolar,
mantendo-o fixo e contrariando as forças exercidas no decorrer da mastigação.
Um humano adulto tem 32 dentes: dezasseis na mandíbula (componente móvel na
parte inferior do crânio) e dezasseis no maxilar (estrutura fixa da região frontal do crânio que se
encontra acima da mandíbula). A disposição dos dentes ao longo do maxilar é indicada na
2
Figura 2. Os dentes são classificados de acordo com a sua forma e função, encontrando-se em
diferentes posições na mandíbula/maxilar. Aqueles que se encontram mais perto da entrada na
cavidade oral (à frente) denominam-se de incisivos (4 superiores e 4 inferiores) e apresentam a
coroa afiada em forma de cinzel, que permite cortar os alimentos. Imediatamente a seguir
encontram-se os caninos (1 de cada lado, sendo 4 no total) com pontas agudas (designadas
cúspide) que permitem perfurar os alimentos 5.
Na zona posterior da mandíbula/maxilar (zona mais afastada da entrada da boca)
situam-se os pré-molares (2 de cada lado, 8 no total) e os molares (3 de cada lado, 12 no total)
que ajudam na esmagar e triturar os alimentos.
A principal função da mandíbula e maxilar é, assim, além de suportar os dentes,
permitir o processo de mastigação do bolo alimentar. Durante esse processo (descrito na
secção 1.1.3.) o alimento vai passando em diferentes tipos de dentes, sofrendo sucessivos
processos de fragmentação para que se torne suficientemente pequeno e possa seguir pelo
aparelho digestivo.
Figura 2: Disposição dos dentes na mandíbula humana – adaptado de
5.
Além da função mastigatória, os dentes possuem uma função estética e desempenham
um importante papel de auxílio à fonação visto que a pronúncia correta de alguns fonemas
depende deles, juntamente com a língua.
3
1.1.2. Saliva
Na cavidade oral podemos encontrar vários agregados de tecido glandular e glândulas
salivares, temos assim as glândulas major: as parótidas, sublinguais, submandibulares, e as
menores, que se encontram espalhadas pela língua, palato e mucosas 6. A secreção das
glândulas permite que a cavidade oral se mantenha húmida e auxilia o processo de digestão.
As glândulas parótidas, localizadas na parte posterior da boca, como é possível
observar na Figura 3, são as maiores da cavidade oral. São glândulas serosas que produzem
saliva aquosa rica em albuminóides. Já as glândulas submandibulares são constituídas por
alvéolos mais serosos do que mucosos e, assim, são consideradas de glândulas mistas. É
possível localizá-las no limite inferior da mandíbula (Figura 3). As glândulas glândulas
sublinguais (situadas imediatamente abaixo da língua) são também elas mistas mas, ao
contrário das referidas anteriormente são principalmente constituídas por alvéolos mucosos,
apesar de apresentarem alguns alvéolos serosos.
O conjunto das glândulas salivares produz a saliva, um líquido que é então uma
combinação de secreções serosas e mucosas das diversas glândulas. A secreção salivar é
induzida por estímulos psíquicos, mecânicos, físicos, químicos e biológicos, estimando-se que
o fluxo salivar varie entre 1,0 a 1,5L/dia no homem adulto 6–9
.
A saliva desempenha diversas e importantes funções ao nível biológico, como a
humidificação e lubrificação da mucosa orofaríngea 10
; formação e transformação do bolo
alimentar, favorecendo a digestão e deglutição; lavagem físico-mecânica dos constituintes da
boca; tamponamento (mantendo o pH da cavidade bucal entre 6,8 – 7,2); ação antimicrobiana,
evitando a colonização da boca por microrganismos potencialmente patogénicos,
remineralização da superfície dos dentes e ativação da agudeza gustativa 6.
Figura 3: Localização glandular na cavidade bucal 9.
4
A multiplicidade de funções da saliva e o seu importante papel na manutenção da
saúde oral decorre da sua composição (Tabela 1 e Tabela 2). A saliva apresenta propriedades
protetoras e contem uma variedade de componentes antimicrobianos e fatores de crescimento
10.
O constituinte da saliva em maior quantidade é a água (> 90%), sendo a sua principal
função manter a mucosa húmida bem como a superfície dos dentes, auxiliar o movimento do
bolo alimentar e, desta forma, a deslocação das proteínas e enzimas da saliva.
A forte presença de proteínas na saliva permite formar um biofilme na superfície
dentária, sendo a enzima mais abundante a α-amilase 10,11
. A α-amilase atua na digestão do
amido (hidrólise do amido) que é um polissacárido muito abundante nos alimentos,
maioritariamente vegetais. É sintetizada pelas glândulas parótidas e contribui para as
características serosas da saliva. A amilase atua também como uma enzima antimicrobiana,
inibindo o crescimento de bactérias como Legionella pneumophila e Neisseria gonorrhoeae 6,12
.
Em 1988, Waterman et al. 9, referiu que a eficácia da saliva como lubrificante depende
da sua viscosidade. Substâncias como lisozima, albumina, imunoglobulina A (IgA), α-amilase,
mucina e ureia possuem um papel relevante nos mecanismos de lubrificação encontrados na
cavidade bucal 6,10
. A lisozima é caracterizada por ser uma enzima capaz de catalisar a
degradação de peptidoglicanos (macromoléculas) e tem uma ação antibacteriana devido à sua
atividade catalítica, ou seja, destrói a camada protetora de bactérias, especialmente do género
Streptococcus 11,13
. Esta proteína tem a capacidade de se ligar à hidroxiapatite
desempenhando uma função antimicrobiana na superfície dos dentes e de proteção da mucosa
6,12,13, nomeadamente na inibição do crescimento e alojamento de fungos (por ex. Candida) na
cavidade oral 6,12
.
As glicoproteínas presentes na saliva, como a mucina, conferem-lhe um carácter
viscoelástico e permitem a formação de uma pelicula lubrificante que ajuda na deslocação do
bolo alimentar 13,14
. Esta proteína permite, em conjunto com os eletrólitos da saliva, a
manutenção do pH entre 7,0~7,4 na cavidade bucal. Os eletrólitos mais relevantes para tal são
os iões fosfato e bicarbonato. As glândulas secretoras de mucina são as sublinguais e
submandibulares (a secreção das parótidas é desprovida de mucinas) 12,15
. Esta proteína é
constituída também uma barreira de proteção contra antígenos, proteção membranar das
células da mucosa salivar contra organismos bacterianos e tem um papel regulador da
colonização bacteriana na boca 12,15
.
No que toca às imunoglobulinas, estas apresentam como principal papel a defesa
contra agentes patogénicos ao organismo. Na saliva humana, as imunoglobulinas presentes
são designadas de imunoglobulinas secretórias (IgA) e combatem essencialmente a invasão
bacteriana. No entanto, não se encontram em quantidade suficiente para evitar a formação de
cáries dentárias pelo alojamento de microrganismos como Streptococcus 11
.
5
A ureia é hidrolisada pela urease, originando o aparecimento da amónia (NH3) na saliva
(substância básica que eleva o pH salivar), o que facilita a precipitação dos sais de cálcio na
formação do tártaro.
Por último, a albumina é uma proteína que se encontra em grande quantidade no
plasma e que se difunde nas secreções mucosas da boca. Esta proteína pode ser adsorvida
por materiais quando fixados na boca levando a uma fixação de bactérias 6,16
.
Relativamente aos eletrólitos (Tabela 2), os iões fosfato, cálcio e fluoreto
desempenham uma função importante na remineralização dos dentes 14
.
Tabela 1: Principais componentes orgânicos da saliva 9,10
.
Constituintes Quantidade (g/L) Principais características
Org
ânic
os
Lisozima 0,13 – 0,66 Atividade antibacteriana
Albumina 0,002 – 0,012 Responsável pela viscosidade
Imunoglobulina A (IgA)
0,022 – 0,15 Combate infeções bacterianas
α-amilase 0,06 – 0,70 Digestão do amido
Mucina 0,88 Propriedade lubrificante
Ureia 0,14 – 0,75 Contribui para a elevação do pH
bucal
6
Tabela 2: Principais componentes inorgânicos da saliva 17
.
A ausência/insuficiência de secreções salivares aumenta a probabilidade de ulceração
e de infeção da mucosa oral, bem como o aparecimento de cáries dentárias 8. Mais, alterações
a nível das proteínas constituintes da mucosa salivar bem como algumas doenças adquiridas
(ex.: diabetes, cancro,..) podem desencadear diversas doenças como periodontite, xerostomia,
hipo e hipersalivação, bruxismo, entre outras, que podem levar à perda total de um ou mais
dentes, diminuindo a qualidade de vida dos doentes. 6,12,15
.
No presente trabalho estudar-se-á o efeito de algumas das macromoléculas mais
abundantes na saliva (lisozima, mucina e albumina), no comportamento tribológico de materiais
utilizados em implantes dentários (zircónia e uma liga de titântio). Será ainda testado como
lubrificante, uma solução de composição eletrolítica semelhante à da saliva.
Constituintes Quantidade (g/L)
Ino
rgân
ico
s
Bicarbonato 0,12 – 0,79
Cálcio 0,03 – 0,1
Cloro 0,02 – 0,15
Magnésio 0,002 – 0,01
Fosforo total 0,12 – 0,29
Potássio 0,55 – 1,60
Sódio 0,12 – 0,56
7
1.1.3. Mastigação
A mastigação é caracterizada pela abertura e fecho da mandíbula de forma rítmica
onde a velocidade do movimento e a frequência são parâmetros importantes, com o objectivo
de reduzir os alimentos de modo a estes serem mais facilmente digeridos 18
.
A medição deste movimento pode ser feita a partir de eletromiografia (EMG) que
relaciona as forças exercidas com as necessárias para romper uma dada partícula alimentar.
As forças aplicadas na mastigação variam dependendo dos alimentos (textura, dureza,
elasticidade, etc), géneros (feminino ou masculino), idade, problemas do foro ortodôntico, entre
outros 5,19
.
No processo da mastigação estão envolvidos alguns músculos, ligamentos, estrutura
óssea e dentes. Os músculos que promovem a abertura e fecho da mandíbula são masséter,
temporal, bucinador, pterigóideo interno ou medial e pterigóideo lateral ou externo (Figura 4)
5,18–20. O movimento de abertura e fecho da boca é realizado com o auxílio dos músculos
faciais, contudo, sabemos que a mastigação ocorre em várias direções, o que é possível
devido à forma como a articulação têmporo-mandibular permite a ligação da mandíbula ao
osso temporal –.
Figura 4: Representação dos músculos envolvidos na mastigação 21.
O ciclo mastigatório, que permite rasgar e triturar os alimentos em pedaços mais
pequenos é caracterizado por três fases: abertura, fecho e oclusão da mandíbula 5,18
.
8
Na fase de abertura da boca não há contacto dos dentes e a mandíbula abre por
relaxamento dos músculos elevadores (masséter, temporal e pterigóideo medial) e contração
dos depressores (milo-hilóideo e músculo digástrico), simultaneamente. Já na fase de fecho da
boca há contração dos músculos elevadores e relaxamento dos depressores permitindo o
fecho da mandíbula. É nesta fase que ocorre o primeiro contacto dentário com o alimento. A
fase oclusal define-se pela ocorrência da trituração do alimento pelos dentes pré-caninos e
incisivos, há aumento da força usada até a mandíbula atingir a posição de máxima
intercuspidação (posição de máximo contacto interdentário entre a mandíbula e o maxilar
superior) 5,18,22.
A pressão exercida na mastigação depende da força e área onde essa força é
aplicada. Verifica-se que, como os dentes pré-molares têm uma superfície oclusal menor, são
usados na mastigação dos alimentos mais duros 18,22
.
A força de mordida humana, como referido anteriormente, varia conforme o género
(feminino ou masculino), a idade dos indivíduos, o desenvolvimento muscular, e o tamanho e
textura do alimento onde é exercida a pressão.
A força mais elevada é exercida pela parte mais posterior da mandíbula, onde se
encontram os dentes molares, usados na trituração dos alimentos. Assim, a variação da força
de mordida consoante o tipo de alimento tornou-se foco de estudo por diversos autores.
Hellsing e Hagberg et al. 23
mediram a força de mordida unilateral em adultos e obtiveram uma
média de 272N. Segundo Anderson et al. 24
, a força de contacto durante a mastigação
encontra-se entre os valores 190 –260N, sendo que a força de mordida máxima se situa na
gama de 500 – 700N 22,24
.
Outros autores referem que consoante a natureza dos alimentos, as forças produzidas
podem ir dos 70 – 150N aos 190 – 260N 5,25,26
.
Nos dentes incisivos a força média registada foi de 190N para homens e 50N para
mulheres 23
, enquanto nos molares a força registada é bastante superior, 500 – 700N 5.
Do exposto, conclui-se que não é possível definir um valor exato para a força de
mordida, que varia de caso para caso e que pode sofrer alteração conforme o desgaste
dentário, doenças periodontais, doenças adquiridas (ex. diabetes), entre outros fatores.
9
1.1.4. Desgaste e Perda Dentária
O termo desgaste dentário refere-se à perda progressiva da superfície do dente
(esmalte), expondo a dentina. Este fenómeno aumenta com o avançar da idade, com o
aparecimento de cáries dentárias. O desgaste pode ser provocado por fricção (abrasão)
exagerada numa zona e erosão, causada por agentes químicos como alimentos/sumos ácidos
ou regurgitamento gastro-esofágico.
Doenças como bruxismo, caracterizado pelo ranger dos dentes de forma rítmica,
maioritariamente durante o sono, também podem levar ao desgaste.
A falta de cuidados dentários pode levar, em condições extremas a um desgaste
elevado que pode levar à perda de dentes, outras causas como trauma ou doenças
periodontais também podem ser responsáveis por essa perda.
O trauma define-se como a quebra parcial ou total do dente causado acidentalmente,
podendo afetar a raiz do mesmo e levando a uma possível infeção do local e posterior
reabsorção óssea, deformando a local afetado.
A periodontite é uma infeção nas gengivas e na estrutura que suporta os dentes, que
pode levar, a mobilidade dentária com perda de volume ósseo. É uma doença que, quando não
detetada e tratada atempadamente tende a destruir o osso até ao ponto de comprometer a
fixação da raiz do dente ao osso, podendo levar à perda total do mesmo ou à perda dentária.
Uma higiene descuidada favorece a acumulação de bactérias sobre a superfície dos
dentes (placa bacteriana ou biofilme), podendo resultar no aparecimento de cáries e/ou originar
infeção junto ao osso e à raiz do dente (doença periodontal), o que pode em última instância
implicar extração do dente 27,28
.
10
1.2. Implantes Dentários
A perda dentária implica que se faça a substituição do dente por uma prótese ou
implante que vai simular o aspeto e função do dente perdido.
O primeiro relato de tentativa de segurar os dentes ao maxilar remonta o tempo dos
egípcios que o fizeram com fio de ouro. Mais tarde, Greenfield 17
testou a implantação de ouro
e platina como raízes dentárias artificiais em dentes de porcelana. Até aos dias de hoje foram
relatados e testados diversos materiais como ligas de metais não ferrosos e cobalto-crómio que
em 1949 foram usados para substituição de mandíbulas totalmente desdentadas, entre outros.
Ao longo dos anos, a técnica tem vindo a ser aperfeiçoada e melhorada 17
.
Surgiu assim a necessidade de compreender a reação do organismo aos materiais
usados. Em 1983 o Dr. Per-Ingvar Branemark aplicou o termo “osteointegração” para se referir
ao processo de fixação de implantes no osso devido ao crescimento do tecido ósseo que
envolvia o implante fazendo com que este pudesse ser utilizado para agarrar uma prótese em
boca. 17
.
Existem vários tipos de prótese dentárias que se podem classificar quanto:
-ao número: totais ou parciais
-retenção: removíveis ou fixas, de acordo com a possibilidade de se poder ou não tirar
e voltar a colocar na boca pelo doente;
-tipo de material: acrílicas, metálicas, metalo-acrílicas, metalo-cerâmicas, cerâmicas
As próteses fixas são colocadas na boca de forma definitiva ou seja não permitem que
o doente as retire. Nesta categoria encontram-se as coroas que revestem artificialmente dentes
naturais que se encontram destruídos, fraturados ou fragilizados devido a desvitalização, e as
pontes que apresentam pelo menos duas coroas que atuam como elemento retentos e um
póntico que une as coroas e que substitui o dente ausente.
Os implantes dentários são dispositivos que se fixam no maxilar (Figura 5) para
substituir uma raiz perdida, e onde as próteses dentárias encaixam ou são fixadas. O implante
apresenta duas superfícies: uma que fica dentro do osso tal como a raiz de um dente natural, e
o outro que apresenta uma conexão que fica fora do osso. É na conexão que a prótese
dentária vai aparafusar.
A utilização de implantes para substituir um ou mais dentes em falta permite melhorar a
aparência estética do indivíduo, permite-lhe falar melhor e fundamentalmente mastigar os
alimentos convenientemente. Minimizando-se assim o risco de má colocação das próteses
tradicionais (por ex. próteses removíveis) e o uso de colas fixadoras de placas. Os implantes
vêm trazer um maior conforto, estética e confiança aos pacientes.
11
Figura 5: Implante dentário – adaptado de 29
.
Os materiais utilizados nos implantes dentários são, na sua maioria, de natureza
metálica conjugados com materiais cerâmicos. Em geral, recorre-se a ligas de titânio, devido à
sua alta biocompatibilidade e às propriedades físicas e mecânicas adequadas para esta
aplicação 30–32
. Com efeito, o processo de mastigação implica a utilização de materiais duros e
mecanicamente resistentes à ação de forças na ordem das centenas de Newtons 30–32
.
Neste tipo de implantes pretende-se ainda que o material a fixar no osso seja
biocompatível, tenha boa capacidade de integração e impeça a colonização bacteriana, visto
que estará em contacto com a gengiva. A liga de titânio acima referida demonstrou ter uma
elevada capacidade de osteointegração com o osso do maxilar 6. É também muito usada em
outros dispositivos médicos devido à sua biocompatibilidade tais como: próteses anca, joelho,
dispositivos cardíacos, entre outros 30–32
.
Os pilares dos implantes dentários são fabricados em titânio e/ou zircónia. A zircónia,
além de não apresentar toxicidade e ser biocompatível, possui excelentes propriedades
mecânicas, químicas e estéticas 33
.
A zircónia é um material cerâmico que apresenta boas características para aplicações
biotribológicas pois é um material duro com alta resistência à abrasão, apresenta uma elevada
estabilidade, boa resistência química e é biocompatível. Comparativamente à alumina, outro
material cerâmico também usado em implantes dentários, a zircónia apresenta duas a três
vezes mais tenacidade à fratura, sendo por isso muitas vezes preferido. A zircónia tetragonal
(TZP) obtem-se por exposição a elevadas temperaturas e é mais densa. A estabilidade da
zircónia é depois obtida por arrefecimento (zircónia parcialmente estabilizada, PSZ) 34
.
Este trabalho incidiu sobre o estudo do comportamento tribológico do par
Ti6Al4V/Zircónia. Foi também estudado o efeito de se revestir a superfície metálica com nitreto
12
de titânio (TiN) que, sendo biocompatível, tem sido utilizado noutras aplicações como forma de
atenuar o desgaste, com custos inerentes relativamente baixos.
Nas reabilitações dentárias, a conexão entre os implantes e os pilares apresenta,
historicamente, uma forma hexagonal. É frequente observar-se o desgaste das superfícies na
área de contacto devido à ação mecânica, podendo este fenómeno ser agravado por fatores de
origem biológica. Pode ocorrer afrouxamento ou até mesmo fratura do pilar e/ou, ainda, fratura
total do implante. A folga na conexão entre o pilar e o corpo do implante permite a acumulação
de microrganismos e origina sequelas clínicas, como peri-implantite ou periodontite (por ex.
processo inflamatório destrutivo que afeta os tecidos em torno do implante dentário) 17,35
. Os
principais fenómenos de origem biológica poderão estar relacionados com alterações a nível da
composição do dente e do meio envolvente, nomeadamente da saliva.
Segundo Duncan et al. 35
, uma das causas mais usuais do desgaste dos materiais
usados nas reabilitações com implantes dentários é o afrouxamento do parafuso que une os
pilares aos implantes. A estabilidade da conexão entre o pilar e o implante depende, em larga
medida, da integridade da zona interna de ligação entre estes, pelo que quando há uma
sobrecarga no implante pode resultar no afrouxamento ou até mesmo na fratura do par.
Na Tabela 2 são apresentadas algumas das causas que levam à quebra/falha dos
biomateriais utilizados em implantes dentários.
13
Tabela 2: Mecanismos que levam à fratura dos biomateriais – adaptado de Ratner, B. et al. (2004) 17
.
Mecânico
Deformação;
Desgaste;
Fratura por stress;
Fratura.
Físico-Químico
Adsorção de biomoléculas;
Absorção de água ou lípidos;
Lixiviação de compostos de baixo peso molecular, conduzindo ao
enfraquecimento ou fragilização;
Desintegração.
Bioquímico/Hidrólise química
Oxidação ou redução;
Mineralização/Calcificação.
Eletroquímico
Corrosão.
Para fazer face ao problema do desgaste dos materiais constituintes dos implantes,
vários autores estudaram e desenvolveram estratégias envolvendo a otimização das
propriedades dos materiais utilizados e/ou melhoria das técnicas de fabricação dos
implantes33,36
. Foram testadas outras geometrias para a conexão, além da conexão externa
hexagonal, desenvolveu-se conexões internas com geometrias em cone morse, triangular,
hexágono, duplo hexágono, octogono 37
.
14
1.3. Biotribologia
A designação tribologia provem do grego “tribos” que significa fricção. Segundo
Hutchings et al. 34
, a tribologia é a "ciência e tecnologia da interação de superfícies em
movimento relativo. Inclui o estudo de fenómenos de atrito, lubrificação e desgaste entre
superfícies 32,38–41
. O atrito, que corresponde à resistência ao movimento relativo entre dois
corpos, é considerado como a principal causa para o desgaste de uma superfície. Um desgaste
elevado pode levar à diminuição ou perda do desempenho mecânico do material 32,38–41
.
O atrito e o desgaste encontram-se, assim, intimamente relacionados na medida em
que se o atrito for nulo não existirá desgaste, não sendo contudo o recíproco verdadeiro 40
.
Com efeito, o facto do coeficiente de atrito ser elevado não implica necessariamente um
elevado desgaste.
A biotribologia refere-se ao estudo dos fenómenos tribológicos que ocorrem no corpo
humano e animal, quer em sistemas naturais (e.g. articulações) quer em artificiais (e.g.
implantes). No que toca aos implantes dentarios o principal factor de preocupaçao para a boa
manutençao e funcionamento dos mesmos incide sobre a acção do atrito e consequente
desgaste 32 –34
.
Atualmente são realizados estudos à escala macro, micro e nano com a finalidade de
antecipar e conhecer o que ocorrerá in vivo ao dispositivo/sistema implantado, conhecendo de
forma mais aprofundada o tipo de desgaste sofrido nas condições reais em que é inserido.
Estes estudos têm favorecido a descoberta de formas de melhorar substancialmente os
materiais utilizados, nomeadamente agindo sobre a sua rugosidade, tamanho do grão ou
mesmo os pontos de contacto (e.g. asperezas) 32,38,39,42
.
Os primeiros estudos tribológicos foram realizados por volta do séc. XVI por Leonardo
da Vinci que mencionou que o atrito é proporcional à carga aplicada e, mais tarde, em 1663,
por Guillaume Amontons que em 1699 formulou as duas primeiras leis para o atrito, conhecidas
como Leis de Amontons:
A força de atrito é diretamente proporcional à força normal;
A força de atrito é independente da área de contacto.
A primeira lei permite definir o atrito (µ) como o quociente entre a força de atrito (𝐹𝑇) e a
força normal (𝐹𝑁), sendo:
𝜇 =𝐹𝑇
𝐹𝑁 𝑒𝑞𝑢𝑎çã𝑜 1
A estas duas leis, é ainda adicionada uma terceira, conhecida como lei de Coulomb
(1785), segundo a qual:
A força de atrito cinético é independente da velocidade de deslizamento32,39–41
.
15
Contudo, esta lei não pode ser considerada como verdade absoluta para todos os
sistemas tribológicos uma vez que a força necessária para iniciar o deslizamento (e.g. fricção
estática) é maior do que a força durante o processo de deslizamento (e.g. atrito cinético) 39,42
.
O contacto entre duas superfícies é determinado pela geometria do par. Neste trabalho,
as experiências tribológicas foram realizadas utilizando sistemas esfera versus plano (Figura 6)
32,41.
Figura 6: Contacto elástico entre esfera e plano 42
.
O contacto entre uma esfera (de raio R) e um plano é de natureza elástica e pode ser
modelado pela teoria de Hertz 32,41
.
De acordo com a equação da deformação elástica de Hertz o raio da área de contacto
da esfera com o plano é dado por 39–43
:
𝑎 = (3𝑅𝐹𝑁
4𝐸∗)
13⁄
𝑒𝑞𝑢𝑎çã𝑜 2
Onde 𝐸∗ representa a componente elástica do contacto entre os materiais, tal que 39–43
:
1
𝐸∗= [
1 − 𝜗12
𝐸1+
1 − 𝜗22
𝐸2] 𝑒𝑞𝑢𝑎çã𝑜 3
𝐸1 e 𝐸2 representam os módulos de Young do material 1 e 2 (esfera e plano) e 𝜗1 e 𝜗1 os
respetivos coeficientes de Poisson. A pressão máxima exercida no contacto é dada pela
seguinte equação39–43
:
𝑃𝑚á𝑥. =3𝐹𝑁
2𝜋𝑎2= (
6𝐹𝑁(𝐸∗)2
𝜋3𝑅2 )
13⁄
𝑒𝑞𝑢𝑎çã𝑜 4
FN
16
É possível demonstrar que a pressão média de compressão corresponde a 23⁄ da
pressão máxima 39–43
:
Quando existe movimento de uma superfície sobre outra ocorre uma força de atrito que
promove a adesão das superfícies 39
. O contacto entre as superfícies dá-se apenas em alguns
pontos: as asperezas. Ao aumentar-se a força normal há uma maior aproximação das
superfícies de modo a suportar a carga exercida. Tal leva à deformação dos pontos de
contacto, resultando no aparecimento de uma tensão oposta à carga aplicada. Em geral, o tipo
de deformação que os materiais sofrem pode ser caracterizado por: elástico, plástico ou
viscoelástico; dependendo da força aplicada, velocidade, lubrificação do meio, rugosidade e
propriedades dos materiais envolvidos 32,38,40–42
.
A rugosidade média de um material (Ra) é definida pelo desvio médio aritmético em
relação à linha média do perfil superficial (elevações ou cavidades). A rugosidade das
superfícies determina a área real de contacto entre os materiais e o tipo de deformação
superficial (elástica/plástica). O aumento da rugosidade traduz-se num aumento do atrito,
conforme referido por diversos autores 32,34,41,42.
O contacto contínuo com movimento associado pode levar ao desgaste das asperezas.
A formação de partículas de desgaste que, caso se mantenham na zona de contacto, podem
sofrer deformação plástica e consequentemente formar uma interface entre as duas superfícies
de contacto, poderá afetar significativamente o coeficiente de atrito 32,44
.
Existem cinco tipos de desgaste: abrasivo, adesivo, fadiga, erosivo e corrosivo 32,41
. O
nosso foco incidirá sobre o desgaste adesivo em que há transferência de material de uma
superfície para a outra, e sobre o desgaste por fadiga devido aos vários ciclos de carga a que o
material está sujeito aquando de movimento de mastigação.
O comportamento tribológico dos materiais é também afetado pela presença de
lubrificantes. Nos sistemas biológicos esta é uma questão particularmente critica, devido à
presença de fluidos biológicos.
A lubrificação do meio afeta diretamente o desgaste dos materiais bem como o atrito
sofrido, isto porque o lubrificante promove a formação de uma camada entre as superfícies em
contacto que, por sua vez, oferece ao sistema uma “proteção” ao desgaste e uma diminuição
do atrito. Stribeck et al.44
identificou e avaliou os diferentes regimes de lubrificação que se
descrevem a seguir – Figura 7.
17
Figura 7: Curva de Stribeck 42
.
Lubrificação hidrostática – as asperezas das superfícies dos materiais não
entram em contacto pois existe um filme líquido, com espessura elevada, que as separa;
Lubrificação hidrodinâmica – a espessura do filme é elevada resultando num
não contacto entre as asperezas dos materiais; contudo o filme líquido é pressurizado por
arrastamento para a zona de contacto;
Lubrificação elastohidrodinâmica – em líquidos muito finos são produzidas
pressões elevadas que provocam um aumento de viscosidade do líquido e, assim, uma
deformação elástica das superfícies. É evitado o contacto entre as asperezas dos dois
materiais;
Lubrificação limite – as asperezas das superfícies estão em contacto direto
embora cada uma delas esteja revestida por uma monocamada de moléculas adsorvidas
de lubrificante; diminui a resistência ao cisalhamento;
Lubrificação contínua – o filme que separa as superfícies é solido, ou seja,
cisalhamento baixo 32,41,42,44
.
Figura 8: Representação dos regimes de lubrificação relativos à curva de Stribeck: (a) Lubrificação hidrodinâmica; (b) Lubrificação elastohidrodinâmica; (c) Lubrificação limite – adaptada de
42.
Em geral, a presença de um lubrificante permite que haja controlo sobre o atrito e
desgaste das superfícies, do mesmo modo que a ausência de lubrificação leva a uma elevada
fricção. É, por isso, importante compreender o modo de atuação da lubrificação para otimizar
as superfícies e minimizar o atrito e desgaste em próteses e implantes.
18
1.4. Tribocorrosão
A falha dos implantes dentários é atualmente motivo de vários estudos. Dado que na
boca os materiais se encontram em contacto com a saliva, é importante ter em consideração a
eventual corrosão a que os materiais, principalmente em metais, estão sujeitos e que pode
levar à falha dos mesmos. A corrosão de metais ocorre pela exposição a um meio químico ou
eletroquímico, onde existem moléculas ou iões que levam à formação de produtos corrosivos.
Nestas condições, a degradação do material pode ser causada por atrito ou erosão da
superfície do mesmo. Em ambos os casos estamos perante fenómenos de tribocorrosão,
envolvendo simultaneamente efeitos mecânicos e químicos. Quando em conjunto, corrosão e
desgaste podem levar a uma rápida falência do material culminando na sua fratura 34
, o que
constitui uma situação irreversível.
Nos implantes dentários a corrosão pode levar a doenças como peri-implantite que
desencadeia a perda óssea na zona do contacto entre o implante e o osso. Tal pode originar a
falha do implante 45
. No contacto implante/parafuso e parafuso/coroa, pode ocorrer também
tribocorrosão, pois os materiais estão envolvidos por fluido e estão sujeitos a cargas externas
(sejam elas elevadas ou micro) 45,46
.
A saliva constitui assim um meio que aumenta a possibilidade de degradação dos
materiais, devido à sua potencial ação corrosiva. Quando o implante é sujeito a cargas pode
ocorrer uma sinergia entre o efeito mecânico e os processos químicos. A abrasão local do filme
de passivação do material (óxido) pode ocorrer, acelerando a corrosão, pois o material fica
exposto a um meio envolvente agressivo que contem iões e proteínas. A corrosão pode
acelerar o desgaste e o desgaste pode acelerar a corrosão 45,47,48
A liga de Ti6Al4V utilizada neste estudo é usada em próteses articulares e implantes
dentários pelas suas características, nomeadamente a sua alta resistência à corrosão
comparada a outros materiais como ligas de cobalto-crómio e aços inoxidáveis. No entanto,
este material apresenta uma baixa resistência ao desgaste abrasivo, e quando utilizado em
implantes e próteses, há tendência para ocorrer dano e transferência de material para o contra-
corpo 47
(mais duro), neste caso particular a zircónia, além da formação de debris que podem
ocasionar danos celulares, reações inflamatórias e até a rejeição do implante. Tratando-se de
uma liga de titânio e não de titânio puro, apresenta menor resistência à corrosão mas maior
resistência mecânica e maior resistência ao fretting 46,48
.
19
2. Parte Experimental
2.1. Materiais
2.1.1. Materiais de implante
As amostras de zircónia (ZrO2) usadas apresentavam as características necessárias
para uso comercial como implantes. Contêm 3% em mol de ítria (Y2O3), com um estabilizador
3Y-TZP. Foram submetidas a um processo de sinterização até 1500ºC num forno (Zirkonofen
600/V2, Zirkonzahn GmbH, Gais, Itália). Após a sinterização as amostras foram
examinadas à lupa para garantir a ausência de defeitos estruturais. As amostras utilizadas
nos ensaios têm um diâmetro de 8,05mm e uma altura compreendida entre 2,5~3mm.
As amostras de titânio (Ti6Al4V) foram previamente cortadas em discos de 25mm de
diâmetro e 8,8mm de altura. Uma destas amostras foi submetida a um processo de polimento
com lixas de SiC de 240, 360, 600, 800, 1200, 2400-4000, seguido por um pano de alumina (0,8
µm) e finalizado com um pano de OPS (oxide polishing – pano finalizador de polimento com
líquido de suspensão coloidal de alumina de tamanho de grão inferior a 1 µm) 49
, resultando
numa rugosidade média final de 35,5±0,4nm. Após o polimento as amostras foram lavadas em
ultrassons com uma solução 15% de Extran (Merk) durante 5 minutos e finalmente lavadas
com água Mili-Q durante 5 minutos (três vezes) para garantir a remoção total do detergente.
Após a lavagem foi ainda feita uma passagem com álcool (96%) e secagem com azoto gasoso.
As restantes amostras de Ti6Al4V (chapas) foram revestidas com TiN pela empresa
Ceramed, não sendo submetidas a qualquer outro tratamento adicional. Estas foram revestidas
por PVD (deposição física em fase vapor) por uma máquina de revestimentos METAPLAS a
300ºC. As amostras são assim atacadas por árgon para remover qualquer óxido presente na
superfície com uma tensão de polarização de 900V. No processo de deposição foram utilizados
os seguintes parâmetros: deposição catódica de corrente 200A; tensão de polarização 100 V e
pressão de gás 1,4x10-4
bar.
Para a realização dos ensaios nanotribológicos foram usadas esferas de Ti6Al4V e
ZrO2 com diâmetros 2,99x10-3
m e 2,8x10-3
m, respetivamente.
20
2.1.2. Soluções
Para a execução de ensaios nanotribológicos e de tribocorrosão foram preparadas as
seguintes soluções: eletrólito de saliva com pH~7,4 (composição na Tabela 3), solução de
albumina (BSA), eletrólito com albumina (eletrólito + BSA), eletrólito com mucina (eletrólito +
mucina) e eletrólito com lisozima (eletrólito + lisozima). Foram ainda executados ensaios com
água Mili-Q (sem iões), ensaios a seco e ensaios com saliva humana.
As concentrações das biomoléculas utilizadas na preparação das soluções situam-se
dentro das quantidades encontradas na saliva humana 17,50
. Para a albumina utilizou-se uma
concentração de 1,2mg/dL 17,50
, para a mucina 0,88mg/dL 14,51
, e para a lisozima 0,66mg/dL
(Tabela 1)
Tabela 3: Concentração dos compostos iónicos usados na preparação da solução de eletrólito de saliva 17
.
Eletrólito da Saliva Concentração (g/L)
NaHCO3 0,63
KCl 1,12
CaCl2 0,17
K2HPO4 1,51
NaCl 0,38
MgCl2 0,06
O método de recolha da saliva humana utilizada neste trabalho foi feito sem
estimulação das glândulas e por gravidade. A saliva usada é uma mistura de saliva de quatro
indivíduos do sexo masculino (elimina-se assim o fator hormonal), com idades compreendidas
entre os 25 e os 35 anos, não fumadores, sem toma de fármacos nos sete dias anteriores à
recolha nem com comportamentos desviantes. Adicionalmente os indivíduos foram impedidos
de ingerir alimentos, no espaço de três horas antes da colheita.
21
2.2. Métodos
2.2.1. Coeficiente de atrito
O estudo dos mecanismos de atrito, desgaste e lubrificação associados ao sistema
tribológico zircónia/titânio é pertinente no sentido de entender os processos que poderão estar
na origem de problemas associados à falha dos implantes. A extrapolação dos resultados
apresentados na literatura para os sistemas reais não é linear, pois todos eles foram realizados
em condições não lubrificadas (ar, oxigénio ou vácuo) ou na presença de lubrificantes como a
água ou solução Ringer 46,47, 75-73
. A composição complexa e as propriedades do fluido (saliva)
que contacta com estes materiais na boca poderá afetar significativamente o seu
comportamento tribológico. A falta de estudo e informação neste campo tornou necessário a
realização deste trabalho.
O comportamento tribológico do par ZrO2/Ti6Al4V foi estudado determinando o
coeficiente de atrito em diversas condições, nomeadamente, a seco e em condições
lubrificadas. Neste último caso, além de água, utilizou-se uma solução de sais para simular a
composição do eletrólito da saliva e soluções de biomacromoléculas existentes na saliva (ver
secção anterior): solução de albumina, eletrólito + albumina, eletrólito + mucina, eletrólito +
lisozima. Realizaram-se também testes usando como lubrificante saliva humana.
O coeficiente de atrito foi determinado utilizando um nanotribómetro CSM
(InstrumentX). O componente principal deste equipamento é um cantilever que está associado
a dois sensores óticos capazes de medir a deflexão normal e lateral durante a fricção dos
materiais do par tribológico.
22
Figura 9: Esquema representativo do cantilever usado no nanotribómetro – adaptado de 52
.
No presente trabalho utilizou-se uma geometria esfera-placa, conforme ilustrado na
Figura 9. A placa (amostra) movimenta-se com uma velocidade e amplitude pré definidas (ver
abaixo). A força de atrito contraria o sentido do movimento fazendo com que o contra-corpo
seja puxado na direção oposta, o que origina a deflexão do cantilever. O equipamento permite-
nos determinar a força de atrito, tensão de contacto e desgaste provocado durante o ensaio
tribológico, a partir da variação do sinal do feixe de infra-vermelhos incidente nos espelhos e
que é depois refletido pelos mesmos, que depende dos valores de Força Normal e Força
Lateral (FN e FT, respetivamente) 38,43,52
.
Além da velocidade de deslizamento, e frequência do movimento, o equipamento
permite controlar a força aplicada. É também possível controlar condições ambientais como a
humidade e utilizar uma célula de líquidos para trabalhar em meio lubrificado, o que permite
uma aproximação às condições existentes nos sistemas biológicos.
Para escolher os parâmetros de trabalho do presente estudo, fez-se um levantamento
dos dados disponíveis na literatura relativamente às condições existentes na boca e a que os
implantes dentários estarão expostos quando in vivo.
Para calcular a força aplicada durante a mordida humana (FN), começou-se por calcular
a componente elástica do contacto entre os materiais em estudo, através da equação 3 (página
15) Para tal foi necessário dispor dos valores dos módulos de Young e dos coeficientes de
Poisson quer para a zircónia, quer para a liga metálica. Esses valores constam das Tabelas 4 e
5.
Tabela 4: Módulo de Young, coeficiente de Poisson e raio da esfera da liga de titânio usada 53
.
Dados do Ti6Al4V Valores (S.I.)
𝑬𝟏 1,14x10
11Pa
𝝑𝟏 0,342
𝑹𝒆𝒔𝒇 𝟏 1,50x10
-03m
23
Tabela 5: Módulo de Young, coeficiente de Poisson para a zircónia 53
.
Dados do ZrO2 Valores (S.I.)
𝑬𝟐 2,05x10
+11Pa
𝝑𝟐 0,31
𝑹𝒆𝒔𝒇 𝟐 1,40x10
-03m
Os dados disponíveis na literatura apontam para valores entre 70 e 700N 5,22–24,26,27
para a força exercida na mastigação. Assumindo que a área de contacto entre 2 dentes é de
2x10-6
m2, a pressão correspondente variará entre 35 e 350MPa. Tomou-se um valor intermédio
para a pressão máxima 237MPa. Tendo em conta que, conforme se referiu anteriormente
(página 16), a pressão média corresponde a 2 3⁄ da pressão máxima, obtém-se 158MPa para
a pressão média, que também cai dentro do intervalo apresentado. A partir destes valores
estimou-se a força FN a aplicar nos ensaios, tendo-se obtido 20mN.
Selecionou-se o cantilever ML – 205, com intervalo de forças na gama de 0,048mN a
156,4mN para 𝐹𝑁 e de 0,091mN a 298,8mN para 𝐹𝑇. E que, deste modo, possibilita a aplicação
da força estimada (𝐹𝑁 = 20mN) nos ensaios nanotribológicos.
O valor usado para a velocidade de deslizamento foi de 0,65cm/s e para a amplitude
total de movimento foi de 1 mm. Cada ensaio teve a duração de 10 minutos (correspondente a
1300 ciclos). O cantilever usado nos ensaios experimentais foi o ML – 205. Todos os ensaios
tribológicos foram efetuados à temperatura ambiente e em triplicado. Na tabela 6 encontram-se
resumidos os parâmetros experimentais usados nos ensaios.
Tabela 6: Parâmetros utilizados nos ensaios nanotribológicos.
Parâmetros Valores
Velocidade 0,65cm/s
Amplitude 1mm
Número de ciclos 1300, 2Hz
Força 20mN
Os pares tribológicos em estudo apresentam duas geometrias inversas: esfera
cerâmica/superfície plana metálica (geometria 1) e esfera metálica/superfície plana cerâmica
(geometria 2). No caso da geometria 1, além das superfícies planas metálicas não revestidas,
24
investigou-se também o comportamento de superfícies revestidas com o cerâmico duro TiN. Os
sistemas estudados são os ilustrados na Figura 10.
Figura 10: Pares tribológicos usados nos ensaios de atrito. (i) Esfera (contra-corpo) de zircónia e amostra (corpo) de titânio; (ii) Esfera (contra-corpo) de titânio e amostra (corpo) de zircónia; (iii) Esfera (contra-corpo) de
zircónia e amostra (corpo) de nitreto de titânio.
É importante salientar que os ensaios em condições lubrificadas só foram possíveis de
realizar com o auxílio de uma célula de líquidos que permitia que a amostra se encontrasse
totalmente imersa nas soluções preparadas (referido em 2.2). Este processo teve como
finalidade impedir que a esfera (contra-corpo) sofresse forças de capilaridade e, assim, que
pudessem afetar o coeficiente de atrito.
ZrO2
Ti6Al4V
Ti6Al4V
ZrO2
ZrO2
TiN
(i) Geometria 1 (ii) Geometria 2
(iii) Geometria 3
25
2.2.2. Caracterização das Superfícies
2.2.2.1. Topografia
Microscopia atómica de varrimento (Atomic Force Microscopy – AFM) é uma técnica de
microscopia avançada, tendo sido introduzida em 1985 a fim de tornar possível a obtenção de
imagens topográficas da superfície de materiais com elevada resolução, em tempo real, bem
como permitir a análise da rugosidade da superfície numa nano escala 39
.
As propriedades físicas das superfícies dos implantes de titânio são determinantes para
uma boa biofixação do mesmo no osso. Para melhorar a performance biomecânica, é
necessário ter em consideração a morfologia e topografia da superfície dos materiais e estudo,
devido à direta influência deste na resposta biológica que ocorre na interface 4,54–57
.
O microscópio de força atómica AFM é um equipamento que permite a obtenção de
imagens tridimensionais de alta resolução das superfícies de materiais permitindo a sua
caracterização topográfica e morfológica. É composto de três elementos essenciais: uma
sonda com cantilever cuja ponta afiada (tip) varre a superfície, um fotodetetor de feixe de laser
refletido e um material piezoelétrico que se move nas três direções (x,y,z). A formação da
imagem da superfície é feita através do varrimento da tip sobre a superfície. Durante este
processo, o cantilever vai deflectir devido às forças de interação que se estabelecem entre a tip
e a superfície da amostra. Este movimento irá alterar a posição do feixe de laser que incide
sobre a amostra e será detetado pelo fotodetetor – Figura 11.
Figura 11: Diagrama da formação de imagem em AFM – adaptado de 58
.
As forças envolvidas são essencialmente interações de Van der Waals, que podem ser
repulsivas (por ex. sofre deflexão) ou atrativas (por ex. no caso de não haver contacto) 59
.
26
Existem três modos de imagem:
Contacto direto (força repulsiva): a tip pode sofrer deflexão devido a interações
de Van der Waals e às forças magnéticas. A formação da imagem é rápida todavia pode
danificar a superfície no caso de amostras menos rígidas;
Contacto intermitente: o cantilever oscila na sua frequência de ressonância e
mantem uma amplitude de oscilação constante, a imagem topográfica da amostra é obtida
através de um mecanismo de feedback;
Não contacto (força atrativa): a oscilação ocorre acima da amostra e não
existindo qualquer contacto. A aproximação da superfície a uma curta distância provoca a
diminuição da amplitude de vibração devido à presença de um gradiente de forças atractivas
originado pela superfície. Quando é estabelecida a nova amplitude de vibração, esta mantém-
se constante e efetua-se o varrimento 39,59
.
Figura 12: Tipos de Contacto usados em AFM – adaptado de 59
.
Neste trabalho, as superfícies dos materiais em estudo foram analisadas por AFM da
Nanosurf easyscan2. Foram obtidas imagens topográficas de 10x10µm2, em modo de contacto,
utilizando tips de silício (PPP CONTSAuD), com frequência de ressonância entre 1 – 57KHz e
força constante entre 0,01 – 1,87N/m. Foram obtidas duas imagens distintas em cada uma de
três amostras.
27
𝜃
2.2.2.2. Molhabilidade
A molhabilidade de uma superfície sólida é a capacidade de um determinado fluido
aderir ou se espalhar sobre essa mesma superfície e é determinada termodinamicamente pelo
ângulo de contacto entre o fluido e a superfície. A molhabilidade depende das características
químicas e físicas da superfície, nomeadamente a sua composição, presença de grupos
funcionais, heterogeneidade e rugosidade 60,61
. Os tratamentos das superfícies afetam a sua
molhabilidade. Esta está relacionada com a energia de superfície e influencia o grau de
contacto entre o meio e a superfície do implante inserido: uma maior molhabilidade favorece a
interação entre a superfície dos implantes e o meio biológico.
Existem vários métodos para determinar a molhabilidade de uma superfície. No
presente trabalho procedeu-se à determinação da hidrofilicidade dos materiais em estudo,
através da medida de ângulos de contacto com a água, num goniómetro. A elevada
sensibilidade deste tipo de análise superficial, aliada à sua simplicidade, tornam-na numa
poderosa ferramenta para a investigação e desenvolvimento de biomateriais.
Utilizou-se o método da gota séssil, que constitui uma das técnicas mais simples para
determinação dos ângulos de contacto estáticos, sendo por isso a mais utilizada.
O procedimento experimental resume-se a uma gota do líquido sobre a superfície em
estudo e a determinar o ângulo de contato, i.e., o ângulo formado pela tangente à superfície da
gota no ponto triplo (ponto de coexistência de gás, sólido e líquido) e a superfície sólida –
Figura 13. Este ângulo depende da relação entre as forças adesivas do líquido e da superfície,
que fazem a gota espalhar-se pela superfície, e as forças coesivas do líquido.
Num sistema ideal em equilíbrio (Figura 15), o ângulo de contacto relaciona-se com as
tensões interfaciais sólido-líquido (SL), sólido-gás (SG) e líquido-gás (LG) através da
equação de Young 55,60
.
𝛾𝑆𝐺 = 𝛾𝑆𝐿 + 𝛾𝐿𝐺 cos 𝜃 𝑒𝑞𝑢𝑎çã𝑜 6
Figura 13: Ângulo de contacto entre um líquido e uma superfície sólida 55
.
28
Na figura seguinte está representado o equipamento usado para a análise de
ângulos de contacto, o goniómetro, que é constituído por uma câmara de vídeo (JAI CV-A50),
instalada num microscópio (WildM3Z) e ligada a um frame grabber (Data Translation DT3155).
Figura 14: Representação esquemática do goniómetro 60
.
As amostras utilizadas nas medidas de molhabilidade foram previamente secas em
forno de vácuo durante 24h sem aquecimento. Colocou-se individualmente cada amostra na
câmara a temperatura ambiente e, de seguida, com o auxílio de uma seringa, depositou-se
uma gota de água Mili-Q sobre a amostra. De seguida procedeu-se à aquisição de imagens de
10 em 10 segundos durante 1 minuto. Foram adquiridas imagens de pelo menos dez gotas
para cada tipo de material. A análise do ângulo de contacto foi feita utilizando o software
ADSA-P (Axisymmetric Drop Shape Analysis – Profile). O referido software faz o ajuste do perfil
da gota à equação da Lei de Laplace que relaciona a energia superficial e a forma da gota.
29
2.2.2.3. Morfologia
Conforme afirmado no ponto 1.3, o comportamento tribológico dos materiais é afetado
pela estrutura superficial destes. Considerando este fator, verificou-se a necessidade de
visualizar a microestrutura das amostras estudadas, recorrendo à técnica de microscopia
eletrónica de varrimento (Scanning Electron Microscopy – SEM). O SEM é essencialmente
constituído por um canhão de eletrões, por bobinas, por lentes de condensação e por uma
bobina de varrimento (Figura 15). As lentes apresentam como função concentrar o feixe
eletrões produzido pelo filamento de tungsténio, enquanto a bobina faz incidir o mesmo
diretamente sobre a amostra. Quando o feixe primário de eletrões interage com um átomo da
amostra, os eletrões podem sofrer colisões inelásticas com os eletrões das camadas exteriores
desse átomo, e podem receber energia cinética suficiente para serem emitidos do átomo e se
propagarem ao longo do material (eletrões secundários). Podem ainda aparecer, para além dos
eletrões secundários mencionados, Raios-X e eletrões Auger.
Os eletrões secundários são recolhidos pelo detetor, que permitirá reproduzir uma
imagem da superfície analisada num ecrã de tubo de raios catódicos.
As amostras a ser observadas são introduzidas no equipamento e submetidas a vácuo
a fim de impedir a oxidação do filamento de tungsténio e a presença de partículas de ar e pó
que possam entrar em colisão com os eletrões incidentes ou provenientes da amostra,
impossibilitando a subsequente interação dos eletrões com a amostra ou a sua deteção.
Resultando numa diminuição significativa da quantidade da imagem obtida.
Figura 15: Esquema representativo de um microscópio eletrónico de varrimento (SEM) – adaptado de 62
.
30
Esta técnica tem como principal vantagem a formação de imagens com alta resolução
(~0,1nm) e o facto de permitir uma elevada gama de ampliações (10x~10000x) 39,43
.
O aparelho usado na análise SEM foi o Hitachi S2400 a operar com uma tensão de
20kV, para se obterem imagens por eletrões secundários. Realizaram-se análises em duas
amostras de cada tipo, obtendo-se imagens com diferentes ampliações.
De salientar que quando a amostra não é condutora de eletrões impossibilita a
obtenção de imagens. Como tal, é necessário realizar um revestimento prévio com um filme de
um material condutor como o ouro 32
. No corrente trabalho, apenas as amostras de zircónia
necessitaram deste revestimento, visto serem materiais cerâmicos, logo, não condutores. As
amostras foram revestidas num aparelho POLARON E500, aplicando uma corrente de
intensidade 12mA durante cerca de 10 minutos. A deposição da camada de ouro foi feita por
bombardeamento, utilizando árgon como gás inerte. O filme de ouro obtido deverá ter uma
espessura da ordem de 1nm.
31
2.2.3. Tribocorrosão
Para realizar os ensaios de tribocorrosão utilizou-se uma técnica desenvolvida
especialmente no âmbito do presente trabalho e que, tanto quanto é do conhecimento da
autora, nunca havia sido antes estudada. A técnica permite a realização de ensaios de
tribocorrosão num nanotribómetro. Para tal acopolou-se ao nanotribómetro CSM um elétrodo
de referência de calomelanos conectado ao potencióstato Gamery Ref.600 e um contra-
elétrodo de platina (feito no laboratório). O elétrodo de trabalho foi o corpo ou contracorpo
de Ti6Al4V. Este equipamento permitiu monitorizar o potencial de circuito aberto (OCP) em
tempo real durante os ensaios nanotribológicos.
Após a montagem do sistema de medida de potencial aberto, seguiu-se um
procedimento experimental análogo ao descrito no ponto 2.2.1., superfície plana e bola foram
imersas no lubrificante contido numa célula de líquidos, onde também se imergiram os
elétrodos de referência e de platina.
Antes de iniciar o movimento relativo das superfícies, os elétrodos foram estabilizados
durante 30 minutos. A polarização foi aplicada nas mesmas condições de força, velocidade,
amplitude e número de ciclos que os ensaios nanotribológicos.
Os ensaios foram realizados em triplicado.
Figura 16: Representação esquemática da montagem para realização de ensaios de tribocorrosão.
32
33
3. Resultados e Discussão
3.1. Caracterização das superfícies dos materiais de
partida
A análise por microscopia de força atómica permite a obtenção de imagens
tridimensionais de alta resolução das superfícies e, como tal, é muito útil para sua
caracterização topográfica e morfológica Assim, é possível estudar a microestrutura e a
rugosidades das mesmas. Esta análise é também importante para aferir a qualidade e
reprodutibilidade das superfícies metálicas usadas neste trabalho (Ti6Al4V), uma vez que foi
necessário poli-las de forma a tornar a sua rugosidade semelhante à da superfície dos
implantes dentários. O software utilizado nesta análise foi o easyscan2.
Na Figura 18 apresentam-se imagens topográficas da parede vertical da conexão e do
anel da conexão superior do implante onde assenta o pilar de um implante dentário de titânio,
identificadas na Figura 17.
Figura 17: Representação esquemática da zona da conexão do implante. II) Anel da conexão superior; I) Parede vertical da conexão.
II
I
34
Figura 18: Imagens topográficas de AFM do implante de titânio (10x10µm2). I) Parede da conexão do implante; II)
Anel da conexão superior.
A rugosidade obtida pela análise AFM do implante dentário usado comercialmente na
zona que é inserida no maxilar para fixação foi de aproximadamente 86,14nm (Figura 17I),
enquanto a zona de contacto com o pilar foi de aproximadamente 62,18nm, sendo a
rugosidade na zona anodizada de 82,49nm (Figura 17II).
Desta forma, as amostras de Ti6Al4V usadas nos ensaios experimentais foram polidas
de forma a conseguir uma rugosidade semelhante à dos implantes comercialmente usados
para a colocação da prótese. Na Figura 18 apresentam-se as imagens topográficas da amostra
de Ti6Al4V (I) e de ZrO2 (II). A zircónia apresenta uma rugosidade bastante superior à liga de
titânio, 167±7nm, enquanto a rugosidade da liga é de 35,5±0,4nm.
Figura 19: Imagens topográficas de AFM 10x10µm2 das amostras de Ti6Al4V (I) e de ZrO2 (II).
I II
I II
35
Conforme referido na parte experimental, algumas amostras da liga de titânio foram
revestidas com TiN. Após o revestimento as superfícies, apresentam uma rugosidade diferente
da inicial, 3,1±0,6nm – Figura 20.
Figura 20: Imagem topográfica de AFM da amostra de TiN (10x10µm2).
A análise das superfícies por microscopia eletrónica de varrimento (SEM) foi essencial
para identificar eventuais alterações nas amostras após cada uma das experiências
nanotribológicas, nomeadamente na zona do Ti6Al4V que estava em contacto com a superfície
de ZrO2 e que sofreu desgaste, criando uma pista na liga.
Na Figura 21 podemos observar a microestrutura do Ti6Al4V bem como o tamanho dos
grãos da liga que apresentam uma forma hexagonal. Está também representada uma imagem
SEM da ZrO2 onde são visíveis os grãos deste material cerâmico que apresentam menores
dimensões e uma forma irregular.
Figura 21: Imagem de SEM do Ti6Al4V e ZrO2,respetivamente.
36
0
10
20
30
40
50
60
Ân
gulo
de
Co
nta
cto
(gr
aus)
Molhabilidade
Ti6Al4V ZrO2 TiN
Para caracterizar as amostras quanto à sua hidrofobicidade, fizeram-se medições de
ângulos de contacto com água. Cada ensaio teve a duração de 60 segundos, período de tempo
em que os valores de ângulo de contacto se mantiveram praticamente constantes. Na Figura
22 apresentam-se os valores médios (e respetivos desvios padrão) obtidos para as superfícies
de Ti6Al4V, ZrO2 e metal revestido com TiN.
Figura 22: Ângulos de contacto médios obtidos utilizando o método da gota sessile com água nos materiais Ti6Al4V, TiN e ZrO2.
Os resultados demonstram que o ZrO2 é o material mais hidrofílico uma vez que
apresenta menor ângulo de contacto, cerca de 33±5º, seguido do TiN com ângulo de contacto
de 39±6º. O Ti6Al4V apresenta maior ângulo de contacto, 45±4º. Contudo, os valores de
ângulos de contacto não são coincidentes com os verificados na literatura. Por exemplo, no
caso da zircónia, os valores reportados na literatura encontram-se entre os 51,7º no caso de
YSZ e os 72º para a zircónia comercial 63–65. Relativamente aos ângulos de contacto
encontrados para o titânio, estes variam consoante o tipo de liga. Assim, para a liga de Ti6Al4V
os ângulos apresentam valores que variam entre 50º e os 60º, já para o titânio comercialmente
puro (cpTi) os valores encontram-se entre os 58º e os 66º 66–68. Para o caso do TiN os valores
de ângulo de contacto citados são entre os 30º e os 60º 61,69.
São diversos os fatores que podem estar na base destas discrepâncias. Por exemplo:
diferenças no método/condições de medição, diferenças na composição das amostras e na sua
37
forma de preparação (i.e. lavagem, secagem) ou diferenças no acabamento dos materiais,
nomeadamente a rugosidade.
38
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
Co
efi
cie
nte
de
Atr
ito
Soluções
3.2. Ensaios tribológicos
No par tribológico em estudo, a zircónia contacta diretamente com a liga de titânio, tal
como acontece no implante. Este facto tem levantado sérias preocupações, devido à diferença
de dureza entre os dois materiais e ao consequente desgaste da interface, que pode originar
efeitos que se estendem desde o aparecimento de reações alérgicas, desencadeadas pelas
partículas de desgaste da liga metálica, ao afrouxamento da conexão entre o pilar e o corpo do
implante, como se referiu anteriormente. Seguidamente apresentam-se os resultados obtidos
nos ensaios tribológicos realizados, em particular os coeficientes de atrito obtidos para todas as
geometrias estudadas, e os resultados dos ensaios de tribocorrosão.
3.2.1. Coeficientes de atrito
3.2.1.1. Sistema ZrO2 (esfera) /Ti6Al4V (superfície plana)
– geometria 1
Na figura seguinte apresentam-se os resultados dos ensaios nanotribológicos com o
par Ti6Al4V/ZrO2 em que a liga de titânio é o corpo (superfície plana) e a zircónia o contra-
corpo (esfera) (geometria 1).
Figura 23: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nantribológicos realizados com o
par ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana).
39
O valor de coeficiente de atrito mais baixo é verificado em condições a seco (0,5)
enquanto o mesmo atinge valores mais altos quando em contacto com lubrificantes (entre 0,85
e 1,3). Este facto contraria o esperado, pois em geral os sistemas tribológicos em meio
lubrificado apresentam menores coeficientes de atrito que a seco 32
.
Na pesquisa bibliográfica realizada, a informação obtida sobre o comportamento
tribológico do sistema alvo deste trabalho foi bastante escassa. Apenas se encontrou um
estudo, realizado por Wang et al. 70
que compara os resultados obtidos a seco e em condições
lubrificadas (25% soro bovino). Nesse estudo, verificou-se que, para a mesma geometria que
acima se apresentou (esfera de ZrO2 e superfície plana de Ti6Al4V), o coeficiente de atrito a
seco é superior ao observado em meio lubrificado (0,5 contra 0,25). Note-se que esse trabalho
foi realizado com esferas de 6,35mm, com uma força de 3N (~500MPa) e uma velocidade de
0,08m/s.
Noutro estudo, de Luo et al. 71
, em que se realizaram ensaios tribológicos com esfera
de Si3N4 (4mm) contra Ti6Al4V, observou-se que nos primeiros 10 min de ensaio, o coeficiente
de atrito é similar a seco e na presença de lubrificantes (água desionizada, solução salina e
soro bovino). Após este período, o coeficiente de atrito a seco aumenta significativamente, bem
como as suas flutuações, relativamente aos observados nos ensaios em meio lubrificado.
Wang et al. 72
, estudaram o comportamento tribológico de polietileno de ultra alto peso
molecular contra Ti6Al4V, e observaram uma inversão de comportamento com o tempo.
Usaram pinos do polímero com terminação esférica de raio 14mm deslizando sobre as
superfícies metálicas, com uma força de 90N (49,8MPa) e uma velocidade de 0,05m/s.
Verificaram que os coeficientes de atrito em meio lubrificado (água destilada e 50% soro
bovino) se mantiveram constantes ao longo de todo o ensaio. No entanto, o coeficiente de
atrito a seco, que inicialmente é significativamente inferior aos observados nos meios
lubrificados, aumenta continuamente, tornando-se superior a esses após 50 – 60 minutos. Este
resultado vem de encontro ao observado neste trabalho, embora a natureza dos contra-corpos
seja muito diferente, o que irá afetar os mecanismos de atrito e desgaste.
Dado que as condições em que os ensaios tribológicos são realizados (força/carga,
velocidade, tempo) afetam significativamente os resultados obtidos a comparação entre
estudos deve ser feita criteriosamente e de forma cuidadosa. Existem diversos estudos
disponíveis na literatura sobre sistemas esfera cerâmica/superfície plana de Ti6Al4V, mas com
esfera de Al2O3, cuja dureza é superior à da ZrO2 (20 – 30GPa versus 12GPa). Na Tabela 6
apresenta-se, a título de exemplo um resumo desses resultados, podendo-se verificar que os
coeficientes de atrito são da mesma ordem de grandeza dos obtidos neste trabalho. No
entanto, não é possível efetuar comparações diretas, face à disparidade de condições.
40
Tabela 4: Estudos tribológicos no sistema Al2O3(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana).
Diâmetro da esfera Al2O3
Meio do ensaio
Força Velocidade µ Autores
9,53x10-3m Seco 10N 0,3m/s 10m/s
0,49 0,44
73
10x10-3m Eletrólito
saliva 2N N.A. 0,7 46,47
10x10-3m Eletrólito
saliva 3N N.A. 0,5 74
1,5x10-3m Solução Ringer
0,1N – 1N 4x10-3 –
12x10-3m/s 0,4~1,2 75
Voltando à análise dos resultados apresentados na Figura 23, a saliva foi o lubrificante
que conduziu ao coeficiente de atrito mais baixo em condições lubrificadas. No que diz respeito
às restantes soluções/líquidos, não existem diferenças muito significativas a assinalar, exceto
para a albumina, que em água conduz a um coeficiente de 0,95 e em eletrólito a 1,3. As
diferenças observadas em água e em solução eletrolítica para esta proteína, poderão estar
relacionadas com alterações na conformação das moléculas adsorvidas, resultantes das
diferentes forças iónicas dos meios e da adsorção de contra-iões à superfície sólida (no caso
do eletrólito 47,48,76,77
). De realçar ainda que, no caso da mucina observou-se uma maior
dispersão dos valores, o que poderá estar relacionado com a agregação destas moléculas
quando em solução e, assim, aderir à superfície formando uma película. No que diz respeito à
albumina, é uma molécula com relativa facilidade de modificação estrutural e, desta forma,
consegue adsorver-se a praticamente todas as superfícies.
Sabe-se que, em geral, as proteínas se adsorvem às superfícies, formando filmes que
protegem as superfícies. Em ensaios tribológicos realizados à escala macroscópica (por
exemplo, em tribómetros do tipo pin-on-disc), observou-se uma diminuição do coeficiente de
atrito 46,47,74,75
. Contudo, diversos autores referem que numa microscópica, como a usada nos
ensaios nanotribológicos realizados neste trabalho, o comportamento é oposto: os coeficientes
de atrito para superfícies com proteínas adsorvidas são superiores aos observados na
ausência de proteínas 78
. Fatores como a concentração das macromoléculas no lubrificante, o
seu estado de ligação e a eventual interação com outras macromoléculas, podem afetar os
complexos mecanismos tribológicos a esta escala. Em certas condições experimentais, o
estabelecimento de forças de adesão entre moléculas de proteína eventualmente desnaturadas
adsorvidas nas superfícies, pode dificultar o processo de lubrificação.
Com este par tribológico foi visível que em todas as experiências houve transferência
de material da liga de titânio para a zircónia pois, no contra-corpo (esfera) observou-se uma
41
mancha negra na zona de contacto entre os materiais. Quando observada a amostra de titânio
identificou-se uma pista no local onde o material sofreu desgaste.
As imagens obtidas por microscopia eletrónica de varrimento (SEM) para a superfície
de metal após os ensaios realizados em meio seco são apresentadas na Figura 24.
Figura 24: Imagens de SEM do Ti6Al4V na pista de desgaste provocado por ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de ZrO2 a seco.
É possível visualizar os locais onde houve desgaste pelo contacto entre os materiais,
pois é criada uma pista no corpo (superfície). A análise das imagens demonstra que o
mecanismo de desgaste é essencialmente abrasivo, ocorrendo arrastamento e remoção de
titânio ao longo da pista. Este comportamento era expectável, uma vez que a zircónia é um
material bastante mais duro que a liga metálica (Dureza de Vickers da zircónia: 12GPa, Dureza
de Vickers do Ti6Al4V: 3,1GPa)17
Nas Figura 25 e 26 estão representadas imagens de SEM da pista formada na
superfície metálica durante os ensaios com água Milli-Q e eletrólito da saliva, respetivamente.
Em ambos os casos existem sinais de abrasão e é evidente a ocorrência de delaminação,
aparentemente mais intensa na amostra submetida a teste em água. Este mecanismo de
desgaste é gerado principalmente pela deformação plástica de asperezas do metal quando em
42
contacto com uma superfície relativamente à qual desliza. A ação repetida da carga aumenta a
deformação por cisalhamento das asperezas, o que provoca a fratura de algumas delas e
posterior adesão na superfície 17,32
. A existência destes detritos lamelares poderá originar
coeficientes de atrito superiores, explicando as diferenças observadas comparativamente ao
valor obtidos no ensaio a seco.
Figura 25: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos em meio lubrificado com água contra contra-corpo (esfera) de ZrO2, em meio lubrificado com água.
43
Figura 26: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de ZrO2 em meio lubrificado com eletrólito da saliva.
No caso da saliva humana (Figura 27), a pista provocada pelos ensaios
nanotribológicos é semelhante à pista formada a seco (Figura 24), embora não haja
acumulação de partículas nas extremidades. O coeficiente de atrito, no caso do ensaio com
saliva humana, é inferior aos outros ensaios em lubrificante, mas ainda assim superior ao
ensaio a seco. A adsorção às superfícies sólidas das várias biomoléculas constituintes da
saliva e o facto de este líquido apresentar uma maior viscosidade relativamente aos restantes
lubrificantes, são fatores que poderão exercer algum efeito protetor da superfície metálica,
atenuando o desgaste provocado pelo contra-corpo. Ainda assim permanece por explicar como
seria de esperar numa macro escala em que estas adsorvem à superfície do metal.
44
Figura 27: Imagens de SEM do Ti6Al4V após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de ZrO2 em meio lubrificado com saliva humana.
45
0,0
0,2
0,4
0,6
0,8
1,0
1,2
1,4
Seco Água EletrólitoSaliva+BSA
Saliva Humana
Co
efi
cie
nte
de
Atr
ito
Soluções
3.2.1.2. Sistema Ti6Al4V (esfera) / ZrO2 (superfície plana)
– geometria 2
A fim de estudar o efeito da geometria do par tribológico, repetiram-se alguns dos
ensaios anteriores invertendo os materiais: i.e. usando a zircónia como corpo (superfície
plana) e a liga de titânio como contra-corpo (esfera) (geometria 2). Relativamente aos
lubrificantes, selecionaram-se apenas quatro, entre as quais a saliva, uma vez que é o
lubrificante real, a água, por ser o principal constituinte do lubrificante e o eletrólito+BSA
por ser o que conduziu ao coeficiente de atrito mais alto na geometria 1.
Na Figura 28 comparam-se os resultados obtidos com ambas as geometrias.
Figura 28: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nanotribológicos realizados com o par Ti6Al4V/ZrO2 para as geometrias esfera/plano (Geometria 1) e plano/esfera (Geometria 2).
A inversão do sistema Ti6Al4V/ZrO2 (geometria 2) conduziu a um ligeiro aumento do
valor médio do coeficiente de atrito a seco. No entanto, face à dispersão dos valores, a
diferença pode considerar-se pouco significativa.
O facto mais interessante a assinalar com a geometria 2, é a diminuição de coeficiente
de atrito quando se passa do ensaio a seco para condições lubrificadas, comportamento
contrário ao observado com a geometria inicial (geometria 1). Verifica-se que não há grande
variação no valor do coeficiente de atrito entre a água, eletrólito com albumina e saliva
humana, sendo o valor do mesmo aproximadamente de 0,4 a 0,5.
46
Ao contrário do que se havia constatado com a geometria 1, a observação a olho nu
dos materiais constituintes do par tribológico na geometria 2 não permitiu detetar a
transferência de material da liga de titânio para a zircónia nos ensaios a seco. Em meio
lubrificado, ocorre transferência de material, sendo possível detetar facilmente uma pista de cor
escura na superfície da zircónia. Nas imagens de SEM apresentadas na figura 29 identifica-se
facilmente a pista formada, visto que essa região apresenta uma morfologia distinta da amostra
inicial de ZrO2. As imagens sugerem que efetivamente ocorre transferência do metal e
eventualmente remoção de asperezas protuberantes do ZrO2. Os mecanismos de transferência
de metal e remoção de asperezas originam debris de desgaste que, em muitos dos ensaios,
puderam ser identificados a olho nu na forma de pó negro junto da zona do ensaio.
Figura 29: Imagens de SEM da ZrO2 após ensaio nanotribológicos contra contra-corpo de Ti6Al4V em meio lubrificado com eletrólito da saliva.
47
3.2.1.3. Sistema ZrO2 (esfera) / TiN (superfície plana) –
geometria 1
Uma alternativa que tem sido estudada noutros sistemas para aumentar a resistência
ao desgaste é o revestimento das superfícies metálicas com cerâmicos duros como o nitreto de
titânio (TiN). Este revestimento é muito utilizado em próteses articulares e dispositivos médicos
em que é importante preservar a integridade das superfícies 61
.
Realizaram-se testes com os lubrificantes selecionados anteriormente (água, eletrólito
com albumina e saliva humana) e uma geometria análoga à geometria 1, mas desta vez com o
titânio revestido com TiN. Na Figura 30 comparam-se os coeficientes de atrito obtidos para a
geometria 1 com a superfície metálica revestida e não revestida.
Em meio seco, verificou-se que o valor médio do coeficiente de atrito, do sistema com a
superfície metálica revestida com TiN é ligeiramente inferior ao observado com a superfície
sem revestimento. Este resultado está de acordo com o observado por outros autores para
superfícies revestidas com TiN. Com efeito, num estudo efetuado por Yetim et al. 79
com
Ti6Al4V revestido com TiN testado contra esferas de WC-Co a seco, verifica-se que para
diversas forças aplicadas (3 – 20N) e uma velocidade de 78nm/s, o coeficiente de atrito obtido
é sempre inferior ao observado com as superfícies não revestidas. Esta tendência é mais
acentuada para forças mais baixas. De igual modo, o desgaste também é significativamente
inferior para as superfícies revestidas com o cerâmico. Wang et al. 70
chegaram às mesmas
conclusões num estudo efetuado com Ti6Al4V contra UHMWPE, verificando que o coeficiente
de atrito a seco passa de 0,9 para 0,25 quando se aplica o revestimento.
Na presença da saliva, o valor do coeficiente de atrito no sistema revestido é idêntico
ao obtido em meio seco, mas em água e em eletrólito+BSA, os coeficientes de atrito sobem
ligeiramente. No entanto, os valores obtidos com TiN em meio lubrificado são sempre
significativamente inferiores aos do sistema em que o metal não tem revestimento.
48
Figura 30: Coeficientes de atrito em diferentes meios lubrificantes para os ensaios nanotribológicos.
Na observação a olho nu das superfícies de TiN (2400HV) e dos contra-corpos
(esferas) de zircónia após os ensaios nanotribológicos, não se detetaram quaisquer marcas,
pelo que não se procedeu à análise por SEM. Deste modo, pode-se concluir, que o
revestimento com TiN deverá ser vantajoso como forma de proteger a superfície metálica,
conduzindo a um menor desgaste.
0
49
3.2.2. Tribocorrosão
Foram realizadas experiências de OCP a fim de entender o que levava a que o
coeficiente de atrito no caso da geometria 1 aumentasse consideravelmente ao passarmos do
ensaio a seco para as condições lubrificadas, contrariando o que se esperava. Para tal,
fizeram-se ensaios usando o par tribológico ZrO2/Ti6Al4V na geometria 1
(ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana)) e na geometria inversa (geometria 2: Ti6Al4V(esfera)/ZrO2(superfície
plana)), verificando-se que a resposta obtida é significativamente diferente nos dois casos.
Na Figura 29 podemos verificar que quando se inicia o processo de desgaste em
ambos os pares tribológicos, ocorre uma diminuição abrupta do OCP, seguida de um aumento
durante o ensaio de desgaste (região b). Contudo, enquanto no par com a geometria 2
(Ti6Al4V(esfera)/ZrO2(superfície plana)) a diminuição de OCP é 0,58V, no inverso (geometria 1,
correspondente à esfera de ZrO2 e superfície plana de Ti6Al4V) a diminuição é de 0,03V. Após
o ensaio de desgaste o potencial tende a recuperar o valor inicial em ambas as configurações
(regiões c e d).
A diminuição drástica de potencial verificada no ensaio com a esfera de Ti6Al4V indica
que o filme de passivação foi destruído e o metal foi exposto à solução, enquanto na situação
em que o corpo (superfície plana) é Ti6Al4V e o contra-corpo (esfera) é ZrO2, a destruição do
filme de passivação é compensado pela contínua exposição ao meio. Os resultados mostram
ainda que a cinética de recuperação do OCP após o ensaio de desgaste em que a esfera é de
Ti6Al4V e a superfície plana de ZrO2 é menor quando os materiais estão em contacto,
possivelmente devido a dificuldades de arejamento da interface ZrO2/Ti6Al4V, o que conduz a
maior dificuldade na regeneração do filme passivo.
Deste modo, pode-se concluir que a os fenómenos de tribocorrosão, que podem
assumir um papel crítico no par tribológico ZrO2/Ti6Al4V dependem em larga medida da
configuração da geometria do par. Assim os resultados de tribocorrosão indicam que, quando a
liga de titânio corresponde ao corpo plano (Figura 32 a) há remoção do filme de passivação
seguido de exposição permanente ao meio corrosivo. Desta exposição resulta a formação de
produtos de corrosão e o aumento de coeficiente de atrito em meio líquido. Inversamente,
quando a liga de titânio corresponde ao contra-corpo esférico (Figura 32 b), após a remoção do
filme de passivação, a superfície metálica mantém-se protegida de exposição direta ao meio.
Daí resulta que, nesta configuração, o coeficiente de atrito em meio líquido se mantém
relativamente baixo. As diferenças no coeficiente de atrito entre as duas configurações
tribológicas devem-se a diferenças ao nível da superfície passivada, sendo a proteção do filme
de passivação de importância fundamental na resposta tribocorrosiva deste sistema quando
usado em implantes dentários.
50
Geometria 1
Geometria 2
Figura 31: Evolução do OCP para o par tribológico ZrO2/Ti6Al4V nas duas geometrias estudadas (esfera/superfície plana e o inverso) (a) estabilização, b) ensaio de desgaste, c) materiais em contacto sem movimento, d) materiais
sem contacto.
Geometria1 (a)
Geometria 2 (b)
Figura 32: Esquemas representativos dos ensaios de tribocorrosão na geometria 1 (a) e geometria 2 (b).
meio
pista
Zona metálica exposta ao meio líquido.
meio
Zona metálica exposta ao meio líquido.
51
4. Conclusões
Com este trabalho pretendeu-se estudar o comportamento tribológico do sistema
ZrO2/Ti6Al4V, de utilização comum em implantes dentários. Em geral, a falha deste sistema é
responsável pela perda dos implantes, uma vez que o desgaste na conexão entre os dois
materiais, nomeadamente da liga metálica, conduz ao afrouxamento dos mesmos.
Começou-se por caracterizar as amostras quanto à sua topografia, molhabilidade e
morfologia. Os resultados de AFM demonstraram que a rugosidade das superfícies metálicas
usadas é inferior àquela que o implante apresenta, embora da mesma ordem de grandeza (Ra
de aproximadamente 35nm para as amostras usadas e entre 62~86nm para o implante).
Relativamente à molhabilidade das superfícies estudadas, a determinação de ângulos
de contacto com a água pelo método da gota sessile conduziu a valores entre 33º e 45º para
todas as superfícies (Ti6Al4V, ZrO2 e TiN).
A análise da morfologia foi feita por SEM para as amostras de Ti6Al4V e ZrO2 antes
dos ensaios tribológicos, por forma a permitir analisar eventuais diferenças nas superfícies
após os ensaios.
Realizaram-se ensaios nanotribológicos com o sistema em estudo na geometria
ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana) (geometria 1), a seco e em condições lubrificadas, por forma a
mimetizar as condições observadas na boca. Os lubrificantes usados foram: água, eletrólito da
saliva e soluções das biomacromoléculas mais abundantes na saliva (albumina, lisozima e
mucina). De acordo com a literatura, estas proteínas deverão desempenhar um papel
importante na lubrificação e na definição da viscosidade na saliva. Como termo de comparação
foram também realizados ensaios com saliva humana. Selecionou-se uma força de 20mN para
assegurar que a carga utilizada se encontra dentro da gama observada na mastigação. A
velocidade foi 0,65cm/s. Os ensaios foram realizados durante 10 minutos (1300 ciclos).
Observou-se que nos ensaios realizados a seco os valores de coeficiente de atrito foram
menores que em condições lubrificadas, o que constituiu um facto inesperado, já que os
lubrificantes, de um modo geral, reduzem o coeficiente de atrito. De entre as
biomacromoléculas estudadas, a mucina e a lisozima são as que apresentam maior valor de
coeficiente de atrito, podendo com isto dizer-se que, à nanoescala, a sua ação lubrificante é
diminuta. Quando analisados os ensaios com a saliva humana, verifica-se que este fluido é o
que apresenta maior poder lubrificante, uma vez que o coeficiente de atrito é mais baixo
(dentro das condições lubrificadas testadas).
A observação por SEM das superfícies planas (Ti6Al4V) após os ensaios
nanotribológicos revelaram desgaste dessas superfícies. O principal mecanismo de desgaste
detetado nos ensaios a seco foi a abrasão, enquanto em condições lubrificadas são evidentes
52
os sinais de delaminação. O desgaste das superfícies metálicas era expectável face à
diferença entre a sua dureza e a da zircónia. Sendo o cerâmico um material significativamente
mais duro, quando há contato e deslizamento entre esta e a liga de Ti6Al4V, vai ocorrer
remoção e transferência de material da liga para a zircónia.
Para verificar o efeito da geometria do sistema, realizaram-se também ensaios com a
geometria inversa: Ti6Al4V(esfera)/ZrO2(superfície plana). Ao contrário do que se observou na
geometria anterior, nos ensaios a seco o coeficiente de atrito obtido revelou-se maior do que o
obtido nos ensaios lubrificados. Contudo, os valores obtidos em meio lubrificado são bastante
inferiores aos verificados na geometria 1, não se verificando igualmente diferenças
significativas entre eles. A análise por SEM da superfície plana da geometria 2 (zircónia)
permitiu verificar que houve alteração morfológica da superfície da amostra, sugerindo que
houve transferência de metal para a zircónia.
A fim de melhorar o desempenho do par tribológico estudado, investigou-se o efeito de
um revestimento cerâmico duro (TiN) sobre a superfície plana metálica. Com efeito, a utilização
deste revestimento é citada na literatura como uma forma de reduzir o desgaste (e nalguns
casos o atrito) das superfícies metálicas. Os valores de coeficiente de atrito obtidos para o
sistema na geometria 1 com este revestimento foram mais baixos do que os observados sem
revestimento, quer a seco quer em condições lubrificadas, embora neste último caso a
diminuição tenha sido mais acentuada. O decréscimo no coeficiente de atrito pode dever-se à
baixa rugosidade apresentada pelo revestimento, tornando a superfície mais lisa e, assim,
menos sujeita a desgaste abrasivo. Por outro lado, o TiN, ao proteger a superfície metálica,
impediu que ocorresse transferência de material para a esfera, como acontecia no caso de não
haver revestimento. Assim, os resultados sugerem que a utilização de revestimentos de TiN no
par tribológico em estudo deverá constituir uma mais-valia para melhorar o desempenho do
mesmo quando utilizado em implantes dentários.
A fim de compreender porque motivo a inversão da geometria do par tribológico
condiciona os resultados obtidos para o coeficiente de atrito dando origem a comportamentos
inversos realizaram-se testes de tribocorrosão em solução eletrolítica. Estes demonstraram
que, no caso da geometria 1 (ZrO2(esfera)/Ti6Al4V(superfície plana)), a camada de óxido existente
sobre a superfície metálica, que se formou logo após o polimento da mesma, é continuamente
removida e restaurada durante os ensaios tribológicos. Já o mesmo praticamente não se
verifica quando a geometria estudada é a geometria 2 (Ti6Al4V(esfera)/ZrO2(superfície plana)) visto que
a esfera se encontra em contacto permanente com a superfície sólida e que a área de contacto
da esfera é significativamente menor comparativamente à pista na amostra metálica da
geometria1.
53
5. Futuros Trabalhos
Os resultados obtidos ajudaram a compreender os mecanismos de atrito e desgaste
que ocorrem in vivo em implantes dentários de ZrO2/Ti6Al4V e deverão contribuir para o
desenvolvimento de sistemas mais resistentes e duradouros.
Como trabalhos futuros seria interessante fazerem-se testes de desgaste e fadiga com
implantes revestidos com TiN, de forma a prever se efetivamente terão maior durabilidade na
boca dos pacientes.
Poderiam também testar-se outros materiais de revestimento que têm demonstrado
eficácia na proteção de superfícies metálicas, como outros nitretos de titânio (por ex. TiCN ou
TiNbN) ou DLCs (Diamond Like Carbon).
Seria importante também, em trabalhos futuros, garantir que as rugosidades das
amostras testadas fossem mais próximas das observadas nas superfícies dos implantes.
Para completar os testes de tribocorrosão, poderiam fazer-se ensaios com aplicação de
corrente de modo a compreender se o filme de passivação criado na amostra de Ti6Al4V tem
relação direta com tamanho do filme de óxido.
54
55
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