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6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas:
com uma breve introdução e uma também breve conclusão
diegoSABÁDO
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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Todos os direitos e responsabilidades desta publicação reservados à Limoeiro Edições.
SABÁDO, Diego. 6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas:
com uma breve introdução e uma também breve conclusão.
Belém: Limoeiro Edições/PerSe, 2014.
ISBN: 978-85-8196-997-8
Série: Filosofia. Fenomenologia. Psicologia. Teologia.
Limoeiro Edições
Editora PerSe
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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diegoSABÁDO
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas:
com uma breve introdução e uma também breve conclusão
SEGUNDA EDIÇÃO
Belém-PA
2014
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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Para minha mãe,
que esteve lá na primeira edição, indo e vindo sem parar, fazendo o impossível para
tornar um sonho realidade. Graças ao seu esforço hoje vivo cada dia com mais fervor este sonho de ser escritor.
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Prefácio à 2ª edição _________________________________________________________ 006 Breve Introdução ___________________________________________________________ 008
“A Síndrome de Peter Pan” __________________________________________________ 009
Desespero e Aceitação do “Eu” que se é ______________________________________ 021
O “Eu” e o “Outro” __________________________________________________________ 029
A Função da Angústia no §40 de “Ser e Tempo” ______________________________ 044 Educação e Indivíduo _______________________________________________________ 089
O Indivíduo diante de Deus _________________________________________________ 107 Uns poucos poemas – explicação ____________________________________________ 109
Breve Conclusão ____________________________________________________________ 128 Referências _________________________________________________________________ 129
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Prefácio à 2ª edição
Em 2009 iniciou-se uma correria em minha família e
entre meus amigos para realizarmos a publicação deste livro. Era meu primeiro livro, o primeiro de todos, o início de um sonho a se
realizar. Lembro ainda hoje do dia do lançamento, na quadra de
uma igrejinha próximo à casa de meus avós, eu lá, com uma
camisa listrada multicor dando autógrafos, me sentindo um
verdadeiro escritor. Creio que este sentimento estará sempre
presente em mim. Nos livros seguintes, quando recebia os convidados nos lançamentos ou quando dava os autógrafos,
sempre outra vez a memória trazia as imagens daquela primeira
vez, com todas as suas sensações, as boas e as ruins, sim, ruins,
pois houve uma delas, e consistia em um nariz teimoso
escorrendo sem parar por causa de uma alergia, ao final da noite lembro de meu avô descobrindo que a alergia provinha dos
próprios lenços de papel que me disponibilizaram para limpar o
rosto, que estavam empoeirados por muito tempo de guardados.
Mas não são para estas memórias bobas que serve
este segundo prefácio, e sim para recolocar a importância do texto
exposto aqui. Muito se modificou do que eu pensava em 2009, mas uma essência permanece ainda intacta, e ela diz respeito
exatamente ao tema central deste livro: o “Eu”, como aquilo que
permanece em nós, e que precisa ser compreendido, aceito e
assumido como quem cada um de nós é e sempre será.
No decorrer destes anos me formei em Psicologia, e estive sempre outra vez revisitando estas questões, mas ainda
quando se falava em mudança de comportamento e mudança de
personalidade, seja lá o que for, permanece em minha
compreensão a verdade sobre o “Eu”. Mudança não é e não pode
ser nunca mudança do “Eu” que se é, e sim descoberta, aceitação
e assunção de si mesmo, do si-mesmo que cada um traz consigo. O indivíduo, este é o tema destas questões, destes
escritos, e dos poemas que o seguem, e, para mim, falar, pensar e
pensar sempre de novo sobre “quem” é este indivíduo sempre terá
sua relevância. Desta forma entrego a vocês este que foi meu
primeiro livro, revisado, e modificado em partes, foram retirados os inúmeros adendos aos escritos, e foram mantidos apenas os
textos concisos, de forma simples, alguns poemas do final
também foram retirados porque destoavam do todo da obra. Na
primeira edição tínhamos muita coisa que não deveria ter sido
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posta ali, mas os arroubos da juventude, a vontade de dizer e de
ser ouvido, inflando meu ego, fez com que eu enchesse de páginas
desnecessárias esta obra. Esta segunda edição, vocês a tem como
ela deve ser, simples e clara, deveras mais curta, e nem por isso menos importante.
Aqueles que leram a 1ª edição certamente notarão
como esta segunda traz uma leitura bem menos cansativa e,
quiçá, mas saborosa. Estou aprendendo a abri mão de coisas que
escrevi, o amadurecer de um escritor exige isto, admitir que
algumas coisas que escrevemos não são boas, e talvez não devam ser publicadas, antes eu não sabia de nada disso, ou era egoísta e
prepotente demais para admitir que comigo dava-se o mesmo.
Espero que gostem da obra que deixo para vocês
agora. Boa leitura.
diegoSABÁDO
Belém, 10 de maio de 2014
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Breve Introdução
O mundo técnico científico contemporâneo não sabe bem dizer onde se encontra, ou de que modo se tem acesso, ou se
ainda há um meio de chegar a ele, ao âmbito do ser-homem
mesmo. Tudo é agora posto sob o julgo da mensurabilidade, tudo
é calculável, e a existência humana agora afunda os pés na lama
de sua própria racionalidade. O que temos a dizer? Coisa alguma
porque não nos é dada a chance de expressarmos tal indignação. Mas eles não nos calam a voz, não, pelo contrário, o mundo
técnico científico atual apenas nos ensina a aceitar, a sorrir, e
achar que toda esta loucura é natural, e faz parte de nosso existir
mesmo. A ciência e o saber filosófico caracterizam-se, ambos, pela
luta entre este tecnicismo e a busca pelo que de humano há ainda em nós. De que lado estamos? Daquele que busca o sentido da
humanidade, o ser-homem da humanidade mesma. Estamos no
caminho certo? Esta escolha é a escolha certa? Na verdade ela é
só uma escolha, e escolhas não são boas ou ruins, elas são só
escolhas, e são tudo o que somos.
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“A Síndrome de Peter Pan”
Um breve esboço sobre o medo de crescer.
Este texto apresenta uma análise clara e distinta sobre uma nova concepção da chamada Síndrome de Peter Pan. Tomei a liberdade de auxiliar-me na poesia de um jovem amigo, e de tomá-lo como exemplo. Por esta razão, é para ele que dedico este breve esboço sobre o medo de crescer.
Introdução poética para uma teoria.
Quando Dennis percebeu que, em seu humilde oceano, já se mostrava demasiado tarde, e que o calor do verão da vida
havia derretido por completo o gelo das lembranças, nada mais
poderia ser feito, senão abrir as velas e partir, a todo pano, no
vento surdo de sal que ecoava livre, abandonando os verdes vales
brancos de neve de sua terceira infância. Mas nosso pobre poeta
não pôde levantar as âncoras, temia não suportar o infinito no horizonte. Dennis era ainda jovem quando chegou a esta
encruzilhada. Mas todos chegaram ou chegarão a ela, os que já
chegaram devem escolher como atravessar esta longa ponte, e os
que já descansam na outra margem nem sempre descansam em
sorrisos. Este pequeno esboço pretende clarear aos nossos olhos o
que vêm a ser este natural temor que aflige os adolescentes de
nossa sociedade, quais suas consequências, quais suas
influências na formação do indivíduo homem que caminhará livre
na densa mata do futuro. Nossa finalidade é então mostrar
aspectos da construção e descoberta do “Eu”. E como este é um tratado que, por mais poético que se nos mostre, teima em
pretender ter qualquer coisa de psicológico, não farei uso de
suspense algum, ou de qualquer mero recurso dramático,
portanto adianto-lhes, caros leitores, nosso sincero, real e singelo
exemplo cruzou esta ponte cruel, seu barco avançou na turva neblina do mar e ele descobriu, não tarde, porém nem muito
cedo, a dor de ser humano, de ter que seguir, de ter que
esquecer...
Desde que somos embriões murchos no útero materno,
estamos, como dizem os desenvolvimentistas na psicologia, nos
construindo, transformando, criando e recriando. Quando finalmente nascemos, já formados, passamos a desenvolver
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nossos sentidos básicos, coordenações motoras básicas, reflexos
básicos e uma infinidade de coisas básicas acontecem em todo
nosso organismo. Depois, na dita segunda infância, passamos a
nos aperfeiçoar por inteiro e aos poucos, física, orgânica e intelectualmente. Na terceira e última infância precedemos em
tudo a catástrofe mágica do ser adolescente. Tudo que
aprendemos e nos tornamos será parte do que seremos quando
chegarmos lá. Aí é que está o papel divinamente importante da
educação dos pais, e também por isso pensam eles que podem
moldar seus filhos à maneira que lhes convêm, porque o que ele verdadeiramente é aqui será a base e o reflexo do adolescente lá
da frente. Porém é preciso entender, por mais presentes que
sejam os pais, por mais unida que seja a família, por mais de
todos que seja tal criança, na adolescência ela estará só, sozinha
num imenso país de desconhecidos, de pessoas que a não entendem, que a não levam a sério. E ainda que dois amigos
adolescentes sejam companheiros inseparáveis na vida e na
morte, como se costuma dizer, nada mudará o fato de estarem
ambos sozinhos no dois que é um só de sua amizade.
Daí ser a adolescência a fase do medo, da angústia, da
solidão. Surge muita dúvida, muita busca por respostas que nem existem. A adolescência é quem cria o ser humano, com as bases
ainda frágeis que este trouxe da infância, o adulto, o velho que
este se tornar não será mais que as ramificações que esta mesma
criação da adolescência fez em seu incompleto caráter, em busca
de seu “Eu” livre de todo erro. Ao morrer então, mesmo que nem mais lembre e nem saiba como, ele se despedirá de tudo que se
tornou a partir das escolhas, das superações, dos desejos, os que
ele venceu e os que deixou lhe vencer, se despedirá de si mesmo,
e este “Si” mesmo que vai embora é apenas o bolo dos sonhos,
esquecidos ou realizados que aos poucos fermentou no forno
daquela vida que cruzou de alguma forma a ponte sobre o infindo mar da adolescência.
Qual a razão de ser do medo e da dúvida que às vezes
são tão poucos que nem podemos notar? Não a razão de ser mais
certa que esta: à frente da juventude de sua alma há somente o
desconhecido, duvida-se sempre do que há neste desconhecido, e teme-se também sua escuridão. É o medo, em qualquer grau que
se apresente para a pessoa que a fará retroceder um pouco
sempre, e pensar, para só então seguir. Suas ações encontram
neste medo um princípio incrível para não serem
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precipitadamente erros irreparáveis. No medo de crescer o jovem
encontra forças de preparar para si o melhor caminho possível,
dentre os muitos que sua subjetividade pode conceber. Mesmo
quando este se nega a avançar, como Dennis Potter o fez por muito tempo, não está senão, ainda que de forma não tematizada,
é claro, preparando não só o caminho que vai seguir, mas sim
toda bagagem, e a si mesmo para tamanha viajem. São as
dúvidas que nos fazem buscar respostas, e é o medo que nos faz
seguir, que nos faz agir, é justo este medo de crescer, que deveria
forçar os jovens corações a abandonar tudo e permanecer ali pra sempre, que os faz seguir em frente e crescer. É esta a razão de
ser de tamanha confusão, levar a catástrofe da adolescência ao
seu fim último e único.
É natural esta vitamina de sentimentos confusos que nos
aflige nesta passagem crucial, nesta saída da adolescência. Ocorre logo depois, como um depois de séculos velozes, logo
depois de nos darmos conta, de naufragarmos, por assim dizer,
neste mar vitaminado de medo, dúvida, angústia, desejos,
saudade e sonhos. Então é como se não soubéssemos onde
estamos, queremos seguir, queremos ficar, queremos voltar, e
estas são as três variáveis que dependem unicamente do “Eu” que cada indivíduo está se tornando: uns querem crescer o mais
rápido possível, romperam a barreira da infância cedo demais
sem saudade alguma e se apressam para chegar à idade adulta,
porém, ou não sabem por onde seguir, ou seguem em dúvida;
outros respiram de fato a dúvida, ou não sabem se vão ou se ficam, ou querem ir, mas no fundo sonham quimeramente em
ficar, ou dizem querer ficar quando na verdade anseiam pelo ar
novo que os espera; uns últimos, como Dennis, descobrem ser em
vão tentar permanecer, impossível voltar, e absolutamente
necessário seguir, então se agarram às lembranças tolas, certos e
confiantes de que, “crescer é esquecer que a infância nunca acaba”. Mas todos os adolescentes nesta fase enfrentam sua
insana crise de identidade: não sabem como resolver-se, não
sabem quem são, e temem o que irão se tornar, passam a buscar-
se em diversos lugares, passam a se procurar, a se criar, a se
inventar e re-inventar, se negam, se perdem, se encontram, e quando enfim se despedem de sua eterna Terra do Nunca, partem
novos, com seu caráter e sua personalidade construídos ou
mesmo esboçados, com seu “Eu” agora encontrado, debaixo do
braço, livres, quem sabe até, prontos para o futuro.
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Pequeno parágrafo para uma importante diferença.
Primeiro vejo a necessidade de explicar nossa Síndrome
de Peter Pan. Diferente do livro do psicólogo americano Dan Kiley, e de muitos outros estudiosos que tratam o tema como uma
versão masculina do chamado Complexo de Cinderela, nosso
esboço mira seus esforços para o alvo da adolescência. Nossa dita
Síndrome de Peter Pan não é aqui uma fuga dos homens das
responsabilidades enquanto estes já se encontram na idade
adulta, muito menos uma extrema vontade de permanecer criança em espírito para assim gozar de aventuras e prazeres que
geralmente seriam negados à um adulto com responsabilidades
sérias. O Peter Pan que até hoje se viu na psicologia é um adulto
que foge dos problemas e das preocupações, um “garotão”, que
não gosta de compromissos sérios e que em todo momento só quer se divertir (este é o Peter de Dan Kiley). O Peter Pan desta
nossa filosofia é na verdade o oposto do que até hoje se tem na
mente por causa destas influências psicológicas, é outro Peter,
um Peter quem sabe mais fiel ao verdadeiro personagem de J. M.
Barrie, talvez não fiel por completo por já haver deixado pra trás
aquela eterna “Neverland”. Nosso Peter, tratado neste esboço sobre o medo de crescer, é apenas um típico adolescente em sua
crise identitária, com medo de avançar um passo que seja, sem
saber por quais caminhos correr, por qual rua entrar. Há que se
entender, antes de mais nada, que esta Síndrome não é, em geral,
uma extrema vontade de permanecer na adolescência, de não crescer jamais. Nossa Síndrome de Peter Pan é exatamente o
medo que sentem os adolescentes de crescer (não por nada ser
este um esboço sobre tal medo), e não um desejo intenso de
jamais crescer, é o medo que sentem estes diante do
desconhecido, do futuro, o medo de não saber o que se tornar, por
não saber quem se é. Enquanto o Peter dos psicólogos carrega consigo uns quase cabelos brancos caindo sobre os ombros, o
nosso carrega o fardo de não conhecer o pesado futuro que terá de
enfrentar.
Do medo de crescer como humanamente essencial.
Os medos dos adolescentes volvem-se numa angústia
cruel, que lhes remoendo por dentro lhes tira o sono e os impede
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de agir num primeiro momento. A angústia1 que os aflige, atua de
muitas formas, mas é no fundo, somente o efetivo medo de
crescer, que acaba por acarretar no desmoronamento e na
construção, ao mesmo tempo, de todo o ser humano dos jovens. Tudo é novo então para este ser humano em construção
e desmoronamento chamado adolescente, mesmo aquelas coisas
que eram comuns em sua infância, se lhe aparecem agora
revestidas por novas peles e roupas. Eles não as podem
reconhecer mais, e mesmo que saibam como deveriam agir em
determinada situação, por uma nítida lembrança que seja de sua infância próxima, sentem-se paralisados, justamente porque, por
serem eles seres completamente novos, tudo que diante de si lhes
aparece é também novo, como se fossem apenas personagens
inéditos em mundos nunca antes visitados.
É difícil agir, é difícil saber como agir, porém não é possível esquivar-se deste algo novo, é preciso escolher o que
fazer, mesmo que se escolha permanecer imóvel e deixar tudo ser
levado na brisa do vento pela irracional força do dia-a-dia e do
tempo.
Tudo é novo, e tudo será sempre novo, até que ele possa
andar até o outro lado onde tudo não será senão um vomitório de repetições, que cada vez mais se revestirão de outras peles e
roupas, porém, aquele ser que desabava e se erguia ao mesmo
tempo haverá deixado de fazer tão incansável trabalho, e agora
poderá resolver tudo, pois tudo já foi resolvido antes. Suas
mudanças serão apenas couraças e mais couraças que colocará sobre as ramificações de seu ser agora caminhando para o fim.
Carta aos meus. Nº1 Saber se encontrar em meio aos nossos próprios
sorrisos perdidos no vão da nossa história. Eis o que me parece ser, deveras, difícil, porém, essencial. Olho ao redor do mundo e
vejo o mesmo mundo de antes, de sempre, acorrentado em devaneios tolos, em respostas mal pensadas, em lembranças distorcidas de um mundo que foi e sempre será este mesmo emaranhado e conflituoso fim, e aos meus olhos, tudo teima em
querer parecer este tolo começo.
Tenho procurado por muito tempo meu porto seguro, receio que seja hora de desistir, talvez ele nem exista. Tenho uns
1 Esta angústia é, claramente, ôntica, e ela só pode volver-se em medo por
encontrar no objeto “medo de crescer” aquilo que ameaça o “Eu”. Mais sobre angústia e sua diferenciação ôntico-ontológica no Escrito 4.
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dezoito anos cansados que teimam em não terminar. Sinto-me num fim sem aplausos, e me sinto feliz, pois quanto mais longe
meu caminhar me leva de "Neverland", mais esta existência se torna um filme perfeito, cheio de cenas banhadas em textos e desfechos maravilhosos.
Eu sou Dennis Potter, um anjo sem asas tentando
alcançar o limite do céu, um triste arlequim do avesso, embriagado de doces palavras e sorrisos sem razão de ser...
Espero que vocês perdoem este tímido desabafo, é um salto poético rumo à liberdade do espírito, é uma valsa sem sorte
alcançando o limbo caótico da solidão. Para aqueles que conseguiram se manter de pé após a
travessia da famosa ponte de paz, parabéns, e para aqueles, como eu, que continuam enfeitiçados pela beleza de uma terra
do nunca que deixa de existir a cada dia, espero que consigamos chegar com lágrimas de gratidão, ao que quer que seja, em terra firme.
Penso numa resposta que englobe tudo, que encontre cada detalhe e traga suas pequenas discrepâncias para junto de um todo maciço, e só consigo segurar em minha mão uma enorme esfera oca, opaca, frágil, cheia de preconceitos infindos,
cheia de medo e cheia de maldade. Dennis Potter – Sincero e sofrido poeta
Esta é uma carta que Dennis, nosso exemplo de típico
adolescente com um medo interminável do novo que lhe aparece
como futuro à frente, escreveu aos seus colegas de classe no livro
lançado por sua escola em seu último ano de estudo. Podemos
notar a clareza como o otimismo manchado de angústia e remorso pelo nada fazer se desenha pelas frases. Há esperança, sempre
há. Os jovens esperam sempre um futuro bom, por mais
inebriados que estejam pelos problemas e dores que enfrentam, e
por mais que todos os pensamentos lógicos que consigam
conceber o levem a conclusão de que será impossível sorrir no futuro, mesmo com todos os pesadelos do mundo, eles esperam,
oram, sonham com jardins cheios de flores e uma vida tranquila,
fácil, quimérica2.
Cada adolescente precisaria ser estudado sozinho, em
todas as suas particularidades, para assim podermos explicar
todas as facetas que este medo pode apresentar. Mas não é preciso fazer tamanho esforço para universalizar que tal medo é
real. Todo leitor que já tenha atravessado tal fronteira, e mesmo
2 Mesmo aqueles entregues à depressão sabem que nesta depressão está a esperança de seu futuro. São adolescentes, e por isso, nada, nem a morte é algo
sério. Aos adolescentes falta exatamente esta categoria existencial essencial: a seriedade.
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cada jovem que estiver lendo este esboço, pode olhar para dentro
de si e com certeza encontrará, em algum nível que seja, o germe
desta síndrome humanamente necessária para a vida.
Quando escrevia estas linhas, meus próprios dedos me quiseram derrubar para provar por si só que o que acabo de
escrever é falso. Porém vejo agora que mesmo aqueles que com
um furor imenso e sem nenhuma saudade atravessam a
adolescência imunes e se tornam honrados homens e mulheres
na idade adulta, de alguma forma, quando corriam sem descanso
para a linha de chegada, se depararam com este, mesmo que em subtraído grau, medo de crescer. Pois de que forma este medo se
lhes pôde aparecer? Talvez como medo de não conseguir chegar
onde se propunha, talvez medo de não ter certeza alguma de que
se estava no caminho certo. De modo que nenhuma pessoa está
absolutamente livre, ninguém foge a esta angústia, às vezes cruel, às vezes fugaz, à qual chamo: medo de crescer.
Busca e construção do “Eu”: O desenvolvimento da identidade
como idéia universalmente atribuída ao crescimento, e como
solvente do medo de crescer.
É devastadora a descoberta que se faz na adolescência
sobre a caixa de pandora existente no mundo adulto que os rodeia
e que antes seus olhos infantis não podiam enxergar. Começando
muitas vezes por seus próprios pais, que em todo instante lhes
eram exemplos de dignidade e honradez, como verdadeiros heróis, e agora se revelam pessoas normais, cheias de erros e defeitos,
cheios de humanidade, seus heróis perdem seus poderes, como
todo mundo adulto passa a perder as coisas boas que dele se
podia imaginar.
Muitos outros fatores também influenciam, mas não
tanto quanto o exposto acima, neste auto-perder do “Eu” que ainda nem era, do adolescente, são fatores múltiplos – e não
convém expô-los aqui – tão diversos quanto são os “Eus” perdidos
e que precisam ser buscados, para só então, de fato, passarem a
existir. A busca deste “Eu” é exatamente a formação da
personalidade, do caráter do adolescente, é a lapidada construção de sua maneira de pensar, de suas verdades, de sua razão e de
sua moralidade.
Esta formação da identidade do adolescente esbarra no
drama incrivelmente oposto da descoberta da impureza do mundo
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adulto. Pois é óbvio que seu natural amadurecimento lhe levará
ao que agora ele observa e entende como errado e absurdo. O
errado e absurdo que o adolescente observa aqui são coisas
comuns ao mundo adulto, atitudes, ações hipócritas e sem sentido que estes realizam (como o fato da própria lei, feita por
adultos, proibir os jovens de fazer coisas que eles já se
consideram capazes de fazer, e outorgar-lhes o dever de fazer
outras que às vezes ainda não se julgam, ou mesmo não são,
capazes). Deste modo é preciso brecar o carro nesta estranha
contramão, retroceder, e procurar outros meios, caminhos distintos, que lhes permitam chegar a casa sem ter que fazer parte
daquela imensa caixa de pandora3.
Agora este aventureiro não medirá esforços para
encontrar esta saída, e esta busca é apenas a construção de seu
“Eu”, subjetivamente composto pelo trabalho exaustivo de cavar estradas, atalhos, conceitos, e verdades absolutas em mundos
que ele cria, ou toma de outros lugares como corretos e infalíveis.
Estamos no que Erik Erikson chamou de crise da adolescência, e
onde o medo de crescer alcança seu mais alto grau de
potencialidade. Como ainda querer crescer diante de tanta
hipocrisia? Como crescer sem se tornar o que agora tanto se abomina? É inevitável crescer, inevitável seguir adiante, então, em
meio a esta crise: alguns adolescentes encontram ídolos em
pessoas que tomam agora como exemplos a se copiar, exemplos
de caráter e personalidade, dignos do rótulo da perfeição, nos
quais eles irão se mirar para a formação de suas próprias identidades; outros se negam a seguir quem quer que seja, se
negam a se tornar pessoas que a infância ao qual eles precedem
irá também abominar, então, rebelados contra tudo e todos,
seguem seus próprios caminhos, guiados apenas por inexplicáveis
forças de dentro de si, ou de seu grupo de iguais jovens, e nem
sempre seguem por caminhos luminosos, muitas vezes perdendo-se em vícios na falsa esperança do controle e da consciência de si
e do caminho que se está trilhando; aqueles que por motivos
puros demais para caber neste breve esboço, ao chegarem a tal
crise (pois que esta enquanto construção da identidade da pessoa
é natural a todos), cruzam o caminho numa paz sincera e
3 É notável um problema nesta colocação, pois aqueles que passaram pela adolescência admirando o mundo adulto obviamente não notaram erro algum, não
se decepcionaram com este mundo, mas talvez sequer tenham abandonado a infância.
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luminosa são dignos de nossos aplausos e de nossa admiração, e
não convém estudá-los aqui; já aqueles que por uma tardia
infantilidade nem observam a consistência da caixa de pandora
aberta no mundo adulto são dignos de nosso pesar, pois esbarrarão mais à frente num muro gigantesco de decepções4.
É óbvio que o adulto que surgirá de toda essa equação,
será apenas o produto dos caminhos que aquele jovem escolheu
seguir, posto que não existe outro meio de chegar a si mesmo,
numa idade além, sem antes passar pelo que neste esboço vos
apresento. Óbvio também, como por alto suscitei no início deste trabalho, é a idéia de que o jovem que teve de tomar tais decisões
mais atrás, ainda que sozinho em seu país de desconhecidos, as
tomou com bases, frágeis ou não, que trouxe da infância. Temos
aqui bem nítida a imagem do contínuo desenvolvimento humano,
onde cada etapa, cada fase de sua vida, exerce sua específica influência na fase seguinte. Mas voltemos à adolescência, para
não perdermos o fio condutor das respostas sobre esta Síndrome
que me propus a esclarecer.
O quão vítimas são os jovens da enorme maldade que
toma conta de nossa sociedade? Agora só lhes resta perder-se em
inúmeras identidades, dissolverem-se em conclusões tão absolutas hoje, e tão banais amanhã. “Não é tão simples crescer”,
pensam eles e parecem querer desistir, não se pode fazê-lo, há
que se seguir. Neste emaranhado de idéias, de vontades e sonhos,
de conclusões absolutas, podemos entender a fantástica evolução
do pensamento nesta fase do desenvolvimento. Os jovens escapam de uma falha e insuficiente maneira de perceber o mundo e
refletir sobre suas coisas, aos poucos vão saltando estágios
cognoscíveis e no cruzar da ponte entendem-se libertos, pensando
livremente de uma maneira nova, abstrata até, quase completa.
Muitos adultos que alcançam esta liberdade do pensar
atravessam a ponte cruel do “desadolescer” com sorrisos, porém muitos outros chegam ao outro lado com o caráter e a
personalidade ainda querendo germinar. Diz-se que o fim da
adolescência é a formação de uma identidade só sua, há
controvérsias, ambas as idéias são duvidosas. Nada duvidosa, no
entanto, é a idéia de que exatamente esta formação do “Eu” do adolescente é o processo do crescimento, o que não implica estar
4 Ou então, se ainda assim não se decepcionarem, quão desgraçados serão, pois
que talvez seja impossível encontrar-se consigo mesmo no caminho das virtudes, da moral e do amor ao próximo. Talvez jamais encontrem seu “Eu” individual.
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com a identidade completamente formada ao se notar “crescido”,
ao se notar na outra margem, como dizemos. E disto só obtemos a
conclusão de que crescer às vezes também não implica chegar ao
fim da adolescência ou mesmo à idade adulta. O fato é que todo medo de crescer se dilui automática e naturalmente no tempo,
nesta formação do “Eu” do adolescente: “Quando finalmente se
cresce, não há mais por que temer o crescer”.
A sólida construção de uma identidade.
O que está em jogo aqui é uma segura construção da
identidade, um bem resolver a crise em que se está envolto. Um
número consideravelmente grande de jovens chega à idade adulta
sem resolver esta crise. Para o psicólogo Erik Erikson, o
desenvolvimento dum indivíduo, desde a fase uterina, é exatamente o solucionar de várias crises, que ele dividiu em
etapas, o não bem resolver destas etapas psicológicas e sociais
implica na formação de uma débil identidade. Na adolescência, a
crise em que se vê emergir a cada segundo é a busca por si
mesmo, pelo seu “Eu”, e esta crise é ampliada pela sagaz lupa do
medo de crescer. Além de ter que descobrir quem se é, é preciso enfrentar tal medo. Porém, medo e crise de identidade atuam
juntos no adolescente, e juntos transformam este em adulto.
Como já foi dito, seria preciso estudar em particular cada
pessoa da sociedade, para assim observar todas as facetas deste
medo. Mas, mesmo os poucos estudos que se tem sobre o tema compreendem, ou ao menos deveriam compreender, a realidade
deste e sua fiel importância para a construção do ser humano em
si, como apontamos neste breve esboço. Ora, o medo de crescer é
a chave, o princípio regulador que faz os jovens recuarem,
estagnarem diante do desconhecido, diante do absurdo e errado
que podem observar, diante da eminente aparição do futuro. Este medo de crescer fadado a ser eliminado e esquecido no terminar
da jornada, leva os adolescentes a escolherem suas ações e seus
caminhos: segundo suas vontades, suas individualidades, suas
maneiras de enxergar o mundo, de refletir sobre ele, segundo os
padrões morais que entende, segundo sua herança cultural e familiar, segundo a imagem que pintam do próprio futuro,
segundo suas mais incontidas esperanças e seus mais diversos
sonhos. Ele escolhe, pois aqui é preciso fazê-lo, agora o
adolescente é dono de si próprio, sozinho que está, por mais
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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cercado que esteja de pessoas que o amam e que o querem
ajudar, precisará escolher o que fazer, e onde esperar chegar. É o
medo de crescer que o faz medir sua própria vida e escolher
“como”, e talvez até, “quando”, finalmente crescer, mesmo que nem se aperceba disto, nem se aperceba destas suas escolhas, ou
pra onde elas o estão levando. Somente suas escolhas revelarão
que espécie de ser humano se tornará, que espécie de “Eu”
conseguirá construir, se uma frágil e débil, ou uma sólida,
consistente e segura identidade.
O conceito de escolha surge aqui neste esboço, como uma chave artesanalmente talhada pela razão de ser da necessidade de
se descobrir, do medo de crescer nasce aos poucos o caminho
desenhado pelas escolhas, e o fim desta estrada é somente a
formação do “Eu”. Somente no fim da estrada (e este fim pode
nem ser o fim da adolescência), quando o medo de crescer se apagou por completo, é que o indivíduo pode descobrir quem ele
se tornou, quem ele é.
Conclusão poética para uma teoria.
Muitos, em sua crise de identidade, nem são capazes de percebê-la chegar ao fim, os que enxergam este ocaso, se
encaminham lívidos numa identidade intocável ao futuro. Dennis
Potter, quando viu o quão cruel era o destino que lhe levava para
uma idade adulta cheia de erros, ignorância e hipocrisia, partiu,
tipicamente, como todos os adolescentes, ao encontro de seu “Eu” puro e liberto. E nessa busca, negou-se, perdeu-se e encontrou-se
enfim, como muitos, cada um ao seu modo, e ao ver seu “Eu”
formado, imutável e belo caminhando ao futuro, olhou ao redor e
viu alguns de seus amigos correndo, em uma crise amena,
ansiosos por se tornar o mais rápido possível como os adultos que
tanto admiravam e nos quais não conseguiam enxergar erro algum, e não pôde entender como eles não podiam perceber a
fragilidade de suas esperanças. Após crescerem, estes seus
amigos esbarraram no gigantesco muro das decepções, e só então
passaram a buscar seus “Eus”, só então passaram a buscar suas
identidades, personalidade e caráter, só então começaram a crescer.
Dennis compreendeu a dissolução do seu medo de
crescer que lhe atormentara antes e que agora não existia mais,
vasculhou a memória e não encontrou o momento de seu
6 escritos sobre o “Eu” e uns poucos poemas – diegoSABÁDO
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desenvolvimento em que este medo lhe dera adeus, nem mesmo
podia dizer se tal medo, que lhe fizera muitas vezes recuar diante
de precipitadas conclusões, que lhe fez pensar e escolher (mesmo
numa lógica adolescente) os caminhos seus, que lhe levaram até ali onde estava, até o ser humano que agora era, não podia dizer
se tal medo ao menos lhe dissera adeus antes de partir. Mas
sentiu orgulho de tê-lo podido sentir quando tudo era novo e
assustador, então lembrou, “crescer é esquecer que a infância
nunca acaba”, e percebeu que havia esquecido, e talvez por isso
estava ali, talvez por isso havia crescido (as conclusões poéticas de Dennis aqui, talvez apenas façam sentido àqueles que como
ele, respiram este ar de poesia, não sendo por isso, tão relevantes
assim para a construção do “Eu” e dissolução do medo de crescer
no geral de nossa sociedade. Ou seja, sua máxima: “crescer é
esquecer que a infância nunca acaba”, exposta em muitos de seus poemas novos, tem valor apenas poético, dramático, pode-se
dizer, ilusório). Mas Dennis havia esquecido da criança que foi um
dia e que lhe levou à adolescência que lhe trouxe até ali, até seu
“Eu” consciente de si, Dennis percebeu que havia crescido enfim.
Escreveu nos altos da memória pra não mais esquecer tamanha
verdade5, sua máxima, pensou mais uma vez naquele medo de crescer e na importância que ele teve na construção de sua
identidade, de seu “Eu”, em seu desenvolvimento, sorriu e partiu
feliz, não sem outro medo qualquer do futuro desconhecido à sua
frente, mas partiu pra casa consciente de si, partiu para o lar que
agora era apenas ele mesmo.
5 O Peter Pan de J. M. Barrie sempre esquece as coisas. No problema de memória do eterno garoto encontramos um contraponto fundamental. O que Peter Pan
esquece? As coisas que viveu, suas aventuras, os amigos, tudo, e este esquecimento essencial, exatamente, ao impedir que guarde sua vida na memória, o impede de crescer, porém há uma única coisa que Peter Pan não esquece jamais, seu desejo de nunca crescer, e por isto ele pode, esquecendo todo o resto,
permanecer criança, na infância. O papel da memória no envelhecimento, na obra de J. M. Barrie é claro, só aquele que lembra, cresce, porque exatamente não percebe que é no esquecimento que está a porta para a infância eterna. Aqueles que crescem são expulsos da “Terra do Nunca”, só permanece ali um menino,
aquele que nunca esquece que a infância só acaba, quando dela não nos ocupamos mais, quando esquecemos que ela é sem fim.
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