a guarda real da polÍcia
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A GUARDA REAL DA POLÍCIA
1801 — 1834
A Guarda Real da Polícia, magnífica instituição mili tar para garantia da
segurança e tranquilidade públicas, que se deve à visão admirável do célebre
Intendente Pina Manique, destinada, inicialmente, a vigiar e guardar a cidade de
Lisboa e, mais tarde a do Porto (e, talvez ulteriormente todo o País), foi a
antecessora das Guardas Municipais e a precursora da Guarda Nacional
Republicana. Dela nasceram também o Corpo de Guarda Bar reiras, antecessor
da actual Guarda Fiscal e a Polícia Civil, mais tarde Polícia Cívica e depois
Polícia de Segurança Pública. Além de excelente corpo de polícia mili tar, a
Guarda Real da Polícia foi mesmo um corpo de tropas de escol, espécie de
«Guarda Real» que nos campos de batalha bravamente se bateu, muito embora
seja triste lembrança que em tais Pugnas dos dois lados sangue português
corresse.
Pela missão fundamental para que foi criada e mis sões consequentes que
lhe foram impostas, pela sua orgânica geral e seu regime de funcionamento,
Pelas modalidades de seu recrutamento e da sua vida peculiar, pelas suas
características profissionais e virtudes militares, seu
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apanágio, a Guarda Real da Políc ia foi mãe das Guardas Municipais e
veneranda antepassada da Guarda Nacional Republicana.
Sendo assim, dar a conhecer esse modelar corpo de tropas àqueles que, a
século e meio de distância, cumprem ainda missão quase idêntica e
desempenham funções beni semelhantes, parecia ser uni dever do Comando
Geral da Guarda Nacional Republicana. Assim se entendeu e, de sorte, para tal
se nomeou um oficial, o capitão de cavalaria Luís Alberto Filipe Rodrigues,
com o encargo de elaborar o esboço histórico da Guarda Real da Policia,
missão que cumpriu com a dedicação que lhe é peculiar.
Julgou-se ser interessante que tal publicação celebrasse o 150.º aniversário
da criação desse famoso corpo, feita por Decreto Real em 10 de Dezembro de
1801, mas entendeu-se de boa prudência não protelar a efectivação da ideia e
decidiu-se a sua imediata impressão, e que publicado fosse em 10 de Dezembro de
1949, em coincidência, pois, com o 148.° aniversário.
Este trabalho, evidentemente, não tem pretensão a obra histórica de
profunda investigação, e, ainda menos, a obra literária de boa forma, mas é,
sem dúvida, um paciente estudo e uma excelente coordenação a que se entregou
o seu autor, o capitão Luís Rodrigues, cuja dedicação profissional e ardente
espírito militar, mais uma vez foi altamente prestante às instituições militares que
com tanto amor serve.
Não é apenas de citar o labor do capitão Luís Rodrigues, mas também de
notar e de muito agradecer, o interesse e entusiasmo com que o Exmo. coronel
de cavalaria José Lúcio de Sousa Gonçalves Nunes, director da Biblioteca do
Ministério da Guerra, contribuiu para esta obra, já com as suas buscas na
instituição que tão distintamente dirige, já com o auxílio e facilidades que
proporcionou ao oficial da G. N. R. encarregado de elaborar este esboço
histórico. Muito grata lhe fica a G. N. R.
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Agradecimentos são ainda devidos às magníficas Revistas Polícia Portuguesa e
Defesa Nacional, pela contribuição que nos Prestaram com os seus excelentes
artigos «Os princípios da Polícia em Portugal», da autoria do Ex."- Sr. Albino
Lapa e «Guarda de Polícia» — cujo autor lamentamos ignorar devendo ainda
especialmente notar-se a generosa gentileza do ilustre director da Defesa
Nacional, comandante José Soares de Oliveira, cedendo para o nosso traba lho,
as interessantíssimas produções de Carlos Ribeiro com os uniformes da
Infantaria e Cavalaria da Guarda Real da Polícia. As nossas gratas homenagens,
pois, às prestantes «Revistas» seus ilustres directores e aos distintos autores
dos artigos e desenhos sobre a G. R. P.
Esta obra, A Guarda Real da Polícia, modesta na sua contextura, mas
grande no seu objectivo, é dedicada à Guarda Nacional Republicana, aos seus
oficiais, sargentos e praças, dirige-se à sua consciência de bons Soldados e ao
seu coração de bons Portugueses, para que possam contemplar e admirar na
existência dos seus «maiores» as virtudes militares de bem servir, de
obediência e lealismo, de coragem e de abnegação que não lhe são estranhos e
que é mister possuir e praticar para bem cumprir, mesmo nas mais duras
emergências, a sempre prestante e patriótica missão, de manter a segurança e
ordem públicas, factores estes essenciais para a prosperidade dos povos e Para
Bem da Nação.
O COMANDANTE GERAL
General Affonso Botelho
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C A P Í T U L O I
Da antiguidade
à Guarda Real da Polícia
s povos primitivos não possuíam quaisquer direitos, razão por que
não tinham qualquer força pública para lhos garantir.
A repressão de qualquer delito ou crime, atentatórios da liberdade ou dos
direitos de todo o indivíduo, era deixada à iniciativa pessoal, motivo por que
todo o homem andava armado, defendendo-se cada qual e aos seus, tanto nos
seus lares como na via pública, como lhe era possível.
Sem segurança dentro da sua habitação e sem defesa nas longas viag ens a
empreender, vingava a lei do mais forte ou do mais astuto e cada qual tratava
de si.
Para que se constitua uma Sociedade bem organizada, são necessárias leis,
e para que estas sejam por todos respeitadas, é preciso um organismo que as
faça respeitar.
Os gregos são os primeiros povos a tomarem precauções contra os perigos
nocturnos e a encarregarem um certo número dos seus melhores cidadãos, da
vigilância dos grandes aglomerados populacionais.
Os romanos estabelecem na Gália a primeira força pública encarregada da
segurança das suas cidades e campos, depois de numerosos bandos armados
terem assolado extensas regiões.
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O Imperador Augusto determina o desarmamento de todos os cidadãos e a
criação de Legiões permanentes destinadas à segurança interna do Império, ao
mesmo tempo que organiza uma guarda pretoriana para sua defesa e segurança
pessoal.
Para assegurar a polícia de Roma é constituída urna guarda urbana, a
cidade dividida em secções e bairros, sendo cada secção entregue a um
«Curatoris regionum urbiis».
A República romana encarrega magistrados especiais da manutenção da
ordem, para vigilãncia das propriedades, das ruas e de todos os lugares
públicos.
Reprime-se o luxo desmedido. a libertinagem, e por legis lação especial
regulamenta-se a profissão das meretrizes. Criam-se as polícias dos víveres, dos
funerais e dos espectáculos; tomam-se cuidados especiais no respeitante a
incêndios, organizam-se rondas nocturnas em todas as cidades da República,
sendo os campos objecto dos mesmos cuidados.
Sabe-se que os últimos anos da República foram preenchidos com lutas
internas que terminaram com a batalha naval de Actium (31 anos A. C.)
A fim de reprimir os hábitos criados pela guerra civil, novamente as
populações são proibidas de usar armas, criando-se, para as proteger,
numerosos postos de segurança espalhados por toda a Itália.
Estes postos tinham por missão deter os malfeitores e conduzi-los a
julgamento após a sua captura. Aos chefes de posto, encarregados de reprimir o
roubo e a pilhagem, chamavam-se «latrunculatores» ou «stacionnariis».
Nada de novo a civilização nos traz, ao virificarmos, 20 séculos passados,
que os nossos comandantes dos postos rurais mais não são do que os
«latrunculatores» dos romanos...
Na Idade Média, sob a alçada dos primeiros reis da Cristandade, os duques
e os condes, grandes proprietários rurais, governam as suas províncias em nome
do seu rei e sucedem aos magistrados romanos no exercício das suas funções
repressivas.
Com jurisdição sobre campos e vilas, vivem, fora das épocas das guerras,
nos seus castelos, com guarnições próprias e com todos os meios morais e
materiais necessários à manutenção da ordem entre os seus povos.
Com a queda do Império romano e diminuida a hegemonia dos
muçulmanos na Península Ibérica, nascem os reinos de Leão e Castela, que sob
a coroa de Afonso VI, voltam à paz
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interna e depois novamente às duras lutas de reconquista aos sarracenos, que por
mais de 3 séculos ensanguentam e retalham toda a Península.
Pelo casamento de sua filha bastarda D. Teresa com D. Henrique, Conde de
Borgonha, Afonso VI entrega àquele, e por vínculo feudal, o governo de toda a
região que se alastra do Minho ao Tejo, desde o mar às serranias transmontanas e
beiroas, entre os anos de 1095 e 1097.
Aparece, assim. o Condado Portucalense, embora sem independência.
Morto Afonso VI, mortos o Conde D. Henrique e D. Teresa, nasce ao fim de
muitos trabalhos e canseiras, em 1128, o Reino de Portugal, sendo D. Afonso
Henriques seu primeiro rei aos 17 anos de idade e batalhando desde os 14.
Embora os nossos dois primeiros reis não tenham deixado leis escritas, pois
só no reinado de D. Afonso II, com as primeiras cortes saem as primeiras leis
gerais do reino (1211), sabe-se que D. Afonso Henriques, após a conquista de
Lisboa aos mouros, deu ao seu município amplos poderes para protecção dos
habitantes contra os criminosos.
Desconhece-se a época certa em que apareceram os primeiros homens
encarregados exclusivamente da segurança pública no novo reino, os
«Quadrilheiros».
Tal organização é, no entanto, anterior a D. Fernando I, pois é no final do seu
reinado, 1383, que coincide com o final da terceira guerra com Castela (1381-83),
que D. Fernando, em contacto com as inovações estrangeiras trazidas pelos mer -
cenários ingleses, seus aliados contra Castela, introduziu várias reformas nos
nossos costumes militares, ao mesmo tempo que no respeitante à vida e à
segurança dos habitantes a dentro da nova cerca da cidade de Lisboa1, estabeleceu
as primeiras leis sobre a organização, nomeação e atribuições dos «Quadrilheiros»,
que por notícias várias se sabe já existirem nessa época.
Os quadrilheiros estavam subordinados às Câmaras, servindo por nomeação
especial por 3 anos. Competia-lhes a vigilância
1Em 1373 iniciava-se a construção das novas muralhas de Lisboa, que ficavam concluídas em
1375. Com 77 torres e num perímetro de 6.500 m., têm por fim conter dentro de amuralhado
cerco, as artérias que se estendiam para além das muralhas da Lisboa mourisca do tempo de D.
Afonso Henriques (1117).
O termo «quadrilheiro» vem de quadrilha, gente armada que nos tempos de Roma acompanha o
pretor nas ruas rondas de vigilância pela cidade.
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da área que lhes estava entregue, reprimindo furtos e crimes, prendendo os seus
autores.
Eram armados de vara ou lança, não gozando de quaisquer privilégios ou
regalias, razão por que foi sempre difícil encontrar quem graciosamente se quisesse
desempenhar de tão espinhosa missão.
Temos notícia de que em 1418 se mantém tal organização, mas que os seus
agentes são isentos do policiamento da cidade de Lisboa durante a noite, e de que
em 1460 D. Afonso V lhes concede outros privilégios.
Com o decorrer dos tempos os quadrilheiros vão desaparecendo a pouco e
pouco, até que no reinado de D. Sebastião é tal o estado de desordem e tais os
furtos e crimes praticados e não castigados, que este rei manda elaborar novas
disposições sobre o seu recrutamento, atribuições e deveres (de 1559 a 1571), em
reforço das primitivas de D. Fernando I e de D. Duarte.
Em 1580, Portugal perde desastrosamente a sua independência, e deixamos
de ter notícias dos Quadrilheiros até 1603.
Reina Filipe II de Portugal e III de Espanha, e quando este rei pretende,
pouco a pouco, integrar politicamente o País no corpo da imensa monarquia
ibérica, volta a falar-se neles, e agora desenvolvidamente, pelo extenso Alvará de
12 de Março daquele ano que cria o Corpo de Quadrilheiros, Alvará
que pelo detalhe com que é apresentado, transcrevemos2:
D. Filipe por Graça de Deus, Rei de Portugal e dos Algarves, d'aquem e d'além mar
em África, Senhor da Guiné e da Conquista, navegação, comércio da Etiópia, Arábia,
Pérsia e da Índia, etc.
Faço saber que El-Rei, meu Senhor e Pai, por justos respeitos que a isso o
moveram, houve por bem, e mandou que nesta cidade de Lisboa houvessem também
Quadrilheiros, como há nas mais cidades e vilas do Reino, e que ao Regimento de
Quadrilheiros, conteúdo no primeiro livro das Ordenações, título 54, se juntassem os mais
casos, que se acrescentam por uma provisão de El-Rei D. Sebastião que Deus tem, feita
em Sintra em 28 de Julho de 157o.
E porquanto nesta cidade se não poderão ordenar aos Quadrilheiros na forma que a
dita ordenação manda, e pareceu que em alguma coisa.
2 Legislação Portuguesa de 1603 a 1619, compilada e anotada por José Justino de Andrade e
Silva—Lisboa, 1854—Biblioteca do Ministério da Guerra.
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o dito Regimento se deveria reformar, no que toca aos Quadrilheiros, que há-de haver
nesta cidade, com o parecer dos do meu conselho: Hei por bem que o Presidente,
Vereadores, e os mais oficiais da Câmara desta cidade, que hoje são, e ao diante forem,
façam e ordenem aos Quadrilheiros, cada 3 anos, na forma seguinte:
I — Dos juízes que nela houver da jurisdição da cidade, escolherão em Câmara os
que mais desocupados forem, e melhor o puderem fazer, repartirão por eles todas as
freguesias da cidade e lhes ordenarão que todos em um tempo, com um escrivão, dos que
com eles servem, corram as freguesias que lhes forem assinadas e em cada rua delas
escolherão homens, a que se tenha respeito, e os que mais contínuos e residentes forem
em suas casas, por razão de seus ofícios, a que farão Quadrilheiros, para servirem par
tempo de 3 anos, e a cada um deles entregarão uma vara pintada de verde, com as Armas
reais, e assim o Regimento do dito cargo, e lhes darão juramento sobre os Santos
Evangelhos para que, bem e verdadeiramente, com toda a diligência possível, cumpram e
guardem o que no dito Regimento lhes está encarregado; do que farão um breve termo,
nos livros que Para isso a Câmara desta cidade lhes dará, no qual assinarão com os
Quadrilheiros, e lhes nomearão logo 20 vizinhos, que para isso forem mais suficientes,
aos quais notificarão que em qualquer hora, de dia ou de noite, que forem requeridos
pelos ditos Quadrilheiros, lhes acudam com as suas armas, e acompanhem, e ajudem a
prender os malfeitores; e dos nomes dos ditos 20 homens farão um rol, que entregarão a
cada um dos Quadrilheiros, para saber os que têm obrigação de lhes acudir.
II — E depois que os ditos juízes acabarem de prover toda a cidade de
Quadrilheiros na maneira sobredita, levarão os livros em que escreveram, à Câmara desta
cidade, para nela estarem em guarda; e por eles o Presidente e Vereadores mandarão
reformar os mortos e ausentes de ausência prolongada, e acabados os 3 anos, fazer outros
Quadrilheiros na forma que dito é; e nenhum Quadrilheiro se ausentará nem mudará de rua
em que morar sem o fazer saber ao Julgador do seu Bairro, o qual proverá logo outro que
melhor lhe parecer em seu lugar.
III — E cada um dos zo homens da Quadrilha serão obrigados a ter continuamente
em suas casas uma lança de 18 palmos para cima, ou uma chuça ou alabarda; e não a
tendo, pagarão zoo reis para o Meirinho ou Alcaide, ou para o mesmo Quadrilheiro que o
acusar.
IV — Item, cada Quadrilheiro será muito diligente em saber por sua informação, (sem
sobre isso tirar inquirição) se em sua Quadrilha se fazem alguns furtos ou outros crimes,
e quais são as pessoas nisso culpadas, ou se andam nelas alguns homens vadios, ou de má
fama, ou alguns estrangeiros; e logo lhes tomarão conta do que aqui fazem;
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não lhes dando eles alguma justa razão, porque tenham causa de aqui andarem; os
prendam e levem ao Corregedor, ou Juiz do Crime, a que estiver encarregado o Bairro da
sua Quadrilha, aos quais o Corregedor ou Juiz, tomará particular conta de quem são, e o
que aqui fazem; e achando-se em culpa os prenderá e fará deles justiça na forma das
minhas ordenações; e dando o tal homem alguma razão parque pareça claramente que tem
necessidade de estar na terra, o Corregedor ou Juiz lhe mandará em certo tempo que lhe
parecer bastante, acabe o que estiver para fazer, sob pena de ser preso; e sendo depois mais
achado, Passado o dito termo que lhe for dado, os ditos Quadrilheiros o prendam e levem ao
julgador do seu Bairro; e da dita notificação mandará o Corregedor ou _luiz fazer termo
por um escrivão d'ante si.
V — E assim terão muito cuidado de saber se em suas Quadrilhas há alguns barre
gueiros casados, ou casa de alcouce, ou alcoviteiras ou feiticeiras, ou casas de tavolagem de
jogo, ou em que se recolham furtos, ou se agasalhem ladrões, e homens de má fama, ou
vadios; para que visitarão as estalagens e tabernas de suas Quadrilhas; e se vivem em
suas Quadrilhas mulheres, que, Para fazer mal de si, recolhem pà blicamente homens por
dinheiro, ou que estão infamadas de fazer mover outras mulheres com beberagens ou por
qualquer outra via; e se há algumá mulher que andasse prenhe, de que se suspeitasse mal
do parto, não dando conta dele; e se souberem de alguma pessoa que costume por
dinheiro testemunhar falso; e assim se souberem de alguns homens, que tiverem cometido
delitos fora desta cidade e andarem nela; e havendo alguma das ditas cousas, os
Quadrilheiros desta cidade de Lisboa o farão logo saber ao Corregedor, ou Juiz do seu
Bairro, e os ditos Corregedores, ou Juízes, se informarão com diligéncia do que assim os
Quadrilheiros lhe disserem; e achando prova bastante, para prenderem os culpados, os
prenderão e procederão contra eles, como for justiça; e cada semana irão dar contas aos
ditos Juízes do estado da Quadrilha; e qualquer Quadrilheiro que em sua Quadrilha
souber, que andam semelhantes pessoas; sem cumprirem o que lhes aqui é mandado,
incorrerão em pena de 2 mil reis, a metade para quem os acusar, e a outra para Cativos;
— e provando-se, que os favorecem, e consentem andar na Quadrilha, serão presos e
condenados em um ano de degredo para África; e além disso, se pessoa vadia, ou
estrangeira, fizer algum furto, ou dano a alguma pessoa, o dito Quadrilheiro, com os da
sua Quadrilha, que consentirem entre si andar a tal pessoa, pagarão à parte danificada
dano que receber.
VI — Item, serão os ditos Quadrilheiros e homens de suas Quadrilhas muito
diligentes em acudir às voltas e arruidos e insultos, com suas
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armas, e farão de maneira que prendam os culpados; e se logo no ar- ruído ou outro
qualquer delito a que acudirem, os não puderem prender, corram após eles apelidando:
Prendam fuão da parte de El-Rei: à qual voz sairão logo todos os da sua Quadrilha; e de
Quadrilha em Quadrilha os seguirão até serem presos; e deixando os culpados de ser
presos por sua negligência, serão obrigados a pagar às partes o dano que receberam, e
puderam haver dos malfeitores, se fora preso; e além disso o Quadrilheiro, que estando
presente, não acudir aos arruídos e insultos, pagará por cada vez 500 reis, e os da
Quadrilha 200 reis, para o Meirinho e Alcaide que os acusar.
VII — Item, sendo caso que seguindo o Quadrilheiro algum homiziado para o
prender, e ele se acolher a casa de algum poderoso, ele com os da Quadrilha que o seguirem
guardarão a porta ou portas da dita casa, e mandarão recado ao Corregedor, ou Juiz do seu
Bairro, ou do em que a pessoa poderosa viver, o qual deixando tudo acudirá logo, e fará o
requerimento à tal pessoa poderosa, para lhe entregar o delinquente na forma das minhas
Ordenações; e sendo a pessoa, aonde o dito malfeitor se acolher, pessoa Eclesiástica, não
querendo entregar nem consentir que as casas se lhe busquem, para esse efeito será
suspenso de qualquer jurisdição que de mim tiver, ate minha mercê.
VIII — E acolhendo-se a algum Mosteiro ou Igreja, ficarão em guarda dele, e
mandarão recado ao Corregedor ou Juiz do dito Bairro, para neste caso proceder na forma
da Ordenação.
IX — E para com mais diligência os Quadrilheiros acudirem às voltas e arruídos, e
outros delitos que nesta cidade se cometem, hei por bem e mando que as espadas,
punhais, adagas e quaisquer outras armas com que forem tomados os delinquentes, que os
Quadrilheiros prenderem, lhes sejam julgadas por perdidas para eles, pelos julgadores dos
Bairros de suas Quadrilhas que forem na prisão; e isto não sendo armas defesas por
minhas leis e Ordenações; porque nestas se guardará o que elas dispõem; e assim haverão
as penas pecuniárias dos delinquentes, que eles prenderem, por matarem, ferirem, ou
arrancarem nesta Corte, na forma em que Por minhas Ordenações se julga aos Meirinhos
e Alcaides, que semelhantes prisões fazem, as quais se repartirão pelos Quadrilheiros e os
da sua Quadrilha que forem presentes.
X — E mando aos Corregedores do Crime e de minha Corte, e aos da Cidade, e
Juízes do crime dela, saibam por informação particular das testemunhas, que para isso
tomarão, se os Quadrilheiros e homens das Quadrilhas, que cairem nos Bairros que lhes
estão encarregados, cumprem este Regimento, e procedam contra os que acharem
culpados.
E este Alvará e Regimento, hei por bem, e mando que se cumpra, posto que não
seja passado pela Chancelaria, sem embargo da Ordenação em contrário.
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Dado em Lisboa, a 12 de Março. Pedro de Seixas o fez escrever. Ano do
Nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1603. — REI.
Ainda sobre a legislação respeitante aos Quadrilheiros encontramos os
Alvarás referentes às seguintes épocas: 25-XII-1608, 25-III-1742 e 11-II-1696.
Transcrevemos, ainda por curiosidade, este último3:
D. Pedro, por Graça de Deus; Rei de Portugal e dos Algarves, etc., etc., faço saber a
vós, que eu passei ora um Alvará, por mim assinado, e passado por minha Chancelaria do
qual o translado é o seguinte:
Eu, El-Rei, faço saber aos que este Alvará virem que, por convir à boa administração da
Justiça que os Bairros estejam providos de Quadrilheiros capazes de acudirem às
pendências, e as apartarem e prenderem os delinquentes; e haver mostrado a experiência,
que por falta de prémio não procedem com aquele cuidado que devem, nas diligências de
Justiça:
— hei por bem que de hoje em diante sejam admitidos os Quadrilheiros desta
Cidade aos ofícios que o Senado da Câmara costuma prover nos homens do povo, que têm
servido na Casa dos Vinte e Quatro e de misteres: e que apresentando certidão do
Ministro do Bairro, que serviram bem, os provejam nos ditos ofícios, assim como
provêem os da Casa dos Vinte e Quatro; e que enquanto servirem de Quadrilheiros,
não sejam obrigados a pagarem os encargos das bandeiras dos ofícios;
e pelas vias, a que toca, ordeno sejam escusos dos alardes, e exercícios
militares; e que acudindo às pendências, sejam suas aqueles armas, que
segundo a disposição da lei, haviam de ser dos Meirinhos ou Alcaides.
O Senado da Câmara o tenha assim entendido; e pelas informações
dos Ministros mandará logo prover os Bairros de Quadrilheiros necessários, escolhendo
as pessoas mais capazes de fazerem as diligências e darem delas boa conta; e os tais
Quadrilheiros não serão obrigados a
3 Legislação de 1683 a 1700, compilada e anotada por José Justino Andrade e Silva, Bacharel
formado em direito — Lisboa, 5859 — Biblioteca do Ministério da Guerra.
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servir mais que por tempo de 3 anos; e só querendo voluntariamente servir par mais
tempo, havendo servido bem, os poderá o Senado mandar continuar.
Lisboa, 11 de Fevereiro de 160 — REI.
Todos estes Alvarás sobre Justiça e Polícia do Reino, que regulavam a
Polícia da Corte e da cidade de Lisboa, foram reunidos e actualizados no reinado
de D. José I, pelo Alvará de 25 de Junho de 1760. a quando da criação do cargo
de Intendente da Polícia da Corte e do Reino.
Estamos chegados aos fins do século XVIII e à época da Revolução
Francesa.
Diz-nos Pinheiro Chagas no volume VII da sua História de Portugal, em que
tão bem nos descreve o ambiente desses agitados tempos:
A Revolução Francesa foi asperamente combatida em Portugal de modo severo e
despótico.
O Alvará de 12 de Março de 1603, criara em Lisboa o Corpo de Quadrilheiros,
espécie de polícia urbana, de que deviam fazer parte os moradores mais honrados
estabelecidos com os seus ofícios e que deviam ser por isso recensiados nas diferentes
paróquias.
Organização fraquíssima, como não podia deixar de ser, não impedia que as ruas
de Lisboa fossem teatro constante das cenas mais vergonhosas e sangrentas.
Até ao reinado de D. José I, continuaram as coisas no mesmo es tado. As vinganças
particulares satisfaziam-se em plena rua e à luz do dia, sem que a autoridade ousasse ou
pudesse intervir.
Não se respeitava mais do que a vida do cidadão, o sagrado das igrejas. Sucediam-se
com frequência os desacatos.
No tempo de D. José I, o carácter conhecido do Marquês de Pombal e a severidade
com que reprimia os culpados, exerceram uma salutar influência e tornaram Lisboa mais
habitável, para o que muito concorreram as forcas mandadas erigir no tempo do
Terramoto... e que se não desarmaram com grande rapidez.
Apenas, porém, saiu do poder o Marquês de Pombal, e a Intendência da Polícia que
ele criara deixou de ser estimulada pela energia do Governo, as coisas recomeçaram a
seguir o mesmo caminho, e já em 1783
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eram tão frequentes os roubos e os assassínios, que ninguém saía à noite a pé ou a
cavalo, senão bem armado ou acompanhado de uma escolta de criados munidos de
pistolas e bacamartes.
Entre a tropa encarregada da repressão e as quadrilhas de saltea dores, chegavam a
travar-se verdadeiros combates, em que nem sempre a primeira ficava vi toriosa.
A audácia dos bandidos chegou ao ponto de assaltarem, em fins de 1783, a casa da
Alfândega de Lisboa onde em cofre especial se encontravam as jóias da Coroa, no valor
de um milhão de cruzados, que só por engano escaparam.
Diz Pina Manique por essa época, em documento enviado ao Ministro Martinho de
Mello e Castro, depois do roubo na Alfândega: As gentes que habitam esta Capital estão
em desassossego, clamando pública- mente, pedindo justiça e proferindo algumas
palavras contra o decoro da Soberana e do seu Ministério, e muitas dessas gentes andam
já armadas com cintos de pistolas e facas, ou a cavalo com espadas e armas de fogo.
Um dos principais elementos de desordem na capital, era o Exér cito4.
A severa disciplina a que o sujeitara o Conde de Lippe, perdera-se completamente, e
o General em Chefe, Duque de Lafres. era homem mais de ciência e de Corte, do que próprio
para o cargo militar que lhe fora confiado.
Os soldados tomavam parte nos roubos, formavam quadrilhas que infestavam a
cidade, não tendo quem os vigiasse e policiasse nos quartéis oi . fora deles. O seu
descaramento chegou ao ponto de andarem de dia pelas ruas vendendo objectos
roubados, fazendas e contrabando.
O Duque de Latões de tudo era informado pelo Intendente Pina Manique, mas não
só não autorizava aquele a prender os responsáveis, como não exercia qualquer acção
disciplinar e repressiva sobre eles.
4 Estamos no final da infeliz campanha de 1801 contra a Espanha, campanha não só infeliz como
vergonhosa, em resultado da qual perdemos Olivença. essa rica região além Guadiana que nunca
mais voltou a Portugal, embora em face de tratados posteriores, juridicamente nos continue a
pertencer. Diz-nos Carlos Selvagem em Portugal Militar: o Exército deixara de ser o fiador da honra e da
defesa nacional, para se tranformar num baluarte político. Os regimentos estavam inçados de
espiões (espiões da maçonaria francesa e da maçonaria escocesa) que só tratavam de fazer
política a favor da França repu. blicana ou da Inglaterra conservadora. O Príncipe Regente D.
João, único que encarnava e quiçá compreendia o interesse nacional, nada podia fazer sem apoio,
sem ministros, sem oficiais e sem soldados. E por isso a sua política, política de transigências,
baixesas e habilidades, foi nesses tristes tempos a única política salvadora da Nação.
17
Foz Diogo Pina Manique, o Intendente da Polícia da Corte e Reino, quem com mais
zelo tratou de estabelecer em Lisboa uma políc ia séria que pudesse proteger os seus
habitantes.
Para isso não cessou de instar com o Visconde de Vila Nova de Cer veira, com o
Marquês de Angeja e com o Arcebispo de Thessalónica, para que se criasse um Corpo de
Polícia à imitação dos Guet e da Marèchaussée da França5, o que efectivamente se
realizou ainda em sua vida (Pina Manique morreu em 18o5), com a criação da Guarda
Real da Polícia de pé e de cavalo.
Com Pina Manique, terminam os Quadrilheiros, organização de polícia civil,
e, portanto, antepassada das Polícias, Civil, Cívica e de Segurança Pública6,
surgindo a Guarda Real da Polícia de pé e de cavalo, que pelas suas característi-
cas militares, dependência, recrutamento, organização e enquadramento, é a
verdadeira antecessora das Guardas Municipais e da Guarda Nacional
Republicana, razão por que daquela nos passaremos a ocupar mais
detalhadamente.
A Guarda Real da Polícia foi criada pelo decreto de 10 de Dezembro de
18017, que pelo seu interesse transcrevemos:
Sendo muito conveniente, não só para a segurança e tranquilidade da cidade de
Lisboa, Capital dos meus vastos domínios, mas para que na mesma, a ordem da polícia
receba zona vasta consolidação, que à
5 Guet, do verbo guetter, que por sua vez deriva da palavra alem:I wahte, que significa esperar,
espiar, vigiar.
Guet de Paris — Corpo de polícia activa do antigo regime francês, e que deu origem à Garde de
Paris.
Assim como a actual Garde Republicaine concorre na actualidade com a Gendarmerie para a
manutenção da ordem, assim a Guet de Paris velou com a Marèchaussée (anteces!,ora da Gendarmerie) pela segurança da capital da França.
Como a Marèchaussée, a Guet de Paris vai buscar a . .ua origem à época medieval.
História da Gendarmerie desde as origens da Marèchaussée até aos nossos dias, pelo Coronel
Larrieu, I Parte — 1927.
6 A Polícia Civil é criada pela primeira vez, com tal nome, no reinado de D. Luiz I, em 1867.
7 Colecção da Legislação Portuguesa de 1791 a 1901, redigida pelo Desembargador António
Delgado da Silva — Lisboa, 1828 — Biblioteca do Ministério da Guerra.
18
imitação das outras grandes capitais se estabeleça um Corpo permanente, o qual vigie na
conservação da ordem e tranquilidade pública, que obedeça, no que toca à disciplina
militar, ao General das Armas da Província, e no que toca ao exercício das suas funções,
ao Intendente Geral da Polícia:
Hei por bem criar uma Guarda Real da Polícia de Lisboa de pé e de cavalo, para
vigiar na cidade de Lisboa, e para guardar pela forma
maneira que se regula no Plano, que baixa com este, assinado pelo Mi nistro e
Conselheiro de Estado, D. Rodrigo de Sousa Coutinho, a quem fui servido encarregar de
levar à minha Real Presença os Negócios concernentes à minha Inspecção da Polícia da
Corte e Reino; o qual Plano em toda a sua extensão e particularidades se entenderá
formar parte deste Decreto. Assim o mando participar ao Conselheiro de Estado,
Ministro e Secretário de Negócios da Guerra, e ao Conselho de Guerra, para se fazer
executar em cada Repartição pela parte que lhe toca.
O mesmo Ministro e Conselheiro de Estado D. Rodrigo de Sousa Coutinho,
Presidente do meu Real Erário o tenha assim entendido e faça executar.
Palácio de Queluz, em 10 de Dezembro de 1801. — Com a rubrica do Príncipe Regente.
E conforme atrás dissemos, entremos agora detalhadamente em tudo que diz
respeito à organização e missões da Guarda Real da Polícia, pois apesar dos anos
que correram desde a sua criação, passando pelas Guardas Municipais, até à
Guarda Nacional Republicana, ainda hoje seguimos muitas das determinações
desenvolvidamente apresentadas no Plano que acompanha o decreto que instituiu
aquela Guarda.
Não foi esta Corporação completamente feliz na sua curta vida de 33 anos
apenas, primeiro por motivo da política estrangeira que dominava o País e que
terminou com as invasões napoleónicas, e depois com as lutas civis que se lhe
seguiram, que ao terminarem, com a vitória dos Liberais, coincidem com a sua
dissolução.
Foi no entanto tão bem pensada a sua organização e teve tal prestígio dentro
da sua função que, nascendo e vivendo em época política das mais agitadas da
nossa História e morrendo com um partido vencido e detestado pelos vencedores,
foi por amigos e adversários políticos sempre respeitada, e por todos considerada
corno utilíssima Corporação de Segurança Pública.
19
Para o estudo que agora vamos fazer, entre documentos oficiais e notícias
encontradas aqui e além, servimo-nos largamente do «Memorial do Oficial da
Guarda Real da Polícia de Lisboa» de Joaquim Miguel de Andrade, oficial de
Cavalaria da G. R. P. editado em 18248.
8 Exemplar único de que temos conhecimento, existente na Biblioteca do Ministério da Guerra.
20
CAPÍTULO
A Guarda Real da Policia
I — Instituição e organização progressiva
riada em 1801 para vigiar e conservar a ordem e tranquilidade
públicas dentro da cidade de Lisboa, conforme o constante no
decreto atrás transcrito, foi a G. R. P. no seu início, e atendendo aos
seus fracos efectivos, auxiliada na sua missão por patrulhas dos
regimentos de Cavalaria e Infantaria de Linha aquartelados na capital. que
durante o seu serviço de patrulhamento nocturno ficavam na dependência do
Comandante da G. R. P.
Cada militar que compunha estas patrulhas recebia a gratificação de 50 reis
por noite.
Organização in ic ia l (1801)
ESTADO MAIOR
(a) O primeiro Comandante da G. R. P. foi o Conde de Novion, oficial francês exilado que servia
no nosso Exército com a patente de Ten. Cor., razão por que manteve a mesma patente como
comandante da Guarda, tendo por este motivo direito a O cavalos em vez de 4, como competia.
ao Cap. comandante da Guarda.
21
INFANTARIA (8 COMPANHIAS, 424 HOMENS)
8 Tenentes Comandantes (a)
16 Sargentos
8 Furrieis
32 Cabos
32 Anspeçadas
320 Soldados
8 Tambores
a) Os primeiros comandantes de C. foram alferes e 7'1:lio tenentes. por terem sido
promovidos do Exército para a Guarda, da classe, de oficiais inferiores e de
cadetes.
CAVALARIA (4 COMPANHIAS, 208 HOMENS, 212 CAVALOS)
Pelo decreto de 26 de Maio de 1802, e atendendo à indispensável unidade de
critério e modo de actuar, ao melhor serviço executado pelas patrulhas da Guarda
em relação às do Exército, e em atenção ao bom serviço da G. R. P., em virtude
do qual e em tão pouco tempo, se conseguia a tranquilidade pública da capital, e
«à utilidade da Real Fazenda, evitando-se os maiores descaminhos dos Reais
Direitos» é ampliada a Organização inicial, conforme se indica:
ESTADO MAIOR
22
INFANTARIA
CAVALARIA
Em 1803 ligeiro aumento se verificou no Estado Maior:
Pelo decreto de 12 de Outubro de 1805, «mostrando a experiência que a força do
Corpo da Guarda Real da Polícia é insuficiente para corresponder perfeitamente
aos importantes fins a que é destinada, para poder não só continuar a manter o
sossego público da Capital, como até então tem feito, mas ainda a estender a sua
vigilância aos subúrbios dela, de modo que este serviço não pese sobre a porção
de tropas que formam a guarnição da Capital», é a mesma Guarda aumentada com
duas Companhias de Infantaria, passando os efectivos a:
23
Novo decreto de 4 de Novembro do mesmo ano, estabelece o acesso de promoção
do Corpo de Oficiais que servem na Guarda, e para facilitar tal promoção, tiveram
as Companhias 1.3, 3.3, 5.3, 7.3 e 9.3 de Infantaria por comandantes um capitão,
o mesmo acontecendo no respeitante às 1.3 e 3.3 de Cavalaria, mantendo-se nas
restantes o comando de tenente.
As Companhias foram subdivididas em Secções e Esquadras, e é por este mesmo
decreto proibido que «neste Corpo, diferente pelo seu destino dos outros Corpos
de Exército, se admitam cadetes».
Finalmente, e atendendo às grandes distâncias dos pontos a rondar pelos Oficiais
de Infantaria, são distribuídos 5 cavalos a esta Arma, mas cautelosamente, um
aviso do Ministro da Guerra datado de 4 de Agosto de 1806, diz que «os
sobreditos cavalos devem servir para aquele fim a todos os oficiais de Infantaria
que fizerem as rondas, e não aos de cada Companhia privativamente».
O último aumento tem a data de 26 de Fevereiro de 1810 e é proposto pelo
Marechal General Lord Beresford à Regência do Reino, que o aprova em Abril do
mesmo ano, com a sua definitiva Organização, num total de 1.326 homens e de
269 cavalos:
ESTADO MAIOR
24
(a) Só em 182S é que a Banda de Música (donde nasceu mais tarde a Banda da
Guarda Municipal) foi constituída com este nome.
«Foi seu primeiro Mestre, José Maria da Silveira. Em 1830 teve a Banda como
novo mestre. José Maria Garcia, filho de Diogo Garcia que foi excelente músico e
fez parte das orquestras de S. Carlos e da Real Câmara».
Revista Polícia de Lisboa, n.º 24-1941: Os princípios da Policia em Portugal» por
Albino Lapa.
INFANTARIA (10 COMPANHIAS)
CAVALARIA (4 COMPANHIAS)
25
Por curiosidade acrescentaremos que durante a permanência da Corte no Rio de
Janeiro, por decreto de 13 de Maio de 1809, foi ali igualmente estabelecida a
Guarda Real da Polícia, com as mesmas características e missões da de Lisboa, e
com a seguinte organização:
Estado Maior, 3 Companhias de Infantaria e 1 de Cava laria, no total de 210
homens.
II — Recrutamento
A Guarda Real da Polícia «será formada pelos melhores soldados, escolhidos em
todo o Exército, não só entre os mais robustos, firmes, solteiros, e até 30 anos de
idade, por serem as funções a que são destinados mais penosas ainda, que as da
Guerra: mas também de boa morigeração e conduta».
Esta era a condição apresentada no decreto da criação inicial, porém, em 1803, foi
aquela condição alterada, admitindo-se recrutas directamente na Guarda. Tal
admissão é, porém. proibida pelo Marechal Beresford. continuando o recru-
tamento a fazer-se como o determinado inicialmente, corno não podia deixar de
ser, dados os maus resultados obtidos.
III — Uniformes
O uniforme da primitiva era como segue: casaca curta azul, abotoada em todo o
seu comprimento, forrada da mesma cor, com bandas, gola e canhões encarnados,
botões amarelos,
27
e oito casas de galão amarelo somente na frente; calças de saragoça para Inverno, e
brancas para estio; meias botas; barrete de coiro negro encerado, com sua liga e
seu oleado «para se abaixar em tempo de chuva»; o mesmo barrete assinalado
com o número da Companhia e ornado em cima com a letra J; capote também
azul. Não havia qualquer diferença no uniforme para a Cavalaria, mais do que nas
camisolas para o serviço das cavalariças.
Este uniforme foi alterado logo na prática em alguns artigos: a farda nunca teve
bandas encarnadas; aumentaram-se três pequenas casas de galão amarelo em cada
pestana das algibeiras. As calças de saragoça para inverno foram trocadas por
azuis logo após a sua recepção. Os Oficiais de Infantaria usaram fardas compridas
e chapeus armados com penacho branco até 1806.
Por volta de 1820 foram feitas as últimas alterações ao plano de uniformes:
Infantaria
1.ª — Barretina de pano de chapeu, com chapas de latão com as letras iniciais da
G. R. P. abertas e com o número da Companhia e da praça gravados em pequenos
algarismos;
2.ª — Penacho de lã branca e encarnada;
3.ª — Calças largas por cima de botins curtos;
4.ª — Na farda, platinas de pano azul com enfeites de galão amarelo, e lã branca;
5.ª — As pestanas das algibeiras em plano horizontal.
Cavalaria
1.ª — Barretina de pano de chapéu com virolas, e escamas de latão, tendo na
chapa em que assentava o laço, os números da Companhia e da praça gravados em
pequenos algarismos;
2.ª — Penacho de lã encarnada;
3.ª — Calças azuis com fundilhos e canhões de cordovão por cima dos botins,
com esporas cravadas no salto.
Mais tarde a cavalaria passou a usar botas altas com esporás, deixando o botim.
28
IV — Armamento, equipamento e arreios
Armamento para a Cavalaria: clavina, duas pistolas e espada.
Armamento para a Infantaria: espingarda curta com baioneta e espada.
Equipamento para as duas armas: Correame branco. Para a Infantaria:
Patrona da Infantaria de Linha a tiracolo e boldrié simples para o terçado.
Arreios: selim à inglesa sem chairel; freio também à inglesa com bocado
firme; cabrest ilho de montada com prisão de ferro em corrente.
V — Administração
O soldo e pré dos ofic iais e sargentos era idênt ico aos da Tropa de Linha,
acompanhando sempre os seus aumentos.
O pré de cabos e soldados, diferia por motivo da melhoria para rancho,
que as praças descontavam nos seus vencimentos.
Por curiosidade apresentamos alguns dos vencimentos
Os capitães e tenentes de cavalaria ganhavam cerca de 2.000 reis mensais
a mais do que os de igual patente na infantaria. O vencimento dos alferes era
igual nas duas armas. Sargentos, cabos e soldados da cavalaria t inham a mais
do que os da infantaria, 10 reis diários.
A administração da G. R. P. era por conta da Real Fa zenda, sendo as
despesas de todo o género (curativo, ferragem. consertos de armas e arreios,
expediente e miudezas das Companhias) pagas pela Tesouraria das Tropas da
Corte, abonadas pela assinatura do coronel comandante da Guarda, segundo
autorização da Secretaria de Estado.
29
A remonta era determinada pela mesma Secretaria e as suas despesas
pagas pela Tesouraria das Tropas da Corte, quando os solípedes não eram
recebidos directamente das Cavalariças e Manadas Reais.
Por portaria de 11 de Abril de 1815 a Inspecção Geral da Cavalaria
permit ia a seguinte despesa diária com cada cavalo, excluindo as forragens:
Esta importância era a relativa ao tempo de paz para o Exército. Por ém,
como fosse julgada insuficiente para a Guarda, foi esta autorizada a despender
com cada solípede a importância diária de 35,96, relat iva à autorizada para os
solípedes do Exército em tempo de guerra.
VI — Aquartelamento
Estado Maior e as Companhias de Infantaria e Cavalaria foram
aquartelados separadamente em conformidade com determinado no § 1.0 do
Plano da Criação:
«Todas as Companhias serão aquarteladas separadamente, serão
preferidos para este fim os Bairros da Cidade onde não houver Tropas de
Linha; poderão dividir-se as Companhias de Cavalaria em dois quartéis,
suposta a dificuldade de achar cavalariças para 52 cavalos».
Os consertos e obras estavam a cargo da Inspecção dos Quartéis Militares
aonde igualmente subiam todas as requisições sobre Quartéis, utensílios e
material de aquartelamento.
As companhias tinham os seus quartéis em casas de aluguer ou barracas
construídas para esse fim, tendo o «Auditor deste Corpo autorização para
embargar e tomar de aposentadoria quaisquer alojamentos indicados pelo
Chefe, como precisos para acomodação do mesmo Corpo».
As luzes dos quartéis, postos da Guarda e cavalariças, fo ram desde a
primit iva fornecidas pela Casa de Iluminação da Cidade; depois correram a
cargo da Inspecção dos Quartéis Militares, até que em 1820 voltaram
novamente àquela Casa, recebendo por cada luz 1/3 de quartilho de azeite
durante os
30
seis meses de Abril a Setembro, e nos outros seis, 72 quartilho para cada noite.
A distribuição dos quartéis do Estado Maior, Companhias e postos pela
cidade foi em definitivo a seguinte:
Unidades Quartéis Postos
Estado Maior R . F o r m o s a G das Bandeiras
Companhias de Infantaria
1.ª Beco do Carrasco
B o a - V i s t a S a n t a
Catarina Imprensa
Régia Patriarcal
Queimada
Cardaes
2.ª Santa Rita
S. Sebastião da Pedreira
Sete Rios
Cruz do Taboado
Santa Marta
Real Casa Pia
3.ª Loios
Praça da Figueira
S. Cristóvão
Menino de Deus
Escolas Gerais
Campo de Santa Clara
Mouraria
4.ª Loios
Chafariz de Dentro
Cais de Santarém
Cais de Ver o Peso
Cais do Tojo
Santa Apolónia
5.ª S. João de Deus
Inglesinhos
Queimada
Buenos Ayres
Necessidades
Visconde d'Asseca
6.ª S. João de Deus
A l c â n t a r a
P a m p u l h a
Santo Amaro
Junqueira
7.ª Largo do Carmo
Passeio do Sul
Passeio do Norte
Santa Ana
E n c a r n a ç ã o
8.ª Largo da Graça
Campo de S. Ana
Arco do Cego
Barreira de Sacavém
Arroios
Forno do Tijolo
Olarias
Nossa S.a do Monte
Rua da Glória
Beco da Era
31
Unidades Quartéis Postos
Companhias de Infantaria
9.ª Boa-Hora do Chiado
Ribeira Nova
Cais da Ribeira
Forregial de Cima
S. Carlos
Chagas
Caetanos
Cais das Colunas
10.ª Estrela
Cruz das Almas
Santa Isabel
Entre-Muros
Boa-Morte
Amoreiras
Inspe cçã o de Belé m D. Vasco
Tapada
D. Vasco
Cais de Belém
Inspecção do Campo Grande
-- Entrada Sul
Entrada Norte
Companhias de Cavalaria
1.ª Triste Feia Quartel do Infantado
2.ª Largo do Andaluz No antigo Cemitério
3.ª Colégio dos Nobres Nos alojamentos do Colégio
4.ª Rua de Salitre No P áte o d os M on ges
Brun os
VII — Serviço Interno
O Comandante do Corpo da Guarda Real de Polícia, es tava subordinado
ao General das Armas da Província, e ao Intendente Geral da Polícia no
respeitante a todas as ordens e requisições de forças, dando a ambos parte dos
acontecimentos do dia e noite antecedente, bem como às Secretarias de Estado
da Guerra e da Justiça, às quais enviava relatórios diários.
O Corpo, nas atribuições militares, seguia as Ordens Gerais prescritas
nas Leis. Regulamentos e Ordens do Dia do Exército; nas da Polícia e
Segurança Pública, observava as Instruções constantes no Plano da Criação.
O quartel onde residia o Comandante do Corpo, denominava-se Quartel
do Estado Maior; ali se fazia todo o expediente militar e civil, se guardavam
as bandeiras e estandartes e funcionava o Conselho de Administração, que
exercia as suas funções segundo determinadas instruções.
Os oficiais deveriam assistir o mais de perto possível a todo o serviço
interno das suas Companhias, «principalmente os de cavalaria para vigiarem
escrupulosamente no trato e sus-
32
tento dos cavalos, sob cujo objecto a mais pequena negligência será cast igada
com severidade».
O recolher era sempre indicado por toques de tambor e trombeta à porta
dos Quartéis; o render da parada era feito no verão às 6 horas da manhã e no
Inverno às 8.
A nenhum sargento ou soldado era permit ido pernoitar fora do quartel.
A Capital era dividida em 10 distritos para a Infantaria e 4 para a
Cavalaria.
Para a Infantaria, cada Companhia era responsável pelo seu distrito, o
qual era vigiado pelos corpos de guarda locais (postos) e patrulhas
extraordinárias, saídas dos respectivos quartéis, que frequentavam os locais
mais suspeitos.
O distrito de cada Companhia de Cavalaria era subdividido em giros, e
vigiado diariamente por patrulhas que patrulhavam a cidade e subúrbios,
«principalmente nos domingos dias santos em que os habitantes não
trabalham».
O tempo regulamentar era de 2 horas para a Infantaria e 3 para a
Cavalaria, pois «todo o tempo a mais fatigaria a tropa, a menos não daria
lugar a patrulhar os giros de maior longitude».
«Uma patrulha forte de Cavalaria, formada em derrama de todas as
Companhias e comandada por um oficial inferior, ronda um ou mais distritos
dos subúrbios todas as noites, sendo incerto o seu destino e hora de saída».
Dois oficiais por escala geral, rondavam a cavalo e acompanhados por
uma ordenança, os postos e patrulhas. Os Comandantes das Companhias, eram
os inspectores dos seus distritos, corpos de guarda e respectivas patrulhas e
«encarregam os seus oficiais subalternos e oficiais inferiores de sindicar o
bom ou mau serviço das mesmas patrulhas, ou qualquer acontecimento, para
dar imediatamente parte, e salvar a sua efectiva responsabilidade».
Um comandante de Companhia era diariamente nomeado oficial de dia ao
Quartel do Estado Maior, e outro presidia aos espectáculos públicos onde o
serviço de polícia fosse feito por guardas do Corpo.
Além dos oficiais de dia às Companhias, havia um oficial de piquete na
Infantaria, que comandava o contingente encarregado de acudir aos incêndios,
e outro na Cavalaria, pronto «a sair à primeira voz de tumulto ou sedição
considerável».
Comandado por um o ficial ou sargento era nomeado um destacamento de
Cavalaria, para todas as feiras até à distância
33
de duas léguas da Capital «com um efect ivo competente à concorrência do
povo, e capaz de segurar a tranquilidade pública. e prevenir tumultos
principalmente nas ret iradas». Para as feiras mais próximas, como as de
Belém, nos domingos de Setembro, de Benfica, nos domingos e dias santos de
Maio, e muitas outras, eram nomeadas patrulhas de Infantaria e Cava laria as
quais se coadjuvavam mutuamente. «O mesmo detalhe se pratica para policiar
os sítios onde sucedem espectáculos ou execuções mais consideráveis, a
respeito de concorrência de povo, ou carruagens de qualquer espécie».
Rancho
«O estabelecimento do rancho nas Companhias, sendo tão proveitoso
quanto recomendado, é assaz atendível, para que os Comandantes de
Companhia e Oficiais subalternos empreguem a maior vigilância por forma a
que os soldados arranchados todos, achem bom sustento, e a horas regulares, e
se mande mesmo a ração respectiva aos soldados, que estiverem de guarda,
excepto se for em grande proximidade, em cujo caso se deverá dar licença a
cada um alternadamente para ir comer o rancho.
No arranjo deste object ivo interessa a honra e dever dos Oficiais, para
que não se poupem às especulações ma is económicas a respeito dos géneros
convenientes, que sejam sólidos, nutritivos e bem calculados; e à maior
integridade possível na aplicação da quant ia que é descontada do pré a cada
praça arranchada; não consent indo que de tal dinheiro se dispenda a mínima
parte em outra cousa, que não seja de comer para as mesmas praças.
As praças arranchadas entram em forma chamadas pela relação do chefe
de rancho, e assim vão buscar as suas tigelas, ou pratos, com as rações ao
lugar em que se faz a distribuição, na presença do oficial de dia, e dali
passarão ao lugar próprio onde há mesas com toalhas e bancos em que se
assentam, para comer com os seus talheres competentes».
VIII — Polícia e disciplina
Pela oportunidade que ainda conserva e pela clareza do seu articu lado,
parece-nos interessante transcrever grande parte do que sobre disciplina
determinava o Plano de Criação da G. R. P.:
34
Sua Magestade quer que O Corpo da G. R. P. seja uma Força Nacional,
que segure a tranquilidade interna da Capital, e vigie na conse rvação da boa
ordem, e execução das leis. O essencial serviço deste Corpo consiste numa
vigilância assídua e firme, capaz de reprimir os infractores das leis e
perturbadores de sossego público.
Deve o Corpo conservar força moral e física; esta, reconhecida pela
aparência militar, adolescência e robustez dos indivíduos que o compõem, que
é precisa para reprimir os malévolos perturbadores da boa ordem; aquela,
exemplificada em público pelo exemplar comportamento e dignidade
individual, é evidentemente necessária para animar os cidadãos pacíficos, que
confiam no bom serviço deste Corpo, e o contemplam como a sua Guarda
Tutelar.
Todo o indivíduo deve considerar a sua admissão neste Corpo como um
princípio de remuneração que Sua Magestade dá aos seus bons serviç os
anteriores.
O costume de se embebedar qualquer indivíduo, será bastante, sem outras
circunstâncias agravantes, para ser expulso deste Corpo. Por consequência,
aquele que for possuído deste vício sem emendar -se, tendo recebido a
primeira advertência e for castigado por disciplina 3 vezes diferentes par
causa de simples embriaguês, será expulso deste Corpo.
Os indivíduos deste Corpo devem sustentar por hábito, sisudez de
carácter sem orgulho, cautos na maneira de aparecer em público, sempre
vest idos com os seus uniformes bem estimados por limpeza e decência;
trazendo as suas espadas ou terçados nos boldriés, bem colocados ainda
quando em passeio, pois que assim mesmo são considerados em serviço
acidentário; ao qual devem prestar -se sendo necessário em actos flagrantes.
Devem ter a mais escrupulosa escolha das pessoas com quem acom-
panham em sociedade, nos passeios e mesmo nas casas que frequentam, não
sejam suspeitas, desprezíveis, nem mereçam a má opinião do público.
É proibido por muitos atendíveis motivos, que qualquer indivíduo deste
Corpo apareça nos lugares -públicos cigarrando ou cachimbando.
É igualmente proibido andar sem uniforme ou disfarçado (sem ordem
posit iva) mesmo fora do serviço; o que dá lugar a presumir -se, que se
empreendem desígnios repreensíveis.
A disciplina, polícia e melhor reputação de qualquer Corpo, pede, para
ser sustentada, que se não tolerem nela costumes corrompidos e ant intorais;
por isso será louvável qualquer indivíduo deste Corpo que comunicar ao seu
Comandante respectivo, o vício daquele que conhecer manchado da nódoa de
má conduta.
35
Como nenhum indivíduo de fora deste Corpo pode usar do uniforme dele,
se torna necessário que quando algum for despedido do serviço activo saia
sem uniforme, e que até mesmo os objectos propriamente seus, sejam
desguarnecidos de forma, que jamais pareçam os deste Corpo. Todo o
indivíduo da G. R. P. que emprestar ou vender algum dos seus uniformes a
pessoa que não deva usá-los, deve ser asperamente punido.
Os comandantes das Companhias e seus subalternos, devem observar
escrupulosamente a aplicação que os oficiais inferiores e soldados dão a
qualquer gratificação que recebam dos seus serviços; não permite pois a boa
disciplina, que a mais pequena quantia seja mal aplicada. Devem mais,
atender a que as despesas feitas pelos seus súbditos não sejam excessivas, e
quando tal presumam, averiguar de que modo eles podem chegar a tais gastos
sem expor-se à sua perdição.
Todo aquele que contrair dívidas em tabernas e casas públicas, ou
convencido de caloteiro, será severamente castigado, e reincidindo, expulso
do Corpo.
Quando acontecer entrarem soldados novos no Corpo, manda a boa
disciplina que eles nunca sejam detalhados para serviço se não juntos a
soldados veteranos, a bem de se instruírem no serviço particular do mesmo
Corpo. Também serão entregues à vigilância dos veteranos de grande
confiança, aqueles soldados suspeitos de fazerem mal o serviço, tanto pela sua
omissão, como peia incerta conduta.
É proibido aos indivíduos deste Corpo frequentar as ruas das mulheres
meretrizes públicas, bilhares, botequins, tabernas, casas de sorte e jogos;
somente indo em serviço praticar diligências, ou inves tigações.
IX — Funções da G. R. P.
Funções Ordinárias
«A Guarda Real da Polícia no activo exercício de girar com assídua
vigilância por meio de Rondas e Patrulhas, por todas as ruas, praças,
travessas, becos, estradas, azinhagas e caminhos da Capital e seus subúrbios,
tem por objecto de suas funções ordinárias»...
Assim começa o preâmbulo do Plano da Criação no respeitante às
Funções Ordinárias da G. R. P., que como veremos eram vast íssimas não só
para os seus efectivos, como para a área a policiar:
36
— Prisão de todos os criminosos e cúmplices de crimes delitos públicos
achados em flagrante, bem como dos acusados pela voz pública:
— Prisão de salteadores, ladrões de estrada, incendiários assassinos,
apreendendo-lhes as armas, instrumentos, ou materiais dos seus crimes;
— Prisão dos contrabandistas, e apreensão de «suas fa zendas e
transportes» conforme as Leis da época;
— Apreensão de armas proibidas e prisão dos desertores de terra e mar,
bem como de todos os militares que não apresentando os seus passaportes de
licença em dia, não just ificassem o motivo por que se encontravam ausentes
das suas Unidades;
— Vigilância sobre os vadios, vagabundos, «mendigos ociosos que
podem trabalhar, os que fingem chagas ou enfermidades, ou que disfarçam de
outra qualquer maneira»;
— Prisão dos vagabundos ciganos «que se inculcam adivinhos dizendo
que sabem ler a buena-dicha, e apreensão dos instrumentos com que sustentam
a impostura»;
— Prisão dos suspeitos contra a segurança pública e «das pessoas
nobres», dos perturbadores do Culto Divino nos Templos ou fora deles, «ou
deprecação de autoridades eclesiás ticas»
— Dar parte de todos os cadáveres ou fetos recém-nascidos guardando o
local até à chegada do Ministro Criminal;
— Participar dos incêndios, arrombamentos, assassínios, destruição de
plantações e edifícios públicos ou particulares mesmo fora do acto de
flagrante delito;
— Prender os que por imprudência ou pela rapidez de suas cavalgaduras,
atropelem ou maltratem qualquer pessoa, ou causem prejuízo nas estradas,
ruas, ou praças públicas;
— Prender os jogadores de azar, fazendo-lhes apreensão «de todos os
instrumentos, peças e aparelhos dos mesmos jogos»;
— Prender os donos ou caixeiros de tabernas, botequins, bilhares ou
casas públicas abertas depois do toque dos sinos da cidade, «às dez horas
desde o dia de N. S.ª da Luz, e no mais tempo às nove horas»;
Havendo algumas destas casas licenciadas para fechar mais tarde, devem
apresentar uma portaria da Intendência Geral da Polícia, rubricada pelo
comandante do Corpo, a qual tem validade quando não haja desordem dentro,
porque havendo-a, até mesmo a portaria deve ser caçada.
As lojas públicas que
37
não vendam bebidas espirituosas, podem fechar as portas mais tarde a seu
arbítrio;
— A casa de qualquer cidadão não pode ser entrada nem de dia nem de
noite, salvo no caso de incêndio, inundação ou reclamação feita da parte d e
quem lá mora, ou em flagrante delito, gritos de Aqui-d'El-Rei, ou motim
desordenado. Ainda mesmo quando possa supor -se que dentro se acha
refugiado algum criminoso de tal recomendação, que seja indispensável
prendê-lo, postar-se-ão sentinelas de observação e segurança pela parte de
fora, avisando-se o Ministro respectivo para ir entrar judicialmente na dita
casa; em sua companhia entrará o comandante da patrulha, praticando
exactamente o que as Leis determinam a respeito dos auxílios prestados à
Justiça de Sua Majestade;
— Não embaraçar (antes socorrer precisando -o) as pessoas que forem
encontradas conduzindo crianças à Casa dos Expostos, guardando todo o
segredo, e sem inquirir donde vêm;
— Praticar os actos de caridade com os indivíduos que necessitarem pios
socorros, conduzindo aos Hospitais os mo ribundos e os feridos desamparados.
para ali serem tratados ou curados: recolhendo nos Postos da Guarda aqueles
desfalecidos ou embriagados que encontrarem nas ruas, demorando -os ali até
recobrarem alívios, ou seu perfeito juízo, que então serão despedidos ou
acompanhados a suas casas, não sendo criminosos que algumas vezes se
fingem para melhor escapar-se;
— Prender as pessoas de qualquer sexo, que sob o pretexto de banhar -se
o fazem indecentemente nas praias públicas com escândalo das pessoas que
por ali transitam por desafogo ou necessidade não devendo contudo esta
proibição entender-se com aquelas, que vão banhar-se nas praias escusas sem
ofender a modéstia
— Prender as pessoas de qualquer sexo, que praticarem publicamente
actos desonestos, ou mostrarem pinturas ou figuras que ofendam o pejo, a
honest idade e os bons costumes:
— Vigiar, em suma, pela observância dos Editais do Senado obrigando
ao fiel cumprimento de quanto neles se determina.
Mais disposições e missões a cargo da G. R. P. poderíamos reproduzir, o
que não fazemos para não sobrecarregar demais tal assunto.
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Só por aqui se vê no entanto que todo o serviço hoje a cargo das várias
Polícias, G. N. R. e Guarda Fiscal, estavam no tempo da G. R. P . apenas a
cargo desta, e com os escassos efectivos já apontados 9.
Funções extraordinárias
A G. R. P. prestava auxílio, desde que fosse legalmente requerido, às
seguintes entidades:
Senado da Câmara; Ministros criminais dos Bairros; Chefes de
Repartições Civis; Superintendentes Gerais; Magis trados Empregados;
Administradores das Alfândegas; Contratadores Gerais dos Reais Contratos;
Juízes dos Descaminhos dos Direitos Reais; Da Mesa do bem comum dos Mer -
cadores; Provedor da Saúde Publica: Auditor Geral da Marinha; Juízes dos
Degredados; Almotaces da Cidade; E a todas as Autoridades legalmente
constituídas.
Tal como hoje, qualquer autoridade const ituída, auxiliada pela Guarda
em consequência de requisição feita ao Comandante do Corpo, conforme a
Lei, não tinha ingerência nas operações militares; estas eram da
responsabilidade do comandante da força requisitada, que para o cumprimento
da requisição feita, as aplicava conforme entendia.
X — Castigos
«O Regimento dos castigos» da G. R. P. classificava as faltas da seguinte
maneira:
— Faltas simples;
— Faltas maiores «que têm a natureza de delitos»; — Crimes de qualquer
classe.
9 Em 1802 é instituída a Guarda de Barreiras, deixando a G. R. P. de exercer a fiscalização
aduaneira nas entradas da Capital. As barreiras eram em número de 2o , mas por falta de
efectivos, a G. R. P. nunca chegou a guarnecer mais de 4: Alcântara, Rua das Águas Livres,
Santa Apolónia e Sacavém.
Até 1818 exerceu a G. R. P. igualmente as funções de Policia Marítima. A partir desta data
foi cr iada uma força militar para aquele efeito, deixando a G. R. P. de exercer aquelas
funções.
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As faltas simples, consideradas como «descuidos aciden tais», eram prevenidas
com admoestação ou advertências suaves, pela primeira vez, passando à classe
de delitos, quando se verificasse a reincidência.
«Por estes meios, se conseguem maravilhosos resultados, principalmente
quando chamando os homens em particular e advertindo -os por maneiras
convenientes das faltas em que têm incorrido. O soldado português, por
condição e génio original da Nação, sujeita os seus caprichos e convence-se
ainda mais dos seus erros, por conselhos suaves e paternais dos seus chefes,
nos quais reconheça firmeza de carácter, verdade e me recimento, do que por
meios ásperos e violentos, daqueles que tendem para o rigor imoderado.
As faltas maiores, que são delitos, nunca devem confundir-se com as
faltas simples; a indulgência mal concebida neste caso, aproxima -se à
impunidade, que sempre foi o abismo da Disciplina».
Para estas faltas o delinquente sofria a pena de prisão dentro do quartel,
conforme a natureza daquelas.
«As penas correccionais usados neste Corpo são:
— Prisão no quartel fazendo serviço efect ivo;
— Prisão no calabouço fazendo faxinas, indo à esquadra de ensino de
manhã e de tarde, ou carregado de armas na frente do Quartel de Bandeiras
com sentinela à vista, ou ainda, e por algumas horas de gonilha10
;
— Prisão rigorosa a pão e água;
— Castigo corporal na frente da Tropa, despida a farda.
O modo de aplicar as penas, deve corresponder ao seu fim, e não ficar
apenas em meras formalidades; devendo alguém ser encarregado de presenciar
a devida execução, com responsabilidade se infringir a ordem, que a
determina.
Os crimes seguem os meios ordinários do Processo Criminal. assaz
declarado nas respectivas Leis Militares: os réus respondem em Conselho de
Guerra, ou são exautorados na conformidade das Leis, segundo o sistema
Criminal-Penal-Lusitano por que são julgados».
10 Gonilha ou golilha, argola pregada num poste a que se prendia o castigado pelo pescoço.
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XI — Recompensas
«Sua Magestade, quando Foi Servido criar este Corpo para um fim tão
útil, qual a Segurança Pública de uma tão grande cidade, Capital de seus
vastos domínios, houve por bem estabe lecer um t ítulo de recompensas
conforme os arriscados serviços que demandam o desempenho das suas Reais
Determinações, e que são as seguintes:
— Por todo o matador ou ladrão conhecido, que prenderem os soldados
da G. R. P., terão 4.800 reis de recompensa;
— O mesmo terão prendendo qualquer contrabandista além da parte que
lhes pertencer como tomadores, se apreenderem os contrabandos;
— Todo o soldado que se incapacitar no Serviço, terá a sua reforma com a
parte de vencimento competente segundo a qualidade dos seus serviços;
— Do mesmo modo será escolhido para Guarda Barreira, se reunir as
condições pedidas para aquela Guarda e a sua incapacidade o permit ir».
XII — Comandantes da Guarda Real da Polícia
Coronel Conde de Novion, 1801-1808.
Coronel Filipe de Sousa Canavarro, 1808-1813.
Coronel D. Joaquim da Câmara, 1813-1817.
Coronel José Pereira de Lacerda, 1817-1825.
Coronel Barão da Portela, 1825-1826.
Coronel Francisco José de Figueiredo Sarmento, 1826-1828.
Brigadeiro Joaquim Maria de Sousa Tavares, 1828-1833.
Coronel Manuel Teixeira Gomes, 1833-1834.
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o rápido esboço histórico que atrás fica, em que da História
Pátria nos tivemos de servir para fazer compreender a
necessidade que através dos tempos sempre houve de criar,
reformar ou remodelar os organismos de segurança pública, se tiram as
seguintes conclusões:
Sempre que a vida nacional se agita, por razões de polít ica externa e
muito principalmente por aquelas devidas à polít ica interna, surge a
necessidade de se atender com o maior cuidado às forças de repressão,
prestigiando-as e renovando-as, pois as anteriores saem sempre mal feridas
perante a nova polít ica e os seus novos senhores.
Assim, em 1383, ao termos as primeiras notícias concretas dos
Quadrilheiros de D. Fernando I e das suas Leis no sentido de tornar mais
eficiente esta organização, encontramo-nos no final de uma guerra infeliz e no
final também de um não menos infeliz reinado.
Tanto a nobreza como o povo de então, pressent indo a crise dinást ica que
bem pouco tempo depois daria lugar à quase perda da nossa independência, se
levantam em massa contra a Regente D. Leonor, a «Flor d'Altura», após a
morte do fraco e formoso Rei seu marido.
Costumes dissolutos, intrigas e ciumentos amores de al cova no Paço
Real, roubos, violências e assassínios nas ruas, indisciplinam a população e
requerem rápida vigilância e castigo.
Em 1603, Filipe III de Espanha e II de Portugal sente a necessidade de
reformar e valorizar a sua força de segurança na cidade de Lisboa, criando o
Corpo de Quadrilheiros em extenso e completo Alvará.
Motivo: aperceber-se que lhe foge a simpatia do povo português ao
pretender unificar a nossa polít ica com a da sua ex tensa monarquia, erro de
visão que seu pai, mais prevenido,
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jamais cometeu. Revolta-se a população, ao mesmo tempo que vadios e
arruaceiros se servem de tal descontentamento para pr aticarem toda a sorte de
desmandos e de crimes, quantas vezes a coberto de um sentimento patriótico
que neles jamais poderia exist ir.
Em 1801 a nossa situação ainda é menos brilhante do que em 1383 e até
do que em 1603, época em que ao menos ainda havia um sentimento de
patriotismo e de libertação contra um rei estrangeiro.
Desaparecido há muito D. José I (1777), com a sua morte quebrara -se o
pulso de ferro do seu primeiro ministro, o Marquês de Pombal.
D. Maria I, fraca e louca, vagueava na sombra dos corredores do seu
palácio pela mão de ambiciosos políticos, em plena desorientação
internacional motivada pela revolução francesa em guerra aberta contra todas
as Cortes da Europa.
O Príncipe Regente D. João, cauteloso e prudente, pouco mais fez,
coagido entre os formidáveis interesses da Inglaterra e da França. que quase o
não respeitavam.
Luxo desmedido, péssimos hábitos herdados do tempo em que o País
convencido de rico se desabituara de trabalhar, aumentam a imoralidade
importada da França republicana e consular, fomentam a desordem nos
espíritos e os crimes na rua.
Um Exército vencido numa campanha desastrosa (a de 1801 em que
perdemos Olivença), tornam-no incapaz de se impor ou de merecer qualquer
confiança.
Um homem de carácter e valor vive ainda, para bem de todos, no meio de
tanta desorientação e fraqueza. Tem sob os seus ombros a tremenda
responsabilidade da polícia do Reino e chama-se Diogo Pina Manique.
É ele que nesse ano cria a Guarda Real da Polícia de Lis boa, corporação
modelarmente pensada e organizada. Tem apenas um «senão», o seu primeiro
comandante, traidor duas vezes, à sua pátria de origem e ao país que o
acolheu. Sem carácter e ambicioso, cria as maiores dificuldades ao enérgico
Intendente, que por vezes tem de baixar a orgulhosa cabeça, ao constatar a
impotência dos nossos governantes em face do predomínio francês.
Em 1833 o Exército Libertador sob o comando do Duque da Terceira,
embarca no Porto, na Esquadra de Napier, e a
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24 de Junho desembarca numa praia do Algarve, entre Cacela e Tav ira.
A 23 de Julho, depois de vagarosa jornada do Algarve ao Tejo, bate as
tropas do General Teles Jordão, na Cova da Pie dade, e no dia seguinte, a 24,
entra em Lisboa sem disparar um tiro.
Comanda as tropas miguelistas o Duque de Cadaval que, ao saber da
derrota e do assassinato de Teles Jordão, abandona com o seu Exército a
Capital. arrastando consigo a Guarda Real da Polícia, que fiel ao seu governo
se bate até 26 de Maio do ano seguinte, data em que é dissolvida.
Sobre a actuação da Guarda Real da Polícia na Guerra Civil que vai de
1832 a 1834, transcrevemos, com a devida vénia, da Revista Defesa Nacional,
parte de um artigo que tem por título «Guarda de Polícia» -- Século XIX (N."
175 e 176 de 1948):
Em Abril de 1824, por decreto de 17 de Fevereiro, e com o parecer do
Infante D. Miguel, ao tempo Comandante em Chefe do Exército, era, a seu
turno, constituída a Guarda Real da Polícia do Porto, ou, pelo menos, se já
exist ia a esse tempo (do que não há, todavia, rasto que saibamos) tornada
definit iva e regularizada a sua organização.
Ficava essa Guarda do Porto dispondo, ao mando de um major ou tenente
coronel, assist ido de um reduzido estado maior e menor, de companhia de
cavalaria, com 70 praças, e de 2 companhias de infan taria, cada uma delas
com 105 oficiais e praças; o que dava para essa arma um efectivo de 210
homens. Total geral: 289 oficiais e praças e 65 cavalos.
O primeiro recrutamento foi levado a efeito por alistamento volun tário de
sargentos, cabos e soldados transferidos do Exército para ali servirem durante
4 anos, com possíveis readmissões, e julgados nas condições requeridas, não
só de robustez, mas de boa conduta moral e civil. Uma escolha rigorosa devia
presidir, da mesma forma, tanto à admissão dos oficiais como à dos sargentos
cabos e praças.
Foi 1.º Comandante da Guarda Real da Polícia do Porto, o major de
Infantaria João Trager Russel, que nesse posto e como tenente -coronel
permaneceu, à sua frente, até à Guerra Civil. Já, em Maio de 1828, a G. R. P.
do Porto permaneceu ao lado do Governo constituído e, tendo abandonado o
Porto, vem entrar na composição de uma das colunas que, sob o comando do
tenente general Gaspar Teixeira, depois
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Visconde do Peso da Régua, operaram, a norte do Douro, contra a divisão
liberal sublevada.
Onde porém, em serviço de campanha de 1ª linha, as duas Guardas Reais
da Polícia (a de Lisboa comandada, pelo menos desde 1830, pelo brigadeiro
graduado Joaquim José Maria de Sousa Tavares) têm pági nas muito honrosas
é, na Guerra Civil, de 1832 a 34, em que, como é natural, servem também com
inteira fidelidade os poderes constituídos, até à convenção de Évora Monte.
A primeira a entrar em operações vem a ser a do Porto que, em de Julho
de 32, segue o movimento de retirada da guarnição para o sul do Douro e, em
seguida, incorporada com a Infantaria de Cascais e outros corpos de Milícias e
Voluntários Realistas, na Iª Brigada da 4.a Divisão, essa, agora ao mando do
coronel Russel, vem a tomar parte, em 22 e 23, nas acções de Valongo e Ponte
de Ferreira, choques iniciais da sangrenta luta que, durante quase 2 anos, se
iria travar.
Depois, durante o cerco e durante o levantamento do mesmo, em Julho de
33, está ao sul do rio, adstrita à 3.ª Divisão sitiante, ocupando com a brigada
provisória a que pertence, o acampamento do Candal. E, em 9 de Agosto, vem
na coluna do general Gouveia Osório, para Coimbra, onde, a 13, reúne à
Guarda de Lisboa.
Esta, saída da Capital no efectivo de cerca de 2.000 homens, entre
infantes e cavaleiros, e com as 4 bocas de calibre 3, de uma meia b rigada
privat iva, que lhe fora atribuída quando do provimento de 1928; e também
com os outros corpos da guarnição de Lisboa, quando da entrada do Duque da
Terceira em 24 de Julho na Capital. Essas tropas haviam at ingido o Mondego
a 9 e 10 desse mês.
Quando, em 15, marcha sobre Lisboa o Corpo de Exército, comandado
pelo tenente general Clouet, as duas Guardas Reais vêm, com as suas três
armas competentes, juntas com os afamados Voluntários rea listas de Chaves,
constituindo, na coluna divisionária de Laroche-Jaquelein, uma brigada, com
autonomia de destacamento misto e que Burnzont, com o comando da Guarda
Real da Polícia de Lisboa, confiara ao seu primogénito, o coronel Luiz de
Burnzont.
Quando do ataque de 5 de Setembro, ao sector compreendido entre
Palhavã e Campolide, está esta brigada em reserva, bivacada, onde é a
Alameda das Linhas de Torres, entre o Campo Grande e o Lumiar.
E é ainda incorporada nesta brigada que as duas infantarias da Guarda
Real da Polícia formam o primeiro escalão de ataque, vinda da Portela de
Sacavém sobre a Penha de França, em 14 de Setembro. Têm aí uma perda
sensível nos seus efect ivos, pois deixam no campo, entre mortos e feridos,
cerca de 70 homens.
Nos estabelecimentos de unidades estabelecidas, como ordem de batalha,
por Macdonell, Póvoas e Azevedo de Lemos, quando suces -
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sivamente comandaram as tropas em operações, a infantaria das duas Guardas
fica, em geral, incorporada na Brigada de Reserva, esta até certa altura
comandada por Luiz de Burmont, e depois pelo brigadeiro João Pigott. Da
cavalaria, pelo menos dois esquadrões vão, em Março de 33, para o Algarve
onde operam até ao fim da Guerra Civil.
O sector ocupado pela Guarda Real da Polícia, durante as operações de
sít io e de invest imento de Lisboa era situado na esquer da da linha de ataque,
apoiando a defesa da Portela de Sacavém, entre o Mirante de Freire e o Pote
de Água.
É aí fortemente atacada a posição em 10 de Outubro, quando Saldanha
toma a ofensiva, saindo fora dos seus entrincheiramentos, para fazer, como
fez, levantar o cerco da Capital. Mas as colunas liberais vindas pelo vale de
Arroios, esbarram com a vivíssima resistência da gente de Burmont. A Guarda
Real da Polícia repele o adversário, com grandes perdas para este, e passando
à ofensiva, num brilhante contra-ataque, leva-o de vencida até ao Alto do Pina
e mesmo até à Penha de França.
Tomando posição nestes dois pontos de apoio, Burmont, prepara-se para
aí se consolidar e pede reforços com o fim de Progredir na marcha para a
frente.
Não vindo, até ao cair da tarde tais reforços, e tornando-se a situação
comprometida pela rotura do centro realista, a Guarda Real da Polícia
consegue, sempre em atitude firmíssima e rompendo caminho a todo o custo e
entre inúmeras dificuldades e perigos constantes, retirar pa ra o Campo Grande
e daí para o Lumiar, indicado como ponto de concentração das tropas
realistas.
Ainda e também no Campo Grande, um esquadrão de cavalaria da Guarda
se dist ingue por uma impetuosa carga, que executa sobre uma coluna liberal. É,
sem dúvida, esta página de 10 de Outubro de 1833 a mais brilhante do historial
guerreiro da Guarda Real da Polícia.
No combate do dia seguinte, em Loures, a brigada da Guarda ainda
comandada por Luiz de Burmont, ocupa a esquerda da linha de combate,
tomando posição no alto, junto à igreja de Loures. A sua cavalaria é a
primeira a tomar contacto, na estrada de Lisboa, com a de Saldanha.
Acompanhando o Exército vai a Guarda estabelecer -se em Santarém.
Toma parte na batalha de Almoster em 18 de Janeiro de 1834, incorpo rada na
Brigada Rebocho, e ataca pela extrema direita as posições liberais de Santa
Maria de Almoster.
Depois, em 18 de Maio, perdida a Batalha de Asseiceira, a Guarda, tanto
de Lisboa como do Porto, segue, sob as ordens de Azevedo Lemos, o
movimento de retirada dos restos do Exército que guarneciam San-
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tarém e dirige-se para Évora, onde é dissolvida a 26, em consequência da
convenção de Évora Monte.
Foram seus últ imos comandantes: da Guarda de Lisboa, o coronel de
cavalaria Manuel Teixeira Gomes; e da do Porto, o major de infantaria José
Pedro da Silva.
Em 3 de Julho de 1834 o Governo const itucional dava-lhe, como
sucessora, a Guarda Municipal de Lisboa às ordens do brigadeiro Fran cisco de
Paula de Oliveira, depois Barão de Almeida. O seu primeiro aqua rtelamento
foi no convento dos Loios, onde, como vimos, já estivera uma co mpanhia da
Guarda Real da Polícia, e onde ainda hoje está aquartelada uma unidade da
Guarda Nacional Republicana.
A 6 de Junho de 1834, D. Miguel embarca em Sines para o exílio,
terminando com ele a realeza absoluta em Portugal.
A situação no começo deste ano era confusa e pouco bri lhante. Tropas
mercenárias, de efect ivos elevados, reforçavam o Exército Liberal. O País,
pisado por estrangeiros e cruzado em todos os sent idos por guerr ilhas com
ocultos desígnios políticos ou de bandit ismo, sofria na sua administração e
economia.
A pretexto de vinganças polít icas contra os vencidos de ontem. Lisboa
era teatro de crimes e extorsões inadmissíveis.
Assim se explica a necessidade urgente de. a menos de um mês da queda
de D. Miguel, D. Pedro, regente do Reino em nome de sua filha D. Maria II,
assinar em Queluz a 3 de Julho de 1834 o decreto criando a Guarda Municipal
de Lisboa.
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