O PROFESSOR PDE E OS DESAFIOSDA ESCOLA PBLICA PARANAENSE

2009

Verso Online ISBN 978-85-8015-054-4Cadernos PDE

VOLU

ME I

O GAUCHE: NAS FEIES QUIXOTESCAS E NOS PERSONAGENS DO CONTO O ALIENISTA, DE MACHADO DE ASSIS

Vera Lcia Berti1 Roselene de Fatima Coito2

Resumo

A busca de estratgias eficazes para o ensino da leitura na escola tem sido alvo de constantes discusses no meio acadmico e tem servido de base para vrios estudos. Uma constante, nestas discusses e estudos, a aluso a um momento (que j conta com dcadas) de grandes incertezas acerca de como o professor poderia desenvolver a prtica da leitura, em especial da leitura da literatura, de modo que ela se apresente significativa e prazerosa ao aluno. Na busca destas estratgias, o presente artigo prope que se estimule a utilizao dos conceitos da Emotologia, visando contribuir para o desenvolvimento de leitores que se apropriem da leitura no apenas como obrigao, mas como desafio ao prazer. Ao se desenvolver atividades de antecipao de leitura, baseadas nos conceitos da Emotologia, observou-se o desabrochar das potencialidades humanas, uma vez que os resultados surgiram como decorrncia de se mobilizarem as potencialidades dos alunos, confirmando a relevncia da emotizao de imagens no cotidiano de todo processo ensino e aprendizagem.

Palavras-Chave: Leitura, Literatura, Emotologia

1 Professora Aprovada no PDE. Turma 2009 2011 Professora no Colgio Estadual Costa e Silva, em

Itaipulndia- Pr. Especialista em Literaturas Ibero-Americanas Contemporneas em Lngua Portuguesa e

Espanhola pela Universidade Estadual do Oeste do Paran - UNIOESTE Campus de Foz do Iguau.

2 Professora Ps-doutorada pela Ecole des Hautes Etudes em Sciences Sociales Ehees- Paris sob a Superviso

de Roger Chartier e Professora na Graduao e Ps-graduao da Universidade Estadual do Oeste do Paran

UNIOESTE Campus de Marechal Candido Rondon e Cascavel.

Introduo

Atitudes como gostar de ler e interessar-se pela leitura e pelos livros so construdas. Para alguns, no espao familiar ou em outras esferas de convivncia em que a escrita circula; para outros, o contato com a leitura e os livros s se dar na escola. Neste sentido, no resta dvidas de que na escola que este gosto deve e pode ser incentivado e formado. Para tanto, importante que o aluno perceba a leitura como um ato necessrio, que depois pode passar a ser prazeroso, dependendo das estratgias utilizadas para tal ato. Neste sentido, a escola passa a ser um espao de interao, no qual se deva ler e discutir diversos gneros textuais e discursivos, uma vez que um leitor pode se deparar com variados gneros em variados suportes de leitura na atualidade. E, sem dvida, o gnero literrio, dentre outros gneros, pode incitar a sensibilidade esttica, expandindo a capacidade de anlise crtica da realidade, ao criar relaes efetivas e afetivas com os contedos trabalhados.

Sabe-se que, muitas vezes, o exerccio de leitura na sala de aula tem sido banalizado, vtima de falsas interpretaes do que realmente significa LER.

Essa m compreenso instaurou prticas de leitura como um processo intuitivo de entendimento de textos, atravs de mecanismos que acabaram se reduzindo a clichs como O que voc achou do texto?, ou Qual a mensagem do autor?, ou a comparaes superficiais com a realidade que cerca o aluno. No se percebe nessa postura a insuficincia desses procedimentos no sentido de favorecer o reconhecimento e a apropriao de mecanismos de linguagem, e no favorece um exerccio que estimule a compreenso das relaes internas e externas que o texto estabelece em sua totalidade. Para muitos, a literatura no se ensina, nem nas escolas de ensino mdio, nem nos cursos superiores de letras, o que se faz uma apresentao das fases da histria literria, seguida de um desfile linear de autores, obras e datas.

De fato, literatura no se ensina, se o objetivo deste ensino for formar poetas e romancistas. Porm sabe-se que esta no a pretenso da escola. O que se deveria ensinar ler, ler o texto literrio. Como em qualquer atividade de ensino, eficiente e significativa, preciso atingir a sensibilidade do aluno, envolvendo-o, fisgando-o, e assim conduzi-lo para a vida que existe fora da escola.

E, conforme afirma Marisa Lajolo,

Mas a leitura literria tambm fundamental. literatura, como linguagem e como instituio, que se confiam os diferentes imaginrios, as diferentes sensibilidades, valores e comportamentos atravs dos quais uma sociedade expressa e discute, simbolicamente, seus impasses, seus desejos, suas utopias. Por isso a literatura importante no currculo escolar: o cidado, para exercer plenamente sua cidadania, precisa apossar-se da linguagem literria, alfabetizar-se nela, tornar-se seu usurio competente, mesmo que nunca v escrever um livro: mas porque precisa ler muitos (LAJOLO, 1999, p.105/106).

Para tanto a formao de um leitor deve valer-se de vivncias sistemticas de leitura carregada de significado e de sentido que contribuam para o ser/estar no mundo. Deve envolver prticas sociais, nas quais o indivduo sinta necessidade de ler. Deve, ainda, fazer do ato de ler um momento de apropriao de saberes, de conhecimento de si e do mundo e, sempre que possvel, tambm um momento de prazer.

Um livro no apenas aquilo que est escrito nele, mas tambm a leitura que o leitor faz desse texto. Os dois processos so ideolgicos. Os dois pressupem uma determinada viso de mundo. Para que o livro tenha um potencial rico, com muitas significaes, necessrio que seja cuidado, tenha qualidades estticas, seja exemplo de criao original e no estereotipado. Mas, para que esse livro possa manifestar esse seu potencial, torn-lo real, indispensvel que encontre um leitor generoso que possa faz-lo dialogar com muitas outras obras, com vises de mundo enriquecidas pela pluralidade e pela aceitao democrtica da diferena. Somente dessa maneira o livro deixar de ser um ponto de chegada para se transformar num ponto de partida permanente para outras leituras de textos e do mundo. Ou dos inumerveis mundos que existem, que no queremos mais que continuem existindo ou que sonhamos que um dia possam vir a existir (MACHADO, 1999, p.67).

Confirma-se ento que o ato de ler sempre foi e sempre ser uma prtica social que envolve atitudes, gestos e habilidades que so mobilizados pelo leitor, tanto no ato da leitura propriamente dito, como no que antecede e no que decorre dela. Depois que o leitor realiza a leitura, os textos que leu vo determinar suas escolhas futuras servindo de contraponto a outras leituras.

De fato, neste incio de sculo, os avanos tecnolgicos foram surpreendentes, e a convivncia num mesmo tempo de manifestaes culturais dos mais diversos gneros e naturezas, onde a informao corre frentica, fez com que competisse escola a difcil tarefa de, em meio s leituras rpidas e at superficiais dos meios de comunicao de massa, seduzir o jovem leitura literria

Quanto tempo leva para a formao desse leitor? Quais seriam os procedimentos metodolgicos mais adequados? Como capacitar os professores para esse desafio? Essas so questes que perpassam o universo educacional brasileiro, tendo em vista que ainda falta muito para nos considerarmos um pas de leitores, especificamente, de literatura.

Ter acesso a livros , sem dvida, um primeiro passo. Entretanto, tambm no se tem dvidas quanto ao fato de a posse do livro, por si s, no garantir plenamente o desenvolvimento do leitor proficiente. Vrios fatores devem ser levados em conta neste desenvolvimento.

Na busca destas estratgias, este artigo pretende relatar o resultado terico e prtico de um estudo que se efetivou numa importante ao de implementao do Projeto de Interveno Pedaggica na Escola, uma das atividades propostas pelo PDE, da qual resultou na elaborao do Caderno Pedaggico com o tema: a anlise de personagens da literatura atravs da emotizao de imagens. Nele esto propostas oficinas literrias com o objetivo de estimular prticas que, atravs dos conceitos da Emotologia, contribuam para o desenvolvimento de leitores que se apropriem da leitura literria no apenas como obrigao, mas como desafio ao prazer. Atravs de atividades variadas e ldicas, envolvendo diferentes gneros da esfera literria, buscou-se mostrar que a literatura, quando bem trabalhada, capaz de promover a autorrealizao e o desabrochar das potencialidades humanas.

Da importncia da leitura literria na sensibilizao do leitor

Antes de falar sobre teorias que possam incentivar a leitura, preciso partir do bvio: apenas lendo que se aprende a ler e a gostar de ler; lendo que se aprende a ter satisfao com a leitura; a ter opinies de leitura e a julgar valores estticos. E isso se aprende dentro e fora da escola. Assim no basta dizer que a nica sada para o desenvolvimento do ser humano a educao, pois o que est em jogo definir o tipo de educao, ou melhor, que condies so oferecidas para que as pessoas se desenvolvam.

Em termos educacionais, a realidade brasileira preocupante. Avaliaes - nacionais e internacionais constataram que um nmero significativo de alunos brasileiros no compreende o que l, no faz relaes entre as mltiplas informaes que recebe, tem dificuldade em interpretar, em apropriar-se do conhecimento trazido pela leitura e fazer dedues. Consequentemente tem dificuldade de posicionar-se criticamente frente ao que l. Levantamento do Ministrio da Educao revela que 20% dos brasileiros entre 15 a 19 anos so analfabetos3, o que representa 12% da populao brasileira. Segundo relatrio da Organizao das Naes Unidas para a Educao, Cincia e Cultura (Unesco), o Brasil tem o stimo maior contingente de analfabetos do planeta. Estes, no entanto, esto fora da escola.

Aqueles que atuam na rea educacional, em todos os nveis, no desconhecem o quanto se tem buscado um ensino de leitura eficiente, no s para tornar o indivduo autnomo na interlocuo com os diversos tipos de textos presentes na sociedade letrada - sociedade que tem como uma de suas prticas sociais a interao por meio da leitura e da escrita -, mas para tambm poderem fruir, esteticamente, obras que tm na escrita a concretizao de uma realizao artstica.

O fato de a formao escolar no conseguir desenvolver adequadamente, em algumas circunstncias, habilidades de leitura e escrita necessrias para que o indivduo se sinta um leitor autnomo, contribui para que o Brasil continue sendo um pas carente de leitores proficientes. A proficincia em leitura considerada como a 3 Dados retirados da Revista: Mente & Crebro. Ano XVI. n 193.p. 53.

capacidade de o leitor compreender e interpretar o que l e ainda apreciar o que leu e se posicionar criticamente sobre isso.

Diversos so os fatores que podem contribuir para a manuteno desse dficit de leitura entre os brasileiros. Todavia, um fator precisa ser analisado e cercado por iniciativas, especialmente no mbito escolar: a necessidade de estratgias para as pessoas internalizarem a leitura como prtica cotidiana a partir, inclusive, da conscincia de que, no mundo urbanizado, as prticas sociais que garantem parte da subsistncia com dignidade supem um indivduo que tenha se apropriado da leitura e da escrita. Nesse sentido, a leitura passa a ser no apenas elemento distintivo de classe social, ou segmento cultural, mas sim instrumento efetivo e eficiente para uma atuao mais autnoma na sociedade. Se a escritura configura como meio transmissor de informao, a leitura se configura como meio de aquisio do que se passa ao redor do homem. A leitura , portanto, um ato social, e como tal, uma questo pblica.

Nas palavras de Arajo (2000, p.9), a leitura deve ser usada como um instrumento de transformao dos indivduos na perseguio de uma causa comum a todos: a felicidade inculpada das pessoas, o pleno prazer de todos que fazem parte da nossa sociedade.

Poderamos aqui listar vrios pensadores e suas concepes a respeito da importncia da leitura. Em todos encontraramos razes de sobra para defendermos tal atividade humana como essencial. Mas h algo que no poderamos deixar de mencionar: ponto aceito sem contestao que a leitura do texto escrito constitui uma das conquistas da humanidade. Pela leitura, o ser humano no s adquire o conhecimento, como pode transform-lo em processo de aperfeioamento contnuo. A aprendizagem da leitura possibilita a emancipao da criana e a assimilao dos valores da sociedade.

cada vez mais forte o consenso sobre a importncia da apropriao de bens culturais como forma de instrumentalizar o indivduo no s para o exerccio de uma cidadania consciente, como tambm para um desenvolvimento pessoal mais consistente. Alm da necessidade de manter o corpo sadio, essencial alimentar o esprito. Dentre outros, podem ser considerados alimentos para o esprito a ampliao do universo cultural, o desenvolvimento da sensibilidade esttica, o domnio de linguagens: ferramentas que, seguramente, contribuem tanto para o

indivduo compreender melhor o mundo que o cerca quanto para analisar e refletir mais profundamente sobre as relaes interpessoais de seu cotidiano.

Sabemos mais do que ningum o que conviver com a pluralidade de idias, de vivncias, de experincia, de sonhos, multiplicidade de sensaes e de emoes no cotidiano. Quantas perspectivas e projetos delineiam-se no dia a dia? Quantas viagens imaginrias no so empreendidas no tempo e no espao?

Exercitar o olhar plural que tem a capacidade de ver/estabelecer relaes entre as mltiplas manifestaes tanto do nosso mundo interior quanto do mundo que nos cerca preferencialmente sob a tica da tolerncia e da compreenso uma grande conquista que pode levar construo do ser plenamente tico, atuante e seguro de seu papel cidado na transformao da realidade.

A leitura da obra de arte literria pode significar um dos momentos dessa construo. Para Zilberman, a literatura,

quando age sobre o leitor, convida-o a participar de um horizonte que, pela simples razo de provir de um outro, difere do seu. solidria e diferente ao mesmo tempo, sintetizando nesse aspecto o significado das relaes sociais. Quando se soma a isto o fato de que uma obra de poca diversa reatualiza a experincia do passado, de outra maneira inacessvel, compreende-se em que medida a literatura tambm possibilita um relacionamento histrico e temporal praticvel dessa maneira. Eis por que Jauss sublinha seguidamente a natureza emancipatria da arte literria: ela, de algum modo, arranca o indivduo de sua solido e amplia suas perspectivas (ZILBERMAN, 1989, p.110).

De acordo com a autora, a leitura da obra literria oferece uma viso mais ampla dos eventos e estimula o leitor julg-los, levando-o a compreender seu tempo pelo olhar no transcorrer do mesmo.

Emotizar imagens: uma estratgia para o incentivo leitura literria

As Diretrizes Curriculares, que fundamentam nossa prtica pedaggica, propem que se pense o ensino da literatura a partir dos pressupostos tericos da

Esttica da Recepo. Com razes em autores como Sartre, o enfoque dado ao leitor e sua interpretao dos textos passou a ser alvo de estudos, ou seja, o texto literrio s se efetiva de verdade quando recriado pelo ato da leitura. Para isso, alm de compreender e interpretar o que est escrito, o leitor precisa posicionar-se diante do que lhe apresentado. Em outras palavras, ler e compreender plenamente supe o processo de interpretao que dialgico (dilogo) por excelncia. Para se atingir essa dialogicidade, no processo de interpretao e construo, so necessrios sujeitos com uma postura de desvendar no apenas o que est no nvel de mera decodificao, mas ir alm e descobrir o que est implcito no texto ou implcito nas relaes que o texto permite com outros textos (a intertextualidade), e com outros sujeitos.

E para que o dilogo leitor/texto(s) seja pleno, preciso que haja, especialmente com o jovem ainda em formao, uma intensa motivao, que deve necessariamente partir do envolvimento de todos os sentidos. O jovem leitor deve perceber que o ato de ler o envolvimento de um olhar especial de que todo o corpo participa. a leitura que envolve o movimento, os sentidos, para envolver tambm o intelecto e o esprito.

Para isso, o leitor dever exercitar sua capacidade de estabelecer relaes um dos movimentos mais importantes no processo de apropriao do conhecimento. E esta a contribuio mais significativa da educao: ajudar o jovem a ver e compreender seu tempo, a se apropriar do conhecimento de forma a us-lo para refletir sobre temas que representam as buscas, angstias e necessidades constitutivas da essncia humana.

Mais ainda: no se pode esquecer que, para que o texto dialogue com o universo do leitor, preciso que esse leitor mobilize conhecimentos prvios que possibilitem tornar o texto mais significativo. Para isso, o professor deve lanar mo de atividades motivadoras de antecipao de leitura e, um ambiente emotizado vem a ser uma tima alternativa para que a interao sujeito-texto seja fonte de criao, e a leitura passe a fazer parte de gestos dirios: preciso sentir necessidade de ler.

Formar leitores sensveis uma tarefa possvel. No entanto, sabemos que algo precisa ser feito nesse sentido. Algo que, conforme props Paulo Freire em seu livro Pedagogia da Autonomia (1999), realmente possa auxiliar na construo de uma pedagogia nova, mais tolerante, que transforme o ensino numa prtica educativa, crtica e de libertao. Alicerados em competncia (a formao do

docente aqui uma questo relevante, que no pode ser mais protelada), criatividade, pesquisa, generosidade, doao, respeito. Trata-se, portanto, de uma pedagogia da autonomia. Autonomia fundamentada na formao do docente.

Segundo Vigotsky, no seu estudo sobre a relao entre desenvolvimento e aprendizagem, a imitao e o modelo adquirem papel relevante. Trata-se da (ZDP), Zona de Desenvolvimento Proximal, assim definida

...a distncia entre o nvel de desenvolvimento real, que se costuma determinar atravs da soluo independente de problemas, e o nvel de desenvolvimento potencial, determinado atravs da soluo de problemas sob a orientao de um adulto ou em colaborao com companheiros mais capazes (VIGOTSKY, 1984, p.97).

Nessa perspectiva, o aluno capaz de fazer mais com o auxlio de uma pessoa (professores, colegas) do que faria sozinho, por isso, se o gosto pela leitura se aprende, pode ser ensinado. A aprendizagem comporta uma face no espontnea e pressupe interveno intencional e construtiva. Assim, o professor tem um importante papel a desempenhar no desenvolvimento de seus alunos/leitores.

Segundo o Professor Luiz Machado (1990, p.15), o ideal do professor no deve ser de ele mesmo tornar-se um gnio, mas sim, de despertar o gnio que h dentro de seus alunos, no sentido de fazer com que desenvolvam suas faculdades da mente que vo gerar as capacidades. Isso o que normalmente se chama de potencialidades.

Digamos que seu papel o de articulador de princpios e prticas. E isso significa que a leitura da literatura precisa fazer parte da vida do professor.

As perspectivas por um aprendizado mais significativo e para a formao do leitor que queremos esto na prxis do professor, o responsvel em romper com o estabelecido, propor a busca e apontar o avano, mesmo sabendo que a formao e a transformao de um leitor no se do num passe de mgica. Com a escola concorrem todos os estmulos e desestmulos com os quais convivem professores e alunos nas horas vagas, no esquecendo tambm de que a mediao pedaggica nem sempre harmoniosa e de carter homogneo.

Significa tambm que preciso trazer a leitura para a sala de aula, para despertar o sabor de ler; que preciso propiciar condies para o prazer como satisfao de necessidades, para a conscincia do aspecto social da leitura, para a argumentao fundamentada e para o julgamento esttico, como tomada de conscincia do sujeito leitor.

Para isso, preciso problematizar o conhecido, transformando-o num desafio que propicie movimento. E aqui que a Emotologia aparece como alternativa para o desenvolvimento da capacidade de leitura e, consequentemente, para a compreenso de todas as disciplinas. A aplicao da emotologia, no ensino da leitura, fornecer elementos que conduzem decodificao, no s do mundo aparente, mas principalmente, do mundo oculto, constitudo pelas analogias (semelhanas e relaes), que uma dos caminhos para se expandirem a inteligncia e a criatividade.

Pode-se dizer que um dos primeiros registros de execuo inteligente e criativa, tendo como base a emotizao de imagens, de que se tm notcias na histria da humanidade aparece no livro As mil e uma noites. Nele, a bela Sherazade consegue evitar e, por fim, reverter a prpria pena de morte e das mulheres de seu reino em geral, contando uma histria atrs da outra para o rei, criando suspense em relao ao final de cada uma e passando lies subliminares, ou seja, fornecendo elementos, atravs da emotizao, para se expandir a curiosidade, mexendo com os sentidos.

Este fato leva-nos a acreditar que so trs as palavras que fazem uma aprendizagem significativa: estratgia, pessoas e execuo. Porque emotizar (estratgias) o que conta, porque o comeo, o meio e o fim so as pessoas (alunos) e porque preciso despertar a curiosidade atravs da emoo para ter como resultado pessoas suficientemente capacitadas e comprometidas com o que fazem.

H informao em tudo; tudo fala quele que mantm seus sentidos alerta. Compete didtica (do grego didaktik a arte do ensino-) fornecer os conhecimentos de como as pessoas formam significados, principalmente recorrendo a estudos de outras matrias, como a Emotologia, como um dos caminhos da cincia humana. preciso tornar a aprendizagem significativa, isto , o que se expe ao aluno, para que ele aprenda, deve tocar-lhe os significados. Desse modo, podemos criar condies para que a inteligncia e a criatividade se expandam.

Em seu artigo sobre O Segredo da Mobilizao de Capacidades, o Professor Luiz Machado afirma que,

o ser humano nasce com a faculdade de ser inteligente, mas no nasce inteligente. As pessoas nascem com a faculdade de realizarem coisas, quaisquer coisas, das mais simples as mais grandiosas, mas preciso transformar a faculdade em capacidade. A faculdade mais a capacidade latente formam a potencialidade, o potencial. A palavra capacidade vem do latim capax (pronuncia-se cpacs), de capere (cpere), apanhar, entender, e indica a aptido prpria para realizar alguma coisa. (artigo publicado no site www.cidadedocerebro.com.br/ acesso em 23/03/10)

De acordo com o mesmo autor, para acessar o potencial normalmente no usado, precisamos abrir o canal de comunicao com o SAPE (Sistema de Autopreservao e Preservao da Espcie), o gerador e reciclador da energia de adaptao, que podemos chamar de energia emocional, considerando a palavra emoo em seu sentido de energia que impulsiona a pessoa para a ao em busca do resultado. O segredo da mobilizao de capacidades estabelecer objetivos e metas que mexam com a emoo-energia, o que chamamos de emotizao. (Luiz Machado - artigo publicado no site www.cidadedocerebro.com.br/ acesso em 23/03/2010)

Uma das formas de abrir o canal de comunicao com o SAPE desenvolver atividades que envolvam Emotologia, conforme afirma o Professor Luiz Machado:

A emotologia um corpo de conhecimentos sistematizados com base em elementos das neurocincias e da fsica quntica, que, adquiridos via observao, identificao, descrio, investigao experimental, pesquisa e explicao de determinadas categorias de fenmenos e fatos, so metdicos e racionalmente formulados para promover o desenvolvimento das potencialidades humanas como elemento de autorrealizao (MACHADO, 2007, p.16).

Segundo o mesmo autor, a palavra EMOTOLOGIA um hibridismo, formada pelos elementos latinos e (x), fora, para fora e MOTIO ao de mover, e pelo

pospositivo grego LOGIA, de LOGOS, tratado, estudo de, mais o sufixo ia, que forma nomes de cincias. A maneira da formao dessa palavra a mesma de SOCIOLOGIA, do latim SOCIUS, companheiro e LOGOS, criado por Augusto Comte para indicar o estudo cientfico da organizao e do funcionamento das sociedades humanas e das leis fundamentais que regem as relaes sociais, as instituies.

Junto com a EMOTOLOGIA, surge a EMOTOPEDIA, palavra derivada de emotologia, com o elemento grego PAIDIA, educao, para indicar a aplicao dos conhecimentos da emotologia no processo ensino e aprendizagem.

O que distingue a aprendizagem emotizada de outros mtodos de ensino que ela, conforme afirma o professor Luiz Machado,

... o ensino/aprendizagem compatvel com o crebro, pois baseia-se nos mais recentes conhecimentos que possumos sobre o funcionamento deste rgo, principalmente das estruturas que controlam as emoes: o sistema lmbico que, juntamente com o sistema glandular endcrino forma o Sistema de Autopreservao e Preservao da Espcie, (o SAPE), mais responsvel pela inteligncia que o prprio intelecto, ou seja, o conjunto de operaes com as quais atuamos de modo consciente: cognio, memria, produo convergente, produo divergente e avaliao, que constituem o intelecto bsico(MACHADO, 2007, p.80).

A emotologia na praxis: interveno pedaggica

Vrias so as maneiras de nos aproximarmos da literatura. Nos primeiros contatos com a disciplina, somos submetidos a uma viso cronolgica das letras. Mais adiante, so apresentadas a ns as escolas literrias, marcadas por estilos que renegam o imediatamente anterior. Quem se aprofunda nesses estudos, enveredando muitas vezes pela anlise de textos, dedica-se a exegeses ou busca criar estratgias para desconstruir estruturas.

Embora todos os enfoques dados a esse aprendizado sejam importantes, buscou-se mostrar que trabalhar com as personagens literrias pode propiciar uma leitura bastante interessante do texto literrio. No por outro motivo, os grandes tipos

sados da imaginao dos escritores sempre foram a interface mais popular entre o universo dos livros e o leitor.

A proposta do projeto partiu da crena de que a formao do jovem leitor uma sucesso de experincias nas quais ele (o leitor) percebe a apropriao paulatina da palavra efetivamente carregada de sentidos.

As atividades propostas foram desenvolvidas em oficinas e tiveram por objetivo favorecer, atravs dos princpios da emotologia, a anlise de dois grandes personagens da literatura: Dom Quixote (El ingenioso hidalgo da obra Don Quixote de La Mancha) de Miguel de Cervantes I Saavedra, e Simo Bacamarte, do conto O Alienista, de Machado de Assis.

Os melhores personagens da literatura esto entre aqueles que, embora nicos, captam algo do jeito, da psicologia, da alma, enfim, do perfil de cada leitor. H um pouco de Quixote, de Bacamarte em cada um de ns. O que eles tm em comum? Vivem entre os limites da razo e da loucura. Ao escolher esses personagens, procura-se ajeitar o espelho da literatura para que o leitor possa vislumbrar uma faceta qualquer do seu prprio reflexo e refletir sobre as vrias dimenses da vida humana. Agora eu era heri? No, somos anti-heris; afinal, no desvo das virtudes que costuma se produzir a melhor literatura e, como diz o ditado: De mdico e louco, todo mundo tem um pouco. Ou ainda, como disse Drummond: Vai, Carlos! Ser gauche na vida. Alis, o elemento lrico, o gauche, criado pelo poeta, no fora esquecido nesta anlise, j que se identifica profundamente com algumas caractersticas dos personagens cervantino e machadiano como se comprovou no desenvolvimento das oficinas literrias.

No decorrer do trabalho com as oficinas, alm das obras mencionadas, no pudemos deixar de lado a presena da msica, uma das linguagens mais significativas para o jovem. E tambm, para enriquecer as anlises, mencionamos a Alegoria da Caverna, da obra A Repblica, de Plato.

Ao se propor este tema, considerou-se que a formao do leitor proficiente passa tambm pela compreenso de sentidos que afloram de todos os dilogos que uma leitura pressupe: entre textos, entre artes, entre mundos, entre leitores. O grande dilogo foi estruturado pela leitura de obras, distanciadas no tempo, mas aproximadas pela interlocuo atemporal que a arte possibilita.

Para que o trabalho com as oficinas literrias fosse mais rico e proveitoso, o aluno precisou estar munido de conhecimentos prvios sobre os temas que foram

enfocados no desenvolver das atividades de antecipao de leitura. Por isso, se fez necessrio o envolvimento de diferentes profissionais que puderam trazer tais informaes. Com este intuito, antes das oficinas literrias, organizou-se um crculo de palestras com os seguintes temas e profissionais: Um professor de Histria que falou sobre o contexto scio-histrico do

sculo XlX: a importncia e o significado das descobertas cientficas nesse sculo que marcaram no s a vida em sociedade, mas tambm as artes de forma geral; O determinismo cientfico que marcou a viso sobre o homem do final do sculo XlX.

Um psiquiatra que abordou o tema loucura no mbito da sade pblica, ou seja, como a medicina identificou e tratou o louco ao longo dos sculos.

Um especialista em Bullying mostrou-se que a literatura oportuniza uma reflexo tica sobre o contexto de uma poca. Todas as histrias que ouvimos desde crianas personagens ajudam-nos a pensar sobre o certo, o errado e o impacto das normas culturais. Uma histria bem contada motiva pessoas a usar os conhecimentos para interiorizar uma cultura guiada por valores. As boas histrias nos ajudam a transformar inteno em realidade.

Um professor de Filosofia para falar de subjetividade e a alteridade: a imagem que eu tenho de mim e que os outros tem de mim. O olhar que cria um sistema de valorao. O outro significa a projeo do nosso olhar (o jogo do olhar, o jogo de projees). Este profissional trabalhou A Alegoria da Caverna da obra A Repblica de Plato. Este crculo de palestras foi desenvolvido em dois dias, no auditrio. Com

estas informaes o aluno aproveitou mais as atividades das oficinas literrias Neste dia, foi apresentada uma performance teatral com alguns alunos, da

obra Soneto da Loucura do Professor Joo Pedro4, uma adaptao do Filme: Sombras de Goya. Esta atividade contou com a ajuda de um professor de teatro da Secretaria Municipal de Cultura, o qual orientou e ensaiou os alunos. O texto profundo e, no dia da abertura, os demais alunos, participantes do projeto, tiveram a oportunidade de conhecer e entender o texto, explicado pelo prprio autor, o professor Joo Pedro.

4 Joo Pedro professor da UTFPR e, gentilmente, nos cedeu seu texto para o desenvolvimento

deste trabalho.

De acordo com os princpios da Emotologia: quanto mais a emotizao envelopa uma idia, tanto mais esta idia tem chances de se tornar realidade (MACHADO, 1990, p. 78), sendo assim, a dramatizao na comunicao didtica, na aprendizagem, tem um papel muito importante, pois feita por imagens mentais que geram emotizaes. Por isso, atividades ldicas que envolvem dramatizao fizeram parte das oficinas, uma vez que, ao se tornar ator o aluno memoriza seus papis com mais facilidade porque emotiza as falas, pem sentimentos no que ensaia para representar.

De acordo com o professor Luiz Machado, quando o aluno usa imediatamente o que aprendeu, ele acrescenta emotizao ao que est aprendendo, j que tal procedimento baseia-se em seus motivos e no em um assunto que no lhe interessa.

Motivo aquilo que move de dentro para fora. A emotizao (imagens mentais dos benefcios, das vantagens, dos resultados que venham satisfazer necessidades humanas, quer bsicas, quer derivadas) est na linha da motivao para preparar todo o ser a fim de aprender. Mesmo nos assuntos ridos podemos criar interesses pela antecipao dos benefcios, das vantagens decorrentes do seu aprendizado (MACHADO, 1990, p. 78).

Ao se desenvolver atividades de antecipao de leitura, pela ludicidade e pela interao entre os participantes, os resultados surgiram como decorrncia de se mobilizarem as potencialidades dos alunos, uma vez que, desta forma a preocupao com a pessoa. ela que cresce. ela que passa a aprender melhor.

Por isso, o tempo de preparo com cada oficina foi fundamental. Cada oficina organizada para tratar de um tema, de um assunto, mas interligadas. Foram aplicadas no 2 e 3 anos, do Ensino Mdio, do perodo matutino e realizadas no contraturno, uma ou duas vezes por semana, durante a implementao do Projeto de Interveno Pedaggica, no 2 semestre de 2010.

As atividades desenvolvidas nas primeiras oficinas permitiram ao aluno, antes de entrar no universo da obra literria, adentrar em seu prprio universo, atravs de exerccios de autoconhecimento. Com esta perspectiva, o trabalho com a literatura no rejeita o ldico como caminho do conhecer: uma forma de estimular a criatividade, o esprito inventivo, a afetividade, a curiosidade pelo inusitado.

importante, ao buscar-se o desenvolvimento das capacidades humanas, que se saiba distinguir o ldico e o jogo. H o jogo da competio e o jogo ldico. O fator ter de vencer, presente na competio, inexiste no ldico. Ldico vem do latim ludus que significa divertimento, recreao.

Atividades desenvolvidas dentro dos princpios da Emotologia utilizam muitas atividades ldicas.

A arte e o ldico relacionam-se estreitamente: brincar e criar so atos que sempre estiveram juntos. Podemos ilustrar o conceito de jogo, com destaque no seu enfoque ldico, atravs do seguinte trecho de John Huizinga:

Se verificarmos que o jogo se baseia na manipulao de certas imagens, numa certa imaginao da realidade (ou seja, a transformao desta em imagens), nossa preocupao fundamental ser, ento, captar o valor e o significado dessas imagens e dessa imaginao (...) Na criao da fala e da linguagem, brincando com essa maravilhosa faculdade de designar, como se o esprito estivesse constantemente saltando entre a matria e as coisas pensadas. Por detrs de toda expresso abstrata se oculta uma metfora, e toda metfora jogo de palavras. Assim, ao dar expresso vida, o homem cria um outro mundo, um mundo potico, ao lado do da natureza (HUIZINGA, 1999 p. 7).

Essa metfora, a que se refere o autor, enfoca a constitutividade plural da obra literria que pode se tecer por uma intertextualidade explcita ou implcita, pelo cruzamento de outras vozes que estruturam o fazer literrio: o social, o histrico, o cultural, as outras obras do universo da Arte. Para que o aluno possa compreender, absorver e fruir os procedimentos estticos que se apresentam em cada obra, importante que, antes de entrar em contato com o texto, seja realizado um trabalho de sensibilizao do aluno por meio da explorao de outras manifestaes artsticas. Assim, a msica, pode convocar os recursos estilsticos e expressivos que

se pretende explorar no texto literrio e que podem ser mais significativamente percebidos pelo aluno.

Ao entrar em contato diferentes tipos de manifestao artstica e compreender o trabalho de elaborao esttica que se apresenta em diferentes veculos da arte, o aluno apresenta-se mais motivado a interagir com o texto, uma vez que ele aprende a relacionar a leitura no mais com a obrigao e o dever de cumprir tarefas cobradas, mas com o prazer e a diverso, tendo em vista que, perante este novo tratamento, o texto apresenta-se agora com o mesmo carter artstico e encantador da msica, por exemplo, considerada mais como lazer. Esse procedimento busca resgatar a essncia das artes, levando o aluno a perceber e experimentar esteticamente a profunda relao entre os diferentes meios de manifestao artstica e sensibilizando-o para que ele compreenda que a literatura proporciona ao ser humano algo muito mais significativo que a simples conferncia de leitura de um texto e seus aspectos formais: proporciona o prazer esttico por meio da explorao dos recursos estticos e expressivos, do uso singular da palavra, dos sons e das imagens, permitindo ao aluno a diverso, a emoo e a sensibilizao.

Esse conceito de pluralidade na constituio da obra literria reafirmado por Jlia Kristeva (1974, p. 72), quando ela afirma que, todo texto se constri como mosaico de citaes, todo texto absoro e transformao de um outro texto.

Segundo a autora, nesses cruzamentos instala-se a intertextualidade, ou seja, a pluralidade cultural que configura parte da sntese da identidade do ser humano.

E ainda, por transgredir valores estticos e comportamentos padronizados pelos condicionamentos sociais, a obra literria oportuniza uma reflexo tica sobre o que pode significar um olhar tolerante e solidrio para a diferena.

Seguindo essa mesma linha, Regina Zilberman (1987, p. 61) afirma que o leitor, ainda que jovem, pode assumir, enquanto recebedor, uma postura crtica diante do texto literrio, questionando a realidade apresentada na obra de arte e a sua prpria. Ainda, segundo a autora, diante da ocorrncia desse contato crtico com a obra o papel infantil ver-se- desdobrado em personagem e leitor, possibilitando a diviso do discurso, a multiplicao dos nveis de realidade e, enfim, o posicionamento crtico diante das normas. (op.cit., p.86).

CCoonnssiiddeerraaeess FFiinnaaiiss

Com essa experincia desenvolvida, percebeu-se que possvel preparar um ambiente para a emotizao. Nesta experincia, as pessoas so movidas por respostas a estmulos que modificam suas concepes. preciso ampliar o nvel de compreenso dos alunos e toc-los para que eles realmente se interessem pelas aes propostas.

Muita coisa que o sistema de aprendizagem emotizada prega j era preconizada por muitos educadores, desde Scrates, filsofo grego que viveu antes de Cristo. O seu mtodo de ensino, ou dialtica, no sentido de arte do dilogo ou da discusso, era a conversao e a interrogao ou ironia, ou ainda, maiutica, palavra que significa relativo ao parto, pois aquele filsofo partejava idias. A palavra ironia vem do grego eironeia, interrogao. A ironia socrtica um processo de ensino empregado por Scrates que, fingindo ignorncia, dirigia perguntas a seus discpulos para investigar suas respostas. O mtodo socrtico procura fazer desabrochar as capacidades latentes, fazendo com que o aluno se desenvolva, que chegue, ele mesmo, a concluses. Nenhuma aprendizagem to marcante quanto quela que fruto da prpria concluso de quem aprende, uma vez que, entre a arte de ensinar e a arte de aprender existe uma grande diferena, no obstante considerarem-se ambas intimamente vinculadas. Em geral, quem comea a aprender o faz sem saber por qu; pensa que por necessidade, por uma exigncia de seu temperamento, por um desejo ou por muitas outras coisas, s quais costuma atribuir esse porqu. Mas quando j comea a vincular-se quilo que aprende, vai despertando nele o interesse e, ao mesmo tempo, reanimam-se as fibras adormecidas da alma, que comeam a buscar, chamando ao estudo, os estmulos que iro criar a capacidade de aprender,ou seja, a emotizao de imagens.

Enfim, como o ser aprende, e para que aprende? Eis a duas indagaes s quais nem sempre se podem dar respostas satisfatrias. Porm, entender como o ser humano aprende e incitar conhecimentos significativos para o aluno um grande desafio. por tudo isso que se diz: se os alunos no aprendem da maneira que ensinamos, por que no ensinar da maneira que eles aprendem?

Envolver os alunos na leitura emotizada de obras literrias de estilos, de pocas, de autores diferentes, motiva-os pelo prazer da descoberta e pelo redimensionamento da leitura literria. Apropriar-se do texto literrio em sua magnitude, l-lo, estud-lo o grande diferencial no mundo das leituras velozes e por isso que fazer um percurso literrio no tempo aproximando o texto de Cervantes (Dom Quixote), do de Machado de Assis (O Alienista), do poeta Drummond (Poema de Sete Faces), das msicas (Dom Quixote, de Humberto Gessinger/Paulo Galvo, Maluco Beleza, de Raul Seixas e Balada do Louco, de Arnaldo Baptista/ Rita Lee), da filosofia de Plato (Alegoria da Caverna), permite que se oponha ao imediatismo dos anseios dos jovens a atemporalidade de anseios e angstias presentes na recorrncia de temas: o amor, a loucura, a angstia do ser humano diante do tempo vivido e marcado pelas presses sociais que sufocam os sonhos de tantos e um aparente revisar de situaes que parecem se repetir ao longo de sculos.

Ao se colocar em prtica os conhecimentos da Emotologia, principalmente quando se trata de temas to complexos como a loucura, pode-se criar um ambiente externo e interno que leve os alunos leitores a uma aprendizagem mais plena.

Em O Pequeno Prncipe, de Antoine de Saint-Exupry, a raposa diz ao principezinho:

... Se tu vens, por exemplo, s quatro da tarde, desde as trs eu comearei a ser feliz. Quanto mais a hora for chegando, mais eu me sentirei feliz. s quatro horas, ento, estarei inquieta e agitada: descobrirei o preo da felicidade! Mas se tu vens a qualquer momento, nunca saberei a hora de preparar o corao... preciso ritos. (1996, p.69).

A emotizao pode, neste caso, ser comparada a preparar o corao. So os ritos.

Num ambiente emotizado, aprende-se melhor e mais rpido. Enfim, o que se pretendeu com este estudo foi propor alternativas que

ajudem o aluno a constatar que a leitura literria tem o poder de lev-lo a refletir sobre temas e formas que representam as buscas, angstias e necessidades que constituem a essncia humana, pois, como afirma Antnio Cndido a literatura deve ser ensinada porque atua como organizadora da mente e refinadora da

sensibilidade, como oferta de valores num mundo onde eles se apresentam flutuantes. (PERRONE-MOISS, 2000, p. 351).

Assim, com as atividades propostas no Crculo de Palestras percebeu-se que a antecipao de alguns conceitos fundamental para que os alunos tenham maior embasamento terico e curiosidade para participar das atividades propostas. A presena de um profissional, especialista no assunto, foi essencial para o sucesso da ao proposta, tendo em vista que se tratava de uma atividade complexa.

Esse percurso foi fundamental, especialmente para o jovem, que se encontra em processo intenso de descoberta das coisas e de si. Atravs das atividades, os alunos perceberam e entenderam o lado gauche do ser humano, e compreenderam que a literatura realmente capaz de desabrochar o interesse por si e pelo outro, auxiliando-o no processo de aproximao como ser humano de outros seres humanos. Prova disso esteve no fato de que a oficina mais abrangente foi a que trouxe tona um problema que est presente em todas as instituies de ensino: o bullying. O que mais se solidificou e marcou todo desenvolvimento da oficina foram a distribuio de informaes e o envolvimento da comunidade escolar. Mais relevante ainda foi o fato de os alunos compreenderem que as histrias se relacionam com a vida diria, que podemos tirar lies de quase todas. Elas nos atraem ao mostrar personagens que identificam um conflito, entendem que precisam tomar uma atitude e agem para resolver problemas e superar dilemas. Depois de um trabalho assim, o aluno ficar bem mais atento aos seus impulsos antiticos no futuro.

A aproximao da objetivao (textos cientficos e literrios) da subjetivao (emoo de cada um) confirma a relevncia da emotizao de imagens no cotidiano do processo ensino e aprendizagem em todas as reas do conhecimento.

De fato, a possibilidade de se trabalhar com os conceitos da emotologia na formao de leitores e de, com isso, estimular uma srie de processos internos ainda no amadurecidos nos alunos, fornece ao professor um instrumento significativo na orientao de seu trabalho, levando o processo de aprendizado a ser, alm de necessrio sobrevivncia, imprescindvel para a motivao e a felicidade pessoal.

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