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1 A MESORREGIÃO DO VALE DO MUCURI: CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA E ANÁLISE DO DESENVOLVIMENTO Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Geografia – Tratamento da Informação Espacial, como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre. Área de Concentração: Análise Espacial Orientador: Prof. Dr. Leônidas Conceição Barroso Co-Orientadores: Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho e Prof. João Francisco de Abreu Phd. Mestrando: Christiano Ottoni Carvalho PUC - MG Belo Horizonte Maio de 2006

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A MESORREGIÃO DO VALE DO MUCURI:

CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA E ANÁLISE

DO DESENVOLVIMENTO

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação

em Geografia – Tratamento da Informação Espacial, como

requisito parcial à obtenção do Título de Mestre.

Área de Concentração: Análise Espacial

Orientador: Prof. Dr. Leônidas Conceição Barroso

Co-Orientadores : Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho e

Prof. João Francisco de Abreu Phd.

Mestrando: Christiano Ottoni Carvalho

PUC - MG

Belo Horizonte

Maio de 2006

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FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Ottoni Carvalho, Christiano O88m A mesorregião do Vale do Mucuri: contextualização histórica e Análise do desenvolvimento /Christiano Ottoni Carvalho. – Belo Horizonte, 2006. 102f. : il.; mapas. Orientador: Prof. Dr. Leônidas Conceição Barroso Co-Orientadores: Prof. Dr. João Francisco de Abreu, Oswaldo Bueno Amorim Filho. Dissertação (mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Programa de Pós-Graduação em Geografia, Tratamento da Informação Espacial. Bibliografia. 1. Planejamento regional – Mucuri, Vale do (MG). 2. Sistemas de Informação Geográfica. I. Barroso, Leônidas Conceição. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Tratamento da Informação Espacial. III. Título. CDU: 91:681.3

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Ponta de Areia Milton Nascimento, Fernando Brant

“Ponta de areia, ponto final Da Bahia a Minas, estrada natural Que ligava Minas ao porto, ao mar

Caminho do ferro mandaram arrancar Velho maquinista com seu boné

Lembra o povo alegre que vinha cortejar Maria Fumaça, não canta mais

Para moças, flores, janelas e quintais Na praça vazia, um grito, um ai

Casas esquecidas, viúvas nos portais”

Agradecimentos

Agradeço, acima de tudo, à minha família, Fabiana, minha esposa e Maria Clara, minha filha querida, razões da minha vida, pela sua paciência e crença infinita em minha capacidade.

Aos meus Pais, Jehorvan e Vitória, à minha irmã, Georgia e à minha Avó, D. Nati, pelo exemplo e incentivo eternos.

Agradeço também, aos meus orientadores, especialmente ao Prof. Dr. Leônidas Conceição Barroso, conterrâneo e irmão de inquebrantáveis crenças regionais.

Agradeço também à CAPES pela concessão de bolsa de estudos que possibilitou a realização desta dissertação de Mestrado.

Agradecimento Especial

Ao meu primo e amigo Fábio Epaminondas Ottoni (in memoriam), enciclopédia viva da história do Mucuri e de nossa família, pela amizade infinita e pelas horas de conversas históricas, maravilhosas, pitorescas e especiais. De certo modo, este trabalho também é um pouco seu, meu eterno amigo.

Dedicatória

Dedico esta dissertação ao imorredouro espírito de Theófilo Benedicto Ottoni, presente em cada vila, cidade e cidadão do Vale do Rio Mucuri. Pelo resgate e vindicação absoluta de suas visões e crenças na capacidade e na bondade humana.

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Índice de Figuras, Quadros, Mapas e Gráficos

Mapa 01 - Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e Mucuri .............. 29

Mapa 02 - Municípios da Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri –2000 ........................................................................................................ 30

Mapa 03 - Traçado da Ferrovia Bahia/Minas – Ministério da Viação e Obras Públicas, 1949 ...................................................................................................... 59

Mapa 04 – Microrregiões da Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri – 2000 .................................................................................................. 72

Figura 01 – Um caminho para o mar – Ilustração de Percy Lau .......................... 32

Figura 02 – Canoas no Rio Mucuri – Ilustração de Percy Lau ............................. 33

Figura 03 – Theóphilo Benedicto Ottoni, “O Luzia” – Visto por Santa Rosa, 1953 ............................................................................................................................... 35

Figura 04 – Vapor no Rio Mucuri – Ilustração de Percy Lau ............................... 38

Figura 05 – Fotocópia de uma ação da Companhia de Navegação Do Mucury .. ............................................................................................................................... 39

Figura 06 – Nas baixadas do rio Todos os Santos – Ilustração de Percy Lau .... 40

Figura 07 – Vista da cidade de Teófilo Otoni em 1860 – Aquarela de Albert Schirmer, Prefeitura de Teófilo Otoni ................................................................... 43

Figura 08 – Estrada de Rodagem entre Filadélfia e Cachoeira de Santa Clara – Ilustração de Percy Lau ........................................................................................ 44

Figura 09 – Folheto comemorativo do centenário da Cidade de Teófilo Otoni, em 1953 – Arquivo da Família Ottoni ......................................................................... 47

Figura 10 – Igreja Matriz da Imaculada Conceição em 1921 – Teófilo Otoni, arquivo da família Ottoni ....................................................................................... 54

Figura 11 – Vista parcial da cidade de Teófilo Otoni em 1921 – arquivo da família Haueisen ............................................................................................................... 56

Figura 12 – Vista parcial da cidade de Teófilo Otoni em 1921 – arquivo da família Haueisen ............................................................................................................... 57

Figura 13 – Mesorregião Expandida - Jequitinhonha/Mucuri – Índice de Desenvolvimento Humano – IDH_M – Variação 1991/2000 - Contornos ............................................................................................................................... 75

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Figura 14 – Mesorregião Expandida - Jequitinhonha/Mucuri – Índice de Desenvolvimento Humano – IDH_M – Variação 1991/2000 – Modelo 3D ............................................................................................................................... 76

Figura 15 – Mesorregião Expandida – Jequitinhonha /Mucuri (2000) – Componente I - Contornos .................................................................................... 78

Figura 16 – Mesorregião Expandida – Jequitinhonha /Mucuri (2000) – Componente I – Modelo 3D .................................................................................. 79

Figura 17 – Mesorregião Expandida – Jequitinhonha /Mucuri (2000) – Componente I ....................................................................................................... 81

Quadro 01 – Oscilação Demográfica no Município de Teófilo Otoni (%) ............. 49

Quadro 02 – População do Município de Teófilo Otoni em 1911......................... 52

Quadro 03 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1920/1980 ......................... 62

Quadro 04 – Tamanho Médio das Propriedades Rurais em Teófilo Otoni 1920 - 1980 (ha) .............................................................................................................. 65

Quadro 05 – Tamanho dos Estabelecimentos Rurais Por Grupos de Áreas em Teófilo Otoni (ha) .................................................................................................. 66

Gráfico 01 – Oscilação Demográfica no Município de Teófilo Otoni em (%) ...... 49

Gráfico 02 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1920 .................................. 62

Gráfico 03 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1940 .................................. 63

Gráfico 04 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1950 .................................. 63

Gráfico 05 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1960 .................................. 63

Gráfico 06 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1970 .................................. 64

Gráfico 07 – Utilização das Terras em Teófilo Otoni 1980 .................................. 64

Gráfico 08 – Tamanho dos Estabelecimentos Rurais por Grupo de Áreas em Teófilo Otoni (ha) – Década de 40 ........................................................................ 66

Gráfico 09 – Tamanho dos Estabelecimentos Rurais por Grupo de Áreas em Teófilo Otoni (ha) – Década de 70 ........................................................................ 67

Gráfico 10 – Tamanho dos Estabelecimentos Rurais por Grupo de Áreas em Teófilo Otoni (ha) – Década de 80 ........................................................................ 67

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ÍNDICE

Resumo .............……………………………… ……………………………………….. 01

Abstract .......................................... ..................................................................... 02

Apresentação ...................................... ................................................................ 03

Capítulo I – Marco Teórico......................... ........................................................ 06

Capítulo II – Contextualização Histórica e Regional ........................................ 28

Capítulo III –Análise do Mapeamento do IDH da Mesor região Expandida do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri no Período 1991 – 2000 ............................................................................................................................... 70

3.1. Considerações Iniciais ................................................................................... 71

3.2. Análise do Mapeamento..................................................................................74

Considerações Finais .............................. ........................................................... 88

Bibliografia ...................................... .................................................................... 94

Anexo I Municípios da Mesorregião do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri – 2000 ............................................................................................................................... 98

Anexo II Municípios do Jequitinhonha – Mucuri (expandida) (dados sobre o IDH em 2000) ..............................................................................................................102

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Para Fábio Epaminondas Ottoni, aonde você estiver ...

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RESUMO

Este estudo trata da contextualização histórica e análise do desenvolvimento da Mesorregião expandida do Vale do Jequitinhonha e Mucuri e tem a intenção de identificar descontinuidades temporais e espaciais nesta região, que nasce de maneira integrada e se desarticula ao longo do tempo por diversos fatores, tanto políticos quanto sócio-econômicos.

Esta abordagem, que se faz através da análise do mapeamento dos Índices de Desenvolvimento Humano – IDH’s da Mesorregião no período compreendido entre 1991 e 2000 utilizando de técnicas de GIS (Sistemas de Informações Geográficas) e análise de superfícies geo-estatísticas, visa a observação da existência ou não de um padrão entre as diferenças dos IDH’s eventualmente mapeados e o processo histórico de desenvolvimento, tornando possível então o estabelecimento de uma relação entre os padrões de desenvolvimento de três regiões distintas, hoje bastante diversas, dentro desta mesorregião e o seu grau de integração e/ou desarticulação tanto no espaço quanto no tempo.

O estudo foca preferencialmente a mesorregião do Mucuri e utiliza a mesorregião do Jequitinhonha e as porções sul do Estado da Bahia e norte do Estado do Espírito Santo como parâmetro para identificar, historicamente, como esta mesorregião expandida, que se consolida inicialmente como uma região integrada, tem se comportado do ponto de vista do desenvolvimento humano e quais os fatores determinantes de grandes diferenças nos índices observados nas três regiões que a conformam.

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ABSTRACT

This essay is about the historical contextualization and analysis of the development processes of the expanded region of the Jequitinhonha and Mucuri Valley and tries to identify discontinuities in time and space in this region, which was born integrated as one and disintegrates itself through time because of many different reasons such as political and social-economic.

This approach, that is done through the analysis of Human Development Indexes of this expanded region between 1991 and 2000, uses GIS (Geographic Information Systems) techniques and geo-statistics surfaces analysis and tries to identify the existence or not of a pattern between the differences of Human Development Indexes mapped and the historical development processes, establishing a relation between the development patterns of three distinct regions that coexist inside the expanded region and its degrees of integration and/or disarticulation in time and space.

The essay also set a focus more specifically in the Mucuri region, using the Jequitinhonha region and the southern portion of the Bahia State and the northern portion of the Espírito Santo State as a parameter to identify, historically, how the expanded region, that consolidates itself as an integrated region, has been behaving through time, from the development point of view and which factors are determinant of great differences between the development indexes in each region.

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APRESENTAÇÃO

Desde a formação do Estado Brasileiro ainda como um Império dividido

em Províncias, podemos observar como a região do vale do Jequitinhonha e do

Mucuri tem sido historicamente, sempre se desenvolvendo à margem das demais

regiões, tanto da própria Província de Minas Gerais quanto das demais regiões do

País.

É assim que encontramos esta região em meados do século XIX, quase

intocada do ponto de vista ambiental e com uma estrutura societária ainda

primitiva uma vez que era exclusivamente habitada por diversas tribos indígenas,

muitas delas sem nunca ter tido qualquer contato com o homem branco.

Todo o fluxo e refluxo de pessoas e mercadorias com destino à região

de Diamantina e do alto Jequitinhonha, ou ali produzidas, deveriam desviar suas

rotas de maneira a passarem pelo então entreposto comercial de Barbacena, ao

sul, ou acompanhar precariamente o eixo do rio Jequitinhonha para que fosse

alcançado o litoral e assim os centros nacionais mais desenvolvidos de então.

O desbravamento da região do Mucuri, desde a primeira metade do

século XIX, passa a ser a principal meta da elite da comarca do Serro Frio, que via

esta região como um obstáculo e assim se configurando como o principal

impedimento ao desenvolvimento de sua região. Além de se configurar como um

obstáculo natural, temos também a descoberta tardia de pedras preciosas nas

matas e colinas do Mucuri.

Respondendo então a este chamamento é que temos o aparecimento

deste a que podemos chamar de “Bandeirante Moderno”, incorporado na figura

singular de Theófilo Benedicto Ottoni, que vê no desbravamento e na colonização

desta região uma resposta aos anseios de sua gente. Além disto, Ottoni

transformará a colonização desta região na sua contribuição mais profunda e rica

para a história do Brasil.

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Assim como a história do Mucuri, sua atuação política, digna de registro

para a transformação do Estado Imperial em República, será praticamente

apagada dos anais da história oficial ensinada em nossas escolas. Este

“esquecimento” vai ser determinante no processo de marginalização desta região.

Numerosos e pitorescos são os aspectos da história do Mucuri que a

fazem absolutamente única. Seu desbravamento tardio, suas numerosas nações

indígenas que a habitavam; as lendas das montanhas das esmeraldas jamais

encontradas; a colonização européia, principalmente germânica; os 100 chineses

trazidos a trabalhar na construção da primeira estrada de rodagem do Brasil e que

por aqui ficaram; as famosas 30 léguas da estrada Santa Clara à Filadélfia,

primeira estrada de rodagem do Brasil; o “Pogirun”, ou Chefe de Mãos Brancas,

nome indígena de Theófilo Ottoni, assim alcunhado por causa das enormes luvas

de couro de coloração esbranquiçada que o desbravador utilizava e sua aversão

ao regime escravista, que acabou por levá-lo, indiretamente, à bancarrota; a

Estrada de Ferro Bahia - Minas que estruturou a região durante quase 70 anos e

que simplesmente desapareceu durante a ditadura militar, depois de 1966.

Apesar da história peculiar desta região, ela observa as mesmas

dificuldades de outras regiões do país que, apesar de se configurarem como

importantes regiões observam um processo de estagnação, desequilíbrio ou de

crescimento bastante reduzido, geralmente com enormes conseqüências que se

refletem negativamente para sua população.

Retomar certos aspectos, mesmo que parcialmente, desta história e

destes processos regionais que moldaram a região do Mucuri é como chamá-la de

volta à vida. É a possibilidade, ainda que débil, de chamar a atenção para um

cantão sistematicamente deixado de fora da maior parte dos estudos e análises

científicas realizadas sobre as diversas regiões do nosso Estado.

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Esta dissertação de Mestrado pretende lançar um olhar mais detido

sobre esta região que para muitos, orgulhosamente, assume o status de Pátria. A

releitura dos processos formadores do Mucuri como região, passa certamente por

uma abordagem desapaixonada das estruturas regionais que a definem, sendo

uma análise científica o método mais apropriado de se realizar tal estudo.

Vivendo um processo de desenvolvimento marginal, esta região

aparentemente demonstra estar estagnada ou em processo de estagnação. Este

discurso tem sido repetido constantemente, por diversas instâncias, nas últimas

décadas. Mas, vale a pergunta ou o desafio: Existe realmente um processo de

estagnação? E se assim for, por quê? Quais fatos, ao longo de sua história, são

determinantes ou ajudaram a colocar a região no ponto onde se encontra? Que

ponto é este, verdadeiramente?

Esta dissertação foca basicamente um breve histórico do

desenvolvimento da região do Mucuri. Ela se inicia com uma apresentação do

marco teórico que fundamenta este trabalho, seguindo-se uma contextualização

histórica e regional, no segundo capítulo. O terceiro capítulo traz a análise do

mapeamento do IDH da região entre 1991 e 2000, realizado no Laboratório de GIS

da PUC/Minas e uma revisão de outros estudos realizados sobre a região,

finalmente chegando a uma conclusão que procura realizar um balanço de todo o

trabalho, estabelecendo um prognóstico sobre o desenvolvimento futuro da região.

Desta maneira, muito provavelmente as respostas definitivas a estes

questionamentos não se encontram integralmente neste estudo, nem ele encerra

toda a complexidade e a riqueza desta região e de sua história, apenas se

configurando como provocação para que novas publicações e estudos se sigam,

completando vagarosamente um mosaico regional que explique mais

adequadamente o Mucuri.

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Capítulo I

Marco Teórico

Desafio do Auto da Catingueira (Elomar)

“Sinhores dono da casa o cantadô pede licença

prá puxa a viola rasa aqui na vossa presença venho das banda do Norte cum pirmissão da sentença

cumprino mia sina forte já por muitos cunhicida buscano a inclusão da vida ou os cutelo da morte e das duas a prifirida a qui mim mandá a sorte”

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1.1. Considerações Acerca das Evoluções Teórico-Met odológicas da

Geografia

A segunda metade do século XX nos apresentou uma série de

evoluções teóricas da ciência Geográfica. Estas movimentações, apesar de terem

se colocado como antagônicas num primeiro momento, hoje se somam de

maneira a dar sustentação teórica a um trabalho que pretende, sem desconsiderar

o caráter histórico e humanístico de uma determinada região, realizar uma análise

quantitativa de determinados parâmetros que levem a uma melhor compreensão

de fenômenos regionais analisados num recorte espaço-temporal.

A partir da década de 1950, houve um reposicionamento teórico e

metodológico de boa parte dos geógrafos, denominado “Geografia Teorético-

Quantitativa”. Este reposicionamento tinha como paradigma a abordagem que

utiliza o “método científico” para identificar regularidades nos fenômenos espaciais

e, assim alcançar níveis de generalização e de explicação de modo que se atinja o

status da modelização e da teorização, possibilitando a predição. A chamada

“Geografia Teorético-Quantitativa” se liga à corrente científica que tinha como

fundamento a doutrina positivista e seus princípios propostos originalmente por

Auguste Comte. 1

Os princípios de Comte foram sintetizados em algumas grandes

orientações chamadas de “doutrina” por R. J. Johnston (1983, p. 13)2, e foram

tidas como principais bases epistemológicas da “Geografia Teorético-

Quantitativa”, a saber:

1 Considerações construídas a partir de notas de aula realizadas durante as disciplinas “Evolução do Pensamento Geográfico” e “Teoria da Geografia”, ministradas pelo Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho, respectivamente em Agosto/Setembro de 2001 e Agosto/Setembro de 2002, no Programa de Pós-Graduação em geografia - Tratamento da Informação Espacial, PUC/Minas. 2 JOHNSTON, R.J. : Philosophy and Human Geography. London, Edward Arnold, 1983, 152 p.

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♦ “Cientificismo: alegação de que o método positivista é o único

método verdadeiro para a obtenção do conhecimento, outros métodos

produzem conhecimento sem sentido”;

♦ “Política científica: Argumento onde o positivismo fornece o método

para se encontrarem soluções racionais para todos os problemas,

inclusive a base para a engenharia social”;

♦ “Neutralidade: As avaliações científicas são objetivas, com as

decisões sobre a veracidade das proposições sendo tomadas com base

em critérios que são independentes de compromissos particulares,

morais ou políticos.”

A “Geografia Teorético-Quantitativa” assim definiu sua metodologia3:

♦ A escolha de uma problemática e de fatos a estudar;

♦ Elaboração e escolha de uma explicação teórica com formulação de

hipóteses;

♦ Confrontação das hipóteses e da realidade observada;

♦ Conclusão através da aceitação, rejeição ou modificação das

hipóteses e da teoria inicial.

Além de contribuir enormemente para o resgate da posição da

Geografia no âmbito das ciências de maior prestígio à época, foi dada grande

importância às técnicas, principalmente quantitativas, introduzindo na prática

geográfica um poderoso instrumento, o computador. A formulação de novos

modelos e teorias, a recuperação de modelos e teorias anteriormente produzidos

ou, então o empréstimo de modelos e teorias desenvolvidas em outras disciplinas,

passaram a ser preocupação permanente dos “geógrafos teorético-quantitativos”.

3 Considerações construídas a partir de notas de aula realizadas durante as disciplinas “Evolução do Pensamento Geográfico” e “Teoria da Geografia”, ministradas pelo Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho, respectivamente em Agosto/Setembro de 2001 e Agosto/Setembro de 2002, no Programa de Tratamento da Informação Espacial, PUC/MG.

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Esta nova prática geográfica será priorizada até meados da década de

1970, quando começam a surgir ataques a essa linha e quando se observa, então,

certa insatisfação caracterizada pela perplexidade dos geógrafos diante da

pluralidade de orientações existentes no seio da Geografia. Esta insatisfação foi

gerada principalmente por argumentos que sustentavam que a geografia

quantitativa, ao longo de vinte anos, não teria apresentado os resultados

esperados ou suficientes que, de alguma maneira, ajudassem a entender, por

exemplo, as repetidas crises econômicas e energéticas mundiais.

Na verdade, as grandes crises mundiais e suas soluções para

problemas relacionados principalmente ao planejamento urbano e regional não

pareciam encontrar respaldo nos estudos e modelos propostos pela geografia

quantitativa. A extrema utilização de modelos matemáticos puros, às vezes sem

uma adequada experimentação ou um mais profundo embasamento teórico do

problema estudado, acaba por colocar em dúvida a capacidade crítica da

geografia, inclusive como ciência “carrefour”.

De fato, o insucesso de muitas de suas proposições se dá na medida

em que importantes variáveis socioeconômicas e principalmente históricas do

fenômeno ou objeto estudado não tinham sido analisadas de forma eficaz.

Somando-se a isto o uso de técnicas quantitativas e uma sistematização

exagerada, severas críticas são direcionadas à Geografia Quantitativa, que chega

a ser considerada como uma nova forma de determinismo, decorrente da escolha

de dados mensuráveis e medidos. (George, 1972, p. 121)4

O que se observa geralmente é que as decisões regionais ou locais são

tomadas com base em variáveis geradas a partir de informações limitadas e

imperfeitas, que resultam em percepções e imagens do mundo de difícil

sistematização. Com efeito, o chamado neopositivismo cientificista e

“reducionista”, cujos trabalhos, conscientemente ou não, faziam uso excessivo e

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muitas vezes inadequado das técnicas quantitativas, alimentava críticas em

relação ao modelo de ser humano que era considerado como o sujeito na

“Geografia Teorético-Quantitativa”.5

A partir da década de 70, surgem duas novas orientações para a

Geografia: a “Geografia Radical ou Crítica” e a “Geografia da Percepção e do

Comportamento Espacial”. As duas correntes que surgem então brotam como

uma reação à suposta “neutralidade” científica da geografia, enfatizada pela

Geografia Teorético-Quantitativa.

A “Geografia Radical ou Crítica” procura mostrar que, de maneira geral,

todas as feições assumidas pela ciência geográfica ao longo da história foram

sempre utilizadas pelo poder político-econômico. Explicita também que existe uma

íntima relação entre ideologia e Geografia, e que o espaço geográfico só poderá

ser compreendido em suas estruturas e processos, a partir do momento em que

for considerado como um produto social, um produto do modo de produção

dominante na sociedade. Assim temos o neomarxismo aplicado à realidade sócio-

espacial sendo definido como paradigma da chamada “Geografia Radical ou

Crítica”.

A outra corrente que surge na década de 1970 é a “Geografia da

Percepção e do Comportamento Espacial” que posteriormente passa a ser

denominada “Geografia Humanística” e que inclui estudos de “Percepção

Ambiental”, constituindo-se numa outra reação à Geografia Teorético-Quantitativa.

Seu pressuposto fundamental é a afirmação de que as pessoas se comportam no

mundo real não a partir de um conhecimento objetivo desse mundo, mas com

base nas imagens subjetivas dele.

4 GEORGE, P. : L’illusion quantitative en Géographie. In: La Pensée Géographique Française Contemporaine – Mélanges offerts au Professeur A. Meynier. Saint-Brieuc, P.U.B., 1972, 716 p. 5 O texto aqui apresentado, a partir deste parágrafo até o final desta seção, foi construído a partir de notas de aula realizadas durante as disciplinas “Evolução do Pensamento Geográfico” e “Teoria da Geografia”, ministradas pelo Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho, respectivamente em Agosto/Setembro de 2001 e

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O suporte teórico-filosófico da “Geografia Humanística” encontra-se na

Fenomenologia e em outras escolas de filosofia crítica. A principal representação

desta corrente se coloca numa interseção entre o geográfico, o psicológico e o

sociológico e tem por objetivo principal o estudo do comportamento espacial de

indivíduos ou grupos sociais. Os “mapas mentais” desenvolvidos por White e

Gould (1974), representam uma importante contribuição metodológica e uma das

técnicas de mensuração dessas percepções e preferências espaciais.

A convivência até certo ponto pacífica dessas duas correntes de

pensamento geográfico, observada durante toda a década de 70, não se

sustentará e a partir do início da década de 80, quando começam a haver conflitos

mais explícitos entre as duas correntes geográficas.

Ambas as orientações surgem da crítica à “Geografia Teorético-

Quantitativa”, que vinha prevalecendo desde a década de 1950. Esta crítica

começa a perder força na medida em que avanços tecnológicos fortalecem as

análises quantitativas e o mapeamento digital passa a se constituir como uma

base confiável e até necessária para estudos de diversas correntes da ciência

geográfica.

Outra razão que faz com que as duas correntes entrem em choque é a

forma essencial em que diferem seus métodos e técnicas, os fundamentos

filosóficos e, sobretudo, os objetivos da Geografia Radical e da Geografia

Humanística (que vai incluir os estudos perceptivos).

Estes estudos perceptivos e humanísticos sofrem severas críticas da

corrente radical que denunciam uma tendência para o psicologismo, apresentando

explicações que questionam ou obscurecem as estruturas sociais e econômicas

que agem de maneira independente do indivíduo, que é sujeito passivo frente a

elas. Esta individualização subjetiva da explicação seria inaceitável, pois traria

Agosto/Setembro de 2002, e da disciplina “Métodos de Análise Espacial” , ministrada pelo Prof. João

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implícita em si, uma negação da crença na validade de soluções de caráter mais

global.

A “Geografia Humanística” por sua vez questiona o que poderia ser

considerado como um “Reducionismo Econômico” comumente chamado de

“Economismo”. Este “Reducionismo” tem suas raízes na importância central

atribuída à economia política no âmbito do Marxismo estrutural, que evidenciaria

uma tendência a classificar o mundo, suas relações e seu processo de evolução

apenas em termos de categorias econômicas. O conceito mais recente da

“sabedoria popular ou vernacular” nos processos observados ou estudados pode

ser considerado como incompleto e subjetivo. A importância prática do

conhecimento da experiência cotidiana vivida, por exemplo, é ignorada em favor

da lógica da estrutura econômica. Argumentos estruturalistas desse tipo não

encontrariam suporte nas evidências dos estudos geográficos.

Estas críticas chamam a atenção para o fato de que tentar fazer

coincidir toda a profundidade da experiência social com os mecanismos de

estruturas econômicas fundamentais, é apresentar uma visão empobrecida dos

domínios social, cultural e político da vida em si.

As limitações colocadas pelas geografias locais e por resistências de

espaços e paisagens cujas feições foram padronizadas em função de parâmetros

pré-determinados, fortalecem as críticas de que o discurso neomarxista não seria

capaz de produzir paisagens à sua vontade, uma vez que, na realidade cotidiana,

ele seria forçosamente obrigado a respeitar tais limitações e condicionantes pré-

estabelecidas.

Análises do tipo estruturalista comumente apresentam conflitos com a

realidade geográfica circunstancial e com a imponderabilidade inerente aos

sistemas complexos regionais. A ênfase na unidade e coerência da lógica das

Francisco de Abreu, Phd. no Programa de Tratamento da Informação Espacial, PUC/MG.

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teorias puras quase sempre aponta para um alto grau de abstração, geralmente

determinando um distanciamento entre a teoria em seu estado puro e referências

históricas ou geográficas em particular.

As relações entre teoria e estudos empíricos e a própria extensão das

teorias à realidade empírica é algo difícil de ser realizado. As tentativas que têm

sido feitas resultam, muitas vezes, na imposição forçada dessas teorias à

realidade histórica. A teoria pura, que busca determinar tudo a partir de si mesma,

geralmente cai diante de parâmetros e situações externas não consideradas “a

priori”.

As divergências teórico-metodológicas das diversas correntes da

ciência geográfica, em verdade, deveriam ser tomadas como complementares.

Uma tendência natural deveria ser a superação das fronteiras entre as diferentes

disciplinas e orientações da disciplina, tal como elas se apresentam, e sua

unificação numa espécie de grande “Economia Política Regional”, como sugere E.

Soja .6

O aprofundamento e a ampliação de um movimento neopositivista da

análise espacial na Geografia não necessariamente conduziriam ao

desaparecimento desta, como disciplina e como campo de reflexão, dotada de

autonomia e de independência. Para tanto seria necessário que uma abordagem

“diagonal” e abrangente pudesse ser realizada, tendo como base fundamental a

cartografia digital onde a extensão da teoria à realidade e a conseqüente

validação empírica das categorias teóricas, assim como a quantificação,

pudessem contribuir para o estudo de fenômenos geográficos teóricos, empíricos

e/ou quantitativos. Na verdade o caráter transdisciplinar da Geografia é benéfico e

a valida como “ciência de prestígio” sem necessariamente a transformar em

“super-disciplina” ou que exija que ela seja renomeada como “ciência espacial”, ou

“análise espacial”.

6 Soja, Edward. Postmodern Geographies: The Reassertion of Space in Critical Theory. London: Verso, 1989.

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As idéias humanísticas na Geografia, em tese, não funcionariam como

uma alternativa proposta pelos espacialistas neo-positivistas de um lado, ou pelos

radicais estrutural-marxistas de outro, todas funcionariam como possibilidades que

pudessem satisfazer algumas expectativas mais essenciais como, também, não

conduziriam os estudos geográficos a impasses de difícil superação e, em certos

casos, até à auto-extinção.

Frente ao até aqui considerado, o autor acredita que, ao contrário, a

Geografia não é uma ciência de síntese, mas está na encruzilhada entre as

ciências naturais e sociais. Assim a proposição de novas formas ou maneiras de

se abordar uma determinada região ou qualquer outro fato geográfico torna-se

necessariamente o objeto primordial da ciência Geográfica.

Com efeito, os estudos em que os valores e as percepções individuais e

de pequenos grupos são levados em consideração, na descrição e na procura da

explicação da organização dos espaços e paisagens, tornam-se tão importantes

quanto a observância de postulados teóricos estruturantes, a quantificação de

determinados parâmetros ou comportamentos e o mapeamento digital dos

fenômenos observados e dos estudos realizados.

As considerações até aqui realizadas são importantes para que seja

estabelecido um amparo teórico-metodológico para um trabalho realizado no nível

de análise regional. Ao contrário, como já colocado, o autor acredita que a

Geografia não parece ser uma ciência que tenha por objetivo uma síntese muitas

vezes reducionista, mas sim, como também colocado anteriormente, uma ciência

“carrefour”, que se coloca confortavelmente na encruzilhada entre as ciências

naturais e sociais. Assim, a observação, mesmo que de alguns aspectos apenas,

da dinâmica de uma determinada região pode, ainda que timidamente, relacionar

um instrumental analítico que toque os aspectos quantitativos, naturais e sociais

próprios de uma ciência de ligação como a Geografia.

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Pelo final da primeira metade do século XX, vários trabalhos de

geógrafos anglo-saxões tratavam do tema geografia regional, embora sem uma

preocupação de sistematizá-la. Também por esta mesma época, já tomava força a

corrente chamada à época de “Nova Geografia”, formada principalmente por

geógrafos Americanos, que procurava alterar os caminhos da geografia,

introduzindo conceitos matemáticos, computacionais e estatísticos como auxílio

para a explicação dos fenômenos geográficos.

A chamada revolução quantitativa busca na verdade novos modelos e

novas teorias que explicassem certos fenômenos geográficos um tanto complexos

para serem medidos sem o auxílio de uma nova metodologia que pudesse,

através de modelos abstratos e medidas computacionais, contrapor o Espaço

Absoluto e o Espaço Relativo.

Um dos primeiros exemplos de elaboração de mapas temáticos para

realização de análise espacial, se deu através da ação do médico Inglês John

Snow em 1854, na cidade de Londres. Durante um surto de Cólera naquele ano,

Snow construiu mapas temáticos a partir de informações coletadas sobre a rede

de distribuição de água potável, do trajeto das redes de esgoto, da localização de

ocorrências da doença e da localização dos óbitos.

Um dos mapas elaborados por Snow mostra a localização relativa das

mortes ocorridas no espaço de tempo entre 12 de agosto e 30 de setembro de

1854, no sub-distrito de Soho e a posição dos poços de fornecimento de água nas

proximidades. A espacialização das informações possibilitou a identificação de um

dos poços na Broad Street como o foco de transmissão da doença. Seu

fechamento contribui de maneira definitiva para a debelar a doença, além disto,

este caso forneceu uma evidência empírica para a hipótese de que o Cólera

poderia ser transmitido pela ingestão de água contaminada.

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Este parece ser um caso típico onde a simples listagem dos casos, dos

óbitos e do sistema de abastecimento não proporcionariam uma visualização do

problema senão pela sua espacialização. Neste caso temos um exemplo de

análise espacial, obviamente, não assistida por meios computacionais o que

somente vai acontecer a partir do final da primeira metade do século XX.

Um grupo formado por universidades do meio-oeste Americano, a partir

da década de 1950 e representado principalmente pelo Grupo de Washington e

pela Escola de Chicago, começa a apresentar uma nova metodologia de análise

espacial realizada através de cartografia digital e se utilizando de métodos

quantitativos.

Estas escolas contam com importantes geógrafos dedicados então á

realizarem mudanças profundas na forma de abordagem da geografia através da

geração de modelos de análise espacial. Entre estes geógrafos podemos destacar

Waldo Tobler, Richard Morril, John Nystuen, William Garrison, Peter Gould, Leslie

King e Brian Berry. Além destes poderíamos destacar Torben Hägerstrand com o

seu modelo de difusão chamado de “têmporo-geográfico” da sociedade com o

propósito de orientar políticas de planejamento urbano e regional bem como o

problema da localização em geral.

Dentre os geógrafos americanos do Grupo de Washington poderíamos

destacar os nomes de Waldo Tobler e John Nystuen pela sua revolucionária

contribuição para a geografia contemporânea, em especial no campo da análise

espacial e da cartografia analítica. Nystuen criou a chamada “matriz de relações

dimensionais”, que integra as relações matemáticas e geográficas e acaba por

definir os conceitos clássicos de direção, conectividade, distância e associação

funcional. (Nystuen, J., 1963)

Tobler gerou seu primeiro mapa digital em 1959 que continha o

contorno dos Estados Unidos da América, este foi publicado num artigo

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denominado “Automation and Cartography” da revista “Geographical Review”

deste mesmo ano.

Sua abordagem para análise espacial se baseava em dois modelos

matemáticos a saber: The Gravity Model (O Modelo Gravitacional) e The Wind

Model (O Modelo de Vento). Na sua abordagem se um eventual imigrante é

“jogado ao ar” ele seguirá uma certa tendência de deslocamento migratório, a esta

tendência Tobler chamou de “Wind” (vento) (Tobler, W. 1975). Seu foco era

principalmente no problema da simetria do modelo gravitacional o qual ele tentou

resolver através da introdução da noção de do “vento” visando alcançar uma

interação em direções específicas. Esta abordagem facilita a análise de matrizes

de grande fluxo na medida em que analisa as partes assimétricas das tabelas

geradas pelo modelo.

Os trabalhos destes geógrafos acabam por dar sustentação teórica ao

que se passou a chamar de análise espacial através de cartografia digital ou

Cartografia Analítica. Sua importância e relevância crescem a partir deste

momento tendo como ferramenta principal os chamados Geographic Information

Systems-GIS ou Sistemas de informação Geográficos-SIG, que é capaz de dar

suporte ao processo decisório dentro do planejamento estratégico em qualquer

nível.

Apesar de, numa maneira geral, a ciência geográfica ter apresentado

uma rica discussão no que diz respeito à geografia regional, observa-se então já

ao final da década de 1960 e começo da década de 1970 um distanciamento entre

a produção geográfica da escola Francesa e da escola anglo-saxônica.

Em seu texto de 1972, “Por uma teoria da Geografia Regional” 7 o

geógrafo francês Roger Brunet, então na Universidade de Reims, denuncia a falta

de uma preocupação, por parte dos geógrafos franceses, em desenvolver uma

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teoria sobre a geografia regional. O que há na verdade é uma produção geográfica

que, segundo Brunet, conduz a duas situações limite (BRUNET, 1972):

♦ a primeira seria uma pretensão ao enciclopedismo, a acumulação de

fatos por si sós, o que seria contrário a uma atitude científica;

♦ a segunda se configura como uma pretensão de se usar a cartografia

com o objetivo de abarcar todo o espaço terrestre.

Estas duas situações limite acima descritas seriam originadas a partir

do estudo geográfico exaustivo gerado pela idéia da continuidade do espaço.

Estes fatos são um indicativo da carência de uma teoria que seja adequada ou

específica para que a noção de região se torne um conceito científico. Assim seria

necessário que houvesse uma formulação clara de seus sentidos, de seus

critérios e de sua natureza. O estabelecimento de regiões passa a ser uma técnica

geográfica, um meio para a demonstração de uma hipótese e não mais um

produto final de pesquisa.

À crítica da noção de continuidade se segue a formulação de uma

teoria que postula que a região, como objeto do estudo geográfico, na verdade

seria descontínua por excelência o que se daria por uma série de fatores que se

seguem:

♦ a presença de fronteiras políticas artificiais e impostas por conflitos

políticos. (exemplo: I e II Guerras Mundiais, alterando fronteiras na

Europa);

♦ os espaços geográficos seriam, muitas vezes, disjuntos. (exemplo: a

presença de montanhas e estuários interrompe uma região);

♦ a existência de regiões e seus limites. A região é a própria expressão

da descontinuidade na geografia.

7 BRUNET, Roger. In: La Pensée Géographique Française Contemporaine – Mélanges offerts au Professeur

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A região concebida como um conjunto é uma realidade viva e

descontínua, pois mesmo em regiões aparentemente homogêneas a presença da

descontinuidade é visível. Podem-se tomar como exemplos as regiões agrícolas,

regiões comerciais, regiões industriais, regiões urbanas, etc. Mesmo quando

considerada uma região funcional como, por exemplo, uma região tipicamente

agrícola ou um bairro com uma forte tendência à especialização (moda, hospitais,

serviços públicos), apresentam descontinuidades. (BRUNET, 1972)

Assim Brunet distingue as descontinuidades:

♦ Descontinuidades Dinâmicas: presentes nas evoluções consideradas

em seu aspecto temporal;

♦ Descontinuidades Espaciais: identificadas em muitas diferenciações

que se dão em termos de regiões, áreas ou paisagens;

♦ Descontinuidades Exógenas: resultam de uma perturbação

provocada do exterior;

♦ Descontinuidades Endógenas: resultam de perturbações que

aparecem sem perturbações exteriores. (BRUNET, 1972)

Também na Teoria Geral dos Sistemas BRUNET encontrará respaldo

para desenvolver sua idéia de descontinuidade. Em seu texto de 1972, o autor

relaciona certos conceitos típicos de sistema:

• As regiões são estruturas , definidas pelas relações entre seus

componentes, e não pelo território sobre o qual as estruturas se

inserem. Uma estrutura define-se por elementos tais como :

• posição;

• ambiente natural;

• economia;

A. Meynier. Saint-Brieuc, P.U.B., 1972, 716 p.

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• estratificação social;

• comportamento demográfico;

• configuração do sítio;

♦ A estes elementos se adicionam as relações horizontais :

• de lugar para lugar;

• de pessoa para pessoa (relações interpessoais);

• de subsistema para subsistema (cultural, social, financeiro, etc.);

Estas relações, definidas assim por Brunet, refletem o estado do

sistema. Um sistema regional possui uma série de estruturas ou formas de

energia, que se comportam de maneira interdependente. Mesmo quando um

sistema possui uma determinada estabilidade, não significa de maneira alguma

que este sistema regional possa ser definido como um sistema estático.

As estruturas regionais ou “formas de energia” são:

♦ recursos locais;

♦ força de trabalho;

♦ informação;

♦ investimento de capital.

O comportamento destas estruturas também pode ser considerado

como sistêmico, pois qualquer modificação em uma delas provoca conseqüências

imediatas nas outras. Seu arranjo forma uma estrutura complexa que só se

mantêm unida através de uma série de mecanismos de controle e auto-regulação.

Nenhuma região geográfica pode ser considerada, de fato, como

isolada. O arranjo estrutural de uma região e o conhecimento de seu balanço das

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trocas de energia é fundamental para a compreensão de sua estrutura e de sua

evolução regional. Novamente o comportamento sistêmico é observado, uma vez

que os arranjos estruturais complexos, a produção e as trocas de energia

implicam necessariamente em mobilidade, o que acaba por determinar que as

estruturas regionais sejam móveis em todos os sentidos.

Os estados de equilíbrio são por definição, provisórios. Como numa

célula, o estágio homeostático é sempre perseguido, desfazendo-se assim que o

equilíbrio celular é atingido. Estas estruturas existem entre dois limiares, a saber:

precisam de certa união, mas ao mesmo tempo a existência de tensões provoca a

sua ruptura, quando são então substituídas por novas estruturas. Este conceito

pode ser aplicado às regiões.

O autor traz neste ponto a noção de limiares e ruptura. O conceito de

limiar é bastante explorado por Brunet e suas definições dos diversos tipos de

limiares são determinantes para a sua Teoria da Descontinuidade. Estes limiares

se definem de maneira espacial e temporal, podendo imprimir ao estudo regional

um alto grau de subjetividade e exigindo um conhecimento prévio das estruturas

regionais, cabendo ao geógrafo responder até que ponto a totalidade do espaço

resulta em um esquema estrutural.

Os limiares se configurariam como o limite, espacial ou temporal, onde

um fenômeno cessa seu comportamento “normal” e passa a se comportar de

maneira diferente. Esta passagem de estado ou estágio sejam eles temporais ou

espaciais, é que determina uma descontinuidade sistêmica, Brunet a define como

uma ruptura.

Assim, os limiares são definidos como limiares de:

♦ manifestação: a partir de certo ponto o fenômeno se manifesta

abruptamente (exemplo: desencadear do fenômeno da erosão);

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♦ extinção: a partir de certo ponto, o fenômeno cessa bruscamente

(exemplo: certos limiares demográficos para a manutenção de

determinados serviços ou limiares de distâncias, a partir dos quais

deixam de ocorrer migrações para certas cidades);

♦ desaceleração: a partir de certo ponto, um movimento se desacelera

(exemplo: desacelerações em curvas demográficas e econômicas)

♦ inversão ou oposição: a ruptura é tão forte que o movimento muda de

sentido (exemplo: evolução bolsas de valores);

♦ saturação: presença excessiva de certa quantidade desencadeia

mudanças. (exemplo: limite de infiltração de água de um dado solo.

Além deste limite podem-se, por exemplo, desencadear deslizamentos).

A ruptura, segundo Brunet, seria o resultado de uma longa preparação,

e, assim, é a própria continuidade que seria responsável pela criação da

descontinuidade. Assim, também, o autor define uma série de princípios que

deveriam, teoricamente, presidir o aparecimento dos limiares e as próprias

rupturas.

♦ princípio da interação: uma ruptura seria o resultado de interações

entre vários fatores que reagiriam uns sobre os outros;

♦ princípio do catalisador: uma descontinuidade freqüentemente se

manifestaria após a intervenção de um catalisador. As condições de

ruptura já se mostrariam presentes e a presença do catalisador a

precipitou;

♦ princípio do ponto fraco: a ruptura ocorreria sempre em pontos de

menor resistência;

♦ princípio da evolução: após uma ruptura se seguiria um novo período

de evolução lenta ou “normal”.

Brunet conclui que a comparação das estruturas regionais é um tema

essencial de pesquisa, pois a região não é uma construção artificial para o

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pesquisador, e, se ela pode ser interpretada em termos de regularidades espaciais

e de fluxos de energia, ela se torna suscetível de abstração e permite a

elaboração de modelos rigorosos.

Observamos que a Teoria da Descontinuidade de Roger Brunet é

essencial para o estudo de problemas regionais, assim como a teoria do Lugar

Central de W. Christaller8 pode ser também de grande valia na medida em que

define um sentido hierárquico para os assentamentos humanos, numa rede

geográfica regional, que pode determinar variações nas estruturas complexas ou

nos fluxos de energia regionais. Mesmo considerando uma diferença importante

entre estas duas teorias, sendo a teoria das descontinuidades uma teoria geral da

geografia e a Teoria dos Lugares Centrais uma teoria de geografia humana ou

econômica, ambas tem muito a contribuir como fundamentação para um trabalho

de análise regional.

Apesar de observamos, na Teoria dos Lugares Centrais, uma forte

tendência de fundamentação do seus conceitos em modelos teóricos puros, ela

trabalhará com o conceito de alcance e o conceito de limiar , no caso aqui, de uma

mercadoria ou serviço. Os sistemas e redes observados nesta teoria geram alguns

princípios e arranjos espaciais associados a eles que são descritos por um valor

denominado K, quais sejam:

♦ O Princípio de Mercado K = 3

♦ O Princípio do Tráfego K = 4

♦ O Princípio Administrativo K = 7

Apesar de determinar uma rede hierarquizada de assentamentos

humanos, a partir do alcance e limiar maiores ou menores dos princípios

relacionados acima, o modelo puro que resulta desta teoria, apesar de

comprovado prática e empiricamente, de maneira geral não se aplica a, por

8 CHRISTALLER, Walter. Central Places in Southern Germany. , 1933 230 pp.

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exemplo, sítios geográficos com certas características específicas. O modelo de

Christaller jamais poderia ser testado, por exemplo, pelo menos não em sua

essência original, em relevos acidentados já que parte do pressuposto de que o

modelo se assenta numa planície uniforme. Também não considera diferenças no

poder aquisitivo da população estudada, o que excluiria imediatamente todos os

países chamados subdesenvolvidos.

Estes princípios definidos na teoria do Lugar Central procuram

estruturar e analisar uma rede geográfica regional dando a ela um sentido

hierárquico e classificando os centros humanos a partir de sua variação

demográfica de suas funções e de sua localização relativa no espaço. Estes

princípios são especialmente importantes no que toca os conceitos de regiões

polarizadas e/ou funcionais, além de servir como fundamentação básica para a

realização de estudos regionais, principalmente quando estes tendem a relacionar

indicadores demográficos e indicadores econômicos, por exemplo, como neste

trabalho que envolve a análise de um pólo regional.

Além das teorias aqui relacionadas, também podemos verificar que

certos princípios e conceitos da geografia são também muito importantes para um

estudo regional. Os princípios da conexão, da diferenciação de áreas e da

sucessão assim como os conceitos clássicos de Geografia Urbana de Sítio e

Posição (Situação) apresentados por Pierre George em seu texto de 1969

Cidades e Condições Naturais 9, se mostram como fundamentais para o estudo

que ora se realiza.

Em seu texto George estabelece a importância da descrição do

ambiente natural para o estudo das cidades. Os estudos das relações geográficas

criadas entre o meio natural e as cidades são definidos como tarefas essenciais

da Geografia e apresentam duas escalas diferentes, a regional e a local. As

9 “Villes et conditions naturelles”, extraído de: GEORGE, Pierre. Précis de Geographie Urbaine. Paris, P.U.F., 1969, 289 p. (p. 38 a ???).Tradução para o Português feita pelo Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho.

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relações definidas pelo conceito de Posição têm a ver com a escala regional

enquanto que as definidas pelo conceito de Sítio dizem respeito à escala local.

Diz Pierre George em seu texto10,

“(...)A posição pode se definir como a localização da

cidade em relação a fatos naturais susceptíveis11, no

passado e no presente, de exercer uma influência em seu

desenvolvimento, o qual, por sua vez, está ligado à

facilidade de sua polarização. Trata-se, portanto, de uma

noção de valor relativo, que se exprime em função de

fatores circunstanciais de urbanização e de

desenvolvimento urbano”(GEORGE, 1969).

“(...) O sítio se define como o quadro topográfico no qual

se enraizou a cidade, ao menos em suas origens. Às

vezes, uma cidade pode ter gravitado, durante seu

desenvolvimento, em tomo de vários sítios, seja

homólogos, seja, ao contrário, diferentes e, assim,

respondendo a necessidades de ordens diversas”

(GEORGE, 1969).

“(...) As duas noções estão ligadas, na medida em que as vantagens do sítio permitem valorizar a posição: um sítio defensivo que protege uma posição comercial, por exemplo. Mas, o papel do sítio pode ser atingido pela caducidade, enquanto a posição pode conservar todo seu interesse ( ... ). Em certos casos, o sítio envelhecido pode constituir um entrave ao desenvolvimento da cidade, que tende a se expandir para além do sítio original: um bom exemplo é o das cidades que, como Atenas, abandonaram sua acrópole e se estendem no sopé de

10 Idem. 11 Nota do Autor. Apesar da afirmação de GEORGE, os “fatos naturais” se constituem apenas como um dos aspectos da noção de posição.

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sua antiga fortaleza que possui, hoje em dia, um valor apenas arqueológico ( ... ).0 valor do sítio envelhece muito mais depressa que o da posição porque o primeiro é mais estreitamente ligado a técnicas específicas de utilização do espaço. Sua importância na configuração da cidade é conseqüência do papel que ele tem desempenhado na história de seu desenvolvimento morfológico. 0 problema geográfico fundamental da geografia urbana é um problema de geografia da circulação12. Qualquer que seja a atividade preponderante da cidade, ela está subordinada às facilidades de deslocamentos de homens e de mercadorias ( ... )” (GEORGE, 1969).

Outro conceito de importância apresentado por George é o conceito de

Posição de Entroncamento ou “Carrefour”. “(...) Uma das condições mais propícias à continuidade do desenvolvimento da cidade é a posição de entroncamento . A convergência de vias de circulação, favorecendo os transportes mais baratos, é um fator de desenvolvimento de mercados. (...) A vocação comercial implica, pelo menos no começo, um processo de convergência. Seu progresso e sua estabilização demandam, por outro lado, um ato político (...) de centralização administrativa” (GEORGE, 1969). As condições naturais geralmente são “exploradas pela construção de

redes de transporte e de circulação, readaptando a função Carrefour a cada novo sistema de relações, isto é, as estradas e os canais primeiro, as vias férreas a partir de meados do séc. XIX, atualmente as redes de auto estradas ” (GEORGE, 1969).

A importância do estudo da Localização, indo mais além do que a

simples identificação da posição geodésica dos lugares, como enfatizava Vidal De

La Blache desde o começo do século passado, é evidente nos estudos regionais.

Estudos de Localização, uma vez desenvolvidos a partir da análise dos conceitos

de Sítio e Posição permitem que sejam determinadas as diversas estruturas dos

sistemas que regem o espaço regional.

12 Nota do Autor. Esta Noção de circulação incluiria hoje, as principais formas, intensidade e direções dos vários tipos de fluxos inter-urbanos ou urbano-regionais.

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Os conceitos de Sítio e Posição13, acima relacionados, juntam-se aos

conceitos de hierarquia, relacionados por Christaller14, e de descontinuidade,

abordado por Roger Brunet em 1972, para neste estudo, servir como

fundamentação para um estudo regional que trata, basicamente, da região com

menores índices de desenvolvimento da região Sudeste Brasileira, a Mesorregião

Expandida do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri.

A maior parte desta região estudada se localiza no estado de Minas

Gerais, mas a análise aqui proposta se entende também pelo sul do Estado da

Bahia e norte do Estado do Espírito Santo. Apesar da divisão política e

administrativa que hoje esta região apresenta, ela tem se comportado em sua

grande maioria, mesmo historicamente, como una. As diferenças ou

descontinuidades exógenas e temporais, são relacionadas aqui como parâmetro

para uma análise das diferenças internas que devem estabelecer um padrão

observável na análise dos índices de desenvolvimento humano ao longo da última

década.

Este é o objetivo deste estudo que se segue com uma caracterização

geral da região no próximo capítulo.

13 “Villes et conditions naturelles”, extraído de: GEORGE, Pierre. Précis de Geographie Urbaine. Paris, P.U.F., 1969, 289 p.Tradução para o Português feita pelo Prof. Dr. Oswaldo Bueno Amorim Filho 14 CHRISTALLER, Walter. Central Places in Southern Germany. , 1933.

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Capítulo II

Contextualização Histórica e Regional

Minha Gente (Sagarana)

João Guimarães Rosa

“Cavalgamos. Subimos. Subir mais. Agora, um lançante contínuo, serra avante em lombo

longo, escalando o espigão. E, pronto, o mundo ficou ainda mais claro: a subida tinha

terminado, e estávamos em notáveis altitudes.

Estalava em redor de nós uma brisa fria, sem direção e muito barulhenta, mas

que era uma delicia deixar vir aos pulmões. E a vista se dilatara: léguas e léguas batidas,

de todos os lados: colinas redondas, circinadas, contornadas por fitas de caminhos e

serpentinas de trilhas de gado; convales tufados de mato musgoso; cotilédones de outeiros

verde crisoberilo; casas de arraiais, igrejinhas branquejando; desbarrancados vermelhos;

restingas de córregos; píncaros azuis, marcando no horizonte uma rosa-dos-ventos; e mais

pedreiras, tabuleiros, canhões, canhadas, tremembés e itambés, chãs e rechãs.”

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2.1. Contextualização Regional

A região que compreende a bacia hidrográfica e a Mesoregião

Expandida dos Vales do Rio Mucuri, do Rio Jequitinhonha e do Rio São Mateus,

está geograficamente localizada nas porções nordeste do estado de Minas Gerais,

extremo sul do estado da Bahia e extremo Norte do Espírito Santo. Esta região

tem sua história de ocupação muito intimamente ligada ao eixo principal dos leitos

destes rios, mas principalmente do Rio Mucuri.

Fonte: Instituto Mineiro de Gestão das Águas - IGAM

Mapa 01 – Unidades de Planejamento das Bacias do Ri o

Jequitinhonha e Mucuri

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MAPA 02 – Municípios da Mesorregião Expandida do Va le do Jequitinhonha

e do Mucuri – 2000

Sua ocupação se dará de maneira tardia porquanto suas vastas

dimensões se encontravam, até meados do século XIX, completamente cobertas

pela Mata Atlântica e habitadas por nações indígenas, que em sua maioria sempre

se mostraram extremamente hostis à colonização branca. Nesta época, até 1889,

a Província de Minas Gerais estava dividida em comarcas e termos. No caso do

hoje Estado de Minas Gerais suas comarcas eram cinco como se seguem: Rio

das Mortes, Vila Rica, Sabará, Paracatu e Serro Frio. A comarca do Serro Frio era

subdividida em dois termos: Serro, com capital em Vila do Príncipe, que

funcionava administrativamente como a capital de toda a comarca, e Minas Novas,

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com sua capital na Vila do Fanado, ao qual pertencia toda a porção ainda virgem

da bacia do Mucuri e parte da bacia do São Mateus.15

Apesar das diversas expedições realizadas na região desde o século

XVI, foi somente durante o século XVIII que a comarca do Serro Frio observará

certo desenvolvimento. Além das dificuldades representadas pela floresta e pelos

índios, a descoberta tardia de jazidas de ouro e diamante na região faz com que o

seu desenvolvimento se dê apenas a partir do século XVIII, principalmente na

cidade de Diamantina, que permanecerá como o mais importante centro regional

até fins do século XIX.

Seu desenvolvimento não se dá de maneira diferenciada das demais

regiões da província, com toda a sua atividade agrícola de subsistência voltada

para a sustentação da atividade principal de mineração. Como a atividade

agropecuária só se revelará como uma opção viável de investimentos em meados

do século XIX, seu isolamento geográfico e social limitará fortemente a sua

capacidade de expansão e desenvolvimento.

Esta dificuldade de expansão e desenvolvimento constatada pelos

cidadãos do Serro se caracterizava, por um lado, pelo interesse da classe

dominante e mineradora de Diamantina na manutenção de uma produção voltada

principalmente para a sustentação de sua atividade e, por outro lado, pela

impossibilidade de alcançar o litoral através da densa Mata Atlântica povoada

pelos índios.

A região do sul de Minas já se configurava como importante centro

produtor e fornecedor de produtos para a Corte no Rio de Janeiro, mais

especificamente a partir de 1808 com a chegada da família real ao Brasil. As

regiões do Norte e Nordeste de Minas permaneceram isoladas e dependentes do

centro-sul da província no que diz respeito à entrada e saída de produtos. A

15 SAINT-HILAIRE, August. Viagens pelas Províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Belo Horizonte:

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existência de dois importantes entrepostos atacadistas, São João del-Rei e

Barbacena, que regulavam a atividade de distribuição e comercialização para a

corte, fazia com que a produção do Norte e Nordeste de Minas apresentasse um

preço final de venda bem mais elevado. Na verdade, até meados do século XIX,

uma estrada aberta em 1728 pelas autoridades coloniais e que ligava Minas

Novas à então chamada Vila Rica, era a única ligação entre essa região e o Rio

de Janeiro. Este quadro de isolamento e dependência da região se configurará

como o principal motivo do desbravamento das matas do Mucuri e São Mateus.16

Figura 01 – Um caminho para o mar – Ilustração de P ercy Lau 17

Em 1836, o engenheiro e explorador Pedro Vitor Renault é designado

pelo governo da província para realizar uma expedição a fim de determinar um

local adequado para receber uma “colônia de degradados”, o que hoje seria algo

próximo de uma penitenciária. Chefiando o grupo, o engenheiro sai de Sabará e

cerca de trinta dias depois chega a Minas Novas. Prepara a expedição e vai,

através das poucas picadas existentes, até às fronteiras dos territórios

Itatiaia/USP, 1975, pp. 153-5. 16 Para informações a respeito da atividade econômica nesta região, ver, SOUZA, José Moreira de. Serro e Diamantina na Formação do Norte Mineiro no Século XIX.

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conhecidos. Quando ainda procurava um local adequado para o assentamento da

colônia, recebe ordens do governo provincial para que explorasse o rio Mucuri.

Renault assim o faz de maneira muito precária, já que não tinha se preparado

especificamente para aquele tipo de empreitada.18

Segundo seu relatório ele desce o rio com um grupo de sete soldados,

quatro índios “mansos” e um “língua”, ou intérprete. O grupo só conseguiria chegar

à foz do rio depois de cerca de 15 dias de viagem, enfrentando todos os perigos

de uma mata atlântica povoada por índios hostis, infestada de insetos, animais

selvagens e até passando fome, já que ,no trajeto, uma das canoas que carregava

suprimentos foi a pique depois de uma emboscada de um grupo de guerreiros

indígenas

Figura 02 – Canoas no Rio Mucuri – Ilustração de Pe rcy Lau 19

17 In CHAGAS, Paulo Pinheiro, 1906 - Teófilo Ottoni – Ministro do Povo – 4. ed. rev. aum. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1982. pg 243. 18 Texto realizado a partir da leitura e compilação do relatório da expedição do Engenheiro Vitor Renault. RENAULT, Pedro Victor. Relatório da Expedição dos Rios Mucury e Todos os Santos. 1837 (Biblioteca Virtualbooks/ Documentos Históricos do Brasil, Transcrição realizada em 1998, por João Carlos Renault). http://virtualbooks.terra.com..br/doc_historicos/doc_historicos_mucury.htm 19 In CHAGAS, Paulo Pinheiro, 1906 - Teófilo Ottoni – Ministro do Povo – 4. ed. rev. aum. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1982. pg 147.

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Apesar de Renault ter provado a navegabilidade do rio Mucuri, fazendo

anotações e registros com instrumentos precisos, sua expedição se deu no mês

de setembro, época em que a região observa seu período de chuva e seus rios e

córregos estão consideravelmente cheios, nada se podendo afirmar sobre a época

da seca. Em seu relatório de 1837, apesar de atestar a navegabilidade do rio,

Renault explicita que repetidas vezes foi necessário prosseguir a viagem por terra

por causa de cachoeiras em alguns pontos do leito do Rio Mucuri.

Este relatório atestando a navegabilidade do rio certamente vai

funcionar como catalisador para a empreitada realizada pelo político e empresário

Teófilo Ottoni a partir de 1848, no sentido de desbravar os sertões do Mucuri e

prover a província de Minas Gerais com uma saída para o mar. A figura deste a

quem podemos denominar de “bandeirante moderno”, como o chamou o

historiador Godofredo Ferreira, é de extrema importância para a formação,

colonização e consolidação da região objeto deste estudo.

Theófilo Benedicto Ottoni nasceu em 27 de novembro de 1807 na então

Vila do Príncipe, hoje a cidade mineira do Serro no termo de Minas Novas. Chega

ao Rio de Janeiro e ingressa na Academia da Marinha Imperial em 1826 e apesar

da promissora carreira e excelente oportunidade de estudo e formação, Ottoni dá

baixa da Academia já em 1828 para seguir seus instintos e inclinações políticas,

alinhando-se ao grupo de Liberais Moderados, chefiado por Evaristo da Veiga,

diretor do jornal “Aurora Fluminense”.20

20 Texto construído a partir da leitura dos livros CHAGAS, Paulo Pinheiro. Teófilo Ottoni: ministro do povo. Belo Horizonte: Itatiaia; Brasília: INL, 1978, CARVALHO, Gonzaga de. O revolucionário Ottoni. Belo Horizonte: Editora Gráfica Literatura, 2000, OTTONI, Christiano Benedito. Biografia de Theóphilo Benedicto Ottoni. Rio de Janeiro: Tipografia do Diário do Rio de Janeiro, 1870 e OTTONI, Theóphilo Benedicto. Circular dedicada aos Srs. Eleitores de senadores pela província de Minas Gerais no quatriênio atual e especialmente dirigida aos Srs. eleitores de deputados pelo 20 distrito eleitoral da mesma província para a próxima legislatura. Rio de Janeiro: S/Ed., 1860, além de notas históricas de família.

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Figura 03 – Theóphilo Benedicto Ottoni, “O Luzia” – Visto por Santa Rosa,

1953 – Prefeitura de Teófilo Otoni

Suas ações e atitudes pouco ortodoxas e de fundamentação liberal,

além de sua agressiva atuação política, o levam a sofrer pressões dentro da

Academia Imperial da qual dá baixa e, em 1829, segue de volta para Vila do

Príncipe. Leva consigo, então, uma pequena tipografia de madeira que fará nascer

a “Sentinela do Serro”, jornal de ideais liberais e de caráter politicamente

agressivo, o qual servirá de tribuna política e como garantia mínima de visibilidade

regional na Corte.

No Rio de Janeiro seus artigos são publicados pela Aurora Fluminense

de Evaristo da Veiga, em S. Paulo pelo “Observador Constitucional” de Líbero

Badaró, no “Universal”, no norte do País, e pelo “Baiano”, em Salvador. Elege-se

Deputado Federal em 1838, alinhando-se politicamente de maneira contrária ao

então “Ministério Paranaguá” empossado em 1840, extremamente conservador e

que restabelecerá o Conselho de Estado banido pelo Ato Constitucional de 1834.

Este Ministério cerceará as conquistas autonomistas das Províncias, todo o

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Estado Imperial será reformado de maneira reacionária, resultando na dissolução

da Assembléia Legislativa do Império.

Segue-se assim a revolução de 1842 e Ottoni novamente participa

ativamente, já que se retira para Minas e junta-se aos rebeldes tomando

Barbacena de assalto e derrotando as forças governistas, proclamando assim

José Feliciano de Pinto Coelho (mais tarde será o Barão de Cocais) como

Presidente Interino da Província. Apesar de saírem vitoriosos nas primeiras

batalhas, os insurretos acabam sendo derrotados pelo Duque de Caxias nos

arredores de Santa Luzia. Ottoni é feito prisioneiro, como um dos chefes da

revolução mineira e conduzido com os demais líderes, a pé, até Congonhas e de

lá a cavalo até Ouro Preto, onde ficaram presos por 18 meses, até sua

transferência para Mariana onde enfrentaram um julgamento e foram absolvidos

por um júri popular.

Ottoni regressa ao Rio de Janeiro para receber a anistia geral de 1844

imposta pelo gabinete do Visconde de Macaé. Consegue se eleger novamente

nas eleições de 1845 para Deputado Federal e segue na sua carreira política

como oposição ao regime, ao mesmo tempo em que se associa ao seu irmão

Honório Ottoni para fundar a casa comercial Ottoni & Cia., que acaba por

prosperar e os enriquece.

Agora, além de militar, jornalista, político, tribuno, ensaísta e

revolucionário, Theófilo Ottoni se coloca também na posição de empresário bem

sucedido e se entrega aos estudos do potencial econômico e social do Brasil. Esta

antevisão de um país industrializado e progressista não melhora a situação de

Theófilo Ottoni dentro do regime, pelo contrário, é combatido e isolado pelos seus

inimigos políticos na corte.

Nesta condição, produz diversos estudos, pareceres e relatórios sobre

diversos empreendimentos de grande porte no Brasil, como a proposição da

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criação de diversas estradas que integrassem os estados de Minas, S. Paulo, Rio

de Janeiro e Espírito Santo, do aproveitamento para a navegação do Rio S.

Francisco e do seu afluente, o Rio das Velhas. Todos estes estudos podem ser

tomados como uma pioneira proposição para a criação de uma hidrovia de grande

porte em Minas, a criação de uma ferrovia que interligasse as zonas mineradoras,

em Minas, de ferro e manganês ao porto de Vitória e que hoje se tornou realidade,

o aproveitamento das águas minerais do sul de Minas, além do que devemos

destacar sua importante participação no que se refere às questões de colonização

e emigração.

Na verdade, seu maior feito viria a se fundamentar na questão da

colonização, na sua aversão ao regime escravista e na sua credulidade na livre

iniciativa para a solução mesmo de problemas de grande envergadura.

Ottoni chega à foz do rio Mucuri em 1847, à bordo do vapor “Princesa

Imperial”, na localidade denominada São José do Porto Alegre, hoje o município

de Mucuri, no estado da Bahia e segue para a localidade de “Coroa dos Muris” à

90 km de Cachoeira de Santa Clara (hoje Nanuque), para se encontrar com um

grupo que vinha de Minas Novas, chefiado por parentes e amigos próximos que se

dispunham a ajudá-lo na excursão. Constroem nesta localidade uma primeira

picada, transitável a cavalo, que sai de Santa Clara em direção ao rio Todos os

Santos, afluente do Mucuri.

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Figura 04 – Vapor no Rio Mucuri – Ilustração de Per cy Lau 21

Já nesta ocasião, o grupo se depara com uma cachoeira próxima de

Santa Clara. Os relatórios do engenheiro e explorador Vitor Renault, de 1836,

apesar de atestarem o rio Mucuri como rio de leito todo navegável, agora se

punham à prova. As condições de navegação do rio eram de extrema importância

para a empreitada, já que o objetivo principal era a navegação. O grupo não se

detém frente a este primeiro obstáculo, abre picadas e transpõe morros na

intenção de encontrar outra “Bandeira” que partiu de Minas Novas. Os dois grupos

deveriam se encontrar num lugar chamado “Porto das Canoas” (hoje Francisco

Sá), mas algum acontecimento de natureza desconhecida impediu o encontro,

fazendo com que a “Bandeira” vinda de Minas Novas retrocedesse e acampasse

nas baixadas, às margens do Rio Todos os Santos.

21 In CHAGAS, Paulo Pinheiro, 1906 - Teófilo Ottoni – Ministro do Povo – 4. ed. rev. aum. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1982. pg 161.

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Frente às primeiras dificuldades, Theófilo Ottoni retorna ao Rio de

Janeiro para deliberações com o irmão Honório, mas, devido a complicações de

caráter burocrático, só retornará à carga em julho de 1853. Em 1850, uma série de

reformas sobre a propriedade da terra e a regulamentação de empresas de capital

aberto, além da abolição do tráfico de escravos que, na época, se configurava

como um dos melhores negócios, tornam as condições propícias para a formação

de empresas privadas com acionistas e interesses diversos da pauta oficial.

Figura 05 – Fotocópia de uma ação da Companhia de N avegação Do Mucury

Apesar da morte do irmão e sócio Honório em 1849, Theófilo Ottoni,

aproveitando-se da sólida condição financeira de sua empresa e da força do seu

nome, funda a Companhia de Navegação do Vale do Rio Mucuri, que basicamente

apresentava dois objetivos, a saber: o alargamento da área agrícola e a busca de

uma saída de Minas para o litoral. O crescimento da produção agrícola, tanto da

produção do algodão, quanto de produtos básicos de subsistência, exigia novas

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rotas de transporte capazes de colocar essa produção nos mercados

consumidores de maneira mais rápida e a um custo mais acessível.

Ottoni volta ao Mucuri e toma a chefia da “Bandeira” que sai de Santa

Clara abrindo uma nova picada com inclinação para oeste, alcançando o

acampamento de outra “Bandeira” vinda de Minas Novas no começo de setembro

de 1853. Ali, na confluência do rio Todos os Santos com o ribeirão Santo Antônio,

funda oficialmente os Armazéns Centrais da Companhia de Navegação do Vale do

Mucuri e, segundo uma planta do irmão engenheiro, Christiano Benedicto Ottoni,

funda também um novo povoado, que batiza de “Nova Filadélfia”, em homenagem

ao centro do pensamento liberal Norte Americano.

Figura 06 – Nas baixadas do rio Todos os Santos – I lustração de Percy Lau 22

Já em 1852, Teófilo Otoni havia escolhido o sítio onde iria construir sua

Filadélfia com a “doação” de terras realizada pelos caciques Tímóteo, Potón e

22 In CHAGAS, Paulo Pinheiro, 1906 - Teófilo Ottoni – Ministro do Povo – 4. ed. rev. aum. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1982. pg 173.

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Nincate23. Ali foram construídos os armazéns centrais da Companhia, além de

uma olaria e de uma carpintaria e, à sua volta, também foram plantadas algumas

roças. Apesar de suas convicções liberais, a falta de financiamento oficial força

Theófilo Ottoni a empregar o trabalho escravo, já que trabalhadores livres

contratados inviabilizariam o empreendimento, frente aos altos custos necessários

para o convencimento e alocação de profissionais, que se dispusessem ao

deslocamento até àquele local famoso pelo seu simbólico selvagem e perigoso.

As nações indígenas que viviam no Mucuri então, pelo menos durante o

período em que o diretor da Companhia foi o responsável direto pelos trabalhos,

não seriam utilizadas como trabalho escravo, já que Ottoni decidira que estas

seriam convencidas pacificamente a ajudar ou seriam simplesmente deixadas em

paz. Suas terras eram trocadas com a Companhia e nunca tomadas pela força.

Além de sua iniciativa inovadora no trato com os índios, Ottoni abre também uma

outra frente ousada e considerada, então, como subversiva, que procurava

apresentar um novo método de colonização para a época. A Companhia

recrutava, através de agentes contratados, colonos na Alemanha, Itália, Portugal,

França, Bélgica, Suíça e mesmo na China. Na sua grande maioria eram técnicos e

lavradores, além de engenheiros, comerciantes, carpinteiros e outros.

O acontecimento mais marcante neste período, certamente foi a

tentativa de adaptação à região dos imigrantes europeus da chamada primeira

leva de 1856. Na sua maioria de origem germânica, estes imigrantes tiveram

extrema dificuldade de adaptação àquela região ainda selvagem, de clima

agressivo e com precárias condições de financiamento para os assentamentos de

cada família.

A despeito das dificuldades, Filadélfia, aos poucos, acabou por se

configurar como ponto central das operações da Companhia de Navegação do

Vale do Mucuri, consolidando-se como pólo regional. ”Naquele mesmo ano,

23TIMERS, Frei Olavo (OFM). Thófilo Bendicto Ottoni: notas históricas e chorográficas , págs 20 e 21. Belo

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contava com 144 casas, 14 negociantes de fazendas, molhados, louças e

ferragens. Construíram-se os templos Católico e Protestante, ambos pelo

engenheiro Prussiano Julio Burrow. Já em 1856, com a entrada de mais

imigrantes, a freguesia passa a contar com 5 mil habitantes, entre nacionais e

estrangeiros.” 24

Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1922. 24 Fundação João Pinheiro, A Colonização Alemã no Vale do Mucuri, Coleção Mineiriana, Belo Horizonte, 1991, p. 61.

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Figura 07 - Vista da cidade de Teófilo Otoni em 186 0 – Aquarela de Albert Schirmer, Prefeitura de

Teófilo Otoni

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Frente a estas considerações, em 1857, o centro urbano de Filadélfia já

contava com 5.000 pessoas além de ser dono da primeira estrada de rodagem

construída no Brasil: 30 léguas que ligavam Cachoeira de Santa Clara (Nanuque)

a Filadélfia (Teófilo Ottoni). Na verdade, o que Teófilo Ottoni almejava era o

desmembramento do Nordeste Mineiro, ou seja, toda a área por ele desbravada, o

sul da Bahia e o vale do rio São Mateus, para a formação do Estado do Mucuri,

que teria Filadélfia como capital, ligada por uma estrada de ferro que faria com

que se escoasse a produção de pedras preciosas e o minério de Minas e do novo

estado, bem como os produtos das atividades agropecuárias do sul da Bahia, do

Mucuri e do Norte Mineiro, através do porto em Ponta da Baleia (Caravelas) no

estado da Bahia.

Figura 08 – Estrada de Rodagem entre Filadélfia e C achoeira de Santa Clara

– Ilustração de Percy Lau 25

25 In CHAGAS, Paulo Pinheiro, 1906 - Teófilo Ottoni – Ministro do Povo – 4. ed. rev. aum. – Belo Horizonte: Ed. Itatiaia; Brasília: INL, Fundação Nacional Pró-Memória, 1982. pg 198.

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A grande envergadura dos projetos de Theófilo Ottoni e seus ideais

excessivamente liberais para a época, ao invés de ajudá-lo, servem de munição

para seus adversários políticos na Corte, que visavam outros interesses para o

dinheiro já aprovado pelo parlamento, que deveria ser, então, destinado ao

financiamento dos empreendimentos no Mucuri, como a construção da estrada de

ferro e de um porto maior em Caravelas. Criam-se embaraços burocráticos e

rapidamente, antes que Ottoni tome conhecimento do acontecido e se desloque

do Mucuri até a Corte, toma corpo no parlamento a idéia de encampação pelo

Império da Companhia de Navegação do Vale do Mucuri.26

Vota-se rapidamente, em 1859, uma lei neste sentido e a companhia é

encampada pelo império, sem prejuízo para os acionistas. Somente Ottoni e seus

familiares saem em prejuízo, pois mesmo a Companhia valendo seis vezes mais

do que seu capital inicial, o seu potencial econômico não é levado em conta. Mas

apesar do malogro financeiro do seu empreendimento, a força do seu modelo de

colonização e ocupação da região não poderia ser mais revertida. Nesta época,

Filadélfia já contava com 25.000 pessoas residentes e fixadas na região, além da

enorme área aberta por ele, antes absolutamente impenetrável. Escreve Theófilo

Ottoni, em 1859:

“Minas ganha além do seu capital que reembolsa:

Mais de 50 léguas de estradas regulares sendo 30 de rodagem. Ganha a posse de uma linha de navegação a vapor que liga o Rio de Janeiro às comarcas do norte. Recebe diversos núcleos de colonização, que importaram indústrias e capitais, e que estão ligados ao solo da província, além de um centro habitado já por 25.000 almas.

Não posso, pois, considerar perdido o tempo que

consagrei ao Mucuri, nem lembrar-me de um miserável balanço

26 Este texto foi compilado a partir da leitura dos relatórios apresentados aos acionistas da Companhia do Mucury realizado por Theóphilo Benedicto Ottoni respectivamente em 1853, 1854, 1858, 1860, inclusive a citação apresentada à página 37.

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de caixa, quando a generosa província de Minas Gerais tira tão assinaladas vantagens dos meus sacrifícios. ”27

Theófilo Ottoni faleceu em 1869, vítima de doença tropical adquirida

durante sua empreitada no vale do rio Mucuri. Em sua homenagem a cidade de

Filadélfia passou a se chamar Teófilo Otoni, quando foi emancipada do município

de Minas Novas e elevada à categoria de freguesia, em 1878. A estrada de ferro

somente alcança a cidade de Teófilo Otoni em 1898 solidificando finalmente o

vínculo entre o alto, o médio e o baixo Mucuri.

27 OTTONI, Theóphilo Benedicto. Relatório apresentado aos acionistas da Companhia do Mucury no dia 10 de maio de 1860 pelo diretor da companhia Theóphilo Benedicto Ottoni. Rio de Janeiro, Typ. Do Correio Mercantil, 1860.

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Figura 09 - Folheto comemorativo do centenário da C idade de Teófilo Otoni,

em 1953 – Arquivo da Família Ottoni

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A revisão histórica de formação e ocupação da região implica

forçosamente numa referência à cidade de Teófilo Otoni, que carrega a posição de

centro ou pólo regional, por uma série de razões estruturais. Além de poder ser

classificada como uma “cidade média propriamente dita” 28, suas raízes históricas

relacionadas acima se somam à outras como a concentração dos fluxos regionais

que forçosamente devem passar por aquela localidade, e ao seu alto grau de

hierarquia regional que agrega princípios de tráfego, mercado e administrativo,

como descreveu W. Christaller.29

A conformação do seu Sítio, em sua maioria de conformação

predominantemente acidentada, justifica inicialmente seu isolamento original com

relação aos demais sistemas e subsistemas de relações em funcionamento na

primeira metade do século XIX. Mas sua Posição sempre apresentou fortes

características de uma “Posição Carrefour”, permanecendo assim até hoje. Sua

desarticulação administrativa e do seu potencial de desenvolvimento, promovida

pela retirada do seu eixo principal de fluxos, a Ferrovia Bahia – Minas em 1967,

não foi suficiente para lhe roubar seu conceito forte de posição de entroncamento.

Pela cidade passam dois eixos rodoviários importantes e estruturadores

tanto da região como do estado de Minas Gerais e mesmo no nível nacional em

relação à sua ligação com as regiões Norte e Nordeste do país. Da sua rede de

comércio e serviços dependem cerca de 70 municípios, tanto da sua região de

influência direta como indireta, além do que é notória sua influência sócio-cultural

e política por toda a rede geográfica regional.

Demograficamente a cidade tem mostrado balanços bastante

significativos, originados das várias reformas políticas por que tem passado a

28AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno. A Rede Urbana da Bacia do Mucuri, in Revista Geografia e Ensino. Ano 3, n0 10, 1990. Belo Horizonte, IGC/UFMG. 29 CHRISTALLER, Walter. Central Places in Southern Germany, (translated from “Die Zentralen Orte in Suddeutschland”, C. W. Baskin). Englewood Cliffs, Prentice-Hall, 1966, 230 p.

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região ao longo, principalmente, da segunda metade do século XX. As oscilações

demográficas que o município tem apresentado são notáveis e desempenham

importante papel no quadro de estagnação apresentado nas últimas três décadas

pela cidade e pela região.

Quadro 01 - Oscilação Demográfica no Município de T eófilo Otoni (%)

DÉCADA CRESCIMENTO %

30 – 40 2,42

50 45,96

60 - 49,3

70-80 10,63

FONTE: FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO

-60

-40

-20

0

20

40

60

Crescimento em %

30 – 40 50 60 70-80

Décadas

Oscilação Demográfica no Município de Teófilo Otoni em %

CRESCIMENTO %

Gráfico 01

Um quadro sistêmico e continuado de desequilíbrio do município,

refletido também na região, certamente vem contribuindo para o aparecimento de

outros centros urbanos que vem apresentando também um certo potencial de

desenvolvimento dentro desta rede regional. Estes novos centros urbanos vem

apresentando certas funções urbanas e boa posição regional, que os investem de

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um grau razoável de hierarquia compatível com o centro regional original. Este é o

caso, por exemplo, das cidades ao longo do eixo regional principal, a MGT-418

(Estrada do Boi), como Nanuque e, também, das cidades litorâneas do estado da

Bahia e do estado do Espírito Santo. Estas últimas têm apresentado elevado

potencial de desenvolvimento alavancadas pela produção de novas “Comodities”,

como a celulose, pelo seu alto potencial turístico no cenário regional e nacional e

pela recente dinamização do setor de produção de petróleo.

Este estudo pretende fazer uma observação da dinâmica desta região,

sob muitos aspectos, singular, tomando como base a evolução histórica e o

comportamento na última década de índices de desenvolvimento humano,

longevidade, renda e educação.

A localização geográfica da cidade de Teófilo Otoni, somada às

enormes dificuldades de comunicação, findava por colocá-la numa posição de

maior proximidade com o Rio de Janeiro ou Salvador do que com os demais

centros de Minas Gerais. A falta de estradas e o relevo montanhoso e recoberto

de vastas florestas sempre dificultaram o intercâmbio com os centros de outras

regiões de Minas. Segundo relato dos descendentes dos alemães da primeira

leva, eram necessários 7 ou 8 “marchas”, a cavalo, para se alcançar Diamantina,

para onde eram mandados a estudar os filhos das famílias que não tinham

condições de os manter no Rio de Janeiro.

Certamente, após a implantação da Estrada de Ferro Bahia - Minas em

1898, que ligava Teófilo Otoni a Caravelas e de lá de navio até o Rio, era

consideravelmente mais fácil se alcançar este grande centro nacional que muitos

outros centros urbanos de Minas Gerais. Além disto, as operações de exportação

de pedras preciosas e semi-preciosas tinham no porto do Rio de Janeiro, um

ponto intermediário obrigatório entre o Brasil e o centro alemão e mundial de

beneficiamento, lapidação e comercialização de pedras preciosas Idar-Oberstein.

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A primeira motivação tanto para o desbravamento quanto para a

exploração da região sempre foi a possibilidade de encontrar-se metais ou pedras

preciosas, possibilidade alimentada pela lenda bandeirante da montanha das

esmeraldas. O fracasso de repetidas tentativas de encontrar a legendária

montanha preciosa acabou por gerar novas motivações para o desenvolvimento

da região. Apesar de superado, o simbólico e o imagético relacionado à questão

das pedras preciosas, ainda hoje permanece incrustado no imaginário e no

cotidiano da população local. A montanha das esmeraldas nunca foi encontrada,

mas ainda hoje o subsolo da região frequentemente revela riquezas minerais

consideráveis.

Em 1920, devido a uma reforma administrativa do Estado, realizada em

1911, o município de Teófilo Otoni mostrava uma população, segundo quadro

abaixo, de 163.19930 habitantes distribuídos em dez distritos com a sede, a saber:

Teófilo Otoni, Itambacury, Poté, Malacacheta, Setubinha, Concórdia, Itaipé,

Urucú(Carlos Chagas), Aimorés e Pampam.

30 MINAS GERAIS. Secretaria de Agricultura. Serviço de Estatística Geral. Minas Gerais segundo recenseamento de 1920. Bello Horizonte: Imprensa Oficial, 1924.

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Quadro 02 – População do Município de Teófilo Otoni em 1911

POPULAÇÃO DISTRITO

TOTAL ESTRANGEIRA

Teófilo Otoni (sede) 31.808 288

Itambacuiry 38.810 56

Poté 13.747 32

Malacacheta 13.303 04

Setubinha 11.161 04

Concordia 10.334 27

Itaipé 15.078 07

Urucú 7.748 60

Aimorés 3.782 69

Pampam 17.338 08

TOTAL 163.199 555

Fonte: MINAS GERAIS. Secretaria de Agricultura. Serviço de Estatística Geral. Minas Gerais segundo

recenseamento de 1920 . Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1924.

Na mesma época, o cenário econômico da região se encontrava

voltado para a produção agropecuária e para a extração e o beneficiamento das

pedras preciosas. Além destas atividades, a cidade possuía também pequenas

indústrias de beneficiamento de matérias primas agrícolas de reduzida base

financeira e localizadas nas próprias fazendas destinadas ao consumo local. Na

verdade, não poderíamos classificar o desenvolvimento da agricultura local como

estruturado em bases mercantis, mas sim destinado principalmente à subsistência

local.

Segundo estudo da Fundação João Pinheiro, o relativo crescimento

econômico da cidade permitiu apenas o investimento em melhoramentos urbanos

no início deste século, não desenvolvendo um sistema produtivo em bases

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manufatureiras, sendo que as pequenas indústrias existentes se estruturavam em

bases artesanais e não fabris. 31

É curioso observar que a cidade de Teófilo Otoni, com equipamentos e

serviços urbanos nem sempre observados nas demais cidades mineiras de então,

talvez pela própria influência do Rio de Janeiro e de seus colonos estrangeiros,

“possuía então telégrafo nacional em 1910, posto de observações meteorológicas

em 1911, abastecimento de água encanada em 1915, linha de bondes em 1918,

rede telefônica em 1920, empresa de automóveis e posto de profilaxia rural em

1921, iluminação elétrica pública e particular em 1922. Possuía ainda dois

hospitais, o Santa Rosália e o São Vicente, uma oficina de marcenaria com

maquinário todo importado no princípio do século, da Alemanha, responsável

inclusive pela decoração interna do interior da Igreja Matriz da Imaculada

Conceição, construída em estilo neo-gótico, com três altares esculpidos em

madeira e com púlpito e bancos todos em jacarandá.”32

31 Fundação João Pinheiro, A Colonização Alemã no Vale do Mucuri, Coleção Mineiriana, Belo Horizonte, 1991, p 78. 32 IDEM, p 79.

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Figura 10 - Igreja Matriz da Imaculada Conceição em 1921 – Teófilo Otoni,

arquivo da família Ottoni

Como coloca Rosa E. Rossini em sua tese de 1974, citada por Milton

Santos, “no final da década de 1920 a urbanização do interior, evoluindo de forma

acelerada e atomizada, foi reforçada pelo movimento de capitais locais

propiciando investimentos de origem privada de companhias de energia, de

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telefone, de meios de transporte, bancos, instituições de ensino etc. Acrescente-se

ainda o surgimento de postos de gasolina, armazéns para a venda de

implementos agrícolas e sementes, que reforçavam o setor urbano, acelerando a

prestação de serviço.”33

Com efeito, a cidade de Teófilo Otoni contava, até a década de 40, com

uma vida cultural bastante agitada sendo comum, principalmente na comunidade

alemã, o ensino de música erudita e artes plásticas a seus filhos, com a presença

marcante também na constituição de corais, tradição que se mantém até hoje.

Devido às distâncias dos grandes centros culturais e ao interesse de grande

parcela da população em eventos culturais, eram comuns apresentação de peças

teatrais e orquestras vindas principalmente da Alemanha. 34

Outro ponto de extrema importância no que tange à vida cultural da

região era a presença de três jornais semanais compostos e editados em oficinas

próprias: “A Família”, “O Mucury” e “O Município”, tendo-se até notícia de um

pequeno periódico editado em alemão. 35

O que se conclui disto é que a cidade de Teófilo Otoni mostrava pela

década de 20, “um elevado grau de modernização do seu aparelho urbano,

possuindo uma avenida e vinte ruas, quatro travessas e cinco praças, com um

abastecimento de água excelente, que contava com um reservatório local para

250.000 litros que permitia o abastecimento de até 510 prédios. A despeito desta

boa distribuição de água, e de acordo com a situação predominante nas cidades

brasileiras e mineiras do mesmo período, Teófilo Otoni não contava ainda com

rede de esgotos.”36

33 Santos, Milton, A Urbanização Brasileira, Editora Hucitec, São Paulo, 1984, p 24.. 34 Fundação João Pinheiro, A Colonização Alemã no Vale do Mucuri, Coleção Mineiriana, Belo Horizonte, 1991, p 81. 35 IDEM, p 81. 36 IDEM, p 81.

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Figura 11 – Vista parcial da cidade de Teófilo Oton i em 1921 - arquivo da

família Haueisen.

Esta consolidação infra-estrutural regional foi crucial no processo de

desenvolvimento e de colonização estrangeira no Vale do Mucuri, alavancada

principalmente por famílias de origem germânica. Um aspecto a ser levado em

consideração quanto à região do vale do Mucuri é a sua fraca articulação viária

até meados da década de 1940, gerando o fato de que esta articulação incipiente

findava por colocar toda a região muito mais em contato com o Rio de Janeiro do

que com os demais centros mineiros. Na verdade esta situação perdurou até a

abertura da rodovia Rio - Bahia, na década de 1940.

Mesmo assim, observa-se que a situação precária perdurou ainda por

muito tempo, uma vez que o asfaltamento da rodovia só veio a se concretizar no

início da década de 60. Antes disto, a viagem a Teófilo Otoni ou à região, a partir

de Belo Horizonte, se dava em três etapas e durava três dias. Ia-se ao Rio de

Janeiro, de lá de barco até Caravelas e então de trem “Maria Fumaça” até Teófilo

Otoni, numa viagem de 376 km que durava cerca de 16 horas.

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Figura 12 - Vista parcial da cidade de Teófilo Oton i em 1921 – arquivo da

família Haueisen.

Um aspecto marcante da economia do vale foi a atividade madeireira

que acompanhou o processo de abertura da ferrovia, inaugurada em 1898, que

ligava o alto e médio Mucuri ao Porto de Caravelas com facilidade. Esta atividade

promoveu uma ação de desmatamento rápida e violenta ao longo da ferrovia.

Toda a produção era destinada à exportação e esta atividade não trouxe maiores

vantagens econômicas para região a não ser para as próprias madeireiras, visto

que estas não faziam nada mais do que um simples beneficiamento primário da

madeira no local, não havendo assim maiores desdobramentos desta atividade ou

de alguma outra atividade secundária ligada à principal.

Além disto, não houve uma preocupação de reposição, num segundo

momento, da área desmatada, fazendo com que os impactos sobre o meio

ambiente, na região, tenham sido e continuem sendo profundos, com efeitos

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significativos sobre o clima, índices e freqüência pluviométricos, além de promover

uma diminuição mais acelerada dos recursos hídricos.

A base fundamental da economia da região sempre foi a produção

agropecuária, que acaba por sustentar uma atividade comercial e de serviços mais

ou menos intensa, na medida em que a atividade principal também se fortalece. A

importante produção de café, que ocorria na região do Vale do Mucuri e se fazia

presente como cultura base em quase todas as propriedades da região devido ao

seu alto preço internacional, foi virtualmente destruída pela crise de 1929, como

quase toda a economia agrária da região Sudeste. Esta situação vai perdurar até

o período pós Segunda Guerra Mundial, quando a cidade assiste a chegada do

primeiro elemento de transporte do modal rodoviário.

Depois de instalada a Rio - Bahia (BR 116), no final da década de 40, o

que se observou na região é que a rodovia, geralmente tomada como sinônimo de

progresso e desenvolvimento, na verdade representou um elemento que expôs a

região ao mundo modificando seu perfil de maneira decisiva, então fruto do

enclausuramento da cidade. Além disso, sua presença acabou patrocinando o

desmatamento dos remanescentes florestais restantes na região de forma

sistemática e definitiva, sem jamais se transformar num vetor de incentivo à

indústria ou ao comércio na região.

A questão do transporte e da comunicação é crucial para o

entendimento das trocas e fluxos regionais internos e externos. Desde o seu

desbravamento, grande parte do fluxo regional se volta para o eixo do rio Mucuri.

Esta lógica permite que a região se articule estabelecendo seus parâmetros de

desenvolvimento balizados pelo movimento pendular ao longo do eixo do rio. A

retirada da Ferrovia em 1966, declarada pelo então governo Militar como “ramo

ferroviário deficitário”, desestrutura rapidamente esta lógica fundamental de

transporte e ligação da região com o mundo, desarticulando a região de maneira

decisiva.

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Mapa 03 - Traçado da Ferrovia Bahia – Minas – Minis tério da Viação e Obras

Públicas, 1949.

A década de 1950 é marcada pelo período em que se dá a implantação

da indústria automobilística brasileira. As administrações desta época, atentas ao

momento político e levadas pela agressiva iniciativa do governo de Juscelino

Kubitschek com relação à construção de rodovias em todo o país e pela máxima

“50 anos em 5”, conseguiram promover o Congresso Pró-Asfaltamento da Rodovia

Rio - Bahia, em 1960, que foi sediado pela cidade de Teófilo Otoni e que acabou

por culminar com o início do asfaltamento da rodovia em 1963. A condição de

“quase isolamento”, tanto geográfico quanto cultural, observado pela região desde

a sua ocupação começa então a se modificar. Agora, além do modal ferroviário,

há o aparecimento de um outro modal que estabelece um outro tipo de relação de

comunicação, mobilidade e transporte, completamente novo para as estruturas

regionais já familiarizadas com o fluxo leste-oeste da ferrovia.

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Seria ingênuo afirmar-se categoricamente que esta superexposição ao

mundo tenha lhe tomado seus recursos, inclusive maculando sua identidade

enquanto fato histórico. A própria construção histórica da região já estabelecia

uma lógica de desenvolvimento que pressupunha uma ação antrópica

colonizadora, que fizesse largo uso de seus recursos naturais. Grandes benefícios

geralmente se seguem ao aumento da permeabilidade regional promovida através

da implantação de um grande eixo de transporte como a rodovia Rio - Bahia (BR

116). O que se pode afirmar é que se a rodovia tivesse sido estabelecida como

elemento complementar à lógica de fluxo já estabelecida pela ferrovia, certamente

ela teria sido determinante para um maior desenvolvimento de toda a região.

No momento em que a rodovia passa a funcionar, a partir de 1967,

como simples contrapartida à extinção da ferrovia, tão importante econômica e

culturalmente para a região, ela também passa a funcionar como elemento

promotor de uma lógica regional que trabalha em sentido oposto às estruturas

regionais já estabelecidas historicamente. Este descompasso ou esta

descontinuidade regional faz com que se inicie um ciclo histórico em que a região

comece a assistir a um processo de desaceleração que acaba por culminar, na

década de 1990, num quadro de estagnação.

Este ciclo de desaceleração contribuiu muito para que a região

observasse, por conseqüência, um empobrecimento acentuado traduzido nos

índices de desenvolvimento humano regionais, todos abaixo da média nacional.

Verificamos também que o asfaltamento da rodovia Rio - Bahia no início da

década de 60 e a retirada da Ferrovia Bahia - Minas, redirecionaram o destino da

cidade de Teófilo Otoni, a cidade pólo da região, que se transforma numa grande

encruzilhada entre a região Sudeste e Nordeste, por onde todo o movimento

pendular Norte-Sul acaba forçosamente passando. Este movimento, apesar de

redefinir a lógica de desenvolvimento regional, parece ainda não ser

completamente reconhecido como tal pela população do Mucuri.

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A abertura da chamada Estrada do Boi (MGT-418), no final da década

de 60, e o seu asfaltamento, no final da década de 70 e começo da década de 80,

jamais conseguirá substituir os trilhos da Bahia - Minas e sua presença, que veio

como uma contrapartida do governo pela retirada da ferrovia, não será suficiente

para alavancar o desenvolvimento de toda a região sob sua influência.

As iniciativas oficiais do final da década de 1970 e começo da de 1980,

representadas então pelas chamadas “Políticas de Cidades-Dique”, procura reter

o fluxo migratório e o efeito de “inchamento” das grandes metrópoles nas décadas

nesta época, quando em que acontece também a chamada 2a industrialização

mineira e é marcada por movimentos migratórios de caráter quase continentais em

todo o país, mas seus efeitos se farão sentir principalmente na região Sudeste.

Estas políticas acabam transferindo para as cidades médias o ônus destes

problemas, até então eminentemente metropolitanos, como desemprego,

inchamento populacional e desestruturação urbana.

A situação dos terrenos rurais e a desestruturação da atividade

agropecuária, observadas hoje na região, são fatores importantes que

contribuíram para o empobrecimento e desestruturação regional. Mesmo as

técnicas agrícolas mais apuradas e diversificadas dos descendentes dos alemães

não conseguiram evitar que a produção agropecuária se voltasse quase

completamente, a partir da década de 60, para a criação extensiva da pecuária

bovina, de corte e leite, em detrimento de todos os outros tipos de produção

agropecuária. Este tipo de atividade agropastoril sempre esteve presente de

maneira marcante na região, notadamente na sua porção mais a leste que faz

fronteira com os estados da Bahia e do espírito Santo, mas, a partir da década de

60, começa a tomar o lugar de outros tipos de cultura de maneira mais

generalizada por toda a região, como mostra o quadro abaixo:

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Quadro 03 – Utilização de Terras em Teófilo Otoni 1 920 – 1980

1920 1940 1950 1960 1970 1980 Especificação

Absoluto % Absoluto % Absoluto % Absoluto % Absoluto % Absoluto %

N0 de

Estabelecimentos 2.653 - 4.618 - 2.840 - 4.484 - 2.836 - 3.021 -

Área Total 279.886 - 348.145 - 240.262 - 315.484 - 276.486 - 328.946 -

Lavouras - - 38.529 11,1 28.04 11,7 49.049 15,5 28.242 10,2 27.277 8,3

Permanentes - - 16.625 43,1 13.094 46,7 19.002 38,7 6.858 24,3 7.129 26,1

Temporárias - - 21.904 56,9 14.952 53,3 30.047 61,3 21.384 75,7 20.148 73,9

Pastagens - - 108.455 31,2 94.607 39,4 186.168 59,0 191.008 69,1 237.376 72,2

Naturais - - - - 17.650 18,7 103.342 55,5 184.127 96,4 220.387 92,8

Plantadas - - - - 76.957 81,3 82.826 44,5 6.881 3,6 16.989 7,2

Matas e Florestas 119.479 42,7 125.691 36,1 67.435 28,1 42.275 13,4 33.696 12,2 36.631 11,1

Naturais - - - - 66.680 98,9 37.074 87,7 33.345 99,0 36.580 99,0

Plantadas - - - - 755 1,1 5.201 12,3 351 1,0 51 1,0

Em Descanso - - - - - - 21.855 6,9 10.266 3,7 8.656 2,6

Fontes: Censo Agrícola, Minas Gerais, 1960. Censo Agropecuário, Minas Gerais, 1970; 1980.

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1920

57%

43%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

Gráfico 02

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70

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1940

22%

36%11%

31%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

LAVOURAS PASTAGENS

Gráfico 03

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1950

21%

28%12%

39%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

LAVOURAS PASTAGENS

Gráfico 04

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1960

12%

13%

16%59%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

LAVOURAS PASTAGENS

Gráfico 05

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71

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1970

9%12%

10%

69%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

LAVOURAS PASTAGENS

Gráfico 06

UTILIZAÇÃO DAS TERRAS EM TEÓFILO OTONI - 1980

7% 11%

10%

72%

OUTROS USOS MATAS E FLORESTAS

LAVOURAS PASTAGENS

Gráfico 07

O desmatamento sistemático da região, principalmente na primeira

metade do século 20, incentivou sobremaneira a criação extensiva, pois ofereceu

aos proprietários de terrenos rurais imensas parcelas de terras virgens bastante

adequados para a produção de pastos, que eram plantados nos locais

desmatados, principalmente com capins de origem africana, como o colonião e as

brachiarias. Diante desta possibilidade, todos os esforços e investimentos se

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72

voltaram para a produção extensiva, de técnicas rudimentares, baixa qualidade e

grande quantidade, com baixos índices de produtividade da pecuária bovina de

corte e leite.

Num primeiro momento, os níveis de produção são extremamente

elevados dada a força da terra, na verdade, esta produção se mostra tão elevada

que temos, em meados da década de 60, o aparecimento de um grande frigorífico

que se instalou em Teófilo Otoni, o Frigorífico do Mucuri S.A. - FRIMUSA, bem

como também o fortalecimento da Cooperativa de Laticínios de Teófilo Otoni a

C.L.T.O., além de outros estabelecimentos semelhantes nos municípios de Carlos

Chagas e Nanuque. Todos entrariam também em decadência, após cerca de duas

décadas de funcionamento, na medida em que o ciclo da bovinocultura extensiva

também começa a perder força enquanto atividade produtiva principal da região.

Com efeito, um estudo da F.J.P. 37 chama a atenção para o fato de que

não existiu, historicamente, um processo de concentração de terrenos rurais na

região, como nos mostram os quadros abaixo:

Quadro 04 - Tamanho Médio das Propriedades Rurais e m Teófilo Otoni 1920 - 1980 (ha)

ANO TAMANHO (ha)

1920 105,5

1940 75,4

1950 84,6

1960 70,4

1970 97,5

1980 108,5 Fontes: Minas Gerais. Secretaria de Agricultura. Serviço de Estatística Geral. Minas Gerais segundo o recenseamento de 1920. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1924. Censo Agrícola, Minas Gerais, 1960. Censo Agropecuário, 1970, 1980.

37 Fundação João Pinheiro, A Colonização Alemã no Vale do Mucuri, Coleção Mineiriana, Belo Horizonte, 1991, 161p.

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73

Quadro 05 - Número dos Estabelecimentos Rurais Por Grupos de Áreas

em Teófilo Otoni (ha)

ÁREA(Ha) 1920 1940 1950 1970 1980 Até 5 - 4,0 4,0 4,2 3,8

De 5 a 20 - 14,7 14,5 13,3 12,3

De 20 a 50 - 27,5 33,0 34,2 33,8

De 50 a 100 - 72,2 76,6 75,5 73,2

De 100 a 200

- 140,4 - 146,7 127,8

De 200 a 500

- 305,3 - 342,4 319,2

De 500 a 1000

- 885,3 - 674,0 692,2

Fontes: Minas Gerais. Secretaria de Agricultura. Serviço de Estatística Geral. Minas Gerais segundo o recenseamento de 1920. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1924. Censo Agrícola, Minas Gerais, 1960. Censo Agropecuário, 1970, 1980.

Gráfico 08

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74

Gráfico 09

Gráfico 10

O que se pode constatar é um equívoco no uso da terra, que acaba

tornando as propriedades pequenas incapazes de suprir as necessidades das

famílias dos proprietários, em constante crescimento. Os descendentes dos

proprietários são forçados a se inserirem em alguma atividade nos centros

urbanos, pois o terreno rural da família, com uma produtividade bastante

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75

comprometida, não mais os comportam. Nas sedes municipais da região, eles

encontram uma situação de desemprego e de completa falta de perspectivas

profissionais, o que os força ao desterro ou a engrossar as imensas quantidades

de desempregados residentes nas inúmeras favelas dos municípios mais

estruturados da região.

Os terrenos rurais regionais estão hoje bastante comprometidos, pois já

não são capazes de uma produção como a de outrora, o que os faz ter um valor

de comercialização bastante baixo, uma vez que seu custo de recuperação é

muitas vezes superior ao preço da terra. Devido aos preços dos implementos, a

alta declividade dos terrenos e a ausência de capital que financie tecnologias

adequadas à resolução destes problemas, a região apresenta um índice bastante

baixo de mecanização e tecnificação, o que configura um cenário de baixa

produtividade geralmente seguido do abandono da terra.

De maneira geral a situação da mesorregião estudada e exposta neste

capítulo, principalmente através da caracterização de seu centro urbano mais

importante, a cidade de Teófilo Otoni, identifica uma série de problemas históricos

que muito contribuíram para que a região hoje se encontre numa posição de

estagnação. Suas estruturas regionais se encontram submetidas a

condicionantes, em sua maioria, de caráter histórico que acabam por definir um

cenário relativamente equilibrado nas últimas três décadas em níveis de

desenvolvimento, tanto humano como econômico, mais baixos do que os da

média nacional.

A percepção do cidadão da região e o censo comum apontam para um

cenário onde teríamos, por um lado, toda a região do Jequitinhonha com índices

de desenvolvimento em geral extremamente baixos, com destaque para a cidade

de Diamantina. Por outro lado teríamos a região do Mucuri com indicadores

relativamente melhores do que os do Jequitinhonha, com destaque para as

cidades de Teófilo Otoni e Nanuque. Finalmente, a região litorânea do norte do

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76

Espírito Santo e Sul da Bahia apareceria com índices de desenvolvimento mais

elevados dentro desta mesorregião expandida.

Este cenário deve encontrar respaldo ou não na medida em que se

realizar a análise do mapeamento dos índices de Desenvolvimento Humano –

IDH, na última década entre os anos de 1991 e 2000, apresentados no capítulo

que segue.

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77

Capítulo III

Análise do Mapeamento do IDH da Mesorregião Expandida do Vale do

Jequitinhonha e do Mucuri no Período 1991 - 2000

Patativa do Assaré (Cabra da peste)

“Tem muita beleza minha boa terra Desde do vale à terra,

Da praia ao sertão. Por ela eu me acabo, dou a própria vida,

Terra querida do meu coração.”

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78

3.1. Considerações Iniciais

Neste capítulo é apresentada uma análise do Mapeamento de variáveis

relativas ao Índice de Desenvolvimento – IDHM e suas respectivas variações entre

os anos de 1991 e 2000. Esta análise foi realizada pelo Laboratório de GIS - I da

PUC/Minas38 e engloba a Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e do

Mucuri, envolvendo 101 municípios de três estados a saber: Minas Gerais, Espírito

Santo e Bahia. Dos 101 municípios estudados 74 se encontram no estado de

Minas Gerais, 19 pertencem ao estado da Bahia e 08 pertencem ao estado do

Espírito Santo.

38 Mapeamento do IDH da Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e Mucuri, 1991 – 2000. ABREU, João Francisco de (PhD) e CARVALHO, Isabella Faria de. Programa de Pós-graduação em Geografia, Tratamento da Informação Espacial. Belo Horizonte, 2004.

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Mapa 04 - Microrregiões da Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e Mucuri - 2000

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O principal objetivo seria a tentativa de identificação de padrões

regionais e microrregionais de desenvolvimento socioeconômico. Para tanto

optou-se por uma análise em escala Mesorregional a partir do mapeamento das

variações do IDH entre 1991 e 2000 acima citado, o que, somada aos processos

históricos do desenvolvimento regional já discutidos, permitiria uma análise de

resultados mais refinada. Além disso, levam-se em consideração os trabalhos “A

Rede Urbana da Bacia do Mucuri”39 e “Cidades de Porte Médio em Minas

Gerais”40 na análise da região do Mucuri.

Como resultado final desta análise busca-se demonstrar um padrão

espacial que sintetize o panorama socioeconômico desta Mesorregião, que é feito

tendo como fundamento um grupo de variáveis consideradas em 101 municípios

da Mesorregião Expandida do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri, mapeados em

ambiente GIS, utilizando-se técnicas de superfícies Geo-estatísticas41 para

apresentação dos resultados finais.

39 AMORIM FILHO, Oswaldo Bueno. A Rede Urbana da Bacia do Mucuri. In Revista Geográfica e Ensino. Ano 3, n0 10, 1990. Belo Horizonte, IGC/UFMG. 40 AMORIM FILHO, O.B.; ABREU, J. F.; BUENO, M.E.T. Cidades de porte médio em Minas Gerais. Boletim de Geografia Teorética, Rio Claro, 12(23/24): 33-46, 1982. 41 Ver: Abreu, 1995; Abreu e Amorim Filho, 2000; Amorim Filho e Abreu, 2001.

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81

3.2. Análise do Mapeamento

O foco principal desta análise recai sobre a região do Mucuri, que toma

a região do Jequitinhonha e as regiões Litorâneas do Norte do Estado do Espírito

Santo e Sul do Estado da Bahia como parâmetro. A hipótese principal é que na

última década, o Mucuri tem se mantido estável em seus índices gerais assim

como a região do Jequitinhonha, mas com variações mais expressivas do que

esta última, enquanto que as porções Norte do Espírito Santo e Sul da Bahia

apresentariam maiores variações quando comparadas com as duas primeiras

regiões.

As maiores variações podem ser observadas nos centros emergentes

do Mucuri e no litoral do estado da Bahia e do Espírito Santo. Este resultado

demonstra que os centros regionais mais desenvolvidos demonstraram uma

menor variação uma vez que eles já possuem um aparelhamento mais

significativo que os demais centros, não apresentando assim um aumento

substancial de seus índices na última década. Já os centros emergentes do sul do

estado da Bahia e norte do estado do Espírito Santo, como já citado

anteriormente, receberem grandes incentivos e investimentos, principalmente do

setor privado, o que certamente contribuiu para uma variação positiva mais

significativa de seus índices.

Variações mais expressivas também ocorreram em várias cidades

localizadas entre a cidade de Teófilo Otoni e Diamantina, o que acaba por reforçar

o eixo leste-oeste estabelecido historicamente como a “espinha dorsal” da região

em questão e que claramente pode ser considerado como de significativa

importância para a estruturação de toda a mesorregião estudada.

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FONTE: ABREU, J. F./2004 / PUCMINAS-TIE

FIGURA 13 - MESORREGIÃO EXPANDIDA - JEQUITINHONHA/MUCU RI

ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO – IDH_M – VARIAÇÃO 1991 /2000 - CONTORNOS

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83

FONTE: ABREU, J. F./2004 / PUCMINAS-TIE

FIGURA 14 - MESORREGIÃO EXPANDIDA - JEQUITINHONHA/MUCU RI

ÍNDICE DE DESENVOLVIMENTO HUMANO – IDH_M – VARIAÇÃO 199 1/2000 – MODELO 3D

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O mapeamento da Componente Principal gerou uma superfície geo-estatística

onde se pode observar claramente onde ocorrem os maiores “picos” ou as

maiores “depressões”. Estas últimas se encontram nos municípios localizados

entre o vale do rio Mucuri e o vale do rio Jequitinhonha, o que se configura como

um obstáculo à integração intra-regional neste sentido. Com efeito, deve-se

observar uma menor articulação entre o Mucuri e o Jequitinhonha perdurando

ainda uma relação mais de dependência com o centro regional, do que de troca.

Este cenário de dependência não deve apresentar modificações

expressivas, apesar do possível aparecimento de novas possibilidades de acesso

e produção nos municípios onde se verificam os menores escores. Em verdade,

acessos mais facilitados ou de melhor qualidade devem acentuar, pelo menos no

primeiro momento, a relação de dependência destes municípios no que toca,

principalmente, ao pólo regional, no caso, a cidade de Teófilo Otoni, onde a

concentração de funções regionais relacionadas à transporte, mercado, saúde,

educação e administração regional tende a se acentuar na próxima década.

Os maiores “picos” são observados nos diversos centros de toda a

mesorregião com destaque para os centros emergentes do litoral do Espírito

Santo, o que deve tender para uma maior articulação da mesorregião do Mucuri

com a mesorregião do São Mateus gerando neste sentido, uma relação mais rica,

de troca, do que de dependência.

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FONTE: ABREU, J. F./2004 / PUCMINAS-TIE

FIGURA 15 - MESORREGIÃO EXPANDIDA - JEQUITINHONHA/MUCU RI (2000)

COMPONENTE I - CONTORNOS

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86

FONTE: ABREU, J. F./2004 / PUCMINAS-TIE

FIGURA 16 - MESORREGIÃO EXPANDIDA - JEQUITINHONHA/MUCU RI (2000)

COMPONENTE I – MODELO 3D

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A hipótese principal levantada anteriormente era de que, na última

década, o Mucuri teria se mantido estável em seus índices gerais assim como a

região do Jequitinhonha, mas com variações mais expressivas do que esta última,

enquanto que as porções Norte do Espírito Santo e Sul da Bahia apresentariam

maiores variações quando comparadas com as duas primeiras regiões.

Este proposição não pode ser completamente verificada porquanto os

índices do Jequitinhonha de maneira geral, exceto de seus centros

microrregionais, ainda variam de maneira muito menos significativa do que os

centros microrregionais do Mucuri. Estes últimos acabaram demonstrando

variações mais expressivas como já verificado anteriormente. Por outro lado, os

centros emergentes do norte do estado do Espírito Santo e do sul do Estado da

Bahia demonstraram expressiva variação de IDH conforme era esperado.

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FONTE: ABREU, J. F./2004 / PUCMINAS-TIE

FIGURA 17 - MESORREGIÃO EXPANDIDA - JEQUITINHONHA/MUCU RI (2000)

COMPONENTE I

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O eixo leste-oeste, já consolidado entre o litoral e a cidade de Teófilo

Otoni, mostra uma tendência a se estender em direção à cidade de Diamantina.

Estes dois municípios, além de serem os dois principais pólos regionais, também

se estruturaram historicamente ao longo do eixo leste-oeste que amarra toda a

região o que acaba fortalecendo as relações entre as bacias do Mucuri, do São

Mateus e o alto Jequitinhonha.

As variações dos índices demográficos e de desenvolvimento nesta

região, como analisadas ao longo do trabalho, sempre apontaram um

comportamento irregular no ritmo de desenvolvimento regional do Vale do

Jequitinhonha e do Mucuri. Seu próprio histórico de ocupação é marcado por

momentos de intenso crescimento em constante alternância com momentos de

estagnação e desestruturação que forçosamente acabaram exigindo algum tipo de

rearranjo regional.

Esta oscilação é refletida principalmente na Mesorregião do Mucuri pela

cidade de Teófilo Otoni, que demonstra índices de crescimento demográfico

bastante desiguais ao longo do século XX. Fundada para ser a nova rota

comercial do centro-norte mineiro em direção à Corte e a possibilidade de dotar

Minas Gerais de um porto no mar, este centro urbano sempre ocupou uma

posição de liderança dentro da rede urbana do Mucuri e de grande parte da

Mesorregião do Jequitinhonha e agora demonstra importância significativa para o

equilíbrio das estruturas regionais.

O trabalho “Cidades de porte médio em Minas Gerais” realizado por

Amorim Filho, Abreu e Bueno em 1982, revela sobre as cidades da bacia do

Mucuri o seguinte:

Teófilo Otoni está classificada entre as “cidades médias propriamente

ditas”, no topo do grupo de cidades deste nível. Seus equipamentos urbanos

(principalmente terciários) são, sem qualquer dúvida, os mais desenvolvidos entre

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90

as cidades de todo o nordeste do Estado. Sua ação polarizadora ultrapassa os

limites microrregionais, sendo qualitativamente diversificada.42

A posição de primazia ocupada pela cidade de Teófilo Otoni além de ter

fundamentos na sua própria história de ocupação, tem sido fortalecida nas últimas

décadas principalmente porque ainda persiste uma má integração externa que se

reflete também, diretamente, numa interação interna que ainda necessita de uma

maior estruturação.

O estudo de 1982 alertava então para o fato de que não se podia

afirmar ainda que as cidades da bacia do Mucuri formassem, num sentido mais

estrito, uma rede urbana. Na verdade diz Amorim Filho, “o que se pode afirmar é

que existe um conjunto de cidades cuja posição, organização interna e articulação

começam a criar um embrião de rede urbana regional”.

O mesmo trabalho alerta também para um aspecto importante que

dificulta a estruturação de uma rede urbana que é “a posição geográfica periférica

da bacia do Mucuri em Minas Gerais (mas, também, em relação aos vizinhos

Estados da Bahia e do Espírito Santo). Isto pesa muito em termos do dinamismo

de suas cidades e de sua economia como um todo”.

A estrutura piramidal formada pelos centros urbanos regionais denotava

também um nível muito pequeno de diferenciação hierárquica entre eles. “Na

bacia do Mucuri, esta diferenciação, principalmente econômica, ainda é pouco

significativa, particularmente no que diz respeito às pequenas cidades e

localidades. Extremamente sub-equipadas, são elas ainda profundamente

dependentes de atividades ligadas ao setor primário da economia: extrativismo

mineral e vegetal, pecuária extensiva e agricultura ainda muito atrasada. Entre as

cidades de maior porte, excluindo Teófilo Otoni, a diferenciação é mais

quantitativa que qualitativa”.

42 AMORIM FILHO, O.B.; ABREU, J. F.; BUENO, M.E.T. Cidades de porte médio em Minas Gerais. Boletim de Geografia

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91

Esta posição de destaque aparece muito claramente nos resultados

mapeados levando-se em consideração as variações de IDH-M no período

compreendido entre os anos de 1991 e 2000. De uma maneira geral os centros

urbanos que apresentavam maiores índices em 1991 continuam a apresentá-los

mais elevados, mas a sua variação final é pequena de maneira geral. O centro

regional mais importante, Teófilo Otoni, apresentou um equilíbrio relativo em seus

índices quando comparado com os centros sob sua influência direta e com os

demais centros regionais emergentes dentro do estado de Minas Gerais. Também

os centros emergentes localizados no norte do Estado do Espírito Santo e sul do

Estado da Bahia, principalmente aqueles na região litorânea apresentaram as

maiores variações.

A tendência de fortalecimento de uma linha de sentido leste-oeste se

confirma, fazendo com que os centros localizados próximos aos grandes eixos de

deslocamento, a saber: BR 101, a Rodovia MGT 418 (estrada do Boi) e a BR 116,

apresentem os maiores índices de desenvolvimento, colocando os demais centros

numa posição de marginalidade regional, com exceção dos centros localizados

entre Teófilo Otoni e Diamantina.

Os centros litorâneos dos Estados da Bahia e do Espírito Santo

apresentaram altos índices de desenvolvimento em virtude de sua atividade

econômica, vinculada, principalmente, à indústria do turismo e da celulose. Estas

atividades parecem demonstrar força suficiente para que estes centros apareçam

com um equipamento urbano capaz de sustentar taxas continuadas de

crescimento, assegurando um movimento ascendente que tende a se mostrar

duradouro.

O baixo grau de articulação e integração interna na parte mineira ainda

se configura como um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento desta região, o

Teorética, Rio Claro, 12(23/24): 33-46, 1982.

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que acaba por fortalecer a posição dos centros regionais já consolidados como

Teófilo Otoni, Nanuque e Diamantina. A heterogeneidade desta Mesorregião, que

se espalha por três estados e, portanto está sujeita a políticas desiguais de

desenvolvimento, também aparece como um obstáculo a uma maior integração da

região como um todo.

Há uma grande tendência, como já referido acima, dos maiores centros

regionais, Teófilo Otoni e Diamantina, fortalecerem suas relações entre si e entre a

cidade de Teófilo Otoni com os centros da Bahia e do Espírito Santo em

detrimento dos demais centros emergentes de Minas Gerais. Apesar da pouca

permeabilidade e da grande dificuldade de deslocamento interno que ainda

persiste a cidade de Teófilo Otoni ainda aparece como o centro regional mais

importante, mais bem equipada e capaz de influenciar o maior número de centros

emergentes e pequenas cidades desta região.

Todas as Microrregionais inseridas na Mesorregião e grande parte dos

centros localizados nos outros dois estados ainda permanecem de certa maneira

dependentes em relação à cidade de Teófilo Otoni. Apesar de ainda manter uma

posição de destaque como pólo regional, a cidade de Teófilo Otoni parece estar,

em certa medida, estagnada. Com efeito, isto faz com que os centros urbanos

emergentes tomem a si a tarefa de desenvolvimento de sua respectiva

Microrregião, como é o caso das de Diamantina, Nanuque e os centros

emergentes da Bahia e do Espírito Santo. Este aspecto fica mais claro quando

observamos os índices de desenvolvimento apresentados por estes três centros

na última década.

A rede urbana em gestação e em formação, observada por Amorim

Filho e Abreu no estudo de 1982, tende a se consolidar cada vez mais na medida

em que a cidade de Teófilo Otoni finalmente se firmar como centro regional,

aumentando seu grau hierárquico urbano. Também deve-se observar algum

avanço na consolidação desta rede, na medida em que seus centros emergentes

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93

cada vez mais se estruturarem sendo capazes, por sua vez, de alcançar níveis

mais altos na hierarquia urbana.

Para tanto é necessário que a interação interna melhore sensivelmente

o que depende diretamente de políticas de melhoramento da capilaridade

rodoviária regional e da própria qualidade da malha rodoviária existente,

melhorando a relação dos grandes centros regionais com aqueles que hoje

apresentam uma posição marginal. O melhoramento dos equipamentos de

educação e saúde tanto em Teófilo Otoni como nos demais centros emergentes

também são aspectos cruciais para um melhor aparelhamento da região.

A estruturação e o crescimento da indústria da celulose, em direção ao

médio e alto Mucuri, podem contribuir para um maior desenvolvimento regional,

podendo se transformar numa alternativa ao setor de comércio e serviços já

bastante consolidado. A presença desta indústria na região pode ser forte o

suficiente para justificar, por exemplo, a reconstrução da Ferrovia Bahia - Minas

ligando as plantas industriais beneficiadoras do produto, na região litorânea da

Bahia e do Espírito Santo, com os maciços plantados no médio e alto Mucuri.

Duas grandes possibilidades se abrem a partir da reconstituição desta

ferrovia: sua conexão com o sistema sudeste até o porto de Vitória ou a

construção de um porto próprio na porção sul do Estado da Bahia, o que poderia

finalmente retirar a região da posição periférica em que se encontra principalmente

a porção regional pertencente ao Estado de Minas Gerais, que se encontra numa

posição marginal mesmo dentro da própria mesorregião.

Institucionalmente deveria ser estimulada a formação do comitê da

Bacia do Rio Mucuri e do São Mateus, transformando-a em instância de

planejamento integrado das diversas atividades na Mesorregião. Esta instância de

planejamento também pode funcionar como regulador e balizador de atividades

impactantes para o meio ambiente, o que pode fortalecer as relações internas na

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94

medida em que trate e analise problemas semelhantes de maneira integrada num

âmbito intra-regional.

O aspecto ambiental da problemática regional pode ser considerado

como importante na medida em que tende a tratar, num mesmo fórum, ou a partir

de uma ótica única, tanto problemas eminentemente urbanos quanto rurais. O

desenvolvimento do meio rural nesta região incide de maneira direta nos índices

de desenvolvimento regionais, já que grande parte de seu território se encontra

dedicado à produção agrícola de base primária ou semi-extrativista ou à extração

mineral também realizada em bases pré-fabris.

A mudança do paradigma produtivo regional, tanto no meio rural quanto

urbano, aparece como cerne da aparente estagnação da porção mineira desta

região. Principalmente quando observamos que o perfil da região se mantém,

desde a década de 60, relacionado ao tratamento primário de produtos agrícolas

com um perfil industrial que pouco soma aos índices de desenvolvimento

regionais, com exceção dos municípios litorâneos extremamente ligados à

indústria de celulose.

Apesar de a atividade econômica regional ter se concentrado,

basicamente, na prestação de serviço nas últimas quatro décadas, a região ainda

demonstra grande dificuldade de desempenhar suas funções de maneira plena.

Historicamente o nível extremamente baixo de mobilidade intra-regional dificulta

sobremaneira o processo de distribuição de produtos em sua rede de comércio,

comunicação e logística em geral o que têm se configurado como um entrave para

a fixação da população local na própria região, fazendo com que os índices

demográficos, dos centros regionais mais expressivos, se mantenham estáveis

nas últimas décadas.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Patativa do Assaré

“Saudade é canto magoado No coração de quem sente É como a voz do passado

Ecoando no presente.”

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Todos os dados relacionados neste trabalho demonstram basicamente

que a Mesorregião estudada começa a dar demonstrações de que o processo de

consolidação como rede urbana, que foi identificado em 1982 como ainda

incipiente, finalmente tende a se solidificar. Ainda assim, mesmo que a região

venha a finalmente se consolidar como uma rede urbana estruturada, ainda

demonstra inconsistências bastante profundas do ponto de vista sócio-econômico

e espacial.

A região ainda apresenta um grau muito baixo de permeabilidade entre

os seus diversos centros urbanos o que determina um baixo grau também de

interação intra-regional, acarretando uma diminuição das relações horizontais,

definidas por Brunet (1972), como relações de lugar para lugar, de pessoa para

pessoa (interpessoais) e de subsistema para subsistema.

Além das relações extra-regionais também as relações internas se

mostram, sob muitos aspectos, desequilibradas. As oscilações demográficas

bastante intensas observadas em toda a Mesorregião, o ambiente natural

extremamente modificado e os baixos índices de investimentos importantes na

economia regional, principalmente no Jequitinhonha, são coerentes com a perda

de referência do imaginário local o que sugere forte grau de desequilíbrio nas

relações intra-regionais, como verificado na análise do mapeamento.

A cidade de Teófilo Otoni aqui aparece como pólo regional mais

importante, mas novos centros, principalmente as cidades litorâneas do sul do

estado da Bahia e norte do estado do Espírito Santo, aparecem também com

elevados graus de hierarquização regional, o que sugere, como analisado

anteriormente, que as relações entre estes municípios e o pólo regional em Minas

Gerais, no caso, Teófilo Otoni devem se intensificar como relações de troca e não

de dependência.

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Estes centros têm se desenvolvido basicamente por apresentar maiores

índices de investimento de capital em atividades bastante lucrativas como a

produção de celulose e o turismo, que fazem grande uso da força de trabalho local

e contam também com um alto nível de informação, logística e comunicabilidade.

A seu favor também conta a presença de um grande eixo rodoviário, a

BR 101, que estrutura todos os fluxos regionais internos e externos, o que não

acontece com a BR 116 na porção mineira da região já que esta rodovia tronco,

não encerra o problema de comunicabilidade e transporte dentro da mesorregião.

Também se observa uma maior permeabilidade regional entre os

centros litorâneos e a cidade de Teófilo Otoni, muito maior do que entre Teófilo

Otoni e o resto da região, principalmente em relação aos centros localizados no

vale do Jequitinhonha. Isto se deve ao fato de que a MGT 418 (estrada do boi)

fortalece as estruturas regionais no sentido leste-oeste.

Este fortalecimento intra-regional já existia historicamente desde a

implantação da primeira estrada de rodagem do Brasil, as 30 léguas que ligavam

Santa Clara (Nanuque) a Filadélfia (Teófilo Otoni) e estabeleceu uma forte ligação

interna regional, pois a ferrovia ligava o sul da Bahia até Araçuaí, localizada no

médio Jequitinhonha. Ainda que a Estrada do Boi, MGT 418, cumpra o papel de

ligação e transporte que outrora fora cumprido pela Ferrovia Bahia – Minas, ela

não estabelece outras relações econômicas que a ferrovia estabelecia como a

ligação a um porto, que potencialmente habilitava a região a realizar processos

comerciais e produtivos mais complexos e estruturados. Além disso, a ligação

rodoviária cessa em Teófilo Otoni não incluindo uma ligação expressa com o Vale

do Jequitinhonha.

Esta talvez seja a maior descontinuidade observada na região. Um

desequilíbrio das estruturas regionais que fazem com que as relações no eixo

leste-oeste, principalmente entre o município de Teófilo Otoni e os centros

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localizados no litoral, sejam mais expressivas do que entre os demais centros

regionais no Jequitinhonha, tanto a leste quanto ao norte da cidade de Teófilo

Otoni.

A dimensão histórica regional determina, desde o desbravamento do

Mucuri, uma forte relação dos fluxos de entrada e saída que sempre seguem,

mesmo que grosseiramente, o eixo do rio Mucuri, o que induz sobremaneira uma

relação regional interna mais sólida neste sentido. Este fato acaba por assegurar

também uma maior permeabilidade e comunicabilidade desta porção regional

mesmo esta estando politicamente dividida e espalhada por três diferentes

estados. O eixo leste-oeste é intuitivamente entendido como o mais adequado e o

que mais atende as necessidades de conexão na região.

Também no sentido norte-sul pode-se observar o aparecimento de

alguns centros mais bem estruturados e com um maior grau de hierarquização

regional, mas suas conexões e suas relações com o pólo regional e com os

demais centros ainda são muito precárias. O eixo que estrutura o sentido norte-

sul, a BR 116, também é relativamente recente na história da região e, como

identificado anteriormente, não estabelece uma relação de maior desenvolvimento

regional na medida em que conecta a região com o resto país.

Há uma forte indicação de que a reestruturação regional interna é tão

ou mais importante para o desenvolvimento da região quanto a melhoria das

ligações externas da região com o resto do país. O aumento das conexões

rodoviárias asfaltadas ou pelo menos de melhor qualidade, entre o pólo regional e

os centros do alto, médio e baixo Jequitinhonha deve aumentar significativamente

o grau de permeabilidade regional, forçando um melhor aparelhamento tanto da

cidade de Teófilo Otoni quanto dos demais centros regionais. Este maior

aparelhamento poderia contribuir no sentido de estancar os processos de

migração expressivos que têm determinado índices de crescimento demográficos

estagnados ou negativos.

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No que toca a questão de logística, comunicação e transporte a

população em geral, principalmente do Mucuri, tem mostrado elevado interesse no

sentido de uma reabilitação do modal ferroviário onde outrora existiu a Ferrovia

Bahia – Minas. Aparentemente isto seria determinante no processo de

desenvolvimento da região, que reconheceria este modal de transporte como seu

modo mais adequado de estabelecer e equilibrar suas estruturas e relações intra e

extra regionais, isto se refletiria diretamente nos índices de desenvolvimento

humanos que certamente demonstrarão um aumento significativo, fazendo com

que a região finalmente se qualificasse como uma rede urbana estruturada.

A respeito deste anseio pelo modal ferroviário é importante lembrar que

este modal de transporte pouco somaria para a realidade econômica e produtiva

regional se o mesmo não estiver conectado, como outrora, a outras estruturas

produtivas ou de logística como um porto ou a rede ferroviária nacional já

existente. O estabelecimento de uma ferrovia na região com o objetivo primordial

de servir como transporte de matéria prima dos maciços de eucalipto para as

indústrias de celulose no litoral, não encerra o problema estrutural da região.

Certamente o restabelecimento do modal ferroviário para esta finalidade

específica, mas ainda desconectado do resto do sistema logístico nacional,

somente abriria uma nova possibilidade de produção e desenvolvimento regional a

longo prazo.

O quadro regional mostra pela análise dos índices de desenvolvimento

mapeados, que a região, principalmente do médio Jequitinhonha, demonstra os

menores índices sócio-econômicos, além de uma grande dependência do pólo

regional mais expressivo, a cidade de Teófilo Otoni. A região do Mucuri parece ter

se acomodado, sob o comando da cidade de Teófilo Otoni, em sua posição de

provedora regional de produtos agrícolas, comércio e serviços. Isto parece ter

gerado um enclave ao desenvolvimento dos demais centros do Mucuri que

apresentam índices de desenvolvimento maiores do que os da região do

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Jequitinhonha, mas que claramente demonstra um processo de estagnação

continuado. Por outro lado, os centros litorâneos do sul do Estado da Bahia e

norte do Estado do Espírito Santo e os demais centros sob sua influência direta,

demonstram índices de desenvolvimento que vêm aumentando consideravelmente

em relação às outras duas regiões.

A mudança no paradigma da produção regional, que se mantém

virtualmente o mesmo nas últimas quatro décadas, seria de extrema importância

para a região. Reconhecer as novas possibilidades produtivas em todos os

setores, primário, secundário e terciário presentes hoje na região e relacioná-las

com uma posição vantajosa de região “carrefour” no cenário nacional, seria

determinante como ponto de partida para um novo rearranjo regional que possa

modificar um quadro descontínuo desta região outrora integrada.

Um dos sonhos do visionário e empreendedor Teófilo Ottoni, quando do

desbravamento da região no século XIX, se configurava no eventual

desmembramento dos Vales do Jequitinhonha e do Mucuri de Minas Gerais, do

sul do estado da Bahia e da bacia do São Mateus, no Espírito Santo, para a

formação do estado do Mucuri. Este estudo se encerra com a inauguração de uma

nova possibilidade de investigação regional. Apesar de a formação do Estado do

Mucuri, como unidade autônoma, ser virtualmente impossível, podemos nos

perguntar o quanto as estruturas regionais aqui identificadas vêm interagindo de

maneira integrada. Será que temos um Estado do Mucuri em andamento? Ou será

que pelo menos assim deveríamos ver esta Mesorregião, como um Estado com

fronteiras virtuais? Talvez isto seja possível como quando tudo começou: com

uma ferrovia e um porto no mar.

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Anexo I

Municípios da Mesorregião do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri - 2000

ID Nome do Município Unidade da Federação

Unidade da Federação ID Nome do

Município 1 Águas Formosas Minas Gerais Bahia 2 Alcobaça 2 Alcobaça Bahia 14 Caravelas 3 Almenara Minas Gerais 27 Eunápolis 4 Angelândia Minas Gerais 35 Guaratinga 5 Araçuaí Minas Gerais 36 Ibirapua 6 Aricanduva Minas Gerais 37 Itabela 7 Ataléia Minas Gerais 38 Itagimirim 8 Bandeira Minas Gerais 40 Itamaraju 9 Berilo Minas Gerais 42 Itanhém

10 Bertópolis Minas Gerais 52 Jucuruçu 11 Cachoeira de Pajeú Minas Gerais 54 Lajedão 12 Capelinha Minas Gerais 59 Medeiros Neto 13 Caraí Minas Gerais 64 Mucuri 14 Caravelas Bahia 67 Nova Viçosa 15 Carbonita Minas Gerais 79 Porto Seguro 16 Carlos Chagas Minas Gerais 81 Prado

17 Catuji Minas Gerais 86 Santa Cruz Cabrália

18 Chapada do Norte Minas Gerais 95 Teixeira de Freitas

19 Comercinho Minas Gerais 99 Vereda

20 Conceiçao da Barra Espírito Santo Espírito Santo 20 Conceiçao da Barra

21 Coronel Murta Minas Gerais 46 Jaguaré 22 Couto de Magalhães de Minas Minas Gerais 62 Montanha 23 Crisólita Minas Gerais 65 Mucurici 24 Datas Minas Gerais 75 Pedro Canário 25 Diamantina Minas Gerais 76 Pinheiros 26 Divisópolis Minas Gerais 77 Ponto Belo 27 Eunápolis Bahia 91 Sao Mateus

28 Felício dos Santos Minas Gerais Minas Gerais 1 Águas Formosas

29 Felisburgo Minas Gerais 3 Almenara 30 Francisco Badaró Minas Gerais 4 Angelândia 31 Franciscópolis Minas Gerais 5 Araçuaí 32 Frei Gaspar Minas Gerais 6 Aricanduva

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33 Fronteira dos Vales Minas Gerais 7 Ataléia 34 Gouvêa Minas Gerais 8 Bandeira 35 Guaratinga Bahia 9 Berilo 36 Ibirapua Bahia 10 Bertópolis

37 Itabela Bahia 11 Cachoeira de Pajeú

38 Itagimirim Bahia 12 Capelinha 39 Itaipé Minas Gerais 13 Caraí 40 Itamaraju Bahia 15 Carbonita 41 Itamarandiba Minas Gerais 16 Carlos Chagas 42 Itanhém Bahia 17 Catuji

43 Itaobim Minas Gerais 18 Chapada do Norte

44 Itinga Minas Gerais 19 Comercinho 45 Jacinto Minas Gerais 21 Coronel Murta

46 Jaguaré Espírito Santo 22

Couto de Magalhães de Minas

47 Jenipapo de Minas Minas Gerais 23 Crisólita 48 Jequitinhonha Minas Gerais 24 Datas 49 Joaíma Minas Gerais 25 Diamantina 50 Jordânia Minas Gerais 26 Divisópolis

51 José Gonçalves de Minas Minas Gerais 28 Felício dos Santos

52 Jucuruçu Bahia 29 Felisburgo

53 Ladainha Minas Gerais 30 Francisco Badaró

54 Lajedã+C24o Bahia 31 Franciscópolis 55 Leme do Prado Minas Gerais 32 Frei Gaspar

56 Machacalis Minas Gerais 33 Fronteira dos Vales

57 Malacacheta Minas Gerais 34 Gouvêa 58 Mata Verde Minas Gerais 39 Itaipé 59 Medeiros Neto Bahia 41 Itamarandiba 60 Medina Minas Gerais 43 Itaobim 61 Minas Novas Minas Gerais 44 Itinga 62 Montanha Espírito Santo 45 Jacinto

63 Monte Formoso Minas Gerais 47 Jenipapo de Minas

64 Mucuri Bahia 48 Jequitinhonha 65 Mucurici Espírito Santo 49 Joaíma

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Municípios da Mesorregião do Vale do Jequitinhonha e do Mucuri - 2000

ID Nome do Município Unidade da Federação

Unidade da Federação ID Nome do

Município 66 Nanuque Minas Gerais 50 Jordânia

67 Nova Viçosa Bahia 51 José Gonçalves de Minas

68 Novo Cruzeiro Minas Gerais 53 Ladainha 69 Novo Oriente de Minas Minas Gerais 55 Leme do Prado 70 Ouro Verde de Minas Minas Gerais 56 Machacalis 71 Padre Paraíso Minas Gerais 57 Malacacheta 72 Palmópolis Minas Gerais 58 Mata Verde 73 Pavao Minas Gerais 60 Medina 74 Pedra Azul Minas Gerais 61 Minas Novas 75 Pedro Canário Espírito Santo 63 Monte Formoso 76 Pinheiros Espírito Santo 66 Nanuque 77 Ponto Belo Espírito Santo 68 Novo Cruzeiro

78 Ponto dos Volantes Minas Gerais 69 Novo Oriente de Minas

79 Porto Seguro Bahia 70 Ouro Verde de Minas

80 Poté Minas Gerais 71 Padre Paraíso 81 Prado Bahia 72 Palmópolis 82 Presidente Kubitschek Minas Gerais 73 Pavao 83 Rio do Prado Minas Gerais 74 Pedra Azul

84 Rubim Minas Gerais 78 Ponto dos Volantes

85 Salto da Divisa Minas Gerais 80 Poté

86 Santa Cruz Cabrália Bahia 82 Presidente Kubitschek

87 Santa Helena de Minas Minas Gerais 83 Rio do Prado 88 Santa Maria do Salto Minas Gerais 84 Rubim 89 Santo Antônio do Jacinto Minas Gerais 85 Salto da Divisa

90 Sao Gonçalo do Rio Preto Minas Gerais 87 Santa Helena de Minas

91 Sao Mateus Espírito Santo 88 Santa Maria do Salto

92 Senador Modestino Gonçalves Minas Gerais 89 Santo Antônio do Jacinto

93 Serra dos Aimorés Minas Gerais 90 Sao Gonçalo do Rio Preto

94 Setubinha Minas Gerais 92 Senador

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Modestino Gonçalves

95 Teixeira de Freitas Bahia 93 Serra dos Aimorés

96 Teófilo Otoni Minas Gerais 94 Setubinha 97 Turmalina Minas Gerais 96 Teófilo Otoni 98 Umburatiba Minas Gerais 97 Turmalina 99 Vereda Bahia 98 Umburatiba 100 Veredinha Minas Gerais 100 Veredinha 101 Virgem da Lapa Minas Gerais 101 Virgem da Lapa

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Anexo II TABELA: Jeq_Mucuri_expandida_2000.TAB

DESCRIÇÃO: municípios do Jequitinhonha – Mucuri (ex pandida) (dados sobre o IDH em 2000) PROJEÇÃO: longitude/latitude (SAD 69)

TIPO DO ARQUIVO: MapInfo

Descrição Esperança de vida ao nascer (em anos)

(Número médio de anos que as pessoas viveriam a partir do nascimento) Taxa de alfabetização de adultos (%)

(Percentual de pessoas acima de 15 anos de idade que sabem ler e escrever.) Taxa bruta de freqüência escolar (%)

(Proporção entre o número total de pessoas em todas as faixas etárias que freqüentam os cursos fundamental, segundo grau ou superior em relação ao total de pessoas na faixa etária de 7 a 22 anos)

Descrição Renda per capita (em R$ de 2000)

(Razão entre o somatório da renda de todos os indivíduos (incluindo aqueles com renda nula) e a população total.) Índice de longevidade (IDHM-L)

(Índice do IDHM relativo à dimensão Longevidade. É obtido a partir do indicador esperança de vida ao nascer, através da fórmula: (valor observado do indicador - limite inferior) / (limite superior - limite inferior), onde os limites inferior e superior são equivalentes a 25 e 85 anos, respectivamente.)

Índice de educação (IDHM-E) (Índice do IDHM relativo à Educação. Obtido a partir da taxa de alfabetização e da taxa bruta de frequência à escola, convertidas em índices por: (valor

observado - limite inferior) / (limite superior - limite inferior), com limites inferior e superior de 0% e 100%. O IDHM-Educação é a média desses 2 índices, com peso 2 para o da taxa de alfabetização e peso 1 para o da taxa bruta de freqüência.)

Índice de renda (IDHM-R) Índice de Desenvolvimento Humano Municipal

(É obtido pela média aritmética simples de três índices, referentes às dimensões Longevidade (IDHM-Longevidade), Educação (IDHM-Educação) e Renda (IDHM-Renda))

Classificação na UF (Posição do município dentro do estado a que pertence em relação ao IDHM)

Classificação Nacional (Posição do município no Brasil em relação ao IDHM)

População residente - Total População residente – Homens População residente – Mulheres População residente – Urbana

População residente - Rural

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