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13 Capítulo Afecções do Joelho Nilson Roberto Severino Ricardo de Paula Leite Cury Victor Marques de Oliveira Osmar Pedro Arbix de Camargo Tatsuo Aihara Introdução O joelho é considerado uma articulação em do- bradiça; porém, trata-se de uma junta bastante com- plexa. É formado por três ossos: o fêmur distal, com seus côndilos medial e lateral; a tíbia proximal, tam- bém com seus côndilos medial e lateral; e um gran- de osso sesamóide que é a patela, com suas duas vertentes. O fêmur e a tíbia formam a articulação femorotibial enquanto a patela, por meio de sua crista rombovertical, articula-se com o fêmur, através da garganta da tróclea femoral, formando um conjun- to funcional denominado articulação femoropate- lar. A cabeça da fíbula é importante pela inserção ligamentar e tendínea, aí existente, de elementos laterais do joelho. Os movimentos funcionais do joelho são: Flexão, de aproximadamente 160° , variando para mais ou para menos de acordo com a espessura da musculatura posterior da coxa e da perna. Extensão, de 0° , podendo em alguns indivíduos ser ligeiramente positiva (recurvato fisiológico). Rotação medial, de 40° , com o joelho em flexão. Rotação lateral, de 30° , com o joelho em flexão. O joelho é totalmente estável e não apresenta movimentos rotacionais da tíbia em relação ao fê- mur quando está em extensão total. Durante o movimento de flexão, há uma rotação medial da tíbia de aproximadamente 10 a 15° , enquanto o fêmur, durante os primeiros 15 a 20° , realiza um movimento de rolamento sobre a tíbia. A partir daí até os 90° de flexão, há um movimento de rolamen- to e deslizamento do fêmur em relação à tíbia en- quanto, nos graus maiores de flexão, o movimento é somente de rolamento. O inverso se dá durante a ex- tensão, com rotação medial da perna até 0° . Os componentes do aparelho extensor do joe- lho são os músculos reto anterior, vasto intermédio, vasto lateral e vasto medial que, juntos, formam o tendão do quadríceps e possuem expansões mediais e laterais que se direcionam à patela, formando os retináculos medial e lateral, a própria patela e o li- gamento patelar, que a une à tuberosidade anterior da tíbia. Os principais flexores do joelho são os múscu- los isquiotibiais (bíceps, semimembranáceo, semi- tendíneo e grácil) e os gêmeos medial e lateral. Os tendões dos músculos sartório, grácil e se- mitendíneo inserem-se proximal e ântero-medial- mente na tíbia, onde formam a pata de ganso e fazem a rotação medial da perna enquanto o bíceps, o poplíteo e a fáscia lata realizam a rotação lateral. Os principais ligamentos estabilizadores do joe- lho são os cruzados anterior e posterior e os colaterais tibial e fibular. São os cruzados que impedem a ro- tação medial axial do joelho quando este está em

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13C a p í t u l o

Afecções do Joelho

Nilson Roberto SeverinoRicardo de Paula Leite Cury

Victor Marques de OliveiraOsmar Pedro Arbix de Camargo

Tatsuo Aihara

Introdução

O joelho é considerado uma articulação em do-bradiça; porém, trata-se de uma junta bastante com-plexa. É formado por três ossos: o fêmur distal, comseus côndilos medial e lateral; a tíbia proximal, tam-bém com seus côndilos medial e lateral; e um gran-de osso sesamóide que é a patela, com suas duasvertentes. O fêmur e a tíbia formam a articulaçãofemorotibial enquanto a patela, por meio de sua cristarombovertical, articula-se com o fêmur, através dagarganta da tróclea femoral, formando um conjun-to funcional denominado articulação femoropate-lar. A cabeça da fíbula é importante pela inserçãoligamentar e tendínea, aí existente, de elementoslaterais do joelho.

Os movimentos funcionais do joelho são:� Flexão, de aproximadamente 160°, variando

para mais ou para menos de acordo com aespessura da musculatura posterior da coxa eda perna.

� Extensão, de 0°, podendo em alguns indivíduosser ligeiramente positiva (recurvato fisiológico).

� Rotação medial, de 40°, com o joelho em flexão.� Rotação lateral, de 30°, com o joelho em flexão.O joelho é totalmente estável e não apresenta

movimentos rotacionais da tíbia em relação ao fê-mur quando está em extensão total.

Durante o movimento de flexão, há uma rotaçãomedial da tíbia de aproximadamente 10 a 15°, enquantoo fêmur, durante os primeiros 15 a 20°, realiza ummovimento de rolamento sobre a tíbia. A partir daíaté os 90° de flexão, há um movimento de rolamen-to e deslizamento do fêmur em relação à tíbia en-quanto, nos graus maiores de flexão, o movimento ésomente de rolamento. O inverso se dá durante a ex-tensão, com rotação medial da perna até 0°.

Os componentes do aparelho extensor do joe-lho são os músculos reto anterior, vasto intermédio,vasto lateral e vasto medial que, juntos, formam otendão do quadríceps e possuem expansões mediaise laterais que se direcionam à patela, formando osretináculos medial e lateral, a própria patela e o li-gamento patelar, que a une à tuberosidade anteriorda tíbia.

Os principais flexores do joelho são os múscu-los isquiotibiais (bíceps, semimembranáceo, semi-tendíneo e grácil) e os gêmeos medial e lateral.

Os tendões dos músculos sartório, grácil e se-mitendíneo inserem-se proximal e ântero-medial-mente na tíbia, onde formam a pata de ganso e fazema rotação medial da perna enquanto o bíceps, opoplíteo e a fáscia lata realizam a rotação lateral.

Os principais ligamentos estabilizadores do joe-lho são os cruzados anterior e posterior e os colateraistibial e fibular. São os cruzados que impedem a ro-tação medial axial do joelho quando este está em

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extensão, enquanto os colaterais impedem a rota-ção lateral.

Os ligamentos cruzados são também estabiliza-dores primários do joelho para deslocamento ante-rior e posterior da tíbia em relação ao fêmur, enquantoos colaterais impedem as aberturas medial e lateral.

O ligamento colateral tibial (LCT), que se origi-na no côndilo femoral medial e se insere na tíbia soba pata de ganso, é o estabilizador primário medialdo joelho, enquanto o ligamento colateral fibular(LCF), que se origina no côndilo femoral lateral e seinsere na cabeça da fíbula, é o estabilizador primá-rio lateral. Os ligamentos cruzados anterior e poste-rior são, neste caso, estabilizadores secundários, assimcomo as expansões da cápsula articular póstero-medial, medialmente e póstero-lateral, lateralmen-te (junto com o tendão do bíceps, a fáscia lata, oligamento arqueado e o tendão do poplíteo).

O pivô central do joelho é formado pelos liga-mentos cruzado anterior (LCA), com seus dois fei-xes, póstero-lateral e ântero-medial, que se originaposterior e medialmente no côndilo femoral laterale se insere na tíbia central e anteriormente, impe-dindo o deslocamento anterior da tíbia em relaçãoao fêmur, e cruzado posterior (LCP), com seus doisfeixes, póstero-medial e ântero-lateral, que se origi-na anterior e lateralmente no côndilo femoral me-dial e se insere posteriormente na tíbia, impedindoo seu deslocamento posterior em relação ao fêmur.

Deve-se salientar que a banda póstero-lateral doLCA encontra-se tensa em extensão, enquanto a ban-da ântero-medial se tensiona em flexão. Por outrolado, a banda póstero-medial do LCP está tensa emextensão, enquanto a banda ântero-lateral se tensionaem flexão.

Entre os côndilos femorais e tibiais estão posi-cionados os meniscos medial e lateral. Eles possuemvárias funções, dentre as quais destacam-se a esta-bilização, o preenchimento de espaço dando con-gruência anatômica entre os respectivos côndilos, oamortecimento e a nutrição da cartilagem articular,pelo líquido sinovial.

Lesões Ligamentares

Nas lesões ligamentares do joelho, é fundamentalpesquisar, por meio de uma história bem feita, omecanismo do trauma e a existência de falseamen-to, principalmente durante determinadas atividades,

a fim de supor quais são as estruturas que estãolesionadas.

Os principais mecanismos de trauma são:� Direto ou indireto.� Rotação lateral da perna e medial da coxa, com

o pé apoiado no solo, associada ao esforço emvalgo do joelho (lesão do LCA associada ou nãoa lesão do LCT).

� Rotação medial da perna e lateral da coxa, como pé apoiado no solo, associada ao esforço emvaro do joelho (lesão do LCA associada ou nãoa lesão do LCF).

� Hiperextensão (lesão do LCA).� Flexão, com trauma direto de anterior para

posterior (lesão do LCP).� Flexão, com trauma direto de posterior para

anterior (lesão do LCA).Deve-se salientar que, comumente, um deter-

minado mecanismo do trauma pode causar lesõesligamentares associadas.

Quanto à epidemiologia das lesões, destaca-seque elas ocorrem principalmente em indivíduos dosexo masculino, sendo 90% delas decorrentes de trau-mas esportivos indiretos (torcionais), principalmentedurante a prática do futebol.

No exame clínico, na fase aguda, deve-se primei-ramente avaliar o paciente no seu aspecto global e,quanto aos membros inferiores, observar dor, der-rame articular e frouxidão.

O derrame articular que ocorre após uma tor-ção do joelho se dá de forma abrupta e é sanguino-lento (hemartrose). A pesquisa do sinal da tecla épositiva. Nestes casos, a punção é necessária e mos-trará a saída de sangue sem gotículas de gordura, senão houver fratura articular concomitante. Em 70%dos casos, significa lesão do LCA.

Nas lesões mais graves, com ruptura da cápsulaarticular, o derrame é inexistente e a dor no joelhoafetado é de menor intensidade.

Diante de traumas agudos, não se pode esque-cer as lesões do aparelho extensor que, quando pre-sentes, causam um déficit da extensão ativa do joelhoe um nítido sinal de depressão no local atingido (li-gamento patelar, fratura da patela ou lesão do ten-dão do quadríceps).

Já na fase crônica ou decorridos alguns dias dotrauma, é possível observar:

� Desvios do eixo mecânico.� Atrofias musculares.� Amplitude de movimentos ativos e passivos.� Derrame articular.

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� Pontos dolorosos.� Sinais clínicos de instabilidades.Pacientes que apresentam lesão dos componen-

tes laterais do joelho podem mostrar, durante a mar-cha, um varismo mais acentuado no membro afetado.

Decorridos poucos dias do trauma, pode-se evi-denciar atrofia da coxa.

Exame Clínico

Uma vez realizada a história do trauma, feito umexame geral dos membros inferiores e se afastandolesão do aparelho extensor do joelho, passa-se à ava-liação do joelho com os testes de instabilidades es-pecíficos. Deve-se iniciar o exame pelo joelho normale, a seguir, fazê-lo comparativamente no joelho afe-tado, afastando assim as frouxidões ligamentares fi-siológicas existentes em indivíduos com ligamentosíntegros. No momento do exame, o paciente deveestar totalmente relaxado, para não mascarar umalesão ligamentar existente com uma contratura damusculatura oponente.

Alguns testes específicos são realizados para secomprovar e diagnosticar as principais frouxidõesligamentares.

Lesão do LCA

Teste de Lachman

Paciente em decúbito dorsal e joelho em flexãode 20 a 30°. Com uma das mãos, o examinador fixa acoxa distal do paciente, próximo ao joelho; com aoutra mão, envolvendo a perna proximal, ele faz umatensão anterior da mesma, forçando um deslocamen-to anterior da tíbia em relação ao fêmur. Quando hálesão do LCA, este deslocamento anterior é eviden-te e dá-se o teste como positivo (Fig. 13.1).

Teste da Gaveta Anterior

Paciente em decúbito dorsal, com flexão de 45°do quadril e de 90° do joelho. O examinador senta-sesobre o pé do paciente e, com a perna deste últimoem rotação neutra, puxa-a para frente, segurando-aem seu terço proximal com ambas as mãos. Quandohá o deslocamento anterior dos côndilos tibiais em

relação ao fêmur, diz-se que a gaveta anterior é posi-tiva (Fig. 13.2).

A manobra continua com o paciente na mesmaposição, porém, com a perna em rotação lateral.Quando há lesão associada do LCT (com o LCA), agaveta anterior permanece positiva. Se o LCT estáintacto, há uma diminuição ou mesmo desapareci-mento da gaveta anterior que, em rotação neutra,era positiva.

A manobra continua da mesma maneira, porém,com a perna do paciente em rotação medial. Quan-do há lesão associada do LCF (com o LCA), a gavetaanterior permanece positiva. Se o LCF está intacto,há diminuição ou mesmo desaparecimento da ga-veta anterior que, em rotação neutra, era positiva.

“Pivot Shift” (Teste da Subluxação Lateral daTíbia)

O teste de pivot shift pode ser realizado de dife-rentes maneiras; porém, com o mesmo significadode lesão do LCA, quando o examinador tem a sen-sação de um solavanco durante a realização da ma-nobra. As seguintes manobras são realizadas parapesquisa do pivot shift:

� Manobra de McIntosh: com o paciente emdecúbito dorsal, o examinador eleva o mem-bro inferior do mesmo com o joelho em ex-tensão. Uma de suas mãos apóia o pé do pa-ciente sob o calcâneo e provoca a rotaçãomedial da perna. Com a outra mão, o exami-nador apóia a face lateral do joelho do pacientee força o valgo. Com o polegar desta mãoapoiado sob a cabeça e o colo da fíbula, o exa-

Figura 13.1 – Teste de Lachman.

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A B

C

minador empurra a perna do paciente parafrente. Neste momento, se há lesão do LCA,há a subluxação anterior do côndilo tibial la-teral em relação ao fêmur. O examinador faz aflexão suave do joelho e, ao redor dos 20 aos30° de flexão, tem a sensação de encaixe datíbia em relação ao fêmur, como um solavan-co que é a redução da subluxação provocadacom o joelho em extensão. Quando isto ocor-re, diz-se que o teste é positivo (Fig. 13.3).

� Manobra de Hughston: é a mesma manobradescrita anteriormente; porém, o examinadorparte da flexão, com o joelho reduzido, para aextensão, quando ocorre a subluxação.

� Manobra de Slocum-Larson: paciente em semi-decúbito lateral sobre o quadril do lado normal,que deve estar fletido em 90° assim como o joe-lho, também posicionado em flexão. O membroa ser examinado deve permanecer em extensãotanto do quadril quanto do joelho, com a face

Figura 13.2 – Teste da gaveta anterior. A, rotaçãoneutra; B, rotação externa; C, rotação interna.

A B

Figura 13.3 – A e B, pivot shift.

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medial do pé apoiada no leito de exame. Comuma das mãos, o examinador fixa distalmente acoxa do paciente, puxando-a para trás; com a outramão, fixa proximalmente a perna do paciente,empurrando-a para frente, forçando o valgo e pro-cedendo à rotação medial da perna. Realizandomovimentos suaves de flexão até aproximada-mente 30° e de extensão do joelho, o examina-dor sentirá a subluxação quando o joelho esti-ver em extensão e a redução (solavanco), quandoo joelho estiver sendo fletido. Estas manobras sãocontínuas, com movimentos suaves seguidos erepetitivos de extensão e flexão. Ocorrendo con-tinuadamente a subluxação e a redução da tíbiaem relação ao fêmur, denomina-se o teste comopivot shift positivo.

Lesão do LCT

Valgo Forçado a 0°

Paciente em decúbito dorsal com quadril e joe-lho em extensão. O examinador provoca uma ten-são em valgo forçado do joelho. Quando há um bocejopresente, ou seja, abertura da interlinha medial, for-mando um joelho valgo, é significativo de lesão doLCT e da cápsula articular póstero-medial, que estátensa em extensão (Fig. 13.4).

Valgo Forçado a 30°

Paciente em decúbito dorsal com quadril emextensão e joelho em 30° de flexão; repete-se a ma-nobra anteriormente descrita. Quando há um bo-cejo presente, ou seja, abertura da interlinha medial,é significativo de lesão do LCT.

Portanto, com o teste positivo em flexão e nega-tivo em extensão, demonstra-se a lesão do LCT comintegridade da cápsula articular póstero-medial.

Lesão do LCF

Varo Forçado a 0°

Paciente em decúbito dorsal com quadril e joe-lho em extensão. O examinador provoca uma ten-são lateral em varo forçado do joelho. Quando há umbocejo presente, ou seja, abertura da interlinha late-ral, formando joelho varo, é significativo de lesão doLCF e da cápsula articular póstero-lateral (Fig. 13.5).Aberturas mais significativas significam associaçãode lesão do ligamento arqueado, tendão do poplíteo,fáscia lata na sua inserção no tubérculo de Gerdy etendão do bíceps.

Varo Forçado a 30°

Paciente em decúbito dorsal com quadril emextensão e joelho em flexão de 30°; repete-se a ma-nobra descrita anteriormente. Quando há um bo-cejo presente, ou seja, abertura da interlinha lateral,é significativo de lesão do LCF.

Figura 13.4 – Esforço em valgo. Figura 13.5 – Esforço em varo.

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Portanto, com o teste positivo em flexão e nega-tivo em extensão, demonstra-se a lesão do LCT comintegridade da cápsula articular póstero-medial.

Nestas manobras de varo forçado, deve-se tercuidado para evitar o estiramento do nervo fibularlateral, que passa pelo colo da fíbula e, quando lesa-do, ocasiona um déficit da flexão dorsal do tornoze-lo e extensão do hálux. Este nervo pode ter sido lesadona ocasião do trauma e seu exame é prioritário emtodas as lesões ligamentares, principalmente naslaterais.

Lesão do LCP

Teste da Gaveta Posterior

Paciente em decúbito dorsal, com o quadril emflexão de 45° e o joelho em flexão de 90°. Se há lesãodo LCP, ocorre uma queda da perna para trás. Quandoo examinador, segurando a perna no seu terço pro-ximal, puxa-a para frente, há um deslocamento an-terior com a redução da posteriorização; ao soltá-la,haverá nova queda para posterior, com desapareci-mento da saliência da tuberosidade anterior da tí-bia. Neste caso, diz-se que a gaveta posterior é positiva(Fig. 13.6).

Teste de Godfrey

Paciente em decúbito dorsal, com flexão de 90°de ambos os quadris e joelhos. O examinador co-loca os pés do paciente com os calcâneos apoia-dos sobre suas mãos. Quando há lesão do LCP, nomembro afetado, há uma queda da perna, na al-

Figura 13.6 – Teste da gaveta posterior.

tura do joelho, para trás, em virtude da posterio-rização da tíbia em relação ao fêmur, com desa-parecimento da saliência da tuberosidade anteriorda tíbia (Fig. 13.7).

Teste de Hughston (Recurvato e RotaçãoLateral)

Paciente em decúbito dorsal, com o quadril eo joelho em extensão. O examinador eleva o mem-bro inferior do paciente segurando-o pelo hálux.Quando há lesão do LCP e do canto póstero-lateral(ligamento arqueado, tendão do poplíteo e LCF),há um recurvato do joelho e rotação lateral da per-na (Fig. 13.8).

Essas manobras e testes descritos anteriormentepermitem o diagnóstico de uma lesão isolada de umligamento do joelho ou rupturas ligamentares as-sociadas.

Figura 13.7 – Teste de Godfrey.

Figura 13.8 – Teste de Hughston.

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Exames Subsidiários

Radiografia Simples sem Esforço

Sempre devem ser realizadas nas incidênciasântero-posterior e perfil para avaliar possíveis fra-turas articulares ou avulsões ósseas nas inserçõesligamentares e capsulares.

Quando há um fragmento ósseo junto à interli-nha articular lateral, decorrente de uma avulsão cap-sular do côndilo tibial lateral, é significativo de umagrave lesão lateral e denominado sinal de Segond.

Uma avulsão do LCA ou do LCP nas suas res-pectivas inserções na tíbia são visualizadas nas ra-diografias simples do joelho, assim como a imagemde calcificação medial, em lesão antiga do LCT, co-nhecida como sinal de Pellegrini-Stieda.

Radiografia Simples com Esforço

As radiografias realizadas tensionando-se as es-truturas lesadas podem demonstrar maior ou me-nor grau de lesão pela abertura da interlinha articular,ou seja:

� Realizada na incidência ântero-posterior com:• Esforço em valgo: quando há lesão dos com-

ponentes mediais, ocorre abertura da inter-linha medial (Fig. 13.9).

• Esforço em varo: quando há lesão dos com-ponentes laterais ocorre abertura da inter-linha lateral (Fig. 13.10).

Quando há lesão associada do LCA e/ou do LCP,tanto no exame clínico quanto no radiográfico, ha-verá abertura da interlinha medial ou lateral bastanteacentuada.

� Realizada na incidência de perfil (joelho com90° de flexão) com:• Esforço de posterior para anterior, puxan-

do-se a perna para frente (gaveta anterior),havendo um deslocamento anterior da tí-bia em relação ao fêmur é demonstrativode lesão do LCA (Fig. 13.11).

• Esforço de anterior para posterior, empur-rando-se a perna para trás (gaveta posterior),havendo um deslocamento posterior da tí-bia em relação ao fêmur é demonstrativode lesão do LCP (Fig. 13.12).

Ressonância Magnética por Imagem

É fundamental que o leitor entenda que o diagnós-tico de uma frouxidão ligamentar é eminentementeclínico e o preço elevado deste exame subsidiário li-mita a sua utilização. Contudo, o exame apresentapositividade diagnóstica com acerto de aproxima-damente 95% e, como existem lesões ligamentares

Figura 13.9 – Raio X: esforço em valgo. Figura 13.10 – Raio X: esforço em varo.

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A B

As lesões agudas dos componentes laterais dojoelho devem ser tratadas precocemente para evi-tar complicações posteriores já que, estabelecida aretração destes componentes, torna-se difícil a suareconstituição. Se esta lesão se torna crônica, pode-se realizar a osteotomia valgizante da tíbia, quandohá um varo significativo, associada ou não a um re-forço lateral como o descrito por Trillat e por Hughston,com o avanço e tensionamento do canto póstero-

Figura 13.11 – Raio X: esforço anterior.

Figura 13.12 – Raio X: esforço posterior.

Figura 13.13 – Ressonância magnética: A, ligamento cruzado anterior normal; B, ausência do mesmo (ruptura).

associadas a outras, como as meniscais ou condrais,a ressonância magnética por imagem se torna im-portante para o planejamento do tratamento a serinstituído (Fig. 13.13).

Tratamento

Nas lesões ligamentares do joelho, uma vez es-tabelecido o diagnóstico, deve-se verificar a idadedo paciente, suas atividades cotidianas e esportivas,suas expectativas e objetivos para então se estabe-lecer o plano de tratamento.

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Afecções do Joelho 153

lateral do joelho na inserção femoral dos seus com-ponentes (LCF, ligamento arqueado e tendão dopoplíteo), ou pela técnica de Muller, com a substi-tuição do LCF por metade do tendão do bíceps.

A lesão do LCT raramente deve ser reconstituídapois o seu tratamento conservador ou cirúrgico, naslesões leves e moderadas, proporciona resultadossemelhantes.

As lesões do LCA e LCP, no corpo destes ligamen-tos, são tratadas com a sua reconstrução com enxer-tos autólogos, homólogos ou artificiais. As reconstru-ções com enxertos autólogos são preferenciais. Estasreconstruções devem ser realizadas quando, após alesão, o paciente recuperar os movimentos ativos deflexão e extensão do joelho, o que ocorre após 15 a 20dias do trauma (reconstrução postergada).

Para reconstrução do LCA pode-se utilizar:� O terço central do ligamento patelar.� O tendão do músculo semitendíneo em for-

ma tripla ou quádrupla, dependendo do seucomprimento.

� Duplos tendões dos músculos semitendíneoe grácil.

A fixação femoral e tibial dos enxertos tem evoluí-do bastante, sendo que o ligamento patelar é fixadocom parafusos intra-ósseos de interferência, inabsor-víveis (aço inoxidável ou titânio) ou absorvíveis. Os ten-dões dos isquiotibiais podem ser fixados com placas(endoboton) apoiadas na cortical lateral externa do fê-mur; parafuso transverso, no túnel femoral; arruelaponteada com parafuso de titânio ou parafuso absorvívelpara partes moles, no túnel tibial.

Para reconstrução do LCP pode-se utilizar:� O terço central do tendão patelar com para-

fusos de interferência para sua fixação, tantofemoral quanto tibial.

� Triplo tendão do músculo semitendíneo complaca endoboton para fixação femoral e para-fuso e arruela para fixação tibial distal.

� Tendão do quadríceps com parafuso de inter-ferência para fixação femoral e parafuso e ar-ruela para fixação tibial distal.

É importante que, nas reconstruções tanto doLCA quanto do LCP, respeitem-se as inserções ori-ginais destes ligamentos, o que se consegue com autilização de guias especiais precisos. A importân-cia deste detalhe diz respeito ao princípio da iso-metria ligamentar, no qual o ligamento cruzadooriginal sempre guarda a mesma distância entre suasinserções, em qualquer posição que o joelho se en-contre.

O tratamento pós-operatório deve ser estabeleci-do de acordo com a possibilidade e necessidade decada paciente, procurando-se recuperar os movimentosnormais do joelho, o trofismo muscular e a confiançanecessária para o retorno às atividades esportivas, oque ocorre após seis a oito meses da data da opera-ção. Este período compreende o repovoamento doenxerto por fibras colágenas já orientadas, para resis-tir a esforços decorrentes da atividade normal.

Em geral realizam-se, após a cirurgia:� Movimentos ativos do joelho, exercícios iso-

métricos e marcha com apoio em muletas atéo 10° dia. Depois disto, a marcha é liberada comapoio total.

� A partir da quarta semana iniciam-se exercí-cios na água, quando possível, e com bicicle-ta ergométrica.

� A partir da oitava semana, mantendo-se estesexercícios, inicia-se corrida em linha reta.

� A partir da 12a semana, passa-se à corrida al-ternada.

� A partir da 16a semana, inicia-se o fortaleci-mento muscular orientado.

� Do sexto ao oitavo mês, se houver confiançapor parte do paciente, ele é liberado para aprática de esportes.

Lesão de Menisco

Os meniscos são estruturas fibrocartilagíneassemicirculares localizadas entre os côndilos femo-rais e o planalto tibial. Sua superfície distal planaencontra-se em contato com a tíbia, ao passo quesua superfície proximal côncava recebe os côndilosfemorais convexos, aumentando a congruência epermitindo um contato mais uniforme entre as es-truturas ósseas. Sua borda periférica, espessa e con-vexa, encontra-se intimamente aderida à cápsulaarticular, em contraste com sua porção central, maisfina e livre, proporcionando ao menisco um aspec-to triangular no corte frontal.

O menisco medial possui a forma de um C, me-dindo aproximadamente 3,5cm em comprimento,sendo mais largo em sua região posterior (Fig. 13.14).Seu corno anterior se fixa à fossa intercondilar tibial,anteriormente à inserção do LCA, de maneira que aparte posterior do mesmo corno dista em média8,4mm da superfície articular anterior da tíbia. Asfibras mais posteriores de sua fixação tibial se fun-

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dem com o ligamento transverso, que une os cor-nos anteriores dos dois meniscos. O corno posteriorse fixa à fossa intercondilar entre as inserções do LCPe o corno posterior do menisco lateral, a uma dis-tância média de 7,5mm da superfície articular pos-terior da tíbia.

O menisco medial, em sua periferia, encontra-se firmemente aderido à cápsula articular, sendo quea porção tibial dessa fixação recebe o nome de liga-mento coronário. Na região medial, esse ligamentoé mais espesso e, juntamente com as expansõesmenisco-sinoviais e meniscofemorais, formam aparte profunda do ligamento colateral tibial.

O menisco lateral, por sua vez, possui uma for-ma mais circular, apresentando praticamente a mes-ma largura em toda sua extensão (Fig. 13.15). Seucorno anterior é localizado a uma distância médiade 7,9mm da superfície articular anterior da tíbia eseu aspecto posterior termina, em 80% dos casos,no ponto médio do LCA. A fixação do corno poste-rior do lateral se localiza mais anteriormente quan-do comparado à do corno posterior do medial, emmédia 8,6mm da superfície articular posterior da tí-bia. A periferia do menisco lateral também encon-tra-se aderida à capsula articular e os ligamentoscoronários aqui são maiores que no menisco medial.Porém, na região póstero-lateral, o menisco apresen-ta-se separado da cápsula articular pelo tendão domúsculo poplíteo. O corno posterior é também fixoao côndilo femoral medial por dois ligamentos fi-brosos chamados de meniscofemorais, sendo o an-terior de Humphrey e o posterior, de Wrisberg.

O menisco é um tecido conjuntivo composto porcélulas envoltas em uma abundante matriz extrace-lular. As células típicas, fibrocondrócitos, são as res-ponsáveis pela síntese desta matriz. Basicamente, elaé composta em 70% por água e o restante por fibrascolágenas, proteoglicanas, glicoproteínas e elastina.As fibras colágenas, na sua maioria do tipo I, corres-pondem de 60 a 70% da “matriz seca”, enquanto 0,6%é formada por elastina. As proteoglicanas, compos-tas por proteína na parte central unida a uma ou maiscadeias de glicosaminoglicanas (GAG), encontram-se dispostas entre as fibras, porém com função aindanão bem estabelecida. As GAG do menisco huma-no são compostas por condroitina 6-sulfato (40%),condroitina 4-sulfato (10 a 20%), dermatossulfato (20a 30%) e queratossulfato (15%). Embora a distribui-ção preferencial das fibras colágenas seja circunfe-rencial, fibras radiais também são encontradas emtodo o menisco.

Todo esse aspecto histológico do menisco temcorrelação com a idade. Na vida pré-natal, os me-niscos são ricamente vascularizados e apresentamuma grande população celular. Após o nascimento,a vascularização diminui progressivamente do cen-tro para a periferia sendo que, após a maturidadeesquelética, a irrigação atinge de 10 a 30% da largu-ra do menisco medial e 10 a 25% do lateral. Os vasossanguíneos originados das artérias geniculares me-dial e lateral e de seus respectivos ramos, superior einferior, formam o plexo capilar perimeniscal, que écircunferencial, com ramos radiais de orientaçãocentrípeta que irrigam o terço externo do menisco.

Figura 13.14 – Visão artroscópica do menisco medial. Figura 13.15 – Visão artroscópica do menisco lateral.

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Os dois terços centrais são compostos por tecido semvascularização, inervação ou vasos linfáticos. Essaperiferia do menisco ricamente vascularizada é a basepara o sucesso das reparações do menisco e cicatri-zação de pequenas lesões periféricas estáveis, trata-das conservadoramente.

O fato de cada côndilo da extremidade distal dofêmur apresentar a superfície esferóide e os côndilostibiais serem considerados praticamente uma super-fície plana faz com que as estruturas ósseas femorale tibial entrem em contato em apenas uma região,no chamado ponto de tangência. Segundo Kapandji(1990), para aumentar a superfície de contato entrea esfera e o plano, seria suficiente a interposição deum anel que representasse o volume compreendi-do entre o plano, a esfera e o cilindro tangente à es-fera. Esse anel, na verdade, tem a forma dos meniscos,pois sua superfície proximal é côncava, em contatocom os côndilos femorais, a distal é plana sobre ocôndilo tibial e a periférica é cilíndrica.

O aumento da área de contato entre o fêmur e atíbia proporcionado pelos meniscos foi bem demons-trado por Walker e Erkman (1975), segundo os quaisfoi de 1.514mm2 na presença dos meniscos e 320mm2

sem eles. Fukubayashi e Kurosawa (1980) observaramuma área de contato duas vezes maior na presençados meniscos comparada quando da sua retirada. Essadiminuição de 50% da área de contato em joelhosmeniscectomizados leva a um aumento significativona pressão por unidade de área, resultando em lesãoda cartilagem e degeneração articular.

Soma-se a isso o fato dos meniscos tambémdesempenharem papel importante na transmissãode forças na articulação do joelho. Segundo Walkere Erkman (1975), o menisco medial transmite 50%da carga no lado medial, enquanto o lateral suportauma porcentagem ainda maior. Os mesmos resulta-dos foram encontrados por Fukubayashi e Kurosawa(1980), que ressaltam a importância do menisco la-teral nesta função. Segundo seus trabalhos, a maiorpressão no compartimento lateral foi encontradasobre o menisco lateral e menos sobre a cartilagemarticular adjacente.

Além dessas propriedades, é creditada aos me-niscos a função de também contribuírem para a es-tabilidade do joelho. Embora a meniscectomia isoladanão aumente a translação anterior do joelho segun-do Levy et al. (1982), os mesmos demonstraram que,quando associada à insuficiência do LCA, aumentasignificativamente a instabilidade anterior da arti-culação. Essa estabilidade secundária seria propor-

cionada pelo corno posterior do menisco medial,explicando assim o grande número de lesões demenisco ocorridas em pacientes com lesão crônicado LCA.

Por fim, os meniscos parecem atuar na nutriçãoda cartilagem, apesar disso não estar bem definido.Sabe-se que forças de compressão excessivas, bemcomo a ausência dessas forças, comprometem anutrição da cartilagem articular, levando à sua de-generação. Na presença dos meniscos, a absorçãode carga e transmissão para cartilagem articular ocor-re de maneira mais fisiológica, havendo uma melhordistribuição em toda a área de contato. Quando omenisco é removido, a concentração da carga ocor-re na área central do compartimento respectivo, pri-vando a área periférica dos privilégios do estímuloprovocado pela carga sobre a cartilagem articular e,ao mesmo tempo, levando a uma pressão excessivana área de contato. O fato dos meniscos reduziremo espaço que poderia ser ocupado pelo líquido si-novial levaria a uma melhor distribuição do mesmo,melhorando a lubrificação e nutrição cartilagínea.

As lesões de menisco podem ocorrer quando ojoelho, em posição flexionada ou parcialmente fle-xionada, é submetido a uma força rotacional, fazendocom que o côndilo femoral force o menisco para ocentro da articulação, sendo o mesmo comprimidoentre o fêmur e a tíbia, ocorrendo assim a lesão. Asrupturas são mais freqüentes em pacientes jovensda segunda e terceira décadas da vida, durante a rea-lização de atividades esportivas. Um segundo grupode pacientes, com idade mais avançada (quinta e sextadécadas), mesmo sem serem submetidos a trauma-tismos de alta energia, também podem apresentarlesões que ocorrem por causa de pequenos movi-mentos torcionais no joelho durante a realização deatividades diárias.

Essas diferenças epidemiológicas também sãoobservadas pelo tipo de lesão encontrada, sendo ado tipo traumática (1º grupo) caracterizada por le-sões verticais longitudinais (Fig. 13.16), que podemse encontrar interpostas entre o côndilo femoral e otibial, caracterizando a chamada lesão em “alça debalde” e também por lesões radiais. No padrão de-generativo (2º grupo), os tipos de lesão mais freqüen-temente encontradas são as horizontais, as oblíquase as complexas (Fig. 13.17).

O menisco medial, por ser mais fixo que o late-ral e acompanhar a tíbia durante os movimentos dojoelho, é o mais lesado. O lateral, por ser mais móvele acompanhar o fêmur, principalmente durante a

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rotação, através dos ligamentos meniscofemorais, émenos susceptível a lesões. Porém, quando a lesãodo LCA está presente, esta incidência depende dacronicidade da lesão ligamentar. Assim, nas lesõesagudas do LCA, o menisco lateral é o mais lesado emvirtude das grandes forças rotatórias criadas. Já naslesões crônicas do LCA, o menisco medial é o maisacometido, como resultado dos repetidos episódiosde translação anterior da tíbia, que levam a um au-mento de pressão sobre o corno posterior do mes-mo menisco.

O diagnóstico da lesão de menisco é caracteri-zado pela história de trauma torcional no joelho se-guido de dor, acompanhado ou não por derramearticular. O derrame articular, quando abrupto, podeser causado por sangramento quando a lesão aco-mete a zona periférica vascular do menisco. Lesõesna zona avascular podem levar a irritação da mem-brana sinovial, provocando sinovite e derrame tar-dio, por aumento na produção do líquido sinovial.O paciente pode se queixar também de bloqueio daarticulação do joelho, da flexão ou da extensão, quan-do uma parte do menisco lesado se dirige para o cen-tro da articulação, limitando os movimentos.

No exame físico, durante a inspeção, pode-seconstatar a presença ou ausência de derrame arti-cular e também hipotrofia da musculatura da coxa,mais evidenciada nas lesões crônicas por desuso domembro acometido.

A mobilidade articular, se não houver bloqueiopela lesão de menisco ou limitação por derrame,encontra-se normal, tanto ativa como passivamente.

Um dos sinais clínicos mais importantes para odiagnóstico da lesão é a presença de dor à palpação dainterlinha articular do lado acometido. Além da sensi-bilidade dolorosa na linha articular, outras manobrassão descritas para diagnosticar as lesões meniscais.Quando positivas, estas manobras mostram a proba-bilidade de lesão meniscal; porém, quando negativas,não se permite afirmar que os meniscos estão íntegros.

O diagnóstico é completado com auxílio dasmanobras para pesquisa da lesão de menisco. Umadas mais utilizadas é a manobra de McMurray, que érealizada com o paciente em posição supina, qua-dril e joelhos fletidos a 90°. Ao examinar o joelho di-reito, o examinador se posiciona à direita do paciente,fixando com a mão esquerda o joelho e, com a direi-ta, o pé do paciente. Desta maneira, promove movi-mentos de rotação interna e externa da tíbia sobre ofêmur. A manobra é considerada positiva quando sesente um “estalido” pelos dedos do examinador nainterlinha articular. Uma modificação desta mano-bra é a sua realização em vários ângulos de flexãodo joelho, associando-se varo para pesquisa domenisco medial e valgo para o lateral.

Outras manobras conhecidas são:� Sinal de Steinmann I: joelho em flexão de 90°.

A dor provocada na fase externa da interlinhaarticular durante a rotação interna sugere le-são do menisco lateral e, inversamente, a dorinterna durante a rotação externa é sugestivade lesão do menisco medial.

� Sinal de Merke: esta prova é semelhante à an-terior, porém os movimentos de rotação são

Figura 13.16 – Visão artroscópica de lesão em alça de bal-de do menisco medial.

Figura 13.17 – Visão artroscópica de lesão complexa domenisco lateral.

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executados com o paciente em pé, pedindo-se ao mesmo que durante os movimentos derotação realize também movimentos suavesde flexão do joelho, com o pé apoiado no solo.

� Prova de Apley: o paciente é colocado em de-cúbito ventral. O joelho é fletido em 90°. O exa-minador, com as duas mãos apoiadas no pé dopaciente, faz, com o apoio do próprio corpo,uma pressão vigorosa, realizando concomitan-temente movimento de rotação externa e in-terna da perna. Quando o paciente acusa dorna interlinha articular interna durante a rota-ção externa, é sugestivo de lesão do meniscomedial; ao contrário, ao se realizar a rotaçãointerna e a dor referida for na interlinha exter-na, é sugestivo de lesão do menisco lateral.Quando os mesmos movimentos são realiza-dos, porém com tração, levantando-se a pernado paciente, com um auxiliar segurando o ter-ço distal posterior da coxa do mesmo, a dor re-ferida deve desaparecer. Por outro lado, se hádor durante esta manobra, significa sinal de pro-vável lesão do aparelho cápsulo-ligamentar, cujatensão aumenta com tração e rotação.

� Sinal de Steinmann II: pode ser aplicado quan-do há um ponto doloroso à palpação anteriorda interlinha articular. Quando se faz a flexãodo joelho e o ponto doloroso se desloca paratrás, é sinal sugestivo de lesão meniscal.

� Sinal de Rocher: presença de ponto dolorosoanterior, na superfície articular medial ou la-teral, quando se faz a extensão forçada do joe-lho e rotação interna e externa da perna.

� Sinal de Böhler: ao se forçar o varo, há dor nainterlinha interna, o que pode significar lesãodo menisco medial; ao se forçar o valgo, o pa-ciente acusa dor na interlinha externa, o quepode significar lesão do menisco lateral.

� Sinal de Payr: na presença de lesão do terço pos-terior do menisco medial, o paciente acusa dorquando adota a posição sentada, de pernas cru-zadas e coxas em adução (“a moda indígena”).

� Sinal de Finochetto: durante a pesquisa dagaveta anterior, quando há concomitante le-são do LCA, há a luxação do menisco com con-seqüente bloqueio articular, o que significauma lesão em “alça de balde” da porção pos-terior do menisco.

Na análise do paciente com história de lesãode menisco, o estudo radiográfico, por meio de ra-diografias simples, deve ser sempre realizado para

diagnóstico de lesões associadas, como fraturas, oupresença de osteoartrose.

Se, após o exame físico, ainda existirem dúvidasquanto ao diagnóstico, a pneumoartrografia e a resso-nância magnética por imagem (RMI) podem ser reali-zadas. O primeiro exame, apesar do custo mais baixo,possui a desvantagem de ser invasivo e de possuir umaeficácia diagnóstica de 85 a 90%, inferior à RMI, emtorno de 90 a 95%. A RMI, mesmo com custo mais alto,além da maior eficácia diagnóstica, é um exame nãoinvasivo que proporciona a chance de se avaliar a in-tegridade das outras estruturas articulares (ligamen-tos, tendões, músculos, cartilagem articular, estruturaóssea) que também podem estar comprometidas.

Na presença da lesão de menisco, o tratamentode eleição é o cirúrgico, que pode ser realizado pormeio de meniscectomia aberta, artroscópica ou, ain-da, sutura da lesão. O tratamento conservador podeser indicado em lesões pequenas e estáveis. Porém,esse tipo de lesão não é freqüente, fazendo com quea maioria delas seja tratada cirurgicamente.

Dada a importância do menisco para a articu-lação do joelho, todos os esforços devem ser feitosno intuito de se manter a integridade da unidademeniscal. Desta maneira, a sutura do menisco deveser o tratamento de eleição, sempre que possível. Paraque a lesão possua boas chances de cicatrização apósa sutura, ela deve ser indicada em lesões periféricas(até 3mm da borda do menisco) localizadas na zonavascular, em lesões do tipo vertical longitudinal, depreferência em pacientes até 40 anos, com trauma-tismo recente (Fig. 13.18).

Quando esses critérios não forem cumpridos, deveser realizada a meniscectomia, que pode ser parcial,subtotal ou total (Fig. 13.19). Dependendo da quanti-dade de menisco retirado, o paciente, com o passardos anos, pode sofrer as alterações degenerativas de-correntes da sua falta. Essas alterações foram inicial-mente descritas por Fairbank (1948), que encontrou40 a 60% de alterações radiográficas em pacientesmeniscectomizados num período entre três meses equatorze anos. Essas alterações foram caracterizadaspela diminuição do espaço articular, formação deosteófitos marginais e aplainamento do côndilo femoraldo lado acometido. Essa descrição corresponde aossinais radiográficos da ostreoartrose articular.

Em condições nas quais não se indica a sutura domenisco e se realiza a meniscectomia total, uma novaopção na terapêutica desta afecção pode ser empre-gada. Trata-se dos transplantes de menisco, que ini-cialmente foram realizados em 1984 por Milachowski.

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A B

Essa prática, realizada com enxertos autólogos, homó-logos e até artificiais, vem sendo intensamente estu-dada e pesquisada por ser mais uma opção na tentativade se manter a estrutura do menisco, evitando-se as-sim todos os malefícios decorrentes de sua ausênciapara a cartilagem articular e biomecânica do joelho.

Alterações Femoropatelares

A articulação femoropatelar é considerada pormuitos autores como uma das mais complexas do

corpo humano em relação à função, biomecânica efisiopatologia. Dentre os distúrbios desta articula-ção, a luxação da patela é um dos mais incapacitan-tes e dolorosos, fazendo com que o paciente procureatendimento médico.

Por definição, luxação da patela significa per-da da congruência articular entre a patela e a trócleafemoral, correspondendo ao grau máximo de de-salinhamento do aparelho extensor. Pode ser clas-sificada em dois grupos: traumática e atraumática.

Na luxação traumática, também conhecida comoaguda, normalmente o paciente procura um pron-to-socorro queixando-se de dor forte, referindo umtrauma direto ou movimento torcional do joelho se-guido de estalido e queda ao solo com o joelho fletido.Nessa ocasião, o médico estende o joelho e a patelaretorna ao sulco troclear, reduzindo-se a luxação.

O grupo atraumático é, por sua vez, subdividi-do em recidivante, habitual e permanente. No pri-meiro tipo, temos geralmente um paciente na segun-da década de vida, do sexo feminino, que refere umepisódio inicial de luxação da patela tratado conser-vadoramente, após o qual começou a apresentaroutros episódios de luxação relacionados a traumastriviais. No segundo, ocorre a luxação da patela naflexão ou extensão do joelho, voltando ao sulcotroclear espontaneamente. Se a posição é normal emextensão, luxará em flexão, normalizando-se em ex-tensão; o mesmo ocorre com a luxação em exten-são. Já na luxação permanente, a patela encontra-seluxada tanto em flexão quanto em extensão, sendoo tipo com pior prognóstico.

Figura 13.18 – Visão artroscópica da sutura do meniscomedial.

Figura 13.19 – A, visão artroscópica de lesão do corno posterior do menisco medial; B, visão artroscópica após meniscectomiaparcial.

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Etiopatogenia

Para a permanência da patela dentro do sulcotroclear, é necessária a ação de estabilizadores mediais(estáticos e dinâmicos) contra a ação do músculovasto lateral. Dentre os estáticos, temos a cápsulaarticular, o ligamento femoropatelar medial e a es-trutura óssea tanto da tróclea quanto da patela. Oestabilizador dinâmico é o músculo vasto medial,mais especificamente a sua porção oblíqua quetraciona a patela, formando um ângulo de 50 a 55°em direção medial. Falha em algum destes estabili-zadores da patela constitui normalmente o fatoretiológico da luxação e, a partir da sua identificação,poderemos instituir um tratamento adequado.

Diagnóstico

Para obter sucesso no tratamento, é necessárioprimeiro fazer o diagnóstico etiológico da instabili-dade femoropatelar. Para isto, devemos começar comuma avaliação clínica apurada e concisa do paciente.

A história clínica deve começar com a queixa dopaciente, analisando se o mesmo tem dor, medo dapatela luxar ou se já houve episódio de luxação patelar.Abordar o início do problema, isto é, se houve al-gum trauma importante que desencadeou a insta-bilidade ou se a mesma teve início espontâneo, paratermos idéia do grau de falha do sistema de conten-ção da patela no sulco troclear e do dano causado aesta articulação. Por fim, analisar também o núme-ro de vezes que a patela luxou para classificá-la emum dos tipos citados acima.

No exame clínico, devemos ter em mente os fa-tores predisponentes para subluxação ou luxação dapatela, que são:

� Anteversão femoral ou rotação femoral medial.� Desvio em valgo do joelho.� Hiperextensão do joelho.� Rotação lateral da tíbia.� Pé plano.� Hipermobilidade articular.� Patela alta.� Displasia patelar.� Displasia troclear.� Ângulo Q aumentado.� Atrofia do músculo vasto medial oblíquo.� Retináculo lateral tenso.Durante a inspeção estática e dinâmica, pode-

mos verificar se o paciente apresenta anteversão

femoral, geno valgo ou recurvato, rotação lateral datíbia, pé plano e atrofia do músculo vasto medial.Analisamos também o ângulo “Q”, formado entre umalinha que parte da espinha ilíaca ântero-superior atéo centro da patela com outra que parte deste pontoaté a tuberosidade anterior da tíbia, que tem comovalor normal 10° para o homem e 15 a 20° para mu-lheres. Deve ser medido com o joelho a 30° de flexãoe com a perna em rotação lateral máxima.

Na palpação, verificar se existe derrame articu-lar (sinal da tecla) e/ou crepitação femoropatelardurante o movimento de flexão e extensão do joe-lho, estando o examinador palpando a patela.

Dentre as manobras especiais, temos a prova dodeslizamento da patela, que é feita com o joelho emflexão de 20 a 30° e com o quadríceps relaxado. A patelaé dividida longitudinalmente em quatro partes e en-tão realiza-se a medialização e a lateralização da mes-ma, apreendida entre os dedos polegar e indicador.Normalmente é possível deslizar a patela lateralmenteentre 0,5 e dois quadrantes. Acima de três quadrantessignifica contenção medial incompetente. O desliza-mento medial serve para analisar as estruturas reti-naculares laterais. Quando for menor ou igual a umquadrante, significa tensão lateral excessiva. Duran-te esta prova, ao se realizar o deslizamento lateral, opaciente poderá ficar apreensivo e tentar evitar que oexaminador prossiga o teste, por medo de que a patelavenha a luxar. Este é o sinal da apreensão.

Outro teste existente é o de inclinação patelarpassiva, que avalia a contenção lateral. Deve ser fei-to com o joelho em extensão e o quadríceps relaxa-do. O examinador segura a patela entre os dedosindicador e polegar e eleva a borda lateral. Uma ele-vação entre 0 e 20° a partir da horizontal é considera-da normal. Menos do que zero é considerado retraçãodas estruturas de contenção lateral.

Feito o diagnóstico de luxação da patela ou ins-tabilidade femoropatelar através do exame clínico,os exames de imagem servirão para confirmá-lo etambém para o planejamento do tratamento.

O estudo radiológico dessa articulação deve ava-liar a patela nas incidências ântero-posterior, perfile axial. As Figuras 13.20 a 13.23 mostram pacientecom patela luxada e radiografias na incidência axialcom patela reduzida, subluxada e luxada (bilateral).

A incidência ântero-posterior deve ser feita comcarga, pés paralelos e o músculo quadríceps relaxa-do, e nos mostrará o alinhamento do membro e aaltura do pólo inferior da patela em relação à linhada superfície distal dos côndilos femorais, cujo va-

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lor normal é 2cm. Nas luxações traumáticas, pode-mos encontrar uma fratura avulsão da borda medial.

Na incidência de perfil a 30° de flexão, podemosavaliar melhor a altura da patela utilizando a medi-da de Blumensaat, que consiste numa linha esten-dida do teto do sulco intercondíleo e que deve tocaro pólo inferior da patela. Quando a patela fica aci-ma desta linha, temos a entidade patela alta e, quandoé cortada por esta linha, a patela baixa. Outro índicemuito utilizado é o de Insall-Salvatti, que avalia arelação entre o comprimento do tendão patelar e ocomprimento da patela, sendo o valor normal entre0,8 e 1,2. Acima deste intervalo, teremos uma patelaalta; abaixo, uma patela baixa. Vale lembrar que apatela alta é uma condição patológica congênita oudesenvolvida, associada com outras anormalidadescomo displasia troclear ou condilar. É possível tam-bém, nesta incidência, verificar se as trócleas sãodisplásicas, conforme a Figura 13.24.

Na incidência axial, feita com os joelhos fletidosa 20 ou a 45°, conforme preconizam Laurin e Merchant,respectivamente, avaliamos o ângulo do sulco troclear(normal é 138°), o ângulo de congruência (normal é–6°), o ângulo de inclinação da patela (normal é seracima de 8°) e analisamos também a forma da patelasegundo a classificação de Wiberg-Baumgartl (Fig.13.25), lembrando que os tipos 3 e 4 são fatores pre-disponentes de instabilidade femoropatelar.

A tomografia pode substituir a mensuração doângulo Q pela medida do TA-GT, que analisa a rela-ção entre a tuberosidade anterior da tíbia e a porçãomais profunda da tróclea femoral (garganta da tróclea),sendo 11mm a distância normal, além de mostrar commaior nitidez a relação da patela com o sulco troclear.

Figura 13.23 – Raio X axial de patela, bilateral com luxa-ção.

Figura 13.22 – Raio X axial de patela com subluxação.

Figura 13.21 – Raio X axial de patela.

Figura 13.20 – Paciente com patela luxada.

Tipo 1 Tipo 2 Tipo 3

Tipo 1 Tipo 2 Tipo 3 Tipo 4

Figura 13.24 – Tipos de displasia troclear.

Figura 13.25 – Classificação de Wiberg-Baumgartl.

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O exame de ressonância magnética serve paradiagnosticar os defeitos da cartilagem articular dapatela e do côndilo femoral lateral, provocados pe-los episódios de luxação.

Tratamento

O tratamento da luxação da patela pode ser con-servador ou cirúrgico.

Na luxação aguda, devemos analisar se houve fra-tura do bordo medial da patela. Nesse caso, devemosinstituir o tratamento cirúrgico por meio da fixaçãocom pontos transósseos, utilizando fio inabsorvível.Caso ocorra uma fratura osteocondral, com a presençade corpo livre intra-articular, preferimos fazer a res-secção do fragmento com visibilidade artroscópica.Se não houver fratura nem fragmento osteocondralintra-articular, o tratamento de escolha é o conserva-dor, com imobilizador inguino-maleolar, por um pe-ríodo de quatro semanas.

A luxação crônica, tanto recidivante quanto ha-bitual, pode ter início após um trauma que provo-cou o deslocamento da patela e que apresentouresultado desfavorável com o tratamento conserva-dor. Porém, é mais comum ser decorrente da pre-sença de um ou mais fatores predisponentes citadosanteriormente, associados a um trauma leve ou en-torse do joelho.

Os casos com poucos episódios de luxação e fato-res predisponentes leves a moderados podem ser tra-tados conservadoramente com fisioterapia visando afortalecer a musculatura interna da coxa, principalmenteos músculos vasto medial e adutores, e alongar osmúsculos isquiotibiais e a banda iliotibial por um pe-ríodo de seis meses. Nos casos mais graves ou na falhado tratamento conservador, está indicado o tratamentocirúrgico, que consistirá na correção do fator predis-ponente, através dos seguintes procedimentos:

� Liberação do retináculo lateral, realizada pra-ticamente em todos os pacientes devido aoaumento da tensão lateral.

� Realinhamento proximal, feito nos casos defalha da contenção medial. Realizamos o avan-ço da inserção do músculo vasto medial maislateralmente, por sobre a patela, aumentan-do a tensão deste estabilizador medial.

� Realinhamento distal, nos casos em que ob-servamos o ângulo Q aumentado. Realizamosa cirurgia de Elmislie Trilat, que consiste numaosteotomia no plano frontal, da tuberosidade

anterior da tíbia, medialização e fixação damesma com parafuso.

� Osteotomia varizante para correção de genovalgo acentuado.

� Trocleoplastia por elevação da borda lateral,cirurgia de Albee, para aumentar a contençãolateral da patela.

� Combinação de duas ou mais técnicas, con-forme a necessidade.

Artrose do Joelho

Definição e Classificações

A artrose pode ser definida como um processodegenerativo ligado ou não a processos inflamató-rios, que levam a deformidades nas articulações,acompanhadas de dor e redução progressiva da fun-ção articular.

As artroses são classificadas em primárias e se-cundárias.

As primárias são aquelas em que não existe umacausa que justifique o seu aparecimento. Geralmentesão causadas por problemas mecânicos, iniciando-se com uma diminuição progressiva da espessura dacartilagem articular (a cartilagem adulta humana nãoapresenta divisão celular e portanto não se regene-ra) provocada por hiperpressão, sem apresentar al-terações ósseas. Quando ocorre o contato direto entreas extremidades ósseas, ocorre um lento alargamentopor neoformação para aumentar a superfície de con-tato e diminuir a pressão, chamado osteófito (rami-ficação do osso). Quando se faz nas duas extremidadesósseas, a sua forma trouxe a popularização do nome“bico de papagaio”. A formação pelo atrito e peladegeneração de inúmeros fragmentos cartilagíneose ósseos de pequeno tamanho, chamados debris, le-vam a uma inflamação da membrana sinovial queintensifica a produção de líquido que, em grandevolume, leva a derrames articulares (hidrartrose),dolorosos e limitantes.

Uma lenta deformação ocorre principalmentenos ossos longos, intensificando o problema mecâ-nico e, por fim, a dor e a limitação de movimentosproduz invalidez permanente.

As artroses secundárias são aquelas causadas porfatores predisponentes como, por exemplo, proces-sos reumáticos (artrite reumatóide, lúpus eritematosoetc.), alterações circulatórias ósseas (osteocondrites,

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osteonecroses), afecções da membrana sinovial (si-novites, condromatoses), seqüelas de fraturas, lesõesligamentares, ressecções de meniscos, processosmetabólicos (gota, pseudogota), infecções, proble-mas neurológicos e tumores (Fig. 13.26).

No joelho, as artroses podem ser classificadaspelas regiões comprometidas: tibiofemorais e femo-ropatelares.

A artrose tibiofemoral pode comprometer só ocompartimento medial ou o lateral, chamando-se deunicompartimental (Fig. 13.27). Quando se encon-tram comprometidos os dois compartimentos é de-nominada bicompartimental. Quando a articulaçãofemoropatelar também está atingida, utiliza-se adesignação panartrose.

Sintomas

A dor de maior ou menor intensidade acompa-nha a artrose desde o seu início, piorando paulati-

namente com o avançar da moléstia. É mais comumem mulheres a partir da 5ª década de vida, durantea fase da menopausa. A deformidade mais comumé o desvio em varo, o qual progride lentamente,levando a uma dor no compartimento medial porhiperpressão, ocorrendo tensão aumentada doscomponentes ligamentares laterais que se afrouxame perda da congruência articular (subluxação). Adeformidade em valgo é mais rara e conduz a umaartrose unicompartimental lateral, com frouxidãoligamentar medial e subluxação.

A artrose femoropatelar, inicialmente dolorosaaos esforços do quadríceps, durante a marcha emrampas, corrida e saltos progressivamente compro-mete a flexo-extensão e o paciente não tem forçaspara levantar-se ao assumir a posição de cócoras.

Ao exame, observamos um joelho aumentadode volume em relação ao lado são, com as deformi-dades já citadas. À palpação, pode-se detectar ou nãoa presença de derrame articular, com intensa crepi-tação local ao mobilizarmos passivamente a articu-lação. O paciente neste momento relata onde seencontram os pontos dolorosos; avaliamos ainda ograu de frouxidão ligamentar e sua amplitude de mo-vimentos.

Avaliação Radiográfica

Realizam-se normalmente três incidências ra-diológicas, para os dois joelhos:

� Ântero-posterior (frente) em pé, para verificar-se a deformidade angular e a diminuição doespaço articular (pinçamento articular), o au-mento da densidade (esclerose) do osso espon-joso subcondral, com a presença de osteófitos.Nos casos mais graves, é comum o encontrodos pseudocistos, imagens císticas de formaarredondada no osso subcondral junto à su-perfície articular e que se repetem à imagemde espelho no osso adjacente.

� Perfil em extensão máxima, para verificar-sea forma dos côndilos e da articulação femo-ropatelar, identificação dos osteófitos e a pre-sença de corpos livres, freqüentemente en-contrados e localizados no recesso articularposterior.

� Axial, com o joelho flexionado a 90°, paravisualizar-se a articulação femoropatelar e suasalterações, sendo denominada incidência nalinha do horizonte. É comum encontrar-se

Figura 13.26 – Artrose do joelho com deformidade em valgo.

Figura 13.27 – Artrose unicompartimental.

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osteofitose intensa tanto da patela como doscôndilos femorais, comprometendo mais afaceta lateral patelar, que pode encontrar-sesubluxada lateralmente, principalmente noscasos com deformidade em valgo.

Tratamento

O tratamento da artrose pode ser somente clí-nico ou associado a procedimentos operatórios. Dissodependerá a intensidade dos sintomas, associadosà maior ou menor gravidade do caso. Assim, ela tam-bém pode ser classificada quanto à gravidade em trêstipos:

� Leve: poucos sintomas, pouca deformida-de, sem limitação de movimentos, ativida-des físicas comprometidas ao sair do leitopela manhã, por dor localizada que melhorarapidamente, ou a exercícios mais vigorosos,desaparecendo durante o repouso. Radiologi-camente, espaços articulares mantidos, simé-tricos ao joelho ileso, sem osteófitos, com umaleve esclerose na região comprometida.

� Moderada: dor a caminhadas prolongadas,exigindo paradas para repouso, exercícios vi-gorosos interrompidos por dor, com melhoraapós o repouso. Deformidades notadas à ins-peção, com pontos dolorosos bem demons-trados, limitação parcial da flexão e extensãomáxima. Radiologicamente, pinçamento arti-cular, osteófitos presentes, deformidades an-gulares, evidente esclerose e osteófitos na re-gião dolorosa.

� Grave: dor ao percorrer curtas distâncias, apoian-do-se em bengalas ou muletas, presente emtodo o movimento e ao repouso. Deformida-des graves, com grosseiro aumento de volu-me. Joelho não flexiona além de 90° e perdeuos últimos 10° de extensão. Radiologicamen-te com esclerose intensa, osteófitos, corposlivres, estando os côndilos em contato total,deformados por achatamento das zonas decontato entre eles.

Tratamento Clínico

O tratamento clínico encerra uma série de me-didas para minorar os sintomas, desde a adminis-tração de analgésicos e antiinflamatórios, medidas

fisioterápicas analgésicas e cinesioterápicas (exer-cícios) e prática desportiva sem sobrecargas sobre aarticulação doente. O estímulo à prática de exercí-cios aquáticos, descarregando o peso corporal atra-vés da flutuação, pode permitir uma melhora naamplitude de movimentos e, ao mesmo tempo, per-mitir a “queima” energética, saudável e muitas ve-zes indispensável para os obesos. A perda de pesocorporal é uma das medidas mais eficientes paraminorar os sintomas principalmente nas artrosesleves e moderadas.

O uso de injeções intra-articulares (infiltrações)com corticóides promove um alívio fugaz do qua-dro doloroso e inflamatório, porém o depósito decorticóides sobre a cartilagem ilesa, que se nutre porcontato com o líquido sinovial, provoca a sua dege-neração e agravamento mais grave da afecção. Atual-mente existem injeções contendo substâncias viscosassemelhantes aos mucopolissacarídeos, presentes nolíquido sinovial que, quando aplicadas, podem me-lhorar a função e a dor nas artroses leves e até nasmoderadas. Os benefícios que promovem são dis-cutíveis, existindo opiniões controvertidas daquelesque as utilizaram, desde o êxito com alívio duradouroaté a piora dos sintomas.

Tratamento Cirúrgico

O tratamento cirúrgico depende de fatores comoidade, sexo, estado geral e a gravidade de cada caso.

Na artrose femoropatelar (Fig. 13.28), a regula-rização da cartilagem lesada, a espongização do osso

Figura 13.28 – Artrose femoropatelar: imagem da resso-nância magnética.

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15°

15°

subcondral (Fig. 13.29) e a retirada dos osteófitos(facetectomia) (Fig. 13.30) nas formas leves e mode-radas podem levar a uma remissão temporária dossintomas.

Nas artroses tibiofemorais unicompartimentaisacompanhadas de desvios em varo ou em valgo, nafase leve ou moderada, em pacientes abaixo dos 55anos, pode ser realizada uma mudança no eixo de cargado membro para o lado oposto, diminuindo as pres-sões mecânicas no lado afetado, pressionando agorao compartimento oposto. O método cirúrgico con-siste em realizar um corte no osso (osteotomia), cor-reção do ângulo e a fixação dos fragmentos na novaposição. As osteotomias podem ser realizadas tantono fêmur como na tíbia; geralmente, as deformida-des em varo ocorrem na tíbia, enquanto as em valgoocorrem no fêmur (Figs. 13.31 a 13.34).

Figura 13.31 – Artrose tibiofemoral unicompartimental: raioX inicial.

Figura 13.32 – Cálculo da cunha a ser ressecada.

Figura 13.29 – Ressecção da área lesada e espongizaçãodo osso subcondral.

Figura 13.30 – Execução da facetectomia.

Estas osteotomias em casos leves podem levara resultados duradouros; porém, em pacientes comcomprometimento mais grave, o alívio da dor é tem-porário, perdurando por um período entre cinco edez anos.

Nas artroses graves, o tratamento de escolha hojeé a artroplastia do joelho (Fig. 13.35), que consistena reconstrução das superfícies articulares medianteo implante de peças metálicas e de polietileno, querevestem internamente as extremidades ósseas, sendo

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BA

A B

Figura 13.33 – A e B, passos da osteotomia tibial valgizante.

Figura 13.34 – Raio X final.

Figura 13.35 – A e B, artroplastia do joelho.

fixadas com o auxílio de polímeros acrílicos (“cimen-to”), conferindo ao joelho uma articulação artificial,indolor, onde se conseguiu realinhar o membro,retornar à estabilidade ligamentar e oferecer umaamplitude de movimentos com flexão de 100° e umaextensão total.

Esta operação oferece ao paciente atividades com-patíveis com o seu grupo etário, ou seja, deambula-ção sem limites, a capacidade de sentar-se livremente,dançar, dirigir veículos, a natação, o ciclismo recrea-tivo etc. Ela não permite a prática de esportes de altoimpacto ou os esforços que exigem a flexão total dojoelho, ou ainda sobrecargas excessivas.

Com o uso, os componentes da prótese tendema se desgastar, exigindo cirurgias de revisão para trocados implantes desgastados. Por isso, a sua indica-

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ção preferencialmente é realizada em pacientes commais de 60 anos, pois a sua vida média atualmentegira em torno de 15 anos. As artroplastias ou próte-ses totais do joelho têm sido utilizadas desde a dé-cada de 1860 e o seu aprimoramento é contínuo,sendo indicada numa intensidade semelhante a jáconsagrada artroplastia total do quadril. A sua indi-cação em pacientes mais jovens é justificada quan-do os mesmos são portadores de afecções reumáticas,pois a possibilidade do processo se instalar no ou-tro lado traria uma grande incapacidade e a “quali-dade de vida” exigida pelo paciente se impõe ao riscode se realizar revisões cirúrgicas em idades mais pre-coces.

Entre as principais contra-indicações locais pararealização do tratamento cirúrgico, chama-se aten-ção para as infecções ou seqüelas de processos in-fecciosos, lesões cutâneas de difícil cicatrização, lesõesvasculares obstrutivas etc. Entre as principais com-plicações além do desgaste, destaca-se a soltura,decorrente da absorção do osso no qual os compo-nentes estão fixados, e as infecções tardias, que ne-cessitam de revisões muitas vezes trabalhosas ou atéimpossíveis de serem realizadas.

Quando um paciente não tem condições clíni-cas para realizar uma artroplastia total ou teve umacomplicação que inviabilizou a reposição de umaprótese anteriormente implantada, o que pode serrealizado é uma artrodese, ou seja, a fixação cirúrgi-ca das duas extremidades, as quais se soldarão, blo-queando qualquer movimento que existia no joelho.Muito realizada no passado, a artrodese do joelho épouco indicada por causar uma marcha rígida, difi-cultando a prática de atividades sociais e diárias comosubir e descer escadas, colocar peças do vestuáriopelos pés e dirigir, pois o paciente, ao sentar-se, per-manece com o joelho em extensão, obliterando otrânsito em lugares restritos como auditórios, cine-mas, assentos de aviões etc.

Osteonecrose e Osteocondrites

Osteonecrose

A osteonecrose (ON) asséptica ou avascular dojoelho significa infarto ósseo resultante provavelmen-te de isquemia, localizando-se mais freqüentemen-te no côndilo femoral medial, mas também podendoafetar o lateral e, com menor freqüência, o côndilo

tibial. A ON do joelho pode ser classificada em pri-mária e secundária. A primária é a chamada ONidiopática, ou de causa desconhecida. A secundáriaé associada a processos sistêmicos identificáveis, taiscomo uso de corticosteróides ou álcool.

A ON idiopática apresenta-se mais freqüente-mente em indivíduos com idade superior a 60 anos,do sexo feminino, na proporção de três mulherespara um homem, sendo bilateral em 20% dos ca-sos. Em 90% dos pacientes, o côndilo femoral me-dial é o mais afetado.

A etiologia da ON permanece ainda desconheci-da, procurando-se comumente relacionar seu surgi-mento a alterações vasculares ou pós-traumáticas.Existem outras suposições causais, tais como aumentoda pressão intra-óssea, pós-afecção dos meniscos,alteração no tecido gorduroso no interior do fêmurdistal e até mesmo após procedimento artroscópico.

Quadro Clínico

O principal sintoma é a dor, que pode variar deintensidade, desde moderada até intensa, caracte-rizando-se por ser de início súbito, com alguns pa-cientes chegando a referir o momento exato do inícioda mesma. Na fase inicial, ocorre piora da dor du-rante a noite que, depois de seis a oito semanas,pode diminuir gradativamente. No exame físicoconstata-se hipotrofia da musculatura do quadrí-ceps e dor à palpação do côndilo femoral, poden-do ser observados derrame articular e, em algunscasos, espessamento sinovial. Nas fases iniciais aamplitude de movimento pode estar normal ou le-vemente diminuída. O sinal de Wilson pode estarpresente e é caracterizado por presença ou aumentoda dor ao examinador provocar a hiperextensão dojoelho com rotação medial. O processo pode evo-luir para dor constante, diminuição do movimen-to, crepitação, deformidade em varo do joelho eaumento de volume, caracterizando-se, na fase fi-nal, a osteoartrose.

Exames Subsidiários

O diagnóstico precoce pode ser evidenciado pelacintilografia óssea, que mostrará área de hipercapta-ção do radiofármaco. Após um período variável detrês a oito semanas, as radiografias, que no início sãonormais, podem apresentar as primeiras alterações.

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Na etapa radiográfica inicial, achatamento do côndilofemoral pode ser a única alteração visível, enquan-to, mais tardiamente, há o aparecimento de área deradiotransparência, rodeada de reação esclerótica,que finalmente adquire o aspecto radiográfico deosteoartrose.

Koshino determina o estágio da doença basea-do em sua classificação radiográfica:

� Estágio I: incipiente, isto é, dor sem alteraçõesradiográficas.

� Estágio II: avascular, com presença de lesãoradiotransparente com forma oval e cartilagemnormal.

� Estágio III: colapso, com esclerose no ossosubcondral.

� Estágio IV: degenerativo, presença de osteófitoscom esclerose femoral e tibial (osteoartrose).

Quando disponível, a ressonância magnética porimagem é um excelente método diagnóstico. As al-terações são demonstradas mais precocemente doque na radiografia simples e o tamanho da área dalesão pode ser mais bem avaliado, assim como aqualidade da cartilagem articular.

Tratamento

No início, o tratamento é incruento com méto-dos com antiinflamatórios não hormonais e dimi-nuição da carga no membro afetado, com o pacientedeambulando com auxílio de bengala ou mesmo parde muletas.

No tratamento cruento da ON, existem doismétodos cirúrgicos:

� Aqueles que visam a reconstituir e manter aarticulação anatômica do joelho por meio deosteotomia tibial, perfurações ósseas, cureta-gem da lesão ou enxertos autólogos osteocar-tilagíneos.

� Substituição artroplástica da articulação comprótese unicompartimental ou total, depen-dendo do grau da osteoartrose.

Osteocondrite Dissecante

A osteocondrite dissecante do joelho (ODJ) é umacondição patológica relativamente rara que acome-te tanto pacientes adolescentes quanto adultos jo-vens, sendo que grande parte da literatura recentemostra tendência a associar estas duas populações

na avaliação dos resultados do tratamento da doen-ça. Somente em torno dos últimos vinte anos elasforam estudadas como dois grupos separados, per-mitindo uma melhor análise da sua evolução natu-ral e possibilitando a criação de diretrizes maissatisfatórias na abordagem terapêutica desta afec-ção. Hughston et al. encontraram uma incidência de15 a 21 casos de ODJ por 100.000 joelhos.

A ODJ se caracteriza pela separação parcial outotal de um fragmento osteocondral. É a causa maisfreqüente de corpo livre na articulação do joelho nosjovens. Embora existam várias teorias tentando ex-plicar sua etiologia, as mais citadas na literatura sãoa traumática, a isquêmica e a predisposição genéti-ca. Smillie acredita que há quatro tipos de ODJ e quetodos estão interligados na etiologia da doença: noprimeiro tipo (10 anos de idade), a lesão é uma ano-malia de ossificação; no segundo tipo (15 anos – ju-venil), a lesão se deve à superposição de um traumaem um osso isquêmico; no terceiro tipo (adulto), umtrauma produz a isquemia e a persistência desta, alesão; no quarto tipo (fraturas osteocondrais tangen-ciais), somente um trauma é responsável pela lesão.Apesar disto, a revisão da literatura recente sugereque ainda não há uma explicação clara para esta afec-ção. A faixa etária mais acometida pela ODJ está en-tre 10 e 20 anos, podendo porém ocorrer acima desteperíodo nos adultos jovens.

Quadro Clínico

Clinicamente, a história costuma apresentar sin-tomas vagos, como dor articular difusa, aumento devolume e algumas vezes bloqueio articular. Da mes-ma forma, os achados de exame físico são inespe-cíficos, sendo um dos mais consistentes a atrofiamuscular da coxa do lado afetado, associada ou nãopor derrame articular, diminuição da mobilidade,corpo livre palpável e crepitações.

Exames Subsidiários

O diagnóstico da ODJ pode ser confirmado pe-los exames radiográficos que permitem também clas-sificar a lesão conforme idealizado por Aichroth(Fig. 13.36).

Outros exames de importância citados pela li-teratura são a tomografia axial computadorizada paraaprimorar o estudo da forma e dimensões da lesão e

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a ressonância nuclear magnética, que parece ser atécnica mais sensível para o diagnóstico precoce daODJ. Contudo, esses exames não são indispensáveispara o diagnóstico e abordagem terapêutica da ODJ.

Tratamento

As lesões pequenas, que em geral acometem ascrianças na 1ª década da vida, são tratadas incruen-tamente com sintomáticos e controle radiográficoperiodicamente.

A artroscopia assume destaque por permitir ava-liar o tipo e extensão da lesão e a mobilidade do frag-mento osteocondral, tendo implicação direta naescolha da terapêutica apropriada e execução damesma se possível, podendo-se optar ainda pelaartrotomia se necessário. Seu uso permite um me-nor período de internação hospitalar, com despesasfinais reduzidas, além de ausência de cicatrizes ex-tensas, menor atrofia muscular e reabilitação maisprecoce no pós- operatório.

A literatura mais recente enfatiza a presença ounão da maturidade esquelética do paciente para ava-liação do prognóstico e orientação na escolha do tra-tamento adequado da ODJ. Nas crianças com surgi-mento precoce da doença, a superfície cartilagíneaestá íntegra, tem suporte subcondral e há maior chancede cicatrização com o tratamento incruento.

A osteocondrite dissecante do joelho possuimuitas opções de tratamento e resultados variá-veis. Os estudos comparativos entre as diversasformas de tratamento divergem muito em relaçãoà idade, estado da lesão e métodos de avaliação. A

revisão da literatura recente ressalta a existência dedois fatores de grande importância na abordagemterapêutica da ODJ: a maturidade esquelética dopaciente e a mobilidade do fragmento osteocondral.Os pacientes esqueleticamente imaturos costumamevoluir bem apenas com o tratamento conservador,enquanto nos jovens próximos à maturidade esque-lética e nos adultos indica-se o exame artroscópicopara se avaliar a mobilidade da lesão. Se esta é fixaao osso (fragmento in situ fixo), realizam-se per-furações na lesão com o objetivo de estimular suarevascularização. Porém, se existe mobilidade (frag-mento in situ móvel), deve-se proceder à fixaçãopor método de preferência do cirurgião. Os frag-mentos transformados em corpos livres são reti-rados da articulação, se possível sob visão artros-cópica.

A probabilidade de ocorrerem alterações dege-nerativas no futuro depende de vários fatores, tais comoa idade do paciente no momento do diagnóstico, otamanho e a localização da lesão. Segundo a literatu-ra, a incidência de artrose é maior nos pacientes nosquais o diagnóstico e o tratamento foram realizadosapós a maturidade esquelética e com lesões extensasque comprometem a área de carga do joelho.

Sinovites do Joelho

IntroduçãoO joelho é a maior articulação do corpo huma-

no e é recoberto internamente por uma membranasinovial, formando uma bolsa com grande capaci-dade (cerca de 250mL no adulto) e de fácil acesso,motivo pelo qual os estudos sobre membrana sino-vial são realizados nesta articulação.

A membrana sinovial produz o líquido sinovial, quefunciona como lubrificador da articulação e é tambémo responsável pela nutrição das cartilagens. O líquidosinovial é um dializado do plasma rico em ácido hia-lurônico. Em condições normais, o joelho contém de1 a 4mL de líquido sinovial. Existe uma pressão negati-va intra-articular que mantém a membrana sinovialcolapsada. Na presença de derrame articular, pode haverum aumento grande da pressão, principalmente nosmovimentos finais de flexão ou extensão, provocandodor pela distensão da cápsula articular.

Derrame articular é a presença de líquido em quan-tidade superior ao que existe normalmente na articu-lação. Pode ser seroso, hemorrágico ou purulento.

Côndilo medial

Clássica Clássica estendida Ínfero-central

Côndilo lateral

Ínfero-central Anterior

Figura 13.36 – Classificação radiográfica de Aichroth.

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No derrame tipo seroso, o líquido é amarelo-citrino, viscoso. É freqüente nas sinovites crônicas,principalmente naquelas denominadas inespecífi-cas, nas quais os derrames costumam ser repetitivose de difícil tratamento.

O derrame sero-hemático aparece nas primei-ras 24 horas após o trauma e ocorre após lesõesagudas como meniscal, ligamentar (principalmentedo ligamento cruzado anterior) e fraturas intra-ar-ticulares.

Trauma ocorre nas lesões do ligamento cruza-do anterior. O derrame sangüíneo aparece nas pri-meiras horas após o trauma, devido a rompimentodos vasos nutrientes.

Quando a hemartrose for decorrente de uma fra-tura intra-articular, haverá presença de gotículas degordura, visíveis a olho nu, no líquido de punção.

A pioartrite ocorre nas infecções bacterianas ecostuma ser bastante nociva, deixando seqüelas de-vido à destruição da cartilagem. A única forma detratamento com êxito é o diagnóstico precoce e ins-tituição de terapia que consiste na irrigação, drena-gem e antibioticoterapia.

Sinovites por Deposição de Cristais:Gota e PseudogotaGota Úrica

A deposição de cristais de ácido úrico pode ocor-rer em articulações, músculos, tendões e ligamen-tos, provocando um processo inflamatório agudolocal. A articulação metatarsofalângica do hálux é olocal de maior incidência. Acomete com mais fre-qüência os indivíduos do sexo masculino, obesos esedentários. É também característica a presença dedor quando em repouso.

Quadro Clínico

Quando ocorre a deposição de cristais no joelho,o paciente refere dor com aumento de volume etemperatura local, de aparecimento súbito. Ao exa-me físico observamos aumento de volume do joe-lho devido ao derrame articular, aumento de tem-peratura local e o líquido aspirado na punção podeser amarelado e turvo, semelhante ao de uma pioar-trite.

Exames Laboratoriais

Devemos solicitar a análise de microscopia comluz polarizada do líquido sinovial, que vai revelar apresença de cristais de urato de sódio.

A dosagem do ácido úrico no sangue deverá es-tar acima do limite normal (em torno de 7mg%).

Tratamento

O tratamento na fase aguda é realizado com re-pouso, uso de antiinflamatórios não hormonais,indometacina, colchicina e, na fase preventiva, oalopurinol pode ser útil para manter o nível séricode ácido úrico mais baixo.

Pseudogota ou Condrocalcinose

Difere da gota, pois os cristais são de pirofosfatode cálcio. São menos freqüentes que a gota e cursamde uma forma mais silenciosa, evoluindo para a croni-cidade sem apresentar surtos agudos tão freqüentescomo a gota. O diagnóstico é realizado por meio doexame do líquido sinovial com luz polarizada, em quevamos encontrar cristais birrefringentes de pirofosfatode cálcio. O exame radiográfico do joelho pode mos-trar presença de meniscos calcificados, cartilagens eligamentos também com deposição de cristais. O tra-tamento é feito com a utilização de antiinflamatóriosnão hormonais como sintomáticos; às vezes, até acortisona pode ser injetada na articulação.

Prega Sinovial Patológica

É uma entidade que passou a ser conhecida como advento da artroscopia. Consiste na presença deespessamento da membrana sinovial e resquíciosda reabsorção incompleta dos septos existentes nafase embrionária dividindo o joelho em três cavi-dades. Existem as pregas suprapatelar, infrapatelare a mediopatelar. Esta última pode dar origem àprega sinovial patológica (Fig. 13.37).

Quadro Clínico

Os sintomas iniciam em torno dos 16 anos deidade e consistem em dor após exercícios físicos oupermanecer muito tempo com o joelho fletido, me-

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A B

Figura 13.37 – A, prega sinovial mediopatelar espessada; B, ressecção.

lhorando quando se estende a articulação; estalidose falseios também podem estar presentes. Não éincomum os pacientes associarem o início da sinto-matologia com algum tipo de trauma, em geral, trau-mas diretos.

Dor, falseios, estalidos e muitas vezes “cordão”palpável na região medial da articulação femoropa-telar estão presentes.

É mais freqüente na raça amarela e, quanto aosexo, o feminino é mais acometido.

O diagnóstico é feito por meio de anamnese eexame físico. Na ressonância magnética em geral,podemos ver a imagem da prega sinovial, emboranão possamos afirmar categoricamente que ela sejado tipo patológica.

Tratamento

O tratamento é feito com repouso, antiinflama-tórios não hormonais, termoterapia e alongamentodos ísquios tibiais.

Caso não haja regressão dos sintomas, o pacienteé submetido a tratamento por artroscopia, onde va-mos notar uma prega esbranquiçada, fibrótica, quese atrita com o pólo ínfero-medial da rótula e facemedial do côndilo femoral medial. Em raros casospodemos observar o bloqueio articular causado pelapresença de uma lesão tipo alça de balde da prega

sinovial. A ressecção total da prega sinovial acarretao desaparecimento da sintomatologia.

No passado, certamente muitos pacientes foramsubmetidos a meniscectomias desnecessárias devi-do à existência de uma prega sinovial espessada ecom má evolução pós-operatória.

A cirurgia por meio da ressecção artroscópicada prega propiciará a cura definitiva do paciente. Umaprega sinovial patológica não tratada poderá ser res-ponsável pelo aparecimento de uma condromalaciafemoropatelar com evolução ulterior para artrose.

PARA LER MAIS

CANALE, S.T. Campbell Operative Orthopaedics. St.Louis, Mosby, 1998.

DANIELS, WILLIAMS & WORTHINGHAM. MuscleTesting: Techniques of Manual Examination. 2nd. Ed.Philadelphia, WB Saunders, 1956.

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