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Página 1 de 31 Prof. Márcio Gondim Prática Jurídica IV Prática Processual Penal I. INQUÉRITO POLICIAL (arts. 4° a 25 do CPP) 1. Conceito de inquérito policial: É o conjunto de diligências encetadas e presididas pela polícia judiciária (polícia judiciária vs. polícia administrativa) reunidas em procedimento administrativo sigiloso, escrito e inquisitivo com o desiderato de se apurar indícios de autoria e prova da materialidade de infrações penais com penas privativas de liberdade superiores a dois anos tendo como destinatário imediato o Parquetou o ofendido (ações penais privadas). Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades policiais no território de suas respectivas circunscrições e terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria. (Redação dada pela Lei nº 9.043, de 9.5.1995) Parágrafo único. A competência definida neste artigo não excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja cometida a mesma função. Ver artigo 144 da Constituição Federal (Segurança Pública) Ministério Público pode investigar? perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência da autoria e da materialidade de determinado delito. Tal conclusão não

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Prof. Márcio Gondim

Prática Jurídica IV

Prática Processual Penal

I. INQUÉRITO POLICIAL (arts. 4° a 25 do CPP)

1. Conceito de inquérito policial:

É o conjunto de diligências encetadas e presididas pela

polícia judiciária (polícia judiciária vs. polícia administrativa) reunidas em

procedimento administrativo sigiloso, escrito e inquisitivo com o

desiderato de se apurar indícios de autoria e prova da materialidade de

infrações penais com penas privativas de liberdade superiores a dois anos

tendo como destinatário imediato o ‗Parquet‘ ou o ofendido (ações penais

privadas).

Art. 4º A polícia judiciária será exercida pelas autoridades

policiais no território de suas respectivas circunscrições e

terá por fim a apuração das infrações penais e da sua autoria.

(Redação dada pela Lei nº 9.043, de 9.5.1995)

Parágrafo único. A competência definida neste artigo não

excluirá a de autoridades administrativas, a quem por lei seja

cometida a mesma função.

Ver artigo 144 da Constituição Federal (Segurança Pública)

Ministério Público pode investigar? “"É

perfeitamente possível que o órgão do Ministério Público promova a

colheita de determinados elementos de prova que demonstrem a existência

da autoria e da materialidade de determinado delito. Tal conclusão não

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significa retirar da Polícia Judiciária as atribuições previstas

constitucionalmente, mas apenas harmonizar as normas constitucionais

(arts. 129 e 144) de modo a compatibilizá-las para permitir não apenas a

correta e regular apuração dos fatos supostamente delituosos, mas também

a formação da ‗opinio delicti‘"‖ (STF. HC 91661/PE – PERNAMBUCO.

Min. Ellen Gracie). (INFO 538 DO STF).

Além disso, o CNMP já estabeleceu regra sobre a

investigação criminal no âmbito do Ministério Público, por intermédio da

Resolução nº 13: "Regulamenta o art. 8º da Lei Complementar 75/93

e o art. 26 da Lei nº 8.625/93, disciplinando, no âmbito do Ministério

Público, a instauração e tramitação do procedimento investigatório

criminal, e dá outras providências".

Comentar PEC 37

2. Características do inquérito:

a) Escrito - o inquérito policial, por força do art. 9º do

CPP, é escrito, portanto, a peça inaugural, interrogatórios, oitivas de

testemunhas e demais atos são reduzidos em termos e juntados em um

único autuado e rubricado pela autoridade policial, isto é, o Delegado de

Polícia.

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Cabe destacar que o projeto do CPP aprovado pelo Senado

Federal admite a documentação das provas por meios gravação de áudio e

vídeo (art. 29, § 1º do NCPP).

b) Inquisitivo - o fato delitivo e o suposto autor são

objetos do estudo da autoridade policial, assim não há contraditório, pois

é discricionariedade do Delegado de Polícia as diligências a serem

adotadas, por prescrição do art. 14 do CPP, como decidiu o STJ:

É entendimento pacífico da doutrina e jurisprudência que o

princípio do contraditório não se aplica ao inquérito

policial‖. (STJ. RHC 200500306196 – (17360 SP)– 6ª T. –

Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa – DJU 28.11.2005. p.

00336).

ADVOGADO! É oportuno ressaltar que não há

necessidade da presença de causídico durante o interrogatório policial,

como afirma PÂNCARO (2006, p. 37):

Tendo em vista a simetria do art. 15 do CPP com o art. 194

do mesmo Código e tendo este sido revogado exatamente em

razão da obrigatoriedade de defensor no interrogatório

judicial, será preciso, agora, também advogado por ocasião

do interrogatório policial? Parece-nos evidente que não,

malgrado isoladas posições em contrário estejam surgindo. É

preciso ver a razão da norma. Porque o advogado no

interrogatório judicial para o réu? Para garantir a plenitude

de defesa. Ocorre que na fase policial não há ampla defesa,

muito menos, contraditório, exsurgindo daí a desnecessidade

da assistência por defensor nesta etapa.

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Destaque-se, entretanto, que existe posição da doutrina

inclinando-se pela processualização do procedimento, com a aplicação

de princípios atinentes ao processo, como contraditório e ampla defesa –

esta posição é minoritária e isolada.

c) Indisponibilidade pela autoridade policial - a

autoridade não poderá mandar arquivar ou dispor do Inquérito Policial,

devendo remeter suas conclusões ao Poder Judiciário, por força do art. 17

do CPP. Entretanto, após arquivado a autoridade poderá realizar novas

investigações e diligências, se tiver notícias de provas novas, art. 18 do

CPP, se não houver novas provas o Ministério Público não pode intentar a

ação penal, como sumulado pelo STF:

524 - Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a

requerimento do promotor de justiça, não pode a ação penal

ser iniciada, sem novas provas.

d) Dispensável - embora indisponível pela autoridade

policial, o inquérito é peça prescindível ao oferecimento da ação penal,

haja vista que o ‗Parquet‘ poderá propor ação penal com esteio em

documentos distintos do IP, por mandamento expresso dos arts. 4º°, p.

único, 27 e 39, § 5º do CPP, como o relatório das CPI/CPMI,

representações etc., nesse sentido o aresto:

1. A teor do disposto no art. 129, VI e VIII, da Constituição

Federal, e no art. 8º, II e IV, da Lei Complementar nº 75/93,

o Ministério Público, como titular da ação penal pública,

pode proceder a investigações, inclusive colher depoimentos,

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lhe sendo vedado tão-somente presidir o inquérito policial,

que é prescindível para a propositura da ação penal. 2.

Precedentes desta Corte e do Supremo Tribunal Federal. 3.

Ordem denegada‖. (STJ. HC 43030/DF; HABEAS CORPUS

n° 2005/0055235-7. Ministro Paulo Gallotti. Sexta Turma.

DJ 02.10.2006 p. 315) (destacado).

O membro do Ministério Público pode obter indícios de

autoria e materialidade por outros procedimentos, como mencionado

anteriormente - os inquéritos não policiais (IPM, procedimento

investigativo do MP, CPI, CPMI, Inquéritos Civis Públicos, COAF, etc.).

Obs.:

→ As autoridades que gozam de foro especial por

prerrogativa de função não podem ser indiciadas pela autoridade policial.

Por exemplo: prefeito (presidência do presidente do TJ); senador

(presidência do presidente do STF). A gestão da investigação é da

autoridade, mas as diligências são feitas pela polícia.

e) Oficialidade - o inquérito é peça de investigação

conduzida por órgãos do Estado, não existindo a figura do Delegado

Particular, mesmo em se tratando de ação penal de iniciativa privada.

f) Sigiloso - é inerente à investigação o sigilo, haja vista

que a publicidade dos fatos ensejará dificuldade ou óbice na elucidação

dos fatos, ‗ex vi‘ do art. 20 do CPP. O Ministério Público pode

acompanhar a elaboração do procedimento de investigação, sem causar

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qualquer suspeição do membro do Parquet, como se depreende da Súmula

nº 234 do Superior Tribunal de Justiça:

234 - A participação de membro do Ministério Público na

fase investigatória criminal não acarreta o seu impedimento

ou suspeição para o oferecimento da denúncia.

O advogado, por força do disposto no art. 7º, inc, XIV da

Lei Federal n° 8.906/94, terá acesso aos autos do inquérito, entretanto, o

Superior Tribunal de Justiça assevera que este acesso não será ilimitado,

como corolário da natureza inquisitiva da investigação a fundamentar a

‗opinio delicti‘ do Ministério Público na persecução penal, ‗verbo ad

verbum‘:

ADMINISTRATIVO - INVESTIGAÇÕES POLICIAIS

SIGILOSAS - CF/88, ART. 5º, LX E ESTATUTO DA

OAB, LEI 8.906/94. 1. O art. 20 do CPP, ao permitir sigilo

nas investigações, não vulnera o Estatuto da OAB ou

infringe a Constituição Federal. 2. Em nome do interesse

público, podem as investigações policiais revestir-se de

caráter sigiloso, quando não atingirem o direito subjetivo do

investigado. 3. Somente em relação às autoridades

judiciárias e ao Ministério Público é que inexiste sigilo. 4.

Em sendo sigilosas as investigações, ainda não

transformadas em inquérito, pode a autoridade policial

recusar pedido de vista do advogado. 5. Recurso ordinário

improvido‖. (STJ. DJ 08.06.2007 p. 239. RMS 13465/PR;

Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n°

2001/0088591-6. Ministro Francisco Peçanha Martins)

(realçado).

SIGILO. INQUÉRITO POLICIAL. CAUTELAR. VISTA.

AUTOS. Não há ilegalidade no ato de o juiz negar

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fundamentadamente o pedido formulado pelos advogados do

ora recorrente de vista dos autos do inquérito policial e do

procedimento cautelar tidos por sigilosos. Esse sigilo, como

demonstrado, é imprescindível para o bom desenvolvimento

das investigações extrajudiciais da ação criminosa, delito de

tal vulto que coloca em risco a segurança da sociedade e do

Estado. Assim, não há que se falar em ofensa ao princípio da

ampla defesa, visto tratar de inquérito policial, mero

procedimento administrativo de investigação inquisitorial

fora da proteção do referido princípio. Quanto ao art. 7º, XV,

da Lei n. 8.906/1994 (EOAB), esse não confere aos

causídicos o direito absoluto de acesso aos autos, direito que

é limitado pelo sigilo, conforme o art. 7º, XIII, do mesmo

estatuto. Por fim, há a prevalência do interesse público sobre

o privado (art. 20 do CPP)‖. (RMS 17.691-SC, Rel. Min.

Gilson Dipp, julgado em 22/2/2005. Informativo nº 0236.

Período: 21 a 25 de fevereiro de 2005) (grifado).

Portanto, cabe destacar que se houver sigilo específico, leia-

se, segredo de justiça, não haverá acesso pleno do causídico ao

inquérito policial, pois tão somente aqueles advogados constituídos pelo

investigado, como leciona FEITOZA (2009, p. 183):

"Sempre que houver sigilo específico (segredo de justiça),

não teria sentido que qualquer advogado pudesse ter acesso

às informações. Assim, cremos que o correto é se permitir

vista dos autos apenas aos advogados do indiciado, nos casos

de sigilo legal (...)".

Ponto:

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Sendo negado o acesso do causídico aos autos do

inquérito policial, qual a peça jurídica a ser manejada? Mandado de

segurança criminal.

Vide súmula vinculante nº 14: “"é direito do defensor, no

interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova

que, já documentados em procedimento investigatório realizado por

órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao

exercício do direito de defesa".

O STJ também asseverou a possibilidade de acesso do IP

por intermédio de habeas corpus profilático.

3. Instauração do Inquérito (art. 5°):

Art. 5o Nos crimes de ação pública o inquérito policial será

iniciado:

I - de ofício;

II - mediante requisição da autoridade judiciária ou do

Ministério Público, ou a requerimento do ofendido ou de

quem tiver qualidade para representá-lo.

§ 1o O requerimento a que se refere o n

o II conterá sempre

que possível:

a) a narração do fato, com todas as circunstâncias;

b) a individualização do indiciado ou seus sinais

característicos e as razões de convicção ou de presunção de

ser ele o autor da infração, ou os motivos de impossibilidade

de o fazer;

c) a nomeação das testemunhas, com indicação de sua

profissão e residência.

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§ 2o Do despacho que indeferir o requerimento de abertura

de inquérito caberá recurso para o chefe de Polícia.

§ 3o Qualquer pessoa do povo que tiver conhecimento da

existência de infração penal em que caiba ação pública

poderá, verbalmente ou por escrito, comunicá-la à

autoridade policial, e esta, verificada a procedência das

informações, mandará instaurar inquérito.

§ 4o O inquérito, nos crimes em que a ação pública depender

de representação, não poderá sem ela ser iniciado.

§ 5o Nos crimes de ação privada, a autoridade policial

somente poderá proceder a inquérito a requerimento de

quem tenha qualidade para intentá-la.

Antes de se discorrer sobre a instauração do inquérito

policial é importante desmistificar um termo que é empregado diariamente

nos meios de comunicação1 que é a ―queixa‖ ou denúncia‖ na delegacia,

pois é costumeiro escutar que fulano deu queixa perante o Delegado ou

que sicrano vai denunciar beltrano na delegacia. Ora, a técnica forense não

permite o uso indiscriminado desses termos, uma vez que se referem às

peças iniciais das ações penais privadas e públicas, respectivamente.

Na realidade, a autoridade policial tomará conhecimento da

infração penal por intermédio da ‗notitia criminis‘, termo latino que

importa notícia do crime.

1

“Clientes da Tavares Correia prestam queixa na delegacia. Publicado em 07.07.2008, às 13h02. Dezenas de clientes da agência de turismo Tavares Correia prestaram queixa na manhã desta segunda-feira (7) na Delegacia de Repressão e Estelionato, no bairro da Boa Vista, área central do Recife.”. (In http://jc.uol.com.br/2008/07/07/not_173368.php). (sublinhado).

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Notar o esquema:

Direta (de cognição imediata)

‗Notitia criminis‘ Indireta (de cognição mediata, por provocação: ‗delatio

criminis‘)

De cognição coercitiva

Feita esta explanação, cabe perceber que a autoridade

policial instaurará o inquérito:

a) ‘Ex officio’: significa por força do meu ofício, isto é, do

meu trabalho, pois a autoridade policial quando tiver notícia (‗notitia

criminis‘) de infração penal de ação penal pública deverá,

obrigatoriamente, instaurar o inquérito policial por intermédio de portaria

(traz os fatos, os eventuais envolvidos, diligências que serão cumpridas e

determina a instauração do inquérito policial). Tem-se conhecimento da

infração (de cognição imediata) por atividade da própria polícia ou pela

imprensa.

b) Por requisição: é corolário do art. 5º, ‗caput‘ do CPP,

assim, havendo requisição do Ministério Público ou Poder Judiciário

deverá o Delegado instaurar o devido apuratório, contudo, EDILSON

MOUGENOT BONFIM afirma não haver subordinação hierárquica

do Delegado ao Membro do Ministério Público e, por conseguinte, não

há obrigatoriedade no atendimento da requisição. Trilha o mesmo

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caminho GUILHERME NUCCI asseverando não ter a requisição a

característica de ordem, além de não ser a autoridade obrigada a atender

em hipóteses de ilegalidade na requisição, no entanto DENILSON

FEITOZA, NORBERTO AVENA e NESTOR TÁVORA asseveram

que a requisição tem caráter de determinação, portanto a autoridade

policial não poderá escusar-se na instauração do inquérito, não há

hierarquia, no entanto o cumprimento decorre de imposição legal.

c) Por meio de requerimento ou representação do

ofendido (pedido): haverá requerimento quando se tratar de ação penal

privada e representação em caso de ação penal condicionada à

representação. Ressalte-se que em caso de não atendimento por parte do

Delegado poderá o ofendido manejar recurso ao superior hierárquico da

autoridade policial, via de regra, o Secretário de Segurança Pública ou o

Delegado Geral, por força do art. 5º, § 2º do CPP.

Obs.:

→ A representação (nos crimes de ação penal pública

condicionada à representação) também é conhecida como ‗delatio

criminis’ postulatória.

Atividade n° 02 – NOTÍCIA ANÔNIMA! Questão

debatida na doutrina é a existência de notícia anônima, apócrifa ou

inqualificada do acontecimento delitivo como forma inválida de ‗notitia

criminis‘ indireta, entretanto importa timbrar o dever da autoridade policial

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instaurar o procedimento de investigação quando conhecer da prática

delitiva, dessarte, não há invalidade em notícia anônima, nesse sentido é o

informativo n° 226 do STJ:

Postula o trancamento do inquérito sob o argumento, em

suma, de que esse derivaria de denúncia anônima, o que

seria proibido pelo texto constitucional. Todavia, chegando

ao conhecimento da autoridade a possibilidade de ocorrência

de conduta típica, essa tem o dever de apurar a veracidade

dos fatos alegados, desde que se proceda com a devida

cautela, o que se observa no presente caso, pois tanto as

investigações quanto o inquérito instaurado têm sido

conduzidos sob sigilo. Não há como ser questionada a

validade do procedimento ou das provas ali apuradas‖.

(Informativo STJ nº 0226. Período: 25 a 29 de outubro de

2004. HC 38.093-AM, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em

26/10/2004) (sublinhado).

1- Para determinação da quebra de sigilo telefônico, há

exigências de que existam indícios de autoria, não havendo,

por outro lado, impedimento de que o inquérito policial

tenha se iniciado após denúncias anônimas. 2- Writ

denegado. (STJ – HC 97.212 – (2007/0303476-6) – Relª

Min. Conv. Jane Silva – DJe 30.06.2008 – p. 1171)

(destacado).

De igual sorte, o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

admite a notícia anônima quando aliada a outros elementos, notar:

Constitucional e Processual Penal. Habeas Corpus.

Possibilidade de denúncia anônima, desde que acompanhada

de demais elementos colhidos a partir dela. (STF. HC 98345

/ RJ - RIO DE JANEIRO. Min. Marco Aurélio.

Julgamento: 16/06/2010).

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A 2ª Turma indeferiu habeas corpus em que se pretendia o

trancamento de ações penais movidas contra a paciente, sob

a alegação de que estas supostamente decorreriam de

investigação deflagrada por meio de denúncia anônima, em

ofensa ao art. 5º, IV, da CF. Ademais, sustentava-se

ilegalidade na interceptação telefônica realizada no mesmo

procedimento investigatório. Reputou-se não haver vício na

ação penal iniciada por meio de denúncia anônima, desde

que seguida de diligências realizadas para averiguação dos

fatos nela noticiados, o que ocorrido na espécie. Considerou-

se, ainda, que a interceptação telefônica, deferida pelo juízo

de 1º grau, ante a existência de indícios razoáveis de autoria

e demonstração de imprescindibilidade, não teria violado

qualquer dispositivo legal. Concluiu-se que tanto as ações

penais quanto a interceptação decorreriam de investigações

levadas a efeito pela autoridade policial, e não meramente da

denúncia anônima, razão pela qual não haveria qualquer

nulidade. HC 99490/SP, rel. Min. Joaquim Barbosa,

23.11.2010. (HC-99490) (Informativo n° 610 do STF, nov

de 2010).

d) Em razão de flagrante: havendo a condução do suposto

autor da infração penal e convencido o Delegado da autoria e

materialidade delitiva criminosa deverá iniciar o inquérito com o

necessário auto de prisão em flagrante.

É importante verberar que a adoção de medidas pela

autoridade policial dependerá da espécie de crime e ação penal, como

explicitado no quadro abaixo:

A. Pública

Incond.

A. Pública Cond. A. Privada

De ofício pelo Sim Não Não

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Delegado

(portaria)

Pedido do

ofendido

(portaria)

Sim Sim

(representação)

Sim

(requerimento)

Requisição do

MP/PJ

(portaria)

Sim Sim, desde que

acompanhada da

representação

Sim, desde que

acompanhada de

requerimento

Em razão de

flagrante

Sim Sim, desde que o

auto seja ratificado

pelo ofendido

Sim, desde que o

auto seja

ratificado pelo

ofendido

4. Presidência do inquérito:

Via de regra, o inquérito é presidido pelo Delegado de

carreira com atribuição na circunscrição policial (delimitação territorial

da atuação do delegado) onde fora praticado o delito, todavia, há exceções

à regra geral, principalmente quando houver investigado com foro especial

em corolário da função.

Os critérios de atribuição para a investigação são dois: a)

territorial e b) matéria (a Lei 10.446/02 permite que a polícia federal

investigue crimes de alçada da polícia civil quando há repercussão

interestadual ou internacional e seja necessária a repressão uniforme, sem

prejuízo das diligências da polícia estadual).

Obs.:

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Prática Jurídica IV

→ Quando o investigado se tratar de Magistrado ou membro

do Ministério Público caberá ao Presidente do Tribunal e ao Procurador-

Geral de Justiça/República, consoante dispositivo das respectivas leis

orgânicas.

→ Além disso, em caso crime dado no Congresso Nacional

o poder de polícia será da Câmara ou do Senado, nos termo da Súmula nº

397 do STF, ver:

397 - O poder de polícia da câmara dos deputados e do

senado federal, em caso de crime cometido nas suas

dependências, compreende, consoante o regimento, a prisão

em flagrante do acusado e a realização do inquérito.

5. Indiciamento:

Não existe na lei o conceito do que seja o indiciamento. É

necessário o silogismo (partir de premissas formais) para se conceituar o

indiciamento. Indiciar é reconhecer que as diligências investigativas irão

se restringir a uma gama de pessoas, pois provavelmente aquelas pessoas

são suspeitas de serem autores da infração.

No indiciamento, o delegado sai de um juízo de

possibilidade e alcança um grau de probabilidade tal que lhe permita

centralizar as investigações em razão daquela pessoa. O preso provisório é

obrigatoriamente indiciado.

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Prática Jurídica IV

É a ―imputação formal da prática de infração penal a alguém

no inquérito policial2

‖, é mera formalidade e não caracteriza

constrangimento ilegal consoante entendimento do Superior Tribunal de

Justiça:

O mero indiciamento em inquérito não caracteriza

constrangimento ilegal reparável via habeas corpus‖. (STJ –

RHC 200600042060 – (18841 PR) – 5ª T. – Rel. Min.

Gilson Dipp – DJU 11.09.2006 – p. 313).

Demais disso, deve preceder a denúncia:

É pacífico nesta corte o entendimento de que não se justifica

o indiciamento policial daquele contra quem o ministério

público já ofereceu denúncia. (STJ – HC 200401412959 –

(38732 SP) – 6ª T. – Rel. Min. Paulo Gallotti – DJU

05.12.2005 – p. 00381)‖.

Obs.:

→ Desindiciamento: é a retratação do indiciamento por

parte do delegado de policia, bem como por intermédio de habeas corpus

que tranca a ação penal (habeas corpus trancativo).

6. Valor probatório do inquérito policial:

O inquérito policial tem valor probatório relativo, pois as

provas produzidas durante a investigação policial devem ser, via de regra,

repetidas durante a instrução processual, salvo as provas irrepetíveis, v. g.,

2 In FEITOZA (2009, p. 173).

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Prática Jurídica IV

as provas periciais, uma vez que realizadas durante a etapa investigativa

não são renovadas em juízo.

Assim, todos os testemunhos e interrogatórios realizados

durante a tramitação do inquérito policial devem ser renovados. A razão

de ser é simples e tem sede constitucional, pois, como mencionado, no

inquérito não há contraditório e é regido pelo sistema

inquisitivo quando somente se produz prova em desfavor

do investigado, portanto quando ajuizada a ação penal haverá, por

conseguinte, necessidade de confecção das provas sob a égide do princípio

do contraditório.

Conclui-se, desse modo, o caráter relativo da prova

coligida na investigação policial, não sendo substrato suficiente a dar

esteio à procedência da ação penal, como já pontificado pela

jurisprudência, perceber:

O inquérito policial tem conteúdo informativo e seu valor

probatório é relativo, tendo em vista que as informações

colhidas nesta fase não são realizadas sob a égide do

contraditório e da ampla defesa‖. (TJPR. Apr 0308528-1. 3ª

C.Crim. – Rel. Des. Robson Marques Cury. J. 09.03.2006).

Frise-se, ainda, que as nulidades cometidas na

investigação policial não contaminam a ação penal, ‗verbis‘:

Agravo regimental no recurso extraordinário. penal.

alegação de contrariedade ao art. 5°, inc. XXXV, LIV e LV,

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Prática Jurídica IV

da Constituição da República. Impossibilidade de análise da

legislação infraconstitucional. Ofensa constitucional indireta.

Eventuais vícios ocorridos no inquérito policial: não

contaminação da ação penal. precedentes. Agravo regimental

ao qual se nega provimento. (STF. RE 626600 AgR / ES -

ESPÍRITO SANTO. Julgamento: 09/11/2010).

Os vícios existentes no inquérito policial não repercutem na

ação penal, que tem instrução probatória própria‖. (STF –

RHC 85286 – SP – 2ª T. – Rel. Min. Joaquim Barbosa –

DJU 24.03.2006 – p. 55).

Obs.:

→ O professor Amilton Bueno de Carvalho entende que os

vícios de inquérito policial podem viciar a ação penal. Além disso, há

decisão do STJ (Op. Satiagraha) declarando nulidade da ação penal

por participação de agentes da ABIN na investigação policial;

→ Para Aury Lopes há que se diferenciar os atos de

investigação dos atos de prova, pois estes são produzidos com as garantias

constitucionais e podem sustentar a sentença condenatória, já que aqueles

são perfunctórios e para sustentar a acusação inicial.

Calha timbrar a modificação do art. 155 do CPP, trazida pela

Lei n° 11.690/08, ‗verbis‘:

Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação

da prova produzida em contraditório judicial, não podendo

fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos

informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas

cautelares, não repetíveis e antecipadas.

Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas

serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.

(realçado).

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Prática Jurídica IV

Destarte, a inovação legal adequou à realidade constitucional

o CPP, pois a doutrina já aludia a impossibilidade de ancorar a decisão

judicial tão-somente no inquérito policial.

Exceções (inquérito como único lastro da sentença

condenatória):

→ Provas cautelares (aquelas fundamentadas na necessidade

e urgência), por exemplo: a interceptação telefônica "contraditório

diferido", seqüestro de bens, etc.);

→ Provas irrepetíveis (provas de fácil deterioração, por

exemplo: vestígios deixados pela infração, perícia no cadáver, no

automóvel, etc.);

→ Produção antecipada de prova (instauração do incidente

de produção antecipada de prova, por exemplo: para ouvir testemunha que

viajará ou que está doente). Não existe regramento no CPP sobre o

procedimento da produção antecipada de provas, destarte é tomado o CPC

como regramento para a produção, nos termos dos arts. 846 ‗usque‘ 851 do

mencionado digesto3.

3 Da Produção Antecipada de Provas

Art. 846. A produção antecipada da prova pode consistir em interrogatório da parte, inquirição de testemunhas e exame pericial.

Art. 847. Far-se-á o interrogatório da parte ou a inquirição das testemunhas antes da propositura da ação, ou na pendência desta, mas antes da audiência de instrução:

I - se tiver de ausentar-se; II - se, por motivo de idade ou de moléstia grave, houver justo receio de que ao tempo da prova já não

exista, ou esteja impossibilitada de depor. Art. 848. O requerente justificará sumariamente a necessidade da antecipação e mencionará com

precisão os fatos sobre que há de recair a prova. Parágrafo único. Tratando-se de inquirição de testemunhas, serão intimados os interessados a

comparecer à audiência em que prestará o depoimento. Art. 849. Havendo fundado receio de que venha a tornar-se impossível ou muito difícil a verificação de

certos fatos na pendência da ação, é admissível o exame pericial. Art. 850. A prova pericial realizar-se-á conforme o disposto nos arts. 420 a 439. Art. 851. Tomado o depoimento ou feito exame pericial, os autos permanecerão em cartório, sendo

lícito aos interessados solicitar as certidões que quiserem.

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Prática Jurídica IV

7. Incomunicabilidade:

O Código de Processo Penal no art. 21 trata da

incomunicabilidade do indiciado, todavia esta regra não fora recepcionada

pela ordem constitucional vigente, pois o indiciado tem plena possibilidade

de se comunicar com sua família e causídico. Ora, a Lei Maior fala que

mesmo em caso de ESTADO DE DEFESA (exceção ao Estado Regular e

Democrático) não há incomunicabilidade do preso, quanto mais durante

sua regularidade, art. 136, § 3°, III da CF4.

Obs.:

→ Nem mesmo no RDD haverá incomunicabilidade do

preso, pois este tem contato com familiares e advogados.

→ DAMÁSIO, VICENTE GRECO FILHO e HÉLIO

TORNAGHI entendem ser constitucional a incomunicabilidade.

Ademais, é imperioso timbrar que a Lei Federal nº

12.403/2011 modificou o art. 306 da Lei de Ritos Penais estatuindo a

imperiosa comunicação à família do preso em flagrante, bem como ao

Ministério Público e à Defensoria Pública, caso não possua advogado,

verbis:

4 § 3º - Na vigência do estado de defesa:

(...) IV - é vedada a incomunicabilidade do preso.

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Prática Jurídica IV

Art. 306. A prisão de qualquer pessoa e o local onde se

encontre serão comunicados imediatamente ao juiz

competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à

pessoa por ele indicada. (Redação dada pela Lei nº 12.403,

de 2011).

§ 1o Em até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da

prisão, será encaminhado ao juiz competente o auto de

prisão em flagrante e, caso o autuado não informe o nome de

seu advogado, cópia integral para a Defensoria

Pública. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

8. Encerramento e prazo (art. 10):

O inquérito deve findar com a confecção de relatório

conclusivo por parte da autoridade que o preside, sendo peça importante

para a formação da ‗opinio delicti‘ do membro do Ministério Público, ‗ex

vi‘ do art. 10, § 1° do CPP.

O relatório é peça escrita que vai funcionar como uma

verdadeira prestação de contas, cabendo ao delegado sintetizar as

principais diligências realizadas e justificar as que não foram feitas por

algum motivo relevante.

O inquérito policial tem prazo para seu término e remessa ao

Poder Judiciário. O prazo geral do CPP é de 30 e 10 dias, para

investigados soltos e presos, respectivamente. Contudo, como no Direito

sempre há exceção, existem leis com prazo especiais como se nota do

quadro abaixo:

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Prática Jurídica IV

Prazo Preso Solto

CPP 10 dias

(improrrogáveis)

30 dias (renováveis)

Tóxicos (Lei

11.343/065)

30 dias (+30) 90 dias (+90)

Justiça Federal 15 dias (prorrogáveis

por mais 15)

30 dias

Crimes contra

economia popular (Lei

1.521/51)

10 dias

Obs.:

→ Quem fixa o prazo para o delegado quando há pedido de

diligências por parte do Ministério Público? Será o Juiz que fixará o prazo

para conclusão das diligências (não há prazo fixo, pois será prazo judicial);

→ O Juiz não pode discordar do pedido de diligências

efetuado pelo Membro do Ministério Público, caso discorde haverá a

possibilidade do manejo de correição parcial.

9. Arquivamento:

Segundo magistério de PAULO RANGEL o inquérito

deverá ser arquivado quando: "o fato não constitui crime; ou já está extinta

a punibilidade; ou, ainda, ausente uma condição exigida por lei para o

regular exercício do direito de agir".

5 Art. 51. O inquérito policial será concluído no prazo de 30 (trinta) dias, se o indiciado estiver preso, e de 90

(noventa) dias, quando solto. Parágrafo único. Os prazos a que se refere este artigo podem ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade de polícia judiciária.

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Prática Jurídica IV

O arquivamento é um ato complexo de vontades, pois

depende de pedido do Ministério Público e decisão do Magistrado, por

intermédio da homologação.

Cai a lanço destacar que DENILSON FEITOZA traz rol

mais amplo para o arquivamento do inquérito policial, fazendo um cotejo

dos arts. 395 e 397 da Lei Adjetiva, nesse norte é bom trazer à baila os

casos de arquivamento mencionados em sua obra:

a) a existência manifesta de causa excludente da ilicitude

do fato (art. 397, I do CPP e subsidiariamente, art. 78, b do

CPPM c/c art. 3° do CPP, equivalente ao revogado art. 43, I,

CPP). Por exemplo, a investigação criminal demonstrou,

cabalmente, que o fato ocorreu em legítima defesa;

b) a existência manifesta de causa excludente de

culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade (art. 397,

II, CP). Por exemplo, a investigação criminal demonstrou

plenamente que o fato ocorreu por coação moral irresistível;

c) o fato narrado evidentemente não constituir crime (art.

397, III do CPP);

d) estar extinta a punibilidade do agente (art. 397, IV, do

CPP);

e) ilegitimidade ad causam (art. 395, II, 2ª parte, do CPP);

f) faltar justa causa, ou seja, elementos probatórios

mínimos que permitam sustentar o exercício da ação penal

(art. 395, III do CPP);

g) faltar condição de procedibilidade;

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Prática Jurídica IV

h) houver impedimento processual que afete a investigação

criminal (litispendência ou coisa julgada, por exemplo).

A doutrina costuma falar em arquivamento direto, indireto e

implícito, notar:

Arquivamento

O arquivamento direto é aquele em que o Ministério

Público requer diretamente ao Poder Judiciário a promoção de

arquivamento que é submetida à homologação judicial consoante a

fundamentação trazida na manifestação do Parquet. É oportuno ver que o

Juiz poderá discordar do pedido de arquivamento do MP e remeter o

feito ao PGJ, segundo disposição expressa do art. 28 do CPP, ver:

Art. 28. Se o órgão do Ministério Público, ao invés de

apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito

policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso

de considerar improcedentes as razões invocadas, fará

remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-

geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do

Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de

arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a

atender.

Direto

Indireto

Implícito Subjetivo

Objetivo

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Prática Jurídica IV

O PGJ, por seu turno, poderá concordar com o membro do

Ministério Público de primeiro grau e devolver os autos ao juiz que não

poderá fazer outra coisa a não ser arquivar o inquérito ou designar novo

membro para o oferecimento da denúncia que atuará como ‗longa manus‘

do PGJ, isto é, autuará em nome daquele, como decorrência da garantia da

independência funcional, esculpida no art. 127, § 1º da CFRB.

Obs.:

Competência originária?

O arquivamento indireto ocorre quando a matéria tratada

em sede de inquérito policial não corresponda às atribuições do Ministério

Público correspondente, por exemplo, instaura-se um procedimento

investigativo na polícia civil e é remetido ao Promotor que conclui que se

trata de desvio de verba federal sujeita ao controle de ente da

administração pública federal, portanto atribuição do Parquet Federal,

assim, o Promotor promove o arquivamento indireto das peças

asseverando não ter atribuição para manejar aquela ação penal pugnando

pela remessa ao Procurador da República.

Em síntese, haverá arquivamento indireto quando não

houver atribuição do membro do Ministério Público para oferecer a peça

vestibular acusatória, como já lecionou EUGÊNIO PACELLI, verbis:

Em tais circunstâncias, ele deverá recusar atribuição para o

juízo de valoração jurídico-penal do fato, requerendo ao juiz

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Prática Jurídica IV

seja declinada a competência para a Justiça Estadual, com

posterior remessa dos autos a este Juízo, para

encaminhamento ao respectivo Ministério Público

estadual6‖.

O arquivamento implícito é construção doutrinária

rechaçada pela jurisprudência7

e, sumariamente, existe quando o

Ministério Público oferece denúncia em relação a apenas um ou alguns dos

indiciados no inquérito policial e silencia-se quanto aos demais indiciados

ou resta inerte com relação a algumas condutas típicas.

Para ilustrar: o Delegado instaura inquérito, mediante

portaria, indiciando Fulano, Beltrano e Sicrano como autores do delito de

roubo, todavia, o Promotor somente oferece denúncia contra Sicrano e

nada fala dos demais indiciados ou, em um segundo exemplo, o Delegado

instaura inquérito indiciando Fulano por roubo e estupro com resultado de

lesão grave, entretanto o órgão de execução do Ministério Público oferece

denúncia apenas narrando e classificando o delito de roubo e nada fala no

estupro com resultado de lesão grave. O primeiro caso é de arquivamento

implícito subjetivo e o segundo é de arquivamento implícito objetivo.

Ora, antes da sentença final, o órgão de defesa da sociedade

(Ministério Público) poderá aditar a exordial como prescreve o art. 569 do

CPP, ‗verbatim‘:

6 In OLIVEIRA (2004, p. 41).

7 “O sistema processual penal brasileiro não agasalhou a figura do arquivamento implícito de inquérito

policial. (STF. Informativo n° 562 de out. de 2009).”

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Art. 569. As omissões da denúncia ou da queixa, da

representação, ou, nos processos das contravenções penais,

da portaria ou do auto de prisão em flagrante, poderão ser

supridas a todo o tempo, antes da sentença final.

Além disso, o Superior Tribunal de Justiça não aceita este

tipo de arquivamento, pois o Parquet poderá, a qualquer tempo, realizar o

aditamento da peça de acusação, perceber:

Improcede a alegação de arquivamento implícito do

inquérito em relação ao paciente, visto que o artigo 569 do

Código de Processo Penal admite o aditamento da denúncia

para suprir, antes da sentença, suas omissões, de modo, por

certo, a tornar efetivos os princípios da obrigatoriedade da

ação penal pública e da busca da verdade real‖. (STJ. HC

46409/DF; HABEAS CORPUS. 2005/0126341-2. Ministro

PAULO GALLOTTI. DJ 27.11.2006 p. 320).

Entretanto, o mesmo tribunal afastou a possibilidade de ação

privada subsidiária da pública em caso de ―arquivamento implícito‖, ver:

―Evidenciada a ocorrência de arquivamento implícito – eis

que o Ministério Público não teria promovido a denúncia

contra os pacientes por entender que não havia prova da

prática de delito pelos mesmos – impede-se a propositura de

ação penal privada subsidiária da pública‖. (STJ. HC

21074/RJ; HABEAS CORPUS 2002/0025422-7. Ministro

GILSON DIPP. DJ 23.06.2003 p. 396. RSTJ vol. 175 p.

473).

Obs.:

Desarquivamento e coisa Julgada:

O inquérito pode ser desarquivado a qualquer tempo,

caso haja NOTÍCIA de prova nova, isto é, não é necessária a existência de

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Prática Jurídica IV

prova nova, mas apenas a notícia, todavia para o oferecimento da ação

penal será NECESSÁRIA a prova nova.

A prova há de ser SUBSTANCIALMENTE nova, ou

seja, com novo conteúdo e não apenas FORMALMENTE nova (novo

testemunho com mesmo conteúdo).

FEITOZA entende que cabe ao Ministério Público o

pedido do desarquivamento e, segundo o STF este pedido é irretratável.

INQ 2054.

O arquivamento em regra não faz coisa julgada material,

como mencionado no art. 18 do CPP e Súmula nº 524 do STF, no entanto

caso se trate de arquivamento por atipicidade e extinção da punibilidade

não haverá possibilidade de promover ação penal.

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL entende que

haverá coisa julgada MATERIAL em caso de arquivamento por

ATIPICIDADE e EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE.

No caso de arquivamento por EXCLUDENTE DE

ILICITUDE a jurisprudência do STF ainda vacila, pois há julgados em

dois caminhos distintos, o primeiro pela coisa julgada formal e outro pela

coisa julgada material, notar:

INFORMATIVO N° 597: Enfatizou não vislumbrar

diferença ontológica entre a decisão que arquiva o inquérito,

quando comprovada a atipicidade do fato, e aquela que o faz,

quando reconhecida a legalidade e licitude desse, porquanto

ambas estariam fundadas na inexistência de crime e não na

mera ausência ou insuficiência de provas para oferecimento

de denúncia. Registrou orientação da Corte no sentido de

que, arquivado o inquérito policial com base na inexistência

do crime, produzir-se-ia coisa julgada material. Aduziu,

destarte, que, tal como não seria admissível o

desarquivamento do inquérito policial pelo surgimento de

provas novas que revelassem a tipicidade de fato

anteriormente considerado atípico pelas provas existentes,

também seria inviável o desarquivamento na hipótese de fato

julgado lícito com apoio em provas sobejamente colhidas.

Asseverou que, na situação dos autos, o Ministério Público,

diante do acervo probatório apurado, concluíra que o fato

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Prática Jurídica IV

investigado não seria criminoso e, em conseqüência, deixara

de oferecer denúncia e requerera o acolhimento das

mencionadas excludentes de ilicitude, o que fora acatado

pelo juízo de origem. Assim, o arquivamento não decorrera

de mero encerramento de investigações improfícuas, mas

sim de um pronunciamento de mérito, anterior ao

oferecimento da denúncia e que corresponderia à absolvição

sumária. Após o voto do Min. Cezar Peluso, Presidente, que

seguia a divergência, pediu vista dos autos o Min. Ayres

Britto. Por fim, o Tribunal determinou a suspensão do

processo penal, até conclusão deste julgamento. HC

87395/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 26.8.2010. (HC-

87395)

INFORMATIVO N° 538: A Turma, por maioria,

indeferiu habeas corpus no qual pleiteado o trancamento

de ação penal instaurada a partir do desarquivamento de

inquérito policial, em que reconhecida excludente de

ilicitude. No caso, o citado inquérito apurava homicídio

imputado ao paciente, delegado de polícia, e a outros

policiais, sendo arquivado a pedido do Ministério Público do

Estado do Espírito Santo, que reputara configurado o estrito

cumprimento do dever legal. Passados dez anos da decisão

judicial, fora instalado, pelo parquet, o Grupo de Trabalho

para Repressão ao Crime Organizado - GRCO naquela

unidade federativa — que dera origem, posteriormente, a

Comissões Parlamentares de Inquérito em âmbito estadual e

nacional —, cujos trabalhos indicariam que o paciente e os

demais policiais não teriam agido em estrito cumprimento do

dever legal, mas sim supostamente executado a vítima

(―queima de arquivo‖). A partir disso, novas oitivas das

mesmas testemunhas arroladas no inquérito arquivado foram

realizadas e o órgão ministerial, concluindo pela

caracterização de prova substancialmente nova, desarquivara

aquele procedimento, o que fora deferido pelo juízo de

origem e ensejara o oferecimento de denúncia. A impetração

alegava que o arquivamento estaria acobertado pelo manto

da coisa julgada formal e material, já que reconhecida a

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Prática Jurídica IV

inexistência de crime, incidindo o Enunciado 524 da Súmula

do STF (Arquivado o inquérito policial, por despacho do

Juiz, a requerimento do Promotor de Justiça, não pode a ação

penal ser iniciada, sem novas provas.). HC 95211/ES, rel.

Min. Cármen Lúcia, 10.3.2009. (HC-95211) (...) Aduziu-se

que a jurisprudência da Corte seria farta quanto ao caráter

impeditivo de desarquivamento de inquérito policial nas

hipóteses de reconhecimento de atipicidade, mas não

propriamente de excludente de ilicitude. Citando o que

disposto no aludido Verbete 524 da Súmula, enfatizou-se

que o tempo todo fora afirmado, desde o Ministério Público

capixaba até o STJ, que houvera novas provas decorrentes

das apurações. Ademais, observou-se que essas novas

condições não afastaram o fato típico, o qual não fora

negado em momento algum, e sim a ilicitude que

inicialmente levara a esse pedido de arquivamento. Vencidos

os Ministros Menezes Direito e Marco Aurélio que deferiam

o habeas corpus por considerar que, na espécie, ter-se-ia

coisa julgada material, sendo impossível reabrir-se o

inquérito independentemente de outras circunstâncias. O

Min. Marco Aurélio acrescentou que nosso sistema convive

com os institutos da justiça e da segurança jurídica e que, na

presente situação, este não seria observado se reaberto o

inquérito, a partir de preceito que encerra exceção (CPP, art.

18). HC 95211/ES, rel. Min. Cármen Lúcia, 10.3.2009. (HC-

95211)

10. Referências:

BATISTA PINTO, Ronaldo; SANCHES CUNHA, Rogério. Processo

penal doutrina e prática. Salvador: Jus Podivm, 2008.

BONFIM, Edílson Mougenot. Curso de processo penal. 3ª edição. São

Paulo: Saraiva, 2008.

CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 5ª edição. São Paulo:

Saraiva, 2000.

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Prática Jurídica IV

FEITOZA, Denilson. Direito processual penal, teoria crítica e práxis. 6ª

ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009.

MENDONÇA, Andrey Borges de. Nova reforma do código de processo

penal. São Paulo: Método, 2008.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de processo penal comentado. 6ª

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OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de processo penal. 3ª edição. Belo

Horizonte: Del Rey, 2004.

PÂNCARO AVENA, Norberto Cláudio. Processo penal, série cursos e

concursos. 2ª edição. São Paulo: Método, 2006.

RANGEL, Paulo. Direito processual penal. 12ª edição. Rio de Janeiro:

Lumen Juris, 2007.

TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar A. R. C. de. Curso de direito

processual penal. 2ª edição. Salvador: Jus Podivm, 2008.