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Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 372
Cidadania na era digital: um
projeto-piloto de formação
de crianças dos 3 aos 9 anos
em contexto formal e
informal de aprendizagem
Citizenship in the digital age: a
pilot project aimed to train young
children in formal and informal
learning contexts
Vitor Tomé
vitor@rvj.pt
CIAC –Algarve University
Faro, Portugal
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 373
Resumo Este artigo apresenta resultados do projeto-piloto ‘Educação para a Cidadania Digital e Participação Democrática’ (2015-2018), na região de Odivelas, Portugal, cujo objetivo consiste em educar crianças, dos 3 aos 9 anos, em cidadania na era digital, num contexto ecológico de aprendizagem (escola, família e comunidade local). Sustentado em diretrizes do Conselho da Europa e em investigação com crianças de 0-8 anos, o projeto formou 25 professoras de Pré-escolar e de 1º Ciclo, que desenvolveram atividades pedagógicas de literacia digital com 366 alunos, sem alterarem as suas planificações previamente estabelecidas. As professoras são grandes utilizadoras de media em termos pessoais, mas fracas utilizadoras em termos pedagógicos. Apontam como razões a falta de formação, a falta de recursos digitais e de apoio técnico nas escolas. Ficaram surpreendidas com a elevada frequência de uso por parte dos seus alunos, o que aponta para a falta de diálogo, com crianças e seus pais, acerca dos media. O projeto continuou depois numa escola, envolvendo oito das 25 professoras formadas e cerca de 200 alunos. Recolhemos dados de alunos, de seus pais e de responsáveis por diferentes entidades da comunidade local. Os resultados serão discutidos com todos os participantes e será elaborado um plano integrado de intervenção em Educação para a Cidadania Digital, a concretizar até junho de 2017. Após avaliação e melhoria, o plano será progressivamente alargado a todas as escolas do Concelho de Odivelas, além de poder ser replicado noutras regiões portuguesas e no estrangeiro. Palavras-chave: Cidadania Digital; Crianças (3-9 anos); Formação de Professores; Contextos formais e informais de aprendizagem.
Abstract This article presents results of the pilot project 'Education for Democratic Citizenship and Digital Participation' (2015-2018), in Odivelas County, Portugal, whose goal is to educate children, aged from 3 to 9, in citizenship in the digital age, within ecological learning context (school, family and local community). Following guidelines from the Council of Europe and from scientific research in digital literacy practices of children aged from 0 to 8, the project trained 25 Preschool and Primary school teachers, who developed educational activities of digital literacy with 366 students without changing their pre-established pedagogical plans. These teachers were great media users in personal terms, but weak users in pedagogical context, mainly due to lack of training, lack of digital resources and technical support at school. They were surprised by the high frequency of media use by their students, which suggests a lack of dialogue with children and with parents about media use. After the training course, the project continued involving eight of the 25 trained teachers and about 200 students. We collected data from children, their parents and from directors of several local community organizations. Results will be discussed with all participants in order to produce a comprehensive plan of action in Digital Citizenship Education, which will be developed until June 2017. After evaluation and improvement, the plan will gradually be extended to all County schools. It may also be replicated in other Portuguese regions and abroad. Keywords: Digital Citizenship; Young children; Teacher training; Formal and informal learning contexts.
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idadania na era digital: participação social, riscos e oportunidades
O acesso à Internet é quase generalizado entre os jovens europeus, sendo
que uma larga maioria dos que têm entre 9 e 16 anos acede à Internet
diariamente (ÓLAFSSON, LIVINGSTONE e HADDON, 2013). Dois em cada três
desses jovens usam media sociais, caso dos media sociais (ex: Facebook, Twitter,
Instagram, Snapchat…), a que acedem cada vez mais através de smartphones
(MASCHERONI e CUMAN, 2014), ou seja, assistimos a uma convergência entre
dispositivos digitais móveis e media sociais (ENDRIZZI, 2012).
Mas o acesso a dispositivos e plataformas online não é sinónimo do exercício
de uma cidadania digital ativa, pois existe um fosso multigeracional em termos de
participação através dos media sociais. As lacunas verificam-se sobretudo ao nível da
análise crítica e da produção reflexiva de conteúdos, da criatividade nessa produção
(STEEVES, 2014). Um estudo realizado em Portugal revelou que 90% dos 549 jovens
(9-16 anos), 75% dos 150 professores e 66% dos 267 pais inquiridos usavam redes
sociais online, mas sobretudo como fonte de informação, meio de comunicação e de
entretenimento. A participação consiste mais na partilha de conteúdos de terceiros
(admitida por cerca de 80% dos professores, 70% dos EE e 60% dos jovens) que da
partilha de conteúdos próprios, com exceção da publicação de fotografias (DE ABREU
e TOMÉ, 2016). Além do acesso a informação, essas redes permitem a criação e
publicação de informação, mas esse potencial está subaproveitado, pelo que há ainda
muito a fazer em matéria de participação efetiva através dos media sociais
(BUCKINGHAM, 2012; JENKINS, 2009).
O uso seguro e eficaz da Internet constitui outra questão premente entre os
jovens, pois 35% dos jovens declararam já se terem sentido incomodados nos media
sociais, apontando como causas imagens violentas, insultos, discussões agressivas,
chantagem, difamação, ciber-perseguição, usurpação de identidade, mensagens de
cariz sexual ou aliciamento (TOMÈ, 2015). Os valores diferem de estudo para estudo,
pois os estudos realizados em países europeus revelam taxas médias de incómodo
da ordem dos 10%, mas a amplitude é grande, variando entre 1% e 50% (AMADO e
MATOS, 2015). Entre adolescentes europeus e americanos, a percentagem de
vítimas constatada em diferentes estudos varia entre 9% e 34% (LINDFORS,
KALTIALA-HEINO e RIMPELÄ, 2012). Só nos Estados Unidos da América, os valores
C
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encontrados em diferentes estudos com crianças e jovens variam entre 9% e 35%
(DAVID-FERDON e HERTZ, 2009) ou entre 10% e 40% (HINDUJA e PATCHIN,
2014).
A elevada percentagem de incómodo é motive de preocupação de professores
e pais, que tendem a encarar crianças e jovens como “vulneráveis” online. Mas
importa ir além dessa visão simplista, uma vez que competências dos jovens, os riscos
e as oportunidades online estão correlacionados, sendo os mais competentes os que
mais riscos correm e que de mais oportunidades beneficiam (LIVINGSTONE, 2014, p.
302).
Por outro lado, se a preocupação com os riscos online é maior, a verdade é que
crianças e jovens estão expostas online e offline, pois o mundo virtual não eclipsou o
físico e o mundo das crianças, embora cada vez mais mediado pela comunicação
online, continua a ser marcado pela casa, pela escola e pela comunidade (HADDON
e LIVINGSTONE, 2014). A forma mais comum de bullying continua a ser pessoal,
face-a-face, pelo que o “bullying online é uma nova forma de um velho problema da
infância e não, simplesmente, uma consequência da tecnologia” (idem, p. 26). A
investigação confirma a tese da migração de riscos do offline para o online, mostrando
que uma vítima de bullying offline tem 10 vezes mais de probabilidade de ser vítima
online do que uma não-vítima (idem). Resultados europeus recentes apontam ainda
para uma subida dos casos de bullying offline (de 7% para 12%) e para uma descida
online (de 14% para 11%) (MASCHERONI e CUMAN, 2014).
Professores e pais, influenciados pelos media e pelos poderes públicos, que
colocam a tónica no carácter perigoso e incontrolável dos media sociais, incitam os
pais a vigiar os filhos, a desencorajar ou proibir o uso (ENDRIZZI, 2012), pelo que
crianças e jovens dissimulam as suas práticas e mentem (BOYD, 2008) o que impede
os adultos de conhecerem as práticas que eles desenvolvem online.
A “chave para a compreensão” dessa realidade reside em “afastarmo-nos das
manchetes – tanto boas como más – e mergulharmos nas realidades mais matizadas
dos jovens” (BOYD, 2015, p. 41). Mergulhar nestas realidades é ainda decisivo para
aproveitar as potencialidades dos media sociais em termos de inovação, de
modernização da escola e da formação de cidadãos. Essas potencialidades cruzam o
contexto formal e informal de aprendizagem e existem a quatro níveis: conteúdo
(acesso a uma enorme variedade, muitas vezes gratuito), criação (utilizadores podem
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criar e publicar os seus próprios conteúdos), conexão (aprendentes estão ligados
entre si), colaboração (aprendentes podem colaborar com professores em projetos,
juntando especialização e potencial) (REDECKER, ALA-MUKTA e PUNIE, 2010).
Urge hoje integrar os contextos de aprendizagem formal e informal, pois, “o
problema midiático-educativo não é só da escola: é problema da família e de todos os
educadores que atuam no território” (RIVOLTELLA, 2012, p. 25), quando se sabe que
a larga maioria dos jovens utiliza media sociais e revela uma clara “preferência por
uma aprendizagem interativa fora da escola” (UNDERWOOD, PARKER e STONE,
2013, pp. 479-80), pondo em causa o tradicional monopólio do saber que lhe era
atribuído.
Há ainda um longo caminho a percorrer, entre a teoria e a prática, no que diz
respeito à integração dos contextos formal e informal de aprendizagem” (PERULLI,
2009), rumo às ecologias de aprendizagem contínuas (MEYERS, ERICKSON e
SMALL, 2013). Os dois contextos são entendidos como quase isolados um do outro,
uma vez que apenas 15% dos docentes e 18% dos alunos concordam que há
aprendizagem de conteúdos escolares nos media sociais, enquanto a aprendizagem
de conteúdos não escolares é admitida por 72% dos professores e por 43% dos alunos
(TOMÉ, 2015).
Constatadas as lacunas, online e offline, em termos de participação social, de
segurança e bem-estar na interação com o outro, e até da conceção holística da
aprendizagem, importa agir no sentido de preparar os cidadãos para colmatarem
essas lacunas, o que deve ser feito ao longo da vida e começando desde o berço
(GONNET, 1999).
2 É necessário formar cidadãos e partir dos primeiros anos de vida
Cerca de 90% das crianças e adolescentes (até 16 anos) começaram a usar
redes sociais online antes dos 13 anos e 40% já tinham perfis em redes sociais aos
oito anos de idade ou antes (TOMÉ, 2015), o que é um indicador que o contacto com
os media sociais começa cada vez mais cedo. Mas esse uso será ainda bem mais
precoce se tivermos como base os media sociais em geral, que começam a ser
usados pelas crianças quando as crianças ainda estão ao colo dos pais, sendo que
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os pais olham muitas vezes para esses media como se fossem brinquedos
(KOTILAINEN e SUONINEN, 2013).
Dados recolhidos junto de 206 famílias que incluíam filhos entre zero e oito
anos de idade, em 18 países europeus, revelaram que a televisão continua a ser o
media mais usado por aquelas crianças, ainda que raramente referido no decorrer das
entrevistas. O tablet é o equipamento mais popular e os smartphones estão presentes
em todos os lares, pelo que as crianças vivem em ambientes digitais ricos, mesmo
quando pertencem a famílias economicamente desprivilegiadas (BRITO e DIAS, 2016;
CHAUDRON, 2016). Cerca de metade das crianças britânicas, com 3-4 anos, usam
tablets e um terço de todas as crianças com menos de cinco anos também (MARSH,
2014). Ainda no Reino Unido, a maioria das crianças com dois anos usa um tablet ou
um computador portátil (SEFTON-GREEN et al., 2016). Um estudo realizado em
quatro países europeus revelou que 60% das crianças com cinco ou menos anos
usam equipamentos digitais, sendo que 23% usam simultaneamente televisão,
computadores e Internet (PALAIOLOGOU, 2016).
Apesar do uso crescente, as práticas online das crianças, sobretudo das que
ainda não são escolarizadas ou que estão nos primeiros anos de escolaridade têm
sido praticamente ignorados pelas políticas da maioria dos países (HOLLOWAY,
GREEN e LIVINGSTONE, 2013). Esse esquecimento é notório na investigação, que
se têm centrado em crianças com nove ou mais anos, pois apenas 12% de cerca de
1200 projetos de pesquisa incluem crianças com menos de sete anos, ao mesmo
tempo que apenas 20% incluem perspetivas de professores e só 13% recolheram
dados junto de pais ou outros responsáveis pelas crianças. A investigação centrou-se
também no uso de Internet e não na aprendizagem com os media, acerca dos media
e através dos media (O'NEILL e STAKSRUD, 2014).
É hoje urgente conhecer as formas como as crianças de 0-9 anos usam as
tecnologias digitais e quais as suas práticas. Sabemos que veem televisão em vários
ecrãs e não apenas no ecrã tradicional. A qualidade dos jogos digitais aumenta e as
suas práticas de literacia digital são construídas em conjunto com pessoas de várias
gerações. São mais independentes no uso, pois preferem ferramentas e aplicações
que dependam menos do texto e mais da imagem, estática ou em movimento, que
gostam de produzir e partilhar, pois a natureza das suas atividades é, sem dúvida,
mais social do que era antes (MARSH, 2014). Mas conhecer as práticas online das
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crianças de 0-8 anos não é suficiente, pois não permite compreender o que elas
significam em termos de aprendizagem, da literacia que estão a desenvolver, da forma
como compreendem o mundo, as relações sociais e que implicações tem o uso de
equipamentos digitais na sua educação global (SEFTON-GREEN et al., 2016).
O digital alargou o âmbito da palavra ‘texto’, que significa hoje qualquer forma
de expressão simbólica, em qualquer formato que transmita um significado, o que
exige mais em termos de descodificação, compreensão, interpretação, organização
de ideias e criação de mensagens com objetivos específicos (HOBBS, 2010). As
experiências precoces de literacia vividas pelas crianças, através de equipamentos
digitais, estão a reconfigurar a forma como produzem sentido e as suas práticas, que
são hoje multimodais: as crianças lidam com palavras, imagens e sons, quer em
plataformas tradicionais, quer digitais. É, por isso, importante, compreender como é
que produzem sentido a partir dos textos multimodais e como é que organizam a
informação, tendo em conta os diferentes modos se justapõem (SEFTON-GREEN et
al., 2016).
3 As literacias e a importância dos contextos
Vivemos hoje na cultura online (DE ABREU, 2011), participativa (JENKINS,
2009) e da conectividade (VAN DIJCK, 2013), marcada pela plasticidade do espaço e
do tempo, pelo existir em rede e em permanência num mundo globalizado e cada vez
mais complexo.
Os cidadãos precisam de ser formados em ‘literacias múltiplas’ (RIVOLTELLA,
2012), ‘multiliteracias’ (SELBER, 2004), ‘literacias pós-modernas’ (MCLAREN E
HAMMER, 2007), ou ‘novas literacias múltiplas’ (KELLNER E SHARE, 2007). Estas
literacias incluem a literacia tradicional - pois, ler, escrever, contar e pesquisar
continua a ser fundamental (BUCKIHGHAM, 2012; SAYERS, 2006) - e a literacia
digital, que consiste em “criar, trabalhar, partilhar, socializar, investigar, jogar,
colaborar, comunicar e aprender” (MEYERS, ERICKSON E SMALL, 2013, p. 356).
Entendemos a designação de literacia digital, não como referente ao uso
técnico de equipamentos digitais, mas como uma prática social que inclui leitura,
escrita e produção de sentido multimodal, através de tecnologias digitais e
tradicionais, além do acesso, uso e análise de textos (em sentido lato: escrita, som,
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imagem estática e em movimento), da sua produção e disseminação, o que exige
capacidades da alfabetização do impresso e do digital (SEFTON-GREEN et al., 2016)
A literacia, além de ser um fenómeno mental, é também sociocultural (GEE,
2010; JENKINS, 2009), pelo que os processos de aprendizagem não são apenas
interiorizados individualmente mas são socialmente distribuídos, com implicações na
pedagogia e na instrução (UNDERWOOD, PARKER e STONE, 2013). A literacia não
é apenas uma questão de competência cognitiva mas também é fundamental para a
democracia e outras formas de participação social (SEFTON-GREEN et al., 2016).
Não é um estado que se atinge, mas um processo permanente, ao longo da vida. As
crianças aprendem por mimetismo, olhando os outros, primeiro os pais e os irmãos,
mas depois vão alargando a observação aos avós, aos primos, aos tios e aos vizinhos
(CHAUDRON, 2015), seguindo-se a escola, a comunidade local e um mundo
progressivamente maior.
Hoje é necessário questionar e refletir sobre a natureza da educação, de forma a
explorar novos tipos de experiências de aprendizagem (UNDERWOOD, PARKER e
STONE, 2013). Os novos projetos de pesquisa na área da literacia digital devem ter
como foco, não apenas o acesso à Internet, as práticas ali desenvolvidas e a produção
de sentido a partir de textos multimodais, mas também os diferentes contextos em que
tal ocorre, o que implica uma atenção especial a quatro aspetos:
a) O papel das crianças, cuja voz é central para compreender as tendências em
termos de uso dos media, bem como o envolvimento das crianças e dos pais
de forma criativa e significativa (MARSH, 2014). Importa observar as crianças
na sua interação com os textos multimodais, não ficando apenas pelo que
dizem que fazem, mas também por aquilo que as vemos fazer (CHAUDRON,
2015).
b) O papel que os pais têm, ou não, na preparação das crianças para o uso das
tecnologias digitais (ÓLAFSSON, LIVINGSTONE e HADDON, 2013), de forma
participativa, crítica, reflexiva, criativa, segura, que permita beneficiar das
oportunidades, controlar riscos e aprender nos media, acerca de media e
através dos media (TOMÉ, 2015). Esta preparação multifacetada, implica que
os pais estejam familiarizados com as ferramentas disponíveis para a
desenvolver (BLÁZQUEZ, CAPPELLO e VALAIS, 2015).
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c) O papel da escola, que deve ser encarado como fundamental em projetos de
pesquisa, sobretudo quando estamos a assistir à transição da Educação 2.0,
na qual as tecnologias de informação e comunicação são ferramentas de apoio,
para a Educação 3.0, na qual a literacia dos media e da informação e a
governança da Internet são os novos conceitos-chave (FRAU-MEIGS e
HIBBARD, 2016).
d) O papel da comunidade local, ambiente informal de aprendizagem por
excelência, de que são exemplos os clubes desportivos e recreativos, as
escolas de dança e música, as bibliotecas, mas também outros serviços
públicos, como os de saúde, formação profissional e emprego.
Além da atenção aos diferentes contextos e ao contexto global da sociedade,
é necessário ter claro o conjunto de competências que um cidadão da era digital deve
desenvolver. O Conselho da Europa, entidade que associa 47 países e cuja missão
consiste em defender os direitos humanos, a democracia e a igualdade perante a lei,
acaba de publicar um modelo de competências (valores, atitudes, capacidades,
conhecimento e compreensão crítica) que os cidadãos devem desenvolver para
participarem ativamente numa cultura democrática (Council of Europe, 2016). , já em
2016, iniciou o projeto ‘Educação para a Cidadania Digital’, que tem como objetivos
definir orientações para a preparação de crianças e jovens, em contextos formal e
informal de aprendizagem.
O Programa de Cooperação Europeia em Ciência e Tecnologia (COST) está a
financiar a ação The Digital Literacy and Multimodal Practices of Young Children
(Digilitey), que reúne investigadores de 33 países europeus e da Austrália, tendo como
objetivo central a criação de uma rede interdisciplinar que consiga compreender as
práticas de literacia digital e multimodais das crianças (zero a oito anos de idade),
além de definir a agenda da investigação futura nesta área e de intervir junto dos
decisores políticos para que seja concretizada uma eficaz ação de desenvolvimento
de competências de literacia digital por parte das crianças europeias (DIGILITEY,
2016).
Estes dois projetos visam então contribuir para a criação de cidadãos digitais,
capazes de exercer uma participação integral na sociedade (RIBBLE, 2011), ou seja,
procuram definir as bases da Educação para a Cidadania Digital, que consiste em
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promover e desenvolver oportunidades de aprendizagem para jovens no sentido de
desenvolverem a proficiência online, o engajamento e a criatividade, a ensinar os
jovens a trabalhar, viver e partilhar em ambientes digitais, de forma positiva, para que
não se foquem no uso de media digitais numa perspetiva negativa (SHAHEEN, 2011).
Outras entidades têm definido domínios de formação em Cidadania Digital,
além de terem organizado orientações para diferentes graus de ensino (Pré-escolar
ao Secundário), apoiando jovens, pais e a formação de professores. São exemplos a
americana Common Sense Media (s.d.), o programa Media Smarts do Canada’s
Centre for Digital and Media Literacy (s.d.), o projeto Cybersmarts, do Office for
Children’s eSafety Commissioner (s.d.), do governo australiano, ou o projeto
neozelandês Netsafe (s.d.). Em termos europeus o projeto DIGICOMP (FERRARI,
2013) definiu também um enquadramento para o desenvolvimento e compreensão da
competência digital na Europa. A designação dos domínios de formação propostos
varia de acordo com as entidades, que sintetizamos em: Acesso, Privacidade e
Segurança, Comunicação e Participação, Literacia dos Media e da Informação,
Questões éticas e Legais, Direitos e Responsabilidades, E-identidade, E-saúde e bem
estar e E-comércio.
Tendo em conta a necessidade de criar cidadãos digitais logo desde os
primeiros anos de idade, em contextos formais e informais de aprendizagem,
desenvolvemos o projeto ‘Educação para a Cidadania Digital e Participação
Democrática no Concelho de Odivelas’, com foco em crianças dos 3 aos 9 anos, nos
contextos escolar, familiar e comunitário.
4 Um projeto-piloto de intervenção em Cidadania Digital
O projeto teve início em janeiro de 2015, no Concelho de Odivelas (localizado
na Área Metropolitana de Lisboa) que tem 145 mil habitantes, apresenta a segunda
maior densidade populacional do País (5424 hab/Km2). Metade da população (51%)
concluiu apenas a Educação Básica (9 anos) e um quarto só concluiu o 1º Ciclo (4
anos). A população em idade escolar é de 11% (total da população jovem é de 15%)
e 16% do total da população é de origem estrangeira.
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São nossos objetivos centrais formar cidadãos em literacia digital, promover e
divulgar boas práticas de formação em contextos formais e informais de
aprendizagem, contribuir para a integração da Educação para a Cidadania Digital nos
curricula e assumir uma lógica que seja replicável noutras regiões de Portugal e no
estrangeiro.
A primeira fase do projeto decorre até fevereiro de 2018 e visa responder a três
questões: i) Até que ponto a formação contínua de professores em Educação para a
Cidadania Digital melhora as práticas de literacia digital desses professores, na sala
de aula, com os seus alunos? ii) Quais são as práticas de literacia digital de crianças
dos 3 aos 9 anos nos contextos da família, da escola e da comunidade local? iii) De
que forma o contexto formal e o contexto informal de aprendizagem moldam as
práticas de literacia digital de crianças dos 3 aos 9 anos?
Neste artigo procuramos responder à primeira questão e apresentar pistas
sobre a resposta às outras questões, com base em dados ainda em análise, pois o
projeto foi iniciado em janeiro de 2015 e termina esta fase-piloto em fevereiro de 2018.
5 Metodologias
A abordagem metodológica deste projeto de investigação-ação, de cariz
exploratório, tem sido alvo de melhorias frequentes, considerando nós que a sua
matriz se enquadra no modelo apresentado na Figura 1 e desenvolvido por Sefton-
Green et al. (2016) – inspirado em autores como Carrington (2013), Colvert (2015) ou
Green (1988) – segundo o qual há três áreas que estão na base da forma como o
indivíduo produz e receciona as mensagens media, quer em contexto formal quer em
contexto informal, nomeadamente: i) a operacional inclui capacidades e competências
necessárias para ler, escrever e interpretar mensagens dos diferentes media e nas
suas várias plataformas; ii) a crítica consiste na capacidade de interagir criticamente
com os textos e produtos digitais, procurando responder a questões relacionadas com
o poder e agenciamento, representação e voz, autenticidade e veracidade; iii) a
cultural diz respeito às interpretações e ações que desenvolve em função do seu
envolvimento em práticas de literacia digital em contextos sociais e culturais
específicos.
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Fig. 1 – Áreas, níveis de decisão e enquadramentos das práticas de literacia digital das crianças (adaptado de SEFTON-GREEN et al., 2016)
As três áreas não são estanques mas interrelacionam-se. Quando um cidadão
quer, por exemplo, comunicar uma mensagem, opera essas três áreas e toma
decisões a quatro níveis: design (se a mensagem é multimodal, ou não); produção
(como cria o texto); distribuição (quais são os canais que escolhe) e implementação
(imagina como é que os recetores interpretarão a mensagem, em função do
background).
Todos estes processos têm lugar em contextos no seio de enquadramentos que
influem nas práticas de literacia digital das crianças, nomeadamente: o micro (a
própria criança), o meso (contextos formal e informal de aprendizagem, família,
amigos e comunidade local) e o macro (a sociedade como um todo, o Estado-nação).
Tal como prevê o modelo, o nosso projeto parte do micro para o macro
enquadramento, através de uma abordagem própria dos métodos mistos (qualitativo
e quantitativo). Visa intervir nos enquadramentos micro e meso, com crianças,
professores, famílias e com a comunidade local, tendo como foco o empoderamento
das crianças em termos de capacidades de literacia digital. Mas, no seu conjunto e
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dado o seu caráter assumidamente replicável, visamos ter impacto no enquadramento
macro, numa lógica de longo prazo.
Um enquadramento ecológico como este sugere equilíbrio e coerência, mas o
uso de tecnologia é muito mais eclético, de mudança rápida e multidimensional
(CARRINGTON, 2013, citado por SEFTON-GREEN et al., 2016). Visamos manter o
equilíbrio e a coerência mas estruturámos um projeto dinâmico, sujeito a reequilíbrios
frequentes, que tem espaço para tensões, incompatibilidades e reconfigurações
frequentes, no sentido de manter ativamente envolvidos todos os participantes.
5.1 Participantes
Participaram no curso de formação 25 professoras, 10 do Pré-escolar e 15 do
1º Ciclo. Dezassete tinham entre 36 e 50 anos, três entre 26 e 35 anos e quatro tinham
51 ou mais. Quinze professoras tinham entre 11 e 20 anos de serviço, tendo as
restantes entre 21 e 30 (cinco casos), mais de 30 (três casos) ou menos de 10 (dois
casos).
Entrevistámos um total de 42 mães ou pais. Mas apenas 38 autorizaram a
entrevista aos filhos. Como algumas famílias incluíam mais que uma criança,
recolhemos dados de 45 crianças: 25 com 3-6 anos, 16 com 7-9 anos e quatro com
10-12 anos. As crianças com 10 ou mais anos foram incluídas porque quiseram
participar, quando os irmãos mais novos estavam a ser entrevistados.
Da comunidade local estão agendadas entrevistas com o responsável pela biblioteca
pública, do clube desportivo, de centros de atividades pedagógicas fora da escola, o
responsável por uma escola de dança e dois diretores de serviços públicos das áreas
da formação profissional e da segurança social.
5.2 Procedimento
Em 2015 iniciámos a revisão de literatura, estruturámos um curso de formação
em literacia digital para professores de Pré-escolar e 1º Ciclo, que foi acreditado pelo
Conselho Cientifico-Pedagógica da Formação Contínua, a entidade responsável pela
aprovação de cursos de formação de professores em Portugal. Produzimos e
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validámos instrumentos de recolha de dados e apresentámos o projeto aos
agrupamentos de escolas.
O curso de formação de professores teve a duração de 25 horas (oito sessões)
e decorreu entre 4 de janeiro e 29 de fevereiro de 2016. Antes do início da primeira
sessão, 24 das 25 formandas (uma faltou) responderam a um questionário organizado
em quatro secções (total de 27 questões): dados pessoais, uso e práticas de media
sociais, uso pedagógico e potencial uso pedagógico dos media sociais; relações com
famílias através dos media sociais [algumas questões foram adaptadas de MATHEN,
FASTREZ e DE SMEDT, 2015]. Em março, oito dessas professoras, que trabalham
na mesma escola, começaram a desenvolver atividades de literacia digital com os
seus alunos.
Em abril iniciámos a recolha de dados junto de pais, de crianças e de
responsáveis de organizações da comunidade local. O guião de entrevista estruturada
a pais foi organizado em quatro secções (29 questões): dados pessoais; uso e práticas
de media sociais; perceções de uso de media sociais pelas suas crianças, de riscos e
de oportunidades; mediação parental [algumas questões foram adaptadas de
MATHEN, FASTREZ e DE SMEDT, 2015]. Os dados foram recolhidos entre 11 de
abril e 9 de junho de 2016.
O guião de entrevista a crianças [adaptado de CHAUDRON, 2015] foi
organizado em três partes: diálogo inicial para quebra-gelo; dados pessoais; entrevista
(uso de media por parte das crianças, observação desse uso sempre que possível,
capacidades evidenciadas, mediação parental e regras da família). Os dados foram
recolhidos entre 19 de abril e 29 de julho de 2016.
O guião de entrevista a pessoas da comunidade local foi propositadamente
aberto, exploratório, assumindo uma lógica de uma entrevista não estruturada, tendo
como tópicos o trabalho desenvolvido com crianças e jovens, a ação na área da
literacia, perceções de literacia digital e acerca da forma como olham a possibilidade
de participarem no projeto. A recolha de dados ainda decorre
Mantemos um diário de bordo, no qual registamos os contactos dos
participantes, também notas acerca das diferentes entrevistas realizadas, bem como
dados que fomos recolhendo nas escolas, em casas de famílias das crianças e nos
diferentes serviços da comunidade.
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 386
Neste momento decorre o tratamento de dados. Os resultados serão
partilhados com todos os envolvidos em setembro, após o que será desenhado um
plano de intervenção a aplicar nos contextos escolar, familiar e da comunidade local,
de forma integrada. A avaliação terá lugar numa conferência a realizar em setembro
de 2017.
5.3 Análise de dados
Os dados recolhidos dos professores através de questionário foram analisados
com recurso ao Statistical Package for Social Sciences (SPSS). Os relatórios das
atividades de literacia digital que desenvolveram com os seus alunos foram alvo de
análise de conteúdo. Os dados recolhidos junto dos pais estão a ser analisados com
recurso a SPSS (dados quantitativos) e ao programa de análise de conteúdo Atlas.ti
(dados qualitativos). As entrevistas com membros da comunidade serão também
transcritas e analisadas com recurso ao Atlas.ti.
6 Resultados
Os resultados apresentados centram-se nos dados recolhidos juntos das
professoras e nos relatórios das atividades que desenvolveram com os seus alunos
no decorrer do curso de formação. São ainda referidos resultados preliminares
relativos aos pais e às crianças.
As professoras são grandes consumidoras de televisão (21 veem todos os
dias), de Internet (22 usam todos os dias) e rádio (18 ouvem todos os dias), mas fracas
consumidoras de jornais (apenas cinco leem todos os dias) e revistas impressas (22
leem até dois dias por semana). Vinte das 24 docentes têm pelo menos um perfil numa
rede social, sobretudo no Facebook (17/20) e no YouTube (13/20), embora refiram o
LinkedIN (2/20) e o Instagram (1/20). Mas só nove visitam os perfis todos os dias. Seis
visitam menos de um dia por semana e cinco entre dois e cinco dias.
O computador pessoal (24/24) é o meio de acesso à Internet, pois apenas nove
usam os computadores da escola. Só oito acedem à Internet via telemóvel ou tablet
(as mais novas) e as que usam o tablet usam o smartphone. O computador da família
é residual (apenas duas o usam).
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 387
Utilizam a Internet como ferramenta de comunicação, sobretudo através do
email (24/24) e também para pesquisarem informação sobre serviços públicos (17/24),
viagens (15/24), bibliotecas/enciclopédias (14/24) ou espetáculos (14/24). Só 11 de
24 recorrem ao Facebook para ler notícias. Nove procuram cursos online mas só uma
admite frequentá-los. Poucas usam ferramentas de comunicação como serviços de
mensagens instantâneas (7/24) ou o Skype (4/24).
6.1 Uso de media em sala de aula e perceções de aprendizagem
As professoras concordam que os media têm potencial pedagógico no Pré-
escolar e do 1º Ciclo (24/24), pois os alunos aprendem ali conteúdos escolares (23/24)
mas também conteúdos não escolares, em função dos seus interesses específicos
(23/24). O uso de media por alunos de Pré-escolar e de 1º Ciclo promove a
aprendizagem (23/24), uma melhor colaboração entre os alunos (20/24), estimula a
criatividade (21/24), alarga a visão que os alunos têm do mundo (22/24), promove um
maior envolvimento com os conteúdos escolares (20/24) e possibilita a partilha com
audiências mais vastas (19/24). Apenas seis professoras (três de Pré-escolar e três
de 1º Ciclo) afirmam que os media distraem mais os alunos do que os ajudam.
Porém, nas salas de aula, os conteúdos media são usados com frequência
esporádica (alguns dias) e os suportes tradicionais, como jornais/revistas impressas
(19/24) e vídeos/filmes em CD/DVD (20/24), superam os suportes digitais, como
vídeos/filmes online (16/24), os jogos digitais (12/24) ou a Wikipedia (10/24) (Fig. 2).
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 388
Fig. 2 – Recursos media usados pelas professoras na sala de aula (N=24)
Conteúdos televisivos, seja numa televisão (4/24) ou em suportes online (2/24),
são pouco usados pelas professoras nas atividades pedagógicas, tal como conteúdos
rádio, de jornais ou revistas online. As redes sociais online estão ausentes das salas,
ainda que 20 das 24 professoras as usem a nível pessoal. Outros recursos são
“imagens para exploração de conhecimentos ou como dicionário ilustrado”. Nenhuma
professora referiu o uso diário de media na sala de aula.
Os computadores disponíveis nas escolas apenas são usados por metade das
professoras e só sete admitem que os alunos também o usam (Fig. 3).
18
18
15
12
9
9
5
3
2
1
1
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0
1
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1
1
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1
0
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1
0 5 10 15 20
Jornais/revistas impressos
Vídeos/filmes (CD/DVD)
Vídeos/filmes (online)
Jogos digitais
Rádio
Wikipedia
Jornais/revistas online
Televisão
Rádio (online)
Televisão (online)
Redes sociais online
Blogues
Outros
Alguns dias Muitos dias
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 389
Fig. 3 – Recursos media usados na sala de aula, segundo as professoras (n=24)
Os equipamentos mais usados são a câmara fotográfica, o projetor vídeo e o
telemóvel (na maioria das vezes como câmara fotográfica), sendo raro o uso dos
computadores da biblioteca ou da câmara de vídeo. O uso do quadro interativo e do
tablet, quando disponíveis, está reservado às professoras.
Entre professoras do Pré-escolar e do 1º Ciclo apenas existem semelhanças no uso
da câmara fotográfica (8/10 e 11/14 respetivamente). Os outros equipamentos são
mais usados por professoras do 1º Ciclo, caso do computador da escola com acesso
Internet (13/14 contra 6/10), do projetor vídeo (13/14 contra 6/10) e do telemóvel
(10/14 contra 6/10). E só as professoras do 1º Ciclo usam o tablet (3/14), o quadro
interativo (2/14) e a câmara de vídeo (1/14).
O uso de tecnologias em atividades pedagógicas, no espaço escolar, por
professores e alunos em conjunto, é raro no Pré-escolar. Apenas uma professora o
admite e só em relação ao computador da biblioteca. No 1º Ciclo é mais comum, pois
11 professoras afirmam usar o computador da escola com acesso à Internet (7/14), o
projetor (2/14), a câmara fotográfica (1/14) e a câmara vídeo (1/14), em conjunto com
alunos
18
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3
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1
1
1
2
0
7
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0
2
1
0 5 10 15 20
Câmara fotográfica
Projetor
Smartphone
Computador da escola
Tablet
Quadro interativo
Computdares (sala TIC)
Câmara vídeo
Eu uso Ambos usamos
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As professoras apontam como razões a falta de tempo para usar media e
tecnologias na sala de aula, a pressão de preparar os alunos para os exames, a falta
de recursos disponíveis para uso por parte dos alunos e a falta de apoio técnico nas
escolas (todos com 22/24), sendo esta última a razão com que mais professoras
afirmam concordar totalmente (11/24) (Fig. 4).
Fig. 4 – Obstáculos ao uso de media na sala de aula (n=24)
Metade das professoras acreditam que há resistência dos professores e das
direções em relação ao uso de media digitais nas salas de aula. Dezassete admitem
dificuldades em termos de conhecimentos e de formação (9/10 do Pré-escolar e de
8/14 do 1º Ciclo), pelo que, no grupo em análise, há mais professoras de 1º Ciclo que
se sentem preparadas para o uso de media digitais na sala de aula. A idade das
professoras não é aqui uma razão, pois quatro das sete professoras mais jovens
(abaixo de 40 anos) admitem que há falta de formação dos docentes a este nível.
As professoras tinham uma perceção de uso de media por alunos inferior aos
valores reais. Apenas oito professoras (sete de 1º Ciclo e uma de Pré-escolar)
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0
0
0
1
0
2
2
2
2
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15
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2
0
0 5 10 15 20
Falta de tempo
A pressão criada pelos exames
Falta de recursos
Falta de manutenção dos recursos
Falta de formação (como usar...)
Resistência de professores e direções
Discordo totalmente Discordo Concordo Concordo totalmente
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 391
admitiam que entre 50% e 75% dos seus alunos usavam media sociais como o
YouTube ou jogos online. Nenhuma apontou percentagens de uso superiores. Quatro
(de 1º Ciclo) afirmaram que entre 25 e 50% dos alunos usam esses media. As
restantes 12 apontaram percentagens inferiores a 25%, sendo que quatro dessas
professoras afirmaram que nenhum dos seus alunos usava aqueles media. Esta
perceção foi alterada na sequência das atividades desenvolvidas com alunos no
decorrer durante o curso de formação.
6.2 Atividades desenvolvidas durante a ação de formação
Na ação de formação foram abordadas as competências de cultura e cidadania
na era digital, a integração da literacia digital nas atividades pedagógicas,
designadamente de atividades de análise crítica, produção reflexiva e criativa de
mensagens media, em suportes tradicionais e digitais. Essas atividades deveriam ser
realizadas sem alterar as planificações pedagógicas que já tinham definido no início
do ano letivo.
Os professores organizaram-se em 10 grupos de trabalho, planificaram e
organizaram atividades de literacia digital com um total de 366 alunos, sendo 147 do
Pré-escolar e 219 do 1º Ciclo). Contaram com o apoio permanente do formador, com
os recursos e informações disponibilizadas no blogue do curso
(http://canecas2016.edublogs.org/). Cada grupo definiu um tema e justificou a
decisão, estabeleceu objetivos a atingir, que associou às metas curriculares previstas
nos curricula do Ministério da Educação. Estes processos, bem como o
desenvolvimento da atividade e a sua avaliação crítica foram descritos num relatório
final. Cada grupo apresentou ainda o seu trabalho aos outros grupos, na última sessão
do curso de formação.
As atividades estiveram relacionadas com três dos 10 domínios de formação
de cidadãos na era digital: Acesso, Privacidade e segurança, Literacia dos media e da
informação (aqui ao nível da análise crítica e produção reflexiva de mensagens
media). Questões de comunicação e participação, éticas e legais, direitos e
responsabilidades, e-identidade, e-saúde e e-comércio eram de algum modo
abordadas, mas não eram o foco das atividades desenvolvidas.
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 392
Nessas atividades foi notória a preocupação das professoras em conhecerem
melhor a dieta mediática dos seus alunos, o que fizeram através de fichas de recolha
de dados. Num dos casos, entre 77 alunos, com idades entre 4 e 8 anos, constataram
que 67 tinham um tablet pessoal e 15 tinham um smartphone. Noutra escola, de um
meio socioeconómico desfavorecido, entre 51 alunos de 6/7 anos, 39 têm computador
em casa, 38 têm tablet e 24 usam smartphone, ainda que não seja sua propriedade
O uso de recursos media levantou sobretudo dois tipos de questões às
docentes, sendo a primeira o uso seguro da Internet. A título de exemplo, uma
professora de 1º Ciclo explorou previamente com os alunos os cuidados a ter aquando
da realização de pesquisas online (foi explorado o manual ‘Smartie, the Penguin’,
disponível online em http://www.childnet.com/resources/smartie-the-penguin). A
segunda questão centrou-se na falta de recursos na escola (normalmente existem
computadores e um projetor na biblioteca, mas não na sala de aula, não existindo
tablets ou smartphones), que foi colocada a vários níveis:
i) Duas professoras de Pré-escolar solicitaram aos pais que autorizassem os
filhos a levar os tablets para a escola, o que aconteceu. Mas a maioria ficou
reticente, temendo que os tablets pudessem ficar danificados.
ii) Duas professoras de Pré-escolar pediram aos pais que usassem os tablets
em casa, em conjunto com os filhos, auxiliando-os a desenhar, associar
palavras e realizar exercícios com números. Os filhos reproduziram depois
os ecrãs dos tablets numa folha e levaram para a escola. Na opinião das
professoras, esta atividade foi muito importante, pois pais e filhos
constataram que é possível usar o tablet sem ser com fins de
entretenimento.
iii) Não tendo meios para fazer pesquisas online ou jornais diários, na escola,
duas professoras pediram aos seus alunos de 4º Ano (8-9 anos) que
pesquisassem notícias em casa, sobre a decisão do Governo de ter
extinguido os exames de 4º Ano. Os alunos interessaram-se pela tarefa, o
que permitiu realizar uma discussão em grupo, na escola, no dia seguinte.
As professoras conseguiram integrar as atividades nas planificações
pedagógicas que tinham organizado no início do ano letivo (em setembro). Foram
abordados temas como a caracterização dos animais domésticos e selvagens, a
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 393
forma como se organiza um livro, qual a função dos jornais, se as crianças aprendem
com os media, o bullying e como evitá-lo, além da análise crítica de conteúdos media
(jornais impressos e online, vídeos no YouTube, banda desenhada), entre eles a
publicidade. Decorreram atividades focadas no desenvolvimento da consciência
fonológica, na associação de palavras a objetos, na realização de operações de
adição e subtração, de interpretação de imagem e de criação exploratória de texto
coletivo a partir de imagens.
Os alunos debateram assuntos de atualidade, a partir da análise de notícias,
sobretudo de assuntos que lhes diziam respeito (ex.: a decisão do Governo de
extinguir os exames no 4º Ano do 1º Ciclo), que se relacionavam com crianças (a
questão do vírus Zika, a violência doméstica, a crise dos refugiados no Mar
Mediterrâneo) ou catástrofes (ex: uma ameaça de bomba no Aeroporto de Faro). Mas
se falam de questões de atualidade, muitas crianças não vão além dos títulos na
compreensão das notícias, como ficou claro numa atividade desenvolvida com 20
alunos de 2º Ano e 24 de 4º Ano, que teve como ponto de partida uma imagem do
corpo de Alan Kurdi, a criança síria de três anos, que deu à praia no Mediterrâneo, em
2015, e que os media imortalizaram. Aquando da exploração da imagem, os alunos
de 2º ano não conseguiram explicar o que acontecera. Só dois alunos de 4º ano se
recordavam da imagem na televisão e que a criança tinha morrido afogada, mas não
conseguiam explicar porquê. Após a pesquisa em casa, com ajuda de pais, familiares
e/ou pares, todos os alunos sabiam o que tinha acontecido. Mas há alunos que
revelam um conhecimento maior de algumas notícias. Numa atividade com 15 alunos
de Pré-escolar (cinco anos), as professoras exploraram uma imagem de um pequeno
barco, com refugiados, no Mediterrâneo. Se algumas associaram a imagem a um
passeio de barco ou a pessoas que foram pescar, outras referiram que “aquele barco
está a ir para outros mundos”, que eram “refugiados que foram para um barco maior”,
“pessoas fogem da guerra”, revelando um conhecimento que surpreendeu as
professoras.
Já em termos da distinção entre publicidade e notícias, tema da atividade
desenvolvida com um conjunto de 51 alunos de 6/7 anos, as professoras concluíram
que os alunos têm muita dificuldade em fazer a separação. Referiram ainda que os
alunos serão demasiado influenciados pelos anúncios.
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 394
Embora os processos fossem mais importantes que os produtos, consideramos
que estes últimos revelam a facilidade com que as professoras integraram as
atividades nas suas planificações. Do trabalho de dois grupos resultou a produção de
livros: um de identificação de animais domésticos e selvagens, em suporte digital
(Power Point); um de rimas, em que 70 alunos (4-6 anos) foram convidados a
escrever, em folhas A5, duas palavras que rimassem entre si, além de desenharem
os objetos que essas palavras representam. No caso do livro de rimas, os alunos
participavam com o número de produções que quisessem. O livro foi depois
encadernado e disponibilizado na biblioteca. Foi ainda produzida uma versão digital
(Power Point). Previamente os alunos votaram o título do livro e quais os
desenhos/palavras que deveriam integrá-lo, ou seja, praticaram democracia na
escola. Nos restantes grupos, os alunos produziram registos escritos, sobretudo
completando folhas de trabalho previamente organizadas pelos professores, com
desenhos ou com textos coletivos, no quadro da sala.
As professoras organizaram-se em grupos livremente, existindo
condicionantes, pois algumas docentes pertenciam a escolas diferentes, o que
limitava a possibilidade de um trabalho conjunto. Mas mesmo quando era possível
associar professoras de Pré-escolar e de 1º Ciclo num mesmo grupo, essa não foi a
regra, pois apenas ocorreu num grupo.
6.3 Avaliação da ação de formação pelas professoras
O curso de formação foi avaliado com recurso à ficha de avaliação usada pelo
Centro de Formação Leonardo Coimbra, da Associação Nacional de Professores.
Numa escala de quatro itens (de Fraca a Muito Boa), 14 professoras avaliaram a ação
como Muito Boa e 11 como Boa. Quanto à utilidade dos conhecimentos adquiridos
(escala de quatro itens, de Nenhuma a Muita), 19 consideraram-nos de muita utilidade
e seis de alguma utilidade. Nos seus comentários, as professoras destacaram quatro
aspetos:
a) Melhoria da prática pedagógica: “Permitiu que, com os conhecimentos
adquiridos, levar os alunos a refletir sobre diferentes recursos que podem
utilizar para aprender (P1); “Acabou por me surpreender no sentido de
conseguir "agarrar" o interesse dos alunos e motivá-los para uma participação
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 395
crítica dos temas da atualidade” (P3); “a ação deu bastante ênfase a questões
que pareciam irrelevantes mas que, afinal, são bastante pertinentes” (P4);
“Ensinou-me a explorar melhor algumas técnicas que não desconhecia, mas
que não estava tão ciente da importância que tinham” (P11).
b) O trabalho de grupo e o envolvimento dos alunos: “Permitiu realizar atividades
em sala de aula pela primeira vez. Houve liberdade para abordagens em sala
de aula de temas/recursos de acordo com cada turma/escola” (P13); “Trabalho
de grupo possibilitou novas aprendizagens/atitudes” (P14); “Realizar atividades
com os alunos em sala de aula foi um aspeto muito positivo” (P25).
c) A partilha de conhecimentos: “Muito interessante e enriquecedora a experiência
partilhada” (P21); “A apresentação dos trabalhos foi bastante enriquecedora e
permitiu-me realizar algumas aprendizagens e pô-las em prática na minha
atividade letiva” (P23).
d) Conhecimento do uso e práticas dos alunos nos media: “A partir dos trabalhos
realizados pelos alunos chegámos a conclusões que não tínhamos sequer
ponderado inicialmente, por exemplo, que os alunos do Pré-escolar veem
pouca televisão, mas usam o tablet diariamente mais de do que uma hora”
(P24); “Contribuiu para me aperceber da realidade relativamente às tecnologias
em que os meus alunos estão inseridos” (P8).
As declarações das professoras na alínea d) estão de acordo com as respostas
ao questionário que preencheram antes do início do curso de formação. Embora 15
docentes (12/14 no 1º Ciclo e 3/10 no Pré-escolar) admitissem falar com as crianças
acerca da frequência de uso e das práticas nos media, esses diálogos ocorriam
apenas alguns dias. Nenhuma professora admitiu falar desses temas com as crianças
muitos dias ou todos os dias. Esses diálogos centraram-se nas vantagens dos media
em geral, mas sobretudo na pesquisa relacionada com trabalhos de casa e nos riscos
associados ao uso dos media, em especial dos jogos online.
O receio em relação aos media está também presente nas conversas entre
professoras e pais das crianças, que 16 docentes (8/14 de 1º Ciclo e 8/10 de Pré-
escolar) admitiram existirem, embora apenas com frequência esporádica (alguns
dias). Essas conversas centram-se na proibição ou limitação de certas práticas como
o tempo de uso (15/16) e no incentivo de práticas como a pesquisa para trabalhos de
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 396
casa (13/16). Professores e pais falam acerca dos vários media de forma positiva,
sendo as consolas de jogos e o tablet os que mais são abordados numa perspetiva
negativa.
Os dados recolhidos junto dos pais ainda estão a ser analisados, mas a partir
dos que já estão tratados, é possível perceber que, dos 42 pais entrevistados, apenas
11 admitem falar com os seus filhos acerca de media muitos dias (nove pais) ou todos
os dias (dois). Sete referiram nunca o terem feito e 24 admitem fazê-lo
esporadicamente (alguns dias). Estes dados serão melhor compreendidos com a
análise das entrevistas, que ainda decorre. E serão também explicados os dados
relativos às conversas entre pais e os professores relativamente ao uso de media
pelas crianças, que apenas seis dos 42 pais admitem, o que aponta para uma
tendência de quase ausência de diálogo entre o contexto escolar e o contexto familiar
relativamente a esta matéria.
Em termos futuros, as professoras consideraram que este tipo de ações deve
“continuar porque muitas vezes temos dificuldade em trabalhar com os recursos
educativos, que são pouco explorados em sala de aula” (P1). Sugeriram “trabalho de
grupo a partir de vídeos” (P13), “mais trabalho prático para partilhar com as colegas”
(P16), mas se possível realizado nas sessões de formação, dada a “dificuldade de
tempos de encontro dos elementos do grupo para realização/organização do trabalho
e do relatório final” (P17). Em relação aos trabalhos que desenvolveram, consideraram
que “seria útil serem publicitados, apresentados em ações de formação” (P25).
7 Discussão, conclusões e passos seguintes
Este artigo visa contribuir para o corpo de pesquisa em práticas de literacia
digital de crianças dos 3 aos 9 anos e seus professores, em contexto escolar. Aponta
para a falta destas práticas nas salas de aula do Pré-escolar e no 1º Ciclo, sobretudo
devido à escassez de formação de professores em serviço. Mas mostra que, após
frequentarem um curso de formação, as professoras conseguem integrar nas suas
planificações e desenvolver atividades de literacia digital, com os seus alunos.
As professoras reconhecem grande potencial pedagógico aos media, quer em
contexto formal quer informal. Mas se são grandes utilizadoras de media, a nível
pessoal, esse forte uso não se reflete nas suas práticas pedagógicas quotidianas, o
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 397
que está em linha com o que referem outros estudos realizados em Portugal
(PEREIRA, PEREIRA e MELRO, 2015; TOMÉ e DOMINGUES, 2014). Três em cada
quatro professoras inquiridas declaram usar conteúdos media nas suas práticas
pedagógicas, sobretudo jornais ou revistas impressas, filmes, vídeos ou jogos digitais,
estando outros, como a televisão ou as redes sociais, praticamente ausentes das
salas de aula. A interação conjunta das crianças e professoras com tecnologias como
o computador, é fraca no 1º Ciclo e quase nula no Pré-escolar. O uso de smartphone
e tablet está vedado aos alunos, ou seja, o uso dos equipamentos digitais preferidos
pelas crianças europeias dos zero aos 8 anos, não é feito na escola (CHAUDRON,
2016).
A maioria das professoras (22/24) considera que a falta de tempo e de recursos
justificam o fraco uso. Mas mesmo quando existem recursos, falta um adequado apoio
técnico, designadamente ao nível da reparação de equipamentos e da resolução de
problemas. Mesmo havendo apoio técnico, é preciso combater a resistência à
mudança, por parte de docentes e direções (BELLONI, 2012; LE DEUFF, 2011), como
admitem metade das inquiridas. Duas em cada três professoras apontam ainda como
razão a falta de formação na área em termos de uso de media e de tecnologias em
sala de aula, o que é consistente com a literatura internacional (DE ABREU, 2011;
REDECKER, ALA-MUKTA, e PUNIE, 2010; UNESCO, 2015).
Tendo em conta os dados da investigação acerca do uso de media por crianças
em idade precoce (CHAUDRON, 2015, 2016; MARSH, 2014), o fraco uso de media
digitais na sala de aula também pode ser devido a uma perceção errada por parte das
professoras. Apenas um terço das professoras inquiridas (no início da formação)
acreditavam que, entre metade e três quartos dos seus alunos usavam media como o
YouTube ou jogos digitais. Todas as outras referiram percentagens mais baixas, o que
perceberam ser uma perceção errada aquando do desenvolvimento de atividades de
literacia digital com os seus alunos.
Embora o uso de media digitais nas atividades não fosse obrigatório, dois
grupos de professoras desenvolveram atividades recorrendo a tablets e envolvendo
crianças e pais. Tal é importante, pois os pais de crianças em idade precoce não
sabem se os seus filhos devem usar os media ou não, mas consideram que as escolas
não usam e deviam usar essas tecnologias (PALAIOLOGOU, 2016). Os nossos
resultados prévios apontam mesmo para uma quase ausência de diálogo entre
Revista Educação e Cultura Contemporânea, v. 13, n. 31 398
professores e pais relativo ao uso de media por parte dos seus educandos/filho.
Importa, por isso, que sejam desenvolvidas ações no sentido de aproximar os
contextos escolar e familiar, os quais têm um papel fundamental na formação dos
jovens e na sua preparação para o uso eficaz das tecnologias.
As professoras organizaram atividades pedagógicas com o objetivo de levar os
alunos a analisar e a produzir conteúdos media, o que implica desenvolver
competências de análise crítica e de produção reflexiva e criativa. Os conteúdos
media analisados centraram-se em temas da atualidade que, em alguns casos, foram
escolhidos e pesquisados pelos alunos, ligando assim cultura popular e escola. Os
alunos refletiram sobre a comunicação nos diferentes media e sobre a função dos
media na sociedade, ou seja, as professoras não usaram apenas os media para
ensinar, mas também para ensinar acerca de media (HOBBS, 1998). Recomendamos
por isso que seja realizada mais formação de professores. Recomendamos também
que haja mais diálogo entre professores e pais relativo ao uso de media por parte das
crianças.
Os próximos passos do nosso projeto consistem em organizar um plano de
intervenção de forma participada com todos os envolvidos e de o aplicar entre outubro
de 2016 e junho de 2017, após o que será avaliado interna e externamente. O plano
será depois melhorado e progressivamente alargado a todas as escolas do Concelho
de Odivelas, podendo ainda ser replicado noutras regiões de Portugal e até noutros
países.
Referências
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Recebido em 30 -03- 2016, aprovado em 30 -07- 2016
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