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A IDENTIFICAÇÃO DE PROPRIEDADES E A
HABILIDADE DE PLANIFICAÇÃO DE FIGURAS
GEOMÉTRICAS ESPACIAIS
Odaléa Aparecida Viana
Universidade Federal de Uberlândia , Brasil odalea@pontal.ufu.br
RESUMO
Questões sobre geometria espacial destinadas a alunos do ensino
fundamental costumam avaliar o conhecimento sobre figuras
tridimensionais por meio da planificação destas. Este trabalho buscou
identificar relações entre a habilidade de planificar e a nomeação e a
identificação de propriedades de figuras espaciais, características dos níveis
elementares de formação conceitual. Foram sujeitos 147 alunos do sexto e
do sétimo de escola pública, que responderam a um questionário tipo lápis e
papel. O desempenho foi considerado fraco e as análises estatísticas
revelaram que os estudantes se saíram melhor na questão de planificação
que na de conceituação. A correlação moderada entre os desempenhos nas
duas questões mostra que a habilidade de planificação pode estar
relacionada ao conhecimento declarativo dos sujeitos, mas há vários casos
em que os desenhos parecem demonstrar manipulação de imagens mentais,
independente de níveis mais elevados de formação conceitual. O trabalho
sugere atividades que levem o aluno a explorar e descrever propriedades de
figuras tridimensionais e a formar e manipular imagens por meio da
elaboração de desenhos de planificação destas.
Palavras-chave: ensino de geometria, geometria espacial, formação de conceitos, planificação.
V SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA 2 28 a 31 de outubro de 2012, Petrópolis, Rio de janeiro, Brasil
ABSTRACT
Spatial geometry questions destined to elementary school usually evaluate
the knowledge of three-dimensional pictures by means of their planning.
This work aimed to identify relations between the ability to plan and the
nomination and identification of spatial pictures properties, which are
typical of elementary levels of conceptual formation. The subjects were 147
students from sixth and seventh grade of public school, who answered a
questionnaire in a pencil and paper type. The performance was considered
low and the statistical analysis revealed that the students did better in the
planning question than in the conceptualization one. The moderated co-
relation between the performances in the two questions reveals that the
ability of planning can be related to declarative knowledge of the subjects,
but there are several cases in which the drawings seems to demonstrate
manipulation of mental images, regardless of higher levels of conceptual
formation. This work suggests activities that lead the student to explore and
describe properties of three-dimensional pictures and to form and
manipulate images by means of elaborating planning drawings of these
pictures.
Keywords: geometry teaching, spatial geometry, concepts formation,
planning.
1 Introdução
O trabalho com a geometria espacial é proposto pelos Parâmetros Curriculares
Nacionais (BRASIL, 1997) para ser iniciado já nos primeiros anos do ensino
fundamental a partir da manipulação dos sólidos geométricos e da exploração de suas
propriedades e regularidades, com vistas à formação de conceitos.
No entanto, pesquisas mostram que alunos do ensino fundamental e do médio têm
dificuldades para resolver questões relativas à formação de conceitos e ao
desenvolvimento de habilidades em geometria espacial, conforme mostram, entre
outros, os trabalhos de Nascimento et al.(2004), Vasconcelos (2004) e Viana (2010).
Muitos alunos do ensino médio confundem poliedros com polígonos, conforme pode ser
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visto em Proença (2008) e em Proença e Pirola (2011), e outros demonstram estar em
um nível de compreensão e de desenvolvimento de habilidades bem aquém do requerido
pela série (VIANA, 2005, 2010).
São várias as formas de avaliar o conhecimento relativo à geometria espacial,
tendo sido encontradas pesquisas que solicitam, entre outros itens, a nomeação e a
descrição de propriedades e também o desenho da planificação de figuras
(BOIAGO&VIANA, 2010; VIANA, MARIM, FRANCO, 2009).
Nos testes de avaliação educacional feitos em larga escala por órgãos
governamentais, não é raro encontrar, na área de matemática, questões relativas ao
conhecimento em geometria espacial. No enunciado destas questões geralmente é
apresentada uma figura geométrica espacial e é solicitada a identificação da planificação
correta − que deve ser escolhida entre várias alternativas.
A justificativa para esse tipo de questão pode ser encontrada nas matrizes de
referência dessas provas, em que são apontadas as habilidades para identificar figuras
geométricas e suas propriedades a partir das respectivas planificações. Pode-se supor,
então, que o conhecimento sobre um conceito em um nível de identificação de
propriedades deve estar relacionado à habilidade de planificar a figura que representa o
conceito. Assim, por exemplo, o aluno demonstraria estar em um nível de identificação
de propriedades do cilindro se pudesse identificar a planificação correta, conforme
mostra a questão da Figura 1.
Exemplo 1 (Simulado da Prova Brasil – 4º série) Observe o bumbo que Beto gosta de tocar. Ele
tem a forma de um cilindro
Qual é o molde do cilindro?
(A) (B) (C) (D)
Figura 1. Exemplo de questão de geometria
Várias pesquisas (SANTOS, 2003; SANTOS, 2007) buscaram explicar a
formação conceitual por meio do modelo de níveis hierárquicos de Van Hiele (1986),
mas poucos trabalhos avaliaram a geometria espacial (SOLER, 2004; VIEIRA, 2010). A
síntese da literatura internacional sobre o tema, feita por Owness e Outhred (2006),
indica muitos trabalhos que tomaram por base a referida teoria e poucos enfatizando a
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geometria espacial (KOHANOVÁ, 2007). Não foram encontrados trabalhos que
avaliassem a habilidade de planificação.
A habilidade para planificar figuras espaciais foi estudada por Viana (2005, 2009)
como um item do componente espacial da habilidade matemática. A autora encontrou
relações entre esta habilidade e o raciocínio espacial. Sabe-se da importância do
raciocínio espacial e da capacidade de visualização no ensino da geometria e há estudos
que propõem metodologias diferenciadas para a produção de imagens que favoreçam a
aprendizagem nessa área de conhecimento (RITTER, 2011).
Apesar da importância da habilidade espacial em geometria, considerou-se que a
descrição de propriedades de figuras também devesse fazer parte da avaliação
conceitual em geometria. Como não foram encontrados trabalhos que relacionassem a
habilidade de planificar figuras espaciais com a identificação ou com a descrição de
propriedades dessas figuras − características do segundo nível de formação conceitual
−, questionou-se se haveria relação entre essas variáveis.
2 Avaliação de conceitos e de habilidades
As avaliações realizadas pelo Programa de Avaliação da Rede Pública do Sistema
Mineiro de Avaliação da Educação Pública – Proeb/Simave (Minas Gerais, 2009), pelo
Sistema de Avaliação de Rendimento Escolar do Estado de São Paulo – Saresp (SÃO
PAULO, 2009), pela Prova Brasil (BRASIL, 2008) e pelo Exame Nacional do Ensino
Médio - ENEM do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira – INEP (BRASIL, s/d) trazem questões com base em suas matrizes de
referência.
No bloco Espaço e Forma, alguns descritores relativos à geometria espacial dessas
matrizes apontam objetivos com pontos em comum, conforme mostra o Quadro1. Pode-
se observar que vários sistemas de avaliação pesquisados indicam a planificação como
forma de o aluno identificar figuras espaciais.
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Quadro 1. Descritores das matrizes de referência Sistema de avaliação
Série/ano Descritor
SARESP 6º série (7º ano) do EF
H18 - Identificar figuras espaciais a partir de suas planificações.
SAEB 8ª série (9ª ano) do EF
D2 – Identificar propriedades comuns e diferenças entre figuras bidimensionais e tridimensionais, relacionando-as com suas planificações.
SAEB 8ª série (9ª ano) do EF
D3 – Relacionar diferentes poliedros ou corpos redondos com suas planificações ou vistas.
SARESP 8ª série (9ª ano) do EF
H23 - Identificar propriedades comuns e diferenças entre figuras bidimensionais e tridimensionais, relacionando-as com as suas planificações.
PROEB 8ª série (9ª ano) do EF
D2 - Identificar propriedades de figuras tridimensionais, relacionando-as com suas planificações.
SARESP 3ª série EM H25 - Relacionar diferentes poliedros ou corpos redondos com suas planificações.
PROEB 3ª série EM D1 - Reconhecer a planificação de figuras tridimensionais mais usuais (prismas, pirâmides, paralelepípedo, cubo, cilindro e cone)
ENEM EM H7 - Identificar características de figuras planas ou espaciais.
Em algumas questões destas provas são apresentadas diferentes planificações para
a mesma figura espacial, seja esta apresentada na forma de desenho ou descrita
verbalmente. A Figura 2 mostra exemplos de questões de geometria espacial para o
quinto ano do ensino fundamental e pode-se supor que elas estejam relacionadas com a
formação e a manipulação de imagens mentais.
Exemplo 2- 5º ano - PROEB/ SIMAVE
Marcelo desenhou em seu caderno a planificação de um cubo. Qual das figuras abaixo representa o
desenho de Marcelo?
Exemplo 3 – 5º ano -Prova Brasil Os alunos da 4a série estão montando um cubo para fazer um dado para a aula de matemática. Eles utilizam o molde abaixo, onde os números 3 e 4 representam duas de suas
faces paralelas
Sabendo que no dado a soma dos números em duas faces paralelas quaisquer totaliza sempre 7, que algarismos
deverão estar escritos nas faces vazias? (A) (C)
(B) (D)
Figura 2. Exemplos de questões envolvendo a planificação
No Exemplo 2, o aluno deve movimentar mentalmente cada planificação
apresentada e decidir qual delas é a que permite a formação do cubo. Todas elas são
formadas por seis quadrados e mesmo a alternativa correta (c) apresenta uma
planificação diferente das que tradicionalmente aparecem nos livros didáticos. No
Exemplo 3, o aluno deve utilizar cada uma das superfícies apresentadas, formar a
1 2 5 6
2 1 6 5
2 5 1 6
1 2 6 5
3
4
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imagem mental do cubo e girá-lo de modo a conferir se a soma das faces opostas é igual
a sete, conforme indica o enunciado da questão. Assim, considera-se que estas duas
questões apresentadas parecem ter pouca relação com o conceito de cubo em um nível
de análise de propriedades.
A nomeação das figuras, na maioria das vezes, não é avaliada nas questões de
planificação das provas analisadas. A Figura 3 mostra exemplos de questões de
geometria para o nono ano do ensino fundamental e terceira série do ensino médio. O
exemplo 4 da Figura 3 mostra um desenho que sugere um prisma e as alternativas
apresentadas já indicam retângulos e triângulos como faces da figura. O Exemplo 5,
apesar de o enunciado conter a palavra tetraedro, este já traz a indicação de uma
pirâmide de quatro faces triangulares, o que facilita a tomada de decisão acerca da
alternativa correta.
Exemplo 4 - 9º ano EF - Prova Brasil
É comum encontrar em acampamentos barracas com fundo e que têm a forma apresentada na figura
abaixo.
Qual desenho representa a planificação dessa barraca? (A) (B)
(C) (D)
Exemplo 5 – 3ª série EM- Saresp Uma determinada caixa de presentes tem a forma de um tetraedro regular, que nada mais é do que uma pirâmide em que todas as faces são triângulos eqüiláteros. Essa caixa, desmontada, corresponde à planificação descrita
em: (A) (B) .
(C) (D)
.
Figura 3. Exemplos de questões de geometria espacial.
Na maioria das questões analisadas, o aluno pode ser levado a manipular
mentalmente cada uma das planificações apresentadas de modo a verificar, em um
processo de tentativas, se aquela alternativa poderia montar a figura tridimensional.
Supõe-se que essa ação mental seja diferente daquela em que o sujeito, mediante a
apresentação do desenho de uma figura espacial, forma a imagem mental, modifica essa
imagem “abrindo” as superfícies e representa graficamente sua planificação. Na
presente pesquisa, foi feita a opção por esta última ação, ou seja, considera-se como
habilidade de planificação aquela em que o sujeito desenha a planificação a partir da
percepção de uma figura espacial na forma de desenho em perspectiva.
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Quanto à parte conceitual, as provas oficiais apresentadas utilizam as questões de
planificação como uma maneira de verificar se os alunos identificam figuras espaciais,
identificam propriedades de figuras e diferenças entre figuras bidimensionais e
tridimensionais. Outra forma de avaliar a identificação de propriedades é solicitar que o
aluno as descreva, e esta foi a metodologia adotada na presente pesquisa.
Identificar propriedades é uma característica referente a um segundo nível de
conceituação em geometria, conforme a teoria de Van Hiele (1986). Esta teoria tem
sido largamente utilizada por pesquisadores para explicar a formação de conceitos que,
segundo o autor, acontece de acordo com níveis hierárquicos de compreensão. Em um
Nível 1, do reconhecimento, os sujeitos identificam e nomeiam uma figura geométrica
pela sua aparência global, não percebendo características ou atributos. Em um segundo
nível, são descritas propriedades das figuras e, no nível seguinte, são estabelecidas
relações entre os conceitos. O quarto nível refere-se à capacidade de demonstrar
teoremas em uma linguagem formal. E, finalmente, no último nível o sujeito pode
comparar outros sistemas geométricos diferentes da geometria euclidiana.
Conforme descrito por Pozo (1998), o conhecimento sobre conceitos pode ser
avaliado de várias formas; entre elas, pode-se solicitar o reconhecimento da definição,
uma exposição temática, a identificação e a categorização de exemplos mediante
técnicas de evocação e também a resolução de problemas. Apesar disso, todas as formas
de avaliar conceitos apresentam vantagens e perigos potenciais, conforme pondera o
autor. Neste trabalho, para avaliar a conceituação dos sujeitos acerca das figuras
geométricas espaciais, optou-se por solicitar dos sujeitos o reconhecimento, a nomeação
e a descrição de propriedades dos conceitos por meio de um aspecto figural.
Assim, ao apresentar o desenho de uma caixa retangular, questionou-se se o
estudante consideraria o desenho como representação figural do conceito de
paralelepípedo e se conseguiria descrever, por meio de palavras, suas propriedades,
relacionando as figuras espaciais com as planas.
Conforme definido por Sternberg (2000), o conhecimento declarativo é um
corpo organizado de informações sobre objetos, idéias ou eventos e que pode ser
expresso em palavras ou em outros símbolos. No campo das figuras geométricas, o
conhecimento declarativo pode, nessa perspectiva, ser expresso por meio da nomeação e
da descrição de propriedades de figuras tridimensionais.
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3 Conceitos e imagens
Os conceitos analisados neste trabalho referem-se às figuras geométricas
paralelepípedo, pirâmide, prisma e cilindro. De acordo com Fischbein (1993), as figuras
geométricas possuem duas naturezas, pois são ao mesmo tempo imagem e conceito, o
que as caracterizam como “conceito figural”.
Ao solicitar o nome de uma figura e a descrição de suas propriedades –
características do Nível 2 de formação conceitual de Van Hiele (1986) – avalia-se o que
Fischbein (1993) chamou de componente conceitual da figura, já que, segundo o autor,
esta pode ser expressa por meio de palavras faladas ou escritas, com maior ou menor
grau de formalismo. Assim, ao apresentar o desenho de uma caixa retangular,
questionou-se se o estudante consideraria o desenho como uma representação figural do
conceito de paralelepípedo e se conseguiria descrever suas propriedades, relacionando a
figura espacial com as planas que estão em suas faces, por meio de palavras escritas.
Quanto à planificação de figuras espaciais, Viana (2005) identificou a habilidade
de planificar figuras como um item do componente espacial da habilidade matemática,
na perspectiva de Krutetskii (1976). Para o autor, as habilidades matemáticas são
características psicológicas individuais que influenciam o sucesso do indivíduo na
disciplina matemática em âmbito escolar e implicam em aspectos como rapidez,
facilidade e meticulosidade no domínio dos conhecimentos, destrezas e hábitos,
próprios da matemática.
O componente espacial dessa habilidade indicaria a facilidade de uma pessoa em
lidar com conceitos espaciais, principalmente para seccionar, rotacionar e planificar
figuras geométricas. Viana (2008) encontrou relação entre a habilidade de planificação e
o raciocínio espacial. Este último, avaliado por meio de testes psicológicos, é definido
por Primi e Almeida (2000) como a capacidade de visualização, isto é, de criar
representações mentais visuais e de manipulá-las transformando-as em novas
representações.
A formação de imagens mentais tem sido estudada por Viana (2005, 2009) com
base na teoria de Kosslyn (1995), no âmbito da aprendizagem escolar da geometria
espacial. Várias atividades e tarefas que são desempenhadas pelos estudantes nesta
disciplina demandam ações com figuras geométricas e isto implica na habilidade de
formar imagens mentais, manter essas imagens, inspecioná-las, acrescentá-las,
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modificá-las e relacioná-las com outras figuras.
Uma imagem mental visual é um tipo de ativação do campo visual que pode não
ser causada por estímulo sensorial imediato e Kosslyn (1995) defende a hipótese que a
imagem mental visual e a percepção visual compartilham mecanismos comuns. Com
base em aspectos neurológicos, o autor propõe um modelo para explicar como o
organismo processa as informações visuais através de certas áreas do cérebro e de suas
conexões.
O modelo de Kosslyn estabelece sete subsistemas que são usados para explicar a
arquitetura inata que permite ao homem reconhecer o mundo através da visão. Assim,
um indivíduo perceberia um objeto, ou seja, um estímulo visual, utilizando os seguintes
subsistemas: (1) campo visual; (2) painel de atenção; (3) sistema de codificação de
propriedades do objeto (forma, textura, cor); (4) sistema de codificação de propriedades
espaciais (localização e tamanho); (5) memória associativa (para reconhecimento ou
identificação); (6) sistema mais complexo de procura da informação (depende de
conhecimentos, de experiências e de informações contextuais) e (7) sistema de mudança
da atenção (e o processo se reinicia).
O autor aponta diferenças entre as imagens e os perceptos. A imagem mental
desaparece, esvanece rapidamente, o que demanda esforço para mantê-la nítida; ela
pode ser criada a partir de informações armazenadas na memória e também pode ser
modificada, distendida e movimentada. Apesar dessas diferenças, o autor admite que os
mesmos componentes do modelo que explicam a percepção também são usados para
explicar os processos de formação e de manipulação de imagens mentais.
Viana (2005) considera que a habilidade de planificação consiste nas ações de
formar a imagem mental da figura, de inspecioná-la e movimentá-la, mudando o
referencial – ou o ponto de vista – de modo a rebater as faces de um poliedro ou de
desenvolver as superfícies de corpos redondos em um único plano e de representar a
imagem final pictoricamente. Essa habilidade pode ser explicada por meio do modelo
citado, já que o sujeito deve formar a imagem mental da figura (subsistema1), focalizar
partes dessa imagem (subsistema 2), codificar e reconhecer propriedades espaciais
(subsistemas 3, 4 e 5), tendo por base as informações e conhecimentos adquiridos
(subsistema 6).
Parece, então, que todos os citados subsistemas devem ser ativados para que o
sujeito possa planificar as figuras. Entre eles, destaca-se o subsistema 6, pois este está
ligado aos conhecimentos que o individuo possui acerca do objeto. Assim, com base no
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modelo, esta pesquisa procura explicar como o conhecimento relativo a figuras
espaciais - ao qual se refere o subsistema 6 - deve influenciar na formação e
manipulação das imagens mentais envolvidas nas atividades de planificação.
Uma das maneiras de avaliar a habilidade de planificar figuras é verificar se o
sujeito identifica uma planificação correta entre várias alternativas. Outra forma é
analisar o desenho da planificação feito com lápis e papel. Na presente pesquisa,
conforme já indicado, optou-se por esta última.
4 Objetivo, sujeitos, materiais e procedimentos
Esta pesquisa, de caráter descritivo, teve por objetivo verificar, junto a alunos do
ensino fundamental, a existência de relações entre a habilidade de planificação e a
conceituação, ou seja, a identificação e a nomeação de propriedades relativas às
principais figuras geométricas espaciais: paralelepípedo, pirâmide, prisma e cilindro.
Foram sujeitos 147 alunos de sexto e sétimo ano de uma escola da rede municipal
de uma cidade de Minas Gerais, o que caracterizou uma amostra de conveniência.
Considerou-se que alunos destas séries teriam formado os conceitos elementares da
geometria espacial ao longo dos anos iniciais do ensino fundamental e teriam alguma
experiência com a planificação de figuras tridimensionais. Os sujeitos responderam ao
questionário durante a aula, com autorização do professor.
O instrumento era composto por um prova com duas questões, descritas a seguir.
1ª questão: Conceituação
Esta questão tinha por objetivo avaliar os conceitos relativos a quatro figuras
(cilindro, pirâmide, paralelepípedo e prisma hexagonal) por meio da nomeação e
descrição de propriedades. Foram apresentados quatro desenhos em perspectiva das
figuras citadas, e foram atribuídos de zero a dois pontos e meio para cada figura,
totalizando 10 pontos para essa questão. Foram consideradas como corretas as
descrições do tipo: cilindro, duas bases circulares; pirâmide, tem cinco faces, com uma
face quadrada e as outras triângulos; paralelepípedo, possui seis faces retangulares, oito
vértices e doze arestas etc. Para descrições parciais, por exemplo, as que indicavam o
número de faces, ou a forma de algumas faces, atribuiu-se de meio a um ponto e meio.
2ª questão: Planificação
Nesta segunda questão eram apresentadas novamente as quatro figuras e eram
solicitadas suas planificações. Antes, havia a apresentação e explicação sobre duas
planificações distintas de um cubo, como exemplo do que estava sendo solicitado.
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Foram atribuídos entre um ponto e meio a dois pontos e meio para as planificações
regulares e boas, ou seja, as que apresentavam o número correto de faces e articulação
correta entre elas (para os poliedros), mesmo que houvesse erros de medidas. A
planificação correta do cilindro era dada pelo retângulo com duas circunferências
tangentes e com medidas adequadas. As notas variaram de meio a um ponto para as
planificações fracas em que não era observada a proporção entre as medidas das arestas,
erros no número de faces ou não se observavam os círculos tangentes ao retângulo que
representava a superfície lateral do cilindro. Convém esclarecer que a maioria das
planificações foi feita à mão livre, ou seja, sem a utilização de instrumentos de desenho.
Assim, não foram considerados os erros de medidas ou a retidão das linhas que
dependeriam desses instrumentos.
5 Resultados
Os desempenhos dos sujeitos na Conceituação e na Planificação e também na
prova como um todo são mostrados na Tabela 1.
Tabela 1. Estatísticas do desempenho dos sujeitos
Estatísticas Desempenho em Conceituação
Desempenho em Planificação
Desempenho geral
N válido 145 145 145 Mínimo 0,0 0,0 ,00 Máximo 8,3 9,4 15,2 Mediana 0,8 1,3 2,3 Moda 0,0 0,0 0,0 Média 1,3538 2,3986 3,7524 D.padrão 1,4996 2,8768 3,7687
Nota-se que os alunos tiveram baixo desempenho, já que a prova valia 20 pontos.
Os sujeitos do sétimo ano tiveram um desempenho médio superior ao do sexto ano,
conforme pode ser verificado na Figura 4, mas essa diferença não foi considerada
significativa (t143 = - 0,759, p = 0,449). A análise estatística mostrou também que os
sujeitos tiveram melhor desempenho na questão de planificação que na de conceituação
(t144 = - 4,808, p = 0,05).
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Figura 4. Desempenho na Planificação e Desempenho na Conceituação por ano.
Com o objetivo de verificar relação entre o desempenho na questão de conceitos e
na questão da planificação foi calculado o coeficiente de correlação de Pearson, tendo
sido encontrada correlação moderada e significativa entre as variáveis (r = 0,426, p =
0,000), o que leva a concluir que houve uma tendência de os sujeitos com melhores
desempenhos em planificação tenderem a ter os melhores desempenhos em
conceituação; os sujeitos com desempenhos mais fracos em planificação também
tenderam a ter desempenhos inferiores em conceituação. Essa relação é ilustrada pela
Figura 5.
Figura 5. Relação entre Desempenho na Conceituação e Desempenho na Planificação
Verificou-se que muitos sujeitos erraram a nomeação das figuras mais comuns e
que o prisma não recebeu nenhuma nomeação correta. O paralelepípedo e a pirâmide
receberam, respectivamente, os nomes de retângulo e de triângulo, por mais de 80% dos
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sujeitos que nomearam essas figuras. Foi possível verificar, na descrição das figuras, a
utilização de termos não geométricos, como “comprido e redondo”, “afunilado”, e
também a de termos relativos à geometria plana, como “tem três lados”, “dois
quadrados”, “retângulo”, “hexágono”, entre outros.
Os desenhos das planificações foram classificados em categorias que indicaram a
qualidade das representações elaboradas pelos alunos. Foi possível verificar que os
sujeitos que elaboraram desenhos considerados como bons e regulares nem sempre
conseguiram descrever e nomear as respectivas figuras. O Quadro 2 ilustra esse dado
com relação ao cilindro. Da mesma forma, muitos alunos que planificaram corretamente
o paralelepípedo sequer conseguiram nomeá-lo (Quadro 3). Situações semelhantes
aconteceram com as figuras pirâmide e prisma, conforme ilustram o Quadro 4 e o
Quadro 5.
Quadro 2. Comparação entre planificação e conceituação do cilindro
Planificação Conceituação Categorias de
desenho N Exemplos Categorias de descrição N
Representações Boas e
Regulares 15
Corretas 0 Parcialmente corretas 13
Incorretas/não respondeu 2
Subtotal 15
Representações Fracas 23
Corretas 3 Parcialmente corretas 12
Incorretas /não respondeu 9
Subtotal 23
Representações Incorretas
82
Corretas 0 Parcialmente corretas 26
Incorretas /não respondeu 56
Subtotal 82
Não respondeu 27
Corretas 0 Parcialmente corretas 14
Incorretas/não respondeu 13 Subtotal 27
Total 147 Total 147
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Quadro 3. Comparação entre planificação e conceituação do paralelepípedo Planificação Nomeação/descrição
Categorias N Exemplos Categorias de descrição N
Representações Boas e
Regulares 33
Corretas 1 Parcialmente corretas 13
Incorretas/não respondeu 19
Subtotal 33
Representações Fracas 33
Corretas 2 Parcialmente corretas 22
Incorretas/não respondeu 9
Subtotal 33
Representações Incorretas
64
Corretas 2 Parcialmente corretas 6
Incorretas/não respondeu 56
Subtotal 64
Não respondeu 17
Corretas 0 Parcialmente corretas 0
Incorretas/não respondeu 17 Subtotal
Total 147 Total 147
Quadro 4. Comparação entre planificação e conceituação da pirâmide Planificação Nomeação/descrição
Categorias de desenhos N Exemplos Categorias de descrição N
Representações Boas e
Regulares 37
Corretas 5 Parcialmente corretas 19
Incorretas /não respondeu 13
Subtotal 37
Representações Fracas 21
Corretas 7 Parcialmente corretas 4
Incorretas / Não respondeu 10
Subtotal 21
Representações Incorretas
59
Corretas 2 Parcialmente corretas 17
Incorretas / Não respondeu 40 Subtotal 59
Não respondeu 30
Corretas 1 Parcialmente corretas 7
Incorretas / Não respondeu 19 Subtotal 30
Total 147 Total 147
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Quadro 5. Comparação entre planificação e conceituação do prisma Planificação Nomeação/descrição
Categorias de desenhos
N Exemplos Categorias de descrição N
Representações Boas e
Regulares 4
Corretas 0 Parcialmente corretas 1
Incorretas / Não respondeu 3
Subtotal 4
Representações Fracas 38
Corretas 0 Parcialmente corretas 9
Incorretas / Não respondeu 29
Subtotal 38
Representações Incorretas 73
Corretas 0 Parcialmente corretas 5
Incorretas / Não respondeu 68 Subtotal 73
Não respondeu 32
Corretas 0 Parcialmente corretas 2
Incorretas / Não respondeu 30
Subtotal 32 Total 147 Total 147
6 Discussão dos resultados
A análise dos desenhos de planificação feitos pelos sujeitos permitiu estabelecer
algumas categorias, com base no trabalho de Viana (2000; 2005), sendo assim possível
perceber a dificuldade de muitos alunos em realizar a tarefa. Na categoria chamada de
representações fracas, os desenhos parecem indicar que alguns sujeitos teriam formado
as imagens com base apenas na percepção; mesmo diante do exemplo dado da
planificação do cubo, não conseguiam empreender as ações relativas à inspeção e à
manipulação de imagens de modo a rebater as faces de um poliedro ou a desenvolver as
superfícies de corpos redondos. O modelo computacional de Kosslyn (1985) explica que
as ações citadas são possíveis por meio da ativação de vários subsistemas cerebrais e,
entre eles, aquele que fornece as informações e conhecimentos adquiridos acerca do
objeto.
O conhecimento ao qual se refere Kosslyn (1985) não é, necessariamente, escolar
tampouco declarativo. A moderada correlação entre as variáveis, encontrada na análise
quantitativa desse estudo, pode evidenciar alguns aspectos dessa afirmação. Mas,
também é possível observar, no Quadro 1, o número de sujeitos que planificou o
paralelepípedo (representações boas e regulares) e que não respondeu ou errou a
descrição da figura. Pode-se atribuir esse resultado ao fato de o paralelepípedo ser a
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forma geométrica espacial mais utilizada no cotidiano do aluno. A experiência de
manipular objetos com essa forma – além daquela decorrente de um trabalho escolar
mais especifico – pode ter contribuído para a verificação das faces e possibilitado a
representação da planificação do paralelepípedo. No entanto, se esta experiência
favoreceu a habilidade de planificar, parece que ela não contribuiu da mesma maneira
para o sujeito nomear e identificar propriedades do paralelepípedo. Ou, pelo menos, não
favoreceu o conhecimento declarativo sobre esse conceito, na forma como este foi
avaliado na presente pesquisa.
Entre os sujeitos que fizeram representações incorretas do paralelepípedo, a
maioria descreveu de forma incorreta as propriedades da figura, o que indica que a
formação insuficiente de conceitos parece realmente interferir na manipulação das
imagens mentais produzidas a partir da percepção do desenho em perspectiva.
Com relação às outras figuras, foram encontradas várias planificações corretas
(por exemplo, da pirâmide) sem que os sujeitos tivessem nomeado os conceitos. No
caso do prisma, nenhum aluno sequer nomeou-o e poucos descreveram o número de
faces. Apesar disso, pode-se notar, até pelos desenhos da categoria “representações
fracas”, a tentativa dos sujeitos de inspecionar a imagem do prisma de modo a
identificar suas faces.
Dessa forma, a ação de planificar corretamente pode estar demonstrando, em
alguns casos, características mais ligadas à habilidade do sujeito em representar e
manipular mentalmente a figura que decorrentes do aprendizado escolar relativo a
conceitos de geometria.
Impressiona, neste trabalho, o número de planificações incorretas, o que pode
indicar que a habilidade matemática ligada ao componente espacial − conforme
estudada por Viana (2005) − pode não ter sido desenvolvida pelos sujeitos, no contexto
da pesquisa. Mas, impressiona ainda mais o fraco desempenho na questão que solicitava
a nomeação e a descrição de propriedades. Alguns alunos tentaram descrever a
quantidade de faces, arestas e vértices dos poliedros – propriedades avaliadas pelos
descritores das matrizes de referência das avaliações dos sistemas de avaliação escolar.
Apesar disso, as análises mostraram que a formação conceitual relativa às figuras
investigadas, na perspectiva de Van Hiele (1986), encontrava-se ainda, para os sujeitos
dessa pesquisa, em um nível inicial, aquém do esperado para estudantes do sexto e do
sétimo ano.
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7 Considerações finais
O trabalho aqui descrito limitou-se a avaliar, por meio da nomeação e descrição
das propriedades de figuras elementares, o conhecimento declarativo dos sujeitos sobre
conceitos geométricos. Os resultados aqui discutidos conseguem amparar alguns dos
pressupostos adotados pelos sistemas de avaliação em larga escala, quando estes
incluem questões de planificação em suas provas com base nos descritores de suas
matrizes de referência. Ou seja, avaliar a habilidade de planificar pode ser uma forma de
verificar se o estudante identifica propriedades das figuras tridimensionais e se relaciona
as figuras planas com as espaciais.
O fraco desempenho dos sujeitos nas duas questões (conceituação e planificação)
permite considerar que a aprendizagem da geometria espacial ainda é um desafio para a
educação matemática.
Os PCN (BRASIL, 1997) sugerem que devem ser dadas oportunidades que
permitam a exploração de propriedades de figuras tridimensionais como forma de
favorecer a formação de conceitos. Considera-se que esta descrição seja feita tanto na
forma oral como na forma escrita, de modo a facilitar o estabelecimento de relações e o
avanço nos níveis de formação conceitual. Além disso, pedir para a criança desenhar a
planificação – ao contrário de solicitar o reconhecimento de uma planificação pronta –
pode contribuir para a habilidade de formar, inspecionar e manipular imagens mentais,
um dos objetivos da geometria no que diz respeito ao desenvolvimento da habilidade
visual.
A discussão aqui iniciada deve fomentar novas pesquisas, com mais sujeitos e
pertencentes a outras séries do ensino fundamental, de modo a tornar o estudo mais
abrangente e explicativo.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico e à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais pelo
auxilio financeiro.
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